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A ORIGEM DA VIOLÊNCIA
Uma contribuição ao estudo do comportamento violento
1ª EDIÇÃO
NOME – E DITORA
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A ORIGEM DA VIOLÊNCIA
Uma contribuição ao estudo do comportamento violento
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A ORIGEM DA VIOLÊNCIA
Uma contribuição ao estudo do comportamento violento
NOME – E DITORA
8
Capa: do autor
Copidesque:
Revisão:
Bibliografia.
ISBN 00-000-0000-0
00 - 0000
CDD- 000.00
1ª edição
1999
Coordenador
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AGRADECIMENTOS
SUMÁRIO
A ORIGEM DA VIOLÊNCIA (uma contribuição ao estudo do comportamento violento) 1
Apresentação e objetivos 17
CAPÍTULO I 21
A Natureza e seus mecanismos 21
Interação, Integração e Função 21
Natureza e diversidade 22
Tropismo e Entropia 23
Interação, comportamento e desvios 25
A origem da destrutividade 26
CAPÍTULO II 29
O Comportamento violento 29
O Cérebro humano 30
Percepção e convenção 32
Comportamento Humano - Ativo e Reativo 34
Comportamento: organização e desvios 37
CAPÍTULO III 40
Bando, agrupamento e Cultura 40
O Bando 41
A Cultura 41
Modelo Cultural, Etnocentrismo e Racismo 43
O AGRUPAMENTO 44
Associação e dissociação (POLARIDADE VITAL) 46
Civilização e origem do conceito de Estado 49
Propriedade territorial 50
Poder Econômico - Riqueza 51
Instituição e violência 52
CAPÍTULO IV 54
Comportamento e representação 54
Fama e exibicionismo 54
Sociedade e comunidade 55
(política, governo e lei) 55
Fatos ocorridos em aldeias indígenas * 57
(RELATOS E SIGNIFICADOS DE COMPORTAMENTOS ATIVOS) 57
CAPÍTULO V 70
Exemplos históricos de comportamentos reativos 70
Reatividade nas sociedades antigas 70
REATIVIDADE NAS SOCIEDADES ATUAIS 102
CAPÍTULO VI 130
Trabalho e violência 161
Violência na família 165
CAPÍTULO VII 167
Psicose e sanidade 167
(mecanismos de intermediação) 167
Mecanismos estabilizadores e desestabilizadores 169
Diagnóstico e natureza causal 173
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Apresentação e objetivos
Este texto perpassa um longo trecho da minha vida, desde quando não compreendia
bem a existência próxima na convivência, entre as pessoas chamadas de ricas e de pobres
naquela época; no tempo em que também via entrarem na minha casa e no consultório do meu
pai, pessoas estranhas á minha imaginação infantil – os índios. Um longo período onde, na
juventude, se adicionaram outras dúvidas advindas dos cursos de psicologia médica e
psiquiatria na universidade.
Outras interrogações vieram nos tempos que passei num hospital psiquiátrico como
acadêmico residente, lidando com pessoas que, além de pobres, eram chamadas de loucas.
Foi, porém, do curso dos anos e das insistentes questões que fiz a mim mesmo – costume
herdado dos pais – e do auxílio dos livros e de tantas outras pessoas, que resultou este
trabalho. Determinantes foram as observações feitas desde 1971 até 1983, quando andei pelas
aldeias indígenas em busca de explicações para um tipo de vida estranho e desconhecido e
quando convivi com menores infratores durante nove anos numa comunidade-fazenda.
Seguindo esse eixo, o presente texto tenta discutir conceitos referentes às sociedades
pré-letradas e pós-industriais, priorizando o enfoque das organizações dessas sociedades – e
dos comportamentos individuais – como fatores facilitadores ou inibidores das formas de
violência que conhecemos atualmente.
No decorrer das análises, procurei não me prender a uma abordagem acadêmica e a uma
linguagem hermeticamente científica para permitir maior clareza e torná-lo accessível. Tentei
contestar e ampliar conceitos médicos usados em psiquiatria, sugerir uma classificação das
alterações do comportamento que se torne mais próxima da realidade do que as que estão
sendo utilizadas atualmente e que se orientam por parâmetros semelhantes aos utilizados para
as doenças físicas. Acredito ter aberto caminho no sentido de ampliar o uso das psicoterapias
para a direção da profilaxia e da educação.
Na verdade o que posso ter feito foi dar um primeiro passo alternativo para pesquisas
mais profundas na área da compreensão do comportamento humano e da sua aplicação
prática. Os estudantes e profissionais de diferentes áreas, através do conteúdo desse texto,
terão farto material para crítica e reflexão. É necessário que as pessoas saiam, de vez em
quando, do horizonte civilizado e conheçam outras realidades; que troquem de ângulo visual e
se disponham a viver no mundo sem as lentes estreitas do dogmatismo e do puro
conservadorismo.
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Escrever é como ter uma relação privilegiada com os outros. Quando o interlocutor
não está presente, a imaginação é livre, a idéia torna-se verdade e lei. É como encontrar um
espaço de liberdade na solidão. Uma liberdade relativa, pois sabendo que os outros irão ler o
que escrevemos, tomamos cuidado e nos tornamos, ás vezes, rígidos censores da nossa
imaginação.
Viver em sociedade é uma coisa muito parecida. Desejamos criar nossas próprias
idéias e verdades, mas sabemos que elas perderão o sentido se não forem comunicadas e
partilhadas com os outros. A convivência influencia nossas idéias e, elas, o nosso
comportamento, mas o comportamento e as idéias dos outros enriquecem as nossas
experiências. Escrever é uma forma virtual de conviver, com relação e sem presença física,
pois os outros, embora ausentes, estão sempre presentes na imaginação de quem escreve. Não
existe solidão absoluta, existem sim, duas formas de conviver: uma real e outra virtual.
Talvez tenham sido essas reflexões que impulsionaram este trabalho: saber que
vivemos em dois planos simultâneos de convivência, um virtual (mental) e outro real (social).
Perceber que o elemento intermediário entre esses planos é o comportamento, que pode
expressar como nos sentimos na convivência, que pode reforçar ou enfraquecer mais ainda
essa vontade de escrever, de viver e de conviver. É preciso admitir que o objetivo maior não é
apenas chegar à conclusão que o comportamento expressa o resultado dessas relações, mas
que ele é o único meio que possuímos, na relação social, para manifestar nosso bem estar ou
mal estar. A curiosidade em saber porque os indivíduos e as sociedades entram em crise e se
comportam reativamente é privilégio de um pequeno grupo de pessoas, mas, quem sabe se a
maioria delas também se interessa por esse assunto?
O desejo de saber para que serve a Vida e se o seu maior objetivo está mesmo voltado
para a convivência, pode nos transportar para um campo onde atuam os intrincados
mecanismos de interação e regulação mental e social. Nos anos setenta havia uma grande
curiosidade da classe média, no Brasil e em outros países, sobre hábitos e crenças orientais
(orientalismo). Era a época dos gurus, da macrobiótica, do naturalismo e do misticismo
oriental. Se quisermos arriscar uma interpretação desses comportamentos da época,
poderíamos pensar que:
Esse certamente deve ter sido o principal objetivo de escrever - aprender sobre
experiências obtidas em dois universos diferentes: o universo virtual do mundo civilizado,
construído sobre sonhos intelectuais de grandeza, e o mundo da realidade natural, assentado
nas possibilidades existentes da Natureza.
Não sou um especialista em filosofia ou em dialética, mas aceito as críticas sérias. Não
dou muita importância a títulos universitários. Penso que “a melhor qualificação para um bom
profissional é estar construído sobre a base de um excelente cidadão”. O título mais
importante que um indivíduo pode alcançar é o de Cidadão. O único título que possuímos,
mesmo antes de nascer, quando somos esperados por nossos pais. É um título homologado
pelo nascimento, gratuito e sem necessidade de qualquer esforço pessoal ou registro em
cartório; porém, talvez seja o mais difícil de manter pelo resto da vida; uma honraria que
precisa ser preservada com simplicidade, pois todos os outros indivíduos também são
possuidores do mesmo título e todos eles são outorgados pela mesma Univers(al)idade.
Quando morremos só levamos conosco duas coisas: o conhecimento que adquirimos e a
convivência que tivemos. O resto fica!
21
CAPÍTULO I
META
22
Natureza e diversidade
1
Interação significa: “relação entre” as partes de um todo.
2
Integração significa: “ação solidária entre” as partes de um todo.
3
Função significa: “ação específica” para desempenhar um papel em benefício do todo.
4
Ativação ou Animação significa: “ação construtiva, reprodutiva e sintônica para unir as
partes beneficiando o todo”, permitindo a sobrevivência.
5
Reação significa: “ação reativa, contrária, dissociada entre as partes” de um todo, conflito.
23
Essa disposição natural pode ser fruto de uma fonte (ou mais de uma) sobre a qual
ignoramos a origem e os objetivos. Admite-se que qualquer modificação antinatural nessa
disposição poderá provocar desvios e alterações com resultados perturbadores para o
conjunto, ou passíveis de reordenação. Quanto maior o grau de integração entre as partes
componentes que um conjunto comporte (diversidade) e quanto menor a ocorrência de
desvios entre essas partes, maior será sua estabilidade.
Tropismo e Entropia
Este fato nos mostra que, para cumprir uma função, as partes que interagem (flor/luz
do sol, raízes/Terra) necessitam funcionar integradas e sintônicas para alcançarem a lógica da
sobrevivência e da reprodução. São leis que organizam os mecanismos naturais da Vida.
Se retirarmos os ponteiros de um relógio, não mais poderemos marcar o tempo por ele;
seu mecanismo continuará funcionando, porém a integração entre o mecanismo e os ponteiros
- que empresta a função de visualizar as horas - se perderá. Se cortarmos o tendão de um dedo
polegar, certamente perderemos a função de apreender objetos, porque sabemos que o tendão
cumpre a função de intermediar o movimento dos dedos. Analogamente, para viver de modo
ativo e em harmonia, as pessoas necessitam obedecer às regras sociais e ecológicas
determinadas pelo seu grupo cultural de acordo com as leis da Natureza. Os modos de
associar-se é que determinam “a qualidade”8 do comportamento das pessoas em relação ao
seu grupo e ao ambiente em que vivem. Se o comportamento é integrador, sintônico e
funcional, o sistema vital no grupo e no indivíduo decorrerá de forma natural (comportamento
ativo/ associação equilibrada); se o contrário acontece teremos um sistema entrópico, o que
caminha para a extinção (comportamento reativo/ associação desequilibrada).
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tropismo em Biologia significa: reação de aproximação ou afastamento de um organismo
em relação à fonte de estímulo.
7
Entropia significa: Medida do grau de desordem em uma substância ou sistema; Na teoria
da informação e em ciência de computador, é uma medida do conteúdo de informação de uma
mensagem, avaliada por sua incerteza.
8
“a qualidade” do comportamento significa: se o comportamento é integrador, sintônico e
funcional entre seus membros e com o ambiente.
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Chamamos de “interação” a uma forma universal de relação que ocorre entre as partes
componentes de um sistema e que segue as leis naturais. Esse sistema poderá ser o Universo,
a Terra, uma sociedade animal ou vegetal ou o nosso próprio corpo ou mente.
A origem da destrutividade
Pode parecer incrível, mas os primeiros registros cerebrais, no plano relacional, que os
homens (e os outros animais) possuem são destrutivos. A destrutividade é a matriz da
sobrevivência; a agressividade natural é sua expressão, na interação entre os indivíduos. Na
verdade a agressividade natural é uma função de todo ser vivo dirigida para a sobrevivência
no convívio entre as espécies. Um homem ou animal que não usa sua agressividade natural
tende a enfraquecer e morrer.
maternal. Quando acometido por uma crise de automatismo epiléptico qualquer indivíduo
pode matar quem estiver próximo (estado alterado da consciência). Quando um pai mata o
filho para defender sua própria vida, entra em ação a parte destrutiva da sua agressividade
natural (autodefesa). Esquematicamente poderia ser assim:
destrutividade (matriz)
Comportamento Ativo
Comportamento Humano (agressividade natural - estado de consciência
(estado de consciência) normal)
Comportamento Reativo
(reatividade - consciência alterada, desvios do
psiquismo)
CAPÍTULO II
O Comportamento violento
Nessas mesmas condições os seres humanos podem reagir instintivamente, pois ainda
estão preservadas suas respostas instintuais primárias. Para que um comportamento seja
considerado verdadeiramente violento são necessárias, entre outras, algumas condições:
• Capacidade de planejar e calcular conscientemente (racionalidade)
• Capacidade de avaliar as conseqüências (discernimento)
• Capacidade de julgar eticamente o resultado (consciência ética)
• Capacidade de associar idéias (associação)
• Capacidade de memorização para fatos antigos (memória retrógrada,
experiência).
• Capacidade de compreender situações sutis (inteligência, capacidade de
abstração).
Essas, entre outras, habilidades especiais de pensar e agir são atributos existentes
apenas nos seres humanos, que podem gerar violência sem a utilização de respostas instintuais
primárias. Essa condição confere ao homem a possibilidade de uso de comportamentos
alterados (reativos). Como exemplo teríamos: sadismo, crueldade, perversão, maquiavelismo,
etc. O comportamento violento nos seres humanos só ocorre em situações em que o cérebro
encontra-se saturado e a mente torna-se perigosamente reativa. Para compreendermos melhor
isso torna-se necessário saber como o cérebro funciona.
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O Cérebro humano
Todo sistema que produz trabalho é movido por energia e produz energia; o cérebro
também é mobilizado por energia e, após processá-la, induz a trabalho físico e energético
(programas). Sabemos também que energia e massa (matéria) são passíveis de conversão
recíproca sob certas condições. Nessas condições o cérebro distribui energia (a partir da
matéria) em forma de descargas (pulsos eletroquímicos), correspondentes às necessidades do
trabalho e de suas características (função). Esse trabalho tanto pode expressar-se de uma
forma real (coordenação motora, locomoção) como pode assumir forma virtual (imaginação,
pensamento lógico).
As funções cerebrais estão dirigidas para duas direções fundamentais: uma interna e
outra externa. A interna está orientada para duas outras, uma que cuida da integração do corpo
(vida vegetativa) e uma autoreguladora do próprio cérebro (autoregulação psíquica) que
funciona como “controle e manutenção” do equilíbrio mental. A externa está dedic ada às
situações que acontecem no meio ambiente (vida de relação). Essas funções se refletem
mutuamente, permitindo a comunicação interfaces e proporcionando uma sensação global
(estado consciente).
etc.) captados pelos órgãos dos sentidos ou imaginados pela criatividade e armazenados na
memória. Após serem processados por centros superiores, esses blocos de informações,
relacionados entre si, servem como suporte para novas experiências. Esta capacidade
possibilita o armazenamento das informações no cérebro como se ele funcionasse como um
banco de dados relacional avançado, permitindo o uso variado e estratégico dessas
informações através de mecanismos de busca (memória) ou dedutivo-associativos (raciocínio,
inteligência). Essas experiências geralmente estão impregnadas de cargas diferentes de
energia especial (emoções) que lhe conferem qualidade e força.
O psiquismo é capaz de manter represados esses sinais reativos (tensão, “stress”) até
determinado limite. Ultrapassado esse limite começam a surgir alterações no organismo
(físicas e/ou psíquicas) que se manifestam de diferentes formas. Os mecanismos que
controlam as direções que essas energias tensionais tomam, para livrar-se do acúmulo,
evitando transtornos mais graves, ainda não são suficientemente conhecidos. Os resultados
podem aparecer sob forma de:
Percepção e convenção
Nós formamos uma consciência do mundo através das percepções e das convenções
advindas das informações e aprendizagens que a Cultura nos fornece. Cada Cultura denomina
e cria conceitos os mais diversos para diferentes objetos, fatos e situações da realidade.
Classificamos e conceituamos a maioria das coisas para facilitar nossa compreensão e
permitir as ações. Percebemos e convencionamos para compreender e agir. Vivemos no
mundo das representações mentais (engramas) às quais adicionamos emoção para formar
registro (percepção) e armazenamento (memorização). A realidade, para nós, varia segundo
nosso modo de interpretar o mundo segundo a emoção e sentimento que ocorre naquele
momento.
Um exemplo simples de entender é o de uma criança de três anos que vê o rosto de sua
mãe e pergunta: - Por que você está triste? (ela está triste por ter brigado com o marido).
Ficamos admirados com a percepção da criança que conseguiu detectar o sentimento sem que
a mãe tivesse dito qualquer palavra. Na verdade essa criança já viu sua mãe em diferentes
circunstâncias que se expressam pelo rosto. E guardou (arquivou) essas imagens visuais na
memória de forma seqüencial como os fotogramas de um vídeo. Cada fotograma é um
conjunto de dados que identifica um grau de sentimento, que vai do mais leve até o choro.
Comparando os diferentes fotogramas essa criança saberá a intensidade da tristeza. Como no
esquema abaixo:
Nossos sensores (olhos, ouvidos, pele, nariz, etc.) transmitem informações específicas,
de cada órgão dos sentidos, para centros superiores no cérebro que as decodificam. Elas, após
processadas, se associam e formam um bloco (engrama) que possui significado lógico (ou
impreciso, dúvida) e que nos transmite propriedade qualitativa (bom/ruim, quente/frio,
prazer/dor, certo/errado, etc.). Direcionamos nossas respostas (atos) guiados por módulos
mentais, fortemente influenciados pelos hábitos e costumes do grupo ao qual pertencemos.
As leis ou regras grupais são testadas freqüentemente pelos indivíduos para obter
“feed-back” sobre a direção a ser seguida ou mudança a ser efetuada. Nossas insatisfações
pessoais, manifestadas para o grupo com excessiva freqüência e de forma explosiva, podem
causar distúrbios no equilíbrio geral, mudar radicalmente a direção das normas grupais ou o
modo de nos comportarmos.
cisão e resultar na formação de um novo grupo independente ou divergente. Isso nos mostra
que os grupos possuem um limite de crescimento e complexidade, podendo dividir-se em
vários grupos. Esse é um fenômeno natural na dinâmica da formação e interação de grupos.
O homem, por ser um animal social, depende do seu grupo. A família, como grupo
social original, cumpre a função de modelar o indivíduo para a sua futura inserção no grupo
social maior (sociedade) e, ao mesmo tempo, é influenciada pelo grupo social maior. Essa
modelagem, sendo função natural e construtiva - permite a sobrevivência do grupo e do
indivíduo – interage por meio de comportamentos ativos (convivência ativa). Pode também
ser reativa e funcionar em sentido oposto, através de comportamentos reativos (convivência
reativa)
Dizemos que uma sociedade é antropocêntrica quando situa a figura humana (e sua
convivência) no centro dos interesses do grupo. O resultado desse tipo de organização é a
formação das sociedades naturais, onde a solidariedade e o respeito pelas normas fortalecem a
coesão do grupo. Da mesma forma chamamos de ergocêntrica a uma sociedade que situa o
trabalho (e os bens produzidos por ele) no centro dos interesses do grupo, onde a competição
excessiva entre seus membros e o desrespeito pelas normas enfraquece a coesão do grupo. No
primeiro caso é valorizado o coletivismo, isto é, o bem-estar dos membros do grupo; no
segundo, é valorizado o individualismo, isto é, o bem-estar individual dentro do grupo. O
resultado desse último tipo de organização é a formação das sociedades de classes e da
competição destrutiva entre seus membros.
Magnata mendigo
Virgem prostituta
Abstêmio drogado
Cientista analfabeto
Santo pecador
Proprietário peão
Existe uma tendência muita arraigada, sobretudo entre médicos, de procurar a causa
das doenças apenas através de fatores físicos, químicos e biológicos. Os mecanismos que
integram o psiquismo ao corpo também são capazes de produzir disfunções e lesões físicas.
Além disso, simulam, através de sinais e sintomas, doenças que são produzidas por fatores
que normalmente produzem alterações físicas. Os mecanismos produtores de doenças físicas
tanto podem ser originados por agentes naturais (vírus, bactéria, exposição excessiva a raios
ultravioletas, etc.) como também por tensões reativas internas, geradas no psiquismo e
dirigidas para o corpo (somatismos). Essas tensões reativas podem interferir nos sistemas
reguladores do organismo (termoregulação, ritmo cardíaco, ritmo respiratório, secreções
glandulares, etc.), produzir lesões (tumorações, úlceras) e simular condições fisiológicas
naturais (cefaléia, vômitos, diarréia, gravidez psicológica, etc).
conflito equilíbrio
ψ + ψ + ψ + ψ + ψ + ψ + ψ = Comportamento Ativo
- - - -
- - - - - ò ò òò
ò
- ò ò ò ò ò
ò ò òò
39
δ
<
Podemos concluir então que o modo de vida de uma pessoa em seu grupo social é
determinado pela cultura do grupo, que forma os hábitos e costumes circulantes (sentimentos,
princípios e valores), que determinam os comportamentos, que originam a qualidade da
convivência, que promovem o bem-estar ou mal-estar, que facilitam o equilíbrio ou o
desequilíbrio psíquico e orgânico de cada um, e que podem colaborar para a união (harmonia)
ou reatividade (conflito) entre os membros no grupo.
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CAPÍTULO III
Sobrevivência e convivência
Todo ser vivo, para se compor de forma estável, necessita de três dimensões que o
integrem no plano vital. São eles:
• Continente (ambiente)
• A associação (bando, agrupamento, grupo cultural)
• Indivíduo (constituição física, neural, mental)
Assim como o cérebro precisa funcionar como um sistema integrado e estável para
não acumular tensões excessivas e não gerar comportamentos reativos, as associações
humanas, para funcionarem de modo adequado, necessitam organizar-se também como um
sistema estável. Um sistema social pode ser compreendido como um conjunto, cujas partes
(sub-sistemas) se orientam para funções específicas essenciais à manutenção do equilíbrio do
convívio. As características físicas, psicológicas, econômicas, religiosas e políticas são sub-
sistemas que configuram o sistema (modelo) cultural de cada grupo humano.
O Bando
A Cultura
Em contrapartida, os objetivos determinados pelas culturas são tão diversos que seria
difícil identificar todos. Afirmamos no início que o Eixo Cultural é o conjunto de regras,
hábitos e costumes que mantém a qualidade dos comportamentos, a coesão e harmonia no
grupo e no ambiente, isto é, sua estabilidade. Ora, se a organização dos bandos possui
estrutura simplificada e, se o estímulo motivador das atividades dos membros do bando,
possui objetivos determinados (comer e reproduzir), quais serão os estímulos motivadores em
uma Cultura?
Vamos começar lembrando que uma cultura humana resulta da complexa interação
entre diferentes comportamentos individuais. Que cada indivíduo é um “sistema pensante”
único e que não visa apenas a sobrevivência e a reprodução. Todo indivíduo possui seus
próprios interesses individuais, mas não perde a consciência de pertencer ao grupo. A
associação em grupos determina não só a defesa dos próprios interesses, porque esses
interesses podem coincidir ou divergir dos interesses dos outros membros do grupo.
agora” da realidade. Um modelo cultural não se representa apenas como unidade lingüística,
econômica, religiosa ou política. Deve, antes de tudo, possuir características de integração e
estabilidade entre os membros e com seu suporte físico (ambiente). Acervo cultural sem eixo
cultural integrado não é Cultura, é agrupamento. Reatividade individual e desequilíbrio social
são fenômenos interligados que compõe um só quadro.
Em outras palavras, uma cultura é um organismo que tem vida própria. Grupos
humanos que não conseguem equilíbrio interno (mental) nem externo (social) não são
culturas, nem possuem modelo cultural. Chamamos a essas tentativas de organização humana
de “agrupamentos”, bem representados pelas sociedades civilizadas. Mas fica a pergunta: o
que determinou o desequilíbrio de muitos grupos humanos, enquanto outros conseguiram
manter-se estáveis, continuar existindo e evoluindo como entidades culturalmente autônomas?
