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CAPITULO IL ERA 0 HOMEM UM CACADOR PODEROSO? Que espécie de criaturas eram os nossos primeiros antepassados que habi- ‘asavana africana hd cereade dois milhdes deanos? Onde viviam equal aspecto fisico? S6 recentemente comecdmos a adquirir conhecimentos as criaturasde que descende ohomem moderno. Odesafiometodolégico € aprender algo sobre o seu comportamento constitui por isso também de novo, Penso que as coisas estariam a correr bem para os arquedlogos ‘seus métodos fossem capazes de nos dar a conhecer como era a vida em ‘do remotas. Na realidade, o paleolitico inferior pode ser visto como ‘espécie de terreno de ensaio para os métodos e as téenicas da arqueolo- ‘até que ponto sao capazes de nos transmitir informagdes acerea de um jo tao remoto que se torna dificil imaginé~lo em termos realistas com na experiéncia moderna? Neste capitulo tentarei dar uma ideia da mu- ‘que actualmente se estd a operar no ambiente intelectual em que se sm estas investigagdes, e procurarei sugerir um quadro de referéncia 0 que, penso, se vird a revelar muito proveitoso. ‘O homem como matador: ‘0 ponto de vista de Dart* Hi cerca de sessenta anos, um anatomista sul-africano, Raymond Dart, adar aulas praticas de anatomia sobre os primatas do Plistoeénico. ‘exercicio, Dart pediu aos seus alunos que procurassem nasredondezas /¢ 0850s partidos em que pudessem aplicar osconhecimentos sobre clas- una trouxe informarées sobre 0 /pensava ser um osso interessante. Isto levou a que, passado pouco tempo, alizasse numa pedreira de caledrio perto de Taung, 130 km a norte de ley, na Africa do Sul, uma descoberta de importancia primordial. Dart + Vor Dart, 1958, © LaGros Clark, 1967, pp. 1-40. “ LEWISR. BINFORD ninguém sabia qual a sua antiguidade. Mais do que isso, ninguém fazia sequer ideia de que os nossos antepassados pudessem ter tido aquele aspecto. Penso que Dart estava conveneido, desde o principio, de que o féssil de Taung tinha um lugar importante na drvore ancestral do homem, mas as primeiras descrigdes anatémicas do erénio por sipublicadas levaram muitos anatomis- tas europeus a discordarem da identificagao ea sugerir que se trataria antes de um féssil de chimpanzé ou de outro animal parecido. Dart fez uma viagem a Inglaterra e a outros locais da Europa, trazendo o pequeno féssil consigo para que pudgsse ser examinado pelos especialistas, e dando origem a uma grande controvérsia sobrea questo deele pertenceroundoa linhagem ances- tral do homem. ‘Para Dart, era dbvio que ndohavia nenhuma base anatémica bem assente ‘que permitisse optar num ou noutro sentido: o eranio féssil, com a sua caixa craniana preservada, ora uma coisa extraordinaria, algo de tao diferente que niio havia critérios claros que permitissem decidir se se tratava oundode um homem féssil. Foi em Inglaterra que Dart omegou a mudar a maneira como via o problema. A questo «serd que isto ¢ um homem?» nao podia ser enca- rada apenas em termos anatémicos porque o que havia de mais importante ‘em relagéio ao homem primitivo nao era 0 seu aspecto mas o seu «comporta- mento». «Uma coisa que é exclusiva do homem, pensou ele, «é que se trata do inico primata que come carne regularmente.» Se encontrassemos vestigios claros de actividades predadoras realizadas por primatas, isso por si sé mos- traria que o responsavel por essas actividades no podia deixar de ter sido o homem (ou um seu antepassado), e permitir-nos-ia—partindo de prinefpio de que teriamos a sorte de encontrar os respectivos oss0s —descobrir como ‘era a anatomia do homem primitivo. Do mesmo modo, o homem é 0 nico a fazer e utilizar 0 fogo. Portanto, se fossem encontrados vestigios de fogo em. ‘associagiio com fosseis, isso indicaria a presenga do homem. A mesma légica aplicava-se igualmente ao fabrico de utensflios. Darttambém utilizou outros critérios, mas estes tréseram osmaisimportantes:definiam ohomem em ter- ‘mos comportamentais, nao anatémicos. Este raciocinio levou Dart a empreender um tipo de investigagdio que nao eracorrentena paleoantropologia da época. Até entdo os anatomistastinham tentado conhecer a histéria antiga do homem, investigando factos anatémi- cos, enquanto os arquedlogos 0 faziam através do estudo dos utensilios de pedra. O que Dart queria dizer, efectivamente, era que, do ponte de vista do ‘comportamento, o homem era um ser tinico. Quais seriam os vestigios deixa- dos por esse comportamento tinico? O achado de ossos associados a vestigios de comportamento do tipo esperado devia constituir uma forma de obter ‘conhecimentos sobre o aspecto fisico do homem no passado remoto, que era, final, a questo em debate. Portanto, antes e depois da Segunda Guerra ‘Mundial, Dart estudou eom grande pormenor a enorme quantidade de ossos de animais nao primatas provenientes de varios depésitos da Africa do Sul, ‘especialmente as pedreiras de Makapansgat. Fé-lona esperanga de determi: nar se