Académique Documents
Professionnel Documents
Culture Documents
INTRÓITO.
Dentro desse contexto, surgiu um apelo ao belo como nunca antes visto. As
empresas passaram a exigir de seus funcionários, além de excelente qualificação
profissional, ótima apresentação; a moda invadiu os lares através da televisão, a qual
leva atualmente famílias inteiras a consumirem inúmeras horas de seus dias assistindo
programas nos quais se destacam tão-somente pessoas que se enquadram em
determinados padrões estéticos. Assim, a boa aparência física passou a ser requisito
imprescindível tanto para uma boa colocação profissional, quanto para uma melhor
aceitação social.
--------------------------------------------------------------------------------
CAPÍTULO I.
1 – CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES.
Direito Médico este que tem, como centro de interesse e estudo, o conjunto de
normas que estabelecem e regulamentam as práticas vinculadas à saúde, abrangendo
o exercício da Medicina e de todas as ciências periféricas e complementares a ela, v.g.:
a Fisioterapia, a Fonoaudióloga e a Enfermagem.
Destarte, a responsabilidade civil por erro médico; o sigilo profissional e o
prontuário do paciente; os atos privativos praticados pelo profissional da Medicina; a
nova Lei do Sangue (Lei nº 10.205/2001); e os limites éticos da intervenção sobre o ser
humano são os temas que estruturam, em nível teórico, esse novo ramo do Direito.
Logo, o mesmo ato profissional médico pode ensejar três ordens de apuração
da responsabilidade médica: a) na ordem ético-disciplinar- por meio de um
procedimento administrativo junto ao CRM; b) na ordem penal - através de um
processo criminal; c) na ordem civil - por intermédio de um processo civil (ação de
indenização por danos morais e/ou patrimoniais).
Por fim, impõe-se considerar que, nos termos da lei civil, a responsabilidade
civil independe da criminal para sua caracterização (art. 1.525 do CC e art.935 do
NCC).
--------------------------------------------------------------------------------
CAPÍTULO II.
2 - RESPONSABILIDADE CIVIL.
2.1-Conceito.
Serpa Lopes, por sua vez, obtempera que " (...) a responsabilidade é a
obrigação de reparar um dano, seja por decorrer de uma culpa ou de outra
circunstância legal que a justifique, como a culpa presumida, ou por uma circunstância
meramente objetiva".
2.2-Pressupostos.
Desse modo, a ação ou a omissão do agente, para constituir ato ilícito e gerar
direito à indenização, envolve a infração de um dever legal, contratual ou social (a
infração à dever social constitui nos atos praticados com abuso de direito, ou seja, a
atitude do agente não contraria a letra da lei, mas sim o seu espírito).
B) Culpa do agente.
O art. 159 do CC (art. 186 do NCC) estabelece o ato ilícito como fonte da
obrigação de indenizar os danos causados à vítima. Como se vê, é de ordem pública o
princípio que obriga o auto2 do ato ilícito a se responsabilizar pelo prejuízo que causou,
indenizando-o.
Já a culpa strictu senso, por sua vez, apresenta-se sobre três modalidades: a)
imperícia, que é a falta de habilidade ou inaptidão para praticar certo ato; c)
negligência, a qual consiste na inobservância de normas que nos ordenam agir com
atenção, capacidade, solicitude e discernimento; c) imprudência, que é a precipitação
ou o ato de proceder sem cautela. Nesse mesmo sentido, preleciona José de Aguiar
Dias: "Negligência se relaciona, principalmente, com desídia; imprudência é conceito
ligado, antes que a qualquer outro, ao de temeridade; imperícia é, originalmente, a falta
de habilidade."
Assim, a culpa pode ser classificada em graus: a) culpa grave, quando resulta
da imprudência ou negligência grosseira e extrema do indivíduo, sem ter previsto o que
ao homem é plenamente previsível; b) culpa leve, a qual advém da inobservância de
cautelas ordinárias, podendo ser evitada com a atenção esperada por um homem
comum; c) culpa levíssima, na qual o dano só poderia ser evitado com extraordinária
atenção.
Segundo Maria Helena Diniz, "para a grande maioria dos juristas a gravidade
da culpa não exerce qualquer influência na reparação do dano".
Logo, no entendimento desses juristas, a classificação da culpa em seus
diversos graus, bem como a distinção entre a conduta culposa e dolosa, teria perdido,
de certa forma, sua finalidade prática, haja vista subsistir a obrigação de indenizar não
obstante tenha o agente ocasionado a ofensa por um comportamento doloso ou
culposo e, nesse último caso, independentemente de ter sido grave, leve ou levíssimo.
Nesse sentido, assevera Silvio Rodrigues:
" A distinção entre dolo e culpa, bem como entre os graus de culpa, de um certo
modo perde sua oportunidade. Isto porque, quer haja dolo, quer haja culpa grave, leve
ou levíssima, o dever de reparar se manifesta com igual veemência, pois o legislador
parece ter adotado a norma romana segundo a qual ‘in Lex Aquilia et levíssima culpa
venit’. Ou seja, dentro da responsabilidade aquiliana, ainda que seja levíssima a culpa
do agente causador do dano, cumpre-lhe indenizar a vítima. Ora, como a indenização
deve ser o mais possível completa, pois indenizar significa tornar indene a vítima, o
agente causador do dano, em tese, tem a obrigação de repará-lo integralmente, quer
tenha agido com dolo, quer com culpa levíssima."
Pessoalmente, filio-me a essa segunda corrente, pois considero que nos casos
de culpa levíssima o juiz deve usar de benignidade ao fixar a indenização.
De qualquer forma, a controvérsia em tela foi dirimida pelo Novo Código Civil, o
qual em seu artigo 944 (sem correspondente no CC de 1916) consagra, em seu caput,
o princípio tradicional, mas em seu parágrafo único, concede autorização para o juiz
decidir por eqüidade em casos de culpa leve ou levíssima, in verbis:
Daí meu desejo de aplaudir o legislador pátrio, o qual andou muito bem ao
elaborar tal dispositivo legal.
Ao cabo, Maria Helena Diniz traz, ainda, a seguinte classificação de culpa: a) in
committendo ou in faciendo, se o agente praticar um ato positivo (imprudência); b) in
omittendo, caso o agente cometa uma abstenção (negligência); c) in eligendo, a qual
advém da má escolha daquele a quem se confia a prática de um ato ou o
adimplemento da obrigação (Súmula 341 do STF); d) in vigilando, que decorre da falta
de atenção com o procedimento de outrem, cujo ato ilícito o responsável dever pagar.
C) Dano.
Assim, cabe à vítima, em regra, provar que sofreu um dano. Nesse sentido,
preleciona Carlos Roberto Gonçalves:
Com efeito, a respeito da liquidação do dano, estabelece o CC, nos arts. 1.537
a 1.553 (art. 948 e ss. do NCC), a regra, nos casos ali previstos, acerca da extensão da
reparação dos danos decorrentes de atos ilícitos.
