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‘MAX WEBER A ETICA PROTESTANTE | EO ESPIRITO DO CAPITALISMO redo de Aaa Fu sss Le Rois tein da Arta Fao a Cora cononngagresenca FICHA TECNICA ‘Tul orginal Die Provstanrische Ethie Aube: Max Weber Tradugdo: Ana FaleZo Bastos « Luts Letido Revisho tenica: Anénio Firmino da Costa Cape: Sector Grifeo de Eitoral Presenga Foinccmposigto: Mulitipo — Artes Gnificas, Lda, Iimpressio e accbamento: Tipografia Guerra — Viseu 3. edigio, Lisboa, 1990 448 edigio, Lisboa, 1996 Dept legal a. 88 859/95 Reservados of dieitot esta etigio b ITORIAL PRESENGA, LDA. ‘Augusto Gil, 35-A” 1000 LISBOA INDICE Nota da revisio tfenica da tradugdo: INTRODUGAO AETICA PROTESTANTE E 0 ESPIRITO DO CAPITALISMO..... 1. O PROBLEMA 1.1, Confissdo e estratifieagao social. 12, 0 «espitito» do cepitalismo .. i 1.3. A concepglo de vocegdo [Beruf] segndo utero. Objectivo da investigagao . 2. A ETICA PROFISSIONAL [BERUFSETHIK] DO PROTESTAN- TISMO ASCETICO .. 2.1. As bases religiosas do ascetismo secular 2.2. Ascetismo e espirito capitalista AS SEITAS PROTESTANTES E O ESP{RITO DO CAPITALISMO.. as 55 88 88 123 196 NOTA DA REVISAO TECNICA DA TRADUCAO ‘A revi téenica destes diflosis textos fi feitaconfrontando a tradugio ¢ 0 original alem#o com as tradugies inglesa (por Talcott Parsons, The Protestani Ethic ond the Spirit of Capitalism, Londres, George Allen & ‘Unwin Lid, 1930, 1978) francesa (por Jacques Chavy, L'Ethique proestan- te et Vesprt du capitalisme, Pais, Ploa, 1964, 1967), italiana (por Piezo Burtesi, L'etica provestante ¢ lo spirito del capitalism, Florenga, Sansoni, 1965, 1970), brasileira (por M. Irene Szmrecsdnyi e Tamds Szmrecsényi, A Biiua Protesiante e © Bepirito do Capitaliomo, 8. Paulo, Livraria Pioneira Editora, Editora Universidade de Brasflis, 1981) ¢ castelhana (por Luis Legaz Lacambre, La ética protestantey el esphito del copitalismo, Bare Jona, Ediciones Peninsula, 1969, 1979). Dada a sua propria natureza e urgéncia, optou-se, nesta revislo, por dar toda a atengo & correcgio técnica da tradusio, mesmo se eventualmente em Getrimento dos aspectos especificament literstis, pelo que a leitura exigié, por veoes, um maior esforgo de deciracio, Hé que ter em conta, a este respeito, a frequente impossibilidade de obter comespondéneias inequivocas entre voodbulos alemies e portagueses. £ 0 caso, entre muitos outros, de Beruf, eujo preciso equivalent semfntico io ‘existe em portugués, c que esté no centro do prdprio objecto abordado, nesta obra, por Max Weber. Normalmente foi radu2ido aqui por «vocagon, por ‘arotisséo>, por «vocasio profssional> ou por «profissio enquanto voct- Glo», conforme os contextos, eatando-se manter compreensiveis os desliza- Imentos ¢ as sobreposigbes de seatido sofidos pela palava, a cujas conot- ges est ligada a tese central dos artigos de Max Weber quanto &imporincia decisiva da wética protestant» na configurapio do wespinito do captalismo>. ‘A inexisteneia em portugués, como nas Ifaguas latinas, de um termo ple- rnamente equivalente a Beruf é (como Weber chatsa a atengéo) algo inti amente ligado 8 propria histria diferencial das formagSes socisis, nomes- damente no que conceme suas préticas religiosas © evonmicas — facto ilustrativo de que numa tradugio deste tipo podem estar, também, implica- dos delicados problemas histérico-sociolégicos. Antonio Firmino da Costa 9 INTRODUCAO O.fitho da moderna civilizagdo europela tratard os problemas da hhist6ria universal tendo em conta, inevitdvel e legitimamente, a se- ‘guinte questdo: que encadeamento particular de circunsténcias levou @ que no Ocidente, e 56 aqui, ienham aparecido fendmenos culturais que — como pelo menos gostamos de pensar — se situaram numa direcgao evolutiva de significado e valor universais? —* S6 no Ocidente existe «ciéncia» num