a criatura responssivel pela acumulagao dos ossos (se é que se trai realmente de restos de comida) era o homem primitivo. Creio que o veredicto histérico sobre este aspecto do trabalho de ‘odeque elesedeixou entusiasmar demasiado. Por exemplo, emd DO PASSADO a os de outra jazida, observou manchas escuras que interpretou como sido produzidas pela ago do fogo, concluindo assim que o homem esti- presente. Consequentemente, a um fossil encontrado mais tarde em kapansgat foi dadoo desajeitado nomedeaustralopithecusprometheus, ou .shomem—macaco meridional utilizador do fogos?, Se (e s6 se) a interpre- das manchas feita por Dart, como sendo lareiras, estivesse correcta, um dos eritérios para o diagnéstico do comportamento humano teria ssatisfeito, tornando possivel sustentara ideia deque os homens-macacos destes dep(sitos eram antepassados do homem. ém, os estudos de Dart sobre os ossos foram mais longe e levaram-no conhecer alguns padres novos einteressantes que até entao nfo tinham ‘assinalados: «os ossos destes depésitos nao estavam representados nas mas frequéncias em que se encontram na anatomia dos animais moder- - A quantidade de ossos que existe no esqueleto de um antflope ou de um evidentemente, algo que se encontra estabelecido de forma incontro- im conjunto de posigdes, e verificar se ele é como deveria ser se fosse constituido por esque- completos, no modificados, de animais. Quando Dart confrontou os encontrados nos seus depdsitos com este modelo, descobriu que os es observados ndo correspondiam de forma alguma &s expectativas: iam muitos fragmentos de erdnios, mandibulas e membros inferiores, rmuito menos costelas, vértebras e bacias. Como se podia explicara obser- le padres deste tipo? ‘Utilizando o mais importante dos recursos humanos —a sua imagina;ao Dart supés que a raziio de ser destas difereneas nas frequéncias dos 0380s encontrasse no facto de algum antepassado do homem ter cagado e abati- os animais longe do sitio onde vivia. Algumas partes anatémicas teriam do deixadas no local de abate, outras trazidas para consumo e, mais signi- ive ainda, alguns ossos teriam sido trazidos para o acampamento para em transformados em utensflios. Isto representa um modelo completa- nte diferente do passado, uma nogao nova dohomem! Seocendrio que Dart * Dart, 1925, 1948. 0 racioefnio de Dart baseava-ve nos melhores dados de que na 6poce dispor, ox quais pareciam indicar quo alguns dos oasos da podreira de Makapan haviam si. mados. Quando foram encontrados fossois de australopithecus om Makapansgat, Dart 1 08 achados tirowa conclusio de que os australopithecus usavam ofogoe, portant, m verdadeiros homens. Para uma boa revise da invostigagio subsoquente veja-se Oakley, 1961, * Dart, 1926, Dart defendeu desde o p iro momento que oaustralopitheeus inicialmente cobertaem Tauingera capador¢, portanto tinha sidoo agente responsavel pela acumalagao joutros oso af encontrados, acumulagdo essa que cle considerava ma lixcira. Aabserva- de acturas om crnios de bebuinesdesempenhow ui pape fandamental nese earacto ‘em Dart, 1949, que pela primeira vez sw afirma ques ossos de animais recolhidos nos pésitos que continham fouses de australapichecus constituiam utensiios. Esta argument p sobre os hibitos de uso fabric de utensilios do australopithecus viria ninda a ter desem- imentos posteriores, Dart, 1967, 1960. Para pontos de vista mais recentes ver Wolberg, 0,¢ Binford, 1981-8, . 2. —uB este o nosso patrimdnio? Cagadores da transigao entre o Plioeénico ¢ 0 Plistocs- eee ee ners de comida como ossos (para mais tarde uiensilios) no regressoa um sacampamento-ba- ‘ses situado numa gruta ou fissura da rocha. Este cendrio implica uma rigorosa divisdo de tra- iesaeriececpentane et eeeeeee mee Seen nae ec nesieeiness jimaginou estava correcto, entdo o homem desta época to antiga comporta- vase tal qual como nés, Cagava (por vezes de maneira particularmente vio- lenta), tinha um acampamento-base permanente, dormia semprene mesmo ‘sitio, trazia a comida para o sitio onde dormia, e vivia numa espécie de casas: tudo comportamentos que so caracteristicos do homem e muito diferentes dos dos outros primatas. A combinago da observacdo com a imaginagio dé assim origem a uma imagem que nfo é apenas ade uma forma muito antiga e ancestral dohomem, mas a desses antepassados como cagadores poderosos e «matadores comprovados»': Osantepassados do homem(...]apanhavamas presascom violéncia, espancavam-nas até a morte, rasgavam os corpos partidos e desmem- bravam-nas, satisfazendo a sua sede rapace com o sangue quente das. vitimas e devorando famintamente a carne em convulsdo*. Dart, 1958. ‘Dart, 1967, p. 85. {BUSCA DO PASSADO # ‘Havia outra fonte de variagao do material ésseo que parecia apoiar esta ar- sntagio. Dart pensava que seria natural que o homem fizesse experién- com 08 objectos que tinha mais A mao, e se na realidade estes nossos mnos antepassados predadores eapavam para