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e
ResponderemQS
ANO II
ÍNDICE
I. FILOSOFÍA
1) "Que é a verdade ?
Podem as facilidades humanas chegar a apreendé-la ?
E qual seria o criterio seguro para se discernir do erro a
verdade ?" Sil
II. DOGMÁTICA
«PBRGUNTE E RESPONDEREMOS»
REDAgAO ADMDÍISTRAgAO
Caixa Postal 2666 R. Real Grandeza, 108 — Botafogo
Rio de Janeiro Tel. 26-1822 — Rio de Janeiro
I. FILOSOFÍA
1) «Que é a verdade ?
Podem as facilidades humanas chegar a apreencfe^L .
E qual seria o criterio seguro para se discernir do erro
a verdade ?»
— 311 _
1. Que é a verdade ?
— 312 —
como éles sao e nao apreendemos apenas urna simples apa-
réncia désses objetos ? Quem nos garante que o ncsso pretenso
conhecimento do mundo externo nao passa de mera ilusáo
subjetiva ?
Tal dúvida se resolve pelo recurso a experiencia, assim
como pela verificagáo das absurdas conseqüéncias que o rela
tivismo e o ceticismo acarretam. É o que nos propomos desen
volver sob tres aspectos:
a) A experiencia atesta que afirmamos de maneira es
pontánea e constante a existencia do nosso corpo e de outros
corpos (ou do mundo sensível exterior a nos).
— 313 —
o individuo humano, se estívesse encerrado em sua consciéncia sem
jamáis atingir objetos externos, nao poderia ter o conceito de realidade
exterior, nem fazer distingáo entre o interior e o exterior, entre os
conceitos meramente subjetivos e os realmente objetivos, distineSo
que de fato a nossa consciéncia faz.
— 314 —
ou porque os motivos pro e contra o ceticismo lhe pare-
cem equivalentes. A pessoa no caso supóe a certeza da
discriminagáo désses motivos, supóe a certeza de um cri
terio para distinguir o certo do incerto e para avaliar a
igualdade dos motivos... Conseqüentemente, tal cético
possui suas certezas e se contradiz ;
... ou porque nao vé motivo nem pro nem contra o ceti
cismo. Nesta hipótese, a pessoa nao propóe o ceticismo
como doutrina, pois toda doutrina se funda em razóes,
certas ou prováveis. Contudo mesmo esta posicáo extre
mamente reservada implica contradigáo, pois supóe a cer
teza de que nao é a mesma coisa possuir e nao possuir
motivos (principio de contradigáo : «o ser nao é o náo-
-ser») ; supóe também a certeza de que nada se deve afir
mar sem razáo segura.
«De resto, todos estes recursos do cético provam que ele procura
íugir das contradiedes (e isso demonstra que ele admite como certo
o principio de contradicáo), mas sem o conseguir: só loge de urnas
para incorrer noutras. Leva semprn consigo a contradigáo essencial
desta doutrina: também o conhecimento provável é um conhecimento,
é saber que a mente nao alcancou ainda a certeza para a qual é
íeita e tende; isso pressupSe o conhecimento da aptidáo da mente
para conhecer a realidader -saber que nao sabe é um saber, pois é
a afirmacáo da existencia real de um determinado estado da mente;
donde o ceticismo é sempre a negacao de tdda a certeza junta com a
aceitacSo de algumas certezas.
Logo, sob qualquer forma que seja proposto, o ceticismo incluí
sempre algumas certezas, incluí sempre o Dogmatismo, e por conse-
guinte nao pode afirmar-se sem 'ipso íacto' negar-se. — É esta a
reíutacao eficaz do ceticismo, por redargüido, já usada por Aristó
teles (Metafísica 4, 3 e 4), pela qual se torna evidente que o cético
nao pode afirmar sua suposicáo sem ter que admitir o que ele nega»
(P. Cerruti, A caminho da Verdade Suprema. Rio de Janeiro 1954, 48s).
— 315 —
Os íilósofos, em geral, ensjnam que a evidencia nao pode ser
própriamente definida, porqué ela é o que há de mais simples e
claro; é como a luz, que se maniíesta a si mesma e maniíesta outras
coisas, mas por nada pode ser maniíestada.
■ — 316 —
em si e todo motivo para se impor a outros. Portante mesmo
quem critica o conceito tradicional de verdade, nao pode ser
tomado a serio, se nao diga que vé e se nao procure fazer ver
que as coisas existem de modo diferente do que se pensa.
Destas consideracóes se deduz que o erro intelectual só
se pode dar onde nao naja evidencia do objeto. Sim; o erro
intelectual consiste em se afirmar o que nao é ; ora o náo-ser,
nao tendo entidade, nao pode ser evidente ou nao pode agir
sobre a inteligencia e necessitá-la a dar sua adesáo. Por con-
seguinte, todo erro é dependente da vontade; deve-se, em
última análise, á influencia da vontade, que move a inteligencia
a afirmar algo que ela nao vé com evidencia. O erro intelectual
jamáis é algo em que o homem normal deva necessáriamente
incorrer.
— 317 —
riam táo pouco eco quanto encontram» (Nouveaux essais sur
l'entendement humain, citado por J. Bouché, em «Dictionnaire
de Théologie catholique» V 2, 1726).
Como se vé, a filosofía perene é francamente otimista na
solucáo da questáo criteriológica: afirma que o homem foi
feito para apreender a verdade e que só incorre no erro caso
nao faga uso devido da sua inteligencia (note-se bem que
ignorancia nao é erro : quem ignora um assunto, nada afirma
sobre o mesmo ; quem erra, afirma algo em desacordó com a
realidade).
n. DOGMÁTICA
A. F. P. (Belo Horizonte) :
— 318 —
vava da descoberta de documentos da civilizagáo antiga (no
séc. XVI essa corrente era chamada «restituigáo das boas
letras»). O individuo humano, com seus valores e suas facul-
dades, foi sendo mais e mais focalizado pelos pensadores da
época que, consciente ou inconscientemente, deram inicio a
nova ordem de coisas, emancipada da que até entáo estivera
em vigor: a cultura profundamente impregnada de fé, que
formara as geracóes antigás e medievais, foi cedendo a nova
mentalidade — á do «livre pensador» ou racionalista, que
tende a remover a idéia de Deus e do sobrenatural (o termo
«humanista» no séc. XVI significava o estudioso que se con-
sagrava as letras humanas em oposicáo as letras sagradas ;
veio a designar mais tarde aquéle cuja filosofía girava toda
em torno do homem).