O AGRUPAMENTO
Polaridade vital é apenas uma expressão convencional que nos ajuda a compreender a
flexibilidade e direcionalidade das relações na Vida. O bem e o mal, o preto e o branco, a
estabilidade e a instabilidade são expressões dos pólos (extremos) em que fenômenos
ocorrem. É também uma forma de dizer que o resultado depende da organização, qualidade e
intensidade dos fatores (“a ordem dos fatores pode alterar o produto”).
Se admitirmos o que foi exposto até agora teremos que admitir também que cada
instância possui a propriedade de integrar-se com os outros componentes e formar um
organismo (indivíduo) e uma organização de indivíduos (modelo cultural).
Esses desvios podem ser percebidos através de resultados conhecidos em diferentes
áreas. Por exemplo:
Medicina: desvio de fatores reguladores da glicemia diabetes
Psiquiatria: desvio de fatores reguladores do psiquismo comportamento reativo dissociativo (esquizofrenia)
Antropologia: desvio de fatores reguladores do grupo racismo
Como vimos, corpo, mente e social são planos qualitativamente distintos. Corpo é
estrutura física; mente é organização virtual; social é dimensão onde corpo e mente podem se
expressar. Comportamento é veículo que permite a interação no continente social. Anomalias
da interação social (desvios) podem produzir no corpo: disfunções e doenças; no psiquismo:
alterações do comportamento (comportamentos reativos); no social: alterações da
convivência.
Cada plano pode manifestar resultados que são percebidos sob diferentes formas. Se
pudéssemos representar cada plano com processos e resultados correspondentes á sua
natureza, poderíamos imaginar suas relações como na tabela abaixo:
Representando dessa forma as relações entre corpo, mente e social, o que chamamos
de Esquizofrenia não seria doença; seria uma desorganização da integração mental, uma
manifestação comportamental das alterações ocorridas nos processos de integração da mente.
Seria um comportamento reativo dissociativo, reversível, desde que o meio sociofamiliar
facilitasse essa reversão e desde que ficasse comprovada a ausência de fatores genéticos
atuando na sua etiologia. De origem preponderantemente relacional (faltam provas
convincentes de determinantes genéticos), essa dissociação mental provisória, necessitaria de
estímulos do ambiente (familiar e social) para readaptar-se e voltar a funcionar sob os
parâmetros da realidade. Mesmo admitindo a existência de fatores predisponentes de natureza
genética, a dissociação mental não se manifestaria em meio sociofamiliar harmônic o, pois
uma convivência amena provavelmente impediria essa manifestação. Essa tese, já
comprovada em consultório e em comunidades terapêuticas bem estruturadas, mostra que
mudanças qualitativamente significativas no ambiente relacional, podem reduzir ou suprimir
as manifestações dissociativas da mente.
49
Estado. No início dessa evolução a organização do Estado Nacional passou por estágios
intermediários.
O Estado é uma concepção abstrata criada pelo homem. É representado pelo conjunto
das Instituições que tentam ordenar a vida política, econômica, legislativa e religiosa de um
agrupamento humano. Na verdade é constituído por uma casta de pessoas (funcionários do
Estado) que detém o poder do agrupamento (povo), através de procedimentos normativos
(Instituições). Observando essa forma de organizar o poder, percebemos profundas anomalias
estruturais e funcionais:
Não é nossa intenção desfiar todas as anomalias desse tipo de organização humana,
porém temos certeza que esses comportamentos, partindo de exemplos das esferas mais altas,
se disseminam por todo o corpo social, provocando alterações de conduta (comportamentos
reativos) em todos os segmentos e classes sociais. Ora, nessas condições de interação social é
impossível haver integração do todo social. Disso resulta o mais apavorante temor que um ser
humano pode experimentar – a incerteza de garantir a sobrevivência, a liberdade e a
expressividade nas relações.
Propriedade territorial
Assim como acontece com a maioria dos animais, o homem também possui a noção de
espaço vital (territorialidade) e tenta preservar o maior espaço possível para a sua
sobrevivência. O conceito de propriedade territorial de um grupo humano é anterior ao
surgimento da Civilização e ainda gera muitos atritos entre os homens civilizados. A
agressividade normal (instinto agressivo) usado anteriormente para caçar e defender a prole
também passou a ser utilizado para defender o território, preservando a existência dos grupos.
Os grupo naturais possuem unidade grupal (tradição de grupo) sustentado por seu eixo
cultural de integração, ou seja, pelo seu reconhecimento entre os membros como “um todo
com identidade”, com hábitos e costumes aprovados pelo senso comum e pelo objetivo
comum direcionado para a vida coletiva. Essas características são importantes para se
entender um grupo como “organismo social integrado” e como uma “unidade com
personalidade e identidade própria” dentro do universo social. Nesse caso a defesa do
território é feita pelo grupo que o entende como bem coletivo.
Instituição e violência
CAPÍTULO IV
Comportamento e representação
Fama e exibicionismo
Entre muitas espécies de animais existe uma forma de exibicionismo voltada para o
ato reprodutivo. Nesses momentos o macho (ou fêmea) executa uma dança particular onde,
cores, ruídos e movimentos, estimulam o parceiro para o acasalamento. Na espécie humana
esse ritual de impressionar o parceiro ou a parceira se reveste de diferentes formas de
representação exibicionista. Porém essa representação pode estender-se para o grupo social,
onde o indivíduo pode conquistar uma posição social que o destaque dos outros indivíduos.
Quando seus atributos pessoais agradam muito, sua presença pode ser muito solicitada,
gerando sentimentos agradáveis que estimulam o “ego” e que criam oportunidades de obter
vantagens ou ganhar dinheiro.
Atributos humanos como emoção, desejo, imaginação e fantasia, são regulados por
cargas de energia (pulsos eletroquímicos), do psiquismo seguindo parâmetros que funcionam
dentro de uma faixa reguladora estável, variável individualmente, num certo período de tempo
adaptativo. Quando essas “doses energéticas” se tornam excessivas, dentro de um curto
espaço de tempo, o indivíduo pode apresentar disfunções do psiquismo, que se manifestam
através de comportamentos reativos. É comum ouvir-se frases como: “a fama subiu-lhe à
cabeça”, “o dinheiro confundiu-lhe os miolos” ou “o poder fundiu sua cuca”. Essas frases
confirmam as mudanças de comportamento que ocorrem em muitos desses casos e que são
melhor percebidas pelos outros indivíduos.
Subgrupo Grupo
com com
indivíduos indivíduos
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espírito de corpo - se estende a toda a comunidade. Significa que a cultura possui valores que
orientam o comportamento na direção dos interesses comuns. Os interesses comuns são o que
constitui os interesses políticos. A comunidade é a nação. A organização política numa
comunidade natural, portanto, é aquela parte de cultura que funciona, explicitamente, através
de representantes da Tradição, para conduzir as atividades dos membros da sociedade na
direção das metas da comunidade.
Nessas condições admite-se que os conteúdos psíquicos dos indivíduos dentro de uma
sociedade natural sejam fracamente reativos, ou seja, desprovidas de tensões excessivamente
acumuladas, propiciando a expressão de comportamentos ativos (construtivos). A utilização
generalizada de sentimentos, princípios e valores de caráter comum (solidariedade,
generosidade, ética grupal), poderia explicar esse conteúdo construtivo da conduta e da
personalidade dos indivíduos nessas comunidades.
Destrutividade
Um fato ocorrido em uma sociedade natural (aldeia indígena) nos mostra claramente
como esse grupo lida com a destrutividade humana. Vamos ao relato:
Quebrando Panelas
“Uma índia fazia panelas de barro à porta de sua oca. Eram enfeitadas de um lado
com cabeça e bico de pássaro e de outro lado com um rabinho. Seu filho de três anos assistia
esse trabalho e, logo que sua mãe terminava uma panela, ele imediatamente quebrava a
cabeça e o rabinho. Ao terminar outra panela ela repetia o mesmo gesto e seu filho tornava a
quebrar a cabeça e o rabinho. Isso já tinha se repetido tantas vezes que o missionário branco
resolveu perguntar: - Por quê você não faz só o corpo da panela e deixa para colocar a
cabeça e o rabinho quando ele não estiver presente? Ela respondeu calmamente: - Porque
ele gosta de quebrar panelas com as cabeças e rabinhos!
Comentário:
Todo ser humano nasce com potencial destrutivo. Toda criança é naturalmente
destrutiva: morde, bate, quebra. Só aprende a construir a partir de experiências primitivamente
destrutivas. Depois que atua destruindo, passa para uma outra fase de socialização, da
agressão: aprende a reparar e construir. É possível que a índia já soubesse intuitivamente
sobre essa evolução natural dos instintos humanos e deixasse o filho completar naturalmente
essa primeira fase. Como sua cultura valoriza pouco o objeto material, ela poderia estar
valorizando o desenvolvimento normal do filho, mesmo sem saber dessas questões da
psicologia. Nessas sociedades é comum ver-se crianças de cinco a dez anos ajudando suas
mães a enfeitar suas panelas, a tecer cestos, fazer tarefas domésticas, sem serem solicitadas.
Gratidão
Neste relato podemos observar o grau de profundidade a que pode chegar o sentimento
de gratidão e o simbolismo contido nos presentes ofertados a alguém.
O Ovo de Pato
Na Unidade Sanitária estava chegando o sexto índio contaminado pela tuberculose.
Resolvemos visitá-los num fim de semana para examinar os mais de oitenta índios da aldeia
Nazaré na cabeceira do rio Marau, afluente do rio Maués no Estado do Amazonas. Eram
semi-aculturados, em contato com missionários na aldeia a alguns anos.
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Um missionário nos avisou que o tuxaua Paulo (nome do líder da aldeia) queria que
fossemos conhecer sua família e agradecer pelos serviços que prestamos à sua gente. Pediu
que tirássemos fotografias da sua família e no final, num gesto cerimonial, nos deu de
presente um bonito ovo de pato selvagem que havia coletado há alguns dias. A principio não
entendemos nada. O que tinha a ver um ovo de pato com os serviços que fizemos?
Procuramos o missionário e pedimos que explicasse aquilo. Ele arregalou os olhos e nos
perguntou: - Ele deu este presente? – Sim! – respondemos. Os seus olhos azuis brilharam e
ele falou: - Mas essa é a maior honraria que um branco é capaz de ganhar dessa gente. Todo
mundo vai ficar sabendo disso.
Comentário:
O missionário falou que naquela época do ano as chuvas diminuíam de intensidade e,
por conseqüência, os rios diminuíam os seus volumes d’água. Os peixes desciam para rios
mais volumosos e a caça procurava outros lugares para se abastecer de água e comida. Tudo
ficava mais difícil para caçar e pescar e os esforços para conseguir comida aumentavam. O
costume tradicional era coletar e armazenar ovos de aves e répteis (que se conservavam por
muitos dias) para preservar a reserva alimentar da tribo. Havia um código ético de que as
crianças não podiam ficar com fome nesses tempos de escassez. Bom, coletar ovos seria uma
forma de garantir comida às crianças, pelo menos. Reserva alimentar de proteínas para as
crianças, naquela tribo, era uma questão de honra. Ora, tirar da reserva alimentar dos filhos
para oferecer presentes, principalmente para brancos, poderia ser no mínimo um grande
privilégio.
Há algum tempo atrás ficou provada a extrema necessidade que as crianças possuem
pela aquisição de proteínas nessa fase de crescimento. Essa necessidade está voltada para a
construção das estruturas do corpo e do cérebro.
Ritual de gratidão
Esse relato nos mostra a importância que é dada a um indivíduo no grupo, e como se
expressa o sentimento de gratidão manifestado pelo grupo como um organismo inteiro
(identidade grupal).
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Desses tratamentos que fizemos em índios, o caso mais agudo foi o de uma índia de
quinze anos. Chegou na Unidade Sanitária um caco quase sem vida. Estava esquelética.
Pesava menos do que a maca que a conduzia. Era um caso grave e a internamos na própria
Unidade, coisa que não era permitida pelo regulamento. Clinicamente era um caso de
tuberculose, mas, dos três exames de escarro feitos, todos foram negativos. Lembramos da
aula de um grande professor que nos ensinou que existem casos de “tuberculose fechada”,
aquelas que não mostram positividade nos exames de escarro. Acreditamos no diagnóstico e,
quebrando as regras da FSESP (Fundação Serviços de Saú de Pública) iniciamos o
tratamento. Tudo indicava que o raciocínio estava certo.
Três meses depois a índia tinha cinco quilos a mais de peso e recuperou seu peso
normal aos seis meses. Respondia até mais do que o esperado em termos de recuperação.
Estávamos felizes e a visitávamos duas vezes por semana na casa do pastor Ronald, onde ela
estava hospedada. Ela foi liberada para continuar o tratamento por mais seis meses na sua
tribo sob coordenação do mesmo pastor que a hospedara. Ficamos tranqüilos e continuamos
o trabalho na Unidade como de rotina. Meses depois ela voltava para novos exames e, já
tendo completado o tratamento, recebeu alta por cura completa.
Comentário:
Fomos homenageados pela índia, seus parentes e pela tribo com colares que
significavam mais ou menos: “cidadão do povo”, algo parecido com “persona grata” ou
“guerreiro de confiança”, tradução do pastor. Para nós, até hoje, nenhuma quantia em dinheiro
tem mais valor do que essa honraria. Compreendemos que nesses grupos humanos o valor de
uma pessoa é tão grande que pode mobilizar todo o grupo, seja para a guerra, seja para um
gesto de gratidão.
Coletivismo e assertividade
Neste relato podemos observar dois costumes comuns entre grupos indígenas: o senso
coletivo e o sentimento de sinceridade expressiva (sintonia, assertividade).
A Farra de Café
(conhecedor da mata) muito experiente. Conhecia muito bem o lugar para onde estávamos
indo. Tinha o hábito de levar café e açúcar para um grupo indígena que conhecia há alguns
anos e que ficava a meio caminho do local da caçada. Falava um pouco a língua deles e os
respeitava muito.
Contou-me que ao receber o presente, seu amigo índio o entregara para sua mulher
que imediatamente convidou todos os outros índios para uma verdadeira festa. Como se
tratava de um quilo de café e dois de açúcar, eles ficavam bebendo até que todo o café e
açúcar acabasse. Poderiam entrar pela madrugada adentro bebendo café e conversando.
Nunca guardavam e sempre repartiam. O presente dado a um, era o presente para o grupo
todo. Uma questão de costume.
Certa vez convidou um rapaz da cidade para uma caçada e entraram na aldeia para
entregar o café e cumprimentar o amigo índio. O rapaz afastou-se um pouco e começou a
fazer gracinhas com índias que o rodearam para vê-lo de perto, pois era um desconhecido
para o grupo. Despediram-se e continuaram a caminhada. Na volta o rapaz pediu para que
entrassem de novo na aldeia, pois ele queria receber arcos e flechas de presente. O mateiro
falou para o índio que o rapaz queria arcos e flechas. O índio se retirou e logo voltou com
dois arcos e seis flechas muito bonitos e enfeitados com penas de pássaros. Falou para o
mateiro: - Isso é seu ! Para ele não daremos presentes e nem queremos receber. Ele não é
amigo do nosso povo. Ele é gente ruim...!
Comentário:
Os índios percebem com facilidade as intenções dos brancos que visitam as aldeias.
Guardam na memória os gestos e as palavras que conseguem entender. Cultivam a amizade,
mas não gostam de ser humilhados. Quando repelem uma amizade dificilmente mudam de
idéia depois. São simples e sinceros e falam o que sentem na frente das pessoas. Não possuem
o hábito de mentir ou falsear seus pensamentos e sentimentos.
A Volta
Comentário:
Não é fácil trocar um grupo humano integrado e solidário por uma “civilização” cheia
de problemas, onde as pessoas são tratadas de forma desumana.
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Neste relato podemos observar como os hábitos e costumes gerados pela tradição
funcionam na convivência em uma cultura integrada.
A Distribuição da Comida
Já estava quase escuro quando um grupo de quatro índios entrou na área da aldeia
com duas grandes pacas penduradas nas mãos. Foram seguidos por crianças e jovens
curiosos que falavam e riam o tempo todo. Deixaram as pacas sobre uma esteira no barracão
e se retiraram. Mais duas mulheres se aproximaram e começaram a preparar as pacas para
assar. Quando tudo estava pronto as crianças se aproximaram e começaram a tirar pedaços
do assado para comer com beijú (espécie de pão feito de mandioca). Depois vieram os velhos
seguidos das mulheres. Por último chegaram os homens e comeram o que restava da caça.
Não sobrou nada.
Comentário:
O missionário explicou que, naquele grupo, as crianças tinham prioridade para servir-se, em
segundo lugar vinham os velhos, depois as mulheres e por último os homens. Comer
coletivamente obedecia a costumes muito antigos ensinados pelos mitos e pela tradição.
Todos conheciam esses critérios e não avançavam desordenadamente para comer.
Poligamia e monogamia
Neste relato podemos observar como hábitos e costumes tradicionais geram valores
que regulam a força dos instintos no grupo.
Foi perguntado a um índio adulto se ele não queria ter duas ou três mulheres. Sua
resposta foi simples: - Tem gente que gosta de ter mais de uma. Eu só gosto de ter uma.
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Comentário:
Nesses grupos a maior humilhação que um guerreiro (homem adulto) pode sofrer se
baseia na sua incapacidade de conseguir alimento suficiente para sua família. Deixar filhos e
mulher com fome é muitas vezes pior do que ser chamado de homossexual, ladrão ou
covarde. Como em determinadas épocas do ano a caça e a pesca se tornam bem escassas, fica
muito difícil alimentar muitas bocas. Cair no ridículo perante todos do grupo seria o resultado
final dessa incompetência demonstrada pelo guerreiro.
Vamos raciocinar: Um guerreiro com sua mulher e dois filhos teria que alimentar
quatro bocas; se tivesse mais uma mulher e dois filhos, teria que alimentar sete bocas; se esse
número aumentasse o guerreiro não teria tempo para fazer mais nada e sua vida estaria restrita
a caçar e pescar grande parte de seu tempo. Não poderia mais conversar e divertir-se. Prover
com alimento suficiente sua família é uma questão de honra que um guerreiro deseja manter
sempre.
Neste relato podemos compreender como a verdade e o acordo são valores de grande
importância em sociedades que não utilizam a fraude e a mentira como mediadores das
relações no grupo.
A lanterna quebrada
Numa aldeia, ás margens do rio Catrimân, nas florestas da serra Parima em Roraima
residia um grupo de índios Ianomâmi. Era um grupo recentemente contatado, andavam nus e
mantinham grande parte de sua cultura tradicional. Eram aproximadamente noventa índios.
Lá tinha sido instalada uma missão católica (Missão Catrimani) há pouco tempo. Os padres
João e Carlos moravam numa casa de madeira a cem metros da maloca. Entramos com uma
equipe de pesquisas para coletar sangue e material da garganta dos índios com o objetivo de
descobrir que tipo de vírus estava matando os índios de pneumonia em outros locais da
região.
Descemos do pequeno avião num campo de pouso todo de terra, a poucos metros da
casa dos padres. Logo ao descermos vieram algumas crianças para ver o avião e olhar
curiosamente para nós.
Mais tarde nos contou: o índio havia trocado aquela lanterna velha com um homem
branco (peão de construtora de estradas) que estava caçando por aquelas bandas. Ele havia
dado em troca um porco-do-mato inteiro e mais alguns arcos e flechas. Disse ele que o
branco afirmara que aquele objeto fabricava luz e ele podia enxergar a noite. Depois o
branco mandaria as pilhas e a tampa de trás. Nunca cumpriu sua palavra e já tinha passado
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dois meses. O índio estava querendo entender porque o homem branco não cumprira o que
prometeu e estava demorando tanto.
Comentário:
O padre João explicou para nós que naquele grupo eles não conheciam a mentira. No
ramo lingüistico deles não havia qualquer palavra referente a enganar, mentir, descumprir.
Não conheciam esse hábito civilizado e o padre estava em dúvida se deveria colocá-lo a par
da realidade branca, onde uma pessoa pode enganar a outra. Ele aprenderia esse costume novo
e o contaria para os outros índios, contaminando assim aquela cultura pura e sem maldades.
Mas um dia teria que falar sobre isso, pois a civilização estava se aproximando da aldeia com
a abertura da estrada.
Controle populacional
Poucos filhos
Um dia perguntamos ao padre João porque uma família indígena tinha sempre uma
média baixa de filhos. Eram sempre dois ou três os filhos de um casal. Ele citou as razões
ligadas ao número de bocas a alimentar e falou sobre um possível uso de anticoncepcionais
naturais pelas mulheres. Mas não tinha certeza dessa utilização de anticoncepcionais. Falou
apenas que as mulheres se reuniam periodicamente dentro da mata e parece que faziam chás
com uma espécie de batatinha semelhante ao gengibre. Não sabia dizer para que servia, e se
aquilo tinha alguma coisa a ver com o controle da natalidade. Nessas reuniões a presença
dos homens não era permitida pela tradição.
Comentário:
Atualmente o controle populacional é função dos governos. A forma de distribuição
dos bens produzidos determina quem pode e quem não pode comer. Mas a reprodução é um
bem individual determinada pelo indivíduo. É possível que as famílias numerosas e a
superpopulação sejam reflexos da desorganização social entre brancos, uma espécie de
“compensação desviada” para garantir a sobrevivência.
Uso da etiqueta
Neste relato podemos perceber como, em grupos que adotam o princípio da verdade,
não são aceitas as convenções falsas utilizadas de forma generalizada e automática pelas
sociedades civilizadas.
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Os Cumprimentos
Nessa mesma aldeia onde morava o padre João, após descermos do avião, nos
dirigimos para a casa dele. No alpendre já havia um pequeno grupo de índios e índias
reunidos. Ao entrar cumprimentamos a todos e nenhum gesto de retribuição foi feito.
Ninguém respondeu ao cumprimento. Os outros dois médicos também fizeram o mesmo e
nada aconteceu. Silêncio total.
Entre eles, a palavra “amigo” tem valor real. Amigo é amigo, inimigo é inimigo.
Como não se mente, tudo o que é dito é compreendido como verdade inquestionável. Falou
que podíamos olhar a vontade para o corpo nu deles, pois, para eles, eles não se sentiam nus.
Eles também não se sentiam constrangidos em olhar para nós, chegar bem perto e até nos
tocar. Eles não reprimem a sua curiosidade e são muito autênticos.
Comentário:
Supomos que o cumprimento entre os civilizados, na grande maioria das vezes, é feito
de forma mecânica e obrigatória. Nós cumprimentamos sem sentirmos essa vontade, e para
ver como anda o humor da outra pessoa ou para nos sentirmos educados. Na verdade achamos
chato ter que cumprimentar sempre. Estamos sempre desconfiados em saber se somos aceitos
pelos outros ou não. Quase sempre cumprimentar é um gesto hipócrita.
Moral e nudez
Neste relato podemos perceber como, em grupos que adotam princípios morais
organizados, a nudez e a moral possuem regras diferentes das existentes nas sociedades
civilizadas.
O Cipó
O padre Carlos estava há pouco tempo na aldeia. Havia chegado da Itália e fora
encaminhado para trabalhar na missão Catrimani, para ajudar o padre João. Quando um ia
à cidade resolver questões de rotina, o outro ficava com os índios. Ainda estava aprendendo
os costumes do grupo.