assegurar a sua subsistén- ‘entiio 08 objectos com que mais provavelmente teriam comegado a expe- tar seriam precisamente os 08808 das presas. Para Dart, tinha sentido 0s primeiros utensilios tivessem sido clavas, cac 1¢ 08 0880s dos animais tam propriedades naturais que podem ser ut . Uma mangibula de antflope pode ser usada como serra sem quaisquer 15es e os densos ossos longos dos seus membros anteriores dao bons pu- ‘quando partidos, visto tenderem a produzir fracturas em espiral com "idades agugadas. Nao é evidente que os nossos antepassados primiti- , esses cagadores poderosos, néo podiam deixar de ter utilizado esses os- ‘como utensflios? Dividas sobre Dart Opanoramainterpretativo acima esbopado surgiu na bibliografia durante ‘es anos 50", embora nao tenha sido, nessa época, objecto de uma ampla divul- ‘gard. O homem que em grande parte foi responsdvel pela sua disseminagio ‘epopularizacio oi oescritor Robert Ardrey, que adoptou as ideias de Dart de- pois de uma viagem a Africa. O seu primeiro livro, African Genesis, em que os ‘nossos antepassados primitivos eram apresentados como matadores sangui- “nérios, tornou-se um best seller e foi traduzido em varias linguas". Este mo- elo do passado remoto também agradou a psicdlogos como Konrad Lonrenz, ‘eujo trabalho sobre a agressdo na espécie humana gozava por essa altura de grande influénciat, No entanto, muitas pessoas duvidavam do modelo de com- ‘portamento passado proposto por Dart, mas a investigaeao necessérii avaliagiio sé muito mais tarde foi realizada. Como ja mencionei, o desenvol- ‘yimento da ideia que fazemos do homem primitivo é um fenémeno contempo- rrineo, produto dos nossos tempos. ‘As primeiras discordancias com as ideias de Dart vieram —como seria de esperar — dos especialistas em antropologia fisiea. Como ¢ que —pergunta- ‘yam —um pequeno animal como o australopithecus, que pesava apenas 40 ‘kg, podia ter sido um cagador poderoso capaz de acumular todos 08 ossos que Darttinha vindoa estudar? Por que nfopodia ter havido outro agente respon- ‘sdvel por essa acumulacao? Um trabalho publicado em 1957? sugeria que 0 australopithecus era o cagado e nao o cagador, tendo servido de refeigfio & hie- namalhada africana, acuja acgéo, e nioachomem, se devia atribuir a acumu- Jagao dos oss0s. * Dart, 1926, 1949, 1967, 1960. 1 Ardrey, 1961. Lorenz, 1966. * Washburn, 1957. 2 LEWIS. BINFORD Esta era realmente uma ideia interessante, que desencadeou investiga- ges que se vieram a revelar muito proveitosas. A validade da argumentagao, Segundo a qual os oss0s tinham sido acumulados pelas hienas, podia ser fa mente avaliada verificando se na actualidade as hienas tinham efectiva mente esse comportamento, Deste modo, A. R. Hughes, um colega de Dart, feseavou valas num depésito formado por hienas, perto do Parque Nacional Kruger, na Africa do Sul, mas ndo encontrou ossos (a ndo ser os de uma tar- taruga), oque olevou a concluir que as hienas «ndo» acumulavam ossose que ‘uma explicagao deste tipo ndo constituia uma objeccao valida a hipstese de Dart", Por outro lado, existia uma grande quantidade de bibliografia paleon- tolégica sindicandoo contrario. Na Gré—Bretanha, por exemplo, muitos estra- tos em estagdes plistocénicas tinham sido interpretados como camadas ‘acumuladas por hienas. Atéos generais romanos se tinham queixadodas hie- znas, que desenterravam os corpos dos soldados eos comiam". Alguns dos opo- sitores de Dart consideravam que trabalho de Hughes nao era suficiente pa- raresolver definitivamente a questioa favor de umaou outra dasposigesem confronto, Por isso, comegaram a recolher dados sobre o comportamento das hhienas e de outros animais", Tornou-se cada vez mais claro que, sob certas condigdes (e, mesmo assim, nem sempre), as hienas «de facto» acumulavam ‘ossos, mais frequentemente nocaso da espéciemalhadadoque no caso da.cas- tanha, Osseus comportamentos variavam em fungio das situagdes concretas (por exemplo, se enfrentavam ou ndo uma concorréncia feroz.da parte dos Jedes). Ashienas, os leopardos e os leses fazem coisas diferentes com os ossos consoante as cireunstdncias. Como é dbvio, tornava—se necessiirio conhecer estes animais de forma mais aprofundada para que fosse possivel compreen- der até que ponto podiam ter tido influéncia na formagao de depésitos conten- do igualmente vestigios do préprio homem. ‘Aimagem publica do arquedlogo nao ¢ propriamente ade uma pessoa que vai para 0 campo observar o comportamento das hienas. Mas a maioria dos trabalhos importantes sobre o comportamento dos animais com inicio em finais dos anos 50 foi, de facto, feita por arquedlogos. A sua propria investiga- gio tinha-os confrontado com o seguinte problema: quaisos processos dopas- Sado que conduziram & formago dos depdsitos arqueoldgicos que existem hoje? E claro que jé existiam observagdes arqueoldgicas, e que jé tinham sido identificados padrdes no registo arqueolégico que insinuavam quais as regu- Jaridados causais que Ihe poderiam ter dado origem. Usando a imaginagao, era até possivel sugerir quais teriam sidoalgumas dessas regularidades. Mas do existia nenhum método para avaliar estas ideias, Foi séhd cerca deduas décadas que a arqueclogia entrou, tanto em Afriea como no resto do mundo, numa era muito diferente, em que a investigagdo passou a ser orientada pa- ta‘a deseoberta de téenicas que permitissem testar as ideias sobre o passado”. Hughes, 1954, ‘8 Dart, 1956 discuto aa descrigdes cldasicas sobre o comportamento das hienas, ™ Dare, 1958. © Vineoat, 1978. 