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Projeto

PERGUNTE
E
RESPONDEREMOS
ON-LIN-E

Apostolado Veritatis Spiendor


com autorizagáo de
Dom Estéváo Tavares Bettencourt, osb
(in memoriam)
APRESENTAQÁO
DA EDIpÁO ON-LINE
Diz Sao Pedro que devemos
estar preparados para dar a razáo da
nossa esperanga a todo aquele que no-la
pedir (1 Pedro 3,15).

Esta necessidade de darmos


conta da nossa esperanca e da nossa fé
hoje é mais premente do que outrora,
visto que somos bombardeados por
numerosas correntes filosóficas e
religiosas contrarias á fé católica. Somos
assim incitados a procurar consolidar
nossa crenga católica mediante um
aprofundamento do nosso estudo.

Eis o que neste site Pergunte e


Responderemos propóe aos seus leitores:
aborda questóes da atualidade
controvertidas, elucidando-as do ponto de
vista cristáo a fim de que as dúvidas se
dissipem e a vivencia católica se fortalega
no Brasil e no mundo. Queira Deus
abengoar este trabalho assim como a
equipe de Veritatis Splendor que se
encarrega do respectivo site.

Rio de Janeiro, 30 de julho de 2003.

Pe. Esteváo Bettencourt, OSB

NOTA DO APOSTOLADO VERITATIS SPLENDOR

Celebramos convenio com d. Esteváo Bettencourt e


passamos a disponibilizar nesta área, o excelente e sempre atual
conteúdo da revista teológico - filosófica "Pergunte e
Responderemos", que conta com mais de 40 anos de publicagáo.

A d. Esteváo Bettencourt agradecemos a confiaca


depositada em nosso trabalho, bem como pela generosidade e
zelo pastoral assim demonstrados.
161 3Q OHNfir OS I íN — IIIX Ol
*T VIXtOlMfí
vNizunog
índiice

Pág.

O SÍMBOLO DO CORACÁO 241

Sinal verde ?

CONGELAMENTO DE ORGANISMOS E ESPERANCA HUMANA 244

Um fenómeno de nossos dias:

CONTESTAQÁO NA IGREJA : LEGAL OU NAO ? 252

Duas op?óes:

VIOLENCIA OU EVOLUQÁO PACÍFICA ? 265

Op?áo intermediaria :

E A NÁO-VIOLÉNCIA ATIVA ? 279

RESENHA DE LIVROS 287

COM APROVACÁO ECLESIÁSTICA


O SÍMB>té=r©0 CORAgAO
Segundo antiga concepgáo popular, o coragáo é a sede dos
afetos humanos: amor, compaixáo, odio... Por isto na lingua-
gem cotidiana ouve-se falar de pessoas que tém bom coragáo
ou que parecem ter coragáo empedernido. A Biblia, escrita em
ambiente judaico antigo, compartilha esse modo de ver: chega
a falar dos «pensamentos do corasáo de Javé, voltados para o
bem do seu povo» (SI 32,11.18).

Os cristáos, por sua vez, acostumaram-se a venerar o Co


ragáo de Jesús. Esta atitude presta-se a equívocos, podendo
mesmo ser desenvolvida em linha sentimental c pouco cons-
trutiva. — Que significa, pois, a expressáo «Coragáo de Jesús»?

Diz a Escritura que «Deus é amor» (1 Jo 4,8). Esse amor


concebeu e amou desde toda a eternidade cada urna de suas cri
aturas. Visto que em Deus nada comeca (em Deus nao há pas-
sado, presente e futuro), Deus jamáis comecou a conhecer e
amar tal ou tal criatura. Posso mesmo dizer que Deus nunca
existiu sem me conhecer e amar,... Deus nunca existiu sem
mim (isto é, sem me contemplar e querer bem).

Esse amor eterno do Criador quis, na plenitude dos tempos,


compartilhar a sorte do homem. Deus se fez homem, de modo
que o amor eterno do Senhor comecou a pulsar num coragáo
humano; experimentou os afetos da natureza sensível do ho
mem (alegrías, tristezas, abandono, decepgóes e consola-
g5es...), a fim de santificar de novo modo a natureza, a vida
e a historia dos homens.

O Coragáo de Jesús vem a ser, pois, o testemunho concreto


desse amor que criou o homem no principio e o re-criou ou res-
taurou na plenitude dos tempos. Esse coragáo pode ser tido
como um símbolo visível de todo o plano de Deus, que abrange o
céu, a térra e todos os tempos. Nele o cristáo vé significadas a
proximidade e a veeméncia do amor divino.

É de notar que o surto da devogáo oficial ao Coragáo de


Jesús tem suas premissas imediatas no século XVII. Este perío
do da historia da Igreja foi, em grande parte, influenciado pelo
jansenismo — corrente que apregoava o temor de Deus mais
do que o amor; exigindo dos fiéis urna pureza estoica, anterior
á graga de Cristo, afastava de Deus os cristáos; estés jamáis

— 241 —
sentiriam a coragem de se aproximar ido Senhor, de mais a
mais que Cristo nao teria morrído por todos os homens, mas
apenas por urna parte deles (o Crucifixo esculpido pelos jan
senistas tinha os bracos verticalmente voltados para o alto,
abarcando tima faixa pequeña de homens, e nao os bracos es
tendidos para o alto, abrangendo toda a humanidade). Foi
precisamente nessa época que Jesús Cristo se manifestou, os
tentando o seu coragáo aberto, a S. Margarida-Maria Alacoque,
monja do Mosteiro da Visitagáo em Paray-Le-Monial (Franga)
nos anos de 1673-1675 1. Jesús apresentava á santa o seu cora
gáo humano como sendo o símbolo mais compreensível e elo-
qüente do amor de Deus, que é o grande inspirador e autor de
tudo quanto existe. Nenhuma criatura — seja irracional, seja
humana — veio a ser e subsiste se nao por efeito do amor. E
esse amor de Deus é irreversível; ele jamáis se retrata, pois
em Deus nao há mudanga; Ele jamáis dirá Nao depois de haver
dito Sim. Pode a criatura desviar-se do Criador e atolar-se nos
caminhos mais lamacentos da vida presente, sem que, por isto,
o amor de Deus se modifique para com ela. A mensagem de
Jesús que apontava para o seu coragáo, vinha a ser «um sorriso
de Deus» aos homens, tencionando despertar confianga, otimis-
mo e amor nos cristáos enrijscidos pelo rigorismo e o abatimen-
to. O Cristianismo significa essencialmente confianga inesgotá-
vel no irreversível amor de Deus; nao há situacáo moral táo
degradante e ignóbil que nao encontré, da parte de Deus, o
remedio e a salvagáo oferecidos a todos aqueles que Ihe apre-
/ sentem um coracáo arrependido e humilde. Sao palavras do
Senhor proferidas através do profeta Oséias: «Como poderia eu
abandonar-te, ó Israel?... Meu coragáo se revolve dentro de
mim; eu me comovo de dó e compaixáo. ... Porque sou Deus
e nao homem, nao gosto de destruir» (Os 11, 8s).

A mensagem do Coracáo de Cristo conserva plena atualida-


de mesmo em nossos dias que repudiam o sentimentalismo va-
zio. Quando os homens se debatan á procura do amor, podem
estar certos de que o Amor existe, e existe divinamente, isto é,
irreversivelmente... para todos aqueles que o queiram invocar!

E.B.

'As revelacSes de Cristo a S. Margarlda-Marla nfio constltuem artigo


de fé, pois sao revelacoes particulares. Inegavelmente, porém, esta santa se
tornou instrumento do despertar de nova forma de pledade entre os crlstSos.

— 242 —
..DE FE COMO DE PAO, ÁGOA OD AR
"Para a pergunta de Pdncio Pilatos: 'Que é a verdade ?',
o homem jamáis esteve táo perto de encontrar urna resposta

quanto através da ciencia. Pessoalmente, creio na Vitoria

derradeira da verdade. Creio que, na medida em que eres-

cerem nossos conhecimentos da natureza, nao somente che

garemos a descobertas científicas universalmente aceitas,

mas também chegaremos a um conjunto de regras e modelos


de comportamento humano universalmente reconhecidos.

Os materialistas do século XIX e seus herdelros marxistas

do século XX nos dizem que o progresso do conhecimento


científico do universo nos permite dispensar-nos da fé em
um Criador. Mas até agora qualquer resposta nova trouxe

também novas interrogacdes. Quanto melhor compreendemos


a complexidade da estrutura do átomo, a natureza da vida
ou o curso das galeotas, mais encontramos razóes para nos
maravilharmos diante dos esplendores da criagáo divina.

Mas a nossa necessidade de Deus nao está fundada ape

nas sobre o recelo. O homem precisa de fé como precisa


de pao, de agua ou de ar.

Com toda a ciencia do mundo, nos precisamos de crer


em Deus, visto que a nossa fé em nos mesmos já atingiu os

seus limites".

Wernher von Braun


Subdiretor adjunto da N.A.S.A.

— 243 —
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS»
Ano XIII — N* 150 — Junho de 1972

Sinal verde ?

congelamento de organismos
e esperanza humana

Em sintese: Genoveva de la Poterie, aos olto anos de Idade, faleceu


de cáncer renal em Janeiro de 1972. Seus país haviam-na levado do Canadá
aos Estados Unidos, para que, em caso de morte, fosse submetlda ao con
gelamento do organismo. Isto se deu, de modo que Genoveva está clínica
mente morta, mas guardada debaixo do gelo, á espera do día em que
a medicina lera descoberto o remedio para o cáncer; nesse hipotético día,
a menina será reativada e, como se eré, poderá recebar o tratamento ade-
quado. Já outros pacientes tém sido congelados na expectativa de possfvel
recuperagao em época futura.

Que diz a conscléncia crista a respeito?

Nao se trata de ressuscltar mortos proprlamente ditos. Com efeito, a


medicina distingue entre morte clínica e morte real; mesmo depols que
cessem as pulsaedes cardiacas e a respiracáo, o organismo pode estar em
coma e ser sede da vida e da alma humana por algumas horas mals, pois
a deteriorado dos tecldos so se dá paulatinamente; jé houve casos de
reanimagáo de pacientes tidos como clínicamente mortos e guardados em
cámara mortuoria. — Por conseguinte, os médicos, congelando o organismo
clínicamente morto, vlsam apenas a impedir a decomposlcáo do mesmo.
A alma humana continua entáo presente nesse corpo, embora de modo
latente. Caso um dia se queira descongelar o organismo, poderá talvez ser
beneficiado por tratamento adequado.

A moral crista nao se opoe a tal processo; este nSo constituí arrogan
cia por parte do homem, mas uso do dominio que Deus concedeu ao ser
humano sobre a natureza; aos dentistas cabe aliviar as sortes da huma-

— 244 —
CONGELAMENTO DE ORGANISMOS

nidade, conlanto que respeltem a dignldade humana; a morte jamáis será


debelada por completo. — É para desojar, porém, que a congelado nao
seja aplicada sem o consentlmento do paciente ou, ao menos, dos geni
tores (ao se tratar de criangas).

Comentario: Os jomáis noticiaram no inicio de 1972 o caso


de Geneviéve de la Foterie, menina día oito anos de idade,
que, vítima de cáncer renal, morreu e foi congelada na expec
tativa de que um dia a medicina disponha de recursos para
curar tal molestia. O caso de Genoveva nao é o primeiro nos
tempos atuais; existem mesmo setores da medicina que se dedi-
cam exclusivamente ao estudo do assunto e ao tratamento pela
congelagáo: sao a criobiologia e a crioterapia (kryos, gelo, em
grego).

A experiencia empreendida com Genoveva e outras congé


neres tém suscitado o interesse do público pelo que apresentam
de novo e audaz; o vocabulario empregado pelos noticiarios res
pectivos é ambiguo. Em conseqüéncia, muitas pessoas interro-
gam: tais tratamentos nao significam arrogancia da parte do
homem, que pretende deter a morte a qual Deus o quis subme-
ter? Pode a ciencia ousar ressuscitar cadáveres? Será lícito obri-
gar um paciente a viver num futuro incerto, quando as circuns
tancias ambientáis seráo totalmente outras?

É a estas questóes que nos propomos dar atengáo ñas pá


ginas seguintes.

1. Que houve com Genoveva ?

1. Guy de la Poterie, cidadáo canadense com 36 anos de


idade, é o pai de Genoveva. Com sua esposa Pierrette, morava
em Montréal, quando verificou que sua filha padecía de cáncer.
Após haver recorrido a varios processos para salvá-la, resolveu
por último apelar para o Dr. Robert F. Nelson, presidente da
«Cryonics Society» da California (E.U.A.). Levou, pois, a me
nina para Los Angeles, onde ela veio a falecer no Burlington

— 245 —
6 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 150/1972

Hospital iás 6 h 49 min de 25 de Janeiro de 1972. Tmediatamente


comegou a ser submetida a urna serie de tratamentos: foi-lhe
extraído todo o sangue que tinha, e, em lugar deste, injstaram-
-Ihe quatro litros de solucáo Collins a menos de 5' de tempera
tura Celsius; depois, mais dois litros da mesma a menos de
lO*. O seu corpo foi finalmente colocado em um dornütório-ge-
ladeira cuja temperatura é de 79* abaixo de zero. De quatorze
em quatorze dias os peritos renovam a carga de gelo, pois a
temperatura do corpo nao pode subir um só grau que seja.

A congelacáo tem por fim deter o processo de deterióracáo


ou destruicáo a que estaría sujeito o organismo em temperatura
normal. Caso se conservem intatas as células desse corpo, po-
deráo um día ser reativadas mediante o descongelamento e os
médicos lhe aplicaráo o remedio eficaz para debelar o cáncer,
remedio que dentro de alguns anos ou decenios talvez já tsnha
sido descoberto.

