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A LENDA E A HISTÓRIA
O livro, subtitulado Lenda do Ceará, conta a triste história de amor entre a índia
tabajara Iracema, a virgem dos lábios de mel e Martim, primeiro colonizador português
do Ceará. Além disso, como resume Machado de Assis, o assunto do livro é também a
história da fundação do Ceará e o ódio de duas nações inimigas (tabajaras e pitiguaras).
Os pitiguaras habitavam o litoral cearense e eram amigos dos portugueses. Os tabajaras
viviam no interior e eram aliados dos franceses.
José de Alencar recorreu a circunstâncias históricas, como a rixa entre os índios
tabajaras e pitiguaras e utilizou personagens reais, como Martim Soares Moreno e o
índio Poti, que depois viria a adotar o nome cristão de Antônio Felipe Camarão. Mas
cercou-os de uma fértil imaginação e de um lirismo próprios da poesia romântica.
A heroína idealizada
Iracema é filha de Araquém, pajé da tribo tabajara, e deve manter-se virgem porque
“guarda o segredo da jurema e o mistério do sonho. Sua mão fabrica para o Pajé a
bebida de Tupã”. Um dia, Iracema encontra, na floresta, Martim, que se perdera de Poti,
amigo e guerreiro pitiguara com quem havia saído para caçar e agora andava errante
pelo território dos inimigos tabajaras. Iracema leva Martim para a cabana de Araquém,
que abriga o estrangeiro: para os indígenas, o hóspede é sagrado.
O momento em que Martim encontra Iracema revela a idealização romântica em seu
grau mais elevado:
“Além, muito além daquela serra, que ainda azula no horizonte, nasceu Iracema.
Iracema, a virgem dos lábios de mel, que tinha os cabelos mais negros que a asa da
graúna e mais longos que seu talhe de palmeira.
O favo da jati não era doce como seu sorriso; nem a baunilha recendia no bosque
como seu hálito perfumado.
Mais rápida que a ema selvagem, a morena virgem corria o sertão e as matas do Ipu,
onde campeava sua guerreira tribo, da grande nação tabajara. O pé grácil e nu, mal
roçando, alisava apenas a verde pelúcia que vestia a terra com as primeiras águas.
Um dia, ao pino do sol, ela repousava em um claro da floresta. Banhava-lhe o corpo
a sombra da oiticica, mais fresca do que o orvalho da noite. Os ramos da acácia
silvestre esparziam flores sobre os úmidos cabelos. Escondidos na folhagem os
pássaros ameigavam o canto.
Iracema saiu do banho; o aljôfar d'água ainda a roreja, como à doce mangaba que
corou em manhã de chuva. Enquanto repousa, empluma das penas do gará as flechas
de seu arco, e concerta com o sabiá da mata, pousado no galho próximo, o canto
agreste
A graciosa ará, sua companheira e amiga, brinca junto dela. Às vezes sobe aos
ramos da árvore e de lá chama a virgem pelo nome; outras remexe o uru de palha
matizada, onde traz a selvagem seus perfumes, os alvos fios do crautá , as agulhas da
juçara com que tece a renda, e as tintas de que matiza o algodão.
Rumor suspeito quebra a doce harmonia da sesta. Ergue a virgem os olhos, que o sol
não deslumbra; sua vista perturba-se.
Diante dela e todo a contemplá-la, está um guerreiro estranho, se é guerreiro e não
algum mau espírito da floresta. Tem nas faces o branco das areias que bordam o mar;
nos olhos o azul triste das águas profundas. Ignotas armas e tecidos ignotos cobrem-lhe
o corpo.”
A harmonia rompida
O narrador deixa clara a ruptura nesse harmoniosa relação de Iracema com o seu
meio ao apresentar o surgimento de Martim: "Rumor suspeito quebra a doce harmonia
da sesta". A vista de Iracema perturba-se, impossibilitada de decodificar essa estranha
aparição de uma etnia que lhe é desconhecida.
José de Alencar retrata, assim, o processo de estranhamento e fascínio mútuo que
dominou o encontro dos dois povos. Começavam a se conhecer, sem sequer suspeitar as
trágicas conseqüências do encontro para os indígenas.