3 Locais importantes Investigacso sobre 08 hominideos primitives X eet Koos Fora. t t Ouowvar Gongs +B Koses: Horren Nossos, Rvee, Exauneronren Rig. 3.—Distribuipo geogréfica de algumas jazidas africanas imporlantes para o estudo ‘do processo de homini2apa0. Aalternativa de Leakey ‘Na mesma época em que se deu a emergéncia destes interesses metodol6- ¢gicos de novo tipo, outro homem comegou a fazer descobertas importantes ¢ eruciais para a nossa compreensdo do comportamento dos primeiros homin- deos. Durante mais de trinta anos de trabalho, e apesar do seu enorme dis- péndio de energia e do grande interesse que tinha pelos hominideos primiti- ‘os, Louis Leakey ndo encontrou nenbum féetl importante, Fer prospecyo extensiva nagargantade Olduvai, na Africa oriental, durante os anos 30;exa- ‘minou vastas dreas da importante jazida do Paleolitico Médio de Olorgesai- lie nos anos 40, utilizando prisioneiros de guerraitalianos como mao-de-obra adicional; e depois da guerra relangou o trabalho de prospecgilo, sempre com ‘ogrande sonho de descobrir fosseis que nos informassem de maneira signifi- cativa sobre a natureza da evolugdo humana. sonho realizou-se em 1959, quando a sua esposa, Mary, descobriu um pedago de osso facetado que estava exposto em depésitos muito antigos de 2 LEWIS R. BINFORD Olduvai, nelereconhecendo a arcada dentéria de uma.criaturade tipo huma- no jazendo em posigsio invertida'*.O depésito foi imediatamente escavado, ¢ 0 fossil veio a revelar—se como o extraordindrio erdnio a que Leakey deu 0 nome de zinjanthropus, Desde 0 momento da sua descoberta que se tornou evidente que este cranio tinha pertencido a uma criatura muito diferente das que Dart havia inicialmente descrito. Estas ultimas eram relativamente pequenas e graceis, com mandfbulas de tamanho moderado. Mas a mandibu- Iadoexemplar encontrado por Leakey era algo que merecia ser visto: a super- ficie do terceirosnolar era quase do tamanho de uma moeda americana de 25 ‘éntimos ou de 2 penee ingleses. Os miisculos da mandibula deviam ser enor- mes, porque ndohavia espago suficiente no cranio paraos fixar a todos, oque tornou necessdrio o desenvolvimento de uma crista éssea, conhecida como a crista sagital, para permitir a realizagéo de ligagées adicionais—tal como no erdnio de um efi. Neste aspecto, como em muitos outros, ozinjanthropus no era nada parecido com o homem moderno; mas parecia claro que tinha pos: tara erecta, que era bipede, e que tinha uma grande caixa craniana. A desco- Fig. 4.— Vista da garganta de Olduoai na zona da primeira fatha geoligica. (Fotografia ce- dda por Diane Gifford.) Leakey, 1979, b © s a {BUSCA DO PASSADO 38 deste «australopitecineo robusto» feita pelos Leakey em Olduvai veio ;plicar ainda mais as j4 complexas polémicas sobre anatomia, Formas Ihantes tinham sido encontradas anteriormente na Africa do Sul, mas ‘sua cronologia ndo era segura, Seriam formas ancestrais uma da outra ou iam aproximadamente contempordnea: Contudo, oimportanteera que ocranioféssil dozinjanthropus estava num ito onde existiam auténticos utensilios de pedra. Mas, ao contrério dos jios» em osso de Dart, neste caso ndo era necessério recorrer a imagi- para os vigualizar. Os arqueélogos jd tinham critérios bem definidos reconhecerém utensilios de pedra feitos pela mao do homem, e a maio- fa das pessoas qualificadas concordava que as pedras encontradasno depési- ‘que continha o erdinio de zinj eram realmente utensilios. Deste modo, nao erin pir em eanss que pelo menos, um dos eitéros de Dart tinha sido isfeito, Esta era, portanto, uma oportunidade para ver se a ideia de Dart sobre 0 em como cagador poderoso» estava correcta, uma vez que os depésitos 1am no s6 hominideos associados a utensflios de pedra, mas também ‘ossos de outras criaturas. Em 1959, nas primeiras noticias distribuidas aos rgaos de comunicagao social, Leakey anunciou que osoutros vestigios encon- ‘trados no depdsito eram ossos de pequenos passaros, de tartarugas e de suf- deos muito jovens, e ovos de passaros™. A ideia dada era ade que ohomem pri- ‘mitivo teria sido essencialmente vegetarian, mas um vegetariano que come- ‘ria carne se a oportunidade se Ihe deparasse. Se, por acaso, encontrasse um nninho de passaros, roubava os ovos; se pisasse um lagarto provavelmente comia-o; se encontrasse uma porea com crias provavelmente