— 319 —
Por tal vía, mais e mais se foi afirmando o subjetivismo
religioso, concorrendo para criar a atmosfera de relativismo
ou ceticismo em torno do sobrenatural, relativismo que muito
caracteriza os tempos presentes.
— 320 —
claro que tais medidas só podiam concorrer para desvirtuar a
piedade e o vigor da vida crista.
Note-se outrossim que, em reagáo contra os desmandos
da Filosofía e das heresias, a teología católica, a partir do
séc. XVI (Ps. -Reforma luterana), se tornou acentuadamente
apologética; o que quer dizer: aplicou-se a defender as teses
dogmáticas e as práticas de culto do Catolicismo mais do que
a manifestar o seu conteúdo rico e vital. Disto resultou que
algumas verdades centráis da fé crista foram sendo menos
focalizadas pelos eruditos e menos explicadas ao povo, en-
quanto os temas controvertidos, muitas vézes periféricos ou
pouco fecundos para a piedade, eram tongamente explanados.
— 321 —
seu primeiro impulso ao Concilio do Vaticano (1870), o qual
rejeitou de maneira perentoria as duas tendencias que atrofia-
vam a teología e a vida católicas :
— 322 —.
Escrevia ainda o Pontífice em 1905: «Já que nosso mais vivo
desejo é que o verdadeiro espirito cristáo volte a florescer de todos
os modos e permanega em todos os fiéis, é necessário prover, antes
do mais, á santidade e á dignidade do templo, onde os fiéis se reunem
justamente para sorver tal espirito em sua fonte primeira e indispen-
sável, isto é, na participagáo ativa nos santos misterios assim como
na oracáo- pública e solene da Igreja» (Pii PontificisMaximi Acta.
Roma 1905, 7T).
Como sugerem, estas palavras do Santo Padre,
— 323 —
um dos setores prediletos da critica racionalista, que desvir-
tuava o conteúdo sobrenatural do Livro de Deus ; a fim de
preservar tal patrimonio e dá-lo como alimento substancioso
ao povo cristáo, Pió X criou o Pontificio Instituto Bíblico
em Roma.
4) Por fim, ao mesmo Pontífice se deve .também a reno
vado da catequese ou dos métodos de ensinar a doutrina sa
grada. O Santo Pontífice desejava fóssem estes métodos mais
influentes na vida dos discípulos; as suas exortagóes desper-
taram a atencáo de benemérita serie de mestres, que até nos-
sos dias se esforcam por aplicar os recursos da psicología e
da pedagogía modernas á transmissáo da Palavra de Deus.
Eis, em rápido esbógo, quanto se deve á atividade de S.
Pió X em favor da renovacáo crista.
— 324 —
em se trocar urna tradicáo recente, circunstanciada pelos fatores
contingentes de determinada época, por outra tradicáo mais antiga,
nao condicionada por elementos contingentes, mas ditada diretamente
pelas íontes e pela estrutura mesma do Cristianismo; qualquer revi-
goramento da cristandade só pode consistir era continuar a mais
genuina tradicáo ou a mais genuina das modalidades da Tradicáo
(está claro que nao de maneira mecánica, mas de modo plástico,
adaptado, sem desvirtuamento, ás circunstancias da época em que
vivem os cristáos).
— 325 —
suas notas típicas, que vém a ser as notas da própria piedade
oficial da Igreja. Ei-las :
1) RELIGIÁO, primariamente e por excelencia, é LOU-
VOR DE DEUS. Sao Paulo lembra aos Efésios (1,6) que o
homem foi criado «para louvar a magnificencia da grasa de
Deus». Isto quer dizer que a criatura humana só se realiza
plenamente devotando-se ao Criador ou ultrapassando-se a si
para procurar viver em Deus e de Deus; é servindo a Éste
que o homem reina.
— 326 —
Ef 2,18). O dogma da SSma. Trindade, geralmente explanado
em termos metafísicos ou abstratos. é dogma muito íntimo e
significativo para a vida de cada cristáo.
— 327 —
Com a participagáo da S. Missa está ligada a estima do ciclo
litúrgico e do domingo. A Sta. Sé tem remodelado as rubricas do
Missal e do Breviario, intencionando dar maior realce á celebracáo
dos grandes temas da Redencáo: Advento (preparacáo para a vinda
do Redentor), Natal, Epifanía, Quaresma, Paixáo, Morte, GlorificacSo
do Senhor e Pentecostés. O percurso destas etapas dá moldura
característica á celebracáo da S. Eucaristía, imprimindo modalidades
próprias á piedade da Igreja. É desejo da autoridade eclesiástica que
estes aspectos sucessivos se impregnem na mente dos fiéis, inspirando
a oracáo coletiva e particular dos mesmos. — Quanto aa domingo,
dia do Senhor, os cristáos bem formados procuram valorizá-lo como
verdadeiro dia de renovacáo espiritual, renovacáo decorrente em
primeira linha, da participagáo da S. Eucaristía.
— 328 —
gelho; incutam, antes do mais, a nocáo daquilo que o cristáo é,
facam ver donde ele recebe a sua verdadeira vida e em que realidade
grandiosa (o Cristo Místico) ele está enxertado, para depois, de
maneira orgánica, deduzirem normas de conduta moral. O Santo
Padre Pío XII, em urna de suas alocucSes pastarais de 1952, veriíicava
o triste fato de que, «confundindo o Cristianismo com um código de
preceitos e proibicóes, os jovens (de nossos tempos) tém a impressáo
de estar sufocados nesse clima de 'moral imperiosa1, de sorte que
nao sao poucos aqueles que atiram para longe tao incómoda bagagem»
(Acta Apost. Sedis 44 [1952] 413).