esiddio de desenvolvimento que hoje reconhecemos como . Noutros lugares, sobretudo na {ndia, na China, na Babilénia e no Egipio, também existiram conhecimenios empiricos, reflexdes sobre os problemas do mundo e da vida, wma profinda sabedoria fllosdfica e também teoldgica — embora o pleno desenvolvimento de uma teologia sisiemética seja caractertstico do cristianismo de influéncia helenistica'(s6 no Istao e em algumas seitas indianas encontramos tentativas nesse sentido) conhecimentos e observagées extraordinariamente requintados. Mas & astronomia babilénica, bem como a todas as outras, faltava —0 que ainda toma mais extraordindrio 0 seu desenvolvimento — a fundamentago matemdtica, que 36 08 Gregos Ihe proporcionaram. A geometria indiana faltava a «demonstragdo racional — mais um produto do espirito helentstico, que também, foi 0 primeiro a criar a mecdnica e a fisica. As ciéncias naturais indianas, muito desenvolvi- das no aspecto da observagdo, faltava a experimentagdo racional + apés os primeiros passos da Aniiguidade, essencialmente um pro- e «jor- nais» impressos, ou seja, toda uma literatura destinada a ser impri- rida e 56 possivel através da impressao. R Na China e no Isldo também existiram escolas superiores de todos 08 tipos, algunas delas superficialmente semelhanies &s nossas uni- versidades ou academias. Mas o exereicio racional, sistemético ¢ especializado da ciéncia, um «corpo de especialistas» treinados, 56 no Ocidente existiu, num sentido e importéncia aproximados aos que ossuem na nossa cultura. Isto é sobretudo verdade quanto ao «fun: ciondrio» especializado, pilar do Estado modermo e da modema economia ocidentais. Dele s6 encontramos precursores, mas que em parte alguma se tornaram tdo fundamentais para a ordem social como no Ocidente. E certo que owfunciondrion, ¢ mesmo o funciond- rio especializado, cong um fendmeno ancestral das diversas cul- turas, Mas nenhum viuma época conheceram como 0 Oci- dente a completa dependéncia de toda a sua existéncia das condigdes politicas, técnicas ¢ econémicas da sua vida, de uma organizagdio de ‘funciondrios especializados, funciondrios de Estado de formagio téc- nica, comercial e, sobretudo, juridica, detentores das mais importan- tes fungdes da vida quotidiana da sociedade. A organizagéo dos gru- Pos politicos e sociais em corpos ou estados (Stand] foi amplamente divulgada, Mas a monarquia fundada sobre os estados feudais (Stin- destaat], como rex et regnum no sentido ocidental, s6 foi conhecida na nossa civilizagdo. E, por itp, s6 0 Ocidente criou parlamentos de crepresentantes do povo» |(Nbdicamente eleitos, governo de de: magogos ¢ lideres partidérios, enquanto «ministros» responsdveis erante o parlamento — embora, evidentemente, por todo o mundo tenhain existido «partidos» no sentido de organizagdes para a con- 4quista e influéncia do poder politico. O «Estado», principalmente no Sentido de instizuigdo politica, com uma «Constituigdo» escrita e um direito racionalmente estabelecido, com uma administracdo orienta- da por regras racionais (as «leis»), exercida por funciondrios espe- cializados, sé no Ocidente aparece nesta combinaydo de caracteristi cas decisivas — apesar dos passos dados neste sentido nowtros lugares. fe} E 0 mesmo acomece com a forca mais decisiva da nossa vida ‘moderna: 0 capitalism. sdnstinto de lucro», «sede de ganho», de dinheiro, do maior ganho ‘moneidrio possivel, ndo tém absolutamente nada a ver com o capita- lismo, Esta aspiragdo enconira-se e encontrou-se em criados, médi- 0s, cocheiros, artistas, prostitutas, funciondrios corruptos, soldados, salteadores, cruzados, jogadores, mendigos, em all sorts and condi- tions of men, em todas as épocas e paises do mundo, desde que para 3 ease isso houvesse ou haja possibilidades objectivas. Faz A{7 da