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Projeto

PERGUNTE
E
RESPONDEREMOS
ON-LINE

Apostolado Veritatis Spiendor


com autorizagáo de
Dom Estéváo Tavares Bettencourt, osb
(in memoriam)
APRESENTAQÁO
DA EDIpÁO ON-LINE
Diz Sao Pedro que devemos
estar preparados para dar a razáo da
nossa esperanca a todo aquele que no-la
pedir (1 Pedro 3,15).

Esta necessidade de darmos


conta da nossa esperanca e da nossa fé
hoje é mais premente do que outrora,
' visto que somos bombardeados por
numerosas correntes filosóficas e
religiosas contrarias á fé católica. Somos
assim incitados a procurar consolidar
nossa crenca católica mediante um
aprofundamento do nosso estudo.

Eis o que neste site Pergunte e


Responderemos propóe aos seus leitores:
aborda questóes da atualidade
controvertidas, elucidando-as do ponto de
vista cristáo a fim de que as dúvidas se
dissipem e a vivencia católica se fortalega
no Brasil e no mundo. Queira Deus
abengoar. este trabalho assim como a
equipe de Veritatis Splendor que se
encarrega do respectivo site.

Rio de Janeiro, 30 de julho de 2003.

Pe. Esteváo Bettencourt, OSB

NOTA DO APOSTOLADO VERITATIS SPLENDOR

Celebramos convenio com d. Esteváo Bettencourt e


passamos a disponibilizar nesta área, o excelente e sempre atual
conteúdo da revista teológico - filosófica "Pergunte e
Responderemos", que conta com mais de 40 anos de publicacáo.
A d. Esteváo Bettencourt agradecemos a confiaga
depositada em nosso trabalho, bem como pela generosidade e
zelo pastoral assim demonstrados.
00
SUMARIO

Solutpoes Mágicas

Pornografía e Violencia nos meios de comunicacao


t/)
A quantas anda o Ecumenismo?
LU

O Nomeacao de Bispos e Autoritarismo

00 Ecos de carta a Fidel Castro

Projeto de nova Legislacao Religiosa na URSS

0 Holismo: que é?

5
LU

_l

CD

O
CC
o.

ANO XXX SETEMBRO 1989 328


GUNTE E RESPONDEREMOS SETEMBRO - 1989
Publicacao mensal N? 328

■etor-Responsável: SUMARIO
Estéváo Bettencourt OSB
Autor e Redator de toda a materia Solucoes Mágicas 385
publicada neste periódico
Um documento da Santa Sé:
Pornografía e Violencia nos me ios de
etor Administrador:
Comunicacáo 386
D. Hildebrando P. Martins OSB
Ensinamentos preciosos:
A Quantas anda o Ecumenismo? 393
mimstracao e distribuicao:
Edicoes Lumen Chrísti Equívocos se desfazem:
Dom Gerardo. 40 - 5? andar. S/501 Nomeacáb de Bispos e Autoritarismo . 400
Tel.:(021) 291 7122
Bispos de Cuba:
Caixa Postal 2666 Ecos de carta a Fidel Castro 407
20001 - Rio de Janeiro RJ
Fruto da Perestroika:
Projeto de nova Legislacáo Religiosa
na URSS 412

MAftfjVt.S SARAJVA"
Nova corrente filosófica:
O Holismo: Que é? 425

NO PRÓXIMO NÚMERO:

329-Outubro-1989

25 anos de Liturgia renovada. - Doutrina Social da Igreja: Orientacoes. -


Ateísmo e Nova Religiosidade. - O Santo Sudario: um ano depois... Mila-
gre e "Milagres" - "O Grande Complb" (J.C de Castro Rios).

COM APROVACÁO ECLESIÁSTICA

ASSINATURA ANUAL: NCzS 20,00 - Número avulso: NCzS 2,00


_Pagamento (a i'srulrt.il —

1. VALE POSTAL á agencia central dos Correios do Rio de Janeiro em nome de Edicoos
"Lumen Christi" Caixa Postal 2666 20001 Rio de Janeiro - RJ.

2. CHEQUE NOMINAL CRUZADO, a favor de Edipoes "Lumen Christi" (enderepo ácima).

3. ORDEM DE PAGAMENTO, no Banco do Brasil, conta N? 31.304-1 em nome do Mos-


teiro de Sao Bento, pagável na agencia Praca Mauá/RJ N? 0435-9. (Nao enviar através
de DOC ou depósito instantáneo - A ¡dentificapio é difícil).
Solugóes Mágicas \-\H
A inclemencia da vida leva muitas pessoas a desesperar ou descrer das
solucoes racionáis ou cientfficas para os seus problemas. Na ansia de se ver
livres dos mesmos, sao propensas a projetar solucoes fantasiosas, "¡media
tas", devidas a pretensas intervencSes da Divindade ou de foreas ocultas.

Tal tendencia é tao antiga quanto a humanidade; dá testemunho disto


a historia da magia. Em nossos días, porém, o fenómeno é especialmente inten
so, dando origem ás numerosas correntes religiosas, que se apresentam ao
homem moderno como portadoras de respostas cabais, garantías de sucesso,
vei'culos de curas, empregos, casamentos... Em tais projetos a sensibilidade,
as emocoes e a imaginacao sobrepujam o papel da razao, induzindo mesmo
as pessoas a tomar atitudes irracionais ou até desumanas (autodestruicao,
suicidio, homicidio...). Interpelando o senso religioso, que é um dos mais
poderosos do ser humano, arrastam multidóes em gestos ilógicos e contagi
antes. Jé o livro dos Atos dos Apostólos descreve situacao semelhante guan
do narra o tumulto causado pelos ourives de Éfeso contra Paulo acusado de
extinguir o culto á deusa Diana dos efésios: "Puseram-se a gritar: 'Grande é a
Ártemis dos efésios!' A cidade foi tomada de confusao e todos a urna se pre-
cipitaram para o teatro... Uns gritavam urna coisa, outros outra. A assem-
bléia estava totalmente confusa, e a maior parte nem sabia por que motivo
estavam reunidos. Urna voz fez-se ouvir da parte de todos, gritando por qua-
se duas horas: 'É grande a Ártemis dos efésios!" (At 19, 28s.32.34).
No rol das solucoes mágicas está também a expectativa do próximo
fim do mundo, apregoado em "profecías" minuciosas e fantasistas. Periódi
camente na historia, em momentos diffeeis, os homens foram inclinados a
pensar: "S6 Deus pode dar um jeito! E o fará drásticamente!" Mas até hoje
nao o fez, como predizia Jesús em Le 17,22.
Em tais circunstancias como as da época atual, importa enormemente
recorrer á razao iluminada pela fé. Crer ná"o significa abdicar a razao, ceder a
emocoes, divagar livremente pela imaginacao... Crer é continuar o discurso
da razao, pois é esta mesma que me diz: "Deves crer! É razoável crer. A ver-
dade nao termina quando termina o alcance da razá*o, mas ela continua em
direcao do Inefável". Ora a razao que estuda as verdades da fé, nao encontra
nesta apoio para admitir milagres e ¡ntervencoes extraordinarios de Deus sob
encomenda do homem.

A grande for?u do cristSo está na orapffo filial, confiante e humilde.


Esta, sim, tem a promessa de ser sempre atendida segundo os sabios desig
nios de Deus (cf. Le 11,5-13). Que o cristao reze fervorosamente, trabalhe
assiduamente em fidelidade á sua vocacSo... E descóbrirá a auténtica solucao
para seus problemas!
E.B.
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS"

Ano XXX - N? 328 -■ Setembro de 1989

Um documento da Santa Sé:

Pornografía e Violencia nos


Meios de Comunicagáo

Em síntese: A pornografía e a violencia sádica nos meios de comuni-


cacao social chegaram a tal ponto que o Pontificio Conselho para as Comu
nicacoes Sociais houve por bem publicar um documento a respeito, mostran
do as causas e os efeitos do fenómeno e apontando pistas para que a onda seja
contida. 0 texto destaca o aspecto comercial que, entre outras coisas, incen
tiva a producao de filmes, cassetes, revistas... pornográficas; exploram a ima-
turidade de crianzas, adolescentes e jovens; reduzem a mulher e o homem á
condicao de coisa ou objeto lucrativo. É também realcado o papel que toca
ao grande público: comprando ou usando os produtos pornográficos, con-
tribuí para a manutencao da perversidade; as atitudes passivas também sao
urna forma de colaboracao com o mal. Cabe a cada cidadao de bom senso
tentar conter a onda - o que será possivel se, entre outros recursos, fizer
ouvir a sua voz de desagrado aos produtores e responsáveis pela onda de per-
missividade destruidora d.i familia e da dignidade humana.
* * *

É freqüente ouvirem-se queixas contra a pornografía e a violencia exi-


bidas pelos meios de comunicacao social (televisao, cinema, radio, imprensa
escrita ...). A situacáb tornou-se mundialmente notoria, a ponto que o Pon
tificio Conselho para as Comunicacóes Sociais houve por bem pronunciarse
a respeito em nome da fé católica num documento que traz a data de 7/5/89
e as assinaturas de D. John Foley, Presidente, e Mons. Pierfranco Pastore,
Secretario.

0 significado deste texto, que é sereno e serio ao mesmo tempo, será


percebido através de urna leitura cursiva do mesmo, que passamos a propor.

386
pornografía e violencia...

I. O TEXTO

Após a respectiva Introdujo, ©"documento compreende tres Partes:


1) Efeitos da pornografía e da violencia; 2) Causas do problema; 3) Como
enfrentar o problema.

Introdujo (n. 1-8)

Nos últimos anos registra-se urna revolucao de ámbito mundial na es


cala dos valores moráis. A pornografía e a violencia penetram cada vez mais
ñas diversas carnadas da sociedade nao somente dos países ricos, mas tam-
bém dos que estao em vias de desenvolvimento.

Altamente responsáveis por tal mudanca sao os me ios de común ¡cacao


social, que gozam de enorme poder de influencia tanto para o bem como pa
ra o mal. Se a eles se deve o fato alvissareiro de que os homens se sentem
mais próximos uns dos outros e mais solidarios entre si, deve-se-lhes também
a deformacSb de adultos, jovens e criancas em casos sempre mais numerosos.

"A exaltafio da violencia e da permissividade sexual sao atitudes mul


to antigás na historia da humanidade, exprimindo a dimensio mais sombría
da natureza humana ferida pelo pecado" (cf. n. 6).
Conscientes disto, muitos responsáveis pela familia de diversas partes
do mundo levaram á Santa Sé as suas apreensdes referentes a filmes, video-
cassetes, programas de televisao, publicacóes impressas..., que freqüentemen-
te sa*o oferecidos a seus filhos e que poem em xeque os valores moráis incuti-
dos pela educacao de casa. - Foi o que levou o Pontificio Conselho para os
Meios de ComunicacSo Social a estudar e explanar atentamente o problema.

1. Efeitos da pornografía e da violencia (n. 9-18)

Por "pornografía" entende-se a violacao, grapas a técnicas audiovi-


suais, do direito á privacidade do corpo humano em sua natureza masculina
ou feminina. Essa violacao reduz a pessoa e o corpo ao plano de um objeto
anónimo, destinado a mau uso, cujo objetivo é o gozo concupiscente.

"Violencia" vem a ser, neste contexto, a apresentacao, provocadora


dos mais baixos instintos, de atos contrarios á dignidade da pessoa humana,
resultantes de intenso exercfcio da forca física profundamente ofensivo e
passional.

Os especialistas divergem entre si na avaliacáo do impacto que tais fe


nómenos podem causar sobre o grande público. Cf. n. 9.
O fato, porém, é que ninguém se pode considerar imune dos efeitos
degradantes da pornografía e da violencia; as criancas e os jovens sao espe-

387
'PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 328/1989

c¡ al mente vulneráveis. Na verdade, tais males depreciam a sexualidade, per-


vertem as relacoes humanas, escravizam os individuos; destroem o casamen
to e a vida de familia, inspirando atitudes anti-sociais e desfibram a tempera
moral da sociedade. Cf. n.10.

As criancas freqüentemente expostas a pornografia sao prejudicadas,


pois ná*o sSo ainda capazes de distinguir claramente imaginacao e realidade.
Mesmo os jovens e adultos podem acabar considerando aceitáveis os mode
los de comportamento táo insistentemente apresentados pelos meiosdeco-
municacao social. Cf. n. 12.

Vé-se, pois, que tais espetáculos levam ao pecado. Com efeito; a pro-
ducao e a difusao dos mesmos á grave mal moral. Mas este mal nao se alas
traría se nao houvesse mercado de compradores e usuarios; estes também co
me te m enorme falta ao recorrer a tais divertimentos, nao só por degrada re m
a sua dignidade pessoal, mas também por estarem alimentando um comercio
nefasto. Cf. n. 11.

Existem dois tipos de pornografia: a dita "suave pornografia" (soft


core) e a "dura pornografia" (hard core). Aquela pode aos poucos extinguir
a sensibilidade moral dos individuos, tornando-os indiferentes aosdireitose
á dignidade de outrem. A pornografia é como a droga: cria dependencia cres-
cente, levando a procurar algo de sempre mais excitante e perverso. Como
quer que seja, ela está sempre, de perto ou de longe, ligada á violencia, pois
provoca a perda de todo respeito aos semelhantes. Cf. n. 12-14.
A pornografia é destruidora do lar, fazendo esquecer a i'ndole familiar
da sexualidade. Desenvolve o frenesí do gozo individual, que é a deturpacao
do amor, pois induz a considerar os outros como objeto de prazer mais do
que como pessoas. Nao surpreende, portanto, o fato de que seja responsável
até mesmo por raptos e morticmios. Cf. n.15-18.

2. Causas do problema (n. 19 e 20)

Podem-se apontar cinco principáis causas:

1) Antes do mais, na base de toda a onda perversa, está urna Moral


permissiva, que procura, a todo preco, atingir a satisfacáo individual. A isto
se prende um niilismo de desespero, que faz do prazer a única felicidade
(n.19).

2) A sede do lucro financeiro, ás custas da fraqueza mesma do próxi


mo. A pornografia é industria lucrativa, e a tal ponto que em certas socieda
des ela faz parte do crime organizado.
3) Alegase a liberdadedeexpressáo, que deveria saber tolerar a porno
grafia, ainda que ¡sto redunde em detrimento da privacidade dos cidadáos.
Há quem afirme que o melhor modo de combater a pornografia é legalizá-la.

388
pornografía e violencia...

Ora estas alegacoes confundem liberdade e Mcenciosidade. NSo pode haver li-
berdade de expressSo no vazio ou em detrimento do respeito aos jovens, ás
mulheres, á vida privada e aos ambientes públicos de urna nacao.

4) Leve-se em conta a falta de leis cuidadosamente elaboradas ou a


nSo aplicacao das que já existem, para proteger o bem comum, especialmen
te a moralidade dos jovens.

5) Verifica-se certa apatia de multas pessoas, inclusive de comunidades


da Igreja, que ¡ndevidamente se consideram estranhas ao fenómeno da por
nografía e da violencia, ou incapazes de Ihe dar remedio. Cf. n.20.

3. Como enfrentar o problema (n. 21-32)

A difusao da pornografía e da violencia é um atentado contra a socie-


dade e exige respostas realistas da parte desta, que tem o direito de se defen
der. Distinguem-se sete setores, aos quais tocam diferentes atitudes frente ao
problema: os profissionais da comunicacao, os genitores, os educadores, os
jovens, o público, as autoridades civis, a Igreja e os grupos religiosos. Cf.
n. 21-22.

1) Os profissionais da comunicacáb nao sao todos coniventes com a


onda do mal; muí tos procuram seguir fielmente as normas da moralidade e
cultivam grande respeito ao bem comum. Merecem admirapao e estímulo.
Além do qué, há"o de ser incentivados a redigir e aplicar códigos éticos de co
municacao e publicidade a altura da dignidade humana, especialmente na te-
levisao. Os comunicadores mesmos déem a conhecer, através dos meios de
comunicacao, quais os melhores dispositivos para contér as ondas da porno
grafía e da violencia. Cf. n.23.
2) Os genitores tém por de ver ministrar aos f ilhos urna auténtica for-
mapáo ética, na qual entrará sadia avaliacao da sexualidade, baseada sobre
a dignidade da pessoa humana, a virtude da castidade e a prática da discipli
na de vida. Darao estes ensinamentos nao so pela palavra, mas também me
diante urna vida familiar equilibrada que por si seja fecunda escola de valores
moráis.
Também procura rao educar os filhos para o reto uso dos meios de co
municacao social; passividade ou concessóes indevidas neste particular pode-
rao tornar-se fontesde graves danos para os jovens. Estejam dispostos a deba
te r com os filhos questoes que a estes ¡nteressem numa atitude de benevo
lencia e carinho; na prática educacional as explicacóes valem mais do que as
proibicóes secas. Cf. n.24.
3) Os educadores. Os principáis colaboradores dos genitores sao os
educadores'ñas respectivas escolas. Estes hao de promover e incentivar os va
lores éticos e sociais em vista do sadio desenvolvimento da vida familiar.