Quanto à prova do dano, ressalte-se que nem sempre cabe à vítima o ônus de
comprovar sua existência, havendo casos em que o dano é presumido, como acontece
nos chamados juros moratórios.
D) Nexo causal.
2.3-Espécies.
2.3.1 – Classificação.
c)Relativamente ao agente:
c.1) Responsabilidade direta, se proveniente da própria pessoa imputada;
Isto posto, o devedor, para ilidir a obrigação de indenizar, deverá evidenciar que
o descumprimento contratual foi devido à caso fortuito ou força maior. Todavia, é
possível estipular cláusula para reduzir ou excluir a indenização, desde que não
contrarie a ordem pública e os bons costumes.
Tal dispositivo legal teve sua redação ligeiramente alterada pelo Novo Código
Civil pátrio, in verbis:
"Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem,
fica obrigado a repará-lo. "
O ônus probandi cabe á vítima; ela é que deve provar a culpa do agente. Caso
não consiga, tal prova ficará sem ressarcimento.
Entretanto, essa prova muitas vezes se torna difícil. Nosso direito positivo
admite, então, em hipóteses específicas, alguns casos de responsabilidade objetiva ou
responsabilidade sem culpa.
Nesse sentido, asseveram Antônio Ferreira Couto Filho e Alex Pereira Souza :
"A responsabilidade com culpa é regra geral, somente sendo admitida a
responsabilidade objetiva ou sem culpa em casos expressamente previstos em lei".
Silvio Rodrigues afirma que em tais conceitos, a rigor, não se podem vislumbrar
espécies diferentes de responsabilidade, mas sim maneiras diferentes de encarar a
obrigação de reparar o dano. Com efeito – aduz-, subjetiva é a responsabilidade
inspirada na idéia de culpa; objetiva, quando esteada na teoria do risco.
Além disso, doutrina Serpa Lopes que essa teoria objetivista é quem o diz, é
dividida em duas modalidades: a) Teoria do risco proveito - é justo que aquele que
obtém o proveito de uma empresa, o patrão, venha a se onerar com a obrigação de
indenizar os que forem vítimas de acidentes durante o trabalho; b) Teoria do risco
criado – pelo simples fato de agir, o homem cria riscos para os demais, por isso deve
responder em caso de dano. Como se vê, na teoria do risco, toda ação, gerando risco
para terceiros, faz com que o agente responda por eventuais danos,
independentemente de culpa.
"A teoria do risco integral, estágio mais avançado, não admite qualquer prova
conducente á ausência de reparação: bastará a existência do dano e seu autor, em
qualquer hipótese, estará obrigado ao ressarcimento. Mesmo em se tratando de
responsabilidade civil do estado, os doutrinadores repelem este último posicionamento
teórico, que favorecia as mais diversas fraudes."
Não se pode olvidar que a teoria objetiva não se confunde com a presunção
legal de culpa, embora esta tenha precedido aquela.
Dessa forma, ressaltam Antônio Ferreira Couto Filho e Alex Pereira Souza que
a culpa presumida é um instituto puramente doutrinário, o qual causa um efeito próximo
ao da teoria objetiva, daí a confusão entre ambas.
" Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem,
fica obrigado a repará-lo.
Dessa forma, responderão pelos danos causados por animais ou por coisas
inanimadas tanto o seu proprietário como o seu detentor ou possuidor, porque o dever
de indenizar é fruto da negligência da guarda ou na direção do bem.
Conforme já visto supra (item 1.2), para que surja a obrigação de indenizar, há
a necessidade da coexistência de certos pressupostos, a saber: ação ou omissão do
agente; culpa do agente; dano experimentado pela vítima e nexo causal.
Vale ressaltar que a lei pode determinar que somente a culpa exclusiva da
vítima, e não a culpa concorrente, seja a excludente da responsabilidade. É o que
ocorre, exemplificativamente, no art. 17 do Decreto n° 2.681/72, o qual regula a
responsabilidade civil das estradas de ferro. In casu, a concorrência de culpas não
atenua a responsabilidade, pois esta permanece integral desde que haja parcela
levíssima de culpa da transportadora. Porém, para que isso ocorra, mister se faz
disposição expressa de lei nesse sentido.
b)Fato de terceiro.
Regra geral, a obrigação de reparar o dano sofrido pela vítima deve ser
suportada pelo seu causador direto. Todavia, no mundo dos fatos, nem sempre o
causador direto do dano é o responsável pela superveniência do evento danoso.
Destarte, o fato de terceiro se consubstancia na idéia de que, embora exista a atitude
do agente e o dano, há também a intervenção do terceiro, a qual exclui o nexo de
causalidade, pois sem ela, o fato danoso não adviria.
Não obstante, antes de examinar tal questão, convém fixar o sentido do termo
terceiro. Aguiar Dias define sucintamente o terceiro como "qualquer pessoa além da
vítima ou do responsável". Definição que, no entendimento de Silvio Rodrigues,
propicia campo para dúvida, porque o fato de terceiro pode derivar do comportamento
de uma pessoa que não tenha qualquer ligação com a vítima ou com o agente
causador do dano, como pode decorrer do comportamento de pessoas por quem o
responsável deva responder, tais como seus prepostos, filhos, pupilos, curatelados,
auxiliares, etc. Nesse caso, ainda segundo Silvio Rodrigues, quando o dano resulta de
fato do preposto, não há exoneração de responsabilidade, pois terceiro é apenas
aquele por quem o indigitado responsável não responde. Contudo, nessa hipótese,
poderia aquele que paga a indenização se valer de ação regressiva contra seu
preposto, causador direto do prejuízo.
Dessa forma, opto pela definição de Antonio Ferreira Couto Filho e Alex Pereira
Souza, por me parecer a mais acertada sobre a matéria. Assim, conforme esses
doutrinadores, "terceiro é aquele que não tem qualquer vínculo com o aparente
causador direto do dano e com a vítima."
Logo, havendo, no caso, a intervenção de uma outra pessoa que não a vítima
ou o causador direto do dano, e não sendo esse responsável pela pessoa ou a
atividade do terceiro interventor, ocorre a excludente de responsabilidade em apreço.
Por outro lado, se houver culpa in vigilando ou culpa in eligendo, não se pode falar em
fato de terceiro como causa de exoneração da obrigação de indenizar, persistindo,
assim, o dever de reparar o dano.
Entende a doutrina que, para que o fato de terceiro funcione como eximidor do
dever de indenizar, deve apresentar os mesmos requisitos do caso fortuito e da força
maior, a saber, a imprevisibilidade e a inevitabilidade.
Por último, existe a possibilidade do fato de terceiro ser causa parcial do evento
danoso, para o qual, entretanto, o agente direto do dano concorre com uma parcela de
culpa. Aliás, Aguiar Dias aventa a hipótese de o fato danoso resultar da conjunção de
três atividades, a saber, a da vítima, a do apontado como responsável e a de terceiro.
Em casos como esse, a responsabilidade se subdivide de acordo com o grau de culpa,
que é o grau de causalidade de cada um.