Nao concorram os pregadores e catequistas para que se multi-
pliquem os dolorosos casos mencionados por Pió XII; procurem, antes,
debelá-los mediante a acentuagüo do que há de central e positivo no
Cristianismo!
— 329 —
Nao há, alias, oposicao (como talvez outrora se julgasse) entre
«piedade objetiva» (a piedade da oracáo pública e litúrgica) e «piedade
subjetiva» (a piedade de inspiracáo pessoal particular);, embora reze
em comum, o cristao deve orar de maneira consciente, isto é, exercendo
sua fé e sua caridade pessoais; a comunidade crista é comunidade.de
pessoas, e nao dissolucáo de individuos em um todo amorfo. Ademáis
a oracáo litúrgica, a qual goza da excelencia de prece oficial da
Igreja, ficaria destituida de sua plena eficacia ñas almas, se nao
fdsse preparada e assimilada pelas práticas da meditacáo e da oracáo
particular. Eis como a respeito se exprime o S. Padre Pió XII na
ene. «Media tor Deb:
«Indubitávelmente a prece litúrgica, sendo a súplica da excelsa
Esposa de Jesús Cristo, supera as oracSes privadas por sua exce
lencia mais elevada. Mas esta excelencia superior nao quer de algum
modo dizer que essas duas especies de oracáo divirjam entre si ou
se oponham. Como sao animadas por um só e mesmo espirito,
caminham na mesma direcáo e se íundem urna com a outra...
procuram o mesmo destino até que em nos se forme o Cristo (cf.
Gal 4,19)».
A título de ilustracáo, vai aqui citado o testemunho de urna
Religiosa franciscana recentemente beneficiada por um aspecto da
volta as fontes, ou seja, pela leitura da Biblia em comunidade :
«Outrora eu tinha minha piedadezinha particular (ma petite. piéié
partículiere). Nao há dúvida, havíamos recebido bons principios para
alimentar nossa vida espiritual; agora, porém, que nos aplicamos á
Biblia, meu horizonte é mais vasto. Vejo melhor a Igreja inteira,...
o Carpo Místico, o designio de Deus. Minha piedade tomou sentido
comunitario. É coisa bem diferente (c'esttoutautrechase)» (depoimento
publicado em «Vie Spirituelle». Supplément 33, máio 1955, pág. 234).
— 330 —
cristáo nao o faga como o náo-cristáo, mas até por essas vias
dilate o Reino de Deus na térra. — Convém, pois, que os fiéis
récorram, e recorram conscientemente, aos sacramentáis.
7) Por último, acrescentar-se-á que a volta as fontes
impele o cristáo a procurar adquirir urna cnltura religiosa cada
vez mate sólida. A piedade é tanto mais profunda, tanto me
nos sujeita as aberragóes da fantasía, do sentimentalismo ado-
cicado ou da falsa mística, quanto mais é nutrida pela Ver-
dade. O cristáo deve esforgar-se por aprofundar a Palavra
de Deus (referida tanto ñas Escrituras como na Tradicáo
oral), fazendo uso dos meios (leituras, práticas, cursos) que a
Providencia Divina Ihe ponha ao alcance. Nao julgue que tal
aprofundamento deva ser privilegio de determinados grupos
(clérigos, Religiosas, núcleos especializados de Agáo Católi
ca...) ; também nao rejeite, em nome de falsa humildade,
urna boa formagáo dogmática, moral e bíblica, ministrada de
acordó com a sua respectiva capacidade. Sta. Teresa de Avila
muito prezava o valor de boa cultura teológica para o pro-
gresso na vida de oragáo !
Eis, em sintese, as grandes linhas que caracterizam a
robusta espiritualidade haurida ñas fontes perenes do Cristia
nismo. Conscientes do insubstituível valor dessa espirituali
dade, e atendendo á voz da Sta. Igreja, os fiéis mais e mais
se esforgaráo para que tais tragos se imprimam profundamente
em sua praxe religiosa !
m. SAGRADA ESCRITURA
PESQU1SADOR (Niteroi) :
— 331 —
lugar ou «berco», tem-se o poligenismo monofilético (phylon = tronco,
ramo, em grego). Dado que, ao contrario, se afirme ter o género
humano aparecido em varias estirpes independentes urnas das outras
e em diversos lugares ou «bercos», professa-se o poligenismo polifi-
lético. Donde se vé que o monogenismo sempre sup5e monoíiletismo;
o monofiletismo, porém, nao acarreta necessáriamente monogenismo.
Resumindo, tem-se a seguinte tabela :
poligenismo: muitos ca
sáis a constituir um
só tronco.
Monof¡Ictismo : um tronco (populacho)
monog-enismo: um só ca
originario
sal a constituir o
único tronco origina
rio do género hu
mano.
— 332 —
A tese poligenista ganhou voga no sáculo passado com a
descoberta de novos fósseis, fósseis que pareciam irredutíveis
a um único principio comum: a nomenclatura atribuida a tais
ossadas insinuava mesmo que pertenciam a especies humanas
diferentes da nossa (dita «homo sapiens») ; assim falaVa-se
(e fala-se) do «homo capensis», «homo kanamensis», «homo
steinheimensis», «homo modjokertensis», «homo helmei», etc.
— Das ragas atuais, havia quem reduzisse a branca ao chim-
panzé, a amarela ao orangotango, a negra ao gorila...
3. A posicao da fé crista
— 333 —
Em agosto de 1950, quando já ardia a controversia, ba-
seada em numerosos dados paleontológicos, o S. Padre o
Papa Pió XH voltou ao assunto, publicando a encíclica «Humani
generis», da qual interessa aqui a seguinte passagem:
— 334 —
dentes do poligenismo ou do polifiletismo. A tais pessoas dir-
-se-á que a fé, restringindo o campo de suas declaragóes a
Adáo e seus descendentes, deixa margem a que se admitam
muitos individuos humanos de troncos diferentes (polifiletis-
mo), contanto que se afirme a sua extingáo por ocásiáo do
aparecimento de_Adáo. Ora os dentistas nao tém dificuldade
em reconhecer que certos tipos de viventes desaparecerán! após
determinada evolugáo ; do seu lado, a Igreja nunca inten-
cionou precisar a época em que Adáo tenha vivido (a respeito
da aparente cronología dos primordios biblicos, veja-se «P.R.»