Um grupo de índios composto de homens, mulheres e crianças tinha o hábito de
descer de tarde para o igarapé (pequeno afluente do rio), para tomar banho. Era uma festa,
nadavam, conversavam e se divertiam muito nessas horas. Nessa tarde, ao passarem em
frente à casa dos padres, convidaram o padre Carlos para descer com eles. O padre foi vestir
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seu calção e os acompanhou pelo caminho que levava ao igarapé. No caminho, passando por
um índio jovem, o convidou para seguir o grupo. O índio fez um gesto negativo com a cabeça
e parecia encabulado. Vestia um calção vermelho e desbotado, produto de troca com um
branco da estrada. O padre se aproximou e perguntou por que ele não queria ir. Ele falou: -
Estou sem cipó !
Comentário:
Para esses índios a roupa do branco era tratada como simples ornamento, como se
fosse um colar ou pulseira. Estar vestido, para um homem da tribo, significava ter seu
prepúcio (pele que envolve a cabeça do pênis) amarrado por um cipó fino, levantado para
cima e amarrado em volta da cintura. Isso sim era estar vestido. O calção, embora encobrindo
seus genitais, não lhe dava a sensação de estar vestido. Seria uma falta de vergonha ir tomar
banho junto com o grupo daquele jeito. Ele preferia ficar assistindo os outros se divertirem
mas não quebraria a tradição. Estava se sentindo nu sem o cipó.
Humor
Este relato mostra como o ambiente (floresta) fornece substrato para um humor
analógico entre homem e animal expondo o homem ao ridículo quando este se comporta de
forma semelhante aos animais. Mostra também como a tensão entre os brancos pode produzir
tiques e gesticulações exageradas que podem expressar certa conduta ansiosa.
Risos na Canoa
Eram dez horas da manhã e os dois padres tinham de atravessar o rio para pegar
mantimentos que estavam do outro lado. Naquele trecho a correnteza era forte, o rio tinha
quase cem metros de largura e logo abaixo, a uns duzentos metros, havia uma cachoeira alta
e perigosa para quem não a conhecia. Pediram a dois índios fortes que o ajudassem a
atravessar.
Cada qual com um remo, ocuparam a proa e a popa da canoa. Durante a travessia os
padres começaram a conversar em italiano e o padre Carlos entusiasmado, gesticulava
muito. Os índios achavam engraçada aquela conversa e começavam a rir, parando de remar.
Comentário:
A condição psicomotora do branco (excesso de palavras e de gestos) é diferente da dos
índios. Enquanto nós falamos e gesticulamos muito (expressão de ansiedade) eles só usam as
palavras e gestos suficientes para se comunicar (expressão de pouca ansiedade). Eles
comparam os brancos com os macacos ou micos que, segundo eles, tem gestos parecidos com
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os dos brancos. O padre Carlos sabia disso e pediu para o outro padre se calar e encerrar a
gesticulação. Deu tudo certo.
Uma das coisas que mais impressiona entre os índios é a obediência quase sagrada aos
seus costumes tradicionais. Os conceitos de: individual, coletivo, liberdade e verdade são
usados de forma tão coerente e flexível que chega a ser de difícil compreensão para nós.
O Arco
Um guerreiro saiu de sua casa e atravessou o terreno central da aldeia. Bem no meio
do caminho abaixou-se, deixou seu arco e flechas no chão e se embrenhou na mata. Poucos
minutos depois sua mulher fez o mesmo percurso e notou no chão o arco e flechas do marido.
Identificou e seguiu, sem parar, para o seu destino. Mais alguns minutos e o guerreiro voltou,
retomou suas armas do chão e penetrou na floresta.
Comentário:
A maioria das pessoas não teria notado qualquer importância nisso que acabamos de
narrar. Mas perguntamos: o que é que a maioria das mulheres branca faz quando encontram
um objeto do marido no chão?
Para certos grupos os objetos pessoais são de propriedade de uma pessoa apenas. Só
deixam de ser quando é autorizado, pelo proprietário, outro tipo de uso. Nenhuma outra
pessoa deve exercer qualquer tipo de poder sobre ele sem autorização, como por exemplo:
trocá-lo de lugar, pegar sem pedir, etc. Cada pessoa é o único detentor do poder sobre seu
objeto pessoal e quando essa pessoa morre, seus objetos são enterrados com o corpo, pois
nenhum objeto pode sobreviver ao seu dono. Os objetos usados em cerimoniais sagrados só
podem ser tocados por certas pessoas do grupo durante os rituais; encerrada a cerimônia ele
passa a ser um objeto qualquer que pode ser usado livremente e até servir de brinquedo para
as crianças. Em vários grupos o objeto é visto pelo seu valor utilitário (função) e não possui
valor comercial. O que uma pessoa faz ou deixa de fazer com seus objetos é de sua inteira
responsabilidade, e ninguém se sente com direito de emitir qualquer tipo de comentário.
Comentar seria invadir a privacidade e se intrometer na individualidade do proprietário, coisa
ridícula para eles.
Crime e tradição
Uma das questões mais difíceis de compreender entre os brancos é a diferença entre
crime e costume. Enquanto em certas sociedades naturais o infanticídio é consenso, nas
sociedades civilizadas passa a ser crime.
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O missionário, falando sobre os costumes daquele grupo, contou que nos casos de
nascimento de gêmeos, o costume tradicional era sacrificar um deles, geralmente o menor e
mais fraco (seleção natural). Contou que uma índia grávida estava com a barriga muito
volumosa e entre as mulheres corria um comentário que ele não conseguia compreender. Os
comentários estavam ligados a um mito relacionado a esse tipo de ocorrência, aliás, bastante
raro, nesse grupo. A tradição dizia que a gravidez gemelar era uma interferência de espíritos
destrutivos da floresta que tencionavam introduzir no grupo, um espirito que teria como
objetivo promover distúrbios dentro da tribo. Como em outros grupos, eles acreditam que as
entidades espirituais são seres da floresta que geralmente estão sob forma de animais
(zoomorfismo) e que em certas circunstâncias (nos partos, por exemplo) assumem forma
humana para desorganizar a vida na tribo, produzindo atritos entre as pessoas. O indivíduo
menor e malformado é identificado como um desses seres. Confesso que a minha primeira
reação foi de repúdio ao fato. Muito depois consegui compreender que a força da tradição
torna-se mais forte para proteger o grupo em detrimento do indivíduo, o que, aliás, é um
princípio geral das comunidades naturais.
Comentário:
Um paradoxo visível nas sociedades civilizadas é a forma incompreensível de se
indignar com um caso desses, enquanto ficamos passivos diante de espancamento (e
abandono) de crianças e das mortes de jovens e adultos, por motivos fúteis, que já não nos
sensibilizam tanto hoje em dia. O que é crime, então?
Guerra e diplomacia
O ataque
Numa certa manhã, bem cedo, a aldeia foi atingida por uma saraivada de flechas
disparadas por um grupo ianomâmi vizinho. O missionário disse que não conseguia
compreender como os agressores, após o ataque, haviam fugido tão rapidamente levando
consigo duas mulheres, sem ferir qualquer dos membros do grupo. Comentários sobre o
ataque foram o assunto durante todo o dia. A tradição dizia que a dignidade do grupo havia
sido atingida e que um contra-ataque deveria vir em seguida, um consenso que teria como
objetivo devolver a autoconfiança dentro da tribo. O missionário, falando sobre os costumes
daquele grupo, contou que nos casos de conflito, o costume tradicional era responder
primeiro ao agravo, para depois fazer as pazes. Como em outras aldeias, eles acreditam que
os grupos possuem personalidade forte e que não podem ser desrespeitadas sob quaisquer
circunstâncias. Foi formado um conselho que identificou o inimigo pelas características das
flechas e marcou um contra-ataque para o dia seguinte. Após efetuarem as pinturas de
guerra e o preparo das armas, lançaram-se á ofensiva. Meses depois haviam marcado uma
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festa de confraternização que resultou em troca de mulheres e objetos fabricados por cada
grupo. Conseguimos compreender que a força da tradição torna-se mais forte para proteger
o grupo, mas, ao mesmo tempo, valoriza a diplomacia como base de convivência intergrupal,
o que, aliás, facilita o comércio e evita a consangü ineidade nas comunidades naturais.
Comentário:
O que mobiliza as guerras nas sociedades civilizadas são motivações tão mesquinhas e
dissociadas de interesses coletivos que as vítimas muitas vezes morrem sem saber porque (e
por quem) estão lutando.
Liberdade e individualidade
Pai, mãe, chefe ou pajé não ousam se intrometer na individualidade das crianças,
jovens ou adultos, pois desde pequenos aprendem que são responsáveis, cada um por si, sobre
seus atos, palavras e objetos. Sabem reconhecer com precisão os territórios do individual e do
coletivo para não serem motivo de risos dos outros. Cultivam a liberdade para se sentirem
livres, pois um cidadão ou cidadã adulta sabe escolher e sabe o que fazer; cultivam a verdade
para se sentirem autênticos consigo próprios e sintonizados com o grupo. Preservar o
individual, o coletivo, a liberdade e a verdade são hábitos tão automáticos que a discussão,
entre eles, sobre esses assuntos não teria qualquer sentido lógico.
* Os relatos acima citados foram baseados em fatos reais, coletados em diferentes grupos
indígenas da Amazônia, em tempos e circunstâncias diferentes, através de observação pessoal
do autor ou transmitidas por pessoas idôneas que conviveram nesses grupos por longo tempo.
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CAPÍTULO V
Pensando sobre fatos históricos que possam ter iniciado o processo reativo nos seres
humanos imaginamos, que num primeiro momento, onde a vida grupal estivesse associada à
segurança e proteção dos indivíduos, alguns sentimentos, obrigatoriamente, impusessem os
seus usos, como por exemplo, a necessidade de usar a solidariedade como forma de
compensar a tecnologia ainda rudimentar. No grupo estaria depositada toda a razão de viver
em segurança. A solidariedade poderia representar, então, o sentimento de união e força dos
grupos.
Nas sociedades competitivas, onde as diferenças sociais são desproporcionalmente
acentuadas, onde os valores circulantes entre indivíduos produzem expectativas
megalômanas, os indivíduos estão mais sujeitos a desajustes do psiquismo e do
comportamento. Essas expectativas individuais possuem um conteúdo de reatividade bastante
exagerado, produzindo desejos fantasistas de posse, posição social e poder. Esses desejos
possuem caráter compensatório com objetivos de livrar esses indivíduos do que eles
imaginam ser condições perigosas e humilhantes. Portanto, a mente – no plano das relações –
configura-se para responder aos estímulos e solicitações do meio social, quase sempre
priorizando os valores circulantes. Ser pobre, não ser ninguém na vida e estar subjugado por
outros, cria um imaginário obsessivo que empurra a maioria das pessoas para aspirações que
podem representar a “solução” desejada para essas situações:
A Mesopotâmia sempre foi tida como o berço da civilização. Alguns autores ainda
admitem que foi no Oriente Médio que surgiram as primeiras manifestações civilizadoras. A
região da Suméria segundo alguns historiadores passou a ser habitada entre 3.500 a 4.000
anos antes de Cristo.
SUMÉRIA
...........................................................
Homens e mulheres carregavam, este um vaso de barro, aquele uma taça de pedra ou
de metal e se aproximavam duma cratera de cobre contendo veneno, depositada no centro do
jazigo; enchiam as taças e bebiam-lhe o conteúdo. Criados abatiam os animais encerrados
na tumba e depois se retiravam. Enchia-se em seguida o corredor de acesso. Segundo o
professor Woolley, as vítimas eram voluntárias; em nenhuma parte foram encontrados traços
de violência. Era a morte considerada como uma libertação, como as primícias de uma
existência feliz num mundo melhor. Diademas, jóias e objetos estão no seu lugar, dispostos
no local fixado e parece mesmo que os músicos tenham continuado a tocar até seu derradeiro
suspiro.
Uma coisa é, em todo o caso, certa: esses holocaustos não eram, como o acreditaram
certos sábios, sacrifícios de virgens oferecidos aos deuses. Na realidade, as vitimas
masculinas são maioria.
....................................................................
Foi nessa época, a mais sombria da história de Lagash, que um príncipe, o célebre
Urucagina, assumiu o poder; suprimiu as taxas abusivas e os padres-funcionários cujas
exações empobreciam a população. O clero foi obrigado a retomar suas funções e a
consagrar-se exclusivamente ao serviço do deus da cidade; o "Ensi" o governador, tornou-se
de novo o primeiro magistrado da cidade. Urucagina, o reformador, cuidou em assegurar o
bem-estar de seus súditos e foi, com justiça, que, na sua velhice, se glorificou de ter dado a
liberdade a seu povo. Infelizmente, seu reino durou um pouco menos de dez anos.
Partido do Estado vizinho de Umma, o rei sumeriano Lugalzamisi caiu sobre Lagash,
depôs Urucagina, apoderou-se dos bens dos ricos proprietários, mandou assassinar centenas
de cidadãos, pilhou os templos e fundou em Uruque, um novo reino. A população aceitou sua
sorte com paciência; os deuses tinham querido assim. Quando soou a hora fatídica para os
sumerianos?
Foram absorvidos, tais como os tunguses pelos chineses, os etruscos pelos romanos,
os vênedos pelos germanos. Ao atingirem o apogeu de sua civilização, foram os sumerianos
substituídos pelos semitas, vindos da Arábia, os quais se fixaram no país de Acádia. Sargão I,
personagem histórico, tornou-se uma figura legendária. Criador do reino de Acádia, fundou
Sargão uma dinastia que se manteve de 2.350 a 2.150, antes de J.C. O rei era deificado e seu
reino uma teocracia. A dinastia semita contou vários soberanos capazes: Sargão I, seus
filhos Rimus e Manistusu e seu neto, Naranisin.
Sargão teve como pai um tal La'ipu e como mãe uma sacerdotisa. Segundo a lenda
sumeriana, depois de haver colocado o recém-nascido num cesto de vime tapado com barro,
sua mãe confiou o menino à corrente do Eufrates e voltou ao santuário onde oficiava. Um
jardineiro, de nome Akki, encontrou o jovem Sargão, criou-o e fez dele o copeiro de
Ur-Zabatan, rei de Kisch. Um dia, cansado de levar a taça aos lábios do rei seu amo,
apoderou-se Sargão do trono. Derrotou Lugalzaggisi e mandou-o expor numa jaula, em
Nipur, diante do templo de Enlil. Depois de ter conquistado todo o país da Suméria, ao
chegar às margens do Golfo Pérsico, lavou Sargão suas mãos nas águas do mar. Mais tarde,
tornado senhor da Anatólia, fundou o primeiro grande império da história.
73
Um novo povo, o dos Guti, destruiu o império semita de Acádia, que formou daí por
diante um mosaico de cidades-Estado. Em Lagash, onde reinava uma dinastia sumeriana, o
rei Gudéa detinha o poder; estátuas de diorita, que representam esse soberano, estão
conservadas no Louvre e em outros museus.
..................................................................................
O texto conta que o rei Ur-Nammu demitiu funcio nários prevaricadores, reformou o
sistema dos pesos e medidas e preocupou-se em melhorar a sorte das viúvas, dos órfãos e dos
pobres. “O homem que possui um siclo não deve ser a vítima do homem que possui uma mina
(60 siclos). O que corta o pé de outrem expõe-se a uma multa de 10 siclos. Quebrar os ossos
de seu próximo custa uma mina de prata. Mas quebrar nariz de outrem só custa dois terços
de uma mina." O professor Kraminer tem razão em afirmar que essa coleção de leis está
baseada em um código anterior.
A babilônia teve seu apogeu entre 1.750 e 562 a.C. Dois reis, Hammurabi e
Nabucodonosor, se destacaram; seus reinados coincidem com o início e com o fim do período
mais próspero da Babilônia.
BABILÔNIA
O que foi a Babilônia e a Assíria corresponde ao Iraque atual; Iraque significa: “País
das Costas”. Foi sobre as aluviões do Tigre e do Eufrates que se criou uma grande
civilização e que se fundaram cidades florescentes. Ali se situa a origem da história do
Ocidente.
Outrora, o Tigre e o Eufrates tinham cada um sua embocadura, mas, com o tempo, o
volume dos aterros foi tal que os dois estuários se confundiram; os dois rios lançam-se agora
no Golfo Pérsico a cento e cinqüenta quilômetros mais a sudeste do que na época de
Babilônia e de Assur. Essas aluviões não encerram vestígio algum, mas o "pais entre os rios"
contém-nos com tal quantidade que serão precisos séculos para esgotar as riquezas que
dormem sob seu solo.
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Cidades e monumentos foram reduzidos a pó. São raposas seus principais habitantes
e somente o ladrido sinistro do chacal perturba por vezes o silêncio. E, no entanto, sabem os
arqueólogos que essa terra ingrata oculta em seu subsolo milhares de casas e de túmulos de
que ninguém jamais desvendou o segredo; por toda parte, valados, montículos, marcam a
localização das cidades e povoações desaparecidas. As cidades são como as criaturas;
nascem, vivem e morrem. Os materiais de que são feitas esboroam-se e acumulam-se. No sitio
ocupado por uma cidade destruída, nova cidade se funda que, por sua vez, prospera e
periclita. Cada vez o montículo se alteia mais. Em conseqüência da superposição das
camadas estratigráficas as escavações devem ser conduzidas com o maior cuidado. E tanto
mais isto quanto, freqüentemente, o amontoado de escombros serviu de subestrutura a uma
aglomeração moderna. Todas as civilizações estão destinadas a reduzir-se a pó; chega um
momento em que o edifício demasiado perfeito vem abaixo.
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Os viajantes que, há três mil anos, se dirigiam para a Babilônia avistavam ao longe
um imenso edifício erguido para o céu: um ziggurat, isto é, uma torre com andares. No alto
se encontrava um templo; o interior era ocupado por uma mesa de ouro maciço e por um
leito magnificamente decorado; todas as noites, uma mulher jovem ali se estendia, à espera
da visita do deus supremo. Segundo a Bíblia, esse ziggurat: teria sido a torre de Babel,
descrita no primeiro livro de Moisés; elevava-se, dizem, ate o céu. Mas, se tal foi o projeto
dos que a edificaram, jamais o realizaram; todas as vezes que os homens tentaram chegar às
esferas celestes, foram vítimas de sua ambição. Finalmente, os deuses de babilônia tiveram
de inclinar-se diante de Jeová, deus de Israel. Ao sul do grande ziggurat elevava-se o
gigantesco templo de Marduque; a seu sopé estendia-se Babilônia, atravessada de largas
avenidas e de barulhentos becos onde se misturavam odores fétidos e perfumes de mirra. A
multidão se comprimia nos bazares. Flanqueada de cento e vinte leões, uma estrada sagrada
levava ao arco de Ishtar.
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permitiram a valorização de terras até então áridas. Secos desde séculos, podem esses canais
ser facilmente identificados dos ares.
Mas, nos derradeiros anos de seu reino, embriagado pelo exercício do poder,
mergulhou Nabucodonosor numa estranha loucura: pensando ser um animal andava de
quatro pés, urrava e comia capim como um bicho.
Seu sucessor, Nabonid, foi mais um sábio que um rei guerreiro; apaixonado pela
arqueologia, passava seu tempo a estudar a civilização sumeriana.
Como nossas grandes cidades, era Babilônia cercada de subúrbios; esta passagem
duma carta dirigida por um "suburbano" a Ciro dá o testemunho disso: "Nossa propriedade
parece-me a mais bela do mundo, porque esta bastante perto de Babilônia para podermos
aproveitar-nos das vantagens da grande cidade; de volta para casa, estamos entretanto longe
da agitação e da poeira".
uma casa vinha abaixo, esmagando seu proprietário, o arquiteto era condenado à pena
capital; quebrar um braço ou perna de outrem, era expor-se a ter a perna ou o braço
quebrado por autoridade judiciária. Se um homem matava uma mulher, a filha do assassino
era também morta. Mais tarde, a reparação foi substituída pela compensação. As
penalidades que atingiam os ricos e os nobres eram mais severas que as que sancionavam os
delitos cometidos pelos pobres. Concebe-se que, nessas condições, a situação dos médicos
não era nada invejável; quando, durante uma operação, o doente passava da vida para a
morte, corta va-se a mão do cirurgião. Acusar alguém sem razão custava caro, se se viesse a
provar que o acusador mentira.
EGITO
(ALEXANDRE SCHARFF)
Trinta dinastias se sucederam no trono dos faraós, de 2.850 a 332 antes de J. C., até o
dia em que Alexandre, o Grande, estabeleceu seu domínio sobre o Grande Egito. O ilustre
historiador Eduardo Meyer faz remontar o começo da primeira dinastia a 3.200 antes de
nossa era. Estima -se que Menés, fundador da primeira dinastia, tenha reinado aí por 2.850
antes de J. C.; seu reinado coincide com o começo da história egípcia que durou três mil
anos. De fato, o que se chama o "período histórico" resulta duma classificação arbitrária
porque, dois mil anos mais cedo, já eram os egípcios civilizados.
Quinze, vinte ou trinta mil anos antes do começo da história egípcia, estava o homem
estabelecido nas alturas que dominam o vale do Nilo, onde se estendiam vastos mangues.
Qual era seu aspecto? Ninguém o sabe; só se conhecem os seus utensílios. E esses utensílios,
de pedra, os mais antigos que se conhecem, são em toda parte os mesmos. Pouco importa que
tenham sido encontrados no vale do Nilo, nos desertos que o bordam, na África do Norte ou
na Europa Ocidental, há trinta mil, cinqüenta mil ou mesmo oitenta mil anos, o "homo -
sapiens", habitante da Euro-África, tinha uma só e mesma civilização.
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fim da duodécima dinastia, fazia-se sentir a ausência de autoridade; sem cessar, os chefes
militares tentavam assenhorear-se do poder e o Egito, impotente, era uma presa sonhada
para invasores. É uma lei da história que os conquistadores instalados num vale fértil
mergulhem pouco a pouco na ociosidade, esgotando-se-lhe a energia. Sob os derradeiros
soberanos da décima sétima dinastia tebana, os egípcios se sublevam e após uma guerra de
libertação, põem os faraós da décima oitava dinastia para fora e fundam um poderoso
império.
Uma mulher, a rainha Hachepsut, imprimiu sua marca nesse período da história
egípcia; reinou de 1.501 a 1.479 antes de J. C. Como era de tradição que os monarcas
egípcios descendessem do deus Amon, Hachepsut contornou a dificuldade e fez-se proclamar
de sexo masculino e de descendência divina. Nas pinturas e esculturas, fez-se representar
vestida de homem e trazendo barba. Embelezou e aumentou o templo de Car naque que ornou
de dois imponentes obeliscos; em Der -elBaliri, construiu um magnífico mausoléu. Por fim,
fez o que seu pai e seu avô tinham sonhado realizar, cavando uma tumba nas montanhas...
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O irmão de Hachepsut, Tutmés III, foi o fundador do grande império egípcio que se
estendeu do Sudão até o Eufrates.
Foi o maior soberano da época. Casado muito moço com sua irmã, teve Tutmés a
principio de abandonar o poder à ambiciosa Hachepsut. Mas, ao tornar-se maior, mandou
Tutmés assassinar sua mulher e seu amante Senmut e fez desaparecer o que evocasse
lembrança de sua "irmã bem amada". Por tanto tempo recalcados, a energia e o dinamismo
de Tutmés III viram-se de súbito libertados; conquista a Palestina e a Síria até o Eufrates. A
narrativa de suas campanhas guerreiras - duraram dezesseis anos - está gravada na pedra,
nos muros do templo de Carnaque.
Amenófis II, seu sucessor, grande caçador e atirador de arco, sufocou no sangue a
revolta síria. Esse faraó não era terno para com seus inimigos. A crônica relata que levou a
Tebas sete reis asiáticos acorrentados. Seis foram enforcados nos muros da cidade e o sétimo
em Napata, cidade situada ao sul da capital. Atribuem-lhe numerosos atos de bravura, mas
não é duvidoso que, durante os vinte e seis anos que durou seu reinado, tenha sabido cuidar
de sua reputação.