inféncia dda hist6ria cultural negar esta definicdo ingénua. UmiSede de ganho ilimitada de modo nenhum é idéntica a capitalismo, ¢ ainda menos ao seu «espirito». O capitalismo pode mesmo ser identificado com a sujei- (iio ou, pelo menos, com um refrear racional deste impulso irracional. Mas é certo que o capitalismo significa @ procura do lucro, de um: lucro sempre renovado, numa empresa capitalista continua e racional; ele é @ procura de «rentabilidaden. E isto ele tem de ser assim. Dentro de uma economia totalmente sui(}da @ ordem capitalisia, una empresa capitalista individual que nao se orientasse segundo os principios da rentabilidade estaria votada ao fracasso. Comecemas por uma definicdo um pouco mais precisa do que tem sido feito até aqui. Designaremos por acgdo econdmica «capitalista» SEE eaguela que se baseia na expectativa de lucro através da wtiligrssp das cxes=possibilidades de troca, ou seja, das possibilidades (formDlente} pacficas de lucro. O ganho obtido pela violencia (formal ou real) obedece a leis especfficas, ndo sendo conveniente (ainda que ndo seja possivel impedi-lo) colocd-lo na mesma categoria da actividade orien tada, em ultima andlise, para o ganho proveniente da troca’, Onde o Iucro capitalista é procurado racionalmente, a acgo correspondente € orientada segundo um cdleulo de capital. Isto significa que este subordinada a uma utilizagdo planificada das prestagBes materiais ou essoais de tal modo que 0 valor final do empreendimento, contabili- zado monetariamente no final de um periodo econémico (ox valor ‘monetrio do activo avaliado periodicamente, no caso de uma activi- dade empresarial continua), deve exceder o «capital», ou seja, o valor dos meias de producdo materiais utilizados para a aquisicdo através da troca. E isto quer se trate de um conjunto de bens in natura dados um caixeiro viajante in comenda, cujo rendimento final pode consis- tir em outras mercadorias in natura adguiridas no comércio, ou de una instalagdo fabril cujo activo, representado por edificios, méqui- nas, reservas em dinheiro, matérias-primas, produtos acabados é semiacabados, se contrapde ao passivo — o essencial é que se possa ‘fazer uma contabitizagao de capital em dinkeiro, seja através de uma ‘contabilidade moderna, seja de wm modo primitivo e superficial. Tudo se faz em termos de-balango: tanto no comeco do empreendimenio (balanco inicial), como antes de qualquer transacgdo isolada (cdl. culo estimativo do lucro provavel), como no controlo e verificagao {céleulo posterior), como ainda no balanco definitivo com vista a estabelecer 0 montante do «lucro». O balanco inicial no caso de 14 mercadorias in comenda é, por exemplo, a fixagdo, por acordo entre partes, do valor em dinkeiro das mercadorias em questo —~ se elas do se apreseniarem j sob a forma de dinkeiro—, e o balango final, a avaliagdo da distribuigao de ganhos e perdas. Desde que as transac: 98es sejam racionais, qualquer acgdo das partes é baseada no cdl: culo. Em qualquer forma de empreendimento capitalista dos nossos dias ainda acontece nao terem lugar wm céleulo e wna estimativa exacta, optando-se por um procedimento puramente estimativo ou simplesmente tradicional e convencional, e isto sempre que as cir- cunstincias no obriguem a um cOmputo exacto. Mas isto sao ques- es que s6 afectam o grau de racionalidade da actividade capitalista, Para o conceito em questdo sé é essencial & acgiio econdmica a tendéncia efectiva em basear-se numa comparacéo do resultado ex- resso em dinheiro com o investimento avaliado igualmente em di- nheiro, por mais primitiva que seja a forma dessa comparagi, Neste sentido houve «capitalismo» e empresas «caplualistas», mesma com uma razodvel racionalizaciio do cdlculo do capital, em todas as civi- lizages do mundo sobre as quais os documentos