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Revista do Palais de Tokyo Le magazine du Palais de Tokyo Novas historias de fantasmas Uma proposi¢do de Georges Didi-Huberman & Arno Gisinger Nouvelles histoires de fantémes Une proposition de Georges Didi-Huberman & Arno Gisinger Paris, n. 19 p. 186-196. Fevereiro, 2014 ‘Tradueao Isis Gasparini Fevereiro, 2015 A198 ediio da Revista do Pulaisde Tokyo, publicada em 2014, trar um conjunto de cinco textosa respedto da expa Iistétas de Fantasmag’, propasta de Georges Didi- Huberman © Amo Gisingey, que esteve em cartar entre 14/02 ¢ Como parte do desejo de me aprusiwar do pensamento desse autor e, malspontualmente, assumindo 0 desatlo de comproader seuprojeto “Atlas” realize espontaneamentea tradugio do pHmelro testo dessa sequéncia a fim de compartilhar com agueles que, camo en, busscam desvendar algo de aia obra, Os dem als textos sfo: After Atlas (por Ama Gisingey); Atle: inde lis (por Harald Falckenberg) Se debr 1s imagens (per Alain Fleisthet), e Mnémosyne 42 (por Georges Didi- Huberman) O historiador e fildsofo Geroges Didi-Huberman ¢ o artista Arno Gisinger retornam a génese e as diferentes etapas do projeto que desenvolvem em conjunto, que teve origem na exposigao ‘Atlas, como carregar 0 mundo nas costas?” concebida por Geroges Didi-Huberman, e que tem uma nova e:iltima etapa apresentada no Palais de Tokyo. Neste dossié, eles evocam os problemas histdricos ¢ tedricos relativos especialmente a questiio das montagens de imagens como formas espectficas de um saber sobre o mundo. Uma Exposicao na Epoca de sua Reprodutibilidade Técnica ‘Texto: Georges Didi-Huberman Tad: Isls Gasparint Inicialmente howe a exposigao “Atlas”. Foi uma ta- refa bastante complexa e extensa (eu nao me lembro © niimero exato de metros quadrados da grande nave suntuosa do Museu. Nacional Centro de Arte Reina Sofia, em Madrid, algo entre dois mil e dois mil e qui- nhentos). No ZKM-Museum fiir Neue Kunst, em Karl- sruhe, ela estava um pouco mais concentrada em sua disposi¢o quadrada; mas, na Sammlung Falckenberg de Hamburgo, ela era muito mais ampla (aproximada- mente cinco mil metros quadrados, acredito, nos dife- rentes niveis de sua complexa arquitetura). Foi um tra- balho intenso, renso em todos os sentidos da palavra os prazos de preparagao eram bem curtos, ainda que tenham sido amparados pela reflexdo que conduzo ha alguns anos sobre a questao do que nomeio de “conhe- cimento pelas imagens’, que é também, fatalmente, um conhecimento pelas montagens de imagens. Era uma exposicao sobre ~ com, através de - tais montagens de imagens: era portanto, mais precisamente, uma grande montagem de montagens de imagens, um grande atlas de varios atlas de imagens. ‘Trabalho tenso, igualmente, porque minha abordagem da questao do atlas nao existiria sem um ponto de vis- ta~discretamente ou nao, eu nao sei ~ polémico com relagao a certos modelos tedricos que o mundo da arte contempordnea incorporou com tanta evidéncia, que cles jamais foram explicitados e menos ainda postos 1 ‘6 Didk Huberman (tx), Aas ,Cémo tlevar el mundo. cuestas?. trad. M.D. Aguilera. (Museo Nacional Centro de Arte Rei- ‘na Sofia. Madrid, 2010). tls. How to Garry the World on One's Back?.trad, 8. B, Lillis (Museo Nacional Contro de Arte Rena Sofa ‘Madstd, 2010). em questo (eu penso partic da divisao histéricae estética entre “modernismo’, “an- ti-modernismo" e “pés-modernismo”). Dai decorreram discuss6es passionais com Manolo Borja Villel, diretor do Museu Reina Sofia Os encontros ocasionais com ele, nos oito ou nove meses que precederam a abertu- ra dessa exposicao, foram decisivos em todos os sen- tidos da palavra: importantes teoricamente ~ porque nés concordamos out confrontamos justamente nossos