No ordenamento jurídico pátrio, o caso fortuito e a força maior são tratados sem
distinção (art. 1.058 do CC e art., 393 do NCC). Todavia, não é ocioso aos objetivos do
trabalho em pauta distinguir as hipóteses de caso fortuito das de força maior, pois
embora sejam tratadas conjuntamente, acarretando, do ponto de vista prático, os
mesmos efeitos, quais sejam, a liberação da responsabilidade de indenizar; do ponto
de vista doutrinário as mesmas não se confundem, haja vista emanarem de diferentes
fontes.
Já para Maria Helena Diniz, na força maior se conhece a causa que dá origem
ao evento, pois se trata de um fato da natureza; enquanto que no caso fortuito, o
acidente que gera o dano advém de causa desconhecida ou de fato de terceiro.
Preceitua essa célebre doutrinadora que " (...) caso fortuito e a força maior se
caracterizam pela presença de dois requisitos: o objetivo, que se configura na
inevitabilidade do evento, e o subjetivo, que é a ausência de culpa na produção do
acontecimento"
d)Estado de necessidade.
I – omissis...
Parágrafo único. Neste último caso, o ato será legítimo, somente quando as
circunstâncias o tornarem absolutamente necessário, não excedendo os limites do
indispensável para a remoção do perigo".
Os artigos 1.519 e 1.520, ambos do mesmo diploma legal, aos quais o artigo
160, II, faz expressa remissão, preceituam, in verbis:
"Art. 1.519. Se o dono da coisa, no art. 160, II, não for culpado do perigo,
assistir-lhe-á direito à indenização do prejuízo que sofreu.
Art. 1.520. Se o perigo ocorrer por culpa de terceiro, contra este ficará com ação
regressiva, no caso do art. 160, II, o autor do dano, para haver a importância, que tiver
ressarcido ao dono da coisa. "
Destarte, num primeiro momento, a lei declara que o ato praticado em estado
de necessidade não é lícito. Depois, porém, estatui que nem por isso fica o autor do
fato isento de ter que reparar o dano. Logo, prima facie, pode parecer que os
dispositivos em comento contêm uma contradição. Contudo, o que a lei prevê é uma
hipótese de responsabilidade objetiva, segundo a qual, mesmo sendo lícito o
comportamento do agente, nem por isso fica afastada sua obrigação de indenizar, em
razão de não se poder atribuir a ele o perigo que ensejou o dano, o mesmo ocorre em
relação à vítima, que com mais razão não deverá suportá-lo.
Por último, é imperioso mencionar que essa matéria se encontra versada nos
artigos 188, 929 e 930 do Novo Código Civil.
Essas excludentes de responsabilidade têm por esteio a idéia de que quem usa
seu direito não causa ofensa a outrem.
Ocorre que, para a configuração de tais escusas, deve a conduta do agente ter
em mira a moderação, que se infere das expressões regular e estrito. Assim, havendo
excessos no exercício do direito ou no cumprimento do dever legal, o ato realizado será
ilícito, surgindo o dever de indenizar. Do mesmo modo, a conduta deverá ser dirigida
sobre pessoa ou coisa determinada, vez que, se for atingida a esfera jurídica de
terceiro, não há a excludente em apreço, persistindo a obrigação de reparar a ofensa.
Quanto ao estrito cumprimento de dever legal, pode ser citado como exemplo o
despejo realizado por oficial de justiça em cumprimento de mandado judicial.
g)Cláusula de não-indenizar.
"A cláusula de não indenizar é aquela estipulação através da qual uma das
partes declara, com a concordância da outra, que não será responsável pelo dano por
esta experimentada, resultante da inexecução ou da execução inadequada de um
contrato, dano este que, sem a cláusula, deveria ser ressarcido pelo estipulante".
Como se vê, tal cláusula exclui a responsabilidade civil, não por desaparecer o
liame de causalidade, mas em razão da própria convenção.
--------------------------------------------------------------------------------
CAPÍTULO III
3.1-Evolução histórica.
A-Primódios.
" Em sua fase mais antiga, o médico não era considerado um especialista em
determinada matéria, mas sim um mago ou sacerdote, dotado de poderes curativos
sobrenaturais. Tal crença era derivada da absoluta ignorância da etiologia de todas as
doenças e da total inconsciência do modo pelo qual o organismo humano reagia
àqueles processos de cura. E, quanto mais a medicina se transformava em ciência,
tanto maior foi se tornando o rigor científico na avaliação dos erros profissionais, não
apenas vinculando-os, como na fase antecedente, ao singelo fato objetivo do
insucesso."
O primeiro documento histórico que trata do problema do erro médico é o
Código de Hamurabi (1790-1770 a.C.). Em seus artigos, impunha ao médico a máxima
atenção e perícia no exercício da profissão; caso contrário, desencadeavam-se severas
penas que iam até a amputação da mão do médico imperito (ou desafortunado). Tais
sanções eram aplicadas quando ocorria morte ou lesão ao paciente, por imperícia ou
má prática, sendo previsto o ressarcimento do dano se fosse mal curado um escravo
ou um animal.
B-Roma.
Antes, tinha lugar a vingança privada, forma primitiva de reação contra o mal
sofrido.
Passa-se, após, à composição tarifada, prevista na Lei das XII tábuas, que
fixava, para cada caso concreto, o valor da pena a ser pago pelo ofensor.
Alfim, vale ressaltar, que em Roma a medicina também era praticada por
curandeiros e sacerdotes, tal qual acontecia na era primitiva da humanidade, sendo a
atividade imbuída de crendices e supertições que tornavam sua credibilidade duvidosa.
Contudo, na passagem da República para o Império, foram organizados cursos
profissionalizantes, alterando assim o panorama então existente, surgindo inclusive,
médicos especialistas em determinadas áreas.
C) Egito.
D) Grécia.
Com o passar dos séculos, porém, as coisas principiaram a melhorar, seja pelo
advento das universidades (no século XIII) ou das corporações de médicos. Após o
surgimento das universidades, vale dizer, a profissão de médico só poderia ser
exercida por quem tivesse habilitação profissional, a qual era obtida no meio
acadêmico.
Além disso, uma atividade tão importante e delicada não poderia ser relegada
apenas ao setor privado, por isso o Estado prosseguiu regulamentando cada vez mais
a área da saúde, conferindo-lhe natureza publicística.
Isto posto, conclui-se que o povo grego tem uma grande importância para a
medicina. Tal afirmação se comprova a partir do fato de que o juramento de Hipócrates,
o qual contém os princípios da ética médica, é a ele atribuído.
E) França.
Na França, por sua vez, onde a teoria da responsabilidade civil foi tratada de
forma mais aprofundada, a Academia de Medicina de Paris, no século passado,
proferiu decisão no sentido de haver apenas responsabilidade moral dos profissionais
médicos, atribuindo-lhes, assim, uma imunidade muito ampla, pois para que houvesse
responsabilidade médica seria necessário se provar falta grave, imprudência visível,
manifesta imperícia; e o ônus da prova sempre incumbiria ao paciente.