econdmicos nos permitem ajuizar: na China, na India, na Babildnia, no Egipio, na Antiguidade mediterranica, na Idade Média e na Idade Moderna. Nao s6 operagtes isoladas mas também empreendimentos econdmi- cos inteiramente baseados na permanente renovacdo de operasdes capitalistas, € mesmo wexploragdes» permanentes — se bem que 0 comércio durante bastante tempo ndo tenka assumido o cardcter da nossa actividade continua, mas essencialmente o de uma série de empreendimentos isolados, e s6 progressivamente se tenha introdu- tido uma coeréncia interna (com derpxplvimento de sucursais) na actividade dos «grandes» comercian|(MDe qualquer forma, a em- resa e o empresério capitalistas so antiquissimos e estavam univer- salmente difundides néo sd como fendmenos ocasionais, mas como actividade permanente. No Ocidente, porém, o capitalismo teve uma enorme importincia, comm 0 desenvolvig7rmo de grande diversidade dos tipos, formas € orientagses do caf, gus nse enconran am hone parte. No mundo sempre existiram comerciantes: por grosso ¢ a retalho, locais e internacionais. Tal como sempre existiram emprésti- mos de toda a espécie, bancos com as mais diversas fungées, pelo ‘menos semethantes dqueles que existiam no nosso sécuio XV. Os em- préstimos maritimos, as consignagoes, os negocios e as associagses ‘em comandita tiveram grande extensao, chegando por vews a assu- is lenee Noe! mir uma forma permanente. Sempre que havia crédito para os orga- nismos piblicos surgiam os financiadores, tal como aconteceu na Babilénia, na Grécia, na India, na China ¢ em Roma, sobretudo para 0 fnanciamento das guerras e da pirataria marttima, para forneci- mentos e construgées de toda a espécie, Estes eram empreendedores coloniais na politica ultramarina, plantadores, traficantes de escra- vos ou utilizadores de trabalho forcado, especuladores sobre rendas senhoriais e cargos e, sobretudo, sobre a cobranga de imposios; financiadores de chefes partidérios com o objectivo de ganhar elei- (¢0es € de condottieri nas guerras civis. Tratava-se, efectivamente, de cespeculadores> em todo o género de negdcios que thes permitissem ter lucro. Este tipo de empreendedores, os aventureiros capitalistas, existiram em todo 0 mundo. As suas actividades bancérias eram — com excepgdo do comércio ¢ das operagies de crédito ou ban- cdrias — ou de um cardcter especulativo puramente tradicional ou orientadas para a aquisigdo pela violencia, sobretudo a saque: seja directamente através deseuerra, seja indirectamente, sob a forma do saque fiscal permanent Mravés da exploracdo dos sibditos. O capitalismo dos descobridores, dos colonizadores e cos grandes especuladores ¢ 0 moderno capitalismo financeiro — sobretudo aquele que se orienta particularmente para a exploragdo da guerra — tém ainda hoje aquelas caracteristicas, mesmo nos modernos patses oci- dentais, permanecendo uma parte, embora apenas uma parte, de grande comércio internacional muito préxima desse capitalismo. Mas (0 Ocidente corbece nos tempos modernas ¢ paralelamente uma nove forma de cd Mismo que até entdo nunca se tinha manifestado: ¢ ‘organizagdo racional capitalista (empresarial) do trabalho (formal- mente) livre. Noutros lugares s6 encontramos elementos precursores deste fenémeno, Mesmo a organicagdo do trabalho servil s6 atingiu um certo grau de racionalidade nas plantagdes e, em menor grau, nos ergasteria da Antiguidade e, com ainda menor desenvolvimento, nas terras e nas oficinas senhoriais, bem como nas indistrias domés- ticas dos domtnios utilizando o srabalho servil, nos principios dos tempos modernos. Fora do Ocidente so esporadicamente encontra- ‘mos com trabalho livre «indistrias domésticas». A existéncia de jor- naleiros, que encontramos por toda a parte, s6 esporadicamente le- vou ao aparecimento de manufacturas — especialmente a monopolios estaiais, muito diferentes da moderna organizagdo industrial — ¢ nunca a uma organizagdo racional de aprendizagem dos oficios se melhante @ da nossa Idade Média. 