Mozart Monteiro, na crónica «Ciencia da Ressurreigáo» pu


blicada no jornal «O Globo», fornece mais os seguintes dados:

"Genovléve deve ressuscltar no ano 2.500. Quando voltar á vida, daqul


a cinco séculos, deverá ter olto anos de Idade. Sua familia s3o existirá. Nln-
guém do mundo atual existirá. Ressuscltando, a crianza entrará num mundo
que ela nunca vlu, e terá de aprender a andar e falar.

E o pal de Genevléve, louco de amor pela fI Iría moría, acredita nlsso".

2. Exfetem treze ou talvez mais psssoas congeladas, viti-


mas de males atualmente incuráveis, que aguardam, como Ge
noveva, o dia em que provavelmente a medicina as podará curar.

O primeiro desses pacientes é o Prof. James Bedford, titu


lar da cátedra de Psicología da Universidade de Phoenix, capital
do Estado de Arizona (E.U.A.). Faleceu de leucemia em 1967;
de acordó com a sua última vontade, foi congelado para voltar
á vida quando já estiver descoberta a cura da leucemia.

Em Los Angeles existe o «purgatorio frigorífico», edificio


branco em forma de hangar, que nao é propriamente um cemi-
tério, mas um criotério. Ai repousam em sarcófagos de acó
corpos congelados sem sangue (mas com urna solucáo Collins

1 Em certos comentarlos Jomalfsticos, encontramos a noticia de que, em


outros casos de congelamento, o cadáver é mantldo em temperaturas ainda
mais baixas: — 196? ou — 296?.

— 246 —
CONGELAMENTO DE ORGANISMOS

injetada no organismo). Aos domingos as familias dos pacientes


e outras pessoas interessadas váo visitar essa estranha mansáo,
a fim de alimentar as suas esperanzas.

Como se compreende, tal processo de conservagáo dos or


ganismos redunda muito dispendioso. Requer cuidados cons
tantes, pois é necessário estar observando regularmente os sar
cófagos e renovar-Ibes com periodicidade rigorosa a carga do
gelo. O Dr. Robert F. Nelson, que já congelou nove pessoas em
condicóes semelhantes, julga que o caso do Genoveva é o mais
interessante de todos, pois se trata de urna menina que mostrou
grande resistencia á molestia e possui chances especiáis de re-
cuperagáo.

Pergunta-se agora: que dizer do processo de congelamento


de um paciente, do ponto de vista da consdéncia crista?

2. O cristao, que diz?

Responderemos em tres etapas:

2.1. Ressurreijáo de morfo ?


s

1. Mediante o congelamento, nao se pretende ressuscitar


um defunto. Mais precisamente, eis o que tal processamento su-
póe e intenciona:

A medicina distingue morte clínica e morte real. Cf. PR


137/1971, pp. 193-203.

A morte clínica é a que o médico declara quando verifica


que o coracáo do paciente já nao pulsa e a respiragáo cessou.
Todavía nao se sepulta alguém que esteja clínicamente morto
senáo 12 ou mesmo 24 horas depois de ocorrido o óbito: na ver-
dade, é extremamente improvável que, com a última pulsacáo
do coragáo, o organismo se modifique de tal modo que já nao
possa ser vivificado pelo seu principio vital, ou seja, pela alma
humana; esta deve ai permanecer latente por mais algumas ho
ras após o óbito clínico, até dar-se a morte real. Alias, a expe
riencia mesma ensina que pessoas clínicamente mortas recupe-
raram suas funcóes vitáis.

Com efeito, em 1970, por exemplo, na Inglaterra, registrou-


-se o caso de urna jovem iraniana que em Brighton ingeriu pe-

— 247 —
8 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS> 150/1972
t

sada dose de barbitúricos. Foi transportada para o hospital, onde


o médico de servico nela averiguou todos os sinais de morte clí
nica. Todavía na cámara mortuária a jovem "-megou a se agi
tar; estava apenas em coma profundo. Foram-lhe entáo aplica
dos os processos de reanimacáo, mediante os quais a paciente
se recuperou e, sadia, deixou o hospital cinco semanas mais
tarde.

Donde se vé que a cessacao das pulsagóes cardiacas e da


respiragáo nao indica a morte real do individuo.

2. Mais precisamente, no tocante ao coma, convém notar


o seguinte: o coma é um estado caracterizado pela perda (total
ou parcial) da consciéncia e a cessagáo mais ou menos total das
fungSes de sensibilidade e motricidade. Distinguem-se seis graus
de coma segundo a respectiva profundidade e gravidade. Des-
ses seis, sejam mencionados ao menos quatro graus: o coma
leve ou de vigía, o coma de gravidade media, o profundo e o
ultrapassado.

No coma profundo ainda há síntomas <3e que o cerebro es


teja vivo, pois o sistema vegetativo ainda se manifesta espon
táneamente. Somente no coma ultrapassado (que já nao é pro-
nriamente coma) ó que o cerebro já nao funciona e a vida vege
tativa central está extinta. O eletroencefalograma se conserva
constantemente liso. O colapso do organismo é total. Nessas
circunstancias, os peritos já tentaram de todos os modos res-
tabelecer as funcóes cerebrais, mas em váo. Já nao há recu-
peragáo.

Condui-se, pois, que, entre o estado de morte clínica (de


clarada por haverem cessado respiragáo e pulsagóes cardiacas)
e o de coma ultrapassado irrecuperável, há urna gama assaz va
riada de estados do organismo suscetiveis de reativagáo e recu-
peragáo para a plena vida.

3. Conscientes disto, os médicos, desde que verifiquen! a


morte clínica de alguém, podem supor que o principio vital (ou a
alma) desse paciente perdure no respectivo organismo até que
se de tal destruigáo dos órgáos e tecidos que já nao possa mais
subsistir ai um principio de vida (ou a alma humana).

Interessa, pofs, aos médicos deter o processo de .deterioriza-


gáo do organismo em virtude do qual se dará a morte real. Ora,
para deter tal processo, nao há (segundo dizem muitos) recurso

— 248
CONGELAMENTO DE ORGANISMOS

mais indicado do que o congelamiento. Este parausa as ativida-


des todas do organismo (inclusive a deterioragáo); conseqüen-
temente, conserva-se presente na pessoa em coma a respectiva
alma. Pode-se entáo esperar que, em época futura, o organismo
esteja em condigóes de ser descongelado e receber medicamentos
ou tratamentos novos, que a medicina esteja para descobrir.
Caso tal medicagáo seja aplicada com éxito e o paciente recu
pere a vida plena, nao se dará a ressurreicáo de um morto, mas
apenas a reativagáo de um organismo inerte. *

Fica naturalmente a dúvida: será que a babea temperatura,


parausando as fungóes do organismo, nao constitui um clima
violento ou artificial demais para a vida humana? Será que o
organismo do homem pode subsistir a 79* Celsius abaixo de
zero ou a temperaturas aínda mais baixas? Será que os corpos
até hoje congelados ainda estáo vivos? — Quem julgar poder
responder afirmativamente, nao terá dúvida em admitir que o
congelamento ou a crioterapia é aceitável do ponto de vista me
dicinal.

Todavía póe-se agora urna dúvida de consciéncia:

2.2. Será lícito congelar?

A resposta abrange dois aspectos:

2.2.1. Congelamento do organismo e plano de Deus

A prática ido congelamento se enquadra tranquilamente den


tro do programa geral da medicina, que é «preservar a vida hu
mana e defendé-la contra as ameagas da morte». Nao há dúyi-
da, trata-se de recurso novo de medicina e, por isto, raro e dis
pendioso; além do mais, os seus resultados sao incertos e
forterhente hipotéticos, podendo mesmo ser nulos. Em conse-
qüéncia, nenhum paciente tem a obrigagáo de pedir tal trata-
mento, nem médico algum tem o dever de aplicar tal processo.

É certo que o congelamento em vista de urna reativagáo


posterior nao derroga aos designios do Criador. O homem deve

1 Note-se bem: a palavra precisa, no caso, é realmente reativacáo, Isto


é, volta ás ativldades; nao reanfmacao (o que poderla significar volta da
anima, alma, ao corpo).

— 249 —
10 <rPERGUNTE E RESPONDEREMOS!. 150/1972

morrer tanto segundo as leis naturais da biología (os órgáos se


desgastam pelo uso e perdem sua vitalidade) como segundo as
proposigóes da fé (a morte é o salario do pecado, diz Sao Paulo
em Rom 6,23). Seria utópica e vá a pretensáo de livrar da morte
o composto «corpo e alma» que peregrina sobre a térra; cedo
ou tarde, este deve ceder á decomposigáo para ser restaurado
sob forma gloriosa, em configuracáo a Cristo ressuscitado (ape
nas a alma humana, e nao o composto «corpo e alma», é, por
sua natureza, imortal).

Ademáis o sabio cristáo tem consciéncia áa que as conquis


tas positivas da medicina em nada derrogam ao poder e á so
beranía de Deus. É por graga e dom do Criador que o homem
consegue progredir nos setores da ciencia e da técnica; tais avan-
gos tém levado muitos dentistas a reconhecer ainda mais evi
dentemente a sabedoria e a grandeza de Deus no mundo criado.
É, pois, para desejar que a ciencia continué a desenvolver-se,
contanto que respeite sempre as leis de Deus e a (dignidade do
ser humano (imagem e semelhanga do Criador).

Tenham-se em vista as palavras do Concilio do Vaticano H:

"Bem longe de julgar que as obras produzidas pelo ta


lento e a energía dos homens se opSem ao poder de Deus e de
considerar a criatura racional em eompeticáo com o Criador, os
cristáos estáo antes convictos de que as Vitorias do género
humano sao um sinal da magnitude de Deus e fruto de seu
inefável designio" (Const. "Gaudium et Spes" n"? 34c).

2.2.2. E a ¿«antología médica?

Dois tópicos vém ao caso:

1) Visto que o congelamento ainda é recurso extraordiná-


ro e incerto, nao deve ser aplicado a um paciente adulto sem o
consentimento deste — consentimento dado previamente em es
tado de lucidez mental. Muitas pessoas, embora nao tentem o
suicidio, aspiram a terminar seus dias na térra e repousar-sc
da fadiga cotidiana. A fé crista reconhece a legitimidade de tal
atitude. É lícito a alguém desejar a morte para si mesmo, con
tanto que nao o faga por covardia, mas, sim, para unir-se a Deus
mais plenamente; tenham-se em vista as palavras de Sao
Paulo:

— 250 —
CONGELAMENTO DE ORGANISMOS 11

«Para mim, a vida é Cristo, e morrer é lucro... Sinto-me coa


gido por esta alternativa: de um lado, o desejo de partir e estar
com Cristo, o que é muito melhor. Mas, de outro lado, por vos-
sa causa, é mais necessário permanecer na carne» (Flp 1,21.23).

Note-se também que o pacíante congelado está sujeito a


voltar á vida pública dentro de decenios, quando as circunstan
cias ambientáis e a civilizagáo seráo muito diversas das atuais.
Poderá readaptar-se ao ambiente? Sentir-se-á á vontade, sem
poder contar com o apoio dos familares e amigos que o acom-
panharam anteriormente? — Tal sorte nao deve ser imposta a
pessoa alguma. Sabe-se que sao rejeitadas pela consciéncia mo
ral as experiencias «in anima nobili» (no ser humano) cujo re
sultado seja incerto.

Ao se tratar de enancas pequeñas, a responsabilidade do


processo pode ser compartilhada pelos genitores e pelo médico;
julgaráo em consciéncia se o congelamento poderá ser benéfico
ao pequenino.

2) A congelacáo de paciente supóe a morte clínica devida-


mente averiguada; somente depois desta pode empreendida. Co
mo se entende, nao seria lícito a um médico antecipar-se á morte
clínica para provocar o congelamento do individuo, pois tal pro
cesso extingue a consciéncia psicológica e moral do enfermo,
sem garantía de recuperacáo da mesma.

Em suma, o novo processo de defesa da vida humana aínda


está envolto em numerosas interrogacóes, apresentando tragos
de fantástico. Nao deve ser desprezado nem condenado porque
se baseia em premissas aceitáveis, tem sua lógica e nao recorre
a meios ilícitos; pode-se talvez tornar fator de progresso da
ciencia. Contudo requer-se sobriedade e uso de raciocinio quando
se pensa em aplicar concretamente tal tipo de tratamento e pre
ver os seus efeitos: que o bom senso e o realismo prevalecam
sempre sobre a fantasía e a imaginagáo mirabolantes!

Vejam-se a propósito dois artlgos de PR: 75/1964, pp. 137-143 (con


gelamento o reativagáo de paciente segundo as condiedes da medicina em
1964) e 137/1971, pp. 193-203 {morte aparente, morte clínica e morte real).

— 251 —
Um fenómeno de nossos dias:

contestado na igreja:
legal ou nao?1

Em síntese: A autoridade na Igreja nao é delegada pelo povo de Deus


aos seus governantes eclesiásticos, mas é comunicada por Cristo aos
homens que Ele escolhe. Orava o Senhor ao Pai a respeito dos seus Apos
tólos: "Assim como Tu me enviaste ao mundo, também eu os envió ao
mundo" (Jo 17,18). Em conseqüéncia, a autoridade na Igreja tem algo de
intocável. De modo especial, a autoridade do Sumo Pontífice nao está
sujeita a ulterior instancia judiciária: "Prima sedes a nemine ludicatur. —
A sede primacial por ninguém é julgada".

Isto, porém, nao quer dizer que nao haja possibilldade de diálogo
na Igreja. Os medievais falavam mesmo de corregió fraterna, correcto que
podia ser dirigida pelos subalternos aos seus superiores, caso estes caís-
sem em erro notorio. Registram-se episodios de historia da Igreja, em que
santos (como S. Catarina de Sena, S. Brígida da Suécia, S. Bernardo de
Claraval...) deram a ver ao Papa abusos humanos ou deficiencias no
seio da Igreja . — Nada impede que se continué o diálogo na Igreja de
hoje; é, ao contrario, desejável. Tal diálogo, porém, nao deverá recorrer
ás formas irreverentes da contestacao nem assumlr o tom de corregió
propriamente dita. Esse diálogo franco, destinado a sanear possfveis defi
ciencias na Igreja, decorrerá em clima de fé e carldade. Além disto, há
de guardar sempre o primado do amor (agápe) sobre as belas Idéias; con
servará também a comunháo com a Igreja, repudiando todo tipo de cisma
ou ruptura; deverá outrossim ser paciente para respeltar a índole das cri
aturas, que nem sempre evoluem segundo o ritmo que se poderla desejar.