17/1959, qu. 5). Na base destas consideragóes, vé-se- que
mesmo aos mais ardorosos defensores do" poligenismo nao é
impossível a conciliagáo com a doutrina católica.
_ 335 _
enviado a éste mundo na qualidade de novo Principio de vida
para os demais : é o Cristo Jesús. Sendo assim, toda a ideología
crista gira em torno dos dois eixos: Adáo e Cristo, duas figu
ras com as quais o género humano inteiro é solidario, ora
para a morte, ora para a ressurreigáo. Alias já Sao Paulo
delineia o paralelismo entre Adáo e Cristo, em Rom 5,12.17-19;
1 Cor 15,21s. — Ora, assim como nao se pode entender o
segundo homem, Cristo, no sentido de urna coletividade, assim
também nao o primeiro; trata-se de dois individuos que, por
sua obra pessoal, transmitem respectivamente morte e nova
vida ao género humano. Daí a incompatibilidade do polige-
nismo com a doutrina católica. Esta, de resto, funda a sua
posicáo monogenista ainda em outros textos bíblicos como
At 17 26 : «De um só (homem) fez (Deus) todo o género humano,
para que habite sobre a face da térra», declara Sao Paulo no Areópago
de Atenas.
Sab 10,1: «Foi a Sabedoria que guardou o primeiro homem, for
mado por Deus para ser o pai do género humano, o único criado».
Por sua vez os capítulos 2 e 3 do Génesis insinuam que Adáo e
Eva eram dois individuos, um único casal. Assim o autor sagrado
observa que o homem estava só, e Deus nao o queria deixar solitario,
pelo que decretou íazer-lhe u'a mulher condigna (v. 2,18) ¡entre os
animáis existentes, nao se encontrava nenhum da mesma dignidade
que Adáo (v. 20) ; por conseguirte, Deus formou tal auxiliar con
digna • vendo-a. Adáo logo reconheceu que era da mesma natureza
aue élé (w 21-23); «estavam ambos ñus, AdSo e sua esposa, sem que,
?or teto se enrubescessem» (v. 25). Finalmente em 320 o autor refere
ter Adao dado á sua esposa o nome de Eva (= «vida» ou «vívente»,
em hebraico), «pois que se tornou a máe de todos os viventes».
— 336 —
2) O género humano, diziam os monofiletistas poligenistas, pro-
vém de um só tronco, que compreendia muitos casáis ; todos estes se
associaram num único pecado coletivo.
Esta hipótese salvaguarda melhor a unidade do pecado original;
supSe, porém, os pecados pessoais de muitos varSes a concorrer para
a realizacáo do' pecado coletivo, a que contraria á doutrina de que o
pecado da origem é o pecado de um só varáo — Adao. Além disto,
tal hipótese dá a entender, como a anterior, que o primeiro pecado
era inevitável.
Sendo assim, um terceiro grupo de autores preferiu asseverar que
3) O género humano constava de muitos casáis, sim. Mas um só
déstes pecou. Contudo quis Deus responsabilizar todos os demais in
dividuos, embora nao tenham pecado.
Neste caso Deus haveria cometido injustiga, pois teria atribuido
arbitrariamente urna culpa a individuos que nao haveriam pecado
nem haveriam herdado urna natureza humana pecaminosa.
Em conseqüéncia, nao se vé como conciliar o poligenismo com a
doutrina do pecado original. Esta, como foi dito atrás, ensina que os
primeiros pais cometeram um pecado único, o qual se transmite aos
descendentes de Adao e Eva por via de geracáo; é justamente por
herdarem a natureza humana destituida dos dons paradisiacos que
deveriam ter, que os filhos de Adáo aparecem disformes aos olhos
de Deus, ou seja, contaminados pela culpa original.
— 337 —
(os principios de identidade, de contradigáo, de causalidade...);
possuem o mesmo senso inato de pudor, proferem a mesma
linguagem instintiva, agem segundo as mesmas tendencias á
verdade, ao bem e ao belo, desenvolvendo de maneira uniforme
a sua civilizácáo e industria ; ñas mais diversas regi6es, os
horiiens recorran aos mesmos tipos de instrumentos, variando
apenas a materia com que os confeccionam; ainda recente-
mente descobriram-se na Australia e na África do Sul indi
viduos que vivem isolados do mundo, mas utilizam instrumen
tos absolutamente idénticos aos que foram encontrados ñas
carnadas mais remotas da idade da pedra.
Ora, se todos os individuos humanos constituem um só
«syngámeon» ou urna só especie, é lógico admitir que essa
especie tenha um só «bergo» ou se derive de um só tronco,
pois a ciencia verifica que cada especie de viventes possui um
único lugar de origem, donde aos poucos se foi difundindo sobre
a térra, por migragóes (daí a nomenclatura da botánica e da
zoología). É o que incute o monofiletismo humano, tornando
de todo improvável o polifiletismo (varios troncos na origem
do género humano) e a oiogénese (surto simultáneo dos homens
em diversas regióes do globo, a semelhanga de gotas de geada).