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Pouco depois de 1.400 antes de J. C., Amenófis III pôs na cabeça a tiara; sob seu
reinado, o império atingiu o apogeu de sua riqueza e de seu esplendor. A irradiação de Tebas
era comparável à da Paris de nossa época. Seus mercados viviam cheios dos produtos do
mundo inteiro e seus edifícios ultrapassavam em magnificência os de todas as capitais
conhecidas.
Meirmon que continuam a montar guarda, de rosto voltado para Tebas, diante do imenso
mausoléu, agora desaparecido, daquele faraó.
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O viajante que visita o Egito ouvirá muitas vezes o grito: “Ramsés voltou!” Ramsés
II, egocêntrico e monômano, fez-se representar, sempre que pôde, nos monumentos do Egito.
Quase a metade das ruínas são as dos edifícios construídos em seu reinado. Terminou a
grande sala de Carnaque, aumentou o templo de Lucsor, elevou um grande santuário, o
Ramesseum, que traz seu nome, mandou erigir estátuas colossais de sua efígie, em todo o
território e restaurou o canal, do Nilo ao Mar Vermelho. Teve várias centenas de mulheres, o
que aliás não surpreende os egípcios, uma vez que não fazia senão imitar seus predecessores.
A tradição refere que teve cem filhos e cinqüenta filhas; algumas se tornaram mesmo esposas
de seu pai, o que, no Egito, era conforme aos usos. Depois de um longo reinado de sessenta e
sete anos, morreu Ramsés com a idade de noventa anos. Um século mais tarde seu nome era
odiado e a dinastia que fundara se extinguiu com seu sucessor. Mas sua múmia se conservou
praticamente intacta; 67 anos de reinado, 90 anos de existência e 3.000 anos de permanência
nas profundezas de uma tumba mal alteraram as feições desse faraó.
Sob esse reinado de Ramsés III, o poder e a riqueza do clero de Amon aumentaram
em proporções consideráveis. Os celeiros clericais regurgitavam de trigo; um exército de
107.000 escravos servia os padres de Amon. Abstração feita dos exageros habituais, essa
cifra de 107.000 escravos corresponde à expressão antiga: "havia muitos". E, admitindo que
a cifra da população egípcia tenha sido de 5 a 6 milhões, um homem dentre cinqüenta ou
sessenta egípcios era escravo do clero. O Museu Britânico possui um documento, o papiro
Harris; é o mais longo texto egípcio conhecido: mede 40,5 metros de comprimento. Muito
bem conservado, contém a enumeração pormenorizada dos presentes e dos dons feitos pelo
faraó Ramsés III aos templos egípcios. Disso ressalta que a sétima parte das terras aráveis
pertencia a Amon e a seu clero: este era, além disso, proprietário de 169 cidades do Egito, da
Síria e do país de Kuch, de uma frota de 88 navios, e de 500.000 cabeças de gado.
O número dos dias feriados era igual ao dos dias de trabalho; dessa situação tirava o
clero de Amon substanciais benefícios. De fato, os faraós eram rebaixados ao lugar de
criados dos servidores dos deuses; o poder e o prestígio reais decresciam à medida que
aumentava o poder do clero. A situação de Ramsés era cada vez mais precária e o faraó teve
de apelar para mercenários estrangeiros a fim de defender o Egito. A tentativa de assassinato
de que foi vítima o soberano é característica do estado de espirito que reinava então; foi
urdida a conspiração, como acontece freqüentemente no Oriente, no harém real. Uma das
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favoritas tencionou pôr a tiara na cabeça de seu filho; aliciou as mulheres de seus oficiais
que guardavam a entrada do harém e persuadiu-os a atentar contra a vida de Ramsés. Os
conjurados asseguraram-se em seguida o concurso de personalidades influentes. Mesmo
depois da descoberta da conspiração, quando Ramsés dera ordem de castigar os culpados,
conseguiram as mulheres do harém, se bem que acusadas, corromper dois juizes e
conquistá -los para sua causa. Processados, tiveram os juizes o nariz e as orelhas cortados.
Um deles suicidou-se; trinta e dois dignitários e altos funcionários foram solicitados a
seguir-lhe o exemplo. Mas Ramsés III sobreviveu pouco tempo à conspiração urdida contra
ele e morreu em 1.167 antes de J. C. Sintomas alarmantes: domínio clerical, intrigas de
serralho, conspirações e invasão do país por estrangeiros eram os sinais precursores da
ruína do Egito.
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Tudo quanto faz a grandeza da civilização egípcia, sua arte prestigiosa, a energia
desenvolvida pelos faraós, o talento dos artistas e dos artífices, a concepção tipicamente
egípcia da existência, as relações secretas existentes entre o Nilo e a população ribeirinha,
passou; esse período, único na história da humanidade, não se reproduzirá nunca mais. O
Egito é o cenário em que se representou o drama de uma civilização, a maior das que
floresceram em nosso globo; tendo atingido quase o zênite, ainda não retombou em pó.
Provinda da alma humana, nascida duma autêntica crença, essa civilização foi a
vida; por isso é que foi tão duradoura e tão grande.
Quem diz morto, diz separação da alma e do corpo. Mas os egípcios acreditavam que,
por ocasião da inumação os padres evocavam a alma e esta se juntava ao corpo, de novo. Em
vista dessa união era, pois, indispensável assegurar a conservação do cadáver; assim, se
explica que tenham os egípcios embalsamado milhões de defuntos, e não somente seus faraós,
mas todos aqueles que fossem bastante ricos para pagar as despesas de um embalsamamento.
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Por ocasião dos banquetes, faziam-se os egípcios untar e coroar de flores por
escravos; o vinho e a cerveja eram bebidas favoritas. Uma inscrição compara convivas
ébrios a “Um leme quebrado que não obedece nem dum lado, nem de outro” e um afresco
contemporâneo do Novo Império mostra uma mulher da boa sociedade em ponto de vomitar.
Uma criada, com um vaso na mão, precipita-se para ela.
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Entre os textos egípcios referentes à medicina, dois: "o grande papiro" do museu de
Berlim e o "Papiro Ebers", que se encontrava outrora na biblioteca de Lipsia, são
reveladores. Os médicos egípcios já tinham estudado o esqueleto e o sistema sangüíneo, as
funções do coração, do estômago e do baço. Não se lê que "o coração fala nos vasos de todos
os membros?” Velho de três mil e seiscentos anos, um dos textos médicos mais notáveis
figura num papiro, ao qual se deu o nome daquele que o descobriu, o inglês Eduino Smith; o
rolo mede cinco metros de comprimento. Quarenta e oito operações cirúrgicas sã o
enumeradas e disso ressalta que os médicos egípcios conheciam o papel motor do cérebro.
Eram os egípcios afligidos pelas mesmas doenças que nossos contemporâneos; todavia, não
se encontra nenhuma menção da sífilis ou do câncer. A cárie dentária, "produto" da
civilização, parece só ter aparecido no curso dos derradeiros séculos da história egípcia. Em
contraposição, a atrofia do dedo mínimo do pé é assinalada desde a época mais longínqua;
andando os egípcios de pés descalços, esse defeito não pode, pois, ser imputado ao uso do
calçado. Outro papiro, o "papiro Ebers", enumera setecentos medicamentos; setenta são
remédios contra as oftalmias, que parecem ter sido muito difundidas na época. A composição
de alguns desses remédios é pelo menos esquisita e a farmacopéia egípcia utiliza curiosos
"ingredientes": excrementos humanos e animais, urina, etc. Para estancar uma ferida,
aplicava-se uma pomada à base de cera, de gordura, de vinho de palmeira, de mel e de trigo
cozido.
Tinha-se o sangue quente nas margens do Nilo; aos dez anos, as meninas eram núbeis
e as relações pré-maritais consideradas como normais. Uma cortesã, relata a tradição, pôde
mesmo fazer edificar uma pirâmide com o montante de seus ganhos.
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Enfim, um poema de amor exprime sentimentos eternos: "Ouvir tua voz perturba-me o
espírito. Minha vida inteira está suspensa de teus lábios. Ver-te é melhor para mim que
comer ou que beber".
ANATÓLIA
O império hitita, pouco conhecido na história dos povos antigos, deixou alguns
vestígios, mas ainda se constitui num mistério para os pesquisadores da atualidade.
Há muitas raças que desapareceram do mundo e cujos nomes conhecemos, mas cuja
história e cuja cultura são ainda um mistério para nós. Há cerca de 4.000 anos, no planalto
anato liano, no coração do que é hoje a Turquia, viveu uma raça que só foi redescoberta na
volta do século. Hattusas, sua capital, jaz a algumas centenas de milhas a leste de Ancara,
perto da moderna cidade de Boghazköy.
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Gente estranha esses hititas, estranha porque ainda não sabemos muita coisa a seu
respeito e porque são bem diferentes daqueles outros povos antigos que se nos tornaram
familiares nestes últimos cem anos. Seus próprios baixos-relevos mostram-nos como baixos e
entroncados, de ossos proeminentes, frontes fugidias, nariz comprido, ligeiramente curvo
como um bico de papagaio e queixos curtos. Usavam mantos compridos sobre túnicas curtas,
altos bonés cônicos, sapatos ou mocassins de bicos revirados. Como se vê no alto-relevo da
chamada Porta do Rei em Boghazköy, usavam seus soldados um saiote com cinturão e um
capacete com peças sobre as orelhas e carregavam uma espada curta e uma acha de armas.
Tomaram seus deuses de Babilônia e também seu sistema de escrita. Esculpiam
baixos-relevos em maciços blocos de pedra nas fachadas de seus palácios e templos e
também nas faces de remotos penhascos. Sua história, até onde a conhecemos presentemente,
começa cerca de 1.900 antes de Cristo, num tempo em que os cretenses já haviam iniciado o
palácio, em Knossos e os faraós da XII dinastia governavam o Egito. Achavam-se então os
hititas divididos em pequenas cidades independentes sob reis locais, mas gradativamente foi
o país unificado sob um só governante. Quatrocentos anos mais tarde derrama ram-se de seu
planalto montanhoso sobre a região do sul e tornaram vassalos seus os pequenos reis da
Síria e da Palestina, ameaçando assim o Egito. Tutmósis III derrotou-os e rechaçou-os para
o norte. Mas os hititas se recompuseram e continuaram a enfrentar o Egito como a um rival
igual e poderoso, por muitos anos.
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Foram encontrados muito poucos túmulos dos tempos hititas. No canto de uma casa,
os escavadores desenterraram os ossos de uma moça muito jovem, trazendo um brinco de
ouro, delgado e chato, na orelha e um fino bracelete de bronze em cada antebraço. Perto
dum fogão encontrou-se o esqueleto de um adulto completo, deitado do lado esquerdo com as
pernas encolhidas. Infelizmente seu crânio estava esmagado e muito poucos restos de seus
ossos estavam intactos. Outro túmulo, contendo também muito poucos ossos conservados,
pertencera a uma criança. A antropóloga alemã Sofia Ehrhardt dedicou acurados estudos à
maxila inferior dessa criança, de treze a catorze anos de idade, mas o precário estado de
quase todos os esqueletos hititas torna-os quase imprestáveis para fins de pesquisa
antropológica. Os hititas por vezes enterravam seus mortos dentro de suas casas, mas
praticavam também a cremação.
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Donde vieram os hititas? Por qual estrada alcançaram o Halys? Que cultura traziam
consigo? Que escrita usavam? E até onde podemos chegar seguindo a pista de sua história
pregressa?
O Rei Anittas vivia num lugar chamado Kussara e nos conta que seu pai Pitkhanas
conquistou a cidade de Nessa (Kussara e Nessa podem ter existido na Anatólia oriental,
talvez no interior da curva do Halys, mas não foram ainda localizadas). O Rei Anittas
informa-nos adiante que após a morte de seu pai, seguiu-lhe os passos indo à guerra,
derrotando todos os países que se lhe opunham. Foi duas vezes atacado por Pijusti, rei de
Hatti, mas apoderou-se de Hattusas, de assalto, no decurso de uma única noite. "No lugar
onde ela existia semeei sementes. Que aquele que se tornar rei depois de mim e povoar
Hattusas de novo, venha a ser ferido pelo Deus da Tempestade do Céu”.
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Como vimos, o Rei Anittas lançou uma maldição contra quem quer que ousasse
recolonizar Hattusas. Não obstante, outros governantes hititas fizeram mais tarde de
Hattusas sua capital. Provavelmente significa isto que Hattusas e o Rei Pijusti existiram
muito antes da chegada dos primeiros hititas. Hattusas não era nome indo-europeu nem
cidade indo-européia, nem semítica, ate onde podemos saber. Sua população falava o hattili.
Os indo-europeus que conquistaram a cidade e nela se estabeleceram referem-se a si mesmos
como "homens e mulheres de Hatti", ou "filhos de Hatti. Daí se originou o nome hitita na
Anatólia, mas o povo mais tarde chamado hititas veio provavelmente duma região diferente.
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Hattusas era uma metrópole fortificada e sua coroa triunfal a cidadela Buyukkale. A
principal característica das famosas cidades da Mesopotâmia sempre foi, em contraste, o
templo do deus citadino. Não podia tampouco o rei dos hititas exercer sua autoridade tão
arbitrariamente como os outros potentados orientais. Era o senhor supremo de seu povo
tanto na guerra como na paz, mas seus poderes eram circunscritos pela nobreza. Não
encontramos indicação de que perseguissem e torturassem os hitit as os povos derrotados,
como era hábito dos assírios e dos medas. As punições eram também menos severas. Desco-
nhecia-se a prática da mutilação e uma sentença de morte só raramente se aplicava aos não
escravos.
Muito nos falam de sua civilização as leis dos hititas e das suas inscrições colhemos
alguma coisa de sua vida social e cultural. Parecem ter sido uma gente de temperamento mo -
derado. Quando um hitita desejava casar-se, comprava uma mulher. Até mesmo um escravo
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podia comprar uma mulher livre. Diferentemente dos egípcios, não toleravam os hititas
casamentos entre irmãos e irmãs. Sabe-se disso por uma tabuinha do Rei Suppiluliumas no
Derradeiro Império que adverte um tal Hukkanas da terra de Hajasa, nas montanhas
armênias: “O irmão não pode tomar sua própria irmã ou sua prima, pois isto não é direito.
Quem quer que tal coisa faça em Hattusas não ficará vivo, mas morrerá”.
Suppiluliumas fez notar que, conquanto pudesse ser habitual em Hajasa casar alguém
com seu próprio irmão, irmã ou prima, tal coisa era proibida em Hattusas. Justificou-se o rei
ao escrever a Hukkanas dessa forma, porque enobrecera o homem simples mais capaz e lhe
dera uma de suas irmãs como esposa. Teve, pois, dificuldades em estabelecer relações
apropriadas entre sua família, sua corte e seu novo cunhado. O rei fere uma nota muito
humana ao continuar: "Se, pois, uma das irmãs ou uma meia-irmã ou prima de tua mulher
chegar a ti, dá -lhe de comer e de beber; comei e bebei juntos e alegrai-vos. Mas não a
desejes. Isto não é permitido e me rece pena de morte; de modo que não o tentes. Mesmo que
alguém te tente, não lhe dês atenção e nada pratiques." Nota-se nesta advertência algo do
agudo provérbio de Salomão.
No decurso de seu pacto com Hukkanas, o competente rei contou-lhe uma pequena
história que serviria de lição. Parece que, um dia, um tal Marjas deixou que seu olhar
pousasse numa hieródula ou escrava do templo, no momento em que passava a seu lado. Ele,
Suppiluliumas, o Pai do Sol, estava por acaso, olhando da janela naquela ocasião e observou
o desenrolar do suave namoro. Ordenou a prisão do desventurado Marias, a quem
perguntou: "Porque olhaste para aquela escrava?” Se o Pai do Sol fez tal pergunta, é que
eqüivalia ela a uma sentença de morte... e Marjas, de fato, foi executado "por causa disso".
Mas o Rei deu mais um passo adiante: decidiu que seu novo cunhado não haveria de recair
nos velhos moldes imorais, mesmo em Hajasa, sua terra natal. Ali, também, deveria no futuro
abster-se de tocar nas mulheres de seu irmão e em suas próprias irmãs. Por outro lado, teria
permissão de conservar as mulheres que já possuía como concubinas.
Vimos num capitulo anterior como a viúva de um faraó egípcio escreveu a um rei
hitita, pedindo-lhe que lhe enviasse um de seus filhos para possível marido. O hitita, que
incidentalmente deve ter ficado bastante lisonjeado pela sugestão, não era outro senão o Rei
Suppiluliuma s e a rainha foi provavelmente Nefertiti, embora não estejamos inteiramente
certos de que tão insólito pedido tivesse sido realmente feito por Nefertiti ou pela viúva de
Tut-ank-Amon, sucessor de Equenaten. Eduardo Meyer e Alexandre Scharff afirmam que foi
realmente Nefertiti quem entreteve esses assombrosos planos matrimoniais. Güterbock,
porém, acredita que a autora da sensacional proposta foi a viúva de Tut-ank-Amon e o
egiptólogo E. Edel partilha desta opinião.
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A história desse escândalo dinástico, que ocorreu cerca de 3.300 anos passados e
certamente não foi tornado público na ocasião, vem narrada nos FEITOS DE
SUPPILULIUMAS, escritos por seu filho Musilis II. As tabuinhas fragmentárias de argila
que trazem esse texto extremamente interessante, foram cuidadosamente reunidas por
Güterbock entre 1954 e 1956 em Frankfurt e Ancara e depois traduzidas por ele para o
inglês.
Regressemos a trezentos anos mais cedo, ao tempo em que estava o trono hitita
ocupado por Labarnas II, também conhecido como Hattusílis I. Deixou-nos este rei, escrito
um texto bilingüe em hitita e acadiano: sua derradeira vontade-testamento, escrito quando
jazia ele moribundo. Sua rainha-consorte e seu herdeiro presuntivo parece terem estado
ligados contra ele. Seu filho não derramou lágrimas e não demonstrou simpatia para com seu
pai moribundo: "Frio está ele e sem coração. Eu, o rei, ordenei-lhe que viesse à minha
cabeceira, mas não é mais meu filho. Depois sua mãe mugiu como um boi." Mas o rei
permaneceu incomovível. "A mãe dele é uma serpente” , prosseguiu. "Várias vezes meu
desleal filho dará ouvidos as palavras de sua mãe, de seus irmãos e de suas irmãs, e então
saciará sua vingança. Haverá um banho de sangue." O rei fez advertência contra a revolução
e a guerra civil. Depois em vez de deixar seu trono ao príncipe coroado, designou o filho
deste, Mursílis, como seu sucessor. Mursilis era ainda jovem, disse ele, "de modo que
eduquem-no para ser um rei herói”.Hattusílis deve ter sido excelente psicólogo, pois ordenou
que seu jovem neto mandasse ler para si uma vez por mês o decreto de seu avô.
É fácil deduzir das tabuinhas de argila dos reis hititas que eram homens que haviam
acumulado a experiência de muitas gerações e aplicavam-na às suas próprias circunstâncias.
Quando era caso de tratados, nunca se satisfaziam com meros pactos de assistência
mútua. Eram hábeis psicólogos bem cientes de todas as fraquezas e tentações a que são
inclinados até mesmo amigos e parentes. Por isso é que se adiantaram muito mais nas suas
medidas de segurança do que os nossos modernos estadistas. Davam ênfase a que seu
parceiro de tratado nunca deveria vacilar em sua lealdade, especificando-a cuidadosamente
ao escrever que não se permitiria deixar-se influenciar por qualquer partido exterior. Quem
quer que fosse inimigo do Sol (e o rei hitita era sempre chamado "o Sol") deveria ser também
inimigo de seu aliado e qualquer coisa que o aliado viesse a conhecer de desvantajoso para o
rei deveria ser a este sempre comunicado. É tocante ver-se Mursílis II, que reinou de cerca
de 1.339 a 1.306, dirigir-se a seu aliado Kupanta-Kal, ordenando-lhe que não prestasse fé a
quaisquer boatos. Eis suas palavras textuais: "A humanidade é corrupta. Se boatos se
espalham e algum chegar a ti, murmurando que o Sol está a prejudicar-te, e a ponto de tomar
tua casa e tuas terras, causando-te danos, deves informar o Sol sem demora”.
Ao concluírem pactos como este, as partes contratantes sempre juravam pelos mil
deuses dos hititas. "Chamamos os mil deuses ao tribunal", reza a fórmula. O Deus Sol do
Firmamento, a DEUSA SOL de Arina, o Deus Tempestade de Muitos Lugares, Ichtar, a
Rainha do Firmamento, e outros incontáveis deuses eram chamados a testemunhar e
invocados a destruir quem quer que desatendesse ao decreto do rei.
Chegou um tempo, porém, em que os deuses dos hititas fracassaram. Hattusas foi
destruída pelas chamas. Cidadela, templos, armazéns e casas desabaram e o céu rubro
esplendia, quando os hititas conheceram sua ruína no lugar que fora outrora a sede de seu
poder. De 1.200 antes de Cristo em diante, todas as referências aos hititas na Anatólia
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oriental cessaram bruscamente e o cenário mudou-se para a Anatólia de sudeste. Foi essa
uma terra dos Reinos Derradeiros ou NeoHititas que floresceram até o fim do oitavo século
antes de Cristo, quando os assírios os conquistaram.
Se, depois que um homem pagava o preço de uma esposa, decidiam posteriormente
seus pais não se separar da moça, eram obrigados a restituir duplicadamente a soma. Por
outro lado, acontecia também que uma moça, que fora prometida a um homem, viesse de
repente a casar-se com outro. Neste caso, o noivo bem sucedido só estava obrigado a
retribuir a seu rival o equivalente à sua despesa até aquela data. Perfumistas e pastores eram
tidos em baixa estima, ao que parece, pois se qualquer moça viesse a casar -se com algum
deles, tornava-se automaticamente escrava por três anos.
As leis hititas iluminam vivamente seu colorido modo de vida. Condenava-se à morte
um homem que fosse sorrateiramente no encalço de uma mulher nas montanhas solitárias e a
violasse. Mas quando outro homem assaltava uma mulher na própria casa dela, a
cumplicidade desta era tida como provada e também ela merecia a morte. (A honra de uma
escrava não tinha proteção legal). Se alguém matava uma serpente, proferindo o nome de seu
inimigo enquanto o fazia, incorria essa magia perigosa numa multa de uma mina de prata e
pagava com a própria cabeça o escravo que praticasse a mesma coisa. Deve ter havido
também pelo menos um hitita tão encolerizado que arrancou de seus gonzos uma porta e
levou-a para fora, pois inventou-se uma lei para atender a tal contingência. O celerado tinha
de restituir todos os animais domésticos que o proprietário perdeu em resultado de seu ato e
pagar, além disso, uma mina de prata.
............................................................................
Os hititas foram povo de grande vitalidade e criaram uma cultura única, muito
embora derivada de várias fontes, dando-lhes razão de um merecido lugar ao sol ao lado da
Assíria de Babilônia e do Egito. Contudo, um dia chegou em que sucumbiram à coisa mais
perigosa da terra, a algo de bem mais implacável do que a Natureza no que tenha de mais
destrutivo: o inimigo em forma humana.
FENÍCIA
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Presume-se que em 700 antes de J. C. deram a volta da África, 2.000 anos antes de
Vasco da Gama. Isto é, o cabo da Boa Esperança teria sido descoberto pelos marinheiros
fenícios.