389
6 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 328/1989

A pedagogía mais valiosa é a que forma os jovens para urna atitude crí
tica e capaz de discernir os diversos programas de te lev ¡sao, radio e de outros
meios. A prenda m assim os jovens a resistir as manipulacoes e a evitar atitu-
des meramente passivas diante dos produtos emitidos. Cf. n.25.

4) Os jovens podem contribuir eficazmente para conter o fluxo da


pornografía e da violencia respondendo positivamente as iniciativas dos geni
tores e educadores e assumindo as suas responsabilidades no plano das deci-
soes moráis e na escolha dos seus divertimentos. Cf. n.26.

5) O público em geral deve fazer ouvir a sua voz; compete-lhe exprimir


individual e coletivamente o seu julgamento aos produtores, ás autoridades
civis e aos comerciantes de programas e noticias. É urgente o diálogo entre
os usuarios e os comunicadores, a fim de que estes conhecam as exigencias e
os interesses daqueles. Cf. n.27.

6) As autoridades civis... Os legisladores, os executivos e os juristas sao


chamados a responder ao problema da pornografía e da violencia sádica Se-
jam promulgadas leis sensatas, sejam esclarecidas as leis ambiguas, sejam re-
toreadas as válidas leis ¡á existentes. Dado que a producao e a distribuicao
do material pornográfico tém suas implicacóes ¡nternacionais, é preciso agir
nao só no setor regional, mas também no ámbito internacional para contro
lar o insidioso comercio. O Conselho da Europa, a Comunidade Económica
Européia e a UNESCO, entre outras instituicSes, já tomaram providencias a
propósito. Sabe-se que o bem comum é ameacado pelo material pornográfi
co na medida em que este é produzido e distribuido sem regulamentacao.
Cf. n.28.

7) A Igreja e os grupos religiosos exercem prioritariamente a sua res-


ponsabilidade ensinando, de modo constante e claro, as verdades moráis fun
damentáis, especialmente as que se referem á Moral sexual. Na época atual,
marcada pela confusao ética e o laxismo, a voz da Igreja há de ser muito ní
tida, podendo tornar-se muitas vezes um sinal de contradicho.

A Ética do prazer ¡mediato é fundamentalmente oposta á plena reali


zado da pessoa humana. A educacJo para a vida de familia e a insercáo
responsável na sociedade exigem a formacao para a castidade e a autodisci
plina. A pornografía e a violencia tendem a ofuscar a imagem de Deus exis
tente em cada pessoa humana.

Em vista disto, a preparacao para o reto uso dos meios de comunica-


cao social deve integrar os programas educativos das escolas católicas dos
Seminarios, como também o sistema de formacao dos Religiosos e Religio
sas, e os Cursos de Reciclagem para sacerdotes e leigos. Alias, os sacerdotes
e os Religiosos comprometidos com o trabalho pastoral devem, eles mesmos
em primeiro lugar, dar o exemplo de discernimento no uso dos meios de co-
municacao escrita ou audiovisual. Cf. n.29.
pornografía e violencia...

ConclusSo (n.30-32)

Verifica-se que urna atitude raaramente restritiva ou negativa da Igreja


em relapao aos meios de comunicacao é insuficiente e ¡nadequada. Requer-
se, antes, um diálogo continuo com os comunicadores conscientes das suas
responsabilidades. Os comunicadores católicos e seus empreendtmentos sfo
chamados a exercer um papel decisivo no desenrolar de tal diálogo. Cf. n.30.
Já existem documentos da Igreja e tomadas de pos ¡cao de Bispos con-
cernentes ás comunicacdes sociais. Sejam levados em consideracao e mais sis
temáticamente aplicados. Os críticos e suas organizacoes oferegam aos pro-
fissionais da comunicacSo e ás familias avaliacóes conscienciosas das produ-
coes apresentadas ao público, a fim de que este se possa orientar sadiamente
diante do grande mercado. Cf. n. 31.
O presente documento dirige-se ás familias que exprimiram suas preo-
cupacoes, e aos pastores da Igreja, a fim de os convidar a urna reflexao sem-
pre mais seria sobre a questao seguinte: Por que estamos diante de tal onda
de pornografía e de violencia sádica nos meios de común ¡cacao durante os
últimos anos? Trata-se de saber como por em prática a exortacSo de SSo
Paulo: "Nao te deixes vencer pelo mal, mas vence o mal com o bem" (Rm
12,21). Cf.n.32.

II. COMENTANDO...

A le ¡tura do documento da Pontificia Comissao para as Comunicacoes


Sociais sugere algumas reflexoes:

1) A voz da Igreja corresponde a ampio clamor proveniente do núcleo


mais sagrado que a sociedade possui: a familia. Esta se vé ameacadade ma
ne ira tanto mais daninha quanto mais sorrateira ou subliminar.
2) O Nao dito pela Igreja á pornografía e á violencia pode encontrar
contradicoes e resistencias tanto da parte dos produtores (interessados em
vender) quanto da parte dos usuarios (vulnerados pela filosofía hedonista).
Todavía a Igreja o profere consciente de que está prestando um servico á
humanidade, servico que certamente custa dor e sacrificio, mas, aos olhos de
Deus e aos olhos dos homens de bom senso, é altamente valioso.
3) O documento refere-se mais de urna vez á passividade dos especta
dores, que vem a ser urna forma de conivéncia com o mal. Aos país e edu
cadores compete assumir sua responsabilidade, aínda que incómoda, frente
aos filhos e educandos. Ao grande público toca manifestar-se junto aos pro
dutores e vendedores, a fim de que sintam que a mercadoria já nao é tao
aceita e possam prever prejuizos resultantes da insistencia em produzi-la To
do cidadao é capaz de exercer papel benéfico na contencao da onda, ainda
que seja apenas pelo fato simples de escrever breve carta a quem compete,

391
8 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 328/1989

manifestando desagrado pelos programas escritos ou talados dos meios de


comunicacáo. Mu ¡tas cartas poderáo impressionar os responsáveis e induzi-
los a repensar seu sistema de lucros comerciáis, procurando algo de honesto
ou algo que nao explore a sensibilidade ou mesmo a imaturidade de cianeas,
jovens e adultos.

* * *

Urna Igreja a Servico dos Homens. Contribuicoes para urna compreen


sao atual da Igreja, por Luis Gallo. Traducao de Ir. Isabel F.L. Ferreira. —
Ed. Salesiana Dom Bosco, Sao Paulo 1984, )6Ox 230 mm, 229 pp.

O autor também é Professor da Pontificia Universldade Salesiana de


Roma. Deixa-nos um livro sobre a Igreja de hoje "pensando sobrétudo nos
¡ovens. Mas eremos, diz o autor, que pode ser útil também a sacerdotes. Re
ligiosos e leigos adultos. Pretende ser urna especie de manual que Ihes sirva
de ajuda" (Prefacio da la. edicao). Após urna Introducao, de índole históri
ca, o autor explana duas grandes Partes: 1) Para que a Igreja? e 2) Como vi-
ver na Igreja? Cada qual destas seccoes responde as indagacoes do público
percorrendo um total de quatone temas á luz da pura doutrina do Evange-
tho, da TradicSo e do Magisterio da Igreja; os documentos do Concilio do
Vaticano II sao tartamente citados. Há também urna atencao especial á
América Latina e aos escritos de Medellín e Puebla. Luíz Gallo saber man-
terse em linha de equilibrio — o que se pode notar particularmente na
abordagem do delicado tema "Instituicao ou Carisma" (pp. 143-151):

"Há os que pretendem esvaziar de densidade carismática a Hierarquia,


fazendo déla urna mera funcao administrativa. S6 um grupo de 'carismático'
manifestaría na Igreja a presenca ativa do Espirito... Costuma também ocor-
rer a concepeáb contraria, a dos que pensam que a presenca do Espirito se
esgota na Hierarquia... Fica claro o seguinte: a estrutura primordial e funda
mental da comunidade eclesial brota da coordenacáo de todos os servicos
que o Espirito neta suscita... Nenhum deles pode ser menosprezado nem
subestimado" (p. 147).

"Se o cristao se deixasse conduzir sempre pelo Espirito de amor que


possui dentro de si, nao necessitaria de nenhuma lei exterior. É o que diz
Santo Agostinho: 'Ama e faze o que quiseres'. Mas, como é pecador e em
seu coráceo coexistem amor e egoísmo, nao poucas vezes nao chega a perce-
ber a voz do Espirito, ou a.confunde com a de outros 'espíritos'. Neste con
texto adquire sentido a existencia da lei exterior. Ela tem a funcáb de indi
car por onde passa ordinariamente o amor aos irmábs" (p. 151).

0 livro tem valor para a formacSo de leigos; nSo se destina, porém, a


um curn'culo de Teología em nivel superior, pois nao aborda todo o ámbito
da Eclesiologia sistemática.

392
Ensinamentos preciosos:

A Quantas Anda o Ecumenismo?

Em sfntese: 0 Cardeal lan Willebrands, Presidente do Secretariado da


Santa Sé para o Diálogo Ecuménico, fez urna palestra a professores e alunos
de Teología e Filosofía no Seminario Arquidiocesano Sao José do Rio de Ja
neiro aos 16/06/89, versando sobre Ecumenismo e assuntos correlatos. - 0
teor de seus sabios dizeres vai sintetizado ñas páginas subseqüentes.

* * *

Esteve no Brasil em junho pp. o Cardeal lan Willebrands, Presidente


do Secretariado da Igreja destinado ao Diálogo com os Cristaos nao Católi
cos, Secretariado que tem um Departamento voltado para os Judeus. S. Emi
nencia veio receber em Sao Paulo aos 11/06 o Premio Patriarca Abraao, que
Ihe foi conferido, assim como ao Dr. Gerhart M. Riegner (Genebra), Presi
dente do Conselho Diretor do Congresso Judaico Mundial. Tal solenidade
foi promovida pela Comisslo Nacional de Diálogo Religioso Católico-Judai
co.

No dia 16/06, passando pelo Rio de Janeiro, S. Em.cia teve contatos


com representantes cristaos nao católicos (protestantes e ortodoxos) e, se
paradamente, com líderes judeus na parte da man ha; o diálogo tocou fran
camente em questoes de ¡nteresse comum a ambas as partes. De tarde, o Car
deal Willebrands se encontrou com um grupo de cerca de duzentas pessoas
(seminaristas em grande maioria, professores e estudantes de Filosofia'e Teo
logía) no Saláo Magno do Seminario Arquidiocesano. Fez entao urna exposi-
cao, a qual se seguiram perguntas do auditorio. Dado o conteúdo denso des-
se coloquio, segue-se urna símese dos principáis tópicos ai abordados.

1. Ecumenismo em geral

O Cardeal Willebrands comepou dizendo ter sido durante vinte anos


Professor de Seminario na Holanda, seu país natal. Os tristes eventos da Se
gunda Guerra Mundial, a partir de 1940, modificaran! o panorama religioso
da Holanda, pois católicos e protestantes foram simultáneamente atingidos
pela perseguicáo nacional-socialista - o que muito os aproximou entre si. De
maneira muito mais viva, entao, tomaram consciéncia da necessidade de su-

393
10 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 328/1989

perar a separado religiosa. Criaram, posteriormente, urna Associapáo desti


nada ao Diálogo Ecuménico, na qual o Pe. Willebrands estava envolvido, ten-
do seu referencial no Pe. Agostinho Bea S.J., Reitor do Pontificio Instituto
Bíblico de Roma. A eleicao do Papa Joao XXIII em 1958 deu grande impul
so ao movimento ecuménico, pois o Nuncio Angelo Roncalli (depois Joao
XXIII) pudera observar na Bulgaria e na Turquía as conseqüéncias do cisma
oriental. O Concilio do Vaticano II, convocado por Joao XXIII em 1959,
teve entre suas miras o diálogo ecuménico. Este se impunha com preméncia
por dois princrpais motivos: 1) a caridade decorrente do Batismo e tendente
a superar divisoes; 2) a necessidade de promover nova evangelizado do mun
do descristianizado, de acordó com a palavra do próprio Cristo: "Todos se-
jam um ... para que o mundo creia" (Jo 17,21). A superacáfo das divisoes é
tarefa que interpela nao somente os teólogos, mas todos os cristaos de modo
geral; cada um deve dar-lhe sua contribuicáo, ao menos pelo teor de sua vida
plenamente fiel a vocacáo que Deus Ihe deu: no casamento, na Vida Religio
sa, no sacerdocio ou em outra modalidade...

A viagem do Papa aos cinco países escandinavos (Dinamarca, Suécia,


Noruega, Finlandia, Islándia), países de grande maioria luterana, em princi
pio de junho foi um fruto do diálogo ecuménico; teria sido ¡mpossível trinta
anos atrás. É de notar que as viagens apostólicas do Pontífice só ocorrem
mediante convite do episcopado da nacao a ser visitada, convite este que de-
ve ter o beneplácito do Governo e a aquiescencia do povo local. Ora aconte
ce que na Escandinávia, onde o número de católicos é extremamente reduzi-
do, os estadios estavam literalmente repletos de pessoas (luteranos e nao ca
tólicos) desejosas de ver e ouvir Joáb Paulo II. Principalmente em Upsala
(Suécia), o diálogo do Papa com o Bispo luterano local foi frutuoso: verifica
se que os países escandinavos estao profundamente marcados por ondas de
suicidios, abortos, divorcios e pela materialismo da vida; os templos religio
sos sao muito pouco freqüentados - o que levou o Bispo luterano de Upsala
a evocar a urgencia de urna "nova evangelizacáo", fazendo eco preciso a urna
expressao caía a Joao Paulo II. Observava o Cardeal Willebrands: parece que
já foram superadas as questoes teológicas referentes aos principios luteranos
"somente a fé, somente a graca, somente a Escritura", mas o modo de viver
dos luteranos ainda é muito diferente do modo de viver dos católicos; será
preciso tender mais e mais á unidade no plano da fé e no da Moral.
O Decreto Unitatis Redintegratio do Concilio do Vaticano II, sobre o
Ecumenismo, distinguiu entre aqueles que realizaram os cismas dos séculos
XI (ortodoxos) e XVI (protestantes) e aqueles que herdaram os cismas (or
todoxos e protestantes de nossos dias). Estes desejam reatar as relacoes rom
pidas e mostram vivos sentimentos de fraternidade. Infelizmente, porém,
nos tempos atuais há quem esteja suscitando novos cismas ou criando novas
e novas denominacoes protestantes; estes sao hostis ao Catolicismo, á dife-
renca dos protestantes tradicionais. O fenómeno das seitas, algumas com ba-

394
AQUANTASANDAOECUMENISMO?

se crista, outras com base oriental e outras aínda com base cultural diversa é
de tal vulto que nao pode deixar de merecer especial atenpao da parte dos
católicos; quais seriam os motivos dessas rupturas ou da criacao desses gru
pos sectarios tao numerosos em nossos dias?

O Concilio do Vaticano II, na Declaracao Nostra Aetate, sobre as Reli-


gioes nao Cristas, dedicou aos israelitas um capi'tuio de grande valor, que so
teve antecedente semelhante na epCstola de Sao Paulo aos Romanos capítu
los 9-11.

2. O Carmelo de Auschwitz

Colocou-se entáo a S. Em.cia urna pergunta relativa ao Carmelo de


Auschwitz (Polonia): deveria ser removido, mas aínda nao o fo¡; por qué?

O Cardeal Willebrands aproveitou o ensejo para dizer, antes do mais,


que o relacionamento entre católicos e judeus é bom. Os judeus compreen-
deram o alcance desse documento (Nostra Aetate), que reconhece "o rico
patrimonio espiritual comum a cristaos e judeus", e aceitaram um diálogo
mais assfduo com os católicos, seja mediante urna Comissao Pontificia desti
nada a isto, seja mediante Comissoes nacionais ou mesmo diocesanas. Os
principios formulados em elevado nivel teológico deverSo aos poucos pene
trar capilarmente tanto no bojo do povo israelita como no povo cristao. É
claro que isto nao se fará bruscamente, pois há para tras sáculos de hostili
dades.

Uuanto ao Carmelo hoje existente no antigo campo de con cent racao


de Auschwitz, é fruto de inspiracao preciosa: rezar pelas vítimas e pelos car
rascos daquele lugar de exterminio desumano. Acontece, porém, que as Re
ligiosas ocuparam o predio que servia de depósito dogas Kyklon B destina
do a sufocar os judeus condenados á morte. Isto afeta a sensibilidade dos is
raelitas hoje, que pedem a remocao da comunidade carmelita para outro lo
cal. Em resposta, o Arcebispo local, Cardeal Macharsky, os Arcebispos de
Liao (Franca) e Malines (Bélgica) juntamente com líderes hebreus assinaram
um acordó, que prevé a transferencia do Carmelo para um terreno situado a
1 km do campo de concentracao, onde se construirá também um centro de
estudos, documentacao e oracáo para todos os interessados. A Conferencia
dos Bispos da Polonia ratificou este pacto, dando-lhe especial vigor frente ao
povo polonés.