Besposta: O fato de que na Igreja de hoje existam grupos


contestatarios que, em manifestacóes públicas, levantam a voz
contra as instituicóes e as autoridades eclesiásticas, tem sur-
preendido a muitas pessoas — católicas e nao católicas. Donde a

'Este artigo continua e termina o que foi publicado em PR 149/1972,


pp. 195-208.

— 252 —
AUTORIDADE E CONTESTACAO NA IGREJA 13

pergunta de uns: Será legitima a contestagáo na Igreja? Outros


replicam: Nao deveria ser reconhecida como a forma moderna
de se obter a renovagáo de certos setores da Igreja?... renova-
gao que, se nao for arrebatada pela forga, jamáis se dará.

Diante da perplexidade suscitada por tais interogacóes,


procuraremos lembrar alguns principios que contribuam para se
formar um juízo sobre táo delicado assunto.

1. A autoridade na lareia

1. Toda sociedade, para subsistir, está sujeita a duas (en


tre outras) exigencias peremptórias:

— ter um código de leis ou urna constituicáo jurídica que


defina e distribua as responsabilidades (direitos e deveres) den
tro da sociedade;

— ter urna autoridade que explicite e salvaguarde a cons-


tituigáo ou a ordem estabelecida na sociedade, aplicando as leis
ou délas dispensando (quando necessário).

Assim também a Igreja Católica neste mundo: na medida


em que consta de seres humanos, Ela necessita dos dois elemen
tas ácima apuntados. Note-se ainda que na Igreja as estruturas
jurídicas e a autoridade devem, em última análise, fundamen-
tar-se sobre os escritos do Novo Testamento. Isto nao quer di-
zer que o Novo Testamento confénfia normas jurídicas muito
explícitas e minuciosas. Ele apresenta, sim, alguns fatos que sao
necessários pontos de referencia para o Direito da Igreja:
assim

— a missáo, que Jesús confiou aos Apostólos, de irem a to


das as nacóes a fim de comunicar-lhes a Boa-Nova e batizá-las
(cf. Mt 28, 18-20);

— as funcoes próprias que Cristo entregou a Pedro, para


que fosse fundamento visível da Igreja (cf. Mt 16,17-20), pastor
do rebanho (cf. Jo 21,15-17) e confirmador da fé de seus ir-
máos (cf. Le 22,31s);

— a promessa da infalível assisténcia de Cristo aos doze


Apostólos como colegio (cf. Mt 18,18) e a Pedro em particular
(cf. Mt 16,18-20);

— 253 —
14 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 150/1972

— a organizagáo das comunidades cristas sob a guia de


andaos, presbyteroi, e superintendentes, epískopoi (cf. At 20,
17.28; Flp 1,1; 1/2 Tim; Ti);

— o Concilio de Jerusalém destinado a dirimir dúvidas ori


undas entre os primeiros cristáos (cf. At 15, 6-30);

— a solicitude pela unidade dentro da multiplicidade de co


munidades que iam surgindo (cf. Gal 1, 6-9; 1 Cor 11,2; 2 Tes
2,5);

— a preservagáo do depósito da fé (cf. 1 Tim 6,10s. 20:


2 Tim 4,1-5), etc.

A Igreja Católica sempre viu ñas funcóes do Sumo Pontí


fice e dos bispos o prolongamento auténtico do ministerio de
Pedro e dos Apostólos. A esses sucessores dos doze cabe, sob a
prometida assisténcia de Cristo e do Espirito Santo, formular e
explicitar de maneira auténtica ñas sucessivas fases da historia
as leis da Igreja (cf. Jo 16,13-15; At 2,1-12).

2. Em vista dos textos bíblicos aqui citados, diz a teología


que os Papas e os bispos exercem sua autoridade por direito di
vino. Esta expressio nao quer dizer que a exercam de maneira
arbitraria e despótica. Ela significa, sim, que a autoridade na
Igreja nao tem sua fonte na iniciativa dos homens que com-
póem a Igreja, mas na escolha que o próprio Cristo faz dos seus
ministros (através dos homens, sem dúvida). Nao sao as comu
nidades católicas que delegam sua autoridade aos respectivos
bispos, mas é Cristo quem comunica aos bispos a sua missáo e os
seus poderes de pastores do rebanho. Dizia o Senhor Jesús ao
Pai em sua oracáo sacerdotal, referindo-se aos Apostólos: «As-
sim como Tu me enviaste ao mundo, também eu os envió ao
mundo» (Jo 17,18).

Em outros termos: o povo de Deus sabe (ou deve ser indu-


zido a saber) que a fungáo dos bispos participa da índole sacra
mental que compete á Igreja: assim como a Igreja nao é simples-
mente a soma dos seus membros, mas é o sinal sensível pelo qual
Cristo santifica os homens, assim os bispos sao os sinais e instru
mentos (ora mais perfeitos, ora menos perfeitos) pelos quais
Cristo exerce sua acáo santificadora entre os homens. Pelos bis
pos nao é o povo que governa a si mesmo, mas é Cristo quem
governa o seu povo; a autoridade é comunicada aos bispos por
imposigáo das máos e por invocagáo do Espirito Santo.

— 254 —
AUTORIDADE E CONTESTACAO NA IGREJA 15

3. Destas consideragóes se segué que o ministerio do Sumo


Pontífice e dos bispos na Igreja tem algo de intocável; assim
como o povo de Deus nao confere a autoridade aos bispos, as
sim ele nao a pode retirar. Existe mesmo um axioma de direito,
muito antigo na Igreja, que diz: «Prima sedes a nemine iudi-
catur. — A primeira sé (a de Pedro) por ninguém é julgada»,
... julgada no sentido de jotUciariamente oondenável. Nao há
apelo do juízo do Sumo Pontífice para instancia ou tribunal
superior.

Os sucessores dos Apostólos na Igreja sao enviados de


Cristo: a missáo que eles exercem, é santa,... .santa no sentido
de «instituida por Cristo»; conseqüentemente, ela tem direito
ao respeito e a inviolabilidade que compete ás coisas santas ou
ou á presenga e á acáo de Cristo. Este fica sendo sempre a
Cabeca e a única fonte de vida na Igreja.

Após haver afirmado a índole sacramental ou divino-hu-


mana da autoridade oficial na Igreja, compete agora fazer urna
observagáo: a reverencia devida aos pastores da Igreja nunca
foi entendida como algo de táo absoluto que excluisse o que
hoje se chama diálogo e o que na Idade Media se chamou, em
certos casos, correcao fraterna. Vejamos, pois, o que se en-
tende por

2. Diálogo e corre$5o fraterna

2.1. Diálogo

A palavra diálogo é assaz usada na linguagem mo


derna. Ela significa o intercambio entre dois interlocutores cu-
jos pontos de vista ou cujas posicóes doutrinárias nao sao idén
ticas entre si; cada um desses interlocutores, através do rela-
cionamento (oral ou escrito) mutuo, faz esforgo por compre-
ender o outro tal como ele é, com suas premissas ou seus prin
cipios, sua educagáo, sua idade, suas experiencias... Compre-
endendo (o que nao significa aceitando) o outro, cada um dos
dialogantes terá ensejo de dissipar mal-entendidos e falsas su-
posicóes a respeito do oponente; talvez nao lhe atribua mais
tudo que ]he atribuia. Caso isto se dé, aproximar-se-io um do
outro, podendo mesmo em alguns casos reformular suas po
sicóes próprias (sem trair a verdade, nem de um lado nem de
outro) e abrir-se para a amizade e quigá a colaboragáo.

— 255 —
16 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 150/1972

O diálogo tem sido preconizado na Igreja \ A sua utilidade


se evidencia pelo fato de que muitas vezes os homens só por
etapas chegam ao pleno conhecimento de urna verdade ou de
urna realidade; padem és vezes estar mal informados ou com
a mente preconcebida; é o encontró dialogado com o próximo
(as vezes, encontró do subalterno que vai procurar o superior
ou vice-versa) que possibilita remover os obstáculos á plena
consecugáo da verdade ou á formulagáo da reta sentenga.
Por isto, sempre que haja dificuldade de aceitagáo mutua e co-
laboragáo na Igreja, é para desejar se institua o diálogo entre
os interessados. Este normalmente transcorrerá em clima de se-
renidade e dignidade.

Aqueles que hoje contestam tumultuadamente dentro da


Igreja, mais atenderiam ao plano de Deus se recorressem ao
diálogo nos termos aqui expostos.

1 Tenham-se em vista as palavras de S. Santldade o Papa Paulo VI na


encíclica "Ecclesiam Suam" datada de 6/VIII/1964:

"A Igreja deve entrar em diálogo com o mundo em que vive... O diá
logo está no plano de Deus... O nosso diálogo convida os filhos da Casa
de Deus — a Igreja una, santa, católica e apostólica, de que esta romana
é máe e cabeca. Quanto prazer nos trará esse diálogo doméstico, em ple-
nítude de fé, de caridade e de obras! QuSo Intenso e familiar o desojamos!
Quanto ambicionamos que tenha em conta todas as verdades, todas as vir
tudes e todas as realidades do nosso patrimonio doutrinal e espiritual!
Ouao sincero e comovtdo o pretendemos, na sua genuina espiritualidade!
Quao pronto a recolher as múltiplas vozos do mundo contemporáneo! Quito
apto a transformar os católicos em homens verdadeiramente bons, pruden
tes, livres, serenos e fortes!

... Este desejo de que as relacSes Interiores da Igreja se caracte-


rizem pelo tom próprio do diálogo, entre membros de um corpo cujo princi
pio constitutivo é a caridade...

Multo desojamos que o diálogo interior, isto é, dentro da comunidade


eclesiástica, desperté novo entusiasmo, multiplique assuntos e interlocuto
res, de modo que aumentem o vigor e a santldade do Corpo Místico terreno
de Cristo" (n? 67. 72. 117.118. 120).

O Concillo do Vaticano II retomou eloqüentemente as idéias da encí


clica "Ecclesiam Suam", preconizando o diálogo dentro e fora da Igreja.
Entre outras, pode-se citar a seguinte passagem, tirada do Decreto sobre
a formac&o sacerdotal:

"Cultlvem-se nos estudantes as aptldSes convenientes que mals con-


tribuam para o diálogo com os homens, como sejam a capacidade de ouvlr
os outros e de abrir o coracSo, em espirito de caridade, ás varias situagóes
humanas" ("Optatam totius" n<? 19).

— 256 —
AUTORIDADE E CONTESTACAO NA IGREJA 17

Mas na historia da Igreja houve — e pode haver — mais


do que diálogo. Este, as vezes, parece insuficiente para satisfa-
zer á realidade e obter as metas que devem ser obtidas. Fala-
-se entáo de «correcáo fraterna»: esta cabe quando há erro evi
dente da parte de um dos interlocutores.

Como entendé-la?

2.2. Corresóo fraterna

1. A fé crista ensina que todo homem é solidario com


ssus irmáos e, até certo ponto, responsável pela salvacáo de
muitos deles. Por conseguinte, desde que alguém possa (desviar
do pecado o seu semelhante e reconduzi-lo ao bom caminho,
cabe-lhe o dever e, por conseguinte, também o direito de fazé-
-lo. Dá-se entáo a correga» fraterna: esta vem a ser urna adver
tencia efetuada por um irmáo a fím de preservar a outrem da
queda moral ou ajudá-lo a livrar-se de erros e faltas. Constitui
um ato da virtude da caridade, que nos obriga a socorrer ao
próximo, principalmente em suas necessidades espirituais. Tem
fundamento ñas palavras de Cristo consignadas em Mt 18,
15-17: «Se teu irmáo pecar,1 vai, repreende-o entre ti e ele so-
mente. Se te oüvir, terás ganho teu irmáo. Se nao te atender,
toma contigo mais urna ou duas pessoas, para que pela boca de
duas ou tres testemunhas se decida toda questáo. Se nao os
atender, dize-o á Igreja. E, se nem á Igreja quiser atender,
considera-o como gentío e publicano».

Distmgue-se a correcáo fraterna da correcáo penal ou jurí


dica. Esta é exercida pela autoridade como autoridade e tem
em vista restabelecer, com a forga da sangáo, a ordem pública
violada pela culpa de um membro ou de um grupo da sociedade.
Prende-se á virtude da justica.

A correcáo fraterna é praticada nao sonriente pelos supe


riores em relacáo aos subalternos, nem apenas por colegas ou
companheiros em seu relacionamento mutuo, mas também,
caso haja oportunidade, pelos súditos em relagáo aos seus su
periores.

2. Na historia da Igreja, ela foi mais de urna vez dirigida


(de maneira legitima e santa) ao Sumo Pontífice por pessoas

'Varios manuscritos gregos acrescenlam: "contra ti". Todavía a forma


mais abalizada do texto é a que transcrevemos ácima.

— 257 —
18 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 150/1972

santas, que gozavam de grande prestigio moral na Igreja.


— Tal foi, por exemplo, o caso de S. Catarina de Sena (1347-
-1380) e o de S. Brígida da Suécia (1303-1372), que instaram
ardorosamente junto aos Papas Urbano V (1362-1370) e Gre
gorio XI (1370-1378) para que voltassem de Avinháo (Franga)
para Roma, conseguindo finalmente obter esta sabia decisáo do
Sumo Pontífice; ambas apontaram com o máximo de clareza
os males que ameagavam a Igreja, caso o Papa nao voltasse a
ocupar a sua sede em Roma: as reis de Franga fariam dos Pon
tífices os instrumentos de suas tramas políticas e os incompati-
bilizariam com o resto do povo de Deus. — Papel semelhante
tocou a S. Bernardo, abade de Claraval, que dirigiu ao Papa
Eugenio m, monge e antigo (discípulo de Bernardo, o tratado
' «De consideratione»: nesta obra, em cinco livros, datada de
1152 ou 1153, Bernardo fazia ver ao Pontífice certos males dos
funcionarios papáis (propensos á vaidade e á ambigáo), assim
como abusos existentes em setores da Igreja. — Nos sáculos
Xn/Xm S. Francisco de Assis, S. Domingos de Gusmáo e ou-
tros mentores de familias ou grupos férvidos apregoaram alta
mente a pobreza e a simplicidade na Igreja, tendo em vista o
prestigio de que gozava o Papado (especialmente o Papa Ino
cencio III, 1198-1216, junto aos reis e príncipes da sua época).