Contudo poder-se-ia objetar: encontraram-se fósseis hu
manos assaz diferentes uns dos outros, dentro, porém, do
mesmo período geológico; sao fósseis tidos como contempo
ráneos entre si, mas aparentemente independentes uns dos
outros. Nao insinuaráo o polifiletismo? — Em resposta, far-se-á
observar que muito relativa é a contemporaneidade désses
fósseis: cada um dos períodos geológicos em que se situam,
compreende dezenas ou centenas de milenios; ora bastam
apenas algumas dezenas de séculos para que urna especie de
viventes emigre do seu bergo de origem e se propague pelo
globo, sofrendo os conseqüentes fenómenos de adaptagáo, evo-
lugáo ou degenerescencia. E, note-se bem, tal prazo (dezenas
de séculos) escapa á observagáo experimental dos geólogos;
urna diferenga de cinco ou seis mil anos entre estrados da
térra já nao pode ser verificada, tendo que ser negligenciada
(a Paleontología nao saberia dizer se o sinántropo de Pequim
e o homem de Kanam na África, pertencentes ao pleistoceno
inferior, foram contemporáneos entre si; nao se pode deter
minar em que termos o pleistoceno inferior da África cor
responde ao pleistoceno inferior de Fequim e ao da Inglaterra).
Em conseqüéncia, os geólogos sao obrigados a dar por estratí-
graficamente contemporáneos fósseis que outrora existiram
á distancia de alguns milenios uns dos outros !
— 338 —
2) Urna vez admitido o monofiletismo, a ciencia nao
pode diretamento provar o monogenismo, mas também nada
tem a lhe objetar.
O fenómeno que mais voga dá ao poligenismo, é a exis
tencia das diversas racas humanas, que a alguns observadores
parecem irredutiveis a um só casal primordial.
Pois bem; levem-se em conta os elementos que explicam
a diversificacáo das ragas.
Esta se deve nao sómente a fenómenos de adaptacáo do
individuo as diversas circunstancias de clima, alimentacáo, tra-
balho, etc., fenómenos que em geral se processam lentamente,
supondo sempre número relativamente grande de sujeitos. As
divergencias raciais se elucidam outrossim por um fator que
só recentemente tem sido estudado: o mutacionismo, isto é,
modificacóes ocorridas nos genotipos, portante no período
embrional do individuo, as quais motivam variagáo brusca e
hereditaria da especie. Ora sabe-se que tais «mutacóes» se
realizam em número restrito de individuos da mesma especie
(em urna ninhada grande, os individuos imitantes sao «indi
viduos raros») ; é o que torna bem compreensível a tese de
que numa carnada numerosa de antropoides o Criador haja
determinado infundir a dois apenas (um casal) urna alma in
telectiva, humana, dando a ésses antropoides (seres até entáo
nao humanos) os caracteres essenciais da natureza humana
e fazendo que entáo comegasse urna estirpe muíante, a estirpe
humana, da qual, por via de monogenismo, procede o género
humano atual. Segundo as leis de Mendel referentes á here-
ditariedade, um novo tronco (phylon) de viventes pode ter
origem por combinacáo de cromosomas, nao sómente a partir
de pouquissimos, mas até a partir de um só individuo. Longe,
portante, de contradizer as ciencias naturais, o monogenismo
professado pela fé crista é de certo modo ilustrado por estas.
— 339 —
porgáo de materia destinada a ser corpo humano é algo que
a geología e os fósseis nao registram, por conseguinte algo
que ficará sempre subtraído á observagáo dos dentistas.
Eis as. razóes pelas quais o cristáo professa o monogenismo
do género, humano, sem receio de estar errando ou mesmo de
estar destoando das expressóes mais -abalizadas do saber con
temporáneo.
A propósito cí. E. Bettencourt, Ciencia e Fé na historia dos
primordios (ed. AGIR), cap. VI.
N. T. (Distrito Federal) :
— 340 —
A conclusáo, porém, basear-se-ia no absoluto desconheci-
mento do conteúdo e do estilo do texto bíblico.
Com efeito. Demonstremo-lo por passos. .
a) A Escritura mesma refere que Adáo e Eva tiveram
numerosos filhos e filhas :
— 341 —
por seu lado, o bloco Gen 5,1-32 é também um documento com
pleto em si mesmo (apresenta a linhagem dos descendentes de Adáo):
ao íalar do primeiro varáo, recapitula alguns tragos salientes da vida
déste, dizendo entáo que gerou muitos íilhos e filhas, sem que, po-
rém, o autor désse documento pensasse em relacionar tal traco com
os episodios que se encontram relatados no cap. 4 do Génesis.
— 342 —
irmáos nos tempos de Caím simplesmente nao estavavém vigor.
Mais tarde, no séc. XIII antes de Cristo, quando já era
numerosa a.populagáo do globo, o matrimonio de irmáos com
irmás já acarretava os dois mencionados inconvenientes. Por
isto Moisés, em nome do Senhor, formulou explícitamente a
proibigáo contida no Levítico (20,17). Tal detercninagáo se
cundaria da lei natural já tinha cabimento. Donde se vé que
o Senhor Deus nao caiu, como se diz, em contradigáo, permi-
tindo o casamento de Caím com sua irmá na primeira fase da
historia. Quando variam as circunstancias em que vive o
homem, está claro que podem e devem variar as condigóes
(direitos e deveres) necessárias para que a natureza humana
viva consentáneamente á sua dignidade.
2. O temor de assassínio
AGAELIÉME (Salvador) :
— 343 —
a Conípanhia tomou acentuado caráter de milicia sacra, pronta
a defender os interésses da Esposa de Cristo onde quer que
isto seja necessário. Desde os primordios da sua historia, os
Religiosos de Sto. Inácio se dedicaram ardorosamente as mais
diversas e duras tarefas: magisterio em colegios e Universi
dades, estudos teológicos, controversias com hereges (protes
tantes e jansenistas, principalmente), missóes no Oriente, etc.,
tornando-se inegávelmente beneméritos da fé católica; em
seus institutos educacionais os jesuítas dos séc. XVII/XVIÜ
formaram os filhos da nobreza e da burguesía, exercendo so
bre geracóes e geragóes influencia notável. Um indicio de
quanto a Companhia correspondía as indigencias dos tempos
modernos é a rápida propagacáo da mesma : em 1749 contava
22.600 membros distribuidos por 39 provincias, 669 colegios,
cérea de 800 residencias e 300 postos de missáo. Pode-se citar
também o fato de que ñas familias da Franga do séc. XVIH
se tornaram assaz freqüentes os nomes «Inácio» e «Xavier»,
nomes que até entáo estavam fora de uso.