Acontece, porém, que algumas dificuldades tém pro te lado a execucao


desse acordó:

1) o regime comunista da Polonia nao favorece a construcao de igrejas


e mosteiros, de modo que o Cardeal Macharsky, de Cracovia, deve estar en
frentando problemas para efetuar a transferencia das monjas;

395
12 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 328/1989

2) os poloneses sabem que Auschwitz (Oswiecin, em polonés) nao foi


lugar de massacra apenas de judeus; muitos poloneses e católicos a! foram
violentamente eliminados, entre os quais S. Maximiliano Kolbe. Com efeito,
em Oswiecin morreram 2.000.000 de judeus, 1.500.000 de poloneses,
1.000.000 de ciganos, russos e outros, de modo que o senso patriótico e reli
gioso dos poloneses está Ínteressado em fazer precisamente da localidade do
campo de concentragao um lugar de oracao, ao contrario do que desejam os
judeus. Assim o problema se torna complexo e de lenta solucao. Esta há de
ocorrer nos termos do acordó fixado, sem dúvida; mas nao se Ihe estipulem
prazos, pois qualquer pressáo dos judeus (que quase nao existem mais na Po-
I6nial sobre o povo polonés só poderá contribuir para exacerbar os ánimos
dos poloneses.

3. Mística oriental e Mística crista

Formulou-se a seguir urna pergunta sobre o relacionamento da Mística


dos derviches (filiados ao Isla) com a Mística crista.
S. Em.cia respondeu que os derviches (monges mupulmanos da Tur
quía) sao mais chegados ao Catolicismo do que os demais maometanos, mas
o seu modo de pensar muito difere do católico.

Tém-se visto casos de cristaos que tentam adotar métodos de oracáo


ou de meditacáo orientáis (especialmente o Zen). É preciso lembrar que tais
métodos estao originariamente ligados a urna filosofía panteísta, que nao se
concilia com a crista. Acontece que tais cristaos fazem, antes, o papel de di
letantes; existem os clássicos métodos católicos, que sao muito mais conatu-
rais com a espiritualidade monoteísta católica.

Após a solenidade de 11/06 em Sao Paulo, um diplomata, cético em


relacao á paz entre ¡udeus, muculmanos e crístáos, perguntou a S. Em.cia
se acreditava na aproximacáo de tais grupos humanos. Respondeu o Cardeal
Willebrands que sua visao de historia se baseava nao em fatores políticos,
mas em Oeus, que fez a promessa de béngáo a Abraáo e á sua descendencia,
inclusive a Ismael e sua linhagem (os árabes); daí acreditar que possa haver
um futuro mais alvissareiro para todos aqueles que, de algum modo, se fi-
líam a Abraao. É de se observar, alias, que na sessao de 11/06 em Sao Paulo
falou, como oradora principal, a Sra. Jehan Sadat, viúva do ex-presidente
Anwar Sadat do Egito, explanando o tema "O legado de Abraao: valores e
deveres compartilhados por católicos, muculmanoSe judeus".

4. Intercomunhao

A terceira pergunta feita a S. Em.cia versava sobre a possibilidade de


se praticar a Intercomunhao entre católicos, protestantes e ortodoxos ou a
participacáo na mesma mesa eucarfstica.

396
AQUANTASANDAOECUMENISMO? 13

O Cardeal WMIebrands respondeu que há um novo Diré torio Ecuméni


co a ser promulgado pela Santa Sé; levará em conta principalmente a ques-
tao dos matrimonios mistos. - Quanto á Intercomunhao, notou S. Em.cia
que é urna palavra despropositada, pois significa querer recebar na Comu-
nhfo da Igreja Católica urna pessoa que a esta nao pertence; com efeito, dar
a Eucaristía é dar a Comunhao eclesial. A nocáo de "hospitalidade eucarís-
tica" tem sido apregoada por alguns teólogos; erróneamente, porém. Hospi
talidade é questáo de caridade, ao passo que a recepcao da Eucaristía é ques-
tao de fé.

Os anglicanos replicam que a mesa eucarCstica é a mesa do Senhor, e


nao dos homens; por isto eles recebem qualquer cristáo na sua ceia domini
cal. Respondem os católicos que se trata da Ceia do Senhor, sim, mas... do
Senhor na sua Igreja; esta é a medianeira instituida pelo próprio Cristo para
ministrar a vida sacramental.
Quem nao tem a fé na Eucaristía, sacrificio do Senhor perpetuado so
bre os altares, ná"o deve receber o sacramento eucarfstico. - Há cristáos
(protestantes) que dízem: "Creío no sacramento da Eucaristía". Esta afirma-
cao sugere dois reparos:
— os protestantes podem falar de "sacramento", mas nao o entendem
no mesmo sentido que os católicos; para estes, a Eucaristía é o sacramento
da presenca de Cristo efetiva ou é o sacrificio de Cristo feito presente sobre
os altares para que o oferecamos com Cristo ao Pai e, conseqüentemente,
recebamos a comunhao sacramental;
- quem eré na Eucaristía, sacramento do Corpo do Senhor, eré tam-
bém na Igreja, de modo que a participacao naquela implica a insercao nesta.
Sao Paulo, em 1Cor 10,17, escreve: "Já que há um único pao, nos, embora
muitos, somos um só corpo, visto que todos participamos desse único pao".
Isto significa que participar do pao eucarfstico implica participar do Corpo
de Cristo eclesial, que é chamado "Corpo Místico" precisamente porque é
o corpo formado pelo misterio1 ou pelo mysterion (= sacramento); donde
se vé que o sacramento (mysterion) da Eucaristía e o sacramento (myste
rion) da Igreja sao inseparáveis um do outro.

De modo especial, os teólogos católicos, protestantes e ortodoxos que


se encontram para estudar artigos de fé, sem pertencer á mesma comunhao
eclesial, nao devem querer participar da mesma Comunhao eucarística; de-
vem estar suficientemente esclarecidos para nao forcar o que nfo deve ser
forcado. Prefiram, antes, sentir a dor da separacáo e trabalhar ardorosamen
te para que esta seja quanto antes superada.

1 O adjetivo "místico" derivase de mytterium, que é palavra equivalente


a sacramentum (sacramento).

397
14 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 328/1989

Estabelecida a regra, pergunta-se: a Igreja Católica admitiría excecoes,


permitindo ocasionalmente a Intercomunhao? - Em resposta, note-se que
as excecdes nao devem contradizer a norma, mas antes conf irmá-la.

O Código de Direito Canónico, normativo no caso, prevé as seguintes


possibilidades de comunhao sacramental entre irmaos separados:

"Canon 844, § 2. Sempre que a necessidade o exigir ou verdadeira uti-


Hdade espiritual oaconselhar, e contanto que se evite o perJgo de erro ou in
diferentismo, é lícito aos fiéis, a quem for física ou mora/mente impossível
dirigirse a um ministro católico, receber os sacramentos da Penitencia, Eu
caristía e UncSo dos Enfermos das maos de ministros nao-católicos em cuja
Igreja esses sacramentos sao válidos.

§ 3. Os ministros católicos administram licitamente os sacramentos da


Penitencia, da Eucaristía e da UncSo dos Enfermos aos membros das Igrejas
orientáis que nao tém plena comunhao com a Igreja Católica, se eles o pedí-
rem espontáneamente e estiverem devidamente preparados; vale o mesmo
para os membros de outras Igrejas que, a juízo da Sé Apostólica, no que se
refere aos sacramentos, estao ñas mesmas condicoes que as referidas Igrejas
orientáis.

§ 4. Se houver perigo de morte ou, a juízo do Bispo diocesano ou da


Conferencia dos Bispos, urgir outra grave necessidade, os ministros católicos
administram licitamente esses sacramentos também aos outros crístaos que
nao tém plena comunhao com a Igreja Católica e que nao possam procurar
um ministro de sua comunidade e que o pecam espontáneamente, contanto
que manifestem, quanto a esses sacramentos, a mesma fé católica e estejam
devidamente dispostos".
Como se vé, ortodoxos e protestantes podem, em casos muito espe
ciáis, receber alguns sacramentos na Igreja Católica. Quanto aos católicos,
só os podem (excepcionalmente) receber ñas comunidades ortodoxas, ñas
jansenistas e ñas véterocatólicas,1 ná"o ñas protestantes, poissomente aque-
las tém o sacerdocio ministerial e a possibilidade de ministrar validamente
os sacramentos (o protestantismo perdeu o sacramento da Ordem).

As excecoes aquí reconhecidas hao de ser utilizadas com seriedade e


com o devido conhecimento dos principios teológicos que Ihes estafo sujba-
centes; os presbíteros e os Bispos devem estudá-los atentamente para nao
transformarem a Comunhá"o Eucan'stica em questao de caridade ou de nos-

! Os jansenistas, no secuto XVIII, e os Velhos-Católicos, no secuto XIX, se-


pararam-se da Igreja Católica sem perder o sacramento da Ordem; por isto os
seus presbíteros tém verdadeira participacao no sacerdocio de Cristo; po
dem, pois, ministrar os sacramentos validamente. Ver Curso de Diálogo Ecu
ménico por Correspondencia, Módulo 15.

398
AQUANTASANDAOECUMENISMO? 15

pitalidade apenas, quando há elementos anteriores em jogo. Tém-se verifica


do abusos freqüentes tanto da parte de católicos como da parte de nao cató
licos; os abusos criam a tendencia a suscitar situacoes de fato, que nao se
coadunam absolutamente com o legado de Cristo. Pode-se notar, alias, que,
se os católicos admitem os ortodoxos aos sacramentos católicos em circuns
tancias especiáis, os ortodoxos nao aceitam a reciprocidade ou ná*o admitem
católicos aos seus sacramentos.

Visto o adiantado da hora, a sessao encerrou-se, deixando todos os


participantes satisfeitos por haver podido ouvir licóes muito lúcidas de S.
Em.cia, a quem fica mais urna vez registrada a gratidao de quantos o acom-
panharam na memorável tarde de 16/06 pp.

* * *

Evangelho segundo Joá~o. Comentario Espiritual, por Jorge Zevini,


vol. I. Traducán de Hugo Neves Ferreira. - Ed. Salesiana Dom Bosco, Sao
Paulo 1987, 155 x 230 mm, 251 pp.
O Evangelho segundo Sao Joao é, por excelencia, o Evangelho do Teó
logo ou o que mais poe em relevo a teología que transparece dos ditos e fei-
tos de Jesús. O Prof. Pe. Zevini, neste volume, procura penetrar dentro dessa
rica mensagem joanéia num "comentario espiritual" baseado no estudo cien
tífico e crítico do Evangelho. O embasamento da doutrina assim apresenta-
da é sólido. A obra favorece a léitura da Biblia como alimento da vida crista
e nao apenas como livro interessante por seus dados lingüísticos e arqueoló
gicos. O volume em pauta, após indicacoes bibliográficas e urna preciosa in-
troducao no pensamento joaneu, percorre os dez prímetros capítulos do
quarto Evangelho; os restantes devem ter ficado para um segundo volume
ainda nao publicado em portugués, mas altamente desejável.
Como espécimen da exegese de Zevini, pode-se citar a difícil passa-
gem de Jo 2,3b-5, em que María interpela Jesús, recebendo do Senhoruma
resposta aparentemente estranha (cf. pp. 85-87). O exegeta traduz: "Que há
entre mim e ti, Mulher? Nao chegou talvez a minha hora?" Conforme Zevi
ni, Jesús quería dizer á sua Mié que nao se preocupasse com o vínho mate
rial; Ele daría, sim, um vinho novo, isto é, o dom da vida eterna, pois chega-
ra a sua hora,... hora que nao era somente a sua Paixao-morte-ressurreicao,
mas toda a sua vida terrestre vivida em conformidade com a vontade do Pal
É ceno que qualquer interpretacao que se dé a espinhosa passagem de
Jo 2,3b-5 poderá deixar dúvidas no leitor, pois é sempre urna cruz para os
intérpretes. Como quer que seja, respeitamos as ponderacoes de Zevini e,
principalmente, nos congratulamos por haver produzido tal obra, que certa-
mente fez e fará grande bem a quantos a lerem e meditarem.
(continua na página 424)

399
Equi'vocos se desfazem:

Nomea^áo de Bispos e
Autoritarismo

Em tíntese; O S. Padre Joao Paulo II tem sido caracterizado como auto


ritario em suas mais recentes nomeacoes de Bispos. principalmente nos casos
de Colonia, Viena, Sa/zburgo... — 0 artigo que se segué, poe em evidencia
1) a liberdade de que goza o Pontífice para nomear Bispos, segundo o Códi
go de Direito Canónico; este prevé consultas aos interessados, sem que estas
restrínjam de algum modo a soberana decisao do Papa; 2) as tramitacoes an
teriores á nomeacao dos Arcebispos de Colonia e Salzburgo... O público que
critica tais nomeacoes, geralmente ignora os fatos ocorrídos e se baseia em
aparéncias; o artigo fornece dados históricos e documentos desconheddos
de muitos cristios e nao cristaos referentes ás duas nomeacoes e aptos a dis-
sipar os rumores de autoritarismo da Santa Sé.

Tém-se formulado críticas ao Papa Joao Paulo II tido como autoritario


por diversos motivos, sem que se veja o porqué objetivo e fundamentado de ta
is censuras. Entre outros casos, registra-se o da nomeacao de Bispos em tempos
recentes, principalmente a do Cardeal de Colonia. D. Joachim Meisner. Em
artiyo de jornal de grande cireulacSo no Brasil, com ¡i data do 16/06/89, l#
se, por exemplo, a seguinte nota:

"A Austria e o Estado de ñenánia-Vesttália, na Alemanha Federal,


mantém concordata com o Vaticano, pela qual gozam do direito de aprovar
os candidatos á nomeacao episcopal. Além disso, o cabido de varías catedrais
européias, entre as quais as de Viena e Colonia, tem, há sáculos, o direito de
escolha dos respectivos Metropolitas. O atual Papa, porém, nomeou os arce
bispos dessas duas dioceses sem consulta aos respectivos Estados e sem levar
em considerado o voto dos cabidos. No caso de Colonia, teve aínda o refi-
ñamento de mudar as regras da eleicSo durante o seu processamento" fProf.
Fábio Konder Comparato, em "A Folha de Sao Paulo").
O leitor de tal noticia é talvez propenso a aceitá-la sem mais, visto que
trata de assunto especializado, cujas minucias ná"o sá"o conhecidas pelo gran
de público; em conseqüéncia, os rumores ou as versóos genéricas, imprecisas
ou falsas podem circular sem encontrar objecoes. Eis por que abordaremos
ñas páginas subseqüentes o tema da nomeacao de Bispos, tendo em vista es
pecialmente dois casos muito comentados.

400
NOMEACÁO DE BISPOS 17

1. NomeacSo de Bispos

O Código de Direito Canónico reza explícitamente: "Episcopos libere


Summus Pontifex nomínat áut legitime electos confirmat. - O Sumo Pontí
fice livremente nomeia os Bispos ou confirma os que foram legit¡mámente
eleitos" (canon 377, § 1?). Donde se vé que o Papa nao está obrigado a no-'
mear candidatos que Ihe sao indicados.

A definicao do Código, alias, nao é se nao o eco de documentos da


Igreja anteriores. Com efeito; o Concilio do Vaticano II assim se pronun-
ciou:

"Como o oficio apostólico dos Bispos foi instituido por Cristo Senhor
e tem urna finalidade espiritual e sobrenatural, o Sacrossanto Sínodo Ecu
ménico declara que o direito de nomear e instituir Bispos épróprio, peculiar
e de per si exclusivo da competente Autoridade eclesiástica.
Por isto, para proteger cabalmente a liberdade da Igreja e promover
mais apta e expeditamente o bem dos fiéis cristios, o Sacrossanto Concilio
exprime o voto de que, para o futuro, nio mais se concedam ás Autoridades
civis direí tos ou privilegios de eleicio, nomeacao, apresentacio ou designa-
cao á tarefa episcopal. As Autoridades civis, porém, cuja obsequiosa vonta-
de para com a Igreja o Sacrossanto Sínodo reconhece com grato ánimo e
tem em máxima conta, se pede muito cortésmente que, por sua própria ini
ciativa, depois de se entender com a Santa Sé, queiram renunciar aos predi-
tos direnos ou privilegios dos quais estejam gozando até o presente por con
venio ou por costume" (Decreto Christus Dominus n. 20).
Aos 6/8/1966, ou seja, logo apos o Concilio, Paulo VI promulgou o
Motu proprio "Ecclosiao Sanctae". visando a regulamentacao de quatro De
cretos do Concilio; neste documento lé-se:

"Embora permaneca firme o direito, do Pontífice Romano, de nomear


e instituir Bispos com toda a liberdade,... as Conferencias Episcopais «ponía-
rao, todos os anos, alguns eclesiásticos aptos a ser promovidos á ordem epis
copal".