roubava~as. No comentario de Washburn e Howell: A descoberta extraordindria recentemente feita na garganta de Ol- duvai clarificou algumas [...] questées importantes sobre 0 comporta- mento dos australopitecineos. Ela fornece testemunhos claros de que estes hominideos primitivos eram de alguma forma carnivorose preda- dores, acrescentandocarne, principalmente de pequenos animaisoude juvenis de algumas espécies, & sua dieta basicamente vegetal. E muito improvavel que os primeiros australopitecineos, de pequena estatura, matassem muita caga, mas as formas maiores que os substitufram jé podiam provavelmente enfrentar-se com animais pequenos ou imatu- ros. Nao hé quaisquer vestigios que indiquem que estas criatura: fossem predadoras dos grandes mamiferos herbivoros tao caracteri 0s do plistocénico afrieano™, Esta interpretagiiobaseava-se, no entanto, nos resultados deumaescava- 40 de apenas 4 m por 6 m! Tendo em conta o grande interesse da descober- ta, a National Geographic Society decidiu atribuir um subsfdio considerével, 1 Esta interpretagdo foi muito divulgada na imprensa da 6peca, mas nunca conseguiencon- ‘rar uma transerigdo do que ofectivamenta foi dito na coaferdncia de imprensa. ‘Washburn ¢ Howell, 1960, p.40. * ‘LEWIS R.BINFORD a longo prazo, para o trabalho de Leakey na garganta de Olduvai. Foi aber- ta uma Grea muito maior em torno da pequena escavaeao inicialmente feita neste local (conhecido como FLK 22", Ograu de preservagao dos vestigios era extraordinério: até pequenos roedores, insectos e moldes de insectos foram encontrados. Mas 0 aspecto mais surpreendente (tendo em conta os anterio- res comentarios de Leakey) era a quantidade e a variedade das espécies e contradas num espago tao limitado. Numa zona encontraram-se os ossos de um okapi (uma forma plistocénica de girafa), noutra area restos fragmenta. dos de um porco plistocénico, de cavalo, e de uma variedade de antdlope afri- ano, Tambérf apareeeram restos de animaisexéticos: crdniosde peixe-gato, roedores, camaleges, ossos de tartaruga. Na realidade, no final das escava- ges, 0 inventdrio dos grandes mamiferos incluia muitas espécies diferentes. Lembrava um pouco uma daquelas magnificas imagens vitorianasdohomem com todos os animais no Jardim do Paraiso. ‘Comegou entéo a parecer que os dados destas escavagdes apoiavam real- ‘mente o ponto de vista de Dart sobre ohomem primitivo. Parecia evidente que um cendrio em que se incluiam: lores suficientemente bons para lidarem com eavalos, grandes antflopes, okapis e outros animais no era compativel comas primeiras nodes de Leakey, queeram as deum ser vegetarianoe timi- do que chupava ovos de passaros e pedia desculpa por ter pisado os lagartos! O material de Olduvai parecia ser suficientemente definido. A maioria dos investigadores estava predisposta a acreditar que nas associagdes entre ossos e utensilios se podiam ver «locais de habitat» gerados pela acedo dos primei- 1ominideos. No sitio FLK NN3, por exemplo, parecia quase certo que Lea- key tinha deparado com um solo antigo cuja superficie original ndo tinha sido grandemente modificada: restos intactos de algumas tartarugas tinham com feito sido enontrados no solo, com os ossos em posigio anatémica aproxima- damente correcta. Perto das tartarugas encontraram-se as vértebras e cos- telas in situ de um antilope africano rodeado de utensflios de pedra. Apesar de se pensar que nalguns sitios as ‘no seriam assim téo simples, mui- tas jazidas em que se verificava a associagao entre ossos e utensflios de pedra foram aceites como solos de habitat. Dado que 0 conteuido destas jazidas era atribuivel a acyéo dos hominideos, a visio dohomem como ca¢ador nao podia, pois, sercontrariada por estes vest gios, que, aparentemente, eram evidentes por si préprios, No sitio FLK, por exemplo, Mary Leakey escavou um nivel que continha restos de dinotherium. Este estranho animal do plistocénice ti- nha dentes do tamanho de presas de elefante, que saiam da sua mandibula inferior com uma disposigdo que lembra a de uma pi carregadora e que uti- lizava para revolver os fundos pantanosos a procura de plantas para comer. ‘Um destes grandes animaisjazia parcialmente desarticulado no solo de FLK, junto & careaga estavam utensilios de pedra que nio ofereciam davidas. A oposi¢ao a ideia do homem como cagador poderoso foi compreensivelmente reduzida ao siléncio. ® Leakey, 1959-2, 1959-6, 1960. ™ Leakey, 1971, particularmente pp. 49-58 o fig. 24, {BUSCA DO PASSADO s Infelizmente, Louis Leakey morreu em 1972, durante uma campanha de ago de fundos para prosseguir as escava¢des; o seu trabalho tem sido wuado noutros locais pela sua esposa Mary e pelo filho Richard. No to, os vestigios encontrados por Leakey em Olduvai constituem os ali- sem que se apoiam as nodes mais comuns e orrentes sobre a natureza \comportamento dos primeiros hominideos, as que se podem encontrar em todos os manuaisescolares da actualidade. E verdade