16 A organizagdo racional da empresa orientada para um mercado regular e ndo para oportunidades politicas de especutario irracional ‘do constitui, porém, a tini(( Xanifestagdo peculiar do capitalismo cocidental. A moderna organttfigao racional da empresa capitalista do teria sido possivel sem outros dois importantes factores de desen: volvimento: a separago entre 0 grupo familiar (frpshali] ¢ aem- (3) presa, que hoje domina totalmente a vida econérlA e, em estreita relacdo com ela, a contabilidade racional. A separapdo espacial entre &) 0 local de producdo ou de comercializagdo e 0 domicflio encontra-se também noutros lugares (no bazar oriental e nas ergasteria de outras civilizapdes). Verifica-se igualmente a criagdo de associagdes capita- listas com wma contabilidade prépria tanto na Asia Oriental como no Préximo Oriente e na Antiguidade. Mas, em relacdo & moderna auto- nomia empresarial, trata-se apenas de primeiros passos hesitantes, sobretudo pelo facto de as condigdes indispensdveis desta autonomia, tanto a nossa contabilidade racional como a separagdo jurtdica entre. 0 patrmonio empresarial e o patriménto pessoal, esrarem rralmente ausentes ou $6 s¢ encontrarem numa forma muito radimentar?, Em todos os outros locais, as empresas & procura de lucto tiveram ten- déncia a desenvolver-se como partes de uma casa real ou senhorial («oikos»); desenvolvimento que, como jd Rodbertus reconheceu, em- bora com um parentesco superficial com a economia moderna, é bastante diversa, ou mesmo oposta, a esta tiltima, significado actual destas caracteristicas particulares do capita- lismo ocidental s6 Ihe é, porém, conferido pelo relacionamento com a organizagao capitalista do trabalho. Também aquilo a que costuma- mos chamar «comercializacdg 0 desenvolvimento dos titulos nego- cidveis e a racionalizagao (hpertire consubstanciada pela_ bolsa, the estdo ligados. Com éfeito, sem organizacdo do trabalho | capitalista ¢ racional, tudo isto, na medida em que fosse possivel, | estaria longe de ter a mesma importdncia para a estnutura social e os | problemas modernos ocidentais com ela relacionados. Uin:célculo | exiacto, findamento de tudo 0 resto, 56 & possivel na base do trabalho | lies. E como, ou antes, porque 0 mundo no conheceu, fora do Ocidente moderno, uma organizacdo racional do trabalho, também 1ndo podia conkecer o socialismo racional. Sem ditvida que 0 mundo conheceu a economia urbana, uma politica urbana de abastecimento, 4 politica mercantilista e de prosperidade dos principes, o raciona- mento, a regulagao da economia, 0 proteccionismo e as teorias do laissez-faire (na China); mas conheceu também diversas formas de a economias comunistas e socialistas: comunismo de tipo familiar, mi- litar e religiose, socialismo de Estado (Egipto), monopilio dos car- iéis e organizagdes de consumidores dos mais variados géneros. Mas tal como 0 conceito de «burguesia» e de «burgués» ndo existe sendo no Ocidente modemo — se bem que por todo o lado tenham existido privilégios de mercado para as cidades, grémios, guildas e toda a espécie de distingdes juridicas entre a cidade e 0 campo — assint faltava também o «proletariado» como classe, o que tinka de aconte- ‘cer uma vez que ndo existia a organizagdo racional do trabalho livre. «Lutas de classes» enire credores e devedores, proprietérios e campo- neses sem terra, servos ou rendeiros, entre comerciantes e consumi- dores ou proprietarios fundidrios, sempre existiram em toda a parte; ‘mas jé a luta da Idade Média ocidental entre os trabalhadores ao domicfio e os exploradores do seu trabalho s6 se encontra de wma forma embriondria