Aos 25/03/1972, o mesmo Papa Paulo VI promulgava "Normas concer-


nentes á designacao dos Bispos na Igreja Latina", cujo artigo XI § 29 reza:
"Essas listas (de candidatos apresentados pelas Conferencias) nao res-
tringem a liberdade do Pontífice Romano, ao qual tocasempre, em virtude
do seu cargo, o direito de escother e instituir homens indicados por outras
vias".
É claro que as nomeacoes de Bispos supdem consultas numerosas e so
licitas a Bispos, clérigos e leigos interessados, como se depreende do cSnon
377 §39:

401
18 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 328/1989

"Salvo legitima determinado em contrario, sempre que deva ser no-


meado um Bispo diocesano ou Bispo coadjutor, compete ao Legado ponti
ficio, para formar os chamados temos, fazer indagacoes individualmente, e
comunicar á Sé Apostólica, ¡unto com seu voto, o que sugerirem o Metro
polita e os Sufragáneos da provincia á qual pertence ou está unida a dioce-
se a ser provida, como também o presidente da Conferencia dos Bispos; além
disso, o Legado pontificio ouca alguns membros do colegio dos consultores
e do cabido da catedral; se ¡ulgar oportuno, indague, individualmente e em
segredo, também a opiniao de outras pessoas, de ambos os cleros, e também
de leigos eminentes em sabedoria".
Como se compreende, tais consultas sao de natureza sigilosa. Em con-
seqüéncia, é diffcil enumerar todos os passos dados anteriormente á escolha
de um Bispo; tal tramitacao, na sua substancia, escapa ao conhecimento do
público. Por isto é inadequado afirmar que "há pelo menos dez anos o Nun
cio Apostólico no Brasil vem descumprindo hierarquicamente os seus deve
res, com o tácito assentimento do Vaticano".
Examinemos agora dois casos particulares, que tém suscitado críticas.

2. Os Arcebispos de Colonia e Salzburgo

2.1. 0 Arcebispo de Colonia


Na Alemanha ainda estao em vigor algumas Concordatas de Estados
alemáes com a Santa Sé, que constituem o Staatskirchenrecht. A sé epis
copal de Colonia está situada na Renania-Vestfália, onde vigora a Concor
data da Prússia com Roma datada de 1929; o artigo 6? dessa Concordata
reza:

"/. Na vacancia de urna sede arquiepiscopal ou episcopal, os cabidos


metropolitanos ou catedralicios respectivos, assim como os arcebispos e bis
pos diocesanos da Prússia preparam urna lista de candidatos de acordó com
as normas do Direito Canónico. Levando em conta essa lista, a Santa Sé
propoe ao cabido tres nomes, dentre os quais o cabido escolhe livre e secre
tamente o arcebispo ou bispo. A Santa Sé nao nomeará nenhum arcebispo
sem que o cabido, após a eleicao, se terina dirigido ao Governo da Prússia
para indagar se nao há objecao de Índole política contra tal nome.
2. Os cónegos nao residentes participam da confec^ao da lista".
0 cabido de Colonia rege-se, pois, pelas normas atrás e também por
seu Estatuto próprio. Ora este exige que todos os eleitos, no caso, sejam
sufragados por maioria absoluta de votos.
Pois bem. Aos 14 de setembro de 1987 a sé arquiepiscopal de Colonia
tornou-se vacante pela renuncia do Cardeal Josef Hoeffner, que atingirá o li
mite de idade (75 anos). O cabido da catedral, tendo-se reunido para a esco-

402
NOMEAgAO DE BISPOS 19

Iha de nomes de candidatos a ser apresentados á Santa Sé, nao conseguíu ele-
ger nenhum com maioria absoluta de votos. No caso, dever-se-ia aplicar o
canon 165, que prevé o seguinte: quando um colegio eleitoral nao consegue
realizar urna ele ¡cao de sua competencia no prazo de tres meses, toca a auto-
ridade superior proceder diretamente a nomeacao do titular.

A Santa Sé, porém, em vez de efetuar logo a nomeacao, como o Direi-


to previa, enviou por sua vez urna lista de tres nomes ao cabido de Colonia
para que escolhesse dentre eles o seu Arcebispo. Eis, que também dessa vez
nao houve convergencia de maioria absoluta dos eleitores sobre determina
do nome. Tendo-se assim criado um impasse, o S. Padre, no uso legítimo de
suas atribuicoes, houve por bem nomear o novo Arcebispo, que era o Carde-
ai Joachim Meisner, de Betlim.
Como se vé, nessa complexa tramitacao nao houve desrespeito de di-
reitos alheios, mas, ao contrario, tentativa, da Santa Sé, de salvaguardar,
além do prescrito pelos cañones, os direitos dos Capitulares de Colonia. O
impasse, porém, em que estes se viram para eleger seu novo Arcebispo, fez
que a Sta. Sé procedesse á nomeagao, a f im de nao deixar por muito mais de
um ano a sé de Colonia vacante ou sem pastor.

Passemos agora ao caso da escolha de

2.2. O Arcebispo de Salzburgo (Austria)


O Arcebispo de Salzburgo, tendo atingido o limite da idade, renunciou
ao seu cargo. Segundo os costumes locáis, a Santa Sé devia apresentar ao ca
bido de Salzburgo urna lista de tres nomes, dos quais um seria escolhido pe
los cónegos para que a Santa Sé o nomeasse Arcebispo. Ora a Santa Sé en
viou de fato urna lista tríplice, que incluía o nome do Pe. Dr. Georg Eder,
párocodecano da pequeña cidade de Altenmarkt na provincia de Salzburgo.
Aconteceu, porém, que os tres nomes indicados por Roma nao coincidiam
com os que a Conferencia dos Bispos da Austria, em conformidade com o
Direito Canónico, apontava para a sé de Salzburgo. Houve entáo conversa-
coes entre as partes interessadas, das quais resultou a escolha do Pe. Dr.
Georg Eder por parte do cabido de Salzburgo; a Santa Sé ratificou a escolha
e nomeou D. Georg Eder.
A tramitapáo correspondente a tal nomeagao suscitou rebolico na Aus
tria e no estrangeiro. Para esclarecer os rumores e as noticias difundidas em
conseqüéncia, publicamos, abaixo, as declaracoes do cabido de Salzburgo,
que mostram como este, o principal interessado no caso, ficou alheio ás crí
ticas formuladas contra o Papa Joáb Paulo II.1

1 Tais declaracoes foram publicadas em francés por La Documentaron Ca-


tholiquen. 7979,5/3/89, pp. 250s.

403
20 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 328/1989

1) Declarado de 30/12/1988

"As informales divulgadas nos últimos dias pelos meios de comunica-


cá"o social a respeito da escolha do Arcebispo obrigam o cabido da catedral a
fazer a declaracao seguinte:

1. O cabido da catedral de Salzburgo procedeu no dia 21 de dezembro


pp. á escolha do 88? sucessor de Safo Ruperto e do 76? Arcebispo de Salz
burgo. Nessa eleicao, o Or. Georg Eder obteve a maioria de votos exigida pe
lo Código de Direito Canónico. Informado a propósito, o Dr. Eder, após os
oito dias de reflexao previstos pelo Direito Canónico, deu seu consentimen-
to ao cabido da catedral no dia 29 de dezembro.

2. Realizando essa eleicao, o cabido manifestou-se disposto a acolher o


pároco-decano de Altenmarkt, sacerdote diocesano bem conhecido, com um
voto previo de confianca.

Além disto, o cabido exprime a esperanca de que o eleito assumirá a


pesada tarefa da sua alta funcao para o bem da diocese e mantera a heranca
dos Arcebispos Rohrbacher, Macheiner e Berg. Conseqüentemente, o cabido
convida os sacerdotes, os Religiosos, os colaboradores e todos os fiéis da ar
quidiocese a acolher o Arcebispo Georg Eder como seu novo pastor, logo
que ocorra a sua nomeacáo pelo Papa.

3. O cabido lamenta muito vivamente que, contrariamente a todos os


costumes do Direito e com desprezo da liberdade de que deve gozar toda de
cisao tomada em consciéncia, antes mesmo do consentimento do eleito, a
sua pessoa e a sua vida tenham sido lancadas como alvo da opiniao pública.
Das informacoes difundidas pelos meios de comunicacao depreende-se cla
ramente que de modo nenhum se pode acusar o cabido de propiciar tais
rebolicos; vé-se, antes, que a opiniao pública foi informada por outros ca-
nais. Os doze cónegos do cabido, ao contrario de outras pessoas, considera-
ram obvio o dever de sigilo, com toda a lealdade, sem procurar influenciar,
como quer que fosse. a decisao do eleito. Apesar das circunstancias extrema
mente penosas para o cabido e também para a pessoa indigitada, é fora de
dúvida que os cónegos do cabido respeitam e acolhem a decisao tomada pelo
Dr. Eder.

4. O cabido julga ser obrigacáo sua assumir de antemáo tal atitude, an


tes que ocorram a tomada de contato com o Governo e a nomeacáo pelo
Papa. Em vista das informacoes publicadas pela imprensa e a televisao, cuja
origem é desconhecida ao cabido, tal atitude ¡mpunha-se a fim de evitar que
os fiéis sejam mais perturbados e ocorram manifestacóes intempestivas na
arquidiocese. O zelo pela pastoral da arquidiocese nos obrigava a nao guar
dar silencio".

2) Mensagem do cabido após a nomeapáb do Arcebispo

"1. O cabido da catedral dos santos Ruperto e Virgilio em Salzburgo

404
NOMEACÁO DE BISPOS 21

saúda o sacerdote diocesano Dr. Georg Eder como sucessor de Sao Ruperto
e Arcebispo de Salzburgo. Os doze conegos apresentam ao Arcebispo Georg
os melhores votos de ministerio episcopal.
2. O cabido da catedral de seja declarar de novo que está disposto a
sustentar com todo o seu apoio o Dr. Georg Eder no exercfcio do seu cargo,
para o maior bem da diocese, como o fez em favor do seu antecessor, Mons.
Karl Berg, e convida todos os sacerdotes. Religiosos e fiéis a acolher com
confianca o novo Arcebispo.

3. O cabido exprime a esperanca e a confianca de que o novo Arcebis


po procurará e realizará, segundo a tradicao dos Arcebispos Rohrbacher, Ma-
cheiner e Berg, urna colaboracao com os sacerdotes e diáconos, os responsá-
veis leigos, homens e mulheres, enfim com todos aqueles e aquelas que se de-
dicaram, como voluntarios, ao servico da diocese.

4. Tendo em vista a polarizacáo ocorrida, o cabido considera premente


dever seu fomentar, com o Arcebispo, a necessária unidade na diocese e, ao
mesmo tempo, a diversidade de todas as forcas positivas da atividade pasto
ral. Seria lamentável que a fecunda atividade pastoral até agora exercida fos-
se prejudicada por declarares intempestivas de porta-vozes de diferentes
grupos.

5. O cabido convida cordialmente os fiéis da arquidiocese para partid-


parem da sagragao e da posse do novo Arcebispo no terceiro domingo da
Quaresma, 26 de fevereiro de 1989. A celebracáo vespertina na catedral po-
deria ser a ocasiao de se imprimir novo fmpeto á 'renovacao da diocese me
diante comunidades cristas vivas' (Sínodo Diocesano de 1968)".
3) Mensagem do novo Arcebispo aos seus diocesanos

"Caros Irmaos e Irmas na fé.

No momento em que a decisao relativa a sucessao episcopal se tornou


definitiva pelo pronunciamento da Sé Apostólica, desejo estender as minhas
duas máos e dizer a todos do fundo do coracao: Grüss Gott!1 Eu o fago co
mo outrora o Apostólo Paulo (1Cor 2,3), receando ná"o ser capaz de assumir
a grandeza da minha tarefa. Nestes dias de tempestade, a grande fonte da
qual tiro a minha forca é a promessa de oracoes que me fizeram ¡numeras
pessoas em nossa arquidiocese e fora déla.

Nestes últimos dias, o peso da Cruz foi muito sensfvel. Vi entao bri-
Ihar a cruz que é colocada sobre o ombro de cada Bispo.

Eis por que vos pepo a todos: acolhei-me como o pastor que o Pastor
Supremo da Igreja vos envia, assim como eu quero acolher-vos todos. E vó-lo

1 Saudaqao alema que significa: "Deus vos salve!" (Nota do Tradutor).

405
22 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 328/1989

pepo: trabalhai todos comigo, sacerdotes. Religiosos, todos os homens e to


das as mulheres, para construir o Reino de Oeus em Salzburgo. Cada um de
nos tem ai' tao grande tarefa a desempenhar!

Eu vos dirijo a saudacáo que o sacerdote formula todos os días: 'O


Senhor esteja convosco!', com todos vos, com cada um de vos, e também
com seu indigno servidor Georg, nomeado Arcebispo".

Vé-se que na própria arquidiocese de Salzburgo reina o desejo de supe


rar qualquer divisSo ou contestacao. Nao há, pois, por que aticar os ánimos
fora daquela circunscricá*o, alimentando um problema que em Salzburgo
mesmojá ná"o existe.

3. Autoridade e Autoritarismo

Eis algumas reflexóes a título de conclusao.

O exerci'cio da autoridade nao é um mal. Ao contrario, é um servico


indispensável para que se preserve e fomente o bem comum de uma socieda-
de. 0 mal consiste, sim, no uso arbitrario ou ¡lícito da autoridade — coisa
que só é imputada a Joao Paulo II por quem nao conhece exatamente os epi
sodios que comenta (tenhamos em vista as explicacoes e a documentacao
atrás oferecidas).

Visto que em nossos dias o espirito democrático mal entendido leva a


certo preconceito contra a autoridade, mais penoso se torna o exercício da
mesma; é o que induz alguns mandatarios a se omitir no cumprimento de
seus deveres, dando ocasiáo a mal-estar, desordem e detrimento dos subalter
nos. É, pois, para desejar que as autoridades eclesiásticas exercam sua fun-
cao, conscientes de que o bem a elas confiado nao é algo de temporal e
transitorio, mas sao valores perenes encarnados em moldes humanos ou em
vasos de argila (cf. 2Cor 4,17). Principalmente o S. Padre Joao Paulo II, le
vando em conta as ameacas á verdade e a Moral do Evangelho que a Igreja
tem de enfrentar, vé-se obrigado a nao se omitir no desempenho de suas fun-
goes de Pastor universal. Ele o faz de modo abnegado e com grandes sacrifi
cios, aturando injurias e represalias, mas certamente prestando á humanida-
de o inestimável servico de guardiáo de um patrimonio que pertence a todos
os homens. Merece, pois, gratidáo muito viva da parte de todos - o que,
alias, se evidencia no fato de que o S. Padre tem podido visitar todos os p<i.'
ses do primeiro e do terceiro mundos (mesmo os protestantes e os mucul-
manos, como o Marrocos e a Turquía); nessa figura de pensador preocupado
com os valores transcendental e a preservacao da dignidade humana, muitos
estadistas e numerosos povos tém visto um vulto respeitável, corajoso e,
ao mesmo tempo, profundamente humano e delicado. Possa esta imagem ca
lar fundo no coracáo dos cristáos, a fim de que, em vez de contestar arbitra
riamente, possam melhor construir o Reino de Oeus!

406
Bispos de Cuba:

Ecos de Carta a Fidel Castro

Em símese: 0 Cardeal Arns, de Sao Paulo, escreveu em Janeiro pp.


urna mefísagem de congratulares a Fidel Castro, presidente de Cuba há trín-
ta anos, felicitando-o pelos sinais do Reino de Deus que se estaría implantan
do ñas estrutums políticas e sociais daquele país. Os bispos cubanos exilados
em Miami escreveram duas cartas privadas a S. Em.cia explicando-lhe que se
achava iludido no tocante é situacao sócio-económica de Cuba e oferedam-
Ihe a oportunidade de mais precisas informacoes. inclusive sobre o estado da
Igreja na ilha. - 0 Cardeal Arns nao respondeu és missivas dos prelados cu
banos; estes entao resolverán) escrever unía Carta Aberta ao Cardeal Arns,
em que de público Ihe expoem algo das condicoes de vida do povo cubano;
terminam repetindo a S. Em.cia que nSo desejam que o Brasil passe pela trá
gica experiencia que atualmente afeta o povo cubano.
Seguem-se o texto da missiva do Cardeal Arns a Fidel Castro e a Car
ta Aberta de Bispos cubanos a S. Em.cia.

Sabe-se que em Janeiro de 1989 o Cardeal D. Paulo Evaristo Arns, Ar-


cebispo de Sao Paulo, mandou a Fidel Castro urna carta em que se congratu-
lava pelo trigésimo aniversario da revolucáo marxista em Cuba, paCs no qual
se estaría implantando o "Reino de Deus".
Tal carta de um prelado estrangeiro ao supremo governante de Cuba
nao podía deixar de interpelar também o episcopado cubano. Este se acha,
em parte, exilado em Miamí (Estados Unidos). Lá tres Bispos houveram por
bem escrever ao Cardeal Arns duas cartas privadas; tendo estas ficado sem
resposta, resolve ram dirigir a S. Em.cia urna Carta Aberta, na qual Ihe ex
poem a situacao de Cuba como eles a véem e experimentam na qualidade
de cidadaos cubanos diretamente atingidos pelo regime castrista. Dada a au-
toridade de tal documento, publicamo-lo, a seguir, em traducao brasileira
feita sobre o original que saiu no diario Las América» de Miami em maio pp.
Para melhor orientacao do leitor, comecamos por apresentar o texto
da carta do próprio Cardeal D. Paulo Evaristo Arns a Fidel Castro, que foi

407
24 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 328/1989

publicada pela imprensa brasileira como também em castelhano pelo jornal


cubano Granma aos 6/01/89.