3.2-Conceito e elementos.
O conceito de responsabilidade civil médica não foge do gênero da
responsabilidade civil, do qual é espécie, ou melhor um braço, uma ramificação.
" Assim, concordamos com Alexandre Lacassagne quando definiu, em sua obra
Précis de médicine legale (Paris, 1906), a responsabilidade médica como ‘a obrigação
que pesa sobre os médicos de suportarem as conseqüências de certas faltas sobre
eles cometidas no exercício da arte, faltas essas que podem originar uma dupla ação,
civil e pena’l aduzindo que ‘a responsabilidade é uma segurança para os médicos
cultos, conscienciosos e prudentes, e uma ameaça constante para os audaciosos sem
escrúpulo e os ignorantes incorrigíveis, ao mesmo tempo que uma barreira
infranqueável contra as reclamações fantasiosas e os caprichos dos clientes
descontentes’ ".
3.3 – Legislação.
Código Civil de 1916 (arts. 159, 1.537, 1.538, e § 1º, c/c Súmula 562 do STF,
1.539 e 1.545); Novo Código Civil (arts. 186, 927, 948, 949, 950, 951); Súmula nº 341
do STF; Constituição Federal de 1988 (art. 37, § 6º; Código Penal (arts. 18 e 44,I);
Código de Defesa do Consumidor (art. 14, caput e § 4º); Código de Ética Médica (arts.
29 e 46); Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais (art. 89) – em caso de delito
culposo e na suspensão condicional do Processo; Portaria CVS 05 de 08 de maio de
2000; e Resoluções nº 1.363/93 e nº 1.627/2001 do Conselho Federal de Medicina.
Na obrigação de resultado:
"(...) o devedor se obriga a alcançar determinado fim sem o qual não terá
cumprido sua obrigação. Ou consegue o resultado avençado ou terá que arcar com as
conseqüências. (...) Em outras palavras, na obrigação de meios a finalidade é a própria
atividade do devedor e na obrigação de resultado, o resultado dessa atividade".
a) Siqueira Montalvão:
b)Silvio Rodrigues:
"Urge, todavia, advertir ser diversa a situação dos cirurgiões plásticos (e dos
anestesiologistas) no que pertine à responsabilidade civil, para a qual a obrigação
desses especialistas é de resultado, não de meio, considerando que as pacientes que
buscam corrigir um defeito estético qualquer na silhueta – que consideram
desagradável, ou como fator de desajustamento psíquico, por afeá-las – não estão
acometidas de enfermidades...
" A regra geral dita que o médico não pode obrigar-se, no desempenho de sua
atividade profissional, a obter resultado determinado acerca da cura do doente e
assumir o compromisso de reabilitar sua saúde.
No Brasil, nosso Código Civil, inspirado no Código Civil francês, estatui em seu
artigo 1.545, in verbis:
O dispositivo legal supracitado teve sua redação modificada pelo Novo Código
Civil, o qual reza em seu artigo 951, in verbis:
"Art.951. O disposto nos arts. 948, 949 e 950 aplica-se ainda no caso de
indenização devida por aquele que, no exercício de atividade profissional, por
negligência, imprudência ou imperícia, causar a morte do paciente, agravar-lhe o mal,
causar-lhe lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho."
" A responsabilidade das pessoas indicadas neste artigo, por atos profissionais,
que produzem morte, inabilitação para o trabalho, ou ferimento, funda-se na culpa; e a
disposição tem por fim afastar a escusa, que poderiam pretender invocar, de ser o dano
um acidente no exercício de sua profissão. O direito exige que esses profissionais
exerçam a sua arte segundo os preceitos que ela estabelece, e com as cautelas e
precauções necessárias ao resguardo da vida e da saúde dos clientes e fregueses,
bens inestimáveis, que se lhes confiam, no pressuposto de que os zelem. E esse dever
de possuir a sua arte e aplicá-la, honesta e cuidadosamente, é tão imperioso que a lei
repressiva lhe pune as infrações".
Vale ressaltar que, salvo casos excepcionais (art. 366 do CC e arts. 1.607 a
1.617 do NCC), todas as provas têm valor relativo, inclusive a pericial, que embora
revestida de caráter técnico ou científico, pode apresentar defeitos ou inexatidões como
qualquer outro meio de prova. Por essa razão, de acordo com o princípio da livre
convicção, o juiz poderá desprezar suas conclusões, pois ele é o peritus peritorum.
Logo, o magistrado, como leigo na ciência da medicina, deve se basear no seu próprio
entendimento, após ouvir os entendidos no assunto.
No que pertine à prova da culpa, há que se levar em conta o que foi visto no
item 3 deste capítulo a respeito das obrigações de meios e de resultado. Com efeito, se
no caso o médico for devedor de uma obrigação de meios, advindo à vítima algum
dano decorrente da intervenção do facultativo, deve aquela provar que o médico agiu
de maneira imprudente, negligente ou imperita. Por outro lado, se a obrigação do
profissional da medicina for de resultado, caberá à vítima apenas provar o dano e o
nexo causal, devendo o médico, para se isentar do dever de ressarcir o dano,
demonstrar a existência de alguma causa excludente de responsabilidade.
Além disso, não se pode olvidar que a culpa pode ser tanto subjetiva como
objetiva.
A culpa subjetiva pode resultar da relação direta entre agente e vítima, como
poderá ser presumida, no caso do agente ser um terceiro.
" Imprudente é o médico que age sem a cautela necessária. É aquele cujo ato
ou conduta são caracterizados pela audácia, intempestividade, precipitação ou
inconsideração. A impudência tem sempre caráter comissivo".
Com efeito, o cirurgião que, podendo realizar uma operação por método
conhecido, abandona esta técnica e, como conseqüência, acarreta para o paciente um
resultado danoso, comete imprudência, e não imperícia. É imprudente também o
médico que avalia, diagnostica e receita por telefone.
Para Genival Veloso França, um ato médico imprudente e desnecessário, sem
danos objetivos, não pode ser classificado como culpa médica, senão como delito de
"periclitação da vida e da saúde", por expor a vida de alguém a perigo direto e
iminente. Por outro lado, prossegue o supracitado autor, não se deve caracterizar como
delito culposo o insucesso diante de um ato médico justificável e intransferível, quando
há precariedade de meios, quando o agente está no cumprimento do dever legal ou no
exercício regular de direito, ou quando os recursos utilizados são opostos à disposição
por meios moderados.
Adverte Genival Veloso França que diagnóstico errado não é sinal de imperícia,
dadas as circunstâncias que envolvem a análise dos sintomas, às vezes confusos.
Ocorreria aí o chamado "erro honesto".
Alfim, vale transcrever a opinião de Genival Veloso França, para o qual não há
que se falar em imperícia médica, entendendo-se, assim, por responsabilidade médica
baseada na culpa subjetiva, apenas a negligência e a imprudência:
(...) Por responsabilidade médica não se entende, então, uma capacidade mais
ou menos brilhante, ou um conhecimento mais ou menos profundo, mas apenas a
possibilidade de imprudência ou de negligência."