noutros lugares. Nem existia de modo nenkum a ‘contradigdo entre empresdrios da grande indtistria e trabathadores cassalartados, pelo que nao era possivel uma problematica tal como a conhece 0 socialismo moderno. Numa hist6ria universal da cultura 0 problema ndo reside pois. em iltima instancid(-Npresmo de um ponto de vista puramente econé- mico —, no desenvotérmento da actividade capitalista como tal, dife indo de forma segundo as diferentes civilicagdes: do tipo aventureiro ou comercial, do eapitalismo orientado para a guerra, a politica ou a ‘administragdo ¢ para as suas possibilidades de lucro; mas, pelo contrério, no nascimento de um capitalismo empresacial burgués com 4 sua organizaziio racional do trabalho livre, ou entdio — de um onto de vista da historia da cultura — no nascimento da burguesia ‘cidemtal com as suas caractertsticas préprias, que, se bem que es. teja numa relagdo estreita com o desenvolvimento da organizacao capitalista do trabalho, néo lhe € simplesmente idéntica. Porque , assim como hd nalicagGes da vida econémica, da técnica, do trabalho cient educacdo, da guerra, da pratica juridica e da administragéo. Para além do mais, pode proceder-se a uma «racionalizagdo» de cada um destes campos a partir de pontos de vista e finalidades completa~ ‘mente divergentes 0 que de um [ponto de vista] é «racional» pode, considerado de outro ponto de vista, ser eirracional. Por este mo- tivo surgiram as mais diversas formas de racionalizagdo nos mais dlspares espacos vitals e em todas as dreas culturais, Para caracteri- zar as diferengas historico-culturais torna-se necessdrio saber quais cas esferas e em que direcgdo elas se racionalizaram. A questéo é, pois, de novo a seguinte: reconhecer o cardcter especifico do raciona- lismo ocidental e, dentro deste, as formas do racionalismo ocidental moderno, assim como explicar 0 seu aparecimento. Qualquer tenta- tiva de elucidagto deste tipo deve sobretudo ter em conta, por se reconhecer a importincia fundamental da evunumis, us condiydes econémicas. Mas também ndo se deve deixar de lado a relagdo cau- sal inversa, De facto, se 0 racionalismo econémico esté, na sua origem, dependente da técnica e do direito racionais, também o esté da capacidade ¢ disposicdo dos homens para determinadas formas de conduta pratica ¢ racional. Onde esta estava obstrutda por blo- queios de tipo espiritual, também ao desenvolvimento de uma con- duta econdmica racional se depararam fortes resisténcias internas, Na.passade, os elementos formadores da conduta eram as forcas of "as € religiosas € a idela ética do dever ancorada nessas igas, Sera delas que falaremos a seguir Comegamos por dois estudos mais antigos que se propéem uma aproximagao do aspecto geralmente mais dificil do problema através de uma questo pontual importante: de que maneira certas crengas religiosas determinam o aparecimento de uma «mentalidade econé: riggs, do ethos de uma forma de economia? Tommos, no nosso exemplo, as correlagdes do ethos econémico moderno com a ética racional do protestantismo ascético. 56 teremos, pois, em conta wma das partes do encadeamento causal. Os ensaios posteriores sobre a «ética econémica das religides universais» tentardo — num pano- rama geral das relaroes entre as religides mais importantes ¢ a economia e a estratificacdo social do meio em que surgiram — consi- derar ambas as relagdes causais até onde for necessério para encon- tar pontos de comparagao com o desenvolvimento no Ocidente, que 20 deverd ser ele prbprio analisado. Com efeite, s6 assim poderemos Procurar, com um grau tolerdvel de aproximagéo, wna imputagao causal daqueles elementos da ética econdmica das religides ociden- tais que se apresentam como pertinentes para as contrapor a outras. Estes estudos ndo pretendem, pois, consiruir, nem mesmo de