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A CONTRIBUICAO DOS PRIMEIROS GRAMATICOS PORTUGUESES NA FORMACAO DO CANONE, GRAMATICAL MODERNO Por M. Kossarik Universidade Estatal de Moscovo, Faculdade de Letras CO interesse pelos problemas da hist6ria da cultura, histéria da cién- cia, que se renovou nos tiltimos anos, apresenta a tarefa de analisar a correlagao da tradigao e da inovagao no processo de se formarem ¢ desenvolverem ideias cientificas. O estudo da histéria da linguistica por- tuguesa desde este ponto de vista da a possibilidade de apreciar o papel das primeiras descrigdes da lingua portuguesa na historia da linguistica europeia. As gramaticas portuguesas renascentistas, que so objecto de estudo na patria delas', continuam sendo pouco conhecidas na Unido Soviética. A importancfa das primeiras descrigdes de linguas vulgares, particularmente das primeiras gramaticas portuguesas, ainda nao esté estimada devidamente. Nas primeiras gramaticas de linguagensna maio- ' M.L. Carvalhiio Buescu. Gtaméticos portugueses do século XVI. Lisboa, 1978. M. L., Carvalho Buescu. Babel on a ruptura do signa: A gramstica @ os graméticos do século XVI. Lisboa, 1983. ML. Carvalho Buescu. Historiogra da lingua portuguesa. Século XVI. Lisboa, 1984. 55 ria dos casos véem uma simples trasladagdo da tradigdo antiga para as novas Iinguas, considerando que nestas obras nao se formavam novas ideias. Porém, a anélise das primeiras descrigdes da lingua portuguesa revela uma grande contribuiciio dos autores delas na criag%o de novos conceitos da apologia de linguagem, da fixag4o da sua norma, na for- magio de um novo ponto de vista a lingua, histérico. Os filélogos portu- gueses da época do Renascimento conseguiram: langar novas ideias importantes para o desenvolvimento da linguistica europeia. Oobjectivo deste artigo é uma tentativa de analisar o papel das pri- meitas gramiticas da lingua portuguesa na formacio do canone moderna da descricfio gramatical. Criadas quase simultaneamente, nos anos 1536 € 1540, as gramaticas de Fernao de Oliveira e de Jodo de Barros’ so muito diferentes, ¢ esta a causa de que as apreciagdes delas variam muito. Ea gramatica de Barros que se considera tradicionalmente a primeira gramatica verdadeira da lingua portuguesa. Porém, ambos os linguistas contribuem muito na formaciio de varios tipos de gramatica Nas obras de Oliveira e Barros achamos uma grande diferenga na compreensao dos fins e do objecto de descrigao gramatical. Em grande parte esta diferenga foi determinada pelos cambios caracteristicos para a época do Renascimento, quando se alargou o ebjecto da linguistica gracas a formagao de linguas literdrias nacionais. Além das graméticas latinas surgem gramaticas de linguagens. Além disso, transforma-se a propria atitude a descricao gramatical, o que se explica pela modificagao da nogao do correcto na gramitica. A lingufstica medieval, modista, estudava as leis universais da correcta oragio, proposicao, Na linguistica renascentista a nogdo do correcto liga-se jd nao com a légica, mas com anorma, Levanta-se o problema de fala correcta que se considera assi nocaso de corresponder ao «bom costume», nocaso de se usarem for mas apreciadas como modelares por certs comunidade. A linguistica renas centista passa da primazia da nogdo de correcgio universal & conscién- cia da importincia das normas de linguas concretas, ¢ isso poe em primeira plana a tarefa de fixar estas normas, a codificaco das linguagens, A mudanga dos fins e do objecto da descrigao gramatical na wadigao renascentista estd ligada & apologia de linguas nac onais provocada pela nova situagio sociolinguistica que causa a luta de linguagens pelo estatuto de linguas literdrias, isto é, pela plenitude do paradigma das 2 F. de Oliveira, A gramdtica da linguagem portuguesa, Lisboa, 1975. J. de Barros. Gramdtica da lingua portugesa. 