Pessoalmente, não concordo com a opinião do supracitado autor.
A culpa subjetiva presumida, por sua vez, decorre das relações individuais
indiretas e funda-se no vínculo jurídico existente entre o agente e o responsável. Para
haver presunção de culpabilidade, o erro deve ser grosseiro, resultante de uma das
modalidades de culpa e ser devidamente demonstrado. Caso os profissionais tenham
se utilizado dos meios normais e indicados, apenas uma prova irretorquível poderá
levar à indenização pleiteada.
3.7-Dano Médico
Para que tenha origem a responsabilidade civil médica, deve existir um dano,
de qualquer tipo ou espécie, ao paciente: lesão a um direito (à vida, à integridade física,
à saúde), lesão de um interesse legítimo – danos patrimoniais ou morais.
Assim, Miguel Kfouri Neto doutrina que os danos médicos podem ser físicos (ou
corporais) - materias ou morais.
Segundo Yussef Said Cahali: " Enquanto dano moral, o dano estético se
apresenta como uma ofensa a um direito da personalidade, qual seja, o direito à
integridade corporal, à imagem."
Nesse sentido, Miguel Kfouri Neto: "A avaliação do dano estético deve ser feita
por ocasião do julgamento, o mais tarde possível. A cicatriz, a deformidade, podem
atenuar-se".
Ex positis, conclui-se que o dano estético terá efeitos morais quando o prejuízo
estético sofrido pela vítima lhe acarretar repercussões de ordem psíquica, ao passo
que terá efeitos patrimoniais sempre que a deformidade lhe houver impossibilitado
exercer certas atividades, v.g., a de modelo fotográfico ou apresentador de programa
jornalístico.
Alfim, a legitimidade para pleitear indenização por dano estético, no Brasil, diz
respeito apenas à vítima da ofensa, da qual resultou o dano. Contudo, admite-se na
doutrina alienígena, notadamente na França, a possibilidade de terceiro pleitear a
indenização por dano estético. Se a estabilidade conjugal, por exemplo, ficar abalada
pela deformidade da mulher, o marido pode pleitear a reparação: vendo a mulher
desfigurada, ele foi acometido de trauma nervoso, caindo doente, daí surgindo o dever
indenizatório. Ou, ainda, pais de filho inválido – que também sofrem com a dor.
3.8-Nexo de causalidade.
" Hoje, nem sempre o médico age apenas praticando atos próprios no exercício
de sua profissão (responsabilidade civil por atos próprios, subjetiva); também pode ser
auxiliado por prepostos ou outros médicos (responsabilidade civil por fato de outrem,
objetiva), ou por instrumentos (responsabilidade civil por fato das coisas, objetiva)."
O médico, como qualquer outro cidadão, é responsável por seus próprios atos;
a responsabilidade civil médica por fato próprio é a obrigação que tem o profissional da
medicina de reparar os danos que, por seus atos e no exercício de seu mister venha a
causar a seus pacientes ou a terceiros.
I-omissis...
II- omissis...
Súmula 341. "É presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do
empregado ou preposto".
A aceitação dos riscos pelo paciente não se presume, sendo que o médico deve
esclarecê-lo sobre seu uso, prevenindo-o das possíveis conseqüências, e obtendo o
seu consentimento para utilizá-los. Feito isso, não haverá responsabilidade. Entretanto,
se o facultativo faltar com o dever de informação, impossibilitando o paciente de optar
pela submissão ao tratamento, caracteriza-se a responsabilidade por fato próprio do
médico, que tem, como já visto, fundamento na teoria da culpa.
Destarte, para que possa ser responsabilizado pelo fato da coisa, o médico
deve ser o proprietário do equipamento ou responsável pela conservação ou guarda da
coisa. Na maioria dos casos, o proprietário da aparelhagem é o hospital, que apenas
coloca à disposição do profissional o seu uso. Nesse caso, havendo dano, o hospital
será responsabilizado e não o médico.
3.9-Erro Médico.
Todavia, há que se considerar que o erro médico pode ser escusável ou não, o
que pode, respectivamente, isentar ou gerar responsabilidade ao facultativo.
Entretanto, na contramão de tudo o que foi visto até aqui, vale ressaltar a
existência de uma corrente doutrinária, liderada por Klotz, que entende que os erros
médicos têm uma função de estímulo às pesquisas, as quais visam evitar que os
mesmos se repitam no futuro, impedindo, assim, o que ele chama de analgesia da
rotina, mal que afeta todos os profissionais, e não apenas os médicos. Dessa forma, os
erros levariam os profissionais a questionar as técnicas então existentes, muitas vezes
solidificadas pelo costume apesar de não serem benéficas, levando, então, ao
aperfeiçoamento da ciência, o que sempre seria algo profícuo.
Nas palavras de Miguel Kfouri Neto, "o diagnóstico consiste, pois, (...) na
emissão de um juízo acerca do estudo da saúde do paciente".
Isto posto, a questão deverá ser deslindada pela seguinte regra geral: se,
naquelas circunstâncias, com os meios de que dispunha, o profissional não se desviou
crassamente da conduta prevista para aquele caso, inexistirá culpa, e, por conseguinte,
estará arredado o dever de indenizar.
Miguel Kfouri Neto preceitua que: " Apesar de o Código Civil brasileiro colocar a
responsabilidade dentre os atos ilícitos, não mais acende controvérsias caracterizar a
responsabilidade médica como ex contractu".
"Assim sendo, se o paciente vier a falecer, sem que tenha havido negligência,
imprudência ou imperícia na atividade do profissional da saúde, não haverá
inadimplemento contratual, pois o médico não assumiu o dever de curá-lo, mas de
tratá-lo adequadamente. É preciso lembrar que não haverá presunção de culpa para
haver condenação de médico; ele (CDC, art. 6º, VIII) é que deverá provar que não
houve inexecução culposa da sua obrigação profissional, demonstrando que o dano
não resultou de imperícia, negligência ou imprudência sua."
"É claro que poderá existir responsabilidade médica que não tenha origem no
contrato: o médico que atende alguém desmaiado na rua, v.g. A obrigação de reparar o
dano, entretanto, sempre existirá, seja produzida dentro do contrato ou fora dele".
Em igual sentido, conclui Serpa Lopes: "... pouco importa que se trata de uma
responsabilidade contratual ou extracontratual, de qualquer modo, em se tratando de
uma obrigação de meios, ao prejudicado é que incumbe o ônus probatório da
infringência dessas obrigações".
E conclui dizendo:
"O dano médico deve ser apreciado a partir da análise do elemento subjetivo,
da culpa, quer seja o profissional vinculado a estabelecimento hospitalar ou não.
Objetarão os estudiosos das relações de consumo que a conclusão contraria o sistema
do Código, inteiramente voltado à responsabilidade objetiva. Dirão, mais, que, em
havendo culpa do médico, o hospital poderá voltar-se, por direito de regresso, contra
seu empregado. Acrescentarão, por fim, que ao consumidor/vítima interessa pleitear o
ressarcimento da pessoa jurídica, economicamente mais poderosa.