uma forma condensada, andlises culturais completas. Antes acentuam ‘aquilo que em cada espaco cultural esté em contradigio com o desen- volvimento cultural ocidental, Deste modo, estao totalmente orienta dos para tudo 0 que, deste ponto de vista, parece importante para compreender a civilizagdo ocidental. Nenhum outro método, tendo em conta 0 objectivo que nos propomos, nos parece possivel. No entanto, para evitar qualquer mal-entendido reremos de indicar aqui expressamente os limites daguilo que pretendemos. Por outro lado, queremos advertir, pelo menos os néo iniciados, de que néo se deve sobrevalorizar o alcance desta exposigao. O sindlogo, 0 indianista, 0 semitista ou 0 egiptdlogo ndo encontrardo nela factos novos. Mas esperamos que no encontrem nada de essencial que considerem Jalso. Em que medida esse ideal foi atingido por um ro especialista, ‘ndo pode o autor sabé-lo, E evidente que quem recorreu a tradugdes @, além disso, teve de utiligar as fontes arqueolégicas, documentais 0u literdrias da literatura especializada, frequentemente muito con- troversa e, em relacdo & qual, por outro lado, néo esté em condigdes de proceder a um jutzo, tem todos os motivos para considerar modes- tamente 0 valor do seu trabalho, Isto tanto mais que o niimero de tradugdes de «fontes» verdadeiras (isto é, de inscri¢des e documen- tos) é em parte (sobretudo no que toca 2 China) ainda muito reduci- do, Dagui decorre 0 carécter totalmente provisorio destes ensaios, sobretudo na parte referente a Asia‘, S6 0s especialistas poderéo elaborar um juizo definitivo. E s6 porque até agora os especialistas 1nd empreenderam esta tarefa com este objectivo particular e deste onto de vista espectfico & que estes ensaios foram escritos. Eles esto destinados, em maior ou menor medida e num ou noutro sent do, a ficar cultrapassados» a breve prazo, o que, no fim de contas, 60 que sucede com todos os trabalhos cientificos. Mas nao se pode evitar em trabalhos comparativos deste tipo, por mais criticdvel que isso seja, uma irrupgio nowtros dominios; resta-nos, pois, imbuir-nos de uma grande resignagdo ante 0 posstvel resultado deste trabalho. A moda ou o ardor dos homens de letras er8 hoje poder prescindir do especialista ou reduzi-lo ao estado de trabalhador subaliero do svidenter. Quase todas as ciéncias devem qualquer coisa aos dile- a tanies 2, frequentemente, pontos de vista de grande valox Mas 0 diletantismo como principio da ciéncia seria o seu fim. Quem deseja swers que v4 ao cinema; hoje em dia é-lhe, alids, oferecida, também sob forma literdria, uma quantidade de coisas que caem no ambito do nosso problema‘. Nada esta mais afastado dos estudos sérios ¢ rigorosamente empiricos do que este estado de esplrito. E— acres- cento ainda — quem deseja «sermdes» que vd a um conventiculo. Nao diremos aqui uma palavra sobre 0 valor relativo das culturas que comparamos. Que a marcha da humanidade +6 pode assustar aqueles que observam um simples periodo historico, ndo ha ditvida, ‘mas eles fardo bem em guardar para si os seus pequenos comentarios Pessoais, como acontece quando se contempla 0 mar ou as monta- has, a menos que saibam expressar-se de uma forma artistica ou em termos proféticos. Na maior parte dos outros casos, 0 constante re- curso @ «intuigdo» oculta pura € simplesmente uma falta de distan- ciagdo relativamente ao objecto, o que deve ser juleado do mesmo ‘modo que idéntica atitude relativamente aos homens, Cabe agora justificar 0 facto de ndo termos ‘fins que prosseguimos, d investigapdo etnografical(-\}io seria natural que acontecesse. Com efeito, o seu esiédio actual de desenvolvimento tornaria indispensével a sua utiliagdo para uma andlise verdadeira- mente aprofundada, sobreiudo no que se refere as religides asidticas. A explicacdo deve-se nao s6 ao facto de a