respectivos modelos estéticos e histéricos -, mas tam- bém conduzindo imediatamente As decisoes mais con- cretas sobre o contetido final do que seria apresenta- do aos espectadores. Eu havia constatado, visitando a montagem das colecées permanentes do Reina Sofia, aque ponto Manolo se sentia implicado na questao do atlas de imagens embora, naquele momento, acredito, ele ainda nao percebia a distincao necesséria entre a problematica do atlas e aquela eno muito em voga do arquivo. Essa é a razao pela qual decidi nao me co- locar como “mestre absoluto” das obras a expor ~ a po- sicao do mestre absoluto, legitimada unicamente por uma autoridade abstrata, parece-me sempre detest vel, tanto eticamente quanto epistemicamente ~ ¢ sim discutir com Manolo cada ponto de vista teérico, cada artista e cada obra considerada para a montagem, O grande beneficio desta posicao é que aprendi muito com alguém que conhecia a situagao da arte contempo- raneade dentro (0 que nao é 0 mewicaso).A dificuldade @ que eu tinha que defender e justificar constantemen- te ~ mas também precisar ~ minha proposta geral, as- sim como as escolhas dos detalhes, minhas “regras” ¢ minhas “exce¢des": Sendo wm curador nao profissional, uma vez que meu meio de trabalho nao énem o museu nem a galeria, nem a instituigéo piblica nem o mer- cado de arte, deparei-me algumas vezes com Wbgicas que me escapavam e, mesmo quando eu podia identifi- cérlas, que me revoltavam (por exemplo, quando uma obraé considerada indigna de ser exposta pelo simples fato de ela jé ter sido mostrada na parede do museu*, ou quando certas instituigdes recusam empréstimos por razoes de estratégia culturak nada de grande Boe- tti “posto que” uma retrospectiva ocorrera muito em breve etc). Mas, uma vez montada a exposicao, entendi bem 0 quanto o resultado devia a todas essas tensdes, todas essas discussdes prévias, todas essas tentativas de negociago [marchandage] que contrastam tanto com 0 trabalho soberano e 3s vezes solipsista do pes- quisador solitario. Sem elas, a exposicao teria sido mais completa mas, sem divi is ingnua e, de todo modo, menos pertinente. A mesma tenso - 0 mesmo confronto dialético ou di I6gico - ira também acompanhar a montagem de Ham- burgo, uma vez que era preciso levar em conta as espe- cificidades da colecao Falckenberg e, portanto, o ponto de vista do colecionador que “defendia” firmemente a lbgica de seu espago e de suas escolhas (por exemplo acentuando o espaco destinado a Hanne Darboven ou a Dieter Roth, ou ainda introduzindo novos artistas, 2 (Nota de tradutos) Cimaises du musée, enjo sentido no fencontra tradusao exata na lingua portuguesa, Cimaise, no conter to doum musou ou exposisio, rofore-se auma ospécto de moldura ‘de madetra que contoma o limite entre a parede eo teto onde ceram colocades ganchos para pendurar as pinturas. Tradicional- ‘mente, efere-so i parte malsnobre.e almejada pelos artistas para exporams obras, tais como Gerl hur Képeke, Richard Ha- milton, Anthony McCall etc). Para transformar nossos debates em novos jogos de montagens, ou nossas con- testagdes miituas em experimentarées conjuntas da disposigao das obras [accrochage], nés terminamos, juntamente com Harold Falckenberg, por transfigurar literalmente a apresentacao realizada inicialmente no museu Reina Sofia sem, no entanto, dissolver ou enfra- quecer sua proposta teérica, muito pelo contrario. Se Aby Warburg foi a figura tutelar desta exposi¢ao que tomou como ponto de partida o atlas de imagens Mné- mosyne, & justamente o pensamento dialético de Wal- ter Benjamin ~ seu pensamento mesmo das “imagens dialéticas” ~ que ter sido o motor fundamental des- ta exposigao, tanto no seu processo, no seu trabalho, quanto no seu resultado. Hoje em dia, todos os amadores e profissionais da arte contemporanea estdo ~ ou acreditam estar ~ familia- zados com 0 pensamento de Walter Benjamin. Todo mundo, em primeiro lugar, conhece - ou cré conhecer ~ as ligdes tedricas contidas no famoso texto “A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica’, nas suas duas verses de 1935 e 1938?. 