3. A título de complementagáo e numa perspectiva um


pouco diversa, pode-se notar o seguinte:

No século XVI, o dominicano Bartolomeu de las Casas, bis-


po de Chiapa no México (1543-1551), insurgiu-se contra a vio
lenta redugáo de indios a escravatura, praticada pelos «conquis
tadores» espanhóis que apelavam para concepgoes teológicas.
A fim de defender os interesses dos aborígenes, viajou sete ve-
zes á Espanha a fím de obter da Coroa mitigacáo do regime.
Alias, o Papa Paulo m em 1537, por instancia idos missionários,
publicou urna bula em que, sob pena de excomunháo, proibia
a escravatura no Novo Mundo e sublinhava expressamente que
os indios possuem alma imortal como os brancos; por isto eram
capazes de receber o cristianismo e os sacramentos; todavía os
abusos continuaran!.

Aínda no século XX registra-se a figura do Padre Lebbe


(1877-1940), lazarista, que insistiu junto aos seus superiores re
ligiosos sobre a necessidade de se reconhecerem os valores da
cultura chinesa ñas missóes católicas da China; evangelizar nao
seria oridentalizar. Todavía as idéias do Padre Lebbe eram pre
maturas na sua época, sendo por isto contraditadas até pela

— 258 —
AUTORIDADE E CONTESTACAO NA IGREJA 19

Santa Sé. Finalmente, porém, Pió XI, sagrando os priméiros


bispos chineses em 1926, reabilitou o pensamento do Padre
Lebbe e preparou elementos de doutrina que o Concilio ido Va
ticano n assumiu em seus documentos sobre a Igreja e as
missóes.

4. Através destes e outros varios casos que se poderiam


citar, compreende-se que dentro da Igreja se possa exercer um
diálogo franco, sereno e carinhoso, inspirado por auténtico zelo
do reino de Deus, mediante o qual os subalternos procuram
mostrar aos seus superiores males a evitar ou bens a promover.
Na Idads Media, esse tipo de diálogo era chamado cortesa© fra>-
terna. Poder-se-á conservar esta expressáo hoje em dia. Parece,
porém, que ela já fez época, devendo, de preferencia, ser substi
tuida simplesmente pelo diálogo, menos ambiguo e já mais
habitual.

Nada impede que esse diálogo continué a ser praticado hoje


em dia. O fato de que ele atuabnente assuma em varios casos as
formas indelicadas, irreverentes ou mesmo violentas da contes-
ta$áo (formas ide todo indesejáveis), nao torna ilícito dentro da
Igreja o diálogo como tal.

Estas consideracóes pedem ulterior complementagáo. Com


efeito, é oportuno frisar com clareza em que termos ou dentro
de que condigóes se pode conceber um diálogo construtivo e vá
lido dentro da Igreja.

3. O legítimo diálogo dentro da Igreja

Podem-se estabelecer quatro condifióes para que se tenha


legitimo diálogo dentro da Igreja.

3.1. Respeito á autoridade papal

Na Igreja Católica, o Sumo Pontífice é o tutor e fautor da


unidade dos fiéis, dessa unidade que o Senhor Jesús, em sua
oracáo sacerdotal, ardentemente pediu para a Igreja. Por con-
seguínte, estar em comunháo com o Sumo Pontífice é urna das
condicdes indispensáveis para que alguém esteja na Igreja e
em plena comunháo com Cristo. Toda facgáo que, em sua mogáo
contestadora, rompa com o Sumo Pontífice, rompe com a Igre
ja e viola a unidade desta.

Podem-se desenvolver-se estas idéias, colocando-se novo


título:

— 259 —
20 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 150/1972

3.2. Permanencia na comunhoo do todo

Toda auténtica reforma há de ser inspirada pelo Espirito


de Deus ou pelo Espirito Santo. Ora o Espirito Santo exerce a
sua atividade imediata vivificando e animando o Corno Místico
de Cristo como tal. Vía de regra, cada individuo em particular
é atingido pelo Espirito Santo na medida em que está vinculado
ao corpo de Cristo ou á comunháo com Cristo Cabega e com os
membros de Cristo (que sao os irmáos na fé). Vé-se, pois, que
as circunstancias ñas quais o Espirito Santo exerce a sua ativi
dade sao comunitarias. Por conseguinte, quem se separa da co-
munidade, subtrai-se á acáo do Espirito de Deus, e arrisca-se
a fazer obra (ou reforma) satánica, em vez de fazer a obra
(ou reforma) genuinamente crista. O vendadeiro reformador
de qualquer setor da Igreja nao se desliga desta nem se insu
bordina violentamente contra seus superiores hierárquicos, mas,
antes, sorve dos tesouros da própria Igreja, representada por
tais e tais prelados, a vitalidade, assim como a pureza de dou-
trina e costumes, neceísárias á realizacjio do seu ideal.

Foi desse modo que procederam:

Sao Francisco de Assis e Sao Domingos de Gusmáo, arau-


tos da pobreza no século XIII, como atrás dito;

Santa Tereza de Avila, Sao Joáo da Cruz, Sao Pedro de


Alcántara, Sao Caetano de Tiene, porta-vozes do ideal da peni
tencia no século XVI, época em que a mentalidade da Renas-
cenca embotava o espirito religioso de muitos prelados. Para-
doxalmente (dir-se-ia), conservando a subordinacáo a seus su
periores, tais santos conseguiram mudar o espirito desses mes-
mos superiores, e preparam a grande reforma católica do Con-
cílo de Trente (1543-1565).

Claro está que esta ssgunda característica de auténtica re


forma dentro da Igreja só pode ser posta em prática por quem
tenha profunda fé. Mas nao seria justamente a fé urna das vir
tudes que mais devem caracterizar o verdadeiro reformador?

3.3. Primazia da caridade (amor fraterno) sobre a gnose


(ou as «bolas idéias»)

O binomio ácima se deve a urna frase de Sao Paulo, que


diz: «A ciencia (gnüse) incha, isto é, ensoberbece; mas a cari-

— 260 —
AUTORIDADE E CONTESTACAO NA IGREJA 21

dads (agápe) edifica» (1 Cor 8,1). — O Apostólo tinha em vista


certos fiéis de Corinto que, dotados de formagáo esclarecida,
bem sabiam que podiam comer qualquer tipo de carne vendi
da no agougue, embora certas carnes tivessem sido previa
mente imoladas aos ídolos nos templos pagaos da cidade. Os
ídolos nao contaminavam religiosamente carne alguma, pois
nada eram.

Ao lado desses cristáos, havia outros em Corinto que, de


formagáo mais fraca ou menos esclarecida, julgavam estarem
contaminadas as cames imoladas aos ídolos; nao as comiam e
se escandalizavam quando viam que alguém as comia. — Di
ante de tal situagáo, S. Paulo mandava que os fiéis esclareci
dos (gnósticos) renunciassem a comer carnes imoladas aos
ídolos, embora tivessem o direito de as comer. Evitassem o es
cándalo dos pequeninos, praticassem a caridade para com eles;
tais atitudes valeriam muito mais do que o frió comportamen-
to gnóstico ou intelectualista. O «conhecer mais» no Cristianis
mo está inseparavelmente associado ao amor e deve fomentar
a este.

Passando agora ao tema «reforma da Igreja», que nos in-


teressa neste contexto, observamos o seguinte:

Todo reformador é alguém que concebe urna «bela idéia»,


um plano grandioso ou ideal, ao qual ele propóe adaptar a re-
alidade presente «deformada». Esse homem pode-se deixar em-
polgar pela sua bela idéia a ponto de lhe subordinar todo e qual
quer outro valor (como sejam os da caridade, das relagóes fra
ternas e humanas, da edifícagáo do próximo, da salvagáo das
almas); torna-se unilateral. Entáo os seus empreendimentos
vém a ser destrutivos em vez de se tornar construtivos; divi-
dem, separam, provocam litigios e escándalos.

Com outras palavras: todo reformador, dizem os estudio


sos, é um simplificador; nisto está a sua forga, mas está tam-
bém o seuperigo. As heresias geralmente nasceram do fato de
que alguém isolava do conjunto da Revelaeáo Divina urna de
terminada verdade e a afirmava unilateralmente ou exagera
damente, sem levar em conta a capacidade de assimilagáo das
pessoas a quem pregava.

Em outros termos ainda: todo reformador julga possuir


urna missáo que o póe em imediato contato com Deus e o dis-

— 261 —
22 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 150/1972

pensa de dar coritas aos homens; essa missáo, o reformador po


de tender a executá-la «a ferro e fogo» ou apaixonadamente.
Caso ceda a esta tentacáo, certamente nao faz a obra de Cristo;
deteriora, em vez de reformar.

Muito a propósito vém as palavras de Fénelon (1651-1715),


bispo de Cambraia, que soube associar elevada erudic.áo e pro
funda humildade:

"Se queréis urna reforma seria, nao a comeceis por fora...


com urna critica áspera e altiva; realizai-a, antes, em vos mes-
mos... Quanto mais vos reformardes desse modo, tanto me
nos desejareis reformar a Igreja" ("Lettres sur l'autorité de
l'Église" III, ed. Didot, t. I, p. 226).

Para terminar, sejam citadas oportunas observagóes do


Papa Pió XI em sua encíclica «Mit brennender Sorge» (14/m/
1937) sobre o nacional-socialismo :

"Toda reforma verdadeira e duradoura, em última análise,


se deriva da santidade de homens inflamados e impedidos
pelo amor de Deus e do próximo.

Generosos, prontos para ouvir todo chamado de Deus e


realizá-lo em si fielmente, estavam seguros de si mesmos, por
que seguros de sua vocacáo; cresceram até tornar-se .os ilu
minadores e reformadores do seu tempo. Ao contrario, onde o
zelo reformador nao jorrou da pureza do individuo, mas foi ex-
pressáo e explosáo da paixáo, ele anuviou em vez de aclarar,
destruiu em lugar de construir, e mais de urna vez tornou-se
ponto de partida para aberragoes mais fatais do que os males
que ele esperava ou pretendía remediar" ("Acta Atpostolicae
Sedis" 1937, p. 154).

3.4. Paóantar ou aguardar os momentos oportunos

A Providencia Divina apreende horizontes mais ampios do


que aqueles que o homem atinge. Sabe levar em conta a lenti-
dio inerente ás criaturas. Por isto pode julgar conveniente di
ferir até mesmo as mudangas salutares, aguardando que as cri
aturas, de acordó com o seu moroso ritmo de amadurecimento,
oferecam as condigóes humanas mais adequadas para receber
alguma reforma. Sendo assim, o reformador que se obstine a
executar de pronto os seus planos, anisca-se a nao servir a
Deus, mas, sim, a si mesmo e ás suas paixóes.

— 262 —
AUTORIDADE E CONTESTACAO NA IGREJA 23

Ttenha-se em vista o caso de um pastor de almas ou de


um catequista que, comegando a trabalhar em determinada re-
giáo, ai encontra urna populagáo fervorosa, mas muito simples
e rude. Os exercícios de piedade daquela gente sao alheios ao
espirito da Liturgia oficial; além disto, a igreja do lugar é
cheia de imagens e flores artificiáis... O pastor ou catequista
percebe que é preciso mudar. Se contudo quiser bruscamente
mudar os costumes e as devocóes dos fiéis, correrá o grande
risco de destruir em vez de construir: os fiéis, nao estando (do
ponto de vista humano, isto é, psicológico e cultural) prepara
dos para assimilar as novas práticas de piedade, largarlo as
antigás e nao adotaráo as novas; ideixaráo simplesmente de re
zar ou mesmo de praticar o catolicismo, passando-se para o pro
testantismo popular ou para o espiritismo, a umbanda... — o
que será profundamente doloroso. A genuína reforma da pieda
de, no caso, há de ser feita devagar, mediante gradativo escla-
recimento dos interessados, levando sempre em conta a len-
tidáo intelectual dos mesmos.

A sabedoria popular ensina que «o étimo é inimigo do


bom». É o que se verifica também em assuntos religiosos: mui-
tos reformadores, querendo obter imediatamente, e por meios
drásticos, o que de melhor se poderia conceber, nao consegui-
ram sequer atingir algum bom resultado.

As reflexóes até aqui propostas já bastam para dar a ver


quáo lamentáveis sao os movimentos contestatarios que, dentro
da Igreja, disseminam divisóes, ressentimentos, azedume, mal-
-estar entre os fiéis. Provocam desconcertó no povo simples e
nos cristáos despreparados, que, em conseqüéncia. se afestam
da Igreja e sofrem dolorosas crises de fé. Mesmo que haja mo
tivos para pleitear novas formas de disciplina na Igreja, nao é
com desordem e violencia que elas háo de ser obtidas. Nem s?
diga que somente as atitudes acintosas e desafiadoras podem
dar resultado hoje em dia (tal seria a inercia ou insensibilidade
das autoridades eclesiásticas!). Toda atitude acintosa larica de
satino e escándalo no povo de Deus, provocando graves males
espirituais. Ora meios maus nao devem ser aplicados nem para
obter fíns bons. O fim nao justifica os meios. — É na fé, na
esperanga e no amor que se faz a obra de Deus.

A respelto pode-se consultar o n? 68 da revista "Concilium" (ed. fran


cesa): "Droit Canonique".