Entende-se, porém, que a penetragáo dos jesuítas na vida
religiosa e social dos séc. XVI/XVIÜ lhes tenha granjeado,
juntamente com muitos amigos, numerosos adversarios, mor-
mente entre os hereges (jansenistas, galicanos, protestantes)
e incrédulos. Com efeito, os jansenistas e galicanos, desejosos
de constituir igrejas nacionais ou independentes do Sumo
Pontífice, viam nos jesuítas um baluarte da fidelidade á Sé
Apostólica ou «a sentinela avangada da Curia Romana» (no
dizer do rei Frederico II da Prússia) ; consideravam-na por
isto um dos mais tenazes obstáculos á realizagao de seus planos
separatistas. Os filósofos racionalistas e ateus dos séc. XVII
e XVIII, opondo-se simplesmente a Igreja, nao podiam deixar
de combater em primeira linha a Companhia de Jesús: «Táo
logo tivermos destruido os jesuítas, escrevia Voltaire, fácil
será a luta contra a Infame» ; ao que d'Alembert acrescen-
tava: «Os outros (defensores da Igreja) sao apenas cossacos
e grosseiros combatentes, que nao resistiráo as nossas tropas
disciplinadas».
Como se compreende, os conflitos em torno dos jesuítas
também foram por vézes provocados pelo zélo ou pelo espirito
conquistador dos filhos de S. Inácio, que tomaram nao raro
atitudes fortes no seu comportamiento público, entrando con-
seqüentemente em choque com homens e instituigóes.
— 344 —
chineses, a íim de ganhar a sua simpatía e íacilitar-lhes a conversáo
k fé crista: toleravam, por exemplo, o culto do sabio estadista chinés
Confúcio assim como o dos antepassados, alegando que tais práticas
exprimiam apenas civismo nacional ou político, e nao própriamente
alguma profissáo religiosa ; os jesuítas também admitiam fósse Deus
invocado pelos nomes chineses «Tien» (=Céu) e «Schangti» (= Su
premo Senhor, Imperador); omitiam certas cerimdnias do batismo e
da uncáo dos enfermos que pudessem chocar a mentalidade dos abo
rígenes; mitigavam preceitos da Igreja, como os da observancia do
domingo e do jejum ; além disso, obtiveram do Papa Paulo V em 1615
a licenca de celebrar a S. Missa e administrar os sacramentos em lín-
gua chinesa. Nao há dúvida. tais métodos favoreceram considerável-
mente a adesáo do povo á íé crista. — Os Padres jesuítas consentiam
em tais acomodacóes porque, tendo estudado a literatura chinesa e a
origem das práticas características da nacáo, haviam verificado que
certos déstes ritos por si nao eram pagaos, ou seja, inspirados por
falsas concepcoes religiosas, mas apenas interpretados em sentido
supersticioso e pagáo pelo povo ; haviam mesmo averiguado a exis
tencia de um edito imperial que proibia a deferencia de honras divi
nas e de preces a Confüdo ; conseqüentemente os templos confucio-
nistas deviam ser tidos como centros de reur.iñes dos sabios, e nao
como casas de culto. Também as cerimónias chinesas em honra dos
defuntos por si nao constituiam culto religioso, mas apenas demons-
tracoes legitimas de piedade filial para com os antenatos.
Contudo desde os inicios do séc. XVII, fizeram-se ouvir dentro
da Companhia mesma, assim como por parte de missionários francis
canos e dominicanos, vozes de'protesto contra tal.tatica de acomoda-
c5es • esta parecía violar a iritegridade da íé e pactuar com hediondas
supersticSes. A questSo foi em breve levada a Roma, onde o Papa Ino
cencio X resolveu condenar a tolerancia dos principáis «costumes ou
ritos chineses» (1645) ; Alexandre VII, porém, em 1656 permitiu ex
plícitamente aos católicos alguns désses usos, afirmando que podiam
ser tidos tjuais meras fórmulas de civismo nacional. Contudo a con
troversia prosseguiu, alimentada em parte, e de longe, pelos janse
nistas da Franca, qiie, achando-se em fase ascensional, acusavam os
jesuítas de cederem ao laxismo para com as supersticoes chinesas,
assirn como «cediam á frouxidao ao julgarem os pecados de seus pe
nitentes no coníessionário» (sabemos que o jansenismo propugnava
Sessimismo em relagáo á natureza humana e severa dtegPUna de
costumes). De tal modo arderam os debates que entre 1657 e 1700
foram publicados, na Franca apenas, mais de duzentos livros e opüs-
culorsobre o teína das acomodacSes chinesas! Finalmente o Papa
Clemente> XI em 1702 mandou á China, como legado apostólico, o Pa
triarca Tomaz de Tournon, a íim de examinar o caso,; Toumon após
inquérito, resolveu condenar os ritos chineses era 1707, decisao^^esta
que o Sumo Pontífice coníirmou sem demora. A íim de extinguir
definitivamente os motivos do litigio, o Papa em 1715 obrigou os
jesuítas a prestarem juramento de fidelidade &s normas pontificias,
os missionários se submeteram devidamente, amda que^»m o tora»
dilacerado. Mais tarde aínda, em 1742. o Papa Bento XIV, tendo rece-
bido informac6es insuficientes sobre o assunto, publicou nova con-
denacáo da tática das adaptac3es.
A titulo de ilustrac&o, acrescente-se que um juramento de obe
diencia as decisOes pontificias de 1715 e 1742 foi exigido dos missioná
rios na China até 1914. Sómente em 1939 o Papa Pió XII reexaminou
a questáo: em vista das circunstancias da época atual, resolveuper-
mitir aos missionários reconhecessem como legítimas as cerimónias
345 —
chinesas que nao fdssem evidentemente práticas supersticiosas. Mais
ainda: em 1942 o Sto. Padre, reíerindo-se ao decreto de Paulo V
(1615), autorizou a celebradlo da Sta. Missa (excetuado apenas o
Canon ou a parte central da mesma) em idioma chinés literario.