0 interesse por tal texto no “mundo da arte” é ainda mais forte porque ele pra- ticamente comeca com uma tomada de posicao relati- va a politica da arte, motivo inerente as questoes que tal mundo se coloca, sobretudo no ambito de grandes instituig6es museolégicas ou pedagégicas, tais como 0 Museu Reina Sofia, 0 ZKM de Karlsruhe ou 0 Deich- 3 W. Benjamin, “ocuvre art l're de sa reproduetibiité technique] primeira versaol” (1938), trad. R Rochlite, cures tit (Gallimard. Paris, 2000). 67-113. Segunda versio (1938), trad M.deGandillac revista por R. Rechts fhe, p. 269-316. torhallen de Hamburgo: “Os conceitos que introduzi- mos na teoria da arte, escrevia Benjamin, distinguem- se de outros conceitos pelo fato de nao serem de modo algum utilizéveis pelos propésitos do fascismo. Em contrapartida, eles sao utilizados para formular as exi- géncias revolucionérias na politica da arte’.” Em um museu como 0 Reina Sofia onde esta expos- ta nada menos do que a Guernica de Picasso - e onde Manolo Borja teve a audacia pedagégica de trazer aos olhos do piblico alguns documentos histéricos tais como 0 filme do funeral de Buenaventura Durruti, em 1936 -, a questo de uma tal “politica da art dentemente, crucial. Ora, a reprodutibilidade técnica se encontra bem no centro de tais “politicas” museolé- gicas: expde-se hoje em dianos museus de arte mod na tanto obras “reproduziveis” (gravuras, fotografias, filmes, edigdes de objetos ou de livros) quanto obras ‘originais” (quadros, esculturas, desenhos), maneira ‘itil de questionar, de deslocar as hierarquias estéticas. Mas é preciso lembrar que a primeira liao politica ti- rada por Walter Benjamin desse contexto dizia respei- ue opera entre “valor de culto” e “valor de exposicao" esta segunda, permitindo o “atual declinio daaura™ que equivale a uma profanagao do mundo das imagens. Benjamin se explicavanesses termos sobre um tal pro- cesso de cisao: “nés poderiamos representar a historia da arte como 0 confronto entre dois pélos no seio da obra de arte em si mesma, ¢ considerar que a histéria 4 id, p.69. 5 Ibid, p78. de seu desenvolvimento é definida pelo deslocamento do centro de gravidade que passa de um pélo da obra de arte a outro, Um desses pélos é 0 valor de culto da obra 0 outro, seu valor de exposigto. A produgao artis- tica comeca pelas imagens que estao a servigo da ma- gia Sé6 aexisténciadessas imagens jaé importante, nao 0 fato de que sejam vistas. 0 alee que o homem figura nas paredes de uma caverna na idade da pedra é um instrumento magico, mas é circunstancial o fato de que sejam expostos aos olhos de seus semelhantes; 0 que mais importa é que a imagem seja vista pelos espiritos. Ovvalor de culto como tal exige verdadeiramente que a obra de arte seja guardada em segredo: algumas e: tuas de deuses somente so acessiveis ao sumo sacer- dote na cella, e algumas Virgens permanecem cobertas quase que o ano todo, algumas esculturas em catedrais gOticas so invisiveis se as olhamos do chao. A medi- da que as diferentes préticas artisticas se emancipam do culto, as oportunidades de exp@-las tornam-se mais numerosas. Um busto pode ser enviado pra ca ou pra 14; por conseqiiéncia ele é mais exponivel que uma es- tatua de um deus, que tem seu lugar demarcado no in- terior de um templo. O quadro é mais exponivel do que © mosaico ou o afresco que o precederam..” 