— 263 —
..." Debrucado sobre urna materia que
¡he resiste, o trabalhador imprime-lhe o seu
cunho, enquanlo para si adquire tenacidade,
engenho e espirito de invencao. Mais aínda,
vivido em rom uní, na esperanza, no sofri-
mentó, na aspiraeáo e na alegría partílha-
da, o trabalho une as vontades, aproxima os
espíritos e sóida os coracoes: realizando-o, os
homens descobrem que sao irmaos."

PAULO VI
(Carta Encíclica Populorum Progressio)
marco -

Ética- Seguranca- Pioneirismo


Duas opgoes:

violencia ou evolucáo pacífica?

Em sfntese: A revolucSo armada é apregoada por pensadores nao


crlstSos (marxistes) como também por alguns crlstños, como sendo a so-
lucSo para as Injusticas sociais vigentes em varios países e, em particular,
na América Latina. — A esta posicáo o S. Padre Paulo VI e o episcopado
católico em geral, fazendo eco ao Evangelho, opCem solucSes pacificas:
o amor, que transforma o ser humano, há de ser a forca revolucionaria do
cristáo. Ademáis lembram que violencia gera violencia.

Todavía a recusa de revotucSo armada na América Latina nao signi


fica inercia ou displicencia frente aos males sociais do continente; é, ao
contrario, acompanhada de veemente apelo a que os cristáos assumam as
suas responsabilidades na constru?5o de urna ordem de coisas mals justa
e humana nos seus respectivos países.

A revolucSo armada nao é sempre ilegitima; ao contrario, pode ser justa,


desde que nSo haja outro recurso (menos violento) para remover urna sl-
tuacSo tiránica e duradoura. A revolucSo, porém, há de evitar exorbitan
cias Injustas e há de ser empreendlda com probablildade de éxito, a fim
de nao se tornar mero e víngativo derramamento de sangue.

Resposta: Vivemos numa época em que as revolugóes se


multiplicam, atingindo os mais diversos sistemas políticos (de
mocracias ocidentais, totalitarismos de esquerda), independen*
temente dos diversos regimes económicos (capitalistas e coleti-
vistas); aliciam em sua onda fiéis de todos os credos religiosos.
Tal época um día poderá ser considerada a era das revolucóes
e da violencia, como outros periodos da historia foram tidos co
mo o século do iluminismo, a era da democracia, a época da
industrializacáo e da técnica... Isto nao quer dizer que em ou-
tras épocas nao se tenha registrado o recurso á violencia; mas
o que caracteriza a violencia em nosso século é que os estu-

— 265 —
26 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 150/1972

diosos (filósofos, sociólogos e políticos) procuram justificá-la


mediante teorías diversas, apresentando-a como método neces-
sário para superar insustentáveis situagóes ide desequilibrio
em que se encontra o género humano.

Vive-se hoje em dia como que o mito da revolugáo, que tem


seus homens simbólicos de fama mundial: Che Guevara, Mao-
-Tse-Tung, Ho-Chi-Min, Fidel Castro, Camilo Torres... Os es
critos de Mao, de Che, de Marcuse tornaram-se os clássicos da
revolugáo na era presente.

Compreende^se entáo que os cristáos se perguntem que ati-


tude tomar diante do processo revolucionario que é apregoado
com aparato de teorías filosóficas, ora mais, ora menos im-
pressionantes. «Se o cristáo é chamado a viver e agir na his
toria, como poderá ficar alheio a um movimento de dimensóes
mundiais?», eis o que perguntam muites.

As respostas a esta pergunta sao contraditórias. Camilo


Torres, ex-pastor de almas católico, caiu morto em guerrilha,
afirmando que «a luta revolucionaria é urna luta crista e sa
cerdotal» (Camilo Torres, Comunicado á imprensa, 24/V/1965).
Ao invés, Martinho Lutero King sucumbiu assassinado enquan-
to professava que o Evangelho recomenda a náo-violéncia.

Diante da contradicáo assim proposta, importa ao cristáo


tomar conhecimento exato de qual deva ser o seu auténtico pa
pel na hora presente. A fim de favorecer a formagáo das consci-
éncias, proporemos, a seguir, as posigóes que hoje se defrontam
diante do problema social: revolugáo violenta, evolugáo pací
fica, ficando a questáo da pressáo moral (que, as vezes, é tida
como urna das expressóes da náo-violéncia) reservada para o
próximo artigo de PR.

1. Revolucáo violenta

Muitos pensadores julgam que a justica e o equilibrio en


tre as dasses sociais só poderáo ser obtidas mediante o recurso
á violencia armada. Esta seria instrumento de libertagáo.

Entre os protagonistas desta tese, podem-se contar

— 266 —
VIOLENCIA OU EVOLUCAO PACÍFICA? 27

1) Os partidarios do marasmo. A revolucáo (e revolucáo


armada, se for necessário) está incluida no programa de agáo
do comunismo. Este encara a luta entre dasses como algo de
plenamente justificado. Entre outros, podem-se citar os seguin-
tes dizeres de Lenine proferidos em 1920 no IH Congresso da
Juventude Comunista:

"Existe urna moral comunista? Existe urna ética comunis


ta? Certo que existe... Dizemos que nossa ética está em tudo
e por tudo sujeita aos interesses da luta de classe do proleta
riado... Eis por que dizemos: para nos nao existe mora! to
mada fora da sociedade humana; admitir isto seria enganar-se.
A nossa moral comunista, nos a subordinamos a este dever.
Nos dizemos: moral é aquilo que serve para destruir a velha
sociedade exploradora e para reagrupar todos os trabalhado-
res em volta do proletariado" (Lenine, "Obras", Moscou 1948,
vol. II, p,p. 645-647).

Muito significativo é também o programa de Che Guevara:

"O odio como fator de luta, o odio intransigente para com


o ¡nimigo, o odio que leva o ser humano para além dos limites
humanos e o transforma em urna eficaz, violenta, seletiva e
e fria máquina para matar. Tais devem ser os combatentes;
um ¡povo sem odio nao pode vencer um inimigo brutal" (Che
Guevara, "Creare due, tre, moltt Vietnan: é la parola d'ordine".
Miláo 1967, p.24; extrato da carta de Che ao Secretario exe-
cutivo de O.S.P.A.A.L., Berlim 1967).

Nao é necessário desenvolver aqui o ponto de vista mar-


xista. Passamos, pois, a outra expressáo da mesma tese:

2) Herbert Marcuse © seus seguictores também admitem


a legitimidade ida revolugáo violenta, embora sejam os arautos
de urna sociedade tranquila, movida pelo amor. A fim de der-
rubar a sociedade de consumo, em que vivemos, Marcuse nao
recusa a revolucáo violenta:

"A relacáo entre os fins e os meios é o problema ético


da revolugáo. Em certo sentido, o fim justifica os meios, no
caso em que estes contribuam claramente para o progresso
humano. Este fim legítimo (o progresso), que na verdade é o
único legitimo, exige a criacáo de um clima que facilite e pro-
mova a sua realizacáo. A criagáo de um tal clima pode justifi
car sacrificios, como ela os justificou no decorrer da historia.

— 267 —
28 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 150/1972

Todavia a relagáo entre fim e meios fica sendo diaiética. O


fim deveria ser levado em consideracáo já nos meios repres-
sivos destinados a atingi-lo. Visto que os sacrificios implicam
violencia, urna sociedade nao violenta só será possível num
período da historia que ainda estamos por alcancar" (citado
por IDOC n? 1, 1/V/1969, pp. 62s).

A respeito de Herbert Marcuse e suas idéias, veja-se PR


106/1968, pp. 405-406; 114/1969, pp. 229-239.

3) Entre os pensadores cristáos, também há os que pro-


pugnam a violencia revolucionaria como meio legítimo de ins
taurar nova ordem de coisas no mundo presente.

a) Apelando para as Escrituras Sagradas, alguns lem-


bram que a Biblia promete o Reino de Deus, Reino que pora
termo a toda injustiga e todo pecado existentes na presente
ordem de coisas; subverterá todas as instituigóes iníquas. A
perspectiva desse Reino habilita os cristáos a empreender as
mudanzas e revolugóes violentas que estejam ao seu alcance.
Nada do que é alheio a Deus na sociedade, é intocável; o cris-
táo pederá empreender a derrabada e a transformagáo neces-
sárias, até por meio de violencia. Segundo a Biblia, o Senhor
abate o poder do opressor para instaurar a sua justiga; é prin
cipalmente nos tempos messiánicos que se deve dar tal revira-
volta; cf. 1 Sam 2,1-11; SI 9. 71.146; Le 1,50-53.

b) A moral crista ensina que todo ser humano injusta


mente atacado tem o direito de se defender da violencia do
agressor mediante a violencia. — Ora pode-se dizer que em cer
tas nagóes a violencia está institucionalizada (isto é, oficialzada
e atuante nos poderes públicos), oprimindo as populagóes pobres
e modestas. Em conseqüéncia, será lícito a um cristáo pegar em
armas e opor-se violentamente a tal violencia institucionaliza
da. A revolugáo assim movida poderá ser tida como fruto do
amor, pois o amor manda preferir os mais fracos e lutar ao
lado deles para assegurar-lhes urna vida melhor e mais livre.

Um espécimen representativo desta atitude encontra-se


ñas palavras de Thomas R. Melville, religioso norte-americano,
que deixou sua Congregagáo Religiosa para apoiar a revolugáo
na América Latina e reunir-se aos guerrilheiros da Guatemala:

"Meu irmáo e eu chegamos á conclusáo seguinte: a atual


violencia, que se afirma na subnutrigáo, na ignorancia, na

— 268 —
VIOLENCIA OU EVOLUCAO PACÍFICA? 29

doenga e na fome, em que está imersa a maioria do povo


guatemalteco, é a conseqüéncia direta do sistema capitalista
que póe, frente uns aos outros, indios sem defesa e proprie-
tários de térras poderosos e bem armados.
Decidimos entáo nao nos tornar cúmplices do exterminio
decorrente desse sistema e ,comecamos a ensinar aos indios
que ninguém haveria de defender os seus direitos se nao
eles mesmos. Se os governos e ricos proprietários recorrem
ás armas para os manter na sua miseria, eles tém a obrigagao
de também pegar em armas para defender o direito, que Deus
Ihes deu, de ser homens.

Acusaram-nos de sermos comunistas, nos e aqueles que


nos escutavam. Nossos Superiores Religiosos e o Embaixa-
dor dos Estados Unidos nos rogaram que deixássemos o pais
— o que realmente fizemos. Mas fago questáo de dizer que
so sou comunista se Cristo é comunista. Foi por causa do en-
sinamento de Cristo, e nao por causa de Marx ou Lenine, que
fiz o que fiz e continuarei a fazer. Também me importa dizer
que somos muito mais numerosos do que pensam a hierarquia
ou o governo dos Estados Unidos.

Quando a batalha se tornar mais manifesta, dai a saber


ao mundo que nos nao lutamos nem pela Rússia nem pela
China, nem por algum outro país, mas, sim, pela Guatemala.
Nossa atitude frente á situagáo atual nada deve á leitura de
Marx ou Lenine; ela provém de uma leitura do Novo Testamen
to" (citado em IDOC, n<? 1, 19/V/1969, pp. 59s).

Tenha-se em vista também o seguinte trecho da última


carta de Camilo Torres dirigida aos colombianos:

"Agora o povo já nao eré em colsa alguma. O povo nao


eré ñas eleigóes. O povo sabe que os recursos legáis estáo
esgotados. O povo sabe que nao Ihe ficam senáo as armas.
O povo está desesperado e decidido a arriscar a vida, para
que a próxima geragáo de colombianos já nao viva na escra-
vidáo, ... para que os filhos, pelos quais os pais estáo dis-
postos a dar hoje a vida, recebam uma educagáo, um teto,
alimentos, vestes e principalmente a dignidade...

Cada revolucionario sincero tem consciéncia de que a


única salda que resta, é a das armas. O povo espera ansiosa
mente que os responsáveis, por seu exemplo e sua presenga,
daráo o sinal da batalha.

— 269 —
30 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 150/1972

Todos os patriotas colombianos devem colQcar-se em pé


de guerra. Aos poucos, em todos os recantos do país, chefes
guerrilheiros experimentados nao de se levantar. Nos também
devemos estar ¡prontos. Entender-nos com nossos vizinhos mais
próximos. Reunir vestes, medicamentos e provisoes afim de
nos prepararmos para um longo combate".

Os dizeres de Melville e Camilo Torres, embora apelem pa


ra o Evangelho e principios cristáos, nao constituem a única
maneira de se entender a mensagem de Cristo e do Novo Tes
tamento. Grande número de cristáos e — de modo especial —
o S. Padre Paulo VI, com o episcopado católico em geral, tém-
-ss mostrado contrarios á tese de que a revolugáo armada é so-
lucáo para a América Latina ou, de modo geral, para os países
em desenvolvimento. Vejamos o seu modo de pensar.

2. Evolujóo pacífica

Procederemos por etapas sucessivas.

Antes do mais, convém notar que a recusa de violencia


armada ou guerra civil nao quer dizer desconhecimento de ma
les vigentes na sociedade contemporánea, nem indiferencia ao
sofrimento dos pobres. A consciéncia de que há situacdes ini-
quas no mundo de hoje é bem viva no laicato e na hierarquia
da Igreja contemporánea. Donde a primeira observacáo:

2.1. Consciéncia dos males vigentes

A existencia de situacóes de desequilibrio social é fato que


todos os estudiosos apontam com estatísticas minuciosas e per
suasivas. É natural que se queira, seja tal desequilibrio remo
vido, a fim de que todos os hornera tenham a oportunidade
ideal de se alimentar, de se instruir e de trabalhar em todas as
partes do globo. Por isto dizia S. Santidade o Papa Paulo VI:

"A situagao presente deve ser encarada com coragem,


e as ¡njusticas que ela comporta, nao de ser combatidas e
extintas. O desenvolvimento exige transfórmaseos audazes, pro
fundamente (novadoras" (ene. "Populorum Progressio" rfi 32).