1975, Neste artigo nao se citam ay obras de Oliveira ¢ Barros, pois os leitores portugueses conhecem bem estas gramiticas. 56 fungdes delas, 0 que apresenta a tarefa de fixar a sua norma. E preciso que na gramitica de Oliveira, que é a primeira experiéncia pratica da fixagéo da norma portuguesa / a codificagiio nesta graméatica resultou bem sucedida gragas A orientago do seu actor ao uso real, achamos também 0 estudo de problemas tedricos de norma que antecipam ideias da ciéncia moderna. Mas, prestando atengo as caracteristicas de linguas concreta fixando as suas normas, a linguistica renascentista nao se recusa da ideia da lingua universal. Ja a propria criagdo de gramaticas de linguagens a base de gramatica latina pressupde o reconhecimento da existéncia de categorias universais, comuns para varias Iinguas. A revelagio do cardcter gramatical das linguagens com o fim de provar a igualdade delas ao latim / a posigao caracteristica para varios filésofos da época do Renascimentoe, entre outros, para Barros /testemunhaaconservagao na lingufstica renascentista da ideia da lingua universal elaborada pela teoria medieval, Aomesmo tempo, adireccao ao eénone gramatical antigo, que dava instrumento para a descrigdo das mais variadas linguas, desde as linguas europeias até as de indigenas da América, contribui muito para a formacio das ideias da gramatica geral ¢ racial. Deste modo, a con- cepeiio linguéstica do Renascimento, apresentada em grande parte pelas assim chamadas «gramaticas traduzidas», nao é resultado de um passo meeanico da teoria medieval & tradigdo antiga, mas representa uma sintese das ideias gramaticais da [dade Antiga e da Idade Média enrique- cida pelo conceito de norma elaborado j4 pela filologia renascentista. A aplicagio da nova doutvina a linguas de varios sistemas criou condigdes para a formagio da teoria gramatical de Port-Royal. Se também lembrarmos que € na época do Renascimento que comega a ser formar um novo método de estudo da lingua, hist6rico / achamos a primeira experiéncia da direcedo aos problemas de origem e do desenvolvimento da lingua nos tratados de Duarte Nunes de Ledo’ /, podemos criar uma nocio mais exacta sobre a importancia da concepgao renascentista para a historia da linguistica e sobre o lugar nela das primeiras desctigées da lingua portuguesa. ‘Como ji foi exposto, para a filologia renascentista so caracteristicas a apologia das linguagens e a codificagao delas a base do cinone gra- matical antigo. No entanto, gramiaticas desta época diferem bastante, ¢ esta diferenga explica-se tanto por distintas posigGes dos seus autores na apologia de linguagem, como por distintos princfpios da descrigdo gra- matical. Apesar de terem Oliveira e Barros rasgos comuns na defesa de portugués / ambos os gramiticos revelam a importincia da sua lingua > D, Nunes de Leo. Ontogratia ¢ origem da lingua portuguesa. Lisboa, 1983, 57 para a histéria do povo e do estado, argumentam o direito dela a exercer todas as fungGes caracteristicas para a lingua nacional literaria, levantam © problema da descrigiio, do enriquecimento dela /, é possfvel notar uma sensivel diferenga dos primeiros gramiiticos portugueses na atitude ao latim. Oliveira prova nao 6 a igualdade de latim e portugués, mas as vezes até a superioridade deste. Latim continua sendo um modelo, mas s6 no que se refere A riqueza da lingua. Na opiniao de Oliveira é preciso imitar 0 respeito de romanos pela sua lingua, mas no as formas e construgées latinas. Como Oliveira nao vé a necessidade de provar o cardcter gramatical de portugués, o que considera evidente, ele nao acha necessario comparar sistematicamente portugués ¢ latim, trasladando para portugués as categorias de latim, Tudo isto determina a atitude de Oliveira ao canone gramatical antigo — Oliveira ndo sempre segue este cdnone. Barros, pelo contratio, nas formas ¢ construgées latinas vé um exemplo. O desejo de provar 0 cardcter