I. DO CARDEAL ARNS A FIDEL CASTRO

"Queridfssimo Fidel,
Paze bem.

Aproveito a viagem de Freí Berto para Ihe enviar üm abraco e saudar o


povo cubano pela ocasiao deste 30? aniversario da Revolucao. lodos nos sa
bemos com quanto heroísmo e sacrificio o povo de seu País conseguíu resis
tir ás agressoes externas e erradicar a miseria, o analfabetismo e os proble
mas sociais crónicos. Hoje em día Cuba pode sentir-se orgulhosa de ser no
nosso continente, táo empobrecido pela divida externa, um exemplo de jus-
tica social.

A fé crista descobre, ñas conquistas da Revolucao, os sinais do Reino


de Deus, que se manifesta em nossos coracoes e ñas estruturas que permitem
fazer da convivencia política urna obra de amor.

Aqui, no Brasil, vivemos momentos importantes de luzes e sombras.


De um lado, a Vitoria popular a lean cada ñas últimas eleicoes renova o marco
político do País e abre esperances de que o indescritível sofrimento do nos-
so povo possa ser minorado no futuro. Convivemos com urna ¡nf lacao de 30
por cent o ao mes e urna sangría de recursos absorvidos pelo injustif ¡cável pa
gamento dos juros da divida externa. Por outro lado, sabemos que essa vitó-
ría nao significa ainda nossa liberdade e que estaremos obrigados a enfrentar
em nosso próprio País todo tipo de pressoes e dificuldades criadas pelos do-
nos do Grande Capital.

Este é um momento de dor para quem faz de seu servico episcopal um


ato de efetivo amor para com os pobres. Entretanto, confio que nossas co
munidades eclesiais de base saberao preservar as sementes da nova vida que
foram semeadas.

Infelizmente, ainda nao se deram as condicoes favoráveis para que se


efetue nosso encontró. Tenho a certeza de que o Senhor Jesús nos indicará
o momento oportuno.

Tenho-o presente diariamente em minhas oracSes, e peco ao Pai que


Ihe conceda sempre a graca de conduzir os destinos da sua Patria.

Receba meu fraternal abraco nos festejos pelo XXX Aniversario da


Revolucao Cubana e os votos de um ano novo promissor para seu País.

Fraternalmente.

Paulo Evaristo Cardeal Arns".

408
ECOS DE CARTA A FIDEL CASTRO 25

Eis agora as observares de Bispos cubanos:

II. DE BISPOS CUBANOS AO CARDEAL ARNS

Em.mo Sr. Cardeal Paulo Evaristo Arns O.F.M.


Arcebispo de Sao Paulo, Brasil

Eminentissimo Sr. Cardeal Arns,

Dirigimo-nos a Vossa Eminencia em forma pública por duas razoes


principáis: primeiramente, porque o fato que ocasiona esta carta, é de ordem
pública, tendo sido noticiado pela imprensa nacional e internacional; em se
gundo lugar, porque, tendo escrito a V. Em.cia em termos privados, nao re
cebemos respostas, após haver esperado durante um razoável prazo. Nossas
cartas anteriores a V. Em.cia estao datadas de 18 de Janeiro (Mons. Boza
Masvidal) e 23 de fevereiro (Mons. Román e Mons. San Pedro) de 1989.
O tema da presente missiva é a mensagem de Natal enviada por V.
Em.cia ao Sr. Castro, ditador vitalicio de Cuba, por ocasiáo dos trinta anos
de tomada do poder. Nao repetiremos o que dissemos em nossa correspon
dencia privada, embora nos permitamos fazer um resumo dos pontos princi
páis que abordamos na mesma.

Diz Tamos a V. Em.cia que seria muito longo expor toda a situacao do
pai's no tocante á discriminacao, falta de liberdade religiosa, etc.; assinala-
mos o caráter discutivel das conquistas e das promocoes, porque, de um la
do, se fazem a prego ético e espiritual demasiado alto e, por outro lado, sao
beneficios muito relativos (carta de Mons. Boza Masvidal).
Também Ihe recordamos que Cuba sofre, ¡á há trinta anos, de urna
cruel e repressiva ditadura militar num Estado policial que viola ou suprime
constante e institucionalmente os direitos fundamentáis da pessoa humana.
Entre outras provas desta situapSo, mencionávamos as aventuras militares do
castrismo, que custaram milhoes de dólares ao povo cubano e milhares de vi-
timas á sua juventude (carta de Mons. Román e Mons. San Pedro).
Seria longo comentar, ponto por ponto, todas as af irmacoes de V. Em.
cia na sua referida mensagem, mas julgamos necessário assinalar algumas das
mais surpreendentes. Estima Sua Em.cia que 'hoje em dia Cuba pode sentir
se ufana por ser, em nosso continente tío empobrecido pela divida externa,
um modelo de justica social'. NSo queremos fazer V. E.cia dizer o que nao
disse; mas, lendo esta frase, poder-se-ia pensar que Cuba nao está, como o
resto do continente, empobrecida pela divida externa. Estamos certos de
que V. Em.cia sabe que Cuba tem enorme divida externa nao somente para
com os. países ocidentais, mas também para com os paises comunistas; se
gundo os últimos dados postos á nossa disposicao, esta divida sobe aproxi
madamente ao teor de 5.500 milhoes de dólares.

409
26 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 328/1989

No tocante á justipa social, da qual V. Em.cia afirma que Cuba é mo


delo em nosso continente, desejamos recordar-lhe que, enquanto um núme
ro bastante exiguo de hierarcas do Governo desfruta de todas as comodida
des da vida, o povo se vé reduzido ao nivel de sobrevivencia. Eminencia, al-
guns de nos estiveram recentemente em Cuba nao para discutir a maneira de
cozinhar camaroes e lagostas com o 'comandante' (ver Fidel e a Religiáo.
Conversas com Frei Betto, pp. 28-29.33-34), mas para conviver com nosso
povo e compartilhar com ele as suas angustias e a sua dor. Estamos certos
de que V. Em.cia nao deseja para o seu querido Brasil urna situacao na qual
um reduzidi'ssimo número retenha irreversivelmente todo o poder poli'tico
e económico, do qual abusa para seu proveito próprio e para perpetuar-se no
poder, enquanto a populacao em geral é mantida em condicóes de su je ¡cao
total equivalente á da minoridade. Sr. Cardeal. pergunte, por favor, a seus
amigos que visitam Cuba e se encontram com os personagens da ditadura,
se alguma vez viram qualquer destes a esperar pacientemente com o cartao
de racionamento na máo para poder comprar urna libra1 de carne de nove
em nove días ou duas camisas por ano, como o resto da populacho.

Diz aínda V. Em.cia que 'a fé crista descobre ñas conquistas da revolu-
pao os sinais do reino de Deus que se manifesta em nossos coracóes e ñas es-
truturas que permitem fazer da convivencia política urna obra de amor'. Nao
sabemos por que, ao ler estas frases, nos vém a mente aquelas outras de Pau
le VI em que afirma que 'a Igreja... recusa a substituigao do anuncio do
Reino pela proclamacao das libertacóes humanas e proclama também que a
sua contribuicao para a llbertacao nao seria completa se se descuidas» de
anunciar a salvacao em Jesús Cristo. A Igreja... nunca identifica libertacáo
humana e salvacao em Jesús Cristo, porque sabe... que nao é suficiente ins
taurar a llbertacao, propiciar o bem-estar e o desenvolvimento para que che-
gue o Reino de Deus' (Evangelii Nuntiandi n.34-350).

Por outro lado, V.Em.cla afirma que as estruturas vigentes em Cuba


'permitem fazer da convivencia política urna obra de amor' é desconheosr
totalmente a realidade cubana. Se as coisas fossem como diz V. Em.cia, por
que se há de considerar um delito tratar de escapar dessa convivencia poli-
tica que aqu¡ é qualificada como 'obra de amor'' Por que um país como Cu
ba, que mal conhecia a emigracao, viu, em trinta anos de ditadura castrista,
um milhao de seus cidadaos abandonar o país? Por que, no curto espago de
cinco meses em 1980, 125.000 pessoas se lancaram para o litoral da Florida
(U.S.A.) num éxodo incontrolável? Que deveríamos pensar, Sr. Cardeal, se
em cinco meses 1.100.000 brasileiros procurassem refugio no Chile?

Cremos que o Sr. Cardeal é vítima da sua bondade e do seu coracao


generoso. V. Em.cia nao conhece Cuba senao através do testemunho de pes-

' Medida inglesa de massa, igual a 0,4535923 kg, ou se/a, quase meio-quilo.

410
ECOS DE CARTA A FIDEL CASTRO 27

soas da sua confianza. Nao nos compete exprimir urna opiniao sobre as in-
tencoes dessas pessoas ou sobre o conhecimento que tais pessoas possam ter
da nossa estranhéza devida ao silencio de V. Em.cia ante a nossa oferta fra
ternal, de irmaos no episcopado,... oferta de por á sua disposicao outros
aspectos da situacao em Cuba, que, como se percebe, V.Em.cia nao conhece.

Um dos aspectos que poderiam preocupar V. Em.cia, é a falta de líber-


dade religiosa em Cuba, afetando especialmente os católicos. Esta falta de li
be rdade, da qual poderíamos oferecer pormenores a V. Em.cia desde que o
quisesse, reflete-se trágicamente ñas estatfsticas religiosas: Cuba é o único
país do Caribe e, provavelmente, da América Latina, que nos últimos trinta
anos tem visto diminuir em termos absolutos o número de católicos, sacer
dotes, Religiosos e Seminaristas, assim como a freqüentacSo da Missa do
minical.
A recente polémica suscitada pela mensagem natalina de V, Em.cia é
evidente prova do que estamos dizendo. V. Em.cia pode responder e fazer
todas as declaracoes públicas que julgou oportuno fazer, tanto na sua patria
como no estrangeiro. Segundo nos consta, os Bispos de Cuba conservaram
seu habitual silencio. A imprensa atribuiu a V. Em.cia a afirmacao de que a
mensagem, que pretendía ser confidencial e privada, se tornou pública so-
mente depois que o Sr. Arcebispo de Havana deu o seu consentimento.
Consta-nos, porém, pelo testemunho de pessoas absolutamente fidedignas,
que tal afirmacao nao corresponde aos fatos. Em.cia, nao duvidamos da sua
veracidade, mas julgamos que, urna vez mais, foi vftima de sua confianca e
credulidade em relacao a terceiras pessoas.

A propósito da liberdade religiosa, pedimos venia para de novo citar a


Exortacao Apostólica Evangelii Nuntiandi:
'Desta justa libertacao, ligada á evangelizado, e que visa a alcancar es-
trutura» que salvaguarden) as liberdades humanas, nao pode ser separada a
necessidade de garantir todos os direitos fundamentáis do homem, entre os
quais a liberdade religiosa ocupa um lugar de primeira importancia' (n. 39).
Queremos concluir reiterando a V. Em.cia o desejo que Ihe exprimi
mos em nossa correspondencia particular: 'Deus queira que seu país nunca
tenha que passar pela trágica experiencia que nos estamos atravessando'.

Senhor Cardeal, Paz e Bem!


Mons. Eduardo Boza Masvidal. Bispo de Los Teques

Mons. Agustín Román, Bíspo Auxiliar de Miami


Mons. Enrique San Pedro S.J., Bispo Auxiliar de Galveston-Houston"

Sem comentarios...

411
Fruto da Perestroika:

Projeto de Nova Legislagáo


Religiosa na URSS

Em símese: A exigua eficacia da perseguicao religiosa na URSS sugere


aos dirigentes soviéticos urna revisao de sua legislacio religiosa. Em fevereiro
de 1989 foi apresentado ás autoridades competentes um Projeto de nova le-
gislacSo, que cortamente significa abertura para os valores da fé ou respeito a
liberdade de consciéncia dos cidadaos. Verificase, porém, que ainda deixa a
désejar, pois a religiao continuaría sob controle permanente do Estado; ne-
nnuma associaca~o religiosa, segundo tal Projeto, pode ser fundada sem pre
via autorizacSo do Governo; este pode extinguir qualquer agremiacao religio
sa desde que a julgue infratora das leis vigentes... As atitudes do Governo,
em cada caso, nao precisam de ser justificadas, nem há recurso ao poder ju-
dietario. Donde se vé que o surto e a subsistencia das instituicoes religiosas,
segundo este novo Projeto, continuarlo a ter caráter precario, dependendo,
em varias situacoes, do arbitrio dos funcionarios do Governo.
Como quer que seja, o Projeto merece sersaudado com otimismo, pois
é provavelmente urna etapa na direcao de mais ampia liberdade de conscién
cia e de culto na URSS.

Já em PR 316/1988, pp. 397-406 e 326/89, pp. 290-303 foram publi


cados pronunciamentos de oficiáis do Governo Soviético que verificavam a
exigua eficacia da perseguicáo até agora movida á religiSo na URSS. Preconi-
zavam, ao mesmo tempo, a revisao das leis atinentes á liberdade de conscién
cia e ao exerci'cio do culto religioso, mesmo dentro do clima oficialmente
ateu e materialista do regime instaurado pelo comunismo.
A legislacSo atualmente em vigor na URSS relativa á religiao derivase
de um decreto datado de 1929 e revisto em 1975. Ora em fevereiro de 1989
o Sr. Konstantin Khratchev, Presidente do Conselho para Assuntos Religio
sos, enviou ás autoridades competentes um Projeto de lei alterando as dispo-
sipoes restritivas vigentes. É certamente um passo na direcao da liberdade re
ligiosa, embora ainda deixe a desejar em varios de seus aspectos, como se po-
derá depreender da leitura do texto, que, a seguir, vai publicado em tradu-
cá*o brasileira.

412
NOVA LEGISLACAO RELIGIOSA NA URSS 29

I. PROJETO DE LEÍ1

"Os cidadaos da URSS gozam de toda a plenitude dos direitos e das li


berdades socio-económicas, políticas e individuáis proclamados e garantidos
pela Constituicao da URSS e as leis soviéticas. O Estado Soviético assegura a
extensao regular dos direitos e das liberdades democráticas, a corroboracao e
o aperfeicoamento das suas garantías económicas, jurídicas e organizado-
nais. A liberdade de consciéncia, que exprime a atitude do homem frente a
reiigiao, é um dos principáis direitos constitucional dos cidadaos da URSS,
realmente garantidos pela legislacao soviética.

A lei sobre a liberdade de consciéncia visa a reforcar a unidade da so-


ciedade soviética e a criar as condicoes necessárias a urna participacáo ativa
de cada cjdadáo soviético na vida social.

.A presente lei garante aos cidadaos o direito de determinar, de mane i-


ra livre e autónoma, a sua atitude para com a reiigiao e as conviccoes corres
pondentes, de celebrar sem entraves os cultos religiosos, individualmente ou
em comum; ela garante a justica social e a igualdade dos direitos dos cida
daos independentemente da sua atitude para com a reiigiao.

I. PRINCIPIOS GERAIS

Artigo 1: Objetivo da legislacao soviética sobre a liberdade de cons


ciéncia

O objetivo da legislacao soviética sobre a liberdade de consciéncia é


regulamentar as relacóes sociais decorrentes do exercfcio da liberdade de
consciéncia estipulada pela Constituicao, determinar as garantías da mesma e
as condicoes organizacionais e jurídicas da atividade das organizacoes religio
sas sobre a base dos principios leninistas referentes á atitude frente a reiigiao
aplicados á etapa atual do desenvolvimento da sociedade soviética, assim co
mo reforcar a legalidade nesse setor.

Artigo 2: Legislacáb sobre a liberdade de conscidncia

A legislacSo da URSS e das Repúblicas federadas sobre a liberdade de


consciéncia compreende a presente Lei e os atos legislativos da URSSe das
Repúblicas federadas adotados em conformidade com aquela.

' O texto foi traduzido do francés tal como o publicou La Documentaron


Catholique, n. 1984, de 21/05/89, pp. 483-487. O tradutor do russo para o
francés foi o Prof. Yves Hamant, que ensina em París X, Nanterre, e que
também é o autor das notas de rodapé.