Fazendo eco ao Sumo Pontífice, os bispos, principalmente


no Terceiro Mundo, tém-se pronunciado em sentido análogo.

— 270 —
VIOLENCIA OU EVOLUCAO PACIFICA? 31

Eis, por exemplo, o que declarava o episcopado latino-ameri


cano reunido em Medellin (Colombia) no mes de agosto de 1968:

"Sao respohsáveis pela injustiga todos os que nao atuam


em favor da justica na medida dos meios de que dispóem, e
permanecem passivos por temor aos sacrificios e riscos pes-
soais que implica toda agáo audaz e verdaderamente eficaz
... Criar uma ordem social justa, sem a qual a paz é ilusoria,
é tarefa eminentemente crista" (cf. SEDOC n<? 5, novembro
1968, COI. 678s).

Em outubro de 1966, a 10' assembléia extraordinaria do


CELAM (Conferencia Episcopal Latino-Americana) havia con
cluido:

"O desenvolvimento exige mudangas de estrutura bem or


denadas, mas urgentes e eficazes. A Igreja, chamada a agir
diretamente no campo de sua competencia, julga ¡ndispensá-
vel formar a consciéncia crista, para que tome uma atitude di
námica de responsabilidade e participagáo".

Ao ler estas declaragóes, talvez julgue alguém que exor-


bitam da missáo da Igreja, a qual é essencialmente espiritual e
religiosa. — Nao há dúvida, á Igreja foi confiada a tarefa de
levar os homens a Deus; todavía a historia da salvagáo se ide-
senrola neste mundo, onde o cristáo se defronta com afazeres
temporais; é lidando com os misteres terrestres que o discípulo
de Cristo dá o testemunho de sua fé; por isto a Igreja quer que
seus filhos leigos se empenhem (nao, porém, de qualquer modo,
como abaixo se dirá) na promogáo de uma justa ordem social.

Vé-se, pois, que a visáo crista das realidades terrestres nao


é menos perspicaz, realista e dinámica do que a visáo nao crista
ou marxista. Acontece, porém, que, ao conceber a maneira de
remediar aos males da sociedade presente, cristáos e marxistas
se distanciam entre si.

2.2. A diferenca banca

1. Para o marxista, o ser humano é materia; as suas su-


perestruturas (senso de fraternidade, direito, moral, religiáo
...) sao fungóes da estrutura básica, que é a satisfagáo das ne-
cessidades materiais do homem. Por conseguinte, conforme o
marxismo, a sociedade será melhor ou plenamente harmoniosa

— 271 —
32 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 150/1972

quando se fizer a redistribuigáo dos bens materiais, de modo que


nenhum individuo seja proprietário, mas todos recebam do Es
tado as mesmas chances.

Nao é assim que pensa o cristáo. Este sabe que, além de


ser materia, o ser humano é espirito; a sua personalidade é
marcada por sua alma espiritual, que aspira, antes do mais,
ao amor, á justiga, á paz, á vida sem fim... Isto nao quer dizer
que o homem na térra se possa saciar exclusivamente com bens
espirituais, mas significa que nao pode haver solugáo para o
homem subdesenvolvido se nao se levam em conta também as
suas aspiragóes transcendentais; estas nao sao fungóes da ma
teria, mas sao táo básicas e imperiosas quanto a fome e a sede
físicas.

2. Em outras palavras: o cristáo professa um humanismo


integral, isto é, afirma que as mudangas sociais a ser realiza
das exigem a conversáo interior de cada homem; é preciso que
cada um se transfira do pecado para a graca, do egoísmo para
o amor, do orgulho para o servigo humilde; se nao se cuida
dessa transformagáo íntima do ser humano, vaos se tornam os
projetos de reforma de estruturas sócio-económicas. É por isto
que o cristáo nao pode simplesmente colaborar com os movi-
mentos revolucionarios de esquerda: estes partem de outro con-
ceito de homem e sociedade, julgando que a materia e a forga
bruta sao os grandes fatores da historia; tais movimentos pro-
pugnam naturalmente o recurso á violencia, ao passo que o
cristáo apregoa, antes do mais, a reforma do homem e a apli-
cagáo do amor, para que haja reforma de estruturas sociais.

3. Verdade é que muitos cristáos, ao propugnar a revo-


lugáo armada, nao tencionam pactuar com o marxismo, nem
abragar idéias materialistas. Acontece, porém, que, assim fa-
zendo, aceitam correr urna aventura arriscada: difícilmente es-
caparáo ao perigo de ser absorvidos e sobrepujadas pelo mar
xismo, que também apregoa a guerra armada. Para o revolu
cionario marxista, os fins justificam os meios, ao passo que
o mesmo nao se dá para o revolucionario cristáo: este terá que
respeitar sempre os valores da sinceridade, da lealdade, da fi
delidade á palavra, enquanto o marxista poderá tranquilamen
te julgar-se dispensado de fidelidade ao compromisso desde que
isto parega conveniente á sua causa. Tendo, pois, caminhado
junto com o cristáo até certo ponto, beneficiando-se da cola-
boragáo deste, o marxista nao recusará langar máo de qualquer

— 272 —
VIOLENCIA OU EVOLUCAO PACÍFICA? 33

recurso para suplantar e assujeitar o seu aliado cristáo quando


julgar que é chegada a hora para tanto.

4. OS. Padre Paulo VI em Bogotá (1968) aludía ainda


a outra justificativa de alianca entre cristáos e nao cristáos. É
a tese do Cristianismo seculaaista, que se pode assim formular:
embora os cristáos professem valores espirituais e transcerufen-
tais, estes nao devem influir no modo de agir dos cristáos na
vida pública e na sociedade contemporánea. Diante de tal tese,
S. Santidade lembrava a auténtica posiclo crista:

"A caridade para com o próximo depende da caridade


para com Deus. Conheceis os assaltos em nossos días sofridos
por esta doutrina de claríssima e inatacável origem evangé
lica: pretende-se secularizar o Cristianismo, olvidando a sua
essencial referencia á verdade religiosa, á comunháo sobrena
tural com a inefável e transbordante caridade de Deus para
com os homens... Esses assaltos tém por fim livrar o Cristia
nismo 'daquela forma de neurose que é a religiáo' (Cox), evi
tar qualquer preocupagáo teológica e oferecer ao Cristianismo
urna nova eficacia toda ela pragmática, a única que poderia
dar a medida de sua verdade, e o tornarla aceitável e operante
na moderna civilizagáo profana e tecnológica" (cf. SEDOC,
n9 5, novembro 1968, col. 647).

Ainda acrescentava o S. Padre:

"Nem o odio nem a violencia sao a forca da nossa cari


dade. Entre os diversos caminhos que levam a urna justa re-
generagáo social, nao podemos escolher nem o do marxismo
ateu, nem o da rebeliáo sistemática, nem milito menos o do
derramamento de sangue e o da anarquia. Distingamos nossas
responsabilidades das daqueies que fazem da violencia um no-
bre ideal, um heroísmo glorioso, urna teología complacente.
Para reparar erras do passado e para curar enfermidades atu-
ais, nao precisamos de cometer novas faltas, porque seriam
contra o Evangelho, contra o espirito da Igreja, contra os pró-
prios interesses do povo, contra o sinal feliz da hora presente,
que é o da justica rumo á fraternidade e á paz" (cf. SEDOC
ibd. col. 649s).

Sem comentarios a estas palavras de Paulo VI, resumi


mos quanto foi dito até agora nos seguintes termos: o cristáo,
diante da situagáo atual do mundo, é francamente favorável á
instauragáo da justica onde há desequilibrio injusto. Todavía

— 273 —
34 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 150/1972

ele nao admite que qualquer método seja lícito desde que ten-
da a tal objetivo; ele recusa o fatalismo histórico que está na
base das teorías em favor de revolugáo violenta; sabe que a
historia é arquitetada por criaturas livres e responsáveis, que
devem ser ajudadas a usar de sua liberdade e responsabilidade,
em vez de ser subjugadas como elementos meramente materiais.

Procuremos agora aprofundar as razóes pelas quais o cris-


táo recusa a violencia.

2.3. Por que nao a violencia armada ?

Dois sao os grandes motivos que justificam a atitude ne


gativa do cristáo: um, de ordem antropológica e histórica; ou-
tro, de índole teológica.

a) Em nomo do próprio hotnem

A violencia é, por sua natureza, um fenómeno emocional,


freqüentemente irracional, difícilmente controlável; é militas
vezes a negacáo do que deve ser um auténtico comportamento
humano. Por isto, via de regra, pode-se dizer que nao é por si
apta a garantir a justiga, que é essencialmente relacionamento
racional, nao emocional, comportamento controlável.

Com outras palavras: é difícil, se nao impossível, instau


rar um regime de liberdade e justiga a partir da violencia. Esta
destrói a fraternidade, a solidariedade e a equidade, precisa
mente ao pretender instaurá-las; além do que, dá muitas vezes
ganho de causa ao contendente mais forte, e nao ao mais justo.

Somente quem aceita urna visáo mecanicista da historia,


pode crer que a violencia seja fator ordinario e normal do pro-
gresso. Na verdade, porém, o desenvolvimento da sociedade, o
amadurecimento de um povo nao sao fatos que decorrem de cega
dialética; sao, antes, fenómenos humanos, que dependem da li
berdade e da responsabilidade dos individuos e das comunida
des. Nao basta, pois, aos reformadores sociais destruir ou pro
curar destruir o «status quo» para que outra ordem, mais jus
ta, se faga; este objetivo só é atingido mediante um processo
de maturagáo espiritual e moral que nenhum ato de violen
cia pode produzir «por encanto». Ao contrario, pode dar-se
que a violencia venha a ser fator negativo ou retardante no

— 274 —
VIOLENCIA OU EVOLUCAO PACIFICA? 35

desenvolvimento de um povo, pois destroi, muitas vezes de ma-


neira indiscriminada, iniciativas e empreendimentos justas ao
lado dos empreendimentos injustos.

Sao palavras de Paulo VI proferidas em Bogotá na famosa


«Jornada do Desenvolvimento» (23/VHI/68):

"Muitos, especialmente entre os jovens, insistem na neces-


sidade de mudar urgentemente as estruturas sociais que, se
gundo eles, nao permitiriam a obtencáo de efetivas condicdes
de justica, para os individuos e para as comunidades; alguns
concluem que o problema essencial da América Latina nao
pode ser resolvido senáo com a violencia.

Com mesma lealdade com que reconhecemos encontra-


rem tais teorías e atitudes práticas a sua motivacao última em
nobres impulsos de justica e de solidariedade, devemos dizer
e reafirmar que a violencia nao é evangélica, nao é crista e
que mudancas bruscas e violentas de estruturas seriam iluso
rias e certamente nao em conformidade com a dignidade da
populacio, a qual exige que as necessárias transformagoes
se realizem de dentro para tora, isto é, mediante urna conve
niente tomada de consciéncia, urna preparagáo adequada e
aquela participagáo efetiva de todos, que a ignorancia e as
condicóes de vida, por vezes infra-humanas, nao permitem ho-
je garantir" (SEDOC n<? 6, dezembro 1968, col. 782).

Alias, na encíclica «Populorum Progressio», baseando-se


em motivos de ordem antropológica e histórica, S. Santidade
formulou semelhante juízo sobre a violencia: «é fonte de no
vas injusticas, introduz novos desequilibrios e provoca novas
ruinas. Nao se pode combater um mal real a prego de um mal
maior» (n' 31).

Procuremos julgar a questáo também e diretamente

b) Em nome do Evongelho

O Evangelho é essencialmente arauto do amor entre os


homens, repudiando tudo que possa fomentar o odio ou a divi-
sáo, O amor constituí, portanto, a arma com a qual o cristáo
deve procurar mudar as estruturas injustas. É o que decorre,
por exemplo, do sermáo sobre a montanha (Mt 5-7), em que
Jesús louva os mansos e os pacíficos («pacífico» é aquele que

— 275 —
36 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 150/1972

«faz a paz», empenhando-se por ela), e condena a antiga lei do


taliáo («olho por olho, dente por dente»). É o que se pode de-
preender também da palavra de Jesús que proibe a Pedro usar
da espada para ferir os enviados do sinedrio (cf. Mt 26,52-54).

Vé-se, pois, que em tese o cristáo nao pode apregoar a vi


olencia e a revolugáo armadas como instrumentos normáis e or
dinarios de reforma sociaL Todavía nao seríamos fiéis ao pen-
samento cristáo se apenas afirmássernos esta proposigáo. Daí
o eeguinte subtítulo:

3. A questóo da revolugáo ¡usta

O cristáo sabe que o amor e a mansidáo integram o grande


programa apontado pelo Evangelho a todos os homens. Toda-
via ele também sabe que o pecado ainda existe na historia dos
homens, impondo-se por vezes de maneira tenaz e violenta.
Consciente disto, o amor cristáo pode ver-se obrigado a opor
violencia a violencia, a fim de que a ordem e os valores evan
gélicos nao sejam expostos á burla e á sufocacáo. A opgáo pela
violencia será sempre delicada e difícil para o cristáo, pois este
a deve repudiar por principio.

Os teólogos elaboraram conseqüentemente o conceito de


«guerra justa», que a encíclica «Populorum Progressio» (n' 31)
nao deixa de reconhecer. — A guerra justa há de atender aos
seguintes requisitos:

1) Causa justa: a guerra legítima deve procurar defen


der ou restabelecer os justos direitos iniquamente violados.

2) Reta intencao: a finalidade da legitima guerra há de


ser a paz, ou seja, a convivencia dos povos entre si, e nao a
eliminagáo ou sufocagáo injusta de determinada populacáo.

3) Observancia dos códigos internacionais: nao se apli-


quem meios ou métodos de guerra reprovados pelo direito na
tural ou por justos tratados positivos.

4) Bazáo .proporcional: os danos causados pela guerra


nao sejam mais vultuosos do que os bens ameagados pelo adver
sario injusto.