A sedução
O conflito
Martim é ameaçado pelo enciumado chefe guerreiro Irapuã, que quer invadir a
cabana de Araquém e matá-lo. Apesar da advertência de Araquém de que Tupã puniria
quem machucasse seu hóspede, os guerreiros de Irapuã cercam a cabana, que é
protegida por Caubi.
Iracema encontra Poti, que está próximo à aldeia dos tabajaras e deseja salvar o
amigo. Planejam, então, a fuga de Martim. Durante a preparação dos guerreiros
tabajaras para a guerra com os pitiguaras, Iracema lhes serve o vinho da jurema e,
enquanto os guerreiros deliram, ela leva Martim e Poti para longe da aldeia. Quando já
estão em terras pitiguaras, Iracema revela a Martim que ela agora é sua esposa e deve
acompanhá-lo. Entretanto, os tabajaras descobrem que Iracema traíra “o segredo da
jurema” e perseguem os fugitivos. Os pitiguaras, avisados da invasão dos tabajaras,
juntam-se aos fugitivos e é travado um sangrento combate. Iracema luta ao lado de
Martim contra a sua tribo.Os pitiguaras ganham a luta e Iracema se entristece pela morte
dos seus irmãos tabajaras.
O exílio
Iracema acompanha Martim e Poti e passa a morar com eles no litoral. Durante algum
tempo, eles são muito felizes, e a alegria se completa com a gravidez de Iracema.
Porém, Martim acaba por “saturar-se de felicidade” e seu interesse pela esposa e pela
vida ao seu lado começa a esfriar. Iracema se ressente da frieza do marido e sofre.
Martim se ausenta com freqüência em caçadas e batalhas contra os inimigos dos
pitiguaras. Enquanto guerreia, nasce seu filho, que Iracema chama de Moacir, que
significa “nascido do meu sofrimento, da minha dor”.
Iracema dá ao filho o nome indígena correspondente ao nome hebraico Benoni, que
também significa “filho de minha dor”. Este é o nome dado por Raquel, mulher do
patriarca bíblico Jacó, ao seu último filho. Raquel morre depois de dar à luz. Mas Jacó
muda o nome do menino para Benjamim. Os filhos de Jacó dão origem às tribos que
formarão a nação Israel, assim como o filho de Iracema representa o início de uma
nação.
Solitária e saudosa, Iracema tem dificuldade para amamentar o filho e quase não
come. Desfalece de tristeza. Martim fica longe de Iracema durante oito luas (oito meses)
e, quando volta, encontra Iracema à beira da morte. Ela entrega o filho a Martim, deita-
se na rede e morre, consumida pela dor. Poti e Martim enterram-na ao pé do coqueiro, à
beira do rio. Segundo Poti: “quando o vento do mar soprar nas folhas, Iracema pensará
que é tua voz que fala entre seus cabelos.”
O lugar onde viveram e o rio em que nascera o coqueiro vieram a ser chamados, um
dia, pelo nome de Ceará.
Martim partiu das praias do Ceará levando o filho. Alencar comenta: “O primeiro
cearense, ainda no berço, emigrava da terra da pátria. Havia aí a predestinação de
uma raça?”
O guerreiro branco volta alguns anos depois, acompanhado de outros brancos,
inclusive um sacerdote “para plantar a cruz na terra selvagem”. Começa a colonização
e a narrativa termina: “Tudo passa sobre a terra.”
O NARRADOR
O INDIANISMO
O índio começou a ser adotado como tema literário no Brasil pelos árcades,
principalmente Basílio da Gama – que via o índio como “homem natural”, e Santa Rita
Durão – para quem o índio era apenas o “comedor de carne humana, que só o
Cristianismo salvaria”.
A polêmica
“Digo-o por mim: se algum dia fosse poeta, e quisesse cantar a minha terra e suas
belezas, se quisesse compor um poema nacional, pediria a Deus que me fizesse
esquecer por um momento as minhas idéias de homem civilizado. Filho da natureza,
embrenhar-me-ia por essas matas seculares; contemplaria as maravilhas de Deus,
veria o sol erguer-se no seu mar de ouro, a lua deslizar-se no azul do céu; ouviria o
murmúrio das ondas e o eco profundo e solene das florestas.”