413
30 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 328/1989

Artigo 3: Conteúdo da liberdade de consciéncia

Conforme a Constituicao da URSS, todo cidadao tem o direito, indivi


dualmente ou em comum, de professar urna religiáo ou de nao professar ne-
nhuma, de determinar de maneira livre e autónoma a sua atitude frente á
Religiao, de propagar as suas conviccoes religiosas ou atéias.'
Os cidadaos da URSS tém o direito de adquirir e utilizar, sem entrav-
ves, livros religiosos na li'ngua de sua escolha, assim como objetos de finafi-
dade religiosa.2
Os genitores ou os seus substitutos tém o direito de ministrar a educa-
cao e o ensino religiosos e moráis aos seus filhos conforme as suas próprias
conviccoes.3
Artigo 4: Ilegal qualquer limitacáo da liberdade de consciéncia

O Estado toma as medidas necessárias para garantir a liberdade de


consciéncia dos cidadaos e defender os direitos e os interesses legítimos das
instituicoes e dos individuos associados para exercer comunitariamente o
seu direito á liberdade de consciéncia.

' Esta disposicao vem a ser, sem dúvida, a modificacao mais importante,
pois só poderá ser admitida se se fizer urna revisao da Constituido Soviética.
Com efeito; esta, em seu artigo 52, limita a liberdade de consciéncia ao ejer
cicio do culto e poe em paralelo a liberdade de culto e a liberdade de propa
ganda anti-religiosa, de modo que nao reconhece o direito de "propagar con-
viccóes religiosas". Tratase de um retorno á formulacao, mais liberal, da
primeira Constituicao, que reconhec/a a liberdade de propaganda religiosa
ou anti-religiosa.

"' A falta de livros religiosos é grande problema para os crentes. O projeto,


aludindo ás atividídes de instituicoes religiosas, nao define as condicoes em
que podem ser exercidas tais atividades.

1 O decreto que separa va a Igreja e o Estado em 1918, previa que os cida-


rliios pudessem "ensinar e estudar a religiao a titulo privado". Em breve, tal
disposicao foi interpretada em sentido muito restritivo: somente os genitores
poderiam ensinar o Catecismo aos seus filhos. Em 1923, urna Circular defi-
niu que era proibido o ensino privado do Catecismo a grupos de mais de
tres criancas.
Segundo o Projeto em pauta, os fiéis poderiam doravante organizar li
bremente, sem o controle das autoridades civis, a catequese dos filhos e dos
adultos em domicilios privados ou nos locáis das associacoes religiosas. Esta
disposicao, que decorre da precedente, corresponde a urna reivindicado es-
sencial dos fiéis.

414
NOVA LEGISLACÁO RELIGIOSA NA URSS 31

É proibida a promulgado de qualquer ato legislativo que limite a li-


berdade de consciéncia, assim como a concessao de qualquer favor a urna re-
ligiao frente ás demais.
O exercício do direito a liberdade de consciéncia está sujeito única
mente ás restricoes previstas pela leí e necessárias á protecáoda seguranpae
da ordem pública, da saúde, da moral assim como dos direitos e das liberda-
des dos outros cidadaos.

Artigo 5: Igualdade dos cidadaos independente da sua atitude frente á


religiáo

Os cidadaos da URSS sSo iguais perante a leí, independentemente da


sua atitude frente á religiáo. Esta igualdade é garantida em todos ossetores
da vida económica, política, social e cultural.
É proibida qualquer limitacao, direta ou indireta, dos direitos dos c¡-
dadéfos, assim como a concessao de favores a alguns, em funcao da sua atitu
de frente á religiáo, ou aínda a indicacao da sua filiacao religiosa nos docu
mentos oficiáis.
Sao passíveis de penas previstas pela lei qualquer ofensa aos sentimen-
tos dos cidadaos em funcao da sua atitude frente á religiáo, qualquer incita
mento á hostilidade e ao odio em funcao das crenpas religiosas ou das con-
viccóes atéias.

A ninguém é lícito apelar para as suas conviccoes religiosas a fim de se


subtrair ás obrigacoes cívicas estipuladas pela lei. Excecoes a esta regra po-
dem ser admitidas, caso por caso, mediante decisao judiciária e contanto que
urna obrigacao seja substituida por outra.1
Artigo 6: Separacáb da Igreja e do Estado

Na URSS a Igreja é separada do Estado.1 0 Estado nao interfere na


atividade interna das associacdes religiosas, desde que esta nao contradiga
nem as finalidades de tais associacdes nem ás leis soviéticas.

1 Esta disposicao parece legalizar a objecao de consciéncia. Esta é praticada


principalmente pelas Testemunhas de Jeová, que, por causa disto, sao fre-
qüen temen te condenadas ao cárcere.

2 O decreto de separacao da Igreja e do Estado em 1918 nao reconhecia,


personalidade moral ás associacdes religiosas. Atualmente estas funcionam
na prútica mais como pessoas moráis (se assim nao fosse, o seu funcionamen-
to seria impossível); devem porém, recorrer a todo tipo de artificios e estao
sempre na dependencia estrita das autoridades locáis. Por exemplo, umapa-
róquia nao pode empreender o mínimo reparo ou conserto sem a autoriza-

415
32 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 328/1969

As questoes que dizem respeito diretamente á atividade das associa


cóes religiosas, nao podem ser regulamentadas pelos órgaos do Estado e as
organizares sociais sem a participado das associacóes religiosas ou sem pre
vio acordó com estas.

As associacóes religiosas, sem se imiscuir nos assuntos do Estado e dos


seus órgáos, podem participar no diálogo social, principalmente através dos
meios de comun¡cacá"o social, assim como na atividade das formacoes so
ciais, em conformidade com os seus estatutos; podem manter relacoes e con
tatos internacionais, inclusive trocas de informacóes.1
0 Estado oferece sua contribuicá*o ás associacóes religiosas no desem-
penho da sua atividade legal.

Artigo 7: Separacáb da escola e da Igreja

A escola na URSS está separada da Igreja.

cao destas; nem é possível a urna paróquia recorrer a um tribunal para defen
derse dessas autoridades locáis.
Quanto aos mosteiros e aos Seminarios, a sua existencia nao estava
prevista pela legislacio vigente.
Até o presente, a lei só reconhece praticamente as associacóes paro-
quiais. As Igrejas como tais com sua organizacao nacional, regional, diocesa
na, tém um estatuto de fato e nSo de direito. No atual estado da legislacio,
0 Patriarca de Moscou só pode ser considerado como o presidente de um
centro religioso habilitado a "fabricar vasos litúrgicos e adquirir vefculos e
edificios para os seus usos" (artigo 20 do decreto de 1929-1975)!
0 reconhedmentó da personalidade moral modifica, pois, sensivel-
mente a situacao jurídica de todas as instituicóes religiosas (cf. artigos 9 e
14).

1 Afirmase hoje na URSS que, se a Igreja está separada do Estado, ela nao
está separada da sodedade. Tal é o significado da proposicSo que garante a
participado das associacóes religiosas no 'diálogo social". Todavía o texto
que prevé o acesso das Igre/as aos meios de comunicacao social, nao define
as condicoes desse acesso.
Pódese perguntar quais sao as misteriosas 'formacSes sociais' do últi
mo parágrafo. Parece tratarse do que se chama atualmente na URSS 'grupos
informáis', isto é, todos os tipos de associacóes e clubes das mais variadas fi
nalidades que proliferam sem existencia legal. As autoridades soviéticas hesi-
tam sobre o tipo de estatuto que Ihes hio de conceder. É difícil dissociar a
sorte das Igre/as da soné dessas associacóes - o que pode explicar a índole
vaga do Projeto em varios dos seus pontos.

416
NOVA LEGISLAQÁO RELIGIOSA NA URSS 33

O ensino da religiao nao é permitido nos estabelecimentos de ensino


públicos e do Estado nos quais se ensinam disciplinas gerais. Os cidadaos po-
dem ensinar e estudar a religiao a título privado, a sos ou em grupos, em do
micilio privado ou numa associagáo religiosa.

II. ORGANIZARES RELIGIOSAS NA URSS

Artigo 8: As organizares religiosas e seus órgábs de direcao

As organizapoes religiosas na URSS sao agremiacoes de cidadáos cujas


atividades tém por finalidade satisfazer a necessidades religiosas. Sá*o tam
bé m as instituipoes religiosas que contribuem para a satisfágalo das mesmas
necessidades.

Por 'organizacoes religiosas' compreendem-se as associacoes religiosas,


as direcoes e os centros religiosos, os mosteiros, os estabelecimentos de en
sino teológico e outras organizapoes.
Os órgaos de di re cao das organizapóes religiosas sao constituidos se
gundo os procedimentos previstos pelos seus estatutos.

Artigo 9: Personalidade moral das organizapoes religiosas

Cada organizacao religiosa constituí urna pessoa moral; goza dosdirei-


tos e assume as responsabilidades conforme ás finalidades da sua atividade.

Artigo 10: Associacao religiosa

Os cidadáos da URSS tém o direito de se unir em associacoes religio


sas para satisfazer comunitariamente as suas necessidades religiosas.

Urna associapao religiosa é urna associapao voluntaria autogerenciada,


constitui'da por cidadáos de ao menos 18 anos de idade, cuja atividade tem
por fim satisfazer ás necessidades religiosas.

Artigo 11: Registro de urna associacao religiosa

Urna associacSo religiosa é registrada pelo Comité Executivo do Sovie-


te regional, desde que haja ao menos dez pessoas residindo no local previsto
para a sua atividade.
O pedido de registro da associacao religiosa, assim como os seus esta
tutos, se urna associapao de mesma orientapá"o, tendencia ou córrante religio
sa já nao foi anteriormente registrada, é examinado pelo Comité Executivo
do Soviete regional no prazo de um mes a partir da data de entrada. A deci-
sao tomada é comunicada por escrito aos peticionarios assim como ao órgao
de Estado da URSS encarregado dos Assuptos Religiosos.
Em caso de recusa, pode haver apelo ao órgao de Estado encarregado

417
34 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 328/1989

dos Assuntos Religiosos, que tem o direito de tomar umadecisao definitiva


sobre a questao.'

Artigo 12: Criapao de direcóes e centros religiosos

As associapoes religiosas tém o direito, no decorrer das suas assem-


bléias, de criar voluntariamente urna organizapao religiosa regional ou cen
tral, dotada do seu órgao de direcao: direpáo, centro religioso ou outro.

As direpoes e os centros religiosos trabalham na base dos seus estatu


tos adotados pelas assembléias das associacoes religiosas e registrados junto
ao órgáto de Estado da URSS encarregado dos Assuntos Religiosos.

As despesas de manutenpafo das direpoes e dos centros religiosos e do


seu aparato s5o cobertas pelas quantias estipuladas voluntariamente pelas as-
sociap5es religiosas na base dos seus respectivos rendimentos, jissim como
pelos emolumentos auferidos das atividades de produpao e edipao dessas or-
ganizapoes religiosas.

1 0 parágrafo segundo o qual o Conselho dos Assuntos Religiosos pode por


termo á atividade de uma organizado religiosa, reafirma urna disposicao da
atual legislado, sem introduzir garantías referentes aos motivos da decisao,
á possibilidade de recurso, etc.
Este artigo nao acarre ta me/hora nenhuma; vem a ser mesmo um recuo
na medida em que o pedido de registro é confiado ás autoridades locáis, que
sao freqüentemente as mais hostis á reabertura de igrejas. Cada vez que é
apresentado a Khartchev um caso de recusa de registro, ele atribuí a respon-
sabilidade ás autoridades locáis. Todavía o argumento é falso, pois, no atual
estado da legislacao, é o Conselho dos Assuntos Religiosos que, a pedido das
autoridades locáis, deve examinar os pedidos de críacao de associacoes reli
giosas. Com o novo texto, Khartchev ¡á nao precisará de desfigurar a verda-
de\
0 novo texto nao exige que se explicite o motivo da recusa de regis
tro nem prevé apelo aos tribunais.
Além disto, perguntase: que significa o registro dos estatutos se uma
associacao da mesma confissao ¡á nao foi anteriormente registrada? Registra
da onde? No distrito? No Conselho dos Assuntos Religiosos? Mais: visto
que, conforme a leí, as associacoes religiosas sao, no plano civil, independen-
tes das Igrejas, que é que o Estado tem a ver com o fato de que tal ou tal
associacao professa a Ortodoxia, o Catolicismo romano, o Catolicismo de ri
to oriental ou o pentecostalismo? Isto estaría em contradicao formal com o
principio da separacao da Igreja e do Estado.

418
NOVA LEGISLAQÁO RELIGIOSA NA URSS 35

Artigo 13: CriaeSb da moiteiros, estabelecimantos de ensino teológico


e de unidades de producáb em dependencia de urna organizado religiosa

As direpoes e os centros religiosos podem criar mosteiros, estabeleci-


mentos de ensino teológico e unidades de produpao para a fabricapá*o de
objetos de culto, consentáñeos com os seus estatutos ratificados pela d¡re-
gao ou o centro religioso.

Esses estatutos devem ser registrados pelo órgáo de Estado da URSS


encarregado dos Assuntos Religiosos.

Artigo 14: Modalidades de interrupcao e suspensáo da atividade de


urna organizacao religiosa

A atividade de qualquer organizapáo religiosa poderá ser interrompida


ou suspensa se for contraria a iegislapá"o vigentes, ás finalidades da sua cria-
pao ou aos seus estatutos.

Poe-se fim á atividade de urna organizapáo religiosa:

- por decisafo da assembléia geral dessa associacao religiosa;


— por decisao de um Congresso de dissolver o órgáo de direpao eleito
por ele;
- por decisao, do órgao de direpáfo, de dissolver a organizapáo religiosa
por ele criada.

0 órgao de Estado da URSS encarregado dos Assuntos Religiosos po


de, por sua própria iniciativa ou provocado pelos órgaos locáis do poder do
Estado, tomar a decisáo de encerrar a atividade de urna organizacao religiosa
ou de suspendé-la, se tiver infringido a legislacSo vigente ou cometido atos
contrarios as finalidades da criacáo dessa organizapáo religiosa ou de seus es
tatutos.

III. SITUACÁO DAS ORGANIZACÓES RELIGIOSAS NO


TOCANTE Á POSSE DE BENS

Artigo 15: Uso de bens da propriedadedo Estado, de organizacoes so-


ciáis ou de cidadábs

As organizapoes religiosas tém o direito de utilizar para as suas necessi-


dades, na base de contrato, os edif fcios e os bens colocados á sua disposipáo
por organismos do Estado, organizacoes sociais ou cidadSos.
Os ComitSs Executivos dos Sovietes locáis p6em gratuitamente á dis-
posicSo das organizacoes religiosas os edificios e os bens especialmente des
tinados á satisfacSo das necessidades religiosas cujo proprietário é o Estado.

419
36 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 328/1989

As organizacóes religiosas tém direito prioritario sobre as outras orga


nizacoes para utilizar os edificios e os bens especialmente destinados ¡¡o

culto.1
No caso de se recusar as organizacóes religiosas a entrega dos edificios
e dos bens especialmente destinados ao culto, pode haver apelo ao órgao
de Estado da URSS encarregado dos Assuntos Religiosos, que tomará urna
decisao definitiva sobre a questao.

As organizacóes religiosas devem prover á boa conservacao dos edifi


cios e dos bens de propriedade do Estado, das organizacóes sociais e dos
cidadáos, e utilizá-los de maneira conforme ao seu destino específico.
A exploracao da térra por parte das organizacoes religiosas efetuase
segundo as modalidades previstas pela legislacao da URSS e das Repúblicas
federadas.

Artigo 16: Propriedade das organizacóes religiosas

Os bens adquiridos pelas organizacoes religiosas com os seus próprios


recursos ou ñas condicoes previstas pela legislacao vigente sao propriedade
das organizacoes religiosas.

As organizacoes religiosas podem possuir edificios, veículos e outros


bens conformes as finalidades das suas atividades.

As organizacoes religiosas podem também oossuir bens situados no es-


trangeiro.

Artigo 17: Transmissáo dos bens de urna organizacao religiosa


Quando urna instituicao religiosa poe termo as suas atividades, os bens
que possui sá"o transmitidos a organizacao religiosa que a criou.
Quando cessa a atividade de urna associacáo religiosa, a questao da uti-
lizacáo dos bens que possui, é regrada pelos órgaos locáis do poder do Esta
do, com a partic'pacao dos representantes dessa associacao ou da organiza-
cao religiosa superior.

Artigo 18: Protecáb dos bens das organizacóes religiosas

Ninguém tem o direito de utilizar as propriedades das organizacoes re


ligiosas para o seu proveito pessoal ou para qualquer outra finalidade parti
cular. As propriedades das organizacoes religiosas sao protegidas pela lei ao
mesmo título que os bens do Estado e das organizapoes sociais.

1 Isto significa, por exemplo, que, se urna Municipalidade é solicitada por


um projeto de transformacao de urna igreja desalivada em bar e, paralela
mente, por um pedido de reabertura dessa igreja apresen tado por urna asso-
ciacio paroquial, a esta última é que deve ser dada a preferencia.