90
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Hírão I, rei de Tiro (969-936 antes de J. C.), foi amigo dos reis Davi e Salomão;
forneceu-lhes madeira de cedro, pedreiros, canteiros. Cerca de 500 antes de J. C., Tiro era
91
tão rica a ponto de possuir "tanta prata quanta areia há nas praias" e "tanto ouro quanto
bosta nos caminhos" (Zacarias 9.3).
Cartago foi igualmente uma fundação fenícia (878 antes de J. C.); Aníbal e o
descendente desse povo de comerciantes e navegadores. Cartago, com suas casas altas e seus
becos estreitos, foi a criação do gênio fenício. Uma longa guerra antagonizou-a com Roma,
mas, finalmente, tiveram os comerciantes de curvar-se diante da força.
Os mercadores fenícios foram antes de tudo homens práticos, nem poetas, nem
imaginativos. Comerciantes e citadinos, não tiveram tempo de criar-se uma literatura e essa
é a razão pela qual se possuem tão poucos textos fenícios. Seus monumentos foram destruídos
ou caíram em ruínas.
Acreditou-se durante muito tempo que esses intrépidos navegadores tivessem sido os
inventores do vidro, da moeda e da faiança; atribuíram-lhes mesmo a invenção do alfabeto.
Ora, recentes trabalhos demonstram que, se os fenícios foram excelentes imitadores e
"agentes" de civilização, nada criaram. Contribuíram simplesmente para a difusão dos
produtos da arte e da indústria manufaturados ou fabricados por outros povos.
PÉRSIA
A Pérsia (hoje Iraque) teve nos últimos tempos seu nome associado aos famosos
tapetes e aos contos fanstásticos do Oriente como, por exemplo: “As mil e uma noites”. Mas
o império persa conseguiu ser uma das regiões mais desenvolvidas e comentadas da
antiguidade. Vários nomes famosos fazem parte da sua história.
Sabendo que Mandane dera à luz um filho, chamado Ciro, deu Astíages ordem a
Harpage, seu camareiro, de mandar assassinar o menino. Mas Harpage confiou o jovem Ciro
a um pastor que habitava os planaltos batidos pelos ventos, situados ao norte de Ecbatana.
Foi lá que cresceu o futuro soberano, o maior homem de Estado de seu tempo.
Deu prova Círo duma grande tolerância para com as religiões e cultos praticados
pelos povos de seu reino; respeitava-lhes os deuses, inclinava-se diante de seus ídolos,
sustentava os templos e mandava queimar incenso diante das estátuas. Em lugar de
exterminar os vencidos, procurava Ciro, pelo contrá rio, conciliá-los. Precursor de Alexandre,
o Grande, foi Ciro o ma ior homem da Ásia ocidental.
e lhe beijavam os pés. Monarca esclarecido, achava Ciro talvez que acima de seu deus,
AhuraMazda, havia um outro que êle não conhecia. O fato de ter mandado reconstruir, em
Jerusalém, o templo de Jeová, não é simples coincidência.
Entretanto, não morreu Ciro na sua capital Ecbatana; caiu, em 530, antes de J. C., sob
as flechas dos massagetas, temíveis cavaleiros que, expulsos pelos citas das estepes do
Turquestão, penetraram no Irã.
Os homens de Estado atuais têm muito que aprender com Ciro. Nenhum se preocupa
com isso: Ciro viveu há dois mil e quinhentos anos! Mas tudo leva a crer que a sabedoria dos
governantes não aumentou desde aquela época. Creso, soberano célebre e invejado, era rei
da Lidia. Sua riqueza proverbial provinha da exploração das minas de ouro. Sardes, sua
capital, era um centro artístico e intelectual. Quando Creso perguntou ao filósofo Solon o que
pensava êste de tantas riquezas e felicidade, respondeu-lhe Solon que ninguém podia
estimar-se feliz a menos que tivesse sua vida atrás de si. Ciro conquistou Sardes e os persas
condenaram Creso à fogueira. Antes de morrer, lembrou-se Creso das palavras de Solon.
Ciro ouviu-o e pediu uma explicação. Quando Creso contou tudo, o sábio Ciro pôs em
liberdade o vencido, deu-lhe numerosas terras, ofereceu-lhe um posto importante em sua
corte e fez de Creso seu conselheiro privado. Durante trinta anos Creso serviu ao rei dos
persas e depois a seu sucessor.
O filho de Ciro, Cambises, faz pensar num moderno ditador. Para começar, matou seu
irmão Smérdis; aumentou seu imperio até o Nilo e massacrou todos os prisioneiros. Diz-se de
Cambises que reduziu os deuses egípcios a pó. Saqueou os túrirulos reais e apoderou-se das
múmias. Naquela época, era um sacrilégio. Queria curar os egípcios de suas “superstições”.
Quando Cambises perdeu a razão, os egípcios declararam que os deuses ofendidos se
vingavam. No fim de sua vida, Cambises fêz figura de precursor de Nero. Matou sua irmã com
um pontapé no ventre, depois mandou assassinar sua mulher, Roxana; com uma flecha, feriu
mortalmente seu filho, Prexaspes e, para se divertir, deu ordem de enterrar vivos doze nobres
persas; tendo condenado Creso à morte, logo lamentou isso e rebentou a soluçar. Sua cólera
reapoderou-se dêle assim que soube que suas ordens não tinham sido cumpridas. Uma revolta
pôs fim ao reinado desse insensato.
Um fanático religioso pretendeu ser Smérdis, irmão de Cambises, que êste mandara
assassinar. Uma segunda revolução derrubou Smérdis e deu o poder a Dario.
Pela Bíblia, conhecemos o nome do sucessor de Dario: Assuero. Sua capital era Susa
e fez de Ester uma rainha. O Assuero do Antigo Testamento é chamado Xerxes por Herodoto.
Assuero embriagava-se; sua vida era uma sucessão de festas e arruínava-se em construções
suntuosas. Perto de Salamina, sua frota foi vencida pela dos gregos. Essa derrota, seguida
pela de Platéia e pelo aniquilamento dum segundo exercito persa, em Micale, teve por efeito
obrigar a Pérsia a limitar-se à Ásia e renunciar a desempenhar um papel na política
européia. Após vinte anos de intrigas e de incuria, morreu assassinado. Enterraram-no com
grande pompa, para satisfação de todos.
O assassino de Xerxes foi morto pelo rei Artaxerxes. Xerxes II foi assassinado pelo seu
meio-irmão e este por Dario. O sangue corria em ondas. Dario II jugulou uma revolta com
implacável crueldade. Mandou matar sua mulher e enterrar vivos sua mãe, seus irmãos e suas
irmãs. Artaxerxes II matou seu filho e morreu de pesar, quando soube que Óxus, outro de seus
filhos, se preparava para fazê-lo ter a mesma sorte.
Óxus reinou vinte anos e foi envenenado por um general. O imenso império persa
afundou-se no massacre, na revolta, na crueldade, nas lágrimas e no sangue.
Alexandre, o Grande, só teve que acabar a ruína daquele grande edifício apodrecido
por dentro. Êsse período da História é cativante. Em novembro de 333, antes de J. C., Dario
III, apelidado "Kodomnos" (Codornano), derradeiro soberano da dinastia dos Aquemênidas,
enfrentou, perto de Isso, as forças de Alexandre; 30 a 40.000 persas se embateram com
20.000 infantes e 5.000 cavaleiros macedônios. Se Alexandre conquistou a vitória deve-o a
uma hábil mudança de frente de suas tropas e também porque, vendo Alexandre que, de pé, no
seu carro, avançava para êle, Dario fugiu, deixando seus soldados desamparados. Ao fim da
batalha, o exército grego perdera 450 homens e os persas cerca de 5.000, o que deve
corresponder à realidade. As cifras indicadas pelos historiadores gregos: 600.000 soldados
persas, dos quais 110.000 mortos, não passam efetivamente da mais exagerada fantasia. A
retumbante vitória conquistada por Alexandre foi por demais realçada de acôrdo com as
necessidades da causa grega. Covardemente, Dario fugiu, abandonando sua mãe, sua mulher,
duas de suas filhas, seu carro, suas jóias e tôdas as suas riquezas que se achavam na tenda
real. A dar-se crédito aos historiadores gregos, Alexandre, o vencedor, teria dado prova de
grande magnanimidade, tratando com solicitude os parentes de Dario e desposando Roxaria,
filha de seu inimigo; pretendem mesmo os gregos que, por ocasião da morte do conquistador,
a mãe de Dario deixou-se morrer de fome em sinal de aflição.
Em que época viveu Zaratustra? Cerca de 700 anos antes de J. C., segundo os
arqueólogos, em 5.500, segundo os gregos. Sabem-se poucas coisas a seu respeito, mas
parece que nasceu a leste do Irã ou na Bactriana. Como Cristo, retirou-se para o deserto e
viveu, durante algum tempo, afastado de seus semelhantes. O diabo tentou-o, mas em vão.
Zombaram de Zaratustra, perseguiram-no, mas revelou-se ele o mais forte; após sua morte,
viram-no elevar-se ao céu num nimbo lumi noso.
Tendo partido para a Média, cêrca de 700, antes de J. C., ficou Zaratustra estupefato
por ver que os medas adoravam ídolos zoomórficos e inúmeras divindades. Inimigo declarado
dos magos e do clero, que viviam da credulidade pública, proclamou a existencia de um deus
único, Ahura-Mazda, deus da luz e do céu.
Mas que papel reserva Zaratustra às antigas divindades natu rais? Identifica-as a
"daevas", demônios, entre os quais enfileirava verossimilmente Mitra e Anahita; aliados de
Ahriman, ajudaram-no a perverter o homem.
O homem acha-se metido na luta que opõe Ahura-Mazda a Ahriman; livre de escolher,
deve optar por um ou por outro. E assim e até o momento em que, três dias após sua morte,
comparece perante o tribunal encarregado de julgar os vivos e os mortos. Os ímpios, os
velhacos, os maus sofrem tormentos eternos; os justos, perdoados, ascendem à eternidade.
Além dêsse tribunal que julga qualquer indivíduo, a religião de Zoroastro prevê o fim
do mundo, a ressurreição dos mortos e um julgamento final que marca o fim da luta do Bem e
do Mal. A luz vence as trevas e os bons, reunidos no Paraiso, conservam-se ao lado de
Ahura-Mazda. A doutrina exposta por Zaratustra no Avesta determina ao homem uma tríplice
tarefa: converter o mau, fazer de seu inimigo um amigo e instruir o ignorante.
96
Esta não foi nunca uma religião nacional e cada qual tinha liberdade de escolher o
deus que lhe conviesse. A destruição de Persépolis por Alexandre pôs fim à história política
da antiga Pérsia, mas o espírito dos persas e dos medas sobreviveu; sua influência, sensível
nas religiões orientais, encontrar-se-á mais tarde nas regiões ocidentais. Como explicou
Franz Cumont, especialista dos cultos mitríacos, a história religiosa conheceu um período
"helenlco" e um periodo "iranico". Talvez represente o zoroastrismo uma síntese, a primeira
da história, uma tentativa para amalgamar as doutrinas que fazem da observação da moral,
do respeito e da justiça a lei suprema da humanidade. A doutrina zoroastriana influenciou
fortemente as crenças ocidentais; está na origem do monoteísmo judeu, do dualismo céu e
inferno, da idéia de resgate e do julgamento final. A luta entre o Bem e o Mal, pela posse do
mundo, prossegue sempre. Onde, em que estepe, em que região montanhosa nasceu
Zaratustra? Em que época viveu? Um dia, Ahura-Mazda lhe apareceu e o sábio disso
concluiu pelo triunfo final da luz sôbre a escuridão.
Zaratustra pregou sua doutrina setecentos anos antes de J. C.; Maomé, setecentos
anos depois de J. C. Entre as duas religiões se situa a de Cristo.
97
O rei dos persas estava à testa dum vasto império; os soberanos dos reinos submetidos
por suas armas eram seus vassalos. Donde seu título de "Rei dos Reis". Soberano absoluto,
ninguém, nem mesmo os poderosos do império tinham o direito de criticar suas decisões;
contravir a essa regra era assinar sua sentença de morte.
O harém real era colocado sob vigilância de eunucos; todos os anos, fornecia
Babilônia, a título de tributo, 500 rapazes emasculados. Enviados a côrte, ali aprendiam o
ofício de pajem. Esses eunucos conquistaram com o tempo uma grande influência sobre as
mulheres e sôbre os familiares do soberano; intrigantes, fomentavam conspirações e sua
presença na côrte tornou-se um verdadeiro flagelo. Derrubavam os reis, organizavam
revoltas de palácio, recorriam ao assassinato e exploravam em seu proveito as rivalidades
que opunham entre si as pensionistas do harém real. Com a continuação, no império persa,
crimes e revoltas foram os meios empregados para garantir-se a posse do trono. Dispunham
os soberanos dum imenso exército, instrumento de seu domínio, formado de elementos
disparatados. Mas, contráriamente ao que acreditavam, essa pletora causou-lhes a perda.
Segundo Heródoto, o exército lançado por Xerxes ao assalto da Grécia compreendia 170.000
homens, mas, abstração feita do exagero habitual e admitindo-se mesmo que 17.000 soldados
persas apenas tenham tomado parte na expedição, nem por isso era menos considerável essa
fôrça para a época.
Formado de elementos díspares, êsse exército teria sido obrigado a debandar após a
derrota. Ora, o fato de haver-se retirado em boa ordem prova a ciência do comando persa.
O rei era o juiz supremo, sua palavra fazia lei; o regime era uma monarquia absoluta.
Magistrados eleitos vitaliciamente faziam justiça em nome do monarca; sua função era
hereditária e um juiz só podia ser destituído se cometesse um assassinato ou se fosse venal. Os
tribunais persas não decretavam apenas penalidades, mas igualmente recompensas. Cambises
pôs têrmo à corrupção dos juízes, mandando esfolar vivo um magistrado; a pele serviu para
cobrir a cadeira do defunto cujo filho foi nomeado juiz no lugar do pai. A pena do chicote - 5
a 200 chicotadas, segundo o caso - sancionava as faltas venais. A mutilação, a cegueira, a
prisão ou a morte puniam as infrações graves. Aproximar-se duma pensionista do harém real
ou tocar o rei era crime de lesa-majestade. O culpado era executado.
mais de duzentos mil quilô metros, de Babilônia a Ecbatana até os confins da Índia e da
Bactriana, correios a cavalo transportavam a correspondência pelas estradas reais. As
distâncias avaliavam-se em parasangas, medida que equivale a 5.250 metros. Dia e noite, os
estafetas reais percorriam-nas em todos os sentidos; eram, diziam os gregos, mais rápidos
que "o vôo dos grous". Parece mesmo que os persas tenham utilizado as fogueiras para a
transmissão das notícias.
mesmos, não ignoravam os persas nem o ódio, nem o amor, nem a alegria, nem as lágrimas; a
hospitalidade era sagrada.
Os filhos valiam mais que as filhas e o rei recompensava aqueles de seus súditos que
possuíam numerosa descendência masculina. "Não se roga ao céu que nos dê uma filha",
diziam os persas; o nascimento duma criança do sexo feminino era considerado quase como
um castigo. A medicina sofria a influência da magia; ao cirurgião, ao ortopedista e ao padre,
preferia-se o médico "que cura pela palavra" e, em vez de recorrer ao cirurgião, dirigiam-se
ao "médico da alma", cuja intervenção, mesmo se ineficaz, não corria risco de atentar contra
a vida do paciente.
PALESTINA
A terra dos hebreus até hoje é considerada o berço da cristandade. Desde os tempos
antigos teve papel proeminente no curso da civilização humana.
Nenhuma obra foi tantas vezes queimada, traduzida, atacada, venerada, como o
Antigo Testamento; é bem o Livro dos Livros, a obra universal por excelência. Quanto aos
livros consagrados à Bíblia são inúmeros; os rios de tinta que fez correr no curso dos séculos
bastariam para encher os oceanos.
Há quatro mil anos, deixou Abraão a Suméria pela terra de Canaã onde, após ter
muito tempo hesitado, fortificou-se na sua crença monoteistica; doravante convencido, ficou
fiel à sua fé.
Por ocasião da morte de Abraão, seus dois filhos, Isaac e Ismael, o enterram
piedosamente; o primeiro goza do favor do Eterno que lhe prodiga seus benefícios. "Isaac
semeou e recolheu o centuplo", está dito no Gênesis. Tão grande era seu amor pela
concórdia que, tendo mandado cavar dois poços de que pastores lhe disputam a propriedade,
manda cavar um terceiro "para o qual não se procurou qüerela". A Isaac sucedeu Jacó, cujos
doze filhos deram nome às tribos de Israel.
.............................................................................
101
No ano 4, antes de nossa era, no reinado de Herodes, nasceu em Belém, Jesus, filho
de Maria. A palavra "Cristo" vem do grego "christos", que significa "ungido". No ano 29 ou
30 de nossa era, o Cristo foi crucificado. Viveu realmente e realmente morreu na cruz.
Desde mil e novecentos anos, tenta-se fazé-lo morrer urna segunda vez.
Esforçaram-se por provar que Jesus era um personagem mítico. Pretendia-se que Jesus não
nascera nesta terra. Iluminados e fantasistas quiseram assimilar o Evangelho a uma lenda.
Giovanni Papini, nascido em Florença, autor duma história da vida de Cristo, propõe
a seguinte questão a todos os detratores: "Quem tomaria o lugar do grande Condenado? Não
cessaram de aprofundar-lhe o túmulo, mas nunca se pôde enterrá-lo nele completamente”.A
despeito das calúnias, dos opróbrios, das críticas, das negações, das interdições e das
destruições voluntá rias, o Cristo não foi afugentado desta terra. Nossa cronologia é sempre
cristã. Continua a ser aplicada e se um homem tivesse sido capaz de inventar a vida de
Cristo, seria maior ainda que o próprio Cristo.
Como se conhece Jesus, sua vida e sua obra? Quais são as fontes históricas de que
dispomos? São os escritos do Novo Testamento. O Novo Testamento não constitui um livro
único. É uma coletânea de textos redigidos em épocas diferentes, por diferentes autores, de
conteúdo variado. A Igreja recolheu-os no correr dos primeiros séculos de nossa era.
Comentário:
Ao tomar conhecimento do modo de vida dos povos antigos, temos a impressão de
estarmos vivendo situações que se repetem, de forma análoga, nos dias atuais. Não importa se
os historiadores discordam nos detalhes, nas datas e em algumas descrições. Na verdade,
estímulos externos (sociais) ou internos (mentais), ou ainda, a combinação deles, que movem
o comportamento das pessoas e escrevem a história dos povos, continuarão se sucedendo ao
longo do tempo. A única mudança nas respostas oriundas dos comportamentos está no seu
molde, ou seja, as diferenças culturais de cada sociedade, alicerçadas nas crenças, costumes,
políticas e tecnologias de cada época.
O cérebro e, mais particularmente, a mente procuram se adaptar a situações do
momento onde essas diferenças ocorrem. É possível acreditar que em algumas regiões
cerebrais o código genético tenha “escrito” uma ampla e diversificada programação, cujo
conteúdo, ativado pelos estímulos, reproduza respostas “pré-escritas” por uma memória
102
genética padronizada pelas experiências armazenadas pela espécie. Essas respostas, passíveis
de atualizações permanentes, facilitariam a ação individual ou grupal no tempo e na cultura.
Os exemplos aqui mostrados foram retirados da mídia impressa. São as notícias que
lemos todos os dias. É bom ressaltar que, independentemente da data em que essas matérias
foram escritas, nada se altera, pois os fatos se repetem como se seguissem o mesmo roteiro da
violência que conhecemos, mudando apenas seus personagens, locais e detalhes de pouca
importância para o fato violento em si. Nem todas as matérias puderam ser inseridas neste
trabalho de forma integral. Pedimos desculpas e explicamos que os textos muito longos
tiveram que ser encurtados para se adequarem aos subtítulos correspondentes.
Notícias:
Nazistas mataram seis milhões de judeus
passado. O anti-semitismo também não era propriedade dos nazistas: os "pogroms", ataques
em massa contra judeus, eram comuns na Rússia Imperial. Os judeus nunca foram bem
tratados na Europa. O que Hitler e seus sequazes fizeram foi dar um "método" delirante ao
assassinato.
Com a guerra, em 1939, os judeus foram impedidos de sair dos guetos. Em 1941,
começou a ação de grupos especiais de extermínio. A partir de 1942, o regime implantou a
chamada "Solução Final": a morte, em centenas de campos de extermínio. Os mais famosos
destes "campos da morte" são os de Auschwitz, Treblinka e Dachau. Os judeus não foram as
únicas vítimas: milhões de prisioneiros russos e ciganos foram mortos, fuzilados ou levados a
câmaras de gás. (Marco Chiaretti)
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Quando avalia os motivos das efervescências racistas, o estudo é categórico: "A falta
de esperança, desemprego e crise econômica" levariam os jovens "em busca daqueles que
seriam culpados pela situação” - que são, para os neonazistas brasileiros, negros e judeus.
Outro foco de concentração dos neonazistas seria uma colônia alemã chamada
Honehau, no Paraguai, que estaria "exportando" seu ideário para as fronteiras com o Brasil
e a Argentina. Aliás, é de uma cidade Argentina, Tucuman, que teriam vindo para o sul do
Brasil, em 1993, publicações neonazistas. Dentre as 34 apontadas, o relatório israelense cita
como principal o jornal "El Nacionalista".
Pesquisa divulgada ontem pelo instituto alemão Emnid revela que, passado quase
meio século da queda do nazismo, os alemães têm atitudes anti -semitas. Segundo a pesquisa,
encomendada pelo AJC (iniciais em inglês do Comitê Judaico Americano), 22% não
gostariam de ter judeus como vizinhos e 28% desaprovariam a eleição de um presidente
judeu. A pesquisa mostrou que 31% dos alemães acreditam que os judeus têm influência
excessiva nos acontecimentos mundiais e 39% acham que eles exploram o Holocausto em
benefício próprio.
"Os resultados são desapontadores", disse David Singer, do AJC. Ele acha alarmante
que, depois de 50 anos do assassinato de 6 milhões de judeus, 54% dos alemães achem que já
é hora de esquecer o Holocausto.
..................................................
Ainda hoje nos perguntamos por quê? Porque os nazistas perpetraram uma matança
tão grande, tão sem motivos, contra um povo pacífico que queria apenas o direito de viver em
paz, preservando sua cultura e praticando suas tradições e sua religião?
A precisa eficiência alemã nos atacou com ferocidade nos campos de extermínio.
Juntou-se a uma teoria racista um líder carismático e cruel; juntou-se a um ressentimento
contra o mundo, um sonho de superioridade racial; juntou-se a necessidade de se encontrar
um inimigo universal, um povo fragilizado e pacífico, talvez até um pouco ingênuo. O resto
da história conhecemos todos.
Mas nossos mártires não morreram em vão. Suas mortes cevaram a terra onde,
alguns anos depois, ressurgiria o moderno Estado de Israel. A ideologia de seus carrascos
representa até hoje (e continuará representando através dos séculos) o que há de mais
desumano e avesso à civilização.
O racismo, base do seu pensamento, é considerado por todos, crime dos mais
nefastos. Já o judaísmo continuará inundando a humanidade com seus valores positivos, sua
visão de mundo e dignidade.
.........................................
Para início de conversa: o massacre dos ianomâmi de Haximu, não foi um só, foram
vários. É só ler o Laudo Pericial da Polícia Federal, conforme inquérito policial número
078/93-DPF-1/RR/19. ago 93-30. set. 93/2 volumes. Os meios de comunicação
documentaram como possível e foi o suficiente para se chegar aos fatos – houve o massacre.
O resto é apenas uma prática comum de fazer persuadir a opinião pública: tudo que se vê
não é aquilo que se vê, é apenas o que EU quero que vocês vejam.