que nunea foram itrados vestigios de fogo em qualquer dos depésitos do olduvense (os aantigos de Olguvaiate agora estudados, nem os depésitos com utensiflios ;pedra continhain exemplos dbvios dos tipos de utensilios em osso que Dart ia imaginado. A auséncia de testemunhos relacionados com dois dos cri- de Dart permitia, portanto, que fossem postos em causa os argumentos ngados a esse respeito. Mas, para muitos, a hist6ria contada pelos de pedra e pela fauna pareceu inequivoea. ‘A nova ortodoxia esta bem representada nos muitos trabalhos de Glynn um dos mais proeminentes africanistas contemporaneos". A imagem pasado que nos oferece est expressa de forma muito viva no seguinte rafo: : ‘Se um observador pudesse ser transportado através do tempo L..J, ‘oque veria? [...] Ao longe, através da planicie, um grupo de quatro ou. cinco homens aproximase|... Amedida que o grupo se vai aproximan- do, o observador apercebe-se de outros primatas por baixo dele. Algu- ‘mascriaturas encontram—se estendidas na areia, & sombradeuma ar- vore, enquanto os jovens brincam & sua volta. A medida que os homens se aproximam estas criaturas levantam-se e torna-se claro que so bipedes. Parecem ser femeas, e gritam com grande excitagdo enquan- to alguns jovens correm a juntar-se ao grupo que chega (...] O objecto transportado é uma carcaca de impala a volta da qual 0 grupo se retine com grande excitagdo. H empurrées e atropelos, zan- gas e ameagas, Depois, um dos grandes machos retira dois objectos de uma pilha situada junto de uma érvore, Ouve-se um som forte quando ele se pie de eécoras e bate os objectos um contra o outro varias vezes. Asoutraseriaturasandam deumlado para outro aprocura das peque- nas esquirolas cortantes que se destacaram das pedras. Quando ja ha varias lascas no cho, a seus pés, o homem larga os dois blocos e esco- The duas ou trés. Voltando para a careaca, o macho que dirige o grupo ‘comesa a fazer incisdes [...] eada macho adulto fica com um bocado da careaca.e retira—se para um canto da clareira, seguidoporumaouduas fémeas e jovens que se juntam a sua volta. Estéo sentados a mastigar ea cortar acarne em bocados, mudando de mao de vez em quando. ‘Um dos machos levanta—se, estica os bracos, coca 0s sovacos e volta soe Meee aaevoreetrntyr sale tore @ etter Par gal. nas, 101, 105, 2976-b, 176 c, 2078, Ua dicussiomaiscentraa na questi docan- de carne pode ser eneontrada em Isaac e Crader, 1981. Pp. 483-485, Fig. 5. E 0 Plistocinico.» Um sbandovestreitamente unido de hominideos primitivos é aqui representado. tha da comida entre os adultos estd represen ada pelo pardadireita;aaprendizagem do de wlensilio ésugerido pelos adultaae pela cria sentadios hesquerda. O grupo reage com curiosidaded chegada decdoismachos que regressam da busca de comida. Que trazem no regres: {90 a0 sacampamento-base» — plantas ou carne de animais cagados ou f4 mortos? (Desenho a opis etinta de Tea Blan Morris.) Apoiando-se na interpretagéo geralmente aceite das jazidas plistocénicas relevantes para o efeito, Isaac argumentou que ja hd cerca de 2 milhdes de anos o homem era um cagador que trazia os produtos da caca parao sitio onde dormia, de forma a serem partilhados tanto com os machos como com as. femeas (dado que vivia em grupos familiares com uma divisdo sexual do trabalho). Em resumo, aideia é a de que jd existiam vérios tipos de caracte- risticas essencialmente humanas, formando uma espécie de reportério com- portamental, desde uma fase surpreendemente remota da evolupgodoshomi- nideos. B, porém, inteiramente razoavel que se ponhaa questdode saber eomo 6 que a imagem cheia de vida apresentada por Isaac foi inferida a partir dos depésitos desta tao remota época. Aabordagem de Brain As descobertas feitas na garganta de Olduvai calaram, efectivamente, muitos membros da comunidade cientifica que até entdo se haviam manifes- tado descontentes com as concepeées de Dart sobre a natureza dos nossos pri- ISCA DO PASSADO ” antepassados, Durante varios anos reinou um siléncio desconfortvel ‘controvérsia sobre o conceito do «cacador poderoso». Mas, actualmente, escavagdes e investigacdes metodolégicas realizadas em Africa e nou- Jocais do mundo deram origem a um novo modelo interpretative que, na ‘opinifio, deveria constituir a base para uma andlise mais realista des- ‘primeiros materiais arqueoldgicos. O arranque do proceso de formagio novo ponto de vista remonta ao trabalho inovador iniciado nos anos 60 sul-africano C. K. Brain’. trabalho inicial de Brain foi realizado em depésitos da Africa do Sul Ihantes aos que Dart utilizou para fundamentar os seus argumentos 50- ‘a caga e 0 uso de utensilios de oss0 pelos australopitecineos. Faltava—me, n efeito, referir que hé outras jazidas importantes na Africa do Sul que ham dado fauna em associagfio com restos de australopitecineos. Um dos tigadores que dirigiram as pesquisas feitasnositiode Sterkfonteineem tros sitios situados na mesma drea foi R. Broom que, com G. Schepers, era ‘opinido que as acumulag6es de oss0s das jazidassul-africanas tinham, pro- Fig. 6.