— 276 —
VIOLENCIA OU EVOLUCAO PACÍFICA? 37

5) Ultima instancia: antes de se empreender urna guer


ra justa, tentem-se todos os recursos possíveis para resolver
em termos pacíficos o confuto em questáo. Somente em caso
de absoluta impossibilidade de solugáo pacífica, empreenda-se
a luta armada.

Nos tempos atuais, quando os interesses dos diversos po


vos sao cada vez mais variados e complexos, torna-se sempre
mais difícil aplicar os criterios ácima e afirmar tranquilamente
que determinada guerra seja justa ou injusta. Isto nao invalida
o conceito teórico de «guerra justa». Quanto á América Latina,
o sabio pensamento cristáo e o magisterio da Igreja julgam
que nao é o caso de recorrer á revolugáo armada para se ins
taurar nova ordem socio-económica. Apresentam-se vias pací
ficas de evolugáo para os povos jovens da América Latina, que
agora váo despertando para seu destino na historia da huma-
nidade.

Educagáo, abrangendo nao somente os aspectos científicos,


técnicos e culturáis, mas também a dimensáo ética e crista do
homem — eis a necessidade mais urgente e decisiva da América
Latina, onde se acham enormes energias humanas e materiais
ainda em estado latente.

Resta abordar a questáo da pressáo moral ou da náo-vio-


léncia atuante, que tem encontrado voga entre os adversarios
da revolugáo armaSa. É o que faremos no artigo seguinte.

"SÓ SE VÉ BEM COM O CORACÁO.

O ESSENCIAL É INVISÍVEL PARA OS OLHOS."

(Antoine de Saint-Exupéry)

— 277 —
Nem mesmo urna e abastece as máquinas que
Companhia que há 60 anos abrem novas estradas.
v'em acompanhando o • Mas su a
progresso, presente em todo responsabilidade máior é
o país (com cerca -de 3500 . com gente.

postos de servic^)), ha Seu pessoal é tremado


industria.(com mais de 300 de acordó com as modernas
prodütos), no campo . técnicas administrativas.
e no lar. A Esso sabe que
A Esso tém urna precisa de gente, porque
tradigáo de pioneirismo. ninguém, nem mesmo urna
Chegou á grande compa
Transamazónica com as nhia, pode fazet
pfimeiras frentes cíe trabalho nada sozinho.
Opcáo Intermediarla:

e a nao-violencia ativa?

Em sintese: A náo-violéncia ativa é a resistencia a urna ordem de coi


sas tlda como Injusta, nSo mediante o recurso ás armas, mas por meio de
greves, bolcotes, sonegacao de impostos, passeatas, jejuns, consclentl-
zacio do público... Em certos casos, é dita "pressao moral". Seus princi
páis representantes sao o Mahatma Gandhl, o pastor Martín Luther King,
o arceblspo D. Hélder Cámara... O juizo a ser proferido sobre a nflo-vlo-
léncla ativa deve levar em conta que: 1) em nao poucos casos, a náo-vlo-
léncia vem a ter algo da brutalidade da violencia (notem-se as greves);
2) geralmente a nSo-violencla provoca represalias violentas da parte das
autoridades constituidas. Em conseqüéncla, ve-se que a nao-violéncla há
de ser lulgada caso por caso; há sltuacSes em que ó legitima (tenha-se
em vista, por. exemplo, a atuacfio de Martín Luther Klng nos EE. UU.); há
outras sltuacfies, porém, em que a nao-violencia suscita males plores do
que aqueles que ela pretende sanear; se, por exemplo. Pió XII, durante
a guerra de 1939-1945, tivesse presslonado mals fortemente os nacional-so
cialistas da Alemanha, teria provocado, da parte de Adolf Hitler, mais re
quintadas brutalidades contra judeus e crlstáos, pois o governo alemfio
dominava quase toda a Europa a partir de 1940.

Em suma, a nSo-violéncia nao é Ilegitima em si; mas requer-se que seja


realmente justificada e aplicada com propósito.

Rcsposfa: Entre a revolugáo armada e a evolucáo pacifica,


muitos pensadores preconizan! a náo-violéncia ativa, de que se
tornaram famosos pioneiros o Mahatma Gandhi, o pastor
Martín Luther King, o líder italiano Danilo Dolci. Evitando a
índole brutal e sangrenta da primeira, assim como a aparente
passividade da segunda, a náo-violéncia ativa parece ser a forma
ideal de contribuicáo para a renovac.áo da sociedade.

Vamos, pois, examinar em que consista propriamente, para


poder tentar um juizo sobre ela.

— 279 —
40 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 150/1972

1. Nao-violencia ativa: que é ?

Náo-violéncia ativa é a resistencia oposta a urna situacáo


tida como injusta; traduz-se pelo nao emprego de armas, mas
por greves, sabotagens, sonegagáo de impostas, recusa de pres
tar servico militar, como ainda por jejuns, passeatas silencio
sas, consdentizacáo da opiniáo pública... Tal tipo de reagáo,
em alguns casos, se chama também prassáo mqral; visa a in
fluir sobre o senso ético e humanitario dos ¡detentores do poder,
levando-os a tomar consciéncia mate viva dos males que este-
jam afligindo a sociedade. Alguns tipos ditos de náo-violéncia
ativa aproximam-se muito da violencia brutal; acarretam pre-
juízos físicos ou materiais, como no caso de greves e sabota
gens. Visto que sao múltiplas as formas que a náo-violéncia po
de asumir, abaixo daremos a palavra a escritores que ilustra-
ram de algum modo o que entendem por náo-violéncia ativa.

a) Mohandas Karamchand Gandhi (*1869), dito «Ma-


hatma» (isto é, Grande Alma)1 foi um homem de estrutura
pequeña, físico frágil, olhos negros e fundos, que se revestía de
paño branco, trazia boné branco e os pés descalcos. Alimen-
tava-se de arroz, frutas e só bebia agua; jejuava severamente,
dormia pouco e no chao, e trabalhava corajosamente. Apregoa-
va a náo-cooperagáo com o governo inglés estabelecido na india,
a fim de obter a independencia nacional. Entre as suas palavras
mais significativas, encontram-se as seguintes:

"Quisera sofrer todas as humilhagóes, todas as torturas,


o ostracismo absoluto e até a própria morte, para impedir que
nosso movimento se torne violencia ou precursor de violen
cia..."

Todavia Gandhi distinguía ciosamente da covardia a sua


posicáo; antes ser violento que covarde, diría ele:

"Onde só resta a escolha entre covardia e violencia, acon-


selharei violencia... Cultivo a coragem de morrer sem matar.
Mas quem nao tem essa coragem, desejo-lhe que cultive a
arte de matar e de ser morto antes que fugir vergonhosamente
ao perigo. Porque aquele que foge, comete urna violencia men
tal; foge porque nao tem a coragem de ser morto matando...
Mil vezes eu aconselharia a violencia antes que o acovarda-
mento de urna populacáo inteira... Prefiro francamente ver

1 Maná = grande; alma = alma.

— 280 —
. NAO-VIOLfiNCIA ATIVA? 41

a fndia recorrer ás armas para defender-se a vé-la testemunha


covarde de sua própria desonra.

Todavia sei que a nao-violéncia é infinitamente superior


á violencia, e que o perdao é mais viril do que o castigo. O
perdao é o adorno do soldado. Abster-se, porém, de castigar
nao é perdao senao quando existe a possibilidade de castigar.
Nao tem sentido quando realizado por urna criatura fraca...
Nao creio na fraqueza da India. Cem mil ingleses nao podem
espantar trezentos milhóes de seres humanos... E, por outro
lado, a torga nao se acha nos meios físicos, ela reside em
urna vontade indomável... Náo-violéncia nao é submissáo
benévola á desgrasa. Nao-violéncia opde toda a forca da alma
á vontade do tirano. Um só homem pode assim desafiar um
imperio e provocar a queda deste".

O prego da libertagáo nao violenta seria o sofrímento, que


Gandhi assim elogia:

"O sofrímento é a insignia da estirpe humana... É a con-


digáo indispensável do ser. A vida sai da morte. Para que o
trigo brote, é preciso que a sementé morra. Jamáis coisa algu-
ma se elevou sem passar pelo fogo do sofrímento... Ninguém
pode escapar a este... O progresso consiste apenas em pu
rificar o sofrímento, evitando fazer os outros sofrer... Na me
dida em que mais puro é o sofrímento pessoal, maior é o
progresso... Náo-violéncia é sofrímento consciente. Tomei a li-
berdade de apresentar á india a antiga lei do sacrificio de si
mesma, a lei do sofrímento. Os Rishis que descobriram a lei da
náo-violéncia em meio ás piores violencias, eram maiores ge
nios do que Newton, guerreiros mais ilustres do que Welling-
ton: realizaram a inutilidade das armas que conheciam... A
reiigiao da náo-violéncia nao é somente para os santos; é para
o •comum dos homens. é a lei da nossa especie, como a vio
lencia é a lei do animal bruto. O espirito dorme no bruto. A
dignidade do homem requer urna lei mais elevada: a forca do
espirito... Quero que a India pratique esta lei; quero que
tenha consciéncia de seu poder. Ela tem urna alma que nao
pode perecer. Essa alma pode desafiar todas as forcas mate-
riais do mundo inteiro".

Grande impulso a praticar a náo-violéncia terá sido dado


a Gandhi pela leitura do Evangelho, como ele próprio confessa:

"Foi o Novo Testamento aue realmente me despertou.


Quando li no Sermáo da Montanha passagens tais como 'Nao

— 281 —
42 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS> 150/1972

resistáis aos maus; se te esbofetearem na face direita, apre-


senta a esquerda1, senti-me simplesmente transportado de ale
gría" (textos transcritos da autobíografia de Gandhi).

A coragem pacífica de Gandhi foi bem sucedida, apesar


da tragedia que marcou o fim de vida do Mahatma. Este mor-
reu assassinado aos 30 de Janeiro de 1948, tendo iniciado a sua
campanha de náo-colaboracáo em 1920. Despertou trezentos
milhóes de compatriotas, emocionou o Imperio Británico e em-
preendeu na política o mais poderoso movimento de todos os
tempos.

b) Também merece atencáo a figura de Martín Luther


King, o protagonista do anti-racismo nos EE. UU., do qual
transcrevemos os seguintes dizeres:

"Aceitar passivamente um sistema injusto é colaborar com


ele; o homem oprimido entáo compartilha a maldade do seu
agressor. Há tanta obrigagio moral em nao cooperar com o
mal como em cooperar com o bem. O oprimido nao deve dar
repouso á consciéncia do opressor. A religiáo recorda que to
do homem é o guardiáo de seu irmáo. Aceitar a injustiga pas
sivamente equivale a dar justificativa moral ás agóes do opres
sor; é uma maneira de deixar dormir a consciéncia dele. Nesse
momento o oprimido deixa de ser o guardiáo de seu irmSo".

Na véspera de morrer assassinado (o que se deu aos


4/IW1968), Luther King fez a seguinte declaracáo:

"Temos diante de nos dias diffceis, mas isto me é indife


rente agora... Como todos, também eu gostaria de ter uma
vida longa... Mas so desejo a vontade de Deus. Ele permitiu-
-me que subisse ao cume da montanha, e de lá eu vi a térra
prometida. Pode acontecer que eu nao chegue lá convosco,
mas quero que saibais hoje que o nosso povo o atingirá. Por
isto estou feliz nesta tarde e nao receio homem algum. Meus
olhos viram a gloria da vinda do Senhor" (transcrito de "Eccle-
sia" n<? 232, julho 1968, p. 64).

O último livro de M.L. King «Para onde vamos?» termina-


-se com estas palavras:

"Hoje ainda temos a escolha entre a coexistencia nao-vi


olenta ou a codestruigao violenta. É esta talvez a última chan
ce que se .oferece á humanldade, de poder optar entre o caos
ou a comunidade".

— 282 —
NAO-VIOLENCIA ATIVA? 43

c) Entre nos, tornou-se notoria a figura de D. Hélder Cá


mara, arcebispo de Olinda-Recife, cujos discursos e conferen
cias no estrangeiro seo famosos. Dom Hélder é o iniciador (com
32 bispos do Brasil) do «Movimento de Pressáo Moral e Liber
tadora», que vem a ser urna forma de náo-violéncia mediante
o despertar de consciéncias dos homens de hoje. Sao palavras do
arcebispo de Recife:

"Devemos organizar-nos para exercer urna pressáo mo


ral libertadora, que esteja em harmonia com os principios dos
Direitos do Homem promulgados pelas Nagóes Unidas. Nossa
pressáo visará a eliminar toda forma de servidáo e a mobili-
zar a opiniáo pública para ajudar as massas a tornar-se um
verdadeiro povo, para defender seu direito a urna vida livre
e á seguranga social".

"Acuso os que realmente favorecem a violencia, todos


aqueles que, de direita ou de esquerda, ferem a justiga e im-
pedem a paz.

Minha vocagáo pessoai é a de peregrino da paz, segundo


o exemplo de Paulo VI; pessoalmente, ¡prefiro mil vezes ser
morto a matar.

Esta posigáo pessoai funda-se sobre o Evangelho. Toda


urna vida de esforco para compreender e viver o Evangelho
leva-me á conviegáo profunda de que o Evangelho, se ele po
de e deve ser chamado revolucionario, é no sentido de que
ele exige urna conversáo de cada um de nos. Nos nao temos
o direito de nos fechar no egofsmo; temos de nos abrir ao
amor de Deus e ao amor dos homens. Basta pensar ñas bem-
-aventurangas — quintesséncia da mensagem evangélica —
para descobrir que a escolha para os cristáos parece clara:
nos, cristáos, estamos do lado da náo-violéncia, que nao é de
modo algum escolha de fraqueza e passividade. A náo-vio
léncia é acreditar na torga da verdade, da justiga e do amor
mais do que na forga das guerras, dos morticinios e do odio"
("Informations Catholiques Internationales" n<? 312, 15/V/1968,
P- 7).

"Ninguém se perturbe: estou longe de pregar o odio; apre-


goo o amor. Creio muito particularmente nos métodos demo
cráticos, em vez de conspiragóes e guerrilhas" ("Revolugáo
dentro da paz". Rio 1968).