É neste jogo de sofismas que são manipulados todos os fatos hediondos do nosso
cotidiano: Candelária, Vigário Geral, Carandiru, Esquadrão da Morte, Corruptos do
Orçamento, Camarilha do Governo Collor, Extermínio de Crianças, etceteras e etceteras...
E lembro ainda mais, os txucarramãe tiveram uma história parecida, assediados por
fazendeiros. Esse grupo caiapó começou a sentir suas terras encurtando sob seus pés,
reagiram, mataram e foram mortos, até ganharem um pedaço de terra no parque do Xingu.
E lembro mais: em 1985 outros índios, também caiapó, no sul do Pará, freqüentaram
as manchetes da imprensa nacional como inimigos mo rtais dos recém chegados fazendeiros,
madeireiros e garimpeiros. Os caiapó reagiram matando. E morrendo.
A história dos ianomâmi não se diferencia das outras acima lembradas. O verdadeiro
massacre dos Ianomâmi vem acontecendo desde a chegada dos garimpos em seu território
no início da década de oitenta, quando já morreram 15% de sua população que era de 20 mil
pessoas (Brasil/Venezuela).
A diáspora, –ou dispersão– dos judeus que se espalharam pelos quatro cantos do
mundo, teve como causa a expansão territorial dos romanos. Nada é tão conhecido como a
Diáspora na história da humanidade, resultado do desejo de um povo em manter seus hábitos,
normas éticas e costumes religiosos integrados. Talvez um dos poucos exemplos que define as
necessidades, de um grupo humano unificado por elementos integradores, de permanecer com
identidade religiosa preservada. Hoje Israel é um Estado militar, um grande quartel que
defende e ocupa territórios num ritmo alucinante de guerras intermináveis. O êxodo de muitos
outros povos foi também, e ainda é, determinado pelo expansionismo territorial e pelo
racismo de agrupamentos humanos que se consideram superiores.
108
Notícias:
Árabes e israelenses
Quando se constituiu o Estado de Israel, muitos liberais e socialistas vislumbraram
uma esperança: com Israel, haveria naquelas regiões ondas sucessivas de renovação política.
Parecia que um Estado semi -socialista carregaria consigo um progresso de novo tipo, que
ajudaria a varrer regimes sociais e políticos arcaicos, pelas próprias contradições
emergentes e o impacto das transformações geopolíticas e econômicas sobre as populações
árabes subalternizadas por déspotas impiedosos.
A Israel coube demonstrar ao mundo a perfeição de sua máquina bélica, pequena mas
afiada, superior para certos fins à dos Estados Unidos, curvados às exigências da guerra fria
e das suas comunidades judias. As recentes tentativas de pacificação foram recebidas com
frieza no Ocidente e com temor em Israel e nos países árabes. Palestinos e israelenses
pareciam prestes a estabelecer uma saída promissora. É cedo para vaticinar se as
conversações de paz malograram. Às vezes, o agravamento dos conflitos produz efeitos
imprevistos. As ocorrências que cercaram o enterro de Goldstein salientam, porém, que as
negociações só podem ter êxito se o rancor enraizado "civilizar-se" ou sublimar-se. É terrível
o que disse o rabino Yaacov Perrin: "Um milhão de árabes não valem a unha de um judeu".
Por que? E o que vale a unha de um árabe da perspectiva antagônica? A paz requer a
extirpação voluntária da cultura da violência e do terrorismo étnico-religioso.
..................................................
Até Arafat anunciar seu apoio à invasão iraquiana do Kuait, os sauditas eram os
principais financiadores da OLP. O reino cortou uma ajuda anual de US$ 85,5 milhões.
Arafat, em crise financeira, tenta reconquistar este apoio.
Desde 1991 o rei Fahd se recusava a receber qualquer delegação palestina. Ele só
aceitou se reunir com Arafat por pressão do presidente egípcio, Hosni Mubarak.
Antes de chegar a Riad, Arafat passou em Meca, cidade sagrada para o islamismo.
Ele fez o que os muçulmanos chamam de "pequena peregrinação".
..................................................
Depois que a Coréia do Norte voltou atrás em sua decisão, a Coréia do Sul colocou
em alerta os 650 mil integrantes de suas Forças Armadas. Clinton enviou carta ao presidente
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sul-coreano, Kim Young-Sam, dizenqo que "uma invasão da Coréia do Sul será considerada
uma invasão aos EUA".
Mas ao Ocidente não interessava esfacelar o Iraque. Um país curdo era fortemente
rejeitado pela Turquia e pelo Irã (que têm minorias curdas). Um governo xiita podia se
vincular à revolução islâmica iraniana. Além disso, o mandado da ONU era apenas para
garantir a desocupação do Kuait, o emirado invadido em agosto de 1990.
Sem apoio, as duas rebeliões foram esmagadas. Para pôr fim aos bombardeios contra
civis, o Conselho de Segurança da ONU impôs as zonas de exclusão aérea, no norte e no sul.
Caças dos EUA e aliados mantêm vôos de vigilância. Já foram derrubados aviões iraquianos
que sobrevoaram áreas proibidas. Também foram atacadas, desde 1991, várias estações de
radar que armaram defesa contra os caças.
Esses são temas polêmicos que geram muito debate. O controle das populações
animais é um fenômeno natural complexo, onde território, alimento e outros fatores como a
seleção natural, atuam para manter a estabilidade. A falsa idéia de superioridade entre os
humanos civilizados os faz resistentes ás leis da natureza. Conceitos como inteligência,
racionalidade e desenvolvimento camuflam os resultados que decorrem dessa onipotência
arraigada. Lidamos quase sempre com as conseqüências (problemas) resultantes dessa postura
arrogante.
111
Notícias:
O holocausto chinês
"A agência de notícias Xinhua informou ontem que uma nova lei submetida ao
Parlamento chinês prevê a utilização de aborto e esterilizações para evitar nascimentos de
qualidade inferior e elevar os padrões da população como um todo" (Folha, 21/12/93, pág. 2-
10). As medidas da ditadura chinesa sobre controle populacional não apenas se aproximam
do horror nazista do holocausto judeu. O superam.
A ditadura chinesa já utiliza todos os meios para deter o constante crescimento de sua
população. Agora, assume, descaradamente, uma política de eugenia, para "elevar os
padrões da população". Na nova-velha civilização chinesa não haverá lugar para doentes
mentais, deficientes físicos e a coorte dos que forem considerados prejudiciais à reprodução
eugênica da população.
Esses termos científicos são assépticos: do que se trata mesmo é da obsessão fascista
da pureza e, para tanto, o Estado patrocinará todos os assassinatos. A dedução é lógica: um
regime totalitário não recua diante de nada, mesmo que sejam corpos de seus cidadãos.
Como o massacre da Praça da Paz Celestial demonstrou sobejamente.
Talvez Robert Kurz ("O Retorno de Potemkin", Paz e Terra, 1993) tenha razão: os
regimes periféricos que intentarem a modernização capitalista, já agônica mesmo nos países
centrais, transformar-se-ão inexoravelmente em regimes de terror contra seus próprios
cidadãos. Deng Xiaoping se esforça para demonstrar as teses de Kurz.
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Limites do capital
"O espectro malthusiano da fome ronda novamente a humanidade. Agora, menos pela
incapacidade agrícola do que pela incapacidade do capitalismo moderno de criar empregos.
Acessível a poucos, a alta tecnologia, alicerçada na ciência, criou um novo padrão de
produtividade, acima da demanda, sem maior absorção de mão-de-obra. Como bolo
fermentado, o desafio demográfico e ecológico tende a crescer diante de um mundo
despreparado e injusto”.
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Ideologia e violência
Nas sociedades naturais o eixo cultural é sustentado pela crença mítica e sabedoria dos
ancestrais, representadas pela Tradição. É uma forma de preservar a unidade grupal com base
em ideário onde organização política, econômica, religiosa e legislativa estão contidas num
plano abstrato, não-institucional. Uma forma de inscrever na consciência individual tudo o
que é essencial para manter a convivência estável. Uma sabedoria sintética que funciona sem
instituições. Com a perda do eixo cultural, os civilizados tiveram que reinventar outras formas
de conviver e, até hoje, não conseguiram atingir esse objetivo. Quase toda ideologia inventada
pelo homem possui no seu cerne uma parte podre, uma brecha de onde brotam seus interesses
pessoais, princípio da desigualdade e da violência; invenção que gera debate, que cria novas
ideologias que conduzem à violência.
Notícias:
Através de suas palavras, Jirinovski nos revela contra o quê ele é. Com exceção da
"limpeza étnica" sérvia, nã o está claro o que defende. Ele é contra a democracia, contra o
livre mercado, contra o Ocidente e contra os não-russos e não-brancos –dependendo da
platéia que o escuta. A frustração com as perdas da Rússia é sua força motriz, assim como o
ressentimento contra aqueles que alegadamente as causaram: os ocidentais, os capitalistas,
os judeus.
Igualmente inquietantes são os lugares onde ele vem fazendo seus pronunciamentos.
Na semana passada ele encontrou uma platéia receptiva na Sérvia. Ele e o homem-forte da
114
Sérvia, Slobodan Milosevic, são sob muitos aspectos irmãos de alma. Ambos se alimentam de
um hipernacionalismo que combina autoritarismo no interior do país com o desprezo por
tudo o que é estrangeiro.
O perigo é que os Milosevic e Jirinovski continuem a pregar sua mensagem de
intolerância e ódio, chegando até mesmo a conspirarem juntos, pressionando outros
dirigentes a "defenderem" seus povos. Em pouco tempo, o etnocentrismo, e não a
democracia, poderia se transformar no princípio organizador da região. A história nos diria
que isso é provável.
Isso poderia levar às seguintes consequências: A Sérvia poderia estender sua limpeza
étnica aos albaneses em Kossovo e Sandjak e aos húngaros em Vojvodina. Poderiam crescer
as tensões entre a Grécia e a Albânia sobre os albaneses já expulsos da Grécia e os 60 mil a
300 mil gregos que vivem na Albânia. (O litígio já é tão grande que a Grécia e a Albânia
sequer conseguem chegar a um acordo sobre o número verdadeiro).
Essas tensões iriam provavelmente ter ecos na Turquia –onde haverá exortações pela
defesa dos albaneses, em sua maioria muçulmanos, além das aproximadamente 800 mil
pessoas etnicamente turcas que vivem na Bulgária. Os nacionalistas húngaros poderiam
chegar ao poder, com base em promessas de proteger os mais de 4 milhões de húngaros
étnicos que vivem em países vizinhos.
... como pode o Ocidente conter o conflito nos Bálcãs e impedir que ele se transforme
numa ampla guerra dos Bálcãs? O Ocidente pode não ser capaz de parar a guerra na Bósnia
por um custo aceitável, mas, com decisão e previsão, pode impedir que outra guerra tenha
início na Macedônia, na Albânia, na Hungria e em outros Estados vizinhos.
JAMES A. BAKER 3.º foi secretário de Estado dos EUA durante o governo de George
Bush. Copyright Los Angeles Times Syndicate.
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Sucessão emaranhada
As moscas azuis turvam o horizonte político. Ninguém sabe mais o que há por trás das
siglas dos partidos, e as exigências de "programas de governo" confundem-se com ambições
pessoais.
Nesse conjunto sombrio, só o PT, descrito como arcaico e pré-histórico, com seus
aliados de esquerdas ainda mais malsinados, não sucumbe aos filtros mágicos no poder.
Olha e segue para a frente. Questiona a sociedade civil, ordenada a partir do tope; repele a
cultura vazia esclarecida, que não ousa mudar se não para fortalecer privilégios e
aparências enganadoras; repudia o Estado fiscal, que canaliza a riqueza pública forjada à
base de impostos arbitrários e coloniais para os que mandam.
As críticas do PT, vindas de baixo e com a voz do povo ao seu lado, não encontram
respostas políticas. Elas exigiriam uma revolução nos costumes e na inércia política dos de
cima. A começar por um projeto arrojado e coerente de umas das maiores e mais complexas
"nações emergentes" do universo global... Por isso, os caluniadores esgrimem palavras
emblemáticas e provocações burlescas, atribuindo ao temido adversário aquilo que foi as
entranhas, a consciência e os sentimentos deles próprios, que confundem governar com
voluntarismo autocrático, entendendo-se por meio das célebres conciliações conservantistas.
O Brasil possui ou não futuro promissor? É claro que possui. Impõe-se, contudo,
primeiro limpar as cavalariças ou castigar os vendilhões do templo.
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Da Reportagem Local
Na última segunda-feira, três dias após Kurt Cobain ter se suicidado com um tiro na
cabeça, um homem de 28 anos repetiu o mesmo gesto em Seattle. Ele acabava de chegar da
116
cerimônia que reuniu 5.000 pessoas em uma praça da cidade, em homenagem a Kurt. O
motivo de seu suicídio, segundo seus amigos, foi a morte de Cobain. O fato era esperado pela
polícia de Seattle, que agora teme uma onda de suicídios por lá, motivados pela morte do
ídolo.
O suicídio inspirado pelo gesto praticado por outras pessoas não está ligado somente
à morte de ídolos. Personagens fictícios da literatura também inspiram este tipo de gesto. Em
1774, o lançamento do livro "Werther", do poeta alemão Goethe, provocou uma onda de
suicídios na Europa. Motivo: a identificação com o destino do personagem-título do livro,
que se mata por amor com um tiro. A epidemia de suicídios foi tão longe que várias pessoas,
na maioria jovens, se mataram envergando casacos azuis e colete amarelo, as roupas que o
personagem usava no final do livro.
A versão diz que Sid matou Nancy e depois pretendia se matar, deixando de fazê-lo
por falta de coragem. No primeiro semestre de 1986, o número de adolescentes suicidas
cresceu no Japão. A polícia atribuiu o fato à morte da cantora pop Yukiko Okada, então com
18 anos, que se jogou de uma altura de sete andares em Tóquio. Depois foram registrados 30
suicídios entre adolescentes no país.
Os números são ainda mais impressionantes quando se fala nos casos de morte de
seguidores de seitas religiosas. O mais famoso data de novembro de 1978. Foi o suicídio
coletivo de 913 pessoas na Guiana. Eram todos seguidores da seita Templo do Povo, do
pastor norte -americano Jim Jones. Eles se envenenaram com cianureto, enquanto seu líder
deu um tiro na própria cabeça.
Terrorismo e violência
O terrorismo é uma forma de vingança ou retaliação que pode ter motivação política,
religiosa ou ideológica. Pelo fato de ter a crueldade e o ódio como motores, ela pode assumir
outras motivações, como o simples prazer. Terrorismo e guerrilha são formas de guerra não
convencional, onde os indivíduos passam a ser elementos pouco importantes para a
consecução de objetivos. Formas graves de desvio social.
Notícias:
A Anistia pede que seja feita uma investigação imparcial sobre a questão da tortura a
que foram submetidos os dois prisioneiros e pede também um julgamento justo. Apelos devem
ser enviados a: Son Excellence Monsieur le Général Gnassingbé Eyadéma, Président de la
République, Palais Présidentiel, Avenue de la Marina, Lomé, Togo.
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Uma Convenção Constituinte, onde Fujimori tinha maioria, foi convocada para
redigir uma nova Carta. A nova Constituição, que permite a reeleição do presidente e
introduz a pena de morte para terroristas, foi aprovada pela magra diferença de quatro
pontos.
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Etnocentrismo e violência
Dissemos que o etnocentrismo cria no indivíduo uma tendência de sentir e pensar sua
cultura como referencial absoluto para todas as outras culturas. As sociedades reativas
(civilizadas) são reativamente etnocêntricas e produzem desvios de comportamento social. As
insatisfações de toda ordem (reatividade) existentes nos indivíduo dessas sociedades
transfiguram esse fenômeno natural, deslocando-as para uma aversão aos indivíduos de outra
cultura (estrangeiros).
Notícias:
À porta do paraíso
Pelo menos dois brasileiros foram detidos por autoridades de imigração de países do
Primeiro Mundo nas últimas semanas - um comerciante em Nova York e uma estudante em
119
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De Washington
Quatro famílias negras se mudaram ontem de madrugada, sob a proteção da polícia
federal dos Estados Unidos, para um conjunto habitacional na cidade de Vidor, Texas,
sudoeste do país. Esta é a segunda tentativa do governo dos Estados Unidos de quebrar 70
120
anos de tradição da cidade, onde nunca morou um negro. Vidor, 50 mil habitantes, fica 168
km a leste de Houston.
O governo do presidente Bill Clinton prometeu colocar pelo menos 12 famílias negras
em Vidor este ano. Para isso, o secretário nacional da Habitação, Henry Cisneros,
desapropriou o conjunto habitacional Vidor Village, de 74 casas, construído pelo Estado do
Texas. Ele argumentou que havia prática de discriminação racial no local. (CELS)
Dinheiro e violência
Notícias:
Segundo ele, 60% dos 111 mil habitantes do Cariri vivem "em miséria absoluta". São
pessoas com renda per capita anual de US$ 118. A renda per capita anual do restante da
população varia entre US$ 118 e US$ 365.
121
O governo diz mais ou menos o seguinte: você tem de pagar no botequim fuleiro o
mesmo preço do acolhedor restaurante. Diz mais: você está pagando pouco. Quem, de fato,
paga imposto? Os assalariados de classe média - os empresários descontam no preço dos
produtos. E qual o retorno?
estabilidade. E o governo quer que você se sinta culpado por pagar "pouco" imposto. Devem
achar que contribuinte é palhaço ou mulher de malandro antes da revolução feminista.
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Cardoso foi preso em flagrante no último dia 30 com um veículo roubado. Ele estava
sendo procurado pela polícia desde agosto do ano passado. O comerciante denunciou o
tenente Evaldo José de Souza, 30; os cabos Vladimir Arnold Filho, 25, e Claudinei Tonin, 22;
e os soldados José Messias dos Santos, 27, e Edmílson Cardoso da Silva, 24.
Dois outros acusados de fazer parte da quadrilha foram presos: Givanildo Martins
Ferreira e Ezequiel Favarão. A Justiça decretou a prisão temporária deles, que ainda não
prestaram depoimento no caso que envolve os policiais militares.
123
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Doença e violência
As doenças podem ter origem no corpo mas são influenciadas pela interpretação do
indivíduo. Podem se originar na mente e ser sentidas no corpo (somatismos). Há ainda as
formas mistas:
A doença tanto pode gerar violência como pode ser resultado da violência. Pode ser
manipulada para proteger interesses individuais e de grupos (laudos e atestados para fins
legais) e transformar-se em procedimentos e exames desnecessários, no que se conhece como:
“a indústria da doença”.
Notícias:
Planos de interesseiros
O Conselho Federal de Medicina está em pé de guerra com as empresas de medicina
de grupo. Em recente resolução, obriga essas empresas a garantirem o atendimento a todas
124
Numa atitude que carece de ética, as empresas inventaram uma lista negra de
doenças em que se recusam a pagar. Ao invés de cobrir a internação de um aidético com
pneumonia, investem numa propaganda enganosa que esbanja eficiência através de frotas de
helicópteros.
Para os interesseiros da saúde, quem causar prejuízo deve ser excluído. Não se
questiona a legitimidade de estabelecer critérios discriminatórios. Por que um infartado
merece ter as despesas pagas, enquanto um aidético é posto à rua?
Tenho medo que tais acordos sirvam para desfigurar a resolução do Conselho
Federal de Medicina. A voz simpática da moça da empresa de saúde então dirá:
"Infelizmente o senhor não poderá ficar no Hospital Albert Einstein, mas temos um contrato
operacional com o Hospital Emílio Ribas...”.
ROBERTO WUSTHOF, 26, é médico-residente do Departamento de Pediatria do
Hospital das Clínicas em São Paulo.
125
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Uma pesquisa feita pela Universidade Duke, de Durham, Carolina do Norte, mostrou
um risco adicional do abuso sexual em crianças: Aids. Em dois anos, a equipe de Aids
pediátrica da universidade contabilizou 96 casos da doença em crianças de até 17 anos. Ao
se investigar a causa da transmissão, descobriu-se que em 14 casos, 11 deles meninas, a
criança tinha sido abusada sexualmente.
Uma das vítimas tinha dois anos e dois meses de idade quando a Aids foi
diagnosticada. Os médicos concluíram, algo estarrecidos, que em certos meios sociais o
modo de transmissão de Aids mais comum entre adultos, o sexo, também atinge crianças
devido à pedofilia. (RBN)
Religião e violência
Ser religioso significa ser bom e construtivo em relação a si mesmo e aos outros (“ama
a teu próximo como a ti mesmo”), um princípio construtivo de eqüidade, solidariedade e
justiça, condições dirigidas para a paz e harmonia. Pertencer a uma religião é associar-se a um
grupo de homens que professam uma crença determinada, afiliar-se á uma instituição religiosa
e seguir seus preceitos. Portanto, nem sempre o homem expressa sua religiosidade, ao
pertencer a um grupo religioso. Ele pode usar o “rótulo religioso” para alcançar objetivos
individuais ou de grupo. Portanto, a prática religiosa nem sempre está vinculada à
religiosidade.
Notícias:
- 135 DC - Diáspora dos Hebreus
A imposição da religião oficial do Império Romano aos territórios dominados foi
motivo de perseguição ao povo judeu, cuja crença monoteísta constituía uma desobediência
aos preceitos da expansão romana. Os judeus, insuflados por sua religiosidade, tentaram sem
êxito empreender insurgências ao império, mas foram perseguidos impiedosamente, assim
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Da Reportagem Local
Depois de uma fase de expansão, a programação religiosa da TV investe em nova
frente: a procura de diferenciais. Um exemplo flagrante fecha, diariamente, a programação
da Manchete: o programa "Espaço Renascer". Seu trunfo? Sonia Hernandes - uma
pregadora que mais parece uma das entrevistadas dos programas "Flash" (Bandeirantes), e
"Perfil" (SBT), seus concorrentes na faixa horária de 0h.
filiados à igreja. O dono da fundação é seu marido, o pastor Estevão Hernandes. Ele é VJ do
"Clip Gospel", programa diário de música religiosa que antecede o "Espaço Renascer". Além
dos dois programas, a Fundação coordena um centro para a integração de menores
abandonados, no centro de São Paulo.
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De Nova York
A explosão na garagem do World Trade Center, em 26 de fevereiro de 1993,
reverberou muito mais longe do que nas torres gêmeas que se tornaram marco na paisagem
de Nova York. A bomba sacudiu as estruturas de um país construído por imigrantes e que, até
então, se considerava a salvo do terrorismo. Com o atentado, Nova York foi acordada pela
força do fundamentalismo islâmico.
A vida na cidade ficou mais tensa. A segurança foi reforçada nos prédios do governo,
em instituições visadas (como a ONU) e nos aeroportos. Pesquisas apontam que aumentou a
rejeição dos norte-americanos a estrangeiros. As cerca de 50 mil pessoas que ocupavam os
escritórios do World Trade Center no momento da explosão certamente não a esquecerão.
Testemunhos dão conta do pânico que se espalhou com a explosão e o subsequente colapso
do sistema elétrico. Alguns funcionários até hoje não conseguiram superar o trauma e voltar
ao trabalho. As relações entre os diversos grupos étnicos que compõem a população de Nova
York também foram estremecidas. Árabes e muçulmanos em geral queixam-se de
discriminação. O policiamento é reforçado toda vez que há um incidente de grandes
proporções no Oriente Médio, como o recente massacre de Hebron. (FG).
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AFEGANISTÃO; BELFAST
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CAPÍTULO VI
Drogas e violência
As formas de usar drogas e as condições que organizam esse uso podem ser diferentes
de acordo com os valores do grupo humano, mas todas elas são expressivas e significativas
para os indivíduos dentro de cada grupo.
• A expectativa pelo poder pessoal (fama, gloria, competência, ser conhecido por
todos, ser diferente dos outros).