Mas não seria através da poesia que Alencar haveria de “cantar a minha terra e suas
belezas”. Ainda na polêmica sobre A Confederação dos Tamoios, ele critica o uso de
gêneros poéticos clássicos para descrever o índio brasileiro:
Desde as primeiras páginas de Iracema, fica claro que o seu autor procura colocar
essas idéias em prática. Alencar adota o gênero do romance, mas o faz com um cuidado
na construção das imagens e com a musicalidade da linguagem que levaram críticos
como Machado de Assis a considerá-lo mais um “poema em prosa” do que
propriamente um romance. E levaram Haroldo de Campos a afirmar que: “O maior
poeta indianista (o único plenamente legível hoje…) foi um prosador: José de
Alencar.” Seguindo a trilha aberta por Augusto Meyer, que já havia observado:
“Bastaria Iracema para consagrá-lo o maior criador da prosa romântica, na língua
portuguesa, e o maior poeta indianista.”
Desdobramentos
Iracema e Macunaíma
"Ci aromava tanto que Macunaíma tinha tonteiras de moleza" (M.A.) -- "Todas as
noites a esposa perfumava seu corpo e a alva rede, para que o amor do guerreiro se
deleitasse nela (J. A.). É a rede de cabelos que torna a Mãe do Mato inesquecível, e é
uma rede que Iracema oferece ao guerreiro branco: -- "Guerreiro que levas o sono de
meus olhos, leva a minha rede também. Quando nela dormires, falem em tua alma os
sonhos de Iracema" (J.A.)
Ambas …não têm leite. O de Ci foi a cobra preta que sugou; em Iracema o leite não
chegava ao seio, diluído nas lágrimas de saudade. "A jovem mãe suspendeu o filho à
teta; mas a boca infantil não emudeceu. O leite escasso não apojava o peito" (J. A.).
Em Macunaíma, o filho do herói "chupou o peito da mãe no outro dia, chupou mais,
deu um suspiro envenenado e morreu".
Iracema voou
Para a América
Leva roupa de lã
E anda lépida
Vê um filme de quando em vez
Não domina o idioma inglês
Lava chão numa casa de chá
A índia e o traficante
Eduardo Dusek / Luiz Carlos Góes /1986
Noite malandra, um luar de espelho,
No meio da terra a índia colhe o brilho,
Som de suor, cheirada musical,
Palmeira que se verga em meio ao vendaval.
Sentia macia floresta,
Bolívia, montanha, seresta...
Alma brasileira
José de Alencar nasceu em 1829, apenas sete anos depois da Independência do Brasil,
em Mecejana, no Ceará. Filho de um ex-padre, que se tornou presidente da Província do
Ceará e Senador do Império, o jovem Alencar se transfere, com a família, aos nove anos
de idade para a cidade do Rio de Janeiro. Em 1844, aos quinze anos, matricula-se nos
cursos preparatórios à Faculdade de Direito de São Paulo. Lê, então, o recém publicado
romance A Moreninha, cujo sucesso em muito há de influenciá-lo na decisão posterior
de se tornar romancista.
Em São Paulo, Alencar cursa os primeiros anos da Faculdade de Direito e começa a
publicar seus primeiros textos em algumas revistas estudantis. Transfere-se, em 1848,
para a Faculdade de Direito de Olinda, em Pernambuco. Em Olinda, na velha biblioteca
do Mosteiro de São Bento, encontra a literatura dos antigos cronistas coloniais, como
Gabriel Soares de Sousa e Pero Magalhães Gandavo.
Anos mais tarde, Alencar ainda se recorda da emoção que foi a descoberta desses
autores do século XVI, que nos dão as primeiras impressões dos europeus ao
encontrarem a natureza e o índio do Brasil, em cujas páginas já procurava um tema para
desenvolver em sua própria literatura:
“Uma coisa vaga e indecisa, que devia parecer-se com o primeiro broto do Guarani
ou de Iracema, flutuava-me na fantasia. Devorando as páginas dos alfarrábios de
notícias coloniais, buscava com sofreguidão um tema para o meu romance; ou pelo
menos um protagonista, uma cena e uma época.”