Não se pretende, com tal exposição, trazer alguma solução ao embate, vez que
a isso não se presta esse trabalho. O que se visa com a inclusão deste tópico é apenas
alertar para a existência do problema acerca da responsabilidade do hospital por danos
causados por seus empregados médicos.
3.13.1 – (In) adequação da aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor
na relação médico-paciente.
"A vida e a saúde não são bens de consumo, posto que (sic) não podem ser
comparadas a nenhum produto, como geladeira, um ventilador ou um telefone celular.
Tampouco podem ser equiparadas, igualmente, a serviços, posto que para se constituir
um serviço – relação médico/paciente – mister que oferecesse ao mercado bens de
consumo, o que a saúde e a vida indelevelmente não são.
Assim, o paciente, por força do art. 25, § 1º, da Lei nº 8.078/90, não está
obrigado a propor a ação apenas contra o hospital ou o médico. Poderá propor contra
os dois conjuntamente, ou apenas contra um deles. É mera faculdade do paciente
decidir contra quem propõe a ação indenizatória, pois a obrigação de reparar o dano é
solidária...e na obrigação solidária a demanda pode ser proposta contra qualquer dos
devedores, assim eleitos, ou pela Lei ou pelo contrato.
" [TA/MG] NP.: 02095834-6/00, TP: Apelação (cv), NA.: pp. co.: Janauba, DJ:
05.03.96, OJ.: 1ª Câmara Cível, DP.: não publicado Juiz Herondes de Andrade, dec.:
unânime indenização. Erro médico – Cooperativa = Legitimatio ad causam. Não
indicado o médico que teria cometido erro profissional, é parte ilegítima passiva ad
causam para responder pela indenização, derivada da responsabilidade civil, a
cooperativa que o teria contratado para prestar assistência aos seus associados, dada
a impossibilidade de se constatar o vínculo de subordinação que poderia existir entre o
primeiro e a segunda, além de ser o erro médico sempre dependente do elemento
subjetivo da culpa."
"(...) seria válido que médico e paciente estabelecessem pacto e que este,
antes de iniciado o tratamento, renunciasse a exercitar qualquer ação civil de
responsabilidade? A mesma indagação surgiria (...) quando se pretendesse apenas
limitar o alcance de possível indenização".
"No Brasil, o médico é civilmente responsável pelos seus erros e pode ser
demandado para que cumpra sua obrigação de reparar os danos culposos que tenha
causado ao cliente. Que a experiência tem demonstrado, no entanto, é que o brasileiro
até hoje não adquiriu o hábito de processar ninguém para obter reparação do dano. E a
classe médica, assim, também tem ficado praticamente alheia ao problema jurídico e
financeiro da responsabilidade da reparação das injúrias físicas cometidas aos clientes,
no exercício profissional.
"A opção pelo seguro é a opção pelo conflito, pois causa uma ruptura na base
da Medicina, que é a íntima relação de confiança entre médico e paciente. Nos Estados
Unidos, esta base está corroída. As seguradoras buscam parcerias com bancas de
advogados conveniados e fala-se em pacote de proteção. Os médicos passaram a ter
advogados conveniados das empresas seguradoras. O compromisso como resultado, e
não com o meio, é cobrado. Como conseqüência, os conselhos de medicina e os
tribunais ficam abarrotados de processos. O instrumento do seguro pode ser utilíssimo
sob outras formas, mas, na Medicina, trará conseqüências bastante danosas ao ato
médico e à relação com o paciente".
No entanto, esses seguros não podem nem devem, sob qualquer pretexto, ser
feitos por empresas privadas. Devem, isto sim, realizar-se por uma instituição estatal
ou pela própria classe médica; como, por exemplo, sob a responsabilidade da
associação Médica Brasileira, como mutualizadora ou como concessionária exclusiva
do Estado".
--------------------------------------------------------------------------------
CAPÍTULO IV
Cirurgia plástica (de plastikós, moldar, plasmar, dar forma) é a parte da cirurgia
que objetiva restaurar, de forma artificial, anatômica e funcionalmente, partes do
organismo arruinadas por deformidades congênitas ou adquiridas, além de corrigir as
desarmonias de ordem estética.
Nesse mesmo sentido, Rosana Jane Magrini define a cirurgia plástica nos
seguintes termos:
Pode-se dizer que a cirurgia plástica passou, no que tange a sua legitimidade,
por três fases distintas, a saber: a fase da rejeição; da aceitação com reservas; e a da
admissão ampla.
A fase de aceitação com reservas, por sua vez, surgiu no fim da Segunda
década deste século, mas precisamente, segundo Caio Mário da Silva Pereira, "... a
partir do julgamento do Tribunal do Sena, em 25 de fevereiro de 1929, após o qual
considerou-se a questão de saber se o médico incide em culpa sempre, ou se depende
esta das circunstâncias de cada caso." Assim sendo, passou-se a entender que, se a
cirurgia plástica não era proibida por lei, não poderia ser considerada um ato ilícito,
conciliando-se, destarte, o direito com o desejo de muitos homens e mulheres de
corrigir imperfeições físicas, renovando, em muitos casos, o prazer de viver, face a
melhor aceitação pelo meio social das pessoas tidas como bonitas, evitando, ou
mesmo curando, possíveis neuroses ocasionados pela rejeição social causada pela
existência de alguma imperfeição estética.
É imperioso lembrar (como visto no item 4.1 deste capítulo) que a cirurgia
plástica pode ser dividida em cirurgia estética reparadora e cirurgia estética
propriamente dita ou meramente estética, conforme visem, respectivamente, corrigir
enfermidades (congênitas ou adquiridas), ou imperfeições da natureza.
" Esta aplicação da ciência não tem sido encarada com muita benevolência
pelos tribunais, naturalmente impressionados pela feição menos nobre da cirurgia
estética posta a serviço da vaidade fútil ou dos até inexeqüíveis processos de
rejuvenescimento, mas esquecidos das assombrosas possibilidades que ela pode abrir
à humanidade, dentro das altas finalidades da arte médica."
" Cabe, portanto, repetir mais uma vez a diferença entre a cirurgia reparadora,
lícita e necessária, de valor indiscutível e incluída entre os direitos profissionais do
médico, e a cirurgia cosmetológica, fora do âmbito da verdadeira Medicina, e que tem
por base interesses escusos de quem a procura, e objetivos nem sempre confessáveis
de quem a realiza."
Miguel Kfouri Neto, por sua vez, ressalva que a regra de ouro em matéria de
cirurgia plástica consiste na seguinte afirmação: "todas as vezes que a saúde, a
integridade física ou a vida do paciente estejam em perigo, o médico deve renunciar ao
aperfeiçoamento de caráter estético, independentemente da vontade do próprio
paciente".