420
NOVA LEGISLAQÁO RELIGIOSA NA URSS 37

IV. GARANTÍAS DOS DIREITOS DAS ORGANIZARES RELIGIOSAS


E DOS CIDADÁOS NELAS REUNIDOS

Artigo 19: Contatos entre os individuos

Independentemente da sua atitude para com a religiao, os cidadaos da


URSS tém o direito de estabelecer e entreter contatos pessoais diretos, indi
vidualmente ou em grupos, e de se comunicar entre si tanto no interior
quanto no exterior do país.'
Artigo 20: Livre exercício dos cultos religiosos

As cerimónias e os ritos religiosos se desenvolvem sem entraves ñas ca


sas de oracao e em torno délas, ñas instituicoes de culto, assim como nos
apartamentos e ñas casas dos cidadaos, nos cemitérios e nos crematorios.

De acordó com a administracáo respectiva, a livre celebracao de ritos


religiosos é permitida nos hospitais, ñas casas para pessoas idosas e para invá
lidos e nos lugares de detencáo.

Nos outros casos, a celebracao de cerimónias e de ritos religiosos se


realiza segundo a regra comum e as modalidades previstas pelos órgáos do
poder do Estado.2

Artigo 21: Relac6es entre as organizados» religiosas e os cidadaos no


tocante ao traba Iho

As organizares religiosas tém o direito de contratar cidadaos com os


quais realizem um contrato de trabalho registrado nos órgaos sindicáis. As
formas e o sistema de retribuicao do trabalho dos empregados sao determi-

1 A necessidade de se introduzir um artigo que garanta aos cidadaos o direi


to de manter contatos pessoais uns com os outros, é reveladora do estado
das liberdades na URSS. Poder-se-ia supor que tal direito fosse-algo muito
natural. Mas o decreto de 1929-75 proibe qualquer reuniao de oracao, de es-
tudos bíblicos, etc. Numa recente entrevista a urna revista soviética, Khart-
chev reconhecia: "Se voces se reúnem com seus amigos para cantar, voces
nao correm risco algum. Mas, se quiserem rezar juntos sem autorizacao, po-
derao prever aborrecímentos".

2 Atualmente as cerimónias religiosas sao permitidas apenas ñas igrejas, nos


templos, etc. A necessidade de obter permissao das autoridades locáis para
celebrar num apartamento privado equivale a urna proibicao. Segundo o de
creto de 1929-75, nos edificios e nos lugares de detencáo é autorizada ape
nas a administracao dos sacramentos a enfermos e moribundos 'em recintos
especialmente ¡solados'. Mas nao se tem noticia de que um sacerdote ¡amáis
tenha sido autorizado a penetrar num campo de prisioneiros ¡a nSo ser como
prisioneiro ele mesmo).

421
38 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 328/1989

nadas pela própría organizado, mas o montante do salario nao pode ser in
ferior ao da categoría análoga dos empregados das empresas ou das adminis-
tracdes regidas pelo Estado ou por organizares sociais.

Os cidadáos que trabalham numa organizacao religiosa na base de um


contrato de trabalho, podem constituir urna organizacao sindical.

Artigo 22: Direitos dos cidadábs que trabalham em organizacoes reli


giosas

Os cidadáos que trabalham em organizares religiosas na base de um


contrato de trabalho, gozam dos mesmos direitos que os operarios e os em
pregados das empresas e das administraooes regidas pelo Estado ou por orga
nizacoes sociais.

Artigo 23: Seguro social e Seguranea social dos empregados das organi
zares religiosas

Os cidadáos que trabalham ñas organizacoes religiosas na base de con


trato de trabalho, tém direito ao seguro social e aos encargos sociais ñas mes-
mas condiooes que os operarios e os empregados das empresas e das adminis-
tracoes regidas pelo Estado ou por organizacoes sociais.

Em vista disto, toda organizacao religiosa deposita no fundo estatal


para a seguranpa o seguro social, a partir dos seus recursos, e as cotas estipu
ladas ñas normas e regras do Conselho de Ministros da URSS.
Os cidadáos que trabalham em organizacoes religiosas na base de um
contrato de trabalho, recebem aposentadoria segundo a regra comum, con
forme a legislacáo vigente.
Artigo 24: Impostes sobre os rendimentos das organizacoes religiosas
e dos cidadáos que nelas trabalham

Os proventos resultantes da atividade de producáo e ded¡cacao das or


ganizacoes religiosas sao taxados conforme a legislacáo da URSS, com exce-
cáo das quantias depositadas para fins de beneficencia ou para obras sócio-
culturais.

A taxacao dos proventos dos cidadaos que trabalham ñas organizacoes


religiosas na base de contrato de trabalho, se realiza segundo as normas pre
vistas para os operarios e os empregados das empresas e das administracoes
do Estado.

V. CONTROLE DA APLICACÁO DA LEGISLACÁO SOBRE A


LIBERDADE DE CONSCIÉNCIA E RESPONSABILIDADE DAQUELES
QUE A VIOLAM

Artigo 25: Controle da aplicacáo da lei relativa á liberdade de corw-


ciencia

422
NOVA LEGISLACÁO RELIGIOSA NA URSS 39

O controle da aplicarlo da lei relativa a liberdade de consciéncia em


todo o territorio da URSS depende do órgao do Estado da URSS'encarrega-
do dos Assuntos Religiosos, assim como dos órgaos a ele subordinados, con
forme o respectivo regulamento.

0 órgao de Estado da URSS encarregado dos Assuntos Religiosos é


responsável pela execucao de urna política de Estado uniforme em relacao ás
religioes e destinada a garantir a liberdade de consciéncia dos cidadaos.

Artigo 26: Responsabilidade daqueles que violam a legislacao relativa


á liberdade de consciéncia

Os - funcionarios e os cidadaos culpados de infracao da legislacao


relativa á liberdade de consciéncia incorrem ñas penas previstas pela legisla-
cao da URSS e das Repúblicas federadas.

VI. TRATADOS INTERNACIONAL

Artigo 27: Tratados Internacionais

Se algum Tratado Internacional subscrito pela URSS estabelecer regras


diferentes daquelas contidas na legislacao relativa á liberdade de consciéncia,
se rao aplicadas tais regras do Tratado Internacional."

COMENTANDO...

O Projeto merece ser saudado como sinal de abertura do Governo So


viético, embora conserve explícita ou implicitamente urna orientacao restri-
tiva á religiáo na URSS. Com efeito,

1) a fundapSo de associacoes religiosas na URSS ainda nao será livre,


mas terá que obter a autorizado previa do Governo. Este a poderá recusar
sem justificar sua atitude — o que quer dizer que razoes pessoais destes ou
daqueles funcionarios do Governo pode rao ser suficientes para impedir o
surto de urna associacao religiosa. Nem haverá recurso algum a Tribunal após
urna recusa do Executivo. Observem-se ainda o teor do Artigo 11 e os co
mentarios que Ihes faz a nota em rodapé.
2) Urna vez fundadas as associacoes religiosas, poderao ser suspensas
ou extintas, desde que a autorídade governamental julgue que infringiram
alguma lei vigente, sem que deva justificar sua decisao e sem apelapao para o
Poder Judiciário. Isto quer dizer que os membros das associacoes religiosas
estarao.sempre sujeitos a intervencoes da Polfcia, que os poderao acusar,
com ou sem fundamento, de violarem as leis do país.
3) Como quer que seja, sao reconhecidos direitos fundamentáis da pes-
soa humana, derivados da consciéncia indevassável de cada qual. Vé-se que a

423
40 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 328/1989

vitalidade da religiao se impoe aos dirigentes soviéticos, que se véem obriga-


dos a mudar seu modo de pensar e agir em relacSo a mesma.
Pode-se crer que este primeiro passo em demanda de maior respeito
aos cidadáos religiosos terá conseqüéncias benéficas para a vida religiosa do
pai's e sugerirá aos governantes soviéticos atitudes ainda mais humanas e no-
bres em relacSo aos seus concidadáos.

* * *

Imagens na Biblia, no Cornejo do Cristianismo e Hoje, pelo Pe. Freí


Paulo Avelino de Assis O.F.M. - Centro Bíblico Católico, Caixa postal
50.500 (Rúa Itaqui 146, Canindé) - 03095 Sao Paulo fSP), 157x230mm,
78 pp.
Este livro foi escrito em vista das objecoes dos protestantes ao uso de
imagens na Igreja Católica. O autor, que é Doutor em Teología Bíblica e vem
desenvolvendo intenso apostolado, apresenta a temática das imagens, mos
trando que no Antigo Testamento elas eram proibidas ta'o somente por cau
sa do perigo de idolatría que ameacava o povo de Israel cercado de povos
pagaos; nio obstante, o Senhor Deus mandou fazer a serpente de brome
(el. Nm 21.4-9), as imagens que ficavam junto á Arca da Alianca (cf. Ex 25,
18-22), os querubins do Templo de Jerusalém (cf. 1Rs 6,23-29). Passando
ao Novo Testamento. Frei Paulo Avelino evidencia que Cristo nao se opós
ás imagens; Ele mesmo se comparou a imagem (= a serpente de brome) em
Jo 3,14. Os cristaos compreenderam a provisoriedade da proibicao do Anti
go Testamento e desde o primeiro século foram pintando e esculpindo a
imagem de Cristo e a de personagens bíblicos no intuito de se ediiiearem ou
de facilitar a elevacao da mente ás realidades transcendentais. No século Vil.
por influencia de judeus e muculmanos, teve origem a controversia icono
clasta (dada á quebra de imagens), que suscitou o martirio de numerosos
cristaos e terminou com o Concilio de Nicéia II (787); este confirmou o
culto de veneracao (nao adoracao) ás imagens como sendo culto dirigido a
Cristo ou aos Santos representados por símbolos visiveis.
O livro termina com um capítulo sobre a Pastoral das Imagens: lem-
bra como SSo Francisco de Assis foi modificado pela imagem do Senhor cru
cificado...; também explana o sentido do Presepio e da Árvore de Natal.

A obra de Frei Paulo A velino é muito oportuna; vem a ser valioso sub
sidio para a catequese e o diálogo com os protestantes. Seja difundida em
ampia escala! O povo de Deus só pode agradecer ao autor a confeccSo deste
importante instrumento de formacao doutrinária e de piedade.

424
Nova corrente filosófica:

O Holismo: Que é?

Em síntese: 0 holismo visa a acentuar o todo, considerando a unidade


presente no universo e ñas suas partes. Pretende, pois, entrelacaros diversos
ramos do saber e do agir humano em interdisciplinaridade, transdisciplinarida-
de, transpartidarísmo, etc. Para tanto, recebe grande contingente aU pensa
dores orientáis, para os quais o Sime o Nao se confundem no Ser Supremo.
A propósito notamos que é inegável e indestrutível a dualidade exis
tente no mundo: masculino e feminino, día e noite, verao e invernó, seco e
(¡mido... Tratase de realidades complementares, que constituem dualidade e
nao dualismo (principios antagónicos). 0 ideal do holismo será atingido nao
pela confusao das idéias e das ciencias, mas pela conversao dos afetos e dos
coracdes. As pontes se construírao entre os homens mediante a superacao do
egoísmo; esta tarefa nao destrói a identidade de cada criatura, mas faz que
cada qual, sem se autodestruir, se integre na harmonía do todo. Alias, o Ca
tolicismo deriva seu nome de kath'holon. é a forma mais antiga e genufna
de holismo; apregoa a reuniao de todos os povos numa só familia humana
centrada em Jesús Cristo, é somente com Deus que os homens conseguírao
vencer o egoísmo que dilacera a humanidade.

•k * *

Tsm tomado vulto no Brasil certa corrente de pensamento dita "holis


mo"; donde o adjetivo "holística". Entre nos instalou-se urna Fundacáo Ho-
ICstica em Brasilia, onde o Governo do Distrito Federal cedeu urna área pro-
pria para a construcab da sede de urna "Cidade da Paz". Esta tem seu Memo
rial de Instituicá'o datado de 15/09/87; destinase a "enriquecer o clima cul
tural de Brasilia", tida como "cidade mística, polo energético do planeta
Térra, talvez o futuro centro do Terceiro Mundo", onde se diz que os
OVNIs sao visitantes assíduos.

Dada a difusao da temática, procuraremos, ñas páginas subseqüentes,


expor o que seja o Holismo e tecer-lhe alguns comentarios.

1. As grandes linhas do Holismo

A palavra Holismo vem do grego hotos, hólon, que significa todo. De-

425
42 "PERGUNTÉ E RESPONDEREMOS" 328/1989

signa a tendencia a sintetizar ou, melhor, a ver "a unidade que está subyacen
te a tudo aquilo que nos dividimos em partes". O fundador dessa escola filo
sófica é, comodizem, Jan Christiaan Smuts (1870-1950), Primeiro-Ministro,
militar e filósofo sul-africano; considerava os fatores da natureza como "to
dos", que nao podem ser reduzidos a soma de suas partes; a evolucfo do uni
verso é que determinaría essa característica da natureza, como se lé na obra
"Holism and Evolution" (1926).

Os adeptos deste modo de pensar julgatn que constituí auténtica revo-


lucáo filosófica, a qual dará im'cio ao terceiro milenio. Este "será holi'stico
ou nao será!" (Pierre Weil). Eis como urna publicacab holi'stica de Brasilia
expoe a sua mensagem:

"O holismo aparece como o signo de urna revolucao que se opera no


pensamento ocidental neste final de milenio. Se examinarmos os sentidos
com que o termo vem sendo empregado nesses diferentes contextos, vere
mos que todos eles indicam urna forca de pensar a realidade que tem a ver
com a etimología da palavra, que vem do grego hólon (inteiro, completo).

Assim, na filosofía, o holismo se refere a urna tendencia do universo a


sintetizar unidades em totalidades organizadas. Na psicología ele é emprega
do para as concepcóes e terapias que enfocam o homem como ser uno (in
teiro, completo) e que se opoem ás correntes tradicionaís, que o consideram
como um ser dual (corpo e mente). Na antropología, chamam-se holistas
aquetas sociedades tradicionais, onde cada pessoa é considerada como parte
do todo social, e nao como um ser singular. O termo ai'se opoe ao individua
lismo, em que cada pessoa é tida como um individuo. Nesta classif¡cacao, in
dividualistas sao as sociedades modernas do Ocidenxe, de tradicao crista. As
demais sociedades do planeta sao holistas, como, por exemplo, a india, onde
cada pessoa é parte de determinada casta, e as castas, em seu con/unto, com-
poem o todo social.

Em algumas áreas nao se emprega o termo holismo, embora se veja


presente o mesmo conceito que ele designa. Na epistemología, fala-se de
abordagem sistémica, ou seja, a consideracao de um determinado fenómeno
sob diferentes óticas, simultáneamente, de forma a se conseguir urna com-
preensao total do mesmo. É urna abordagem que se opoe ao conhecimentó
fragmentado da tradicao ocidental. Na socioeconomia, fala-se de desenvolví-
mentó integrado, o que consiste num conjunto de estrategias desenvolvímen-
tistas que atacam, de forma globalizada, os problemas de determinada re-
giao. Diferentemente das estrategias economicistas tradidonais, queso viam
o problema do desenvolvimento sob o ángulo da producao, aquí tentam-se
solucóes tanto económicas quanto sociológicas, poli'tícas, culturáis, ecoló
gicas, etc.

No campo das artes, o raio láser permitiu urna nova forma de represen-
tacio visual, a holografia, que projeta tridimensionalmente o objeto (com-

426
HOLISMO:QUEÉ? 43

pleto, inteiro), substituindo a forma pardal das duas dimensoes" (Guia "Ser
Alternativo", Brasilia, Dezembro 1987, n. 8,pp, 7e8).
Com outras palavras aínda: a tendencia holfstica procura estabelecer
pontes onde há divisSes e resgatar a consciéncia unitiva, de totalidade. "NSo
haja cisá"o, e sim uniao", dizem os holistas. Em conseqüéncia, apregoam em
política o transpartidarismo;' no setor profissional, a transdisciplinaridade;
no setor universitario, a interdisciplinaridade, etc.

"Chegou o tempo em que precisamos de jogar pontes sobre todas as


fronteiras: as nadonais e culturáis, as científicas e epistemológicas, as ideoló
gicas e religiosas, as do interior da razio e do coracSo" (Pierre Weil). t
Em marco de 1986 a UNESCO realizou um Coloquio em Veru-.za, do
qual participaran^ dezenove representantes, mundialmente conhecidos ou
Premio Nobel, das ciencias biológicas, físicas, humanas e das tradicoes.2
Deste encontró resultou urna Declaracáo, que enfatiza a urgencia de um es-
tudo transdisciplinar ou do encontró entre a ciencia e as grandes tradicoes es-
pirituais da humanidade; reconhecia outrossim a convergencia e complemen-
taridade dos diversos enfoques dos pensadores desejosos de resolver os pro
blemas do momento. Para cultivar tais propósitos, já existe em París a Uní-
versidade Holística Internacional, que tem por presidente o Dr. Jean-Yves
Laloup e por vice-presidente o Dr. Pierre Weil. Tal Universidade apoiou a
Associacao de Análise Transacional de Brasilia e a FundacSo Holística do
Brasil para realizarem o 1? Congresso Holístico Internacional na capital
federal em 1987. Este Congresso contou com a presenca de Jean-Yves
Laloup e Pierre Weil e a presenca ou, ao menos, a adesao do médico Dr.
José Angelo Gaiarsa, do matemático Prof. Ubiratan D. Ambrogio, Pro-Re i-
tor da Unicamp, do Prof. Murilo Nunes de Azevedo, engenheiro orientalis
ta, do jornalista Luiz Alberto Bahía, do rabino Henry Sobel, presidente do
Rabinato da Congregapao Israelita Paulista, do Prof. André Chouraqui, vi-
ce-prefeito de Jerusalém, da Sra. Rose-Marie Muraro, escritora, píoneira do
Movimiento de Libertacao da Mulher no Brasil...