IRACEMA
A Lenda do Ceará
1865
Problema:
Fundação do Ceará
"[...] uma história, que me contaram nas lindas várzeas onde nasci, à calada da noite
[...]"
Sabor de lenda:
"Além, de muito além daquela serra que ainda azula no horizonte, nasceu Iracema."
Problema:
Advertência em Ubirajara:
b) Estrutura da obra:
Sabe-se que a maior influência sentida na concepção de Iracema foi Átala, magnífica
obra romântica francesa de Chateaubriand.
c) Caracterização psicológica:
Possível modelo:
d) Contradição
e) A idealização do índio
Caracterização física
"Iracema, a virgem dos lábios de mel [...]. O favo da jati não era tão doce como o seu
sorriso; nem a baunilha recendia no bosque como seu hálito perfumado."
"Quem cria, vê sempre uma Lindóia na criatura, embora as índias sejam pançudas e
remelentas."
(Trecho de Amar, verbo intransitivo - idílio de Mário de Andrade) [1]
f) Foco narrativo
A obra foi escrita em terceira pessoa, e leva a crer que temos um narrador-observador,
porém o ufanismo faz com que, em alguns momentos, o narrador apareça em primeira
pessoa e deixe transparecer sua admiração e seu envolvimento. O narrador participa da
história:
A intromissão do narrador no texto faz com que ele deixe de ser um mero observador, e
permite que transmita juízo de valores.
"Verdes mares bravios de minha terra natal, onde canta jandaia nas frondes da
carnaúba"
g) A linguagem
1 - prosa poética
Capítulo 1
"Verdes mares bravios de minha terra natal, onde canta a jandaia nas frondes da
carnaúba;
Verdes mares, que brilhais como líquida esmeralda aos raios do sol nascente,
perlongando as alvas praias ensombradas de coqueiros;
Serenai, verdes mares, e alisai docemente a vaga impetuosa, para que o barco
aventureiro manso resvale à flor das águas. [...]"
"Ver-des-ma-res-bra-vios (6)
De-mi-nha-ter-ra-na-tal (7)
On-de-can-taa-jan-da-ia (6)
Nas-fron-des-da-car-na-úba (7)
Ver-des-ma-res-que-bri-lha-is (7)
Co-mo-lí-qui-da-es-me-ral-da (7)
Aos-ra-ios-do-sol-nas-cen-te (7)
Per-lon-gan-do-as-al-vas-pra-ias (7)
En-som-bra-das-de-co-quei-ros (7)
2 - Adjetivação e comparações
"Iracema, a virgem dos lábios de mel, que tinha os cabelos mais negros que a asa da
graúna e mais longos que o seu talhe de palmeira.
O favo da Jati não era doce como o seu sorriso; nem a baunilha recendia no bosque
como seu hálito perfumado."
3 - A língua tupi
h) Tempo
O ano em que a ação se desenvolve é 1603, século XVII, época da colonização do
Brasil, mais especificamente, no texto, da colonização do Ceará.
Em Iracema (1865) José de Alencar, ou por ter atingido a maturidade nos temas
indianistas, ou porque nessa obra não há a rigor nenhum compromisso com uma
afirmação nacional pela literatura, atinge seu romance mais bem estruturado, sob o
ponto de vista estético. Iracema é o exemplar mais perfeito de prosa poética de nossa
ficção romântica, belíssimo exemplo do nacionalismo ufanista e indianista, com o qual
Alencar contribuiu com a construção da literatura e da cultura brasileira.
A índia Iracema, que se entrega por amor a Martim, tem a função de simbolizar, no
romance, a presença do elemento nacional, da cor local, existente na criação de seus
traços físicos, que é feita por comparação com elementos da natureza. Embora
psicologicamente Iracema se assemelhe às heroínas românticas européias, constitui,
nessa fusão de elementos da cor local com elementos do romantismo europeu, um mito
fundador da pátria. De acordo com o romantismo europeu, Iracema pode ser
caracterizada como um exemplo de "mulher-anjo" - virgem, delicada, bela, capaz de se
sacrificar pelo homem que ama, Martim. Essa característica de Iracema mostra que
embora o narrador privilegie os seus sentimentos e pensamentos ao longo da história,
idealizando o índio, que ela representa, o seu ponto de vista ao contar torna-se o do
branco colonizador, na medida em que "europeiza" e "romantiza" Iracema.