E continua o autor:
Toda profissão é regida por uma Lex Artis. Na medicina, porém, não obstante
seu caráter geral, essa lex é aplicada a cada ato médico individualizado (ad hoc). Os
fatores já mencionados e seus efeitos variam de caso a caso. Diversas são as
avaliações, logo, do atendimento a um moribundo ou a um paciente com ligeiro mal-
estar; de uma cesariana realizada por um só médico em hospital de zona rural, ou por
uma equipe em grande centro urbano.
O juiz – que não é versado em medicina – define a Lex Artis ad hoc não só
pelas informações do perito e assistentes técnicos eventualmente indicados pelas
partes, mas também pela consulta aos autores consagrados da especialidade médica
considerada, que descrevem qual o procedimento recomendado para aquele ato do
qual adveio o resultado lesivo.
Por outro lado, existem casos em que, embora seja necessário o tratamento, o
paciente ou seus familiares negam-se a autorizá-lo. José de Aguiar Dias comenta que
"a operação sem consentimento equivale a agressão".
Ocorre, porém, que há, como já visto, situações emergenciais, nas quais deve-
se relativizar o elemento vontade, primeiramente pelo compromisso do médico com a
vida e, em segundo lugar porque, em tais situações, nem sempre o paciente ou seus
familiares têm condições psicológicas adequadas para decidir acerca da intervenção
médica, podendo-se, outrossim, entender que em tais casos poderá incidir a
excludente de responsabilidade do estado de necessidade.
José de Aguiar Dias narra um caso no qual uma jovem senhora procura um
médico para eliminar gorduras excessivas em suas pernas. Na cirurgia, o médico, além
da gordura, retirou massa muscular em apenas uma das pernas, numa operação cujos
contornos foram extremamente complicados. Ainda pela dificuldade de sutura do
tecido, pela extrema contração dos músculos, a perna da paciente foi enfaixada com
bandagens, somente retirada após três dias da cirurgia, quando cheiro característico de
gangrena surgiu. Ao final de três semanas não restou outra alternativa senão a
amputação da perna.
Foi afirmando, outrossim, que a obrigação assumida pelo médico é, regra geral,
de meios, bastando tão-somente que o mesmo preste ao paciente cuidados
conscienciosos e atentos, de acordo com as condições evolutivas da ciência médica,
para que se exima da obrigação de indenizar na superveniência de algum dano por sua
atividade.
A atividade do cirurgião plástico, porém, possui feição peculiar, haja vista ser
distinta a obrigação do médico conforme a modalidade de cirurgia plástica realizada, a
saber, estética propriamente dita, ou estética reparadora.
Desse modo, caso o paciente venha a ficar com aparência pior após a cirurgia,
terá ele direito a reparação pelo dano sofrido, haja vista não ter sido alcançado o
resultado almejado por ele e prometido pelo cirurgião.
E mais, in verbis:
Miguel Kfouri Neto ressalva, porém, que "se a cirurgia tiver por finalidade a
reparação de graves defeitos – causados por acidentes de automóvel, do trabalho,
queimaduras v.g. – é induvidosa a caracterização da obrigação de meios..."
Tal fato ocorre porque, em sendo de meios a obrigação, não assume o médico
a obrigação de cura do paciente, cumprindo o contrato firmado com o cliente desde que
preste a estes cuidados conscienciosos e atentos.
--------------------------------------------------------------------------------
CAPÍTULO V
Até algum tempo atrás, o dano advindo do médico era tido como inevitável.
Raro, nesses casos, buscar-se reparação. Daí, passou-se a uma situação totalmente
contrária, não só de proteção ao lesado, como também de predisposição deste em
imputar qualquer mau resultado ao profissional – seguindo-se a demanda indenizatória.
Uma resposta menos atenta pode dizer que isso deriva do erro médico em si, à
deficiência das faculdades, à má formação dos médicos, aos baixos honorários, etc.
Todavia, por que tal ocorre inclusive nos Estados Unidos, onde o médico é
sabidamente bem formado e bem remunerado?
Estudiosos do assunto apontam outros fatores que vão além dos
supramencionados. Entre os vários motivos que levam à desconfiança na atuação do
médico, dois se mostram precípuos e incontroversos: o primeiro deriva da
dessacralização crescente da sociedade e o segundo da impessoalização da relação
médico-paciente.
Hodiernamente, o paciente não tem mais o seu médico particular, mas sim uma
lista "infindável" de profissionais que lhe são oferecidos pelos planos de saúde. O que
prevalece hoje não é apenas se o profissional é bom, mas se ele é vinculado a um
convênio ou plano de saúde. Não é por acaso que as chamadas consultas particulares
estão a cada dia mais escassas e só profissionais altamente renomados podem abrir
mão de trabalhar com os planos de saúde. E, como os convênios nivelaram por baixo a
remuneração do profissional, ele tende a trabalhar em mais locais, com mais pacientes,
a fim de auferir uma remuneração razoável. O resultado é a impessoalização da
relação médico-paciente. Nesse sentido, aduz Miguel Kfouri Neto:
Assim, retornando ao âmbito nacional, não se pode negar que hoje o Estado
coloca à disposição do cidadão para proteger seus direitos, um Poder Judiciário, em
que pese sua morosidade e deficiência, muito melhor aparelhado e próximo da
comunidade que tempos atrás.
Logo, em apertada síntese, conclui-se que ao lado das deficiências dos cursos
de medicina nacionais, contribuem para o aumento das demandas por erro médico em
nosso país, a dessacralização da sociedade, a massificação dos tratamentos médicos
com a proliferação dos planos de saúde, a atuação da imprensa, a própria atitude da
classe médica diante do problema, e o melhor aparelhamento do Poder Judiciário
pátrio.
Pena de até três anos de prisão e indenizações que variam de oitenta a mil
salários mínimos, acrescidas, se for o caso, do montante das despesas que o paciente
precise fazer para corrigir a lesão que eventualmente tenha sofrido e condenação em
pagamento de uma pensão, até permanente, ao paciente ou dependentes seus, que
variam de acordo com a renda que estes paciente tinha no momento da lesão que o
tenha incapacitado. Essas são as punições que a Justiça brasileira vem concedendo a
médicos que tiram vidas, mutilam pacientes, deixam trauma e um vazio eterno nas
inúmeras famílias vítimas de erro médico.
Nesse sentido vale dizer que o Superior Tribunal de Justiça vem decidindo a
favor da indenização à vítima e à família em casos de erro médico em que fique
provado, sem margem de dúvidas, que o procedimento do profissional foi realmente a
causa da lesão ou morte do paciente. Quando, no processo criminal ou cível, as provas
são insuficientes, o STJ, ao analisar a questão, isenta o médico da pena por não poder
reexaminar as provas. Por outro lado, quando o nexo causal é descrito e provado, o
tribunal reconhece o direito à indenização e pune os profissionais.
Para Miguel Kfouri Neto: "O artigo 1.545 do Código Civil não aprofunda, por
exemplo, a questão do laudo e do perito". Segundo ele, um dos grandes inimigos
desses processos é o laudo incompleto ou inconclusivo, que deixa dúvidas sobre as
quais o juiz não pode decidir. "É preciso criar-se um estatuto que trate somente do erro
médico". Opinião com a qual, pessoalmente, concordo.