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• A expectativa pelo poder político (ser o líder, ter influência, dirigir e controlar
os outros).
A sociedade branca lida com a droga de forma ambígua e paradoxal. Ao mesmo tempo
em que os moralistas a condenam e a segregam da realidade social, ela é usada
indiscriminadamente de forma abusiva e descontrolada por todas as classes sociais, por
indivíduos de todas as idades, com freqüência alarmante e totalmente desvinculada de
mecanismos controladores da sua função social.
A Ciência concentrou o saber dos fenômenos naturais e a sua aplicação, nas mãos de
grupos restritos. A religião já vinha transformando a crença e os costumes em códigos morais
rígidos e culpáveis e elegeu um único Deus para substituir as múltiplas divindades existentes,
ligadas às diferentes necessidades da crença humana. A concentração ou centralização tem
sido sempre a grande tendência da sociedade que se auto-intitula de “civilizada”.
Com isto queremos dizer que a questão da identidade (quem sou?, quem são os
outros?, quem gosta de mim?, de quem eu gosto?, qual o meu papel nisso tudo?) é,
provavelmente, o grande fator de equilíbrio que determina os comportamentos, seja no plano
135
O indivíduo que abusa das drogas expressa, através do uso excessivo delas, a
necessidade de suprir-se desses vínculos essenciais da cadeia social, necessários que são ao
desenvolvimento da sua personalidade e ao seu equilíbrio no grupo social. O abuso de drogas
não é, portanto, um fenômeno meramente individual que encontre resposta adequada através
da prática médica, jurídica, policial ou religiosa. As posturas moralista, legal, científica ou
religiosa até hoje não conseguiram resultados satisfatórios e nem nunca conseguirão, pois as
formas de drogadição são múltiplas e suas raízes estão presas às próprias necessidades
humanas dentro da paisagem social.
Pior que a drogadição são: fome e guerras, resultados do caos social. Somos obrigados
a rever a ordem social, suas instituições, valores e costumes. Estamos diante de um dilema: ou
mudamos ou continuamos o caminho para a autodestruição.
136
Notícias:
OS CRUSTIES E...
SEXO
O universo crusty é basicamente heterossexual, com pequeno número de adeptos gays
e lésbicas. Doenças venéreas são freqüentes por causa da falta de higiene. Casos de gravidez
inesperada acontecem muito entre os mais novos, basicamente por falta de informação. Mas
nada que seja muito diferente de qualquer grupo da mesma idade.
DROGAS
Um crusty aceitará qualquer droga que tiver na casa. Não tomar drogas é
considerado anormal na nação crusty. Faz sentido: eles não ligam para saúde, vivem para o
momento e papo antidrogas é papo exatamente da sociedade que eles deixaram para trás.
Haxixe é universal, com maconha aparecendo de vez em quando. Acido é um must, porque é
barato e dura várias horas. Speed e ecstasy também são populares. Nas cidades, existe
também um bom número de crusties vicia dos em heroína. As bebidas preferidas são cidra e
cerveja forte.
POLÍTICA
A rejeição a tudo é uma atitude política em si. Mas a maioria dos crusties não se
importa com o que acontece e deixa de acontecer. É mais aquela visão simples de "nós"
contra "eles" (a polícia, o governo etc.). Existem os politizados, geralmente envolvidos em
grupos ambientalistas tipo Greenpeace (um núcleo crusty nasceu do acampamento ecologista
que passou anos plantado em frente à base nuclear inglesa de Greenham Commom) ou anti-
fascistas com a Anti-Fazi League.
RELIGIÃO
Nada de religiões tradicionais. A filosofia espiritual é totalmente new age:
simplicidade, consciência terrestre etc. Coisas místicas (pirâmides, cristais, astrologia) ou
exóticas (budismo, Hare Krishna, shamanismo ) despertam o interesse também. Stonehenge,
na Inglaterra, o misterioso círculo de pedras supostamente erguido pelos druidas, é um ponto
obrigatório da nação crusty.
Giuliani disse ter ficado chocado com a negligência das chefias e escolheu para o
cargo de comissário-chefe da polícia de Nova York um "estrangeiro" com fama de durão,
William Bratton, ex-chefe da polícia de Boston, Massachusetts (também na Costa Leste).
Giuliani acredita que um "xerife" sem vínculos anteriores com seus próprios subordinados
processará a "limpeza" dos corruptos com mais eficácia.
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equivocada. O crime está muito bem organizado. As armas chegam nas favelas com uma
frequência extraordinária."
Sivuca cita uma estatística policial que, segundo ele, não foi divulgada pela
Secretaria Estadual de Polícia Civil. "O Comando Vermelho tem 17.500 soldados, a maioria
talvez com menos de 14 anos. Como ela diz então que o crime não está organizado?”
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De Londres
O governo britânico foi abalado ontem por um novo escândalo sexual. O deputado
conservador Stephen Milligan, 45, foi encontrado morto em seu apartamento em Londres
usando apenas uma cinta-liga e meias de mulher. A polícia suspeita ainda que ele possa ter
consumido drogas.
A polícia investiga várias hipóteses, desde assassinato até morte natural e overdose
de drogas. A causa mais provável, porém, parece ser morte por parada cardíaca, causada
involuntariamente pelo próprio deputado.
Neste caso, antes de morrer ele possivelmente estaria realizando uma prática que
consiste em se abster de oxigênio para aumentar o prazer sexual. O efeito é comparado pelos
médicos com o de algumas drogas que provocam alucinações por reduzir o fluxo de oxigênio
139
para o cérebro. Uma corda amarrada ao saco plástico indica que Milligan parecia estar se
sufocando. Isso teria provocado uma parada cardíaca.
Governo Major
O Partido Conservador é o mais hostil aos homossexuais no Reino Unido (Inglaterra,
Escócia, Irlanda e País de Gales). Vários de seus membros já qualificaram a
homossexualidade como um desvio ou anomalia sexual. O partido reluta em aprovar a
redução da idade mínima para relação homossexual de 21 para 16 anos. (HuSa)
Prostituição e violência
A prostituta é a mulher que, por não ser competitiva no mercado, precisa usar o sexo
como produto, para sobreviver. A “mulher emancipada” é a que tem capacidade de competir.
Mesmo assim, se vender o sexo, será para adquirir bens de consumo que a façam sentir-se
mais próxima das classes altas, sem perder a “classe”. Não há diferença de caráter, de talento
ou de religiosidade entre esses tipos de mulheres. O comportamento hipócrita dos homens, ao
defenderem a moral de suas filhas e freqüentarem alegremente os cabarés, aponta para a
discriminação social que separa as pessoas em classes: superiores e inferiores. A prostituição
é um conceito civilizado, artificialmente criado para julgar a sexualidade sob parâmetros
equivocados.
Notícias:
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Lílian Ramos sabia exatamente o que fazia - e sabia exatamente o que não estava
usando por baixo da justa camiseta. Tinha certeza de que, postada ao lado do presidente,
viraria o centro das atenções e dos fotógrafos. Traduzindo: como perua deslumbrada, ela
merece nota 10.
Quem não sabia seu papel era o presidente. Se ele conhecesse seu papel tão bem
quanto a manequim, nada teria acontecido. Ou mellhor, quem sabe tudo teria acontecido.
Explico melhor.
Ele é solteiro e poderia até ter travado contato menos público com a manequim -
ninguém proíbe um presidente de ter vida sexual.
Do jeito que acabou, ele manchou a imagem de um presidente, ficou com a fama de
ingênuo para uns e depravado para outros - e, para completar a comédia, nem teve um fugaz
caso.
PS – Há líderes políticos sustentando que Itamar Franco deveria cair pela baixaria.
Mas, alguns deles, não se incomodaram em defender até o último momento Fernando Collor
-mesmo sabendo quem era e o que tinha feito com o dinheiro público. O episódio da calcinha
é, pelo menos, de graça.
Corrupção e violência
Notícias:
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De Nova York
O combate à violência foi o carro-chefe da campanha de Rudolph Giuliani. E agora
promete ser seu maior desafio. Com o crescimento do crime organizado e do tráfico de
drogas, espalhou-se também a corrupção entre uma corporação de 30 mil policiais, a maior
força policial de uma cidade norte-americana.
Giuliani disse ter ficado chocado com a negligência das chefias e escolheu para o
cargo de comissário-chefe da polícia de Nova York um "estrangeiro" com fama de durão,
William Bratton, ex-chefe da polícia de Boston, Massachusetts (também na Costa Leste).
Giuliani acredita que um "xerife" sem vínculos anteriores com seus próprios subordinados
processará a "limpeza" dos corruptos com mais eficácia.
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Da Sucursal do Rio
O delegado Luis Mariano dos Santos, da Polinter, vai investigar as denúncias de
corrupção por determinação do secretário de Polícia Civil, Nilo Batista. A investigação
começa com os depoimentos dos árbitros Cláudio Cerdeira, autor das primeiras denúncias, e
Reginaldo Matias, que prometeu uma lista de corruptos.
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Notícias:
Adultério derruba ministro britânico
Tim Yeo, do Meio Ambiente, renuncia um dia depois de dizer que não deixaria o
cargo
De Londres
Um caso de adultério provocou ontem a renúncia do ministro do Meio Ambiente do
Reino Unido, Tim Yeo. Há 11 dias ele lutava para se manter no cargo, após admitir ter tido
uma filha numa relação extraconjugal. O escândalo causou embaraço para o governo do
premiu John Major, que está realizando uma cruzada pelo retorno a valores tradicionais da
sociedade.
O ministro, que é casado e tem dois filhos adultos, teve uma breve relação com Julia
Stent, 34, vereadora num distrito de Londres. O caso aconteceu durante a convenção do
Partido Conservador em 1982. Stent, que é solteira, ficou grávida e deu à luz uma menina em
julho de 1993.
Yeo admitiu ter agido "tolamente", mas afirmou que uma questão privada não deveria
influenciar no destino de um ministro. "Minha vida privada jamais afetou meu trabalho como
ministro", afirmou. Com o apoio de sua família e de Stent, que não se pronunciou nesse
período, ele esperava poder manter seu cargo. Apesar de adultério ser um problema grave
para um ministro no Reino Unido, o que obrigou Yeo a renunciar foi a imagem de hipocrisia
que ele transmitiu. Num momento em que o governo defende a volta a valores conservadores
e ataca as mães solteiras como "um dos maiores problemas sociais de nossos tempos",
espera-se que um ministro dê exemplo, não que se veja envolvido num escândalo como esse.
ministro. Em sua carta de renúncia, Yeo disse que renunciava "com profunda tristeza". O
premiê Major respondeu que lamentava a perda do "talento de um eficiente ministro".
Ironicamente, foi do Partido Tralhista, de oposição, que veio o maior apoio a Yeo. Os
trabalhistas defendem que a vida privada de um político não deve ter repercussões na vida
pública. Yeo se soma à lista de políticos conservadores vítimas de aventuras amorosas fora
do casamento. O último caso ocorreu em 1992, quando David Mellor, então ministro da
Cultura e amigo pessoal de Major, renunciou quando se descobriu que ele teve um caso com
uma atriz.
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Calcinhas
Guerra e violência
grupal. Nas sociedades reativas elas possuem motivações econômicas (indú stria bélica),
religiosas (fanatismo), políticas (anexação de território, objetivos eleitorais) ou simplesmente
como forma de descarregar reatividade acumulada (belicosidade).
Notícias:
"A estrutura da guerra está mudando fundamentalmente... o tempo dos combates caiu
muito e a margem entre morrer ou ser morto é de uns poucos segundos", diz Tony
Cordesman, do Centro Wilson de pesquisa (Washington).
Um tempo tão curto torna quase impossível para o piloto de um caça verificar o alvo
com seus próprios olhos antes de atirar.
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FIM DE GUERRA
Sob a influência da tomada do poder em Cuba por Fidel Castro, a opção pela
guerrilha disseminou-se entre países centro-americanos como uma alternativa para combater
ditaduras personalistas e violentas.
Os sandinistas, após uma década no poder e enfraquecidos pela ação dos contra-
revolucionários, apoiados pelos EUA, realizaram eleições livres, em que foram derrotados.
Em El Salvador, os guerrilheiros da FMLN, depois de um acordo de paz, adotaram a via
política pacífica.
Virada essa página de violência e intolerância, que teve sua população civil como a
maior vítima, espera-se que toda a América Central consolide o regime democrático, que aos
poucos se fortalece na região.
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O Leste Europeu, expressão mais política do que geográfica, vive hoje uma situação
muito parecida à do pós-Segunda Guerra.
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Parece pouco sensato generalizar sobre atos violentos cometidos por crianças e
adolescentes. A carga reativa (tensões internas) acumulada, pode resultar em comportamento
violento na medida em que sua intensidade, somada aos mecanismos específicos
determinados pela constituição individual atingir o limiar crítico dos processos mentais que
controlam os impulsos destrutivos e a administram na relação. Mas o ambiente, gerador de
tensões, é de grande importancia para a sua prevenção.
Quando uma criança ou adolescente não consegue ter seu espaço no interior da
família, se dirige para as ruas onde tenta se refugiar do caos familiar. O que encontra nesse
meio, todos já sabemos: a violência.
Notícias:
Terapeutas relatam casos de crianças com menos de 12 anos (não penalizáveis pela
lei) acostumadas a cometer atos que, praticados por um adulto, seriam considerados crimes
ou contravenções. A tortura de animais, especialmente gatos, está no topo da lista. Também
não são incomuns os registros de atos de vandalismo (riscar veículos com uma chave, por
exemplo) e de pequenos furtos. Mais raros são os casos de assassinatos cometidos por
crianças.
O menino pobre foi encaminhado a uma escola bem organizada, onde passava o dia
inteiro. O outro foi para uma nova escola particular, passou a fazer psicoterapia e a sua
família também.
Dois anos depois, o menino pobre estava trabalhando num supermercado e não exibia
mais os sintomas de antes. O outro, continuava com os mesmos sintomas, foi expulso da
escola e, anos mais tarde, deu um tiro numa namorada. "Com todas as condições, ele não
mudou nada. Há situações em que o ambiente parece não influenciar", conclui Assumpção.
Mais otimista que Assumpção, Tanis acha que, com auxílio terapêutico, "essas
crianças podem compreender que frustrações elas estão tentando compensar com os seus
atos".
A terapeuta de família Lidia Aratangy, 53, acha que parte dos problemas das crianças
surge da repressão à agressividade com tapa. "Bate-se muito em criança e isso é muito ruim.
É um contra-senso. Agressividade se resolve com abraço", diz a psicóloga.
(Mauricio Stycer)
Poucos parecem ver que negros são tão "negros" e brancos são tão "brancos" quanto
peles-vermelhas são "vermelhos" ou amarelos são "amarelos". A cegueira do preconceito é
autocomplacente e consentida.
O tempo e o acaso tornaram o Brasil uma das mais violentas sociedades capitalistas
modernas. Aqui, crianças morrem de fome ou, a golpes de miséria e abandono, converte m-se
em pequenos assaltantes ou marginais ferozes. Na maioria são negras e, depois de cuspidas
nas ruas e favelas imundas, são aniquiladas como ratos, por bandos de extermínio.
O tempo e acaso fizeram com que Hermógenes de Almeida Silva Filho e Reinaldo
Guedes de Miranda nascessem "negros" no Brasil, lutassem pelo direito das minorias,
participassem da Comissão que investiga o assassinato de adolescentes na Candelária e
fossem trucidados com 15 tiros de pistola 9 mm, na madrugada de domingo, 12/06/94.
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Por fim, o tempo e o acaso fizeram com que este horror acontecesse em tempos de
Copa do Mundo, onde quase todos - é natural - só têm olhos e ouvidos para futebol. É a
"história feita destino pessoal", diria Hannah Arendt.
Mas, continuo com Arendt, se não formos "desses rematados oportunistas que sempre
aceitam o "aqui e agora", a história não pára neste funesto episódio. Que cultura é esta; que
país é este? Uma escola de bufões? Estes homens morreram por aquilo que diz respeito a
todos! Por que o silêncio em torno de suas vidas e memórias? Por que noticiar as mortes em
fundos de jornais, como anônimos fatos policiais? Onde está nossa televisão, sempre prestes
a cair em "orgias patrióticas" por qualquer "vitória brasileira" nos esportes! Onde estão as
matérias barulhentas e chorosas dos horários nobres, feitas quando a tragédia atinge,
infelizmente, os ricos e famosos? Morte de "negros", lutando por justiça, não vende
automóveis de luxo ou produtos de limpeza? É isto? Então, o que queremos com isto?
Apontá -los como tolos que morreram por nada e por nenhuma causa? Ou queremos mostrar
aos nossos filhos que o desprezo e o esquecimento são o destino dos que encarnam nossos
ideais morais, enquanto o reconhecimento é privilégio dos que têm sucesso publicitário e
dinheiro? Como podemos lamentar o descrédito na "política", na "ética" e na "lei", se
ocultamos do olhar de todos aquilo que é a mais alta expressão da dignidade e heroísmo
políticos: morrer pelo bem comum! Um povo sem heróis é um povo infeliz; um povo que não
sabe reconhecer seus heróis é infeliz e estúpido!
Não penso na canalha cínica que seqüestrou esta nação. Ou seja, à corja de
traficantes, corruptos e vendidos de toda sorte ou naqueles empresários brasileiros que
posam de vítimas do Estado enquanto "exigem", com a maior desfaçatez, que a sociedade
pague os lucros inflacionários que perderam e querem manter, com ou sem inflação! Esta
ralé é incorrigível. A solução é a cadeia. Penso nos que ainda querem fazer deste lugar um
lugar digno de se viver. Por que comportar-se como ovelhas diante de chacais? Há pouco a
Itália, sacudida pelos escândalos da Máfia e da democracia cristã, saía às ruas, em Palermo
e outras cidades, gritando: "A Itália é nossa e não da Cosa Nostra!" Onde estão o
parlamento, a universidade, os intelectuais, os partidos políticos, as associações, os grupos
de cidadãos, os "cara-pintadas", que não vêem que mortes como estas são algo muito mais
sério do que troca de moedas ou de caras em Brasília? Quem pode governar um país onde
Hermógenes e Reinaldo são assassinados por quem foram e como foram, em pleno Rio de
Janeiro, e dias depois, a polícia vem a público dizer que se tratou de um crime passional!
É tudo; e como é pouco! Estamos aprendendo a viver em guetos, cantando como rãs
em charcos. O cerco da marginalidade se estreita. E ao chegar a nossa vez, vamos
idiotamente perguntar o que outros algum dia perguntaram, quando resposta alguma fazia
mais sentido: como Hitler ou o Cartel de Medellín tornaram-se possíveis? Nesta hora, talvez
Hermógenes e Reinaldo venham a ser lembrados. Só que não haverá "Dia D", onde não
existe desejo de libertação. Não estaremos em luta contra nazistas, stalinistas ou qualquer
outro totalitarismo que se venha, por acaso, a inventar. A "Normandia ocupada" está em
cada um. Está no conforto bovino que nos prende à indecência da especulação, do consumo,
do desperdício, enquanto homens como nós morrem por nossa honra e por nossa vida. Se o
"basta!" não chegar a tempo, logo logo virá o "tarde demais".
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Velhice e violência
Notícias:
Na sua opinião, muitos dos idosos que estão em casas de repouso "estão insatisfeitos"
e só permanecem lá por falta de uma família ou porque imaginam que estão atrapalhando os
filhos.
O professor observa que as pessoas, à medida que que envelhecem, tendem a ficar
mais caseiras e a diminuir seus relacionamentos. "É fundamental manter uma vida social",
afirma. Segundo ele, a maioria das pessoas se adapta bem à velhice, convivendo com
pequenos passeios diários e o contato com os netos. "Mas uma minoria não aceita o
envelhecimento”.
O geriatra Mário Mosca, 49, diz que o idoso sadio não precisa de atividade ou
espaços especiais. "Seria uma forma de segregá-lo”.
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Da Reportagem Local
A artista plástica Anita Maiuri não diz a ninguém quantos anos tem. "Sou muito
vaidosa", justifica. Até o ano passado, ela mantinha um ateliê e uma pequena escola de
pintura no seu apartamento da rua Mela Alves (Jardins). Anita conta que já participou das
bienais de Roma, Paris e São Paulo.
Há dois meses está na casa de repouso Danúbio Azul, na rua Avanhandava, 814, (tel.
256.1480). Paga cerca de 300 URVs por mês para conviver com 18 outras mulheres. A casa é
comandada por Nilda de Oliveira Vasques, 57, que há 40 trabalha com idosos.
"Estou apenas repousando", diz Anita. "Logo saio daqui, arrumo um apartamento e
monto de novo meu ateliê." A velhice não a agrada muito. "Prefiro morrer a ficar com cara
de velha idiota, que nem anda nem fala”.
Anita tem olhos verdes e cabelos brancos. "As pessoas dizem que sou muito bonita, e
eu acredito. Tive muitos namorados, até sobrou”.
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Da Reportagem Local
Felicidade sexual entre casais com mais de 70 anos não é história da carochinha.
"Conheço cada vez mais casos", afirma uma especialista no assunto, a psicoterapeuta
Ana Perwin Fraiman, que acaba de lançar o livro "Sexo e Afeto na Terceira Idade".
"Os casais felizes sexualmente aos 70 anos são aqueles que aprenderam uma
linguagem sexual mais madura, cheia de malícia e provocação, menos ansiosa, e mais difusa
pelo corpo todo", afirma Ana Fraiman.
Especializada em gerontologia (estudo dos problemas dos idosos), Ana Fraiman, 47,
dá orientação psicoterápica individual e a grupos de maiores de 55 anos.
No Instituto Kaplan, uma entidade sem fins lucrativos que oferece atendimento na
área de sexologia a pessoas de baixa renda, Ana Fraiman tem hoje um grupo de nove pessoas
(seis homens e três mulheres).
"Elas me perguntam se os velhos também “ficam”. Muitas querem falar com os netos
sobre sexo. É também grande o interesse das mulheres em aprender direitinho a se
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masturbar", afirma Ana. Em suas palestras a idosas, Ana costuma afirmar: "Pare de ficar se
amolando com pelanca, varise, banha e descubra que o seu corpo é vibrante”.
"Muitas mulheres hoje na casa dos 50 anos aprenderam a tomar banho com
camisolão. Então, elas precisam aprender a massagear o próprio pé, dormir nua, reaprender
a ter prazer", afirma a psicoterapeuta.
Para uma mulher viúva, encontrar um novo parceiro não é fácil, diz Ana. "Na idade
jovem, as pessoas podem fazer sexo sem afeto. Na velhice, isso é impossível", conta.
Ao encontrar um parceiro, a idade obviamente vai impor limites físicos, mas isso não
é um problema, na opinião da psicoterapeuta.
"Não se trata tanto de um sexo de posse, mas de doação, bastante mais sutil e de certa
forma bem mais demorado”.
Quando falamos sobre a mente dissemos que todo excesso de energia tensional
(nódulos reativos) tem tendência de se descarregar em qualquer direção (para o
comportamento ou para dentro do corpo) com a finalidade de reequilibrar o organismo. Cada
indivíduo pode conter (reprimir) ou expressar (descarregar) essas tensões. O modo de vida de
uma pessoa em seu grupo social é determinado pela estabilidade cultural da sociedade, que
forma os hábitos e costumes circulantes (sentimentos, princípios e valores), que determinam
os comportamentos; que originam a qualidade da convivência; que promovem o bem-estar ou
mal-estar; que facilitam o equilíbrio ou o desequilíbrio psíquico e orgânico de cada um; e que
promove a união (harmonia) ou reatividade (conflito) entre os membros no grupo. A
sociedade humana se comporta como um organismo que, quando em desequilíbrio, pode
produzir células destrutivas (indivíduos reativos) que se organizam em forma de tumores.