Quanto à importância relativa das personagens, Alencar constrói uma obra inteiramente
distinta de O Guarani (e também do posterior Ubirajara, que data de 1874).
EmIracema, a relação amorosa entre a jovem índia e o fidalgo português Martim
domina toda a obra.
Não é difícil encontrar as fontes principais em que se inspirou Alencar: Iracema é, num
certo sentido (não o da imitação, evidentemente), a transposição de Atala, de
Chateaubriand, autor que Alencar confessou ter lido bastante. Temos, pois, o caso de
uma composição homóloga, pois apresenta vários pontos em comum: o tema da
felicidade primitiva dos selvagens, que começa a se corromper diante da primeira
aproximação do civilizado; a idéia do bom selvagem; o amor de uma índia por um
estrangeiro; a morte das duas heroínas, o exótico da paisagem; enfim, nas duas obras de
um conflito fundamental representado pela oposição de índole dos dois mundos: o da
velha civilização européia e o Novo Mundo da América.
Elementos épicos
O texto é épico por ser narrativo. José de Alencar narra os feitos heróicos dos
portugueses na figura de Martim. Iracema, também, é transformada em heroína. O
vinho de Tupã que permite a posse de Iracema (presença do "maravilhoso"). Além
disso, temos, também, a presença dos deuses indígenas representando as forças da
natureza.
Elementos líricos
O amor de Iracema por Martim: Iracema é a heroína típica do romantismo, que padece
de saudades do amante, que partiu, e da pátria que deixou. Ela se enquadra dentro de
uma corrente luso-brasileira cujo inicio data das cantigas medievais.
Toda a força poética do livro advém dessa relação amorosa. A ação é reduzidíssima, o
que dá ao livro o notável espaço lírico de que se valeu Alencar para escrever sua obra
mais poética: a desorientação inicial de Martim, jovem fidalgo português, que se
perdera nas matas... O surpreendente encontro com a jovem índia... A hospitalidade do
selvagem brasileiro... O ciúme do guerreiro... O amor entre os representantes das duas
raças: lracema e Martim... A morada dos dois, afastados da tribo e da civilização... A
nostalgia de Martim por sua terra natal, suas viagens e a tristeza de Iracema com a
mudança inesperada de seu amado... O nascimento de Moacir, filho da dor, e a morte de
Iracema... Essa é praticamente a síntese da fábula do livro.
Foco narrativo
Personagens
Iracema – (lábios de mel) – índia da tribo dos tabajaras, filha de Araquém, velho pajé;
era uma espécie de vestal (no sentido de ter a sua virgindade consagrada à divindade)
por guardar o segredo de Jurema (bebida mágica utilizada nos rituais religiosos);
anagrama de América. Forte, sedutora, mas submissa. Heroína trágica.
Martim Soares Moreno – guerreiro branco, colonizador europeu, amigo dos pitiguaras,
habitantes do litoral, adversários dos tabajaras; os pitiguaras lhe deram o nome de
Coatiabo ("guerreiro pintado" - "tinha nas faces o branco das areias, nos olhos o azul
triste das águas e os cabelos da cor do sol."
Moacir - Filho de Iracema e Martim, filho do sofrimento (Moaci = dor, ira = saído de).
Poti – herói dos pitiguaras, amigo – que se considerava irmão – de Martim. Personagem
histórico.
Irapuã - chefe dos tabajaras; apaixonado por Iracema. Ciumento e corajoso. Seu nome
significa "mel redondo".
Caubi – índio tabajara, irmão de Iracema. Não guardou rancor de Iracema, indo visitá-
la no exílio.
Jacaúna – chefe dos pitiguaras, irmão de Poti. Seu nome significa "jacarandá preto".
Enredo
Durante uma caçada, Martim Soares Moreno, personagem histórico responsável pela
colonização do Ceará, se perdeu dos companheiros pitiguaras e se pôs a caminhar sem
rumo durante três dias.