Esse dever legal tem como fundamento as máximas romanas afirmadas por
Ulpiano, segundo as quais "deve-se viver honestamente, não lesar ninguém e dar a
cada um o que é seu".
Vale ressaltar que o artigo 5º, V e X da Magna Carta de 1988 consagra a plena
reparabilidade do dano moral.
Para Miguel Kfouri Neto, quando se trata de dano moral ou estético, apropriado
seria falar em compensação, como forma de restabelecer uma situação que se havia
modificado, em função de prejuízo ou dano causado. Verifica-se, entretanto, larga
aplicação do vocábulo reparação, especificamente em relação ao dano moral,
insuscetível de valoração monetária absoluta.
Nesse contexto, faz-se mister citar o disposto no artigo 944 do NCC (sem
correspondente no CC de 1916), e na Súmula nº 37 do Superior Tribunal de Justiça
(máxima instância para decidir sobre o assunto em nosso país), in verbis:
Não há um critério aritmético para apurar o dano estético. Esse dano será maior
ou menos extenso conforme o sexo, idade, condição social do lesado, etc. P. ex.:
suponha-se que a vítima da lesão deformante seja uma das dez mulheres mais
elegantes do Brasil, centro de atrações sociais, e que, de uma hora para outra, em
razão da lesão, vê-se obrigada a usar olho de vidro, aparelhos ortopédicos, etc. que
prejudiquem sua vida social (o dano ob deformitatem será menos extenso se outra
fosse a vítima, pertencente a uma classe social inferior).
O Novo Código Civil não mais faz tais distinções, vez que até mesmo o dote foi
eliminado do nosso ordenamento jurídico, dispondo somente no seu art. 950, in verbis:
"Art. 950. Se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não possa exercer
o seu ofício ou profissão, ou se lhe diminua a capacidade de trabalho, a indenização,
além das despesas do tratamento e lucros cessantes até o fim da convalescença,
incluirá pensão correspondente à importância do trabalho para que se inabilitou, ou da
depreciação que ele sofreu.
5.3.1-Direito comparado.
c)Na Suíça, tem a vítima desfigurada direito à indenização quando por causa
desta há restrições ao seu futuro econômico;
d)O direito alemão contém preceito expresso protegendo o ofendido por lesões
corporais a receber indenização pecuniária pelos danos que não tenham afetado o seu
patrimônio.
f)No direito português – "A lei protege os indivíduos contra qualquer ofensa
ilícita ou ameaça de ofensa à sua personalidade física ou moral";
g)No direito inglês, a reparação das lesões aos direitos subjetivos é a mais
efetiva e ampla, estendendo-se, do mesmo modo, às ofensas a bens imateriais;
h)Nos Estados Unidos, qualquer ofensa à pessoa, seja material ou moral, é
tratada com a maior severidade possível. A indenização é aplicada da forma mais
perfeita e completa;
--------------------------------------------------------------------------------
CONCLUSÃO.
Vale ressaltar que o erro médico não é algo distante dos profissionais da
medicina, nem da população. Pois, a cada dia crescem as ações judiciais que,
fundadas em tal questão, buscam obter reparação aos pacientes vítimas de danos
causados por culpa na realização de cirurgias plásticas.
6) caso, porém, a cirurgia plástica for meramente estética, ou seja, tiver caráter
meramente cosmetológico, a obrigação assumida é de resultado, ocorrendo
inadimplemento contratual se o fim preestabelecido (a melhora estética) não for obtido.
8) se, por outro lado, a cirurgia realizada for meramente estética, incumbe ao
médico comprovar a existência de alguma causa excludente de responsabilidade, a fim
de se eximir da obrigação de indenizar.
--------------------------------------------------------------------------------
ANEXO.
Não viola regra sobre a prova o acórdão que, além de aceitar implicitamente o
princípio da carga dinâmica da prova, examina o conjunto probatório e conclui pela
comprovação da culpa dos réus. Legitimidade passiva da clínica, inicialmente
procurada pelo paciente. Juntada de textos científicos determinada de ofício pelo Juiz.
Regularidade. Responsabilização da clínica e do médico que atendeu o paciente
submetido a uma operação cirúrgica da qual resultou a secção da medula. Inexistência
de ofensa à lei e divergência não demonstrada. Recurso especial não conhecido. (STJ
– 4.ª T.; Rec. Esp. N.º 69.309-SC; Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar; j. 18.06/1996; v.u.)
STJ/TRF 89/155 e RJ 231/149
Ocorre que não foi feito o exame de sensibilidade do paciente e, não sendo
intervenção "cirúrgica urgente", tanto assim que a anestesia fora setorial, houve falta de
cuidado objetivo e técnico do médico anestesista, que, por negligência e também
imperícia, tanto pelo aspecto omissivo e comissivo, não teve atitude correta, pronta,
técnica e profissional condizente ao momento e ao paciente, havendo agido com culpa
e respondendo pelo dano causado (artigos 159 e 1.145 c.c. o artigo 1.056 do CC).
Apelo conhecido e provido parcialmente (TJGO – 1.ª Câm.; Ap. Cível n.º
29.966-5/188; Rel. Des. José Soares de Castro; j. 18.05.1993) RJ 231/149
Ementa oficial: é devida indenização por danos morais à mãe parturiente, cujo
filho nasce morto por respirar mecônio no útero em razão do retardamento do parto,
por negligência e omissão médica. (TJRO – Câm. Civil.; Ap. Cível n.º 95.005038-5; Rel.
Des. Eliseu Fernandes de Souza; j. 27.06.1995; v.u.) RJ 231/150 e RT 729/290
--------------------------------------------------------------------------------
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 16.
ed. atual. de acordo com o novo Código Civil (Lei nº 10.406, de 10-01-2002). São
Paulo: Saraiva, 2002. v. 7.
ERROS médicos. Pró Consumidor. [s.l.], ano 2, n. 24, p. 18-23, jan. 2001.
FRANÇA, Genival Veloso de. Direito médico. 6.ed. São Paulo: Fundo Editorial
BYK-Procienx, 1994.
________. Socialização do risco médico [on line]. Set. 2000. Disponível em:
www. Jurinforma.com.br/Notas html. [capturado em 17 jun. 2002].
KHOURI, Paulo Roque. Erro Médico. Revista Consulex. São Paulo, ano 3, n.
36, p. 14-21, dez. 1999.
LIMA, Alvino. Da culpa ao risco. 2.ed. rev. e atual. Pelo Prof. Ovídeo Rocha
Barros Sandoval. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998.
RESPONSABILIDADE civil por erro médico. Revista Consulex. São Paulo, ano
5, n. 113, 10-18, set. 2001.
SERPA LOPES, Miguel Maria de. Curso de direito civil: fontes acontratuais das
obrigações – responsabilidade civil. 5. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1989.