gramatical da sua lingua feva-o & comparagio sistematica de portugués e latim, a trasladagao para portugués de algumas categorias da Iingua latina, A descrigao de portugués em rigorosa conformidade com o cAnone gramatical antigo. De tal modo a diferenga nas posig6es de apologia da lingua portuguesa determinou a diferenga na atitude ao cénone gramatical, ¢ isto,a sua vez, condicionou a diferenga do contetido das gramaticas. Oliveira antes de mais nada presta a sua atengSo & descricéio da fonologia, formagdo e variagdo de palavras, abordando talbém alguns problemas da seleccao do léxico normativo, Como se vé, a atengdo de Oliveira concentra-se nos fendmenos que em primeiro Jugar esto sujeitos & codificagao, Ecaracteristico para Oliveira o interesse pela forma oral da existéncia da lingua, a fala. Concentrando-se na fixagao de variantes normativas, Oliveira recusa-se da descrigéio de partes de oragao, tradicional para a gramatica, da sua classificagao, definigiio, andlise de acidentes delas. Nao toca a questées da sintaxe. Na gramitica dele falta a parte dedicada a figuras. O contetido da gramética de Barros difere bastante da de Oliveira. Descrevendo a fonologia, Barros concentra-se nas questdes graficas. ‘A maior atencio ele presta 4 descricao tradicional das partes de oracio, aborda os problemas sintacticos / apesar de descrever a sintaxe em termos de morfologia, o que é caracteristico para a época /. Barros inclui na gramatica a parte dedicada a figuras. Desta maneira, as primeiras gra- miaticas portuguesas como que completam uma A outra, apresentando juntas descrigdes de varios niveis do sistema da lingua portuguesa, A diferenca na compreensio dos fins da descrigdio gramatical / para Oliveira estes fins consistem na fixacéio do uso, costume, na seleceao de variantes normais, para Barros, na exposigtio sistematica de todos os niveis da lingua em correspondéncia com o cénone gramatical antigo 58 provando o caracter gramatical de portugués / determinou a diferenga nos princfpios desta descricfio, Para Oliveira é caracterfstico 0 critério formal, para Barros 0 semantico-funcional. Oliveira acha na lingua portuguesa s6 categorias que se exprimem formaimente, isto 6, categorias formolégicas. Por exemplo, considerando que o nome portugués tem género e ntimero, 4 que tem flexes especificas, Oliveira ndo reconhece em portugués a existéncia de casos de nome, explicando-o pela falta de variago nominal em casos, pela falta de formas especiais. Oliveira interpreta 0 caso com acategoria morfolégica do nome que se expressa por flexdes¢ que existe em umas linguas /latim, grego /e falta ¢ outras /em portugues /. Ao con- trério, Barros reconhece a existéncia de caso em portugués, para Barros caso é uma categoria universal que em parte se exprime por meios sintacticos, por construgdes de preposiciio e de nome. A mesma atitude vemos na interpretagiio de categorias verbais, Oliveira reconhece sé categorias do verbo portugués que tem expressio formal, categotias morfoldgicas: modo, tempo, nimero, pessoa. Quanto 4 voz, de facto, recusa desta categoria do verbo portugués, afirmando que o verbo portugnés tem s6 uma voz, jé que nao tem formas opostas. Barros, estu- dando o problema da voz, baseia-se nos critérios sintdcticos, no cardcter do sujeito e predicado. Enquanto Oliveira, seguindo o critério formal, nzio distingue optativo e conjuntivo, Barros partindo do critério semantico- -funcional, reconhece a existéncia de ambos os modos em portugués. Desta maneira, as primeiras descrigdes da lingua portuguesa teste- munham 0 inicio do processo de se formarem diferentes princfpios da descrigao gramatical. Na gramdatica de Oliveira esboga-se 0 principio formal que foi uma etapa necessaria no desenvolvimento da teoria gra~ matical, levando 3 revelagio de meios formais de expressio de significado gramatical. A atengdo de Oliveira a estes meios formais