No interior das matas pertencentes à tribo dos tabajaras, encontra-se com Iracema, filha
do pajé Araquém, da tribo dos Tabajaras, "os senhores das montanhas".
Ao deparar-se com Martim, surpresa e amedrontada, a índia o fere no rosto com uma
flechada. Ele não reagiu. Arrependida, a moça correu até Martim e ofereceu-lhe
hospitalidade, quebrando com ele a flecha da paz. Martim, por quem Iracema se
apaixona, vai visitar a sua tribo. Lá encontra Irapuã, o chefe, um rival. Entretanto, o
duelo entre ambos é interrompido pelo grito de guerra dos Pitiguaras, "os senhores do
litoral", liderados por Poti (Antônio Felipe Camarão, personagem histórico), amigo de
Martim.
Nas entranhas da terra, magicamente abertas por Araquém, Iracema esconde-se com
Martim e torna-se sua esposa, traindo o compromisso de virgem vestal, sacerdotisa da
tribo e portadora do segredo da jurema, o segredo da fertilidade dos Tabajaras.
Durante o sono da tribo propiciado por Iracema, que a leva aos bosques da Jurema, onde
os guerreiros podem sonhar vitórias futuras, há o reencontro entre Martim e Poti, que
fogem guiados por Iracema. Ela não revela a Martim o que houve entre ambos o
himeneu, enquanto o jovem iniciava-se nos mistérios de Jurema, só o fazendo depois da
fuga.
Iracema, Martim e Poti chegam ao território Pitiguara, de onde viajam para visitar
Batuirité, o avô de Poti, o qual denomina Martim Gavião Branco, fazendo, antes de
morrer, a profecia da destruição de seu povo pelos brancos.
Iracema engravida e, acompanhada de Poti, pinta o corpo de Martim, que passa a ser
Coatiabo, "o guerreiro pintado", que às vezes tem momentos de grande melancolia, com
saudades da pátria.
Martim e Poti voltam vitoriosos; Martim sente mais saudades da pátria; Iracema
profetiza a própria morte que ocorrerá com o nascimento do filho. Enquanto Martim
estava combatendo, Iracema teve sozinha o filho, a quem chamou de Moacir, filho da
dor. Certa manhã, ao acordar, ela viu à sua frente o irmão Caubi, que, saudoso, vinha
visitá-la, trazendo paz. Admirou a criança, porém surpreendeu-se com a tristeza da irmã,
que pediu a ele que voltasse para junto de Araquém, velho e sozinho.
De tanto chorar, Iracema perdeu o leite para alimentar o filho. Foi à mata e deu de
mamar a alguns cachorrinhos; eles lhe sugaram o peito e dele arrancaram o leite copioso
para voltar a amamentar. A criança estava se nutrindo, mas a mãe perdera o apetite e as
forças, por causa da tristeza.
No caminho de volta, findo o combate, Martim, ao lado de Poti, vinha apreensivo: como
estaria Iracema? E o filho? Lá estava ela, à porta da cabana, no limite extremo da
debilidade. Ela só teve forças para erguer o filho e apresentá-lo ao pai. Em seguida,
desfaleceu e não mais se levantou da rede.
Morre Iracema. Suas últimas palavras foram o pedido ao marido de que a enterrasse ao
pé do coqueiro de que ela gostava tanto. O sofrimento de Martim foi enorme,
principalmente porque seu grande amor pela esposa retornara revigorado pela
paternidade. O lugar onde se enterrou Iracema veio a se chamar Ceará.
Martim retornou para sua terra, Portugal, levando o filho. Não consegue permanecer lá.
Quatro anos depois, eles voltaram para o Ceará, onde Martim implantou a fé cristã. Poti
se tornou cristão e continuou fiel amigo de Martim. Os dois ajudaram o comandante
Jerônimo de Albuquerque a vencer os tupinambás e a expulsar o branco tapuia. De vez
em quando, Martim revia o local onde fora tão feliz e se doía de saudade. A jandaia
permanecia cantando no coqueiro, ao pé do qual Iracema fora enterrada. Mas a ave não
repetia mais o nome de Iracema. "Tudo passa sobre a terra."