0 problema se complica terrivelmente a partir do mo- mento em que observamos que essa “confrontagao” su- blinhada - e mesmo politicamente reivindicada ~ por Benjamin entre valor de culto e valor de exposigtio seria, a partir de entao, absorvida, dissolvida, destruida por isso que poderiamos nomear como valor cultural da arte atual, devendo a palavra “cultura” ser aqui entendi- 5 Tid, p.79. danao no sentido antropolégico, que é 0 tinico interes- sante, mas no sentido que querem lhe dar os diferentes “ministérios” que asseguram seu peso e seu prestigio. Em outras palavras, o valor de exposigo se tornou um valor cultual no sentido pleno: da cisao entre culto € exposi¢ao, nés passamos ao culto da exposigdo, e tal 6 hoje em dia, o problema que se coloca a toda “politi- cada arte’ £0 que ocorre quando, por “magia” ~ uma ‘magia que se exprime inicialmente em tratativas entre musetis e mesmo entre governos e, ainda, sobre “valo- res de seguro” -, vinte e dois quadros de Vermeer dos trinta e cinco existentes esto reunidos em um mesmo lugar de exposigao ou, ainda, quando os fcones de Sinai saem pela primeira vez de seus silenciosos monasté rios e se encontram em plena Manhatam, nas paredes do Metropolitan Museum. E assim que auténticos mo- vimentos de peregrinagdes turisticas e burguesas em direcdo a Haia ou a Nova York encontram seus lugares. aura cultual” justifica que as pessoas - sem racionais em outros lugares ~ fagam sete na neve para ver uma exposigao. Esse movimento de absorgo espetacular do valor de exposicao pelo valor de culto explica, sem diivida, cer- to miimero de tensdes e mesmo de contradigées que pude sentir em Madrid, no momento de preparacao do ‘Atlas’: Em um museu exemplar e audacioso como © Reina Sofia, -m duvidaria que a questao da re- produtibilidade técnica chegaria ao cerne daquilo que podemos nomear de a modernidade do atlas. 0 fato de as pranchas de Warburg nao existirem mais em sua forma original nao diminui em nada sua eficacia mesmo formal ~ quando sao reproduzidas; o fato de a Boite-en-valise de Marcel Duchamp ser um miiltiplo em nada dimi pelo contrério. Mas, em um grande museude arte como © Reina Sofia, nao se poderia levar as coisas to longe: expor uma fotografia, sim, absolutamente ne- cessario encontrar um vintage (foi o caso de Moholy- Nagy, entre outros); expor um manuscrito, sim, mas sera absolutamente necessario o orginal e, portanto, excluir todas as opcdes de fac-simile (foi 0 caso de W. G. Sebald ou, além disso, dos “atlas” de Malevitch cujo empréstimo 0 MoMA recusou). Nao por acaso, lugares menos “cultuais” ~ lugares onde ainda nao ha peregri- nagdo —e mais experimentais como 0 ZKM ou acolecao Falckenberg nao hesitaram, nas duas temporadas su- cessivas daexposigao do “Atlas’; em mostrar o precioso manuscrito de Warburg, de Claude Simon ou de Sebald na forma nao preciosa de suas reproduces em fax mile. Como “tudo que é raro é caro’; conforme o antigo ditado, compreende-se bem que o valor de culto das obras coincidem em grande parte ao valor mercantil, e que 0 deus venerado em toda essa historia se identifica vagamente como sacro-santo mercado da arte, 1i seu “valor” histérico e estético, muito No entanto, Walter Benjamin afirmava sobre a repro- dutibilidade técnica que “sua significagao ultrapassa © dominio da arte’ Desse modo, se quisermos levar a sério a ligao desse grande pensamento, deveremos primeiramente observar que a economia da exposi- sao tende constantemente a reinclutr a reprodutibili- dade técnica no dominio da arte; entao, sera preciso, em segundo lugar, tentar redissociar, no interior desse dominio, o valor de exposigao de seu préprio valor de 7 Tid, p.73, culto, Por exemplo, encontrando for de exposigdes capazes de atravessar ~ ou de subverter a economia cultual-cultural do prestigio, do valor ma- gico-mercantil