— 283 —
44 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 150/1972

"Pego a meus amigos que já optaram, ou que pensam em


optar, em favor da violencia: nao confundam em absoluto nao-
-violéncia e passividade, covardia, falta de coragem. Está sen
do ultimada atualmente urna pressáo moral organizada, atu-
ante, eficaz, que aproveitará de todos os recursos da publici-
dade moderna. E veréis os privilegiados, em reagáo contra
a nossa agáo pacífica, encarregar-se de demonstrar que a
náo-violéncia nao é nem táo cómoda nem táo simplória quanto
alguns pensam" ("Informations Catholiques Internationales"
n9 315, 1/VII/1968, p. 5).

d) Barbara Deming, no boletim «Revolution, Violent and


Non Violent» (suplemento da revista «Liberation» 1968) p. 6,
observa o seguinte:

"As palavras sao insuficientes: Gandhi chamava a agáo


náo-violenta satyagraha, o que se pode traduzir por 'agarrar
se á verdade'. É isto que se requer: agarramo-nos á verdade
tal como a vemos. É preciso que nos agarremos a ela com to
do o nosso peso. Nao nos contentemos com dizer: 'Tenho o
direito de sentar-me aqui'; realizemos essa verdade, e sentemo-
-nos ali. Nao nos limitemos a dizer: 'Se nos somos clientes
nessa toja, nao é normal que ai jamáis sejamos tratados como
clientes!' Nao digamos apenas: 'Nao creio nessa guerra'; recu
semos vestir um uniforme. Nao nos contentemos com dizer: 'O
emprego do napalm é coisa atroz'; recusemos pagá-lo so ne
gando os impostes. E assim por diante.

Apliquemos todo o nosso peso económico, nosso peso po


lítico, social, psicológico, nosso peso físico. Trata-se de muito
mais do que urna exortagáo moral. Aqueles que combatem por
ela, deveriam reconhecer que nos também nos apoiamos so
bre a forga".

Urna vez exposto o pensamento de grandes arautos da náo-


-violénda, impóe-se a pergunta:

2. Lícita ou nao?

1. O fenómeno da náo-violéncia é complexo e, por isto,


difícil de ser julgado em tese ou de maneira geral.

Com efeito, note-se que a náo-violéncia pretende nao re


correr as armas nem provocar derramamento de sangue, mas

— 284 —
NAO-VIOLENCIA ATIVA? 45

apenas tocar as consciéncias para provocar ou catalisar a reta


evolugáo dos homens e das estruturas da sociedade. Todavía, co
mo foi dito atrás, algumas formas de náo-violéncia aproxümam-
-se assaz da violencia direta, pois provocam males materiais ou
físicos e nao apenas convicgóes ou concepgóes novas. Tal é o ca
so de greves, sabotagens, boicotes. Nos EE. UU. urna empresa
de ónibus boicotada pelos cidadáos de raga negra foi levada á
falencia. — Ao lado destas formas mais marcantes de protesto
náo-violento, outras formas se registram que nao atingem pro-
priamente as condicóes físicas ou materiais da sociedade: te-
nham-se em vista o jejum empreendido por um líder ou um gru
po, urna passeata silenciosa...

As formas menos brandas da náo-violéncia (sabotagens,


greves, boicotes...) provocam fácilmente odios, divisóes, re
presalias entre os homens. Poder-se-ia mesmo dizer: de modo
geral, a náo-violéncia, por mais bem intencionada que seja, sus
cita fácilmente a reagáo violenta ou armada das pessoas ou
instituigóes atingidas. Ela redunda assim em provocagáo á vio
lencia: o poder constituido vé-se obligado a empregar meios vi
olentos para assegurar a sua subsistencia. Este contra-golpe
dialético é inevitável.

2. Tais fatores nos levam a proferir um juízo vago sobre


a náo-violéncia considerada de maneira genérica ou abstraía.
Para se poder falar com precisáo, é necessário considerar cada
caso de náo-violéncia de per si. A nao violencia pode ser legíti
ma e justificada aos olhos da consciéncia crista; tal é prova-
velmente o caso da campanha desencadeada por Martín Luther
King; será legitima e válida, pois nao se entende, do ponto de
vista da consciéncia crista no século XX, a discriminacáo racial.
A náo-violéncia entáo é um mal necessário,... necessário por
que a humanidade aínda caminha sob a infuéncia do pecado.

É preciso, porém, que o cristáo que assuma urna campanha


de protesto náo-violento, se acautele decididamente contra to
da especie de paixáo e obsessáo; procure servir únicamente a
Deus e ao próximo, inspirando-se sempre no amor e evitando
toda ofensa desnecessária.

Outros tipos de pressáo moral podem ser bem intenciona


dos, mas, em vez de beneficiar a boa causa, podem prejudicá-la
seriamente, provocando, da parte dos poderosos, tais represa
lias que se deve entáo questionar a validade da campanha náo-
-violenta: será oportuno prossegui-la, quando suscita tais resul-

— 285 —
46 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 150/1972

tados? Á guisa de exemplo, tenha-se em vista o caso do Papa


Pió XII durante a guerra ide 1939-1945: S. Santidade sofría du
ramente pela injustiga praticada contra os judeus por parte do
regime nacional-socialista da Alemanha. Pío XII deu a saber as
autoridades hitleristas o seu protesto contra o anti-semitismo.
Podía, porém, ter chamado mais forte e concitado os povos do
mundo ao repudio do anti-semitismo; a pressáo moral contra
o nazismo era inegavelmente justa. Todavía pergunta-se: teria
sido eficaz e proficua? Respondem os peritos negativamente; se
Pío XII tivesse desenvolvido campanha mais forte contra o anti-
-semitísmo, teria provocado a violenta represalia do nazismo,
nao só contra os israelitas, mas também contra grande núme
ro de outras pessoas inocentes; o nacional-socialismo a partir
de 1940 dominava quase toda a Europa; podía fazer impune
mente quase tudo que a furia de seus mentores tentasse em-
preender contra os inocentes residentes na Europa. Daí dizer-se
que seria inoportuna urna mais intensa pressáo moral de Pío XII
sobre o hitlerismo em favor dos judeus.

Ao cristáo tocará, pois, julgar sempre com prudencia e es


pirito de fé todo movimento que traga em si os gérmens de odio
e divisóes facciosas entre os homens.

Bibliografía:

Mohandas Karamchand Gandhl, "Minha vida e minhas experiencias com


com a verdade", 3? edlcao 1964. Edades "O Cruzeiro".

Hélder Cámara, "Revoluto dentro da paz". Rio de Janeiro 1968.

B. Hárlng, "A contestado dos nao-violentos". Editorial Perpetuo So


corro, Porto, Portugal.

Revista "Concllllum" n? 35 (ed. francesa), ano de 1968.

"Selecciones de teología" n? 38, vol. 10 (1971), fascículo dedicado


Intelramente á teología política e aos temas correlatos.

"Informatlons Catholiques Internationales", fascículos qulnzertais do


ano de 1968.

"IDOC Internatlonal", 1/V/1969.

Estéváo Bettencourt O.S.B.

— 286 —
resentía de livros
Os flitios do divorcio, por Jeanne Delais; traducáo de Thamar Lin-
denberg Sette; prefacio de Maria Junqueira Schmidt. — Editora Agir,
Rio de Janeiro 1972, 135 x 210 mm, 220 pp.
Este livro se deve a urna prolessora e orientadora educacional que
se dedlcou, mediante inquéritos e entrevistas variadas, a averiguar a
situacao em que sao colocados os filhos em conseqüéncia do divorcio
dos genitores. Com multo senso psicológico, Jeanne Delais ouviu os fi
lhos do divorcio, leu suas cartas e dassiíicou os respectivos depoimentos
em seccoes que constituem o conteúdo desse livro, com os seguintes
títulos (entre outros): «Causas do divorcio segundo as criancas». «Cri-
ancas dilaceradas», «Padrastos do domingo», «Perdáo, Jamáis!» A
leitura dessas páginas poe o leitor diante do realismo de cenas profun
damente dolorosas e angustiantes; um por um, todos os aspectos do
problema, váo-se desvelando: degradagáo moral, vulgaridade de sen-
timentos, forca do odio... Resulta de tal leitura a conclusáo de que
quase sempre os filhos sao as grandes vítimas do divorcio, quer este
seja considerado desejável, quer nao. Os filhos do divorcio até o fim
da vida conservam as impressdes traumatizantes colhidas na infancia,
quando seus pais se digladiavam ou viviam separados; «eles jamáis
esquecerao o que marcou a sua juventudes» (p. 220).
O livro de Jeanne Delais constitui um documentarlo de alto valor,
muito apto a despertar a atencao dos adultos para urna face do pro
blema do divorcio que geralmente é menos considerada: enquanto se
pensa em salvar, mediante o divorcio, a felicidade dos cdnjuges em
litigio, nao se leva em conta a ruina moral e material que a pretensa
solucao geralmente acarreta para os filhos, que seráo os portadores
do amanhá da sociedade.
Encontró com o infinito, por Carlos da Silveira. — Gráfica Olím
pica Editora Ltda., Rúa da Regeneracáo 475, Rio de Janeiro 1971,
140 x 210 mm, 302 pp.
Carlos da Silveira estuda as origens do mundo e do homem, do
ponto de vista cientifico, filosófico e cristao. Apresenta rigorosamente
os dados da cosmología e das demais ciencias naturais, recorrendo &
nomenclatura técnica; mas nunca se detém numa análise meramente
científica dos fatos; examina também a questao do sentido e do valor
que o mundo e o homem tém; a mensagem da Biblia é assim utilizada.
O autor recorre a estilo poético — o que dá certa graca as suas pági
nas. É interessante como num total de 302 páginas Carlos da Silveira
consiga explanar tantos temas: expansáo e retragao do universo, Oreo-
piteco e Homo Sapiens, celibato do clero, conselhos evangélicos, «uni-
sex»... Ao servir-se da Biblia, o autor é por vezes superficial; veja-se,
por exemplo, a interpretacáo do firmamento bíblico á p. 110. A aborda-
gem um tanto sumaria de assuntos importantes parece desnecessá-
ria num livro desse Upo. Isto nao impede que a obra tenha valor
por apresentar urna slntese muito válida entre ciencia e fé; o conjunto
é realmente positivo e útil.
VocacSo: tnquietaoóes e pesquisas, por Chenu, Congar, Garrone,
Léger, Tillard, Jeanne d'Arc, Carrier; traducao de M. Cecilia de M.
Duprat. Colecáo «Eu sou aquele que serve» 1 — Edicñes Paulinas, Sao
Paulo 1971. 130x200 mm, 188 pp.
Este livro, que é urna coletánea de estudos, enfrenta o arduo pro
blema das vocaeñes sacerdotais e religiosas. As necessidades da Igreja
e do mundo váo-se multiplicando de maneira impressionante, enquanto
se nota que vao escasseando os operarios do Senhor. A coletánea de

— 287 —
48 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 150/1972

estudos ácima pretende ser um testemunho de que bispos e padres pen-


sam seriamente no assunto: analisa Batlsmo e vocagáo á vida consagra
da, mentalidade e psicología dos jovens, despertar e amadurecimento
das vocagóes, o padre e o Religioso no mundo de hoje. Oportuna énfa-
se é dada á fé profunda e á boa íormagao teológica do padre, assim
como á íungáo da vida religiosa como sinal dos bens deíinitivos em
meio á vida temporal (pp. 104 e 110). — O livro merece ser difundido
em ambientes de formacáo, assim como entre sacerdotes, Religiosos e
Religiosas, que encontrarao ai substancioso material para reflexao e
progresso espiritual.

Equilibrio psíquico e vida consagrada, por Romain Matignon; tra-


dugáo de M. Cecilia de M. Duprat Colecáo «Eu sou aquele que
serve» 6. — Edigóes Paulinas, Sao Paulo 1972, 130x200 mm, 142 pp.

Esta obra saiu conjuntamente com a anterior, completando-a, pois


desenvolve os aspectos psicológicos que servem de substrato á vida
da grasa e á agáo do Espirito Santo numa pessoa chamada ao servigo
do Senhor. Exp8e sabiamente as dimensSes psicológicas da opgáo, do
engajamento, da vivencia consagrada, da perseveranga... — o que é
muito necessário. Nao se esquegam, poréra, os fatores sobrenaturais da
vida consagrada; em última analise, é Deus quem age no cristáo voca-
cionado; se este é dócil á voz do Espirito, pode superar certos obstá
culos que a técnica humana ná0 conseguirla suplantar. Esta observagao
em nada diminuí o valor da obra de Romain Matignon, digna de ser
recomendada.
E. B.

NO PRÓXIMO NÚMERO:
Legalizacáo do aborto
«O que se faz por amor nao é pecado»
Jesús quem é ? em dois documentos

«PERGUNTE E RESPONDEREMOS»

Assinatura Anual Cr$ 30,00


Número atrasado Cr$ 4,00
Volumes encadernados de 1958 e 1959 (prego unitario) Cr$ 35,00
Índice Geral de 1957 a 1964 Cr$ 10,00
Índice do qualquer ano Cr$ 3,00

EDITORA LAUDES S. A.

BEDACAO DE PR ADMINISTBACAO
Caixa Postal 2.666 Rúa SOo Rafael, 38, ZC-09
ZC-00 20000 Rio de Janeiro (GB)
20000 Rio de Janeiro (GB) Tels.: 268-9981 e 268-2796

— 288 —
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Essa diferenca chama-se experiencia


em Boeing, que só a VARIG tem. Boeing
nao é novidade para a VARIG. Há mais
de 12 anos, nossas tripulacóes voam
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Agora, em suas viagens pelo Brasil, prefira
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B HORIZONTE - AV. JOAO PINHEIRO, 146 - 7." ANI).-Tels.:22-6957e22-6120
EMBRATUR REG. GB • 14/SP-518/R8-67/MG-87 CAT. "A"

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