—A eseavagdo de Glynn Isaac no stio do hipopétamo de Koobi Fora (Ful). (Foto- ofia cedida por Diane Gifford.) 2 Brain, 1961, 60 principal rerumo de todo o seu trabalho e deve ser consultado por todas ‘as pessoas que se interessem pelas questses aqui discutidas. s LEWIS. BINFORD Fig. 7. —C. K: Brain (6 direita)estudando os ossos escavados em Swarthrans. (Agosto de 1981) vavelmente, resultado da acpo das hienas, ¢ nao podiam ser interpretadas ‘como testemunhos do seu uso como lugares de habitat ou acampamentos-ba- se de um homem primitivo de comportamento altamente «predador». Narea- lidade, o ponto de vista partilhado por muitos investigadores eminentes” até A descoberta de Leakey (a deseoberta de utensflios no solo de zinj era que os materiais das jazidas da Africa do Sul deviam talvez ser atribuidos quer & ‘acpéio de outros animais quer a um comportamento neer6fago dos nossos pri- ® Ver Washburn, 1967, o Bartholomew e Birdsell, 1953. As primeiras interpretaptes de arte deoutros autores foram infTuenciadas pela associagifatinisticarepresentadaem Tatung thos, ovos de péssaros, pequenos roedores, babuinos, hominideos). Bates dados nio pare ndicar a acgdo das hienas ou de outros grandes carnivoros. Robert Broom (1993, p. 131), porexemplo, escreveu: «Do estudo da brocha 6ssoa associada ao cranio do Tating podemos ex: ‘air algumasidoias acores dos habitos doaustralopithecus|..|Estou de acordocom acaracte- ‘zap feita por Dart segundo a qual se trata de uma lieira do australopithecus constitafda essencialmente por ossos de uma forma extinta de coelho, Os crdnios esto tod partidos, frequentemente em pequenosfragmontos, Quemcomeuestes ‘do um grande carnfvoro, como o leopardo ob o chacal, os quais tariam mastiga cranios{..J Além disso, hd também multos erinios de babuino, partidos como. tra tivesse querido chegar & mioleira...» Esta visio do homem primitive fol scndo gradualmente aceite e dominou a bibliografia até av ineio dos anos 50. Pensava-se quo cos sitios correspondiam a lixeiras do australopithecus, © ‘qual seriaum predador menor, apanhando apenas pequenos animals, ovosde passa ote, Veja- D0 PASSADO ey esantepassados), Os achados de Leakey pareciam serineompativeiscom ideias. ‘Oproblema inicial a que Brain se dedicou foi ode saber como se tinham for- do estes depésitos durante tanto tempo estudadospor Dart. Quaisos «pro- #3508 de formaséio» que se haviam dado? Os restos dos primeiros hominideos 1am sido encontrados esporadicamente em densas bolsas de ossos de ani- Brain pensava, e com muita razo, que a compreensdo das condigées deram origem a formagéo dos depdsitos podia dar mais consisténcia & pretapdio do seu conterido. No entanto, as suas primeiras observagées a respeito muito pouco a ver com 0 problema em si mesmo. Repa- numa earacteristica interessante da paisagem que circundava algumas jazidas sul-afrieanas que conhecia: era uma paisagem clissica de sava- ‘com arbustos baixos, por vezes passando gradualmente a formagées de desértico; mas as drvores, em vez de serem baixas e dispersas como nor- imente acontece, encontravam-se juntas e chegavam a atingir um tama- o consideravel. Brain descobriu que a causa deste fendmeno era de natu- za geoldgica. A dissolugao dos espessos depésitos de caledrio resultara na jagfio de emaras no interior das rochas, nas quais se acumulavam tan- ‘as dguas de escorréncia como as provenientes da pereolaggo das éguas iciais. Parecia, portanto, ébvio ser a existéncia deste recurso que per- © desenvolvimento de arvores grandes num ambiente que é de modo al muito seco. Foi assim que alguns investigadores, entre os quais Brain, jaram a pensar se, em vez de grutas ou abrigos facilmente acessiveis, as 's investigadas por Dart no seriam pocos fundos para onde os ossos im sido arrastados pelas dguas ou na base dos quais se tinham acumu- do 08 restos de animais vivos que neles tinham eaido acidentalmente. ‘No inicio do seu trabalho, Brain ligou esta observagio a outra: 0s leopar- tinham tendéncia para levarem as suas presas para o topo das arvores do se sentiam ameagados por outros predadores®. Este comportamento ra-se ao facto de o leopardo ter tendéncia para fazer 0 seu covil em abri: ou fissuras na rocha (especialmente quando as fémeas tém crias), ¢ foi conhecido pelo préprio Dart comoum dos agentes que poderia ter contribui- ypara a formagao destes depésitos™, Mas, em termos de processos de forma- o, seria esta informagdio suficiente para criar uma imagem convincente do ido? Certamente que nao. Antes de poder avangar argumentos inter- Oakley, 1953, por exemplo. Mas assim que comegou a encontrar em Maka} ‘uma fae diferente, om que predominavam os antilopes, Dart comogou também a defender que o mo- )de vida do homem primitivo se baseava afinal numa eaga muito mais activa, Aqueles que t- m aceite