e da sacralizacao das imagens que nos sao mostradas nos espagos de arte contemporanea. Se, como sugere Benjamin no Ambito mais amplo de uma antropologia politica, “a crise das democracias pode ser compreendida como uma crise das condigoes de exposicao™ (trata-se, antes de tudo, ¢ evidentemente, daexposicao dos homens politicos por si mesmos), no seria urgente buscar incansavelmente ~ pois as formas se desgastam rapidamente, se reintegram - novos for- ‘matos para a exposicao ptiblica das imagens? Uma exposi¢o como “Atlas” convocaria naturalmen- te esse género de reflexio, ja que o atlas de imagens é uma forma ~ ao mesmo tempo forma de conhecimen- to e forma visual ~ que é historicamente inseparavel das condigdes de reprodutibilidade dos elementos que © compoe. Em contrapartida, é logico que, ao viajar, a exposi¢ao perde pouco a pouico seus elementos mais “raros’, mais ““inicos” e mais “caros”: de fato, é dificil fazer viajar por tanto tempo o marmore romano de Sevilha, a escultura tao fragil de Marcel Broodthaers, aobra prima de Alberto Giacometti On ne joue plus ou, ainda, o herbario delicado [herbiers volatils] de Paul Klee’. No entanto, se o atlas de Arthur Rimbaud ~ um objeto muito fragil, quase esfacelado ~ acompanhou a exposicao até o fim é porque provavelmente os conser- vadores do museu-biblioteca de Charleville-Méziéres nao compreenderam a que ponto esse objeto era ex: 5 ibid, p.93. 9 NT: Ohesbarlum do Paul Klew 6 fvadas sobre pranchas para fins de estudos. a caleg depla traordinario exatamente por suas “faltas’, a saber, os cortes que foram produzidos pelo poeta nas pranchas geograficas. Na reta final - nas salas de Hamburgo, em suma, menos “nobres” e mais “industriais” que as de Madrid -, havia entao um pouco mais de fotografias e de obras ligadas a reprodugao em geral, como os tra- balhos de Hanne Darboven, o grande conjunto de Guy Debord ou, ainda, o imenso Walker Evans (uma amplia- (Ao realizada sob seus cuidados e nao uma tiragem no sentido habitual) cujos rostos andnimos pude confron- tar Ando menos grandiosa galeria de homens célebres de Gerhard Richter (esta também apresentada na sua versao fotografica). Enquanto isso, varias instituiges, museolégicas ou nao, ainda me propuseram viajar com esta exposigao. Em especial, soube por intermédio de Stefanie Bau- mann que esse desejo foi expresso por parte de Beirute e do Rio de Janeiro. Mas teria sido impossivel realizar tal projeto na forma de uma itinerdncia classica, de um lado, em fungao dos empréstimos acordados por um tempo limitado, de outro, em fungao do custo finan- ceiro e do espaco requerido para uma exposigao como essa, Ocorreu entao, como que naturalmente ~ quer di- zet, como um prolongamento légico das hipsteses war- burguianas e benjaminianas a partir das quais ‘Atlas” teria sido concebido -, a idéia de por em pratica uma exposigao na época de sua reprodutibilidade técnica: uma exposigo com dimensées variaveis (fossem elas mintisculas), faciln ;portaveis pelo mundo @, sobretudo, com um orgamento acessivel. No mais, trabalhando de Madrid a Karlsruhe e de Karlsruhe a Hamburgo, tomei gosto pela experimentagao - sempre com direito A renovacao - com as escalas da exposicao e com as modificagSes “narrativas” de sua montagem. Ora, trata-se mais uma vez de um prinefpio muito bem esclarecido por Walter Benjamin no seu texto sobre a reprodutibilidade técnica, cuja “epoca” é caracterizada pelo que chama de “perfectibilidade” das configura- Ges das imagens cujas remontagens so sempre pos- siveis, por direito e talvez de fato'* (mas s6 depende de nés transformar esse direito em fato) Enfim, a idéia de uma tal “exposi¢do na época de sua reprodutibilidade técnica” nao me ocorreria abstra- tamente, ela talvez nao tivesse de