Apesar de tudo que havia de sadio na tátlca das acomodacóes je
suítas na China (as quais, anteriormente á condenagáo pontificia,
também eram praticadas na india por instituicáo do Pe. Nobili S.J.),
tal tática muito excitou os ánimos do público europeu, atraindo sobre
os jesuítas, militantes tenazes como eram, as avolumadas suspeitas
de seus adversarios.
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os governos civis, imbuidos do «filosofismo» da época, desen-
cadearam violenta campanha contra os jesuítas.
A celeuma explodiu em Portugal, justamente pouco depois
que o Papa Bento XIV concederá aos monarcas lusitanos o
título de «Reis fidelíssimos» ! D. José Manoel I (1750-77), so
berano de caráter fraco, tinha por primeiro ministro Sebas-
tiáo José de Carvalho e Mello, Marqués de Pombal, o qual,
educado na Inglaterra (bergo do Huminismo ou racionalismo
do séc. XVIII), estava impregnado de idéias «voltairianas» e
anticlericais; desejoso de restaurar o poder de Portugal
abalado, julgava que nao o conseguiría se nao sufocasse o
prestigio da Igreja e avassalasse o clero. Ora a ocasiáo para
isto lhe foi fornecida por um acordó entre Espanha e Portu
gal (1750), que, deslocando fronteiras ñas colonias da Amé
rica do Sul, fazia passar sob a jurisdigáo de Portugal sete das
«Redugóes» ou cerca de 30.000 indios do Paraguai. Tendo os
aborígenes resistido aos seus novos senhores, os portugueses,
Pombal langou a culpa sobre os jesuítas (1756). Pouco depois
(1758), um atentado contra o rei D. José I na metrópole deu
pretexto a que os Padres da Companhia fóssem acusados de
conspiragáo revolucionaria ; em conseqüéncia, Pombal decre-
tou a supressáo da Sociedáde em Portugal e colonias (1759).
O Papa Clemente XIII tendo levantado protestos contra o ato,
o govérno lusitano, em represalia, despediu o Nuncio residente
em Lisboa. Alguns dos Religiosos jesuítas foram mesmo leva
dos ao tribunal da Inquisigáo, presidido pelo irmáo do próprio
Marqués de Pombal (donde se vé quáo pouco a Inquisicáo era
órgáo do govérno da Igreja naquela época ; cf. «P. R.» 8/1957,
qu. 9). Famosa nessas circunstancias se tornou a figura do
Pe. Gabriel Malagrida S.J., que com oitenta e um anos de
idade foi condenado a morte e langado as chamas como «trai
dor» e «hereje» (1761).
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cia da Franca ; essa especie de autonomía outorgada aos franceses
poderla apaziguar os ánimos dos jansenistas e galicanos; ao que o
Pe. Ricci respondeu rejeitando toda ingerencia do poder civil no go-
vérno interno da Sociedade : «Sint ut sunt, aut non sint!», exclamou
ele, significando qué os jesuítas ou continuariam a ser o que até entáo
haviam sido, sem se desvirtuar, ou prefeririam deixar de existir ! Em
conseqüéncia, o Parlamento decretou a aboligao da Companhia na
Franca (1764). O Papa Clemente XIII protestou contra a medida ; em
vao, porém. A «Filha primogénita da Igreja» rejeitara a Sociedade de
Jesús !
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proceder dos jesuítas, lavrou um decreto disciplinar, revogá-
vel desde que cessassem as infelizes circunstancias de sua
época... (note-se bem : tal decreto era meramente disciplinar,
nao dogmático ; ao contrario, o caso de Henrique VHI a plei
tear divorcio afetava o dogma ; por isto é que a Santa Sé nao
pode transigir com éste monarca, apesar das previsóes de cisma
na Inglaterra). Clemente XIV sentiu-se profundamente aca-
bnuihado pela responsabilidade do ato de extingáo da Compa
nhia, de sorte que, dentro de um ano, aos 22 de setembro de
1774, veio a morrer, consumido pelas preocupagóes mais do
que por achaques físicos. — Carece de todo fundamento a tese
de que o Papa haja sido envenenado pelos jesuítas ; diz-se,
antes, que entre as suas últimas frases havia urna referencia
á supressáo dos jesuítas assim concebida : «Cortei-me a máo
direita!».
O golpe foi duro para a Santa Igreja. Os inimigos da Com-
panhia eram, em última análise, e com poucas excegóes, ini
migos da fé, de sorte que Voltaire, informado da extingáo da
mesma, exclamou com o riso nos labios : «Dentro de vinte
anos, já nao existirá a Igreja !■». Embora a predigáo nao se
tenha cumprido, as lacunas abertas pela retirada dos jesuítas
foram lamentáveis: 800 colegios e 15.000 professóres vieram
a faltar ao magisterio católico, enquanto muitos postos de
missáo em térras pagas pereceram.
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3. As acusagóes c seu fundamento
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setor da Moral, nao deixarei de o repetir, éles foram e ainda
sao os mestres» (carta de 30 de marco de 1756).
A respeito da restrigáo mental e de seus abusos imputados
aos jesuítas, veja-se «P. R.» 18/1959, qu. 6.
Quanto á obediencia apregoada pelos jesuítas, foi mal
entendida, como se reduzisse a personalidade humana a algo
de mecánico. Note-se que a expressáo «obedecer á semelhanga
de cadáver, perinde ac cadáver», com que se costuma caracte
rizar a docilidade dos jesuítas, nao foi criada por S. Inácio, mas
já era usual a S. Francisco de Assis (t 1226) ; trata-se de me
táfora, que, como tal, só exprime um aspecto da realidade: o
discípulo de S. Inácio obedece, sim, com exatidáo e presteza,
sem titubear, imitando nisto menos o cadáver do que o sol
dado sobre o campo de batalha ou o marinheiro a bordo;
tal obediencia, porém, nao deixa de ser inteligente e consciente,
ficando facultado aos súditos, segundo as Regras da Compa
nhia, recorrer a instancias superiores, caso julguem inadequa-
das as ordens que tenham recebido.