capacidade humana de trabalho ter os seus limites, mas também a isso nos ter parecido legitimo, uma vez que deviamos ocupar-nos agui das conexdes da tica religiosa das diversas camadas sociais que eram «portadoras da cultura» das respectivas regides. Trata-se de estudar as influén- cias exercidas pelo seu comportamento, Ora, é absolutamente certo que elas $6 podem ser verdadeiramente determinadas € compreendi das, no seu cardcter espectfico, se confrontadas com os factos folel6 remogriial ve ois, ser expressamente afirmado ¢ subli- nhado que existersfai wna lacuna que o einégrafo tem plenas razies para criticar: Espero poder facer alguma coisa para o seu preenchi: mento através de uma andlise sistemdtica da sociologia das religides, ‘mas wn tal empreendimento ultrapassaria 0 quadro deste estudo, que tem objectivos limitados. Por isso ele teve de se contentar com a tentativa de discernir, na medida do posstvel, os pontos de compara- $0 com as nassas religides ocidentais. Consideremos, finalmente, 0 aspecto antropol6gico do problema. Quando encontramos repetidamente no Ocidente, e apenas aqui, certos 2 sorrido, para os tipos de racionalizagtio — mesmo em esferas de conduta (aparen- temente) independentes umas das outras no seu desenvolvimento — somos naturalmente levados a admitir que as qualidades hereditérias constituem a sua base determinante. O autor confessa que se inclina, pessoal e subjectivamente, a atribuir uma grande importincia & hereditariedade bioldgica. No entanto, ‘nao vejo, apesar dos resultados significativos da antropolog! determinar de forma rigorosa, pelo menos aproximadamente, a extensdo ou, acima de tudo, a forma da sua influéncia no processo aqui analisado. Uma das tarefas do trabalho sociolégico e histérico deveria ser, em primeiro lugar, determinar na medida do posstvel todas as influéncias e todos 05 encadeamentos de causas explicdveis por reacgdes ao destino e a0 meio. E 36 depois, e na medida em que a neurologia e a psicologia das ragas tiverem progredido para além da fase rudimentar em que se encontram — alids promissora em muitos aspectos —, poderiamos talvez esperar obier resultados satisfatérios para este problema’. Por agora, pois, parecem-me inexistentes estas condigdes, e a refe~ réncia d «hereditariedade» seria uma reniincia precipitada ao que 0 conkecimento nos pode ja hoje, eventualmente, dar e uma transposi- ¢fo do problema para factores ainda desconhecidos. NoTAs "Aqui, como nostros pontos,divirjo do nosso respeitado mestre Lujo Brentano, 1a sua obra: Die Anfinge des modemen Kapitalismas (Os Primérdios do Capiualismo Modemo), Musique, 1916, sobremdo a0 que se refere 2 temninologia, mas também em questies defacto, Nio ne parece adequado cclocar na mesma categoria coisas Ho hneerogéness como 0 eto proveniente do saque e o ganho que advém da dteegio de uma fébrica, © manos ainda designat toda a aspraso a0 ganho monerio — em ‘oposigdo a obras formas da aquisigb0 — como eespiitos do captalismo, Com efeto, ‘no segundo caso, renunciarfamios a qualquer preciso do conceitoe, no primeito, & possibilidade de fazer ressaltar a specifcidade do capitalismo ocidental relati- ‘Yamente a outas formas. Do mesmo modo, G. Simmel, em Philosophie des Geldes (A Filosofta do Dinheiro 1900, leva demasiado longe a ideaificaglo ene «econo- ‘mia monetérin © Olque me rsa dos meus conbesimentos de hebeu ¢ igalmente insficint « Nio € preciso dizer que no se nserem aqui tentativas coma as de K. Jaspers (0 seu lio Psychologie der Wltanchauungen, 1919) 09 de Ludwig Klages (Prinipion sler Charakterloge, Lepr, 1910) eatudos setelieuen que se disdaguct dos ‘evs guano a0 sen ponte de parid, Nao abe tqui a suadisustfo, 5 Um prestgiado prquiara expriniu-me 0 mesmo pont de vst alguns acs

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