A imprensa assim comentou a realizacao de tal Congresso:

"Um bazar oom mil e urna rtovidades

0 Centro de Convencoes se transforma, de hoje a domingo, num aglo


merado de seitas, terapias corporais, meditacoes transcendentais as mais di
versas, corren tes filosóficas e medicinas naturais.

1 Pergunta-se: que significa isto?


2 TradipoB», no contexto hoKstico, significa "conjunto de doutrinas eprá-
ticas religiosas ou moráis, transmitidas de secuto em sáculo; engloba as dife
rentes concepcdes cristS, judaica, muculmana, budista, sufista..."

427
44 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 328/1989

Isto é holístico, assim como hólos significa o todo. Nos corredores do


Centro, ¡números standersse ocupam do 'comercio holístico', com camise
tas, pedras, pirámides e pequeños amuletos, além da farta literatura forneci-
da pelas 'atracoes' francesas e americanas presentes. Ao final de cada confe
rencia os autores estarao concedendo autógrafos de seus trabalhos.
Na abertura do I Congresso Holístico Internacional o Governador Jo
sé Aparecido lembrou seu acaten tado projeto de construir a Alvorada, 'oda-
de da paz', que abrigará a primeira Universidade Holística do Brasil".
A justificativa do I Congresso Holístico Internacional encontra-se num
dos impressos preparatorios do mesmo assim formulada:

"Por que um Congresso Holístico?

Somos educados para a fragmentacao, para a unilateralidade de visio


que, na nossa cultura racional, denominamos especializacao. E também inte
riormente estamos divididos, compartímenta/izados, esfacelados. £ por estas
divisoes internas e externas, que se retroalimentam, pagamos o doloroso pre-
co da desagregacao e do ¡nfindável confuto que tem caracterizado a vida hu
mana.

Por outro lado, a Física quSntica demonstra que, em última instancia,


só existe espaco onde nao há fronteira alguma. Somos toreados a constatar
que toda fronteira. toda di visio, é criacao da analítica mente humana que,
como um bisturí, retalha a unidade cósmica, o hólos, o Todo. Assim, por
seu próprio caminho, a ciencia moderna aproximase da visao dos antigos
mestres das diversas Tradiqdes de sabedoria, que nos deixaram o precioso
legado da visao nao dual.

O Congresso Holístico pretende ser um forum para o exercído da


transdisdplinaridade, onde representantes de notorio saber das ciencias,
das artes, e das tradicoes possam iniciar, de fato, um diálogo inusitado, cria-
tivo e que aponte novas direcóes para urna busca antiga".
Sao estes alguns pontos importantes para se ter urna no?ao do que
seja o Holismo e das suas metas.

Refutamos agora sobre tal proposta.

2. Ponderando ...

Quem lé os impressos divulgativos do Holismo. tem motivos para jul-


galos vagos e indefinidos. Por certo, a uniao dos homens entre si é meta
excelsa, mas o caminho proclamado pelo Holismo nao pode deixar de pare
cer confuso e artificial. Para lancar um pouco de claridade sobre tal pro
posta, precisamos de distinguir: 1) plano ontológico; 2) plano lógico e
3) plano afetivo.

428
HOLISMO:QUEÉ? 45

2.1. Plano ortológico

O plano ontológico é o plano do ser (on, óntos, ente, em grego) ou


das estruturas naturais.
A natureza é um todo harmonioso composto de partes diversas, incon-
fundi'veis entre si, ou irredutfveis urnas as outras. Com efeito, ela consta de
homem e mulher, masculino e feminino, luz e trevas, dia e noite, ve rao e in
vernó, calor e frió, dureza e moleza, seca e umidade, materia e espirito,
corpo e alma... Estas diversas afirmacdes da natureza nao estío em antago
nismo mutuo ou em dualismo (o que seria mau), mas estáo em dualidade -
o que quer dizer: sao facetas diferentes que se complementam e que consti-
tuem o ambiente natural propicio ao desenvolvimento do homem e da vi
da. Quem quisesse extinguir essa dualidade, poria termo á harmonía do uni
verso e á própria historia do género humano; sabe-se que a entropía ou a
reducao do calor e do frió a urna temperatura moma uniforme implicará
o fim da vida e do mundo atual.

A historia só tem graca porque existem o masculino e o feminino, o


dia e a noite, o verao e o invernó... Por conseguite, será sempre necessário
reconhecer a dualidade existente no mundo e nao a querer extinguir.

Está claro, porém, que este universo é perpassado por urna ordem es
tupenda, que garante precisamente a sua sinfonía (= convergencia de vozes).
Neste sentido pódese falar de unidade e de integracao num todo harmonio-
so. A evolucáo dos seres vivos parece teleguiada; é orientada para urna fina-
lidade e nao se processou ao acaso; dir-se-iaque urna idéia fundamental vai-
se desabrochando e afirmando ñas sucessivas fases da evolucao ascendente
do universo. Este plano básico, porém, se manifesta numa multiplicidade de
seres específicamente diversos, existentes num sistema equilibrado; neste sis
tema, uns elementos precísam dos outros, porque estes outros tém o que os
primeiros nao tém, e vice-versa.

2.2, Plano lógico

O plano lógico é o plano do pensar.

É obvio que o pensar, para ser verídico, tem que ser conforme a natu
reza real. Conseqüentemente no plano lógico nao se poderá negar a dístíncao
entre o Sim e o Nao (ou o principio de contradicao); este vale até mesmo
em Oeus, pois a Verdade é urna só e tem sua fonte em Deus. Quem negué o
principio de contradicfo, já n3o pode exprimir ou comunicar coisa alguma.
Donde se vé que o pensar humano deve guardar todas as distincdes implíci
tamente comidas na distíngao entre o Sim e o Nao.
Notamos que a negacao do principio de contradicao é corrente ñas
tradicoes filosófico-religiosas do Oriente. Nio sem motivo o holísmo enfati-
za com certa preponderancia a mentalidade oriental; varios dos seus expo-

429
46 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 328/1989

entes sao discípulos de Buda ou das escolas místicas da India, do Tibe, do


Japao...

2.3. Plano afetivo


O problema das divisoes existentes na historia dos homens, e principal
mente em nossos dias, é um problema real, que merece seria consideracáo.
Mas ele ná*o se sitúa no plano ontológico nem no lógico, e sim no plano
afetivo. Com efeito; as guerra s e os flagelos dar decorrentes nao de ser supe
rados mediante a renovacao dos sentimentos e afetos do coracao humano.
Haja compreensao mutua, benevolencia fraterna, altrufsmo em vez de ego
ísmo... Entao, sim, estaremos entrando muito alvissareiramente no terceiro
milenio da historia.

Essa renovacao dos afetos humanos pode ser fomentada, sem dúvida,
pelo en trelaca mentó das disciplinas de estudo e pelo das profissoes (interdis-
ciplinaridade). As contribuicoes e os valores de cada setor de pesquisas e tra-
balhos se somarao para o bem da humanidade, mas sem destruir a ¡dentida-
de de cada pessoa e das suas atividades; caso contrario, a sociedade caira sob
o totalitarismo e a ditadura (que já existe em certos países) ou regressará aos
tempos da mentalidade do cía, segundo a qual a pessoa nao valia como tal.
mas so contava em funcao do grupo (cía) a que pertencia (por isto os ino
centes eram punidos quando alguns eram culpados).

A especializado dos estudiosos é indispensável, pois o campo das cien


cias se ampliou de tal modo que é impossível a um homem conhecer bem
urna área em todos os seus aspectos. É para desejar, porém, que os especialis
tas se encontrem em diálogo e coloquio, onde componham entre si os resul
tados de suas investigacóes. Além disto, é necessário que haja sabios (filóso
fos) que saibam fazer a si'ntese de todos esses conhecimentos aos olhos da
metafísica ou do Transcendental. 0 Concilio do Vaticano II já considerava
a problemática assim lancada e Ihe propunha a solucáo:
"Como se pode conciliar urna dispersao tSo rápida e progressiva das
ciencias particulares com a necessidade de elaborar a sua si'ntese e de conser
var nos homens as faculdades de contemplacao e admiracao que encami-
nham para a sabedoria?

Que fazer para que a grande massa dos homens participe dos benefi
cios da cultura, quando simultáneamente a cultura das élites nao cessa de
se elevar e de se tornar cada vez mais complexa?

Como enfim reconhecer legitima a autonomía que a cultura reclama


para si, sem cair em um humanismo meramente terrestre e mesmo adversa
rio da própria religiao?

No meio destas antinomias é necessário que a cultura humana se de-


senvolva de tal modo que aperfeicoe de mane ira equilibrada a pessoa
humana integral e ajude os homens a desempenhar as funcoes a que sao cha-

430
HOLISMO:QUE É? 47

mados, sobretudo os cristaos, unidos fraterna/mente na única familia hu


mana" (Const. Gaudium et Spesp. 56).

Como se vé. o Concflio apela para o desenvolvimento da pessoa huma


na integral, ou seja, como individuo ¡nconfundfvel e também como membro
da sociedade; esta se deve tornar cada vez mais urna grande familia em virtu-
de do espirito fraterno de cada um de seus membros.

Estas reflexoes sugerem urna considerado final.

3. A resposta crista

O anseio por harmonía ou por pontes entre os homens nao data de


nossos dias. Já o Cristianismo, desde os seus albores, o apregoa. O Apostólo
Sao Paulo preconiza a queda das barreiras existentes entre os homens, quan-
do escreve:

"Cristo é a nossa paz: de ambos os povos fez um só, tendo derrubado


o muro de separado e suprimido em sua carne a inimizade — a Lei dos man-
damentos expressa em preceitos - a fim de criar em si mesmo um só Ho-
mem Novo, estabelecendo a paz, e de reconciliar ambos com Deus em um
só Corpo, por meio da Cruz, na qual ele matou a inimizade. Assim ele veio
e anunciou paz a vos que estáveis longe, epaz aos que estavam peno, pois,
por meio dele, nos, judeus e gentíos, num só Espirito temos acesso junto ao
Pai"(Ef 2,14-18).

"NSo há mais grego e judeu, circunciso e incircunciso, bárbaro, cita,


escravo, livre, mas Cristo é tudo em todos" (CI 3, 11; cf. Gl 3¿7s; ICor
12,13).

Cristo é o eixo de convergencia de toda a humanidade dividida pelo


egoísmo e o pecado. É a cabeca de um só Corpo Místico, no qual cada mem
bro e órgao Ipés, maos, olhos, ouvidos, boca...) conserva sua identidade, mas
contribuí para o bem do todosem se autodestruir (cf. ICor >2,12-27).

Por isto também o Cristianismo tomou desde cedo o nome de Cato


licismo, palavra que vem do grego kath'holon (= segundo o todo ou total,
universal). 0 Catolicismo é a forma de holismo mais antiga e genuína, que
pode, com exclusividade, satisfazer ao anseio de harmonía dos homens,
porque fundamentada no plano de Deus. É curioso, alias, que o holismo re
corra precisamente ao termo grego que está na raiz do apelativo Catolicis
mo. Isto bem mostra que o ideal do holismo nao é novo; tem seu valor, mas
nunca poderá ser atingido pela negacao da dualidade natural como também
nunca se efetuará sem o auxilio daquele que é o Autor da natureza e que
se revela aos homens em Jesús Cristo. Fora da obra de Cristo encontrar-se-á
semprea Babel decorrente das tendencias egoístas latentes nos coracoes hu
manos.

Estéváb Bettencourt O.S.B.

431
48 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 328/1989

Livros em Estante

Jesús Cristo, ontem, hoje e sempre. Ensaio de Cristologia, por Mario


Serenthá. TraducSo de Ir. Isabel F.L. Ferreira - Ed. Salesiana Dom Bosco,
Caixa postal 30.439 {Rúa da Mooca 766) -01051 SSo Paulo (SP), 1986,
155 x 235 mm, 590 pp.
0 autor é Professor da Pontificia Universidade Salesiana de Roma. En
trega ao público o resultado de seus estudos cristológicos sob forma de texto
escolar, que, sem dúvlda, esgota a temática, seguindo sempre orientacio se
gura e multo atualizada. Logo ñas prímeiras páginas, Serenthá expoe o enfo
que que adota, em consonancia com outros teólogos contemporáneos: em
vez de considerar, como fazla a Teología Escolástica, de um lado, a pessoa
de Cristo (a Cristologia propriamente dita) e, de outro lado, a sua obra sal-
vffica (a Soteríologia), Serenthá prefere abordar conjuntamente a pessoa e a
obra de .Cristo: restabelece "a dímensao histórica concreta do misterio de
Cristo, cujo ápice reside na Páscoa como ponto de referencia para a elabora-
cao de todo o discurso cristológico" fp. 19). A obra divide-se em tres Par
tes: a Bíblica, a Histórica e a Sistemática, cada qual abrindo ampios horizon
tes ao leitor, dada a erudicSo do autor.
Um dos pontos mais discutidos da Cristologia, em nossos días, é oda
ciencia e consciéncia de Jesus-homem — assVnto difici'limo, pois supoe que
o estudioso tenha podido penetrar no íntimo de Jesús, que viveu sua vida
mortal na Térra há 2.000 anos. Nao podendo deixar de considerar a temáti
ca, Serenthá lembra que os Escolásticos desenvolviam suas concepcoes a par
tir do "principio de perfeicao": Cristo devia ter, no grau mais perfeito possi-
vel, mesmo como homem viandante na Térra, tudo aquílo que toca ou toca
rá aos demais homens; portan to, tinha a visao beatífica dos Justos no céu, a
ciencia infusa dos místicos, e a ciencia adquirida do comum dos homens.
Serenthá^ com outros teólogos, acha que este modo de tratar o assunto é
especulativo ou apriorista demais; prefere, pois, olhar para o Cristo como
se acha nos Evangelhos: era portador de verdadeira humanidade; por conse-
guinte, devia, como homem, ter todo o saber que interessava á sua missao de
Mestre e Salvador dos homens; no caso, nao teria tido a visSo beatifica dos
justos no céu, pois esta supoe urna realidade assaz diversa da do homem pe
regrino na térra. Jesús, porém, como homem sabia que o seu Eu era o da se
gunda Pessoa da SS. Trindade. - Estas elucubracoes sobre o saber humano
de Jesús sao sutis. De resto, nao excluem a ciencia perfeita que Deus tem e
que o Filho feito homem conservava (como conservava a onipoténcia de
Deus, capaz de ressuscitar os morios). Como entao conciliar o saber humano
de Jesús e o seu saber divino, se em Jesús nao há dois eu, mas um só eu (di
vino)? Serenthá tenta explicá-lo seguindo as pegadas de Galtier e Kart Rah-
ner, cujas teorías sao complexas, mas aceitáveis. Cf. pp. 560-568.
Eis urna amostragem da obra de Serenthá. Merece recomendacao, prin
cipalmente para os estudantes de Teología; certamente é dos melhores trata
dos existentes em portugués.

432
RENOVÉ OUANTO ANTES SUA ASSINATURA DE 1989
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"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" ANO 1988.


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ca controversia entre Católicos e Protestantes, procurando mostrar que a
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ro, versa mais sobre palavras do que sobre conceitos ou proposicoes. —
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te a Escritura? - III Somente a Fá? Nao as obras? - IV A Santfssima Trin-
dade: Fórmula paga? - V O Primado de Pedro - VI Eucaristía: Sacrificio e
Sacramento — Vil A ConfissSto dos pecados — VIII O Purgatorio — IX As
Indulgencias - X María, Virgem e Mffe - XI Jesús teve ¡rmá"os? - XII O
Culto aos Santos - XIII E as imagens sagradas? — XIV Alterado o Decálo
go? - XV Sábado ou Domingo? - XVI 666 (Ap 13,18) - XVII Vocé sabe
quando? - XVIII Seitas e espirito sectario - Apéndice geral: A era Constan-
tínians - Epilogo — Bibliografía.

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O MISTERIO DO DEUS VIVO, P. Patfoort O.P. O Autor foi examinador de


D. Cirilo para a conquista da láurea de Doutor em Teologia no Instituto
Pontificio Santo Tomás de Aquino em Roma. Para Professores e Alunos de
Teologia, é um Tratamento de "Deus Uno e Trino", de orientacao tomista e
de índole didática. 230 p. NCzS 10,50.

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Rúa Dom Gerardo, 40 - 5? andar - Sala 501

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