forma alguma me ocorrido se eu nao tivesse tido, desde o inicio, lembra- do daquele que, melhor que qualquer outro, poderia condwzir tal empreendimento. Trata-se de Arno Gisi get: Eu conheci melhor sua obra fotografica através do Projeto Konstellation: Walter Benjamin en exil!. Es obra além de ser acompanhada de um conhecimen- to profundo e uma ver 10" [prise au mot’)? de algumas grandes ideias benjaminianas, é perfeitamente compativel com as condigdes de traba- Iho - itinerancia, leveza, maneabilidade dos formatos em fungao do lugar de exposigao ~ requeridas por tal Projeto. Arno Gisinger renunciou (que audacia! que sabedo- rial) a tiragem fotografica classica e A sua valorizacao 10 Bid,p.03-BA. 11 Arno Gisinger/ Nathalie Rooux. Konstellation: Walter Ben: jamin en exil,postface de G.Didi- Huberman (Trans Photographic Press-Bucher Verlag, Paris Vienne, 2009) 12 Prendreau motslvara sérfo,m: pegiraspalavme. também, literalmento, estético-mercadolégica, concomitantemente. Definiti- vamente, ndo havera vintage de Gisinger para se co- lecionar devotamente, nenhuma imagem a impor um ndo ultrapasse [nec plus ultra] como um objeto aura- tico. Em suma, nenhum quadro. Embora uma grande qualidade caracterize suas imagens - gro ou pixel, cor, enquadramento -, elas existem antes de tudo no pen drive que carrega no bolso no momento em que chega ao local de uma exposigao, digamos, em Beirute ou no Rio de Janeiro, O valor de exposicao sera entéo, nesse caso, sistematicamente dissociado de todo valor de culto, Ele aprecia 0 espaco onde pretende expor & decide entao o némero, a ordem e, sobretudo, aescala que pode ser muito variével - das suas imagens. Em. seguida da orientagdes ao impressor: Ele colanas pare- des imagens que sao perfeitamente adaptadas, e nao impostas, ao lugar que as acolhe. Quando tudo acaba, tudo destrufdo, nao existira objeto - como os grandes “retabulos” de alguns fotdgrafos célebres, tao pesados em suas molduras envidragadas quanto caros em seu “valor de seguro” ~ para sacralizar Arno Gisinger aceitou enti fotografar a exposi¢ao “Atlas” em sua diltima ver iquela de Hamburgo ~ e fez isso atento a todos os aspectos do trabalho mu- seolégico: as cerca de mil imagens que ele produziu mostram todas as etapas da montagem, da instalagao das obras e da desmontagem da exposicao. E é dentro desse importante corpus que “Atlas, suite” ganha corpo dando acesso As méiltiplas possibilidades de remonta- gem ~ novas aproximagdes e novos contrastes, novas constelacdes e novos esbocos de narrativas ~ que todas essas imagens carregam. Atlas, suite ser, enfim, uma ‘iga0 sem valor de culto (algo que “Atlas’, com sua reunido de obras primas, ainda nao era), realizando assim um desejo inerente & “politica da arte” benjami- niana Mas as coisas sao talver ainda mais complexas. Pois, onde Benjamin se contentava em opor a tela, como “unicidade e duragao’, A reproducao, como “fugacidade € possivel repetigo", Arno Gisinger vai mais longe e redialetiza todos os termos desta oposigao: ao adaptar essas “suites” ou “constelagdes” a cada lugar de exposi- a0, ele faz, da reprodutibilidade técnica uma ferramen- ta de ndo-repetico e mesmo de unicidade, uma vez que cada montagem - do Fresnoy ao Rio e de Beirute a0 Palais de Tokyo ~ seré necessariamente muito dife- rente. Assim, com 0 “jogo de cartas” das imagens, cada um podera em sua propria parede, sua mesa ou solo psiquico [tapis psychique], inventar novas configura- ses, quer dizer, novas significagdes, liberando com isso 0 “inconsciente ético” ao qual Walter Benjamin ‘via, em todas as montagens que se prezem, um acesso privilegiado™. TSW. Benjamin, opsit p. 75-76 (traducio modifcada [pelo autor) Mid, p. 103,

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