as posigdes anteriores, bascadas nos dados de Tatung, viram estes novos dados o- incompativeis eas interpretapées de Dart como extremas, Do mesmo modo, aqucles que se tiam repelidos pela ideia deos nossos antepassados torem sido matadores sanguinérios rea também contra interpretaciadada por Dar-ao material de Makapansgat. Visto que es- -material continha uma fauna mais robusta, os argumentos que favoreciam 8 cpio dos gran- .carnivoros como sendooagente responsavel pela acumulagdodos ossospareclam agora mais ‘préximos da realidade, ‘Brain, 1968. % Dart, 1959, p. 121. wo LEWISR, BINFORD Fig. 8. —Vista das eseavagéesem Swarthrans, lhando em direcqéo. Sterkfontein. (Agosto de 1981.) Notem-ce, d esquerda, as droores que crescem Junto ds fissuras no calodrio, pretativos, Brain precisava de observagdespertinentes e pormenorizadasres- peitantes & histéria natural, pelo que 0 passo seguinte era, obviamente, o de estudar ocomportamento dos leopardos. O que descobriu foi que, em situagdo de confronto directo, a maior parte dos predadores carnivoros de Africa podia facilmente levar a melhor sobre o leopardo. Este ultimo adaptou-se a esta situago mediante orecurso.o sistema de arrastar a presa para otopodeuma Arvore, de forma a por-se a salvo dos seus concorrentes (especialmente das hienas). A presa é estendida sobre um ramo da drvore, com as pernas pendu- radas para ambos os lados, e & medida que o leopardo comega a consumi-la, a partir do eixo central do dorso, vao caindo pedacos para o cho. O leopardo é, aparentemente, o unico dos predadores africanos que tem este tipo de com- portamento. (Os estudos comparativos de ossos resultantes da aero dos leopardos, abandonados no chéo debaixo das drvores e a volta das fissuras, forneceram, dados proveitosos. Para citar s6 um exemplo, os cranios mostravam fracturas, depressdoe feridas por puncionamento. Sempre que podem, e ao contrérioda. ideia dada pelos filmes de Tarzan, os grandes felinos matam por asfixia, is- toé, fechando a sua boca sobre a das vitimas até a morte destas por sufoca- ‘do. Deste modo a presa fica quieta, quase hipnotizada, sem espernear (o que {BUSCA DO PASSADO a ser perigoso para o predador, que podia facilmente ficar com o ventre ido). Este tipo de comportamento resulta num padrao sistematico de per- i96es cranianas que podem ser comparadas com o espacamento existente 8 caninos do leopardo*. Brain reexaminou o material de Swartkrans “partir demodernas observapées anatémicas deste tipo, e conseguiu demons- ‘ar que também neste caso as fracturas dos crénios nao resultavam de pan- ‘eadas dadas pelo homem (como pensava Dart), mas da morte por asfixia tal ‘eomoacima deserita. Do mesmo modo, o contraste que se verificava nos 0850s de Makapansgat, entre ofacto de os membrosinferiores sorem achados intac- tes eas vértebras estarem quase totalmente ausentes, podia ser relacionado com o padrdio de consumo tipico dos leopardos. F, de facto, os padrdes de frae- turaso eram, no essencial, indiferenciveis dos que Brain tinha encontrado ‘nos seus estudos sobre o comportamento dos leopardos actuais. Esta era, pois, uma situacdo muito sugestiva. O contexto geolégico dava crigem & formagdio de grupos de drvores que ofereciam sombra e protecydio ‘uma paisagem de modo geral aberta; ambientes deste tipo constituiam 0 Aabitat natural em que um dos mais importantes predadores consumia os seus alimentos; e esse consumo tinha como consequéncia a acumulagdo de ‘essos em torno da abertura de fissuras naturais, Esta combinagaode cireuns- Fig. 9.—C. K. Brain esoavando em Swarthrans. (Agosto de 1981.) * Brain, 1961, figs. 50.0 221, Fig. 10, —Reconsttuigae de wma cona em que um leopard devora um homsinideo primiti- ‘vonuma drvore sobre uma fissure no caledrio, (Desenho a tinta de Mary Coombes, reprodusi- do com autorizagdo do South African Museum Bulletin, n*9, 1968.) taneias convenceu Brain de que a responsabilidade pela formagao dos depé- sitos paleontolégicos eseavados na Africa do Sul devia ser atribuida A ocorrén- cia destas mesmas condigSes e processos ao longo de milhdes de anos. Noentanto, Brain néo se limitou a estudar os leopardos. Estudou 0 porco- ~espinho africano, que também acumula o3s0s na sua toca. Examinouo com- portamento das corujas nos seus ninhos, o qual tinha certamente contribuf- do com quantidades considerdveis de ossos de pequenos animais para os depésitos existentes nas jazidas dos caledrios. Estudou ocomportamento das hienas e, ao contrério de Dart, concluiu que as acgdes deste interessante animal podiam explicar muitas das caracteristicas dos conjuntos faunisticos encontrados nas jazidas do «homem-macaco» primitive. Estes estudos do comportamento animal foram combinados com a eontinuagéo da escavacao.e investigasao da importante jazida de Swartkrans. ‘Sonieltasieo ‘Soquéncia de formacso ‘Jaridas de hominidoos da Africa do Sul Fig. 11. —

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