deu-lhe a possi- bilidade de revelar muitos morfemas, que era um passo importantissimo para o desenvolvimento da lingufstica. Na sua gramitica Oliveira cita, indicando também a sua significacdo, uma série de morfemas que server para a formagao das palavras /prefixos, sufixos, raizes /e para a variagiio delas / flexdes nominais ¢ verbas /, Caracteriza também 0 aspecto ino- vador da sua gramatica e separagdo por Oliveira dos problemas de for- magiio e de variacio de palavras. Ao contrario da tradigao, Oliveira naio inclui na descrig&o de partes de oracio as questes de formagio de pala- vras / 0 cAnone antigo nfo os separava, apresentando espécie e figura como acidentes de parte de oracio /. Oliveira aproxima-se separacioda morfologia a disciplina que estuda a formagio de palavres, morfémica. E bem possivel também que Oliveira distingue 0 nivel fermoldgico, ao qual presta atengao na sua gramitica, e o nivel sintactico, que pretendia descrever numa outra obra dedicada a seméntica ¢ a fungdes de partes de 59 oracdo, que comegou a escrever, segundo as suas indmeras referéncias, mas nao conseguiu terminar. Analisando a gramética de Oliveira, devemos indicar que nela se nota a tendéncia de separar a descrig&o de formagio de patavras / morfémica /, variagao de palavras / morfologia /e sintaxe. Mais uma particularidade da gramitica de Oliveira esta ligada com a sua atengio a linguagem falada, o que explica a descrigdo muito detalhadae fina da fonologia portuguesa. Notemos que Oliveira niio s6 dé recomen- dagées para a seleogdo de variantes normais na prontincia ¢ na escrita, mas também revela oposicées sistematicas no vocalismo € consonantismo portugués, trata de descrever articulagdes, revela processos fonéticos activos em portugués do século XVI, porexemple, a crescente tendéncia a reducdio de voeais. Os principios da descrigao da lingua portug.sesa na obra de Barros diferem bastante dos de Oliveira. Barros orienta-se A linguagem escrita, co que testemunha a sua atengdo As questoes grificas. Analisando as ques- tes da gramdtica propriamemte dita, descrevendo as partes da oragio, Barros baseia-se nos critérios semantico-funcionais. A aplicagio do cfnone gramatical antigo a lingua portuguesa contribui & formagiio do conceito de categorias universais que servem de fundo para varias linguas. ‘Como podemos ver, varios prineipios da descrigao de lingua deter minaram a formagao de varios tipos de graméticas, representados na tra- digdo portuguesa, ji desde 0 inicio dela, pelas obras de Oliveirae Barros. A primazia da tarefa de fixar a norma portuguesa causa a atengdo de Oliveiraa fenémenos concretos da linguagem, aproximando a gramatica dele ao tipo de gramaticas particulares, Cujo assunto principal € a de crigo de formas de uma lingua concreta, de linguagem, o que contribui a0 desenvolvimento do método gramatico-formal, interesse pela fonologia, disting’o dos problemas de morfémica, morfologiae sintaxe. Este tipode gramdtica difere bastante do cAnone antigo. Pelo contrario, para Barros é caracteristica a ateng&o aos aspecios seméntico-tuncionais de gramatica, ligada com a tarcfa de achar em portugués as mesmas categorias que tem a lingua latina. Barros fa-lo aplicando ao portugués o cdnone gramatical antigo, o que contribui a revelacao de categorias universais, aproxima a gramitica de Barros ao tipo de gramatica universais. ‘Aanilise das primeiras descrigdes da lingua portuguesa mostra que elas estio & fonte do proceso de formacao de dois tipos de gramiticas: as de linguas concretas, isto é, gramiticas normanivas, particulares, € gramaticas filos6ficas, universais, Nisto se vé a contribuigdo dos primeir linguistas portugueses, F. de Oliveira e J. de Barros, na formaciio do cAnone gramatical moderno que se constituiu jd na seguinte etapa da historia da linguistica, nos séculos XVI e XVIIL 60

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