Dispensando-nos de descer a ulteriores pormenores, nota
remos que, embora muitas fábulas tenham sido propaladas a
respeito dos jesuítas, a historia nao deixa de registrar fallías
na conduta religiosa e civil de membros da Companhia de
Jesús ; tais males se derivaram da fraqueza moral inerente
a tudo que é humano ; em última análise, nao significan! senáo
que houve na Companhia Religiosos pouco fiéis as suas Regras;
estas, sem dúvida, lhes vedavam, e ainda vedam, cometer o
que surpreendeu e escandalizou a opiniáo pública. O fato de
ter havido transgressores nao permitiria ao historiador obje
tivo concluir que a Companhia de Jesús como tal haja sido
escola de tais abusos nem que ela seja censurável em suas
idéias motrizes ou em seus estatutos. Evidencia-se mesmo o
contrario, se se levam em conta as atividades benéficas — muito
mais vultuosas do que os abusos — que os filhos de S. Inácio
podem apresentar ao mundo como expressáo de seu espirito
ardoroso e disciplinado, «para a maior gloria de Deus» !
CORRESPONDENCIA MIÚDA
DISCfPULA (Rio de Janeiro): V. C. pergunta se é ou nao permi
tido o ensino da S. Escritura por meio da "Biblia em quadrinhos".
Em resposta, vai aqui a noticia de um fato recém-divulgado por
"Noticias Católicas" : a Curia Arquidiocesana de Miláo retirou o "Im-
primatur" (licenca de publicacáo) que dera a urna versáo "gráfica da
Sta. Biblia realizada em quadrinhos. Motivo : os livros do tipo da
"Biblia em quadrinhos" tém sido muito criticados e podem dar lugar a
escándalos.
— 351 —
'■■' -Tal noticia é corroborada pela seguinte : os círculos católicos da
Italia criticaram a sensacionalista apresentacáo, em Veneza, de um
filme tcheco de desenhos intitulado "A criagáo do mundo". Esta película
fof confeccionada com a colaborasáo do caricaturista francés Jean Effel,
o qual publicou outrossim um livro de quadrinhos-earicaturas sobre os
dois primeiros capítulos do Génesis. Os desenhos de Effel propóem o
Senhor Deus como um anciáo calvo, dotado de barbas longas e revestido
de camisola branca, a pairar nos ares e admirar satisfeito o mundo por
file criado — o céu, o sol, Adáo e Eva... O demonio ai aparece em seu
tipo zombeteiro, com chifres e cabeleira, procurando com embustes reno
vados perturbar a obra de Deus. O "Osservatore Romano", diario oficial
da Cidade do Vaticano, publicou a propósito o seguinte comentario : "O
filme .(exibido em Veneza) tem por conseqüéncia prática tornar grotes
cos objetos do ridículo a Sagrada Escritura e, indiretamente, o próprio
Deus". O jornal "Avanti" de Roma, por sua vez, observava amargamente
que a película servia para ridicularizar a Relig.ifio.
Ésses episodios sao altamente significativos. Nao nos permitiriam
concluir que a autoridade da Igieja condene o uso de .imagens ilustrati
vas no ensino da Escritura Sagrada, mas acautelam os fiéis contra o
emprégo désse tipo de gráficos que sao os quadrinhos. E isto, por dois
motivos :
1) Os quadrinhos concorrem para equiparar a historia sagrada as
modalidades de historia fantasista ou sensacionalista que costumam ser
reproduzidas por tal género de publicidades ; o aspecto "caricatura" tende
ai a suplantar os demais, provocando fácilmente detui'pasáo e escándalo,
mesmo que o desenhista procure ser sobrio.
2) Agora o que talvez seja mais importante : em vez de formar,
os quadrinhos deformam a mentalidadé dos observadores. Sim ; íneutem
apenas a face externa, antropomórfica, dos episodios bíblicos (e a in-
cutem com tragos marcantes, ás vézes exagerados), debcando de lado
a mensagem religiosa da página sagrada e dando a entender de certo
modo que o ensinamento da Biblia é simplesmente o que se encontra. na
sua roupagem externa. Ora justamente a doutrina religiosa visada por
ésse aparato externo é que deveria ser, em primeiro lugar e ácima de
tudo, acentuada no ensino da historia sagrada ; cf. "P. R." 18/1959,
qu. 4 e 5. — O significado profundo das cenas bíblicas deverá ser ex-
presso nao por desenhos com tendencias realistas e teatrais, mas antes
por gráficos e esquemas, nos quais o caráter típico (teológico) dos epi
sodios e as etapas do designio salvífico de Deus podem ser debidamente
representados (possibilidade esta que os quadrinhos, reproduzindo apenas
a letra ou a face humana do texto sagrado, nao oferecem). Recomenda-se
em geral, na iconografía sagrada, o uso de imagens sobriamente estili
zadas que representen! a "transparencia" ou o caráter alusivo (que as
vézes é muito rico) dos episodios bíblicos.
ROSA-FLOR (Sao Paulo): O caso tem solucáo. Queira consultar
de viva voz um sacerdote.
ESTUDANTE DE SOCIOLOGÍA (Rio de Janeiro): Os orientáis
cismáticos admitem o divorcio em caso de adulterio, como se fSsse per
mitido por Jesús em Sao Mateus 5,32 e 19,9 (donde o nome de "privile
gio de S. Mateus" dado a éste uso). Na verdade, o Senhor concede apenas
a separagao (desquite), condenando segundas nupcias enquanto os dais
cónjuges desquitados estejam em vida. Hoje em dia os estudos filológicos
levam a ler em Mt 5,32 e 19,9 : "... a nao ser em caso de uniáo ilícita",
o que remove toda dúvida exegética e teológica. Maiores explicacóes se,
t^ER." 7/1959, qu. 6. - -
D. ESTÉVAO BETTENCOUBT O. S. B.