Crime organizado é isso: a reunião de indivíduos portadores de comportamentos reativos
atuando destrutivamente no interior de um organismo social doente.
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Notícias:
Da Reportagem Local
O crime organizado preocupa a Polícia Civil de São José. Nos últimos três meses,
grupos profissionais promoveram assaltos considerados audaciosos, utilizando armamentos
pesados, sistemas de radiocomunicação e "uma certa dose de discrição", afirma o delegado
regional José Celestino Joaquim, 56. Neste período, pelo menos quatro assaltos deixaram as
investigações na estaca zero.
Vestindo blazers brancos e camisas pólo pretas, quase 200 membros da Yamaguchi-
gumi voaram para Sapporo, capital da ilha, a fim de inaugurar a filial da quadrilha. Foram
recebidos no aeroporto por 800 integrantes de sindicatos rivais.
Sexo e violência
É sabido que o desejo e o amor levam ao sexo, que o sexo leva à Vida, que a vida
exige e determina a organização de uma Família. Não temos alternativas: ou ficamos sós ou
produzimos uma Família.
A primeira grande característica do sexo é ser individual - cada indivíduo tem seu
sexo. A segunda é ser diferenciado - só há dois sexos: masculino e feminino.
Parece que a natureza propositadamente projetou duas criaturas inacabadas, isto é,
feitas só pela metade; duas bandas que isoladamente não tem sentido qualquer, mas, quando
reunidas, se completam e se integram ganhando sentido e função.
Sexo é isca atraente e gostosa que fisga homens e mulheres para, igualmente, colocá-
los no cesto familiar e despachá-los para o mercado social. Ninguém fisga ninguém, ambos
são fisgados e gostam de ser. Homens e mulheres são protagonistas na atividade sexual, mas
não são seus criadores. São, porém, os inventores da idéia que associa o sexo ao pecado e à
culpa. Quem inventou a idéia de pecado? Algum esperto que pensou em tirar algum proveito
disso ou um fanático que resolveu se tornar inimigo do prazer, da família e da sociedade?
Manter a idéia de "sexo sujo" (pecado) deve ser importante para os que querem
preservar a mentira do pecado. Homens e mulheres, escravos dessa idéia, terão sempre uma
vida sexual pobre e marginalizada e se manterão fervorosos adeptos e leais colaboradores da
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castração religiosa e do brasão da falsa moralidade. Nas doenças mentais e nas neuroses
graves de crianças, adolescentes e adultos sempre surge esse brasão e essa bandeira
tremulando no alto das cabeças doentes, como se fossem as marcas subversivas à Ordem
Natural. O sexo nas sociedades civilizadas é visto como um mal necessário, uma espécie de
assunto proibido para crianças e adolescentes. Um tabu.
Notícias:
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Ishihara disse que começou a roubar por hobby. Mas depois descobriu o valor que as
calcinhas usadas têm para os fetichistas e iria vendê-las. Cada calcinha pode chegar a custar
US$ 9 (cerca de CR$ 2,9 mil). Máquinas de produtos pornográficos chegam a cobrar várias
vezes este valor. Um dos best-sellers da indústria do sexo são estudantes com roupas da
Marinha e calcinhas brancas.
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De Washington
Lorena Bobbitt, 24, a manicure que cortou o pênis do marido, John Wayne Bobbitt,
descreveu ontem ao júri que a está julgando diversos incidentes em que alega ter sido
espancada por ele. A defesa afirma que a agressão de Lorena, em junho do ano passado, só
ocorreu por ela ter sido submetida pelo marido a anos de agressões físicas e sexuais.
Ela também se definiu como uma mulher de família muito católica, que condena o
sexo antes do casamento, o aborto e o divórcio. "Para mim, o divórcio é uma humilhação,
uma vergonha". Ela está se divorciando de John, após quatro anos e meio de casamento.
John Bobbitt, 26, negou ao júri todas as denúncias de violência contra a mulher. Em
novembro, ele foi absolvido da acusação de estupro marital. John teve o pênis reimplantado e
os médicos que o operaram dizem que ele vai voltar a ter funções sexuais ainda este ano.
As contas médicas de John estão sendo pagas com contribuições arrecadadas pelo
radialista conservador Howard Stern, que já chegaram a US$ 260 mil. Os advogados de
Lorena são pagos por entidades feministas.
Se for considerada culpada, Lorena Bobbitt pode pegar até 20 anos de cadeia e ser
deportada de volta para o Equador. O júri, de sete mulheres e cinco homens, pode começar
suas deliberações hoje.
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Trabalho e violência
A identificação ideológica tendia mais para o lado do discurso dos comunistas. Eles
prometiam uma sociedade igualitária onde não haveria classe dos ricos e dos pobres. Diziam
que chegaria o dia em que o mundo seria socialista e que o povo só necessitaria trabalhar
quatro horas diárias para manter garantidos a economia e o bem-estar das pessoas. Embora
nossa simpatia estivesse mais voltada para os marxistas, na verdade, não estávamos
convencidos. Ricos e pobres de um lado e ausência de liberdade de expressão de outro? Não
dava para entender.
Estava acontecendo diante dos nossos olhos um espetáculo novo: uma sociedade
verdadeiramente comunista e democrática ao mesmo tempo. Um tipo de sociedade que
comunistas e democratas prometiam, desejavam, mas não conseguiam ter.
Trabalhavam sem planos econômicos, sem receber ordens, com satisfação e apenas
três horas diárias! O resto do tempo estava reservado para conviver, cantar, dançar e
conversar; fazer festas e jogos onde adultos, crianças e adolescentes participavam igualmente.
A partir dessa época passamos a visitar com mais freqüência as aldeias para
compreender melhor os seus modos de viver, e aprender esse tipo de organização social tão
novo para nós. Compramos livros de Etnologia (estudo das culturas), conversávamos com
missionários e com outras pessoas, que conheciam há mais tempo seus costumes. Ficamos
realmente curiosos pelo fato de eles não saberem explicar suas práticas e suas formas de
organização social, religiosa, política e econômica assim como nós fazemos. Só sabiam
praticá-las e achavam isso muito natural. Não precisavam, como nós, explicar e entender tudo,
escrever e ler, justificar e argumentar, debater e discutir. Estavam simplesmente interessados
em viver e conviver.
Muito depois percebemos que essas explicações estavam integralmente contidas nos
seus mitos, hábitos, religiosidade e tradições, tendo como base a utilização do conhecimento
intuitivo. Bastava saber ler as suas práticas do dia-a-dia para entender tudo. Com o passar do
tempo compreendemos que o trabalho para eles era tão importante como qualquer outra
atividade. Trabalhar representava uma necessidade da vida, mas nunca o objetivo da vida A
vida era praticada (sem teorias) no conjunto dos momentos; trabalhar era apenas um desses
momentos. Tão importante como conversar, cantar, dançar, comer e contar piadas e estórias.
Muito diferente do que nós aprendemos, onde trabalhar, estudar, acumular dinheiro e
consumir sempre foi o lema e o objetivo maior. Realmente ficamos muito confusos nessa
época. Como mudar tudo o que havíamos aprendido? Será que estavam todos delirando ou, o
que víamos, era real mesmo e existia?
Foi muito difícil compreender tudo isso e com certeza resistimos muitas vezes em
aceitar esses costumes. Sentíamos inveja e admiração num só tempo. Quando soubemos que
essa prática já vinha ocorrendo há muitos milhares de anos ficamos mais incrédulos ainda.
Não era possível! O trabalho, o lucro, o poder e a grandeza que nos haviam ensinado estavam
completamente desmoralizados e arruinados diante dos nossos olhos. Fomos enganados por
capitalistas e comunistas.
discursos e sem livros, nos ensinavam uma forma nova e revolucionaria de sentir e pensar
como um homem livre! E eles nunca se aproximaram de nós para nos convencer a respeito de
ideologias políticas ou religiosas.
Albert Einstein tinha razão, a teoria da relatividade foi um avanço. Não existe o
“absoluto”, o único, o perfeito. Só comparando e relacionando é possível compreender e
estabelecer as diferenças. Só assim podemos optar e escolher livremente.
Atualmente esses discursos ideológicos estão praticamente extintos posto que o tempo
não perdoa ilusões e mentiras. Domenico de Masi diz com propriedade em sua obra “O
Futuro do Trabalho - fadiga e ócio na sociedade pós-industrial” que: “... Do nascimento à
morte, de dia e de noite, somos ativos, com o corpo e com a mente. A gente se move, agita,
pensa, recorda, imagina, fantasia. Em algumas dessas atividades prevalece a fadiga, a dor, o
desgosto, a rotina, o pesar; se pudéssemos, pararíamos imediatamente com elas. Se não
paramos é porque somos forçados pela necessidade, pelas ameaças, pelo hábito, pela falta de
coragem ou de imaginação. São essas as atividades que geralmente chamamos de
“trabalho”...”.
A fábula da formiga e da cigarra sempre foi uma mentira deslavada, uma estória para
idiotas. A formiga representando o operário-padrão e a cigarra o vagabundo cantor que perde
seu tempo sem trabalhar. Uma mensagem disfarçada que induz para o trabalho excessivo e
para a produção desenfreada, visando à acumulação de bens materiais. As crianças e jovens,
ao perceberem a mensagem, tendem a se identificar com a formiga (ser produtivo). Mas se se
identificam com a cigarra (ser improdutivo), podem sentir-se marginalizados e
ridicularizados, ou seja, só é bom quem trabalha muito como a formiga diz a mensagem
alienadora.
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É fácil desmascarar esse mito civilizado através dos livros de entomologia (estudo dos
insetos) e de algumas visitas a hospitais e clínicas superlotadas de homens e mulheres
estressados, estafados e neurotizados pelo trabalho excessivo.
Na verdade nem a formiga nem a cigarra trabalham muito ou ficam ociosas; ambas
trabalham o suficiente para viverem. Esses e outros animais não aprenderam a acumular bens
materiais por ganância ou ambição. Nem índios nem insetos conhecem a aposentadoria,
promessa enganadora de uma vida despreocupada, farta e feliz, inventada pela civilização
branca.
Outra hipocrisia reside no fato de se tomar como exemplo a vida das abelhas. Essa
farsa tenta impingir a idéia de que as abelhas são operárias dedicadas que trabalham muito,
acumulam mel e são obedientes à sua rainha (modelo do sistema civilizado).
Em outras palavras: enquanto a rainha fica ociosa e desfruta dos prazeres, as operárias
trabalham como escravos, obedecem e nada reclamam.
Esse seria o “processo natural” que todos deveriam assimilar: o Estado e a classe
dominante (rainha) controlando os trabalhadores (operárias) através do comando ordem-
obediência (organização da colmeia). Nessa concepção a maioria das abelhas seria
constituída de seres produtivos e obedientes que acumulam, e a rainha seria o ser parasitário e
poderoso que desfruta desse trabalho.
A mentira cai por terra duplamente porque esses insetos agem por instinto e não por
raciocínio lógico. Ademais, quem cria as abelhas para delas roubar o mel: é a rainha ou o
homem apicultor? Quem tiver interesse em compreender melhor a vida das abelhas tirará suas
próprias conclusões. Verá que elas não aprenderam os costumes civilizados. Basta ler alguns
livros que explicam esses assuntos. No dia em que o homem começar a comer fungos e
madeira podre, vamos sentir muita pena das formigas e dos cupins.
Muitas obras escritas sobre índios como “O Bom Selvagem”, de Jean Jacques
Rousseau, deturparam e tornaram românticas e irreais a complexa e pouco conhecida
diversidade dessas culturas. Jean Jacques Rousseau, ao que se sabe, nunca visitou um grupo
indígena e não conhecia as técnicas etnográficas modernas. Aliás, muitos doutores de
gabinete que defendem teses científicas citam sempre esse autor, talvez, quem sabe, por
simples comodismo ou por se sentirem plenos na matéria. Será que se sentem mais sábios que
os “selvagens”?
Ouvimos muitas pessoas afirmarem que os índios são preguiçosos e indolentes. Não é
nossa intenção defendê-los, porque já temos nossas idéias sobre este assunto e porque não
temos procuração deles para isso. Nem achamos que trabalhar muito seja bom; pelo contrário,
achamos uma grande burrice. Aliás, os burros de carga não falam sobre isso, mas de vez em
quando empacam.
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Violência na família
O nosso primeiro núcleo afetivo é a família, grupo que nos gerou, com o qual
exercitamos nossas primeiras relações e que estará fortemente gravado em nosso psiquismo
para toda a vida. A qualidade dessas relações e do “clima familiar” será sempre de grande
influência sobre nós. A família é a primeira instância do poder, do afeto e da violência que o
indivíduo civilizado experimenta. É através dela que são sentidas as primeiras restrições,
limites e proibições (repressões) da vida social. O homem depende do seu grupo social. A
família, como unidade social, cumpre a função de modelar o indivíduo para viver em
sociedade e, ao mesmo tempo, é influenciada por ela. Os membros da família deveriam
interagir por meio de comportamentos ativos (construtivos) e não de comportamentos reativos
(destrutivos). Esses comportamentos é que determinam a qualidade da convivência familiar e
social.
Nossa família biológica não mais dispõe de uma rede sociocultural bem desenvolvida
e integrada. Ela terá que encontrar formas alternativas para conseguir desempenhar
normalmente suas funções de proteção, educação e socialização dos indivíduos, até que outras
soluções apareçam para lhe dar apoio.
Uma aparente contradição do grupo familiar está contida no seu principal papel e na
sua mais importante função: gerar, proteger, nutrir e educar o indivíduo com o objetivo de
prepará-lo para a futura separação do grupo que o originou e formar um novo grupo - outra
família. Só assim é possível perpetuar a espécie e manter a vida humana em movimento.
Com o homem não poderia ser diferente embora, na escala zoológica, seja o animal
que mais tempo depende do grupo familiar para se desenvolver. A função da família é, pois,
de natureza centrífuga (de dentro para fora); quem quiser formar uma família, não pode
permanecer eternamente na sua. Tem que sair. E é melhor que saia bem preparado.
Somos o retrato fiel da nossa família e da sociedade. Mas, por incrível que pareça,
somos dotados da capacidade de provocar mudanças em nós mesmos e ao redor, no ambiente
em que vivemos.
As crianças e adolescentes das classes média e alta são diferentes dos meninos de rua
porque ainda contam e usufruem bens materiais, têm família, embora não consigam es-
tabelecer um bom contato com ela. Agridem-se entre seus grupos rivais e também à
sociedade. Não conseguiram completar seu desenvolvimento adulto dentro de casa e, por isso,
se sentem revoltados. Zombam da sociedade atual considerando-a “desatualizada”. Agridem
ou tentam agredir essa sociedade que esmaga suas famílias sobrecarregando-as de tributos,
trabalho e fantasias de consumo.
Desde o início deste trabalho procuramos mostrar que as distorções em nosso modo de
viver e conviver atingem e alteram a Organização Social, a Família e o Indivíduo. Dissemos
que esses três planos da convivência estão interligados e se influenciam mutuamente. Se
aceitarmos que o indivíduo é a unidade de qualquer grupo social, teremos que aceitar que seu
comportamento é o motor das relações sociais e que seu psiquismo é o ponto de origem onde
tudo se inicia.
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CAPÍTULO VII
Psicose e sanidade
(mecanismos de intermediação)
Conviver é usar todas as nossas experiências inatas ou adquiridas para encontrar uma
solução inteligente ou uma resposta temporária, frente aos dilemas que a vida em sociedade
nos apresenta. É como dizer: “Viver eu quero, conviver é preciso!” Mas é preciso também ter
a capacidade de fazer uma avaliação correta do ambiente e das relações. Se no ambiente onde
se vive, os sentimentos, princípios e valores são verdadeiros, nossa resposta é ativa
(sintônica); se em outro ambiente os sentimentos, princípios e valores são falsos, nossa
resposta é reativa (camuflada). Nossa mente é tão adaptativa quanto o nosso corpo, com a
diferença de ser mais rápida.
A teoria evolucionista nos diz que vivemos lincados (sintonizados) com o ambiente,
num processo de adaptação permanente. E mais: que nossa sobrevivência como espécie
depende de mecanismos estabilizadores que intermediam essa relação interativa. Se esses
mecanismos falham ou se tornam incompetentes para apresentar respostas adequadas, nosso
destino é desaparecer como espécie e como indivíduo.
Já vimos que uma sociedade é antropocêntrica quando situa a figura do homem (e sua
convivência) no centro dos interesses do grupo e que o resultado desse tipo de organização é a
formação de sociedades naturais, onde a solidariedade entre seus membros e o respeito pelas
normas fortalece a coesão do grupo. Precisamos dizer agora que esse tipo de convivência
facilita a sintonia entre indivíduos, pois o valor central é o coletivismo, isto é, o bem-estar dos
membros do grupo. Poderíamos, então, chamá-las de sociedades sintônicas. Nesse caso, os
sentimentos, princípios e valores podem expressar-se livremente, do jeito como se originaram
no psiquismo. Não precisamos camuflar, reagir ou reprimir e, não havendo acúmulo interno
de tensões, quase toda a energia da emoção é liberada no gesto, ato ou palavra. O resultado é:
estabilidade mental, tranqüilidade, bem estar.
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Todos nós, quando experimentamos situações com as quais não estamos adaptados,
atuamos reativamente na tentativa de readaptar nossas respostas ou mudar a situação alterada.
Nesses períodos, não só a nossa agressividade se altera como todo o organismo reage,
podendo produzir o que conhecemos como: descontrole emocional, fúria, pânico, etc.
Essas alterações podem ser mediadas por outros mecanismos que nos dão uma falsa
idéia de normalidade desde que camuflem parcialmente as descargas fortes desencadeadas
pelos fatores que a iniciaram, fazendo com que os distúrbios transmitidos para o
comportamento pareçam menos intensos. Porém, a parte que não se descarregou fica retida e
passa a refletir-se para diferentes órgãos do corpo; outra parte fica na mente, de forma
acumulada, dando origem ao que conhecemos como “comportamento neurótico” (depressão,
ansiedade, obsessividade, etc). Quando aumentam, podem alterar a estabilidade psíquica,
produzindo alterações graves do psiquismo, ainda hoje conhecidas como doenças mentais
(comportamento reativo grave). Esses mecanismos mediadores é que determinam a
manifestação ou conversão das tensões, originando aquilo que chamamos de doenças
psicossomáticas, neuroses, psicopatias e psicoses.
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Os grupo naturais possuem unidade grupal (tradição de grupo) sustentado por seu eixo
cultural de integração, ou seja, pelo seu reconhecimento entre os membros como “um todo
com identidade”, com hábitos e costumes aprovados pelo senso comum e pelo objetivo
comum direcionado para a vida coletiva. Essas características são importantes para se
entender um grupo como “organismo social integrado” e como uma “unidade com
personalidade e identidade própria” dentro do universo social. Nesse caso, é de se supor que a
“sintonia nas relações” é fator importante e responsável pelo equilíbrio físico e mental do
indivíduo e do grupo, que o entende como bem estar.
Sintonia
O que é sintonia?
Para facilitar a compreensão desse conceito, vamos subdividi-lo em duas partes:
Homossintonia: Na homossintonia (sintonia adequada) o cérebro estaria recebendo do
seu circuito primário (família) todos os estímulos desejáveis para processar e imprimir
programas básicos de alta definição. Estaria sendo preparado para desempenhar bem suas
funções com o circuito secundário (sociedade), com o qual permaneceria conectado sempre,
gerando um novo ciclo de programações sintônicas. É o equilíbrio resultante das relações
positivas e construtivas entre indivíduos, que beneficiam o próprio indivíduo, a família, o
grupo social e o meio ecológico. Seria fator de harmonia do meio, determinante para a
manutenção do desenvolvimento equilibrado do psiquismo, da estabilidade familiar e do
modelo cultural.
M imetismo psicossocial
Ora, a forma que o organismo utiliza para se livrar dos resíduos tóxicos do corpo, isto
é, das fezes, da urina e do suor, é expulsá-los, colocá-los para fora. Com o psiquismo ocorre
coisa semelhante: ele precisa livrar-se do excesso de tensões emocionais, ou seja, do acúmulo
de cargas tensionais retidas no dia a dia, que prejudicam o seu equilíbrio e funcionamento
normal. Então, expressar ou manifestar essas emoções através de palavras e gestos é como
livrar-se do excesso. Reprimi-las significa aumentar essa tensão e acumular “núcleos reativos
de insatisfação e irritação”. Camuflar e reter sentimentos, princípios e valores é o mesmo que
facilitar o acúmulo de tensões e ficar “estressado”.
Sinalização
Fugas provisórias
Essa parece ser uma questão das mais difíceis com as quais nos defrontamos. Se cada
indivíduo possui uma configuração mental personalizada, aprendizagens e interesses
diferenciados e linguagem emocional própria, como organizar os dados para avaliar os
174
componentes que influenciam o resultado final da expressão manifestada? Se, ainda, sabemos
que essa manifestação pode ser produto de cargas reativas que se expressam simbolicamente
em códigos e que esses códigos provêm de um plano inconsciente não percebido pelo próprio
indivíduo, como ficamos? Eu acho que... Parece que... É possível que... Essas são as respostas
que temos atualmente, meras hipóteses!
Na segunda hipótese, significa negar sua natureza virtual, tratando-a como se fora de
natureza física. Ora, seria o mesmo que admitir a possibilidade de restaurar um programa de
computador que apresenta falhas, utilizando chaves de fenda, parafusos e outras ferramentas.
sinaliza a possibilidade de uma provável infecção, quais os sinais que indicam sua progressão
e seus fatores predisponentes?
alterações do corpo escolhemos o termo “doença” - que dá idéia de lesão ou disfunção física -
para as alterações do comportamento esse termo não se ajusta e torna-se inadequado.
“o grupo é o indivíduo e cada indivíduo é o grupo” e “os outros não pertencem ao nosso
grupo”, portanto, são estranhos a nós.
Ora, qual indivíduo desejaria destruir um sistema que o protege, mesmo nas condições
em que se comporta reativamente para descarregar suas tensões?
É curioso notar que entre certos grupos indígenas as concepções de saúde e doença
possuem sentido radicalmente oposto ao que conhecemos nas sociedades ocidentais. Nesses
grupos Saúde significa uma condição padrão da Vida, de normalidade estável, enquanto
Doença é considerada um desvio desse padrão normal, uma condição anômala da Vida, um
acidente passageiro. A Vida é construída sob o parâmetro da Saúde e os desvios são acidentes
178
efêmeros. Em outras palavras: Enquanto nossas atenções estão voltadas para a doença, eles a
tratam como mero acidente ocasional e desfrutam a saúde como bem instituído. Será por outra
razão que eles valorizam as pessoas enquanto estão vivas, enquanto nós só as valorizamos
depois que morrem?
Certas pessoas agem de forma análoga aos grupos naturais da selva: defendem suas
“verdades” com tamanha convicção, que podem sentir as verdades dos outros como formas de
perseguição ou retaliação à sua integridade intelectual, à sua individualidade. Concordam
teoricamente com o princípio da diversidade de opiniões e da liberdade de expressão, mas
agem reativamente quando suas “verdades” são questionadas.
Nas sociedades que perderam seu eixo cultural, o sentido mental de grupo encontra-se
enfraquecido ou desintegrado e a projeção dos elementos patológicos da cisão não encontram
sentido para extravasar em direção à exterioridade. Voltam-se para o interior da mente
individual produzindo graus diferentes de dissociação nos centros responsáveis pela unidade
integradora da mente. Se observarmos com atenção a paisagem social civilizada, podemos
acreditar que ela reflete certamente essa cisão na convivência entre indivíduos, e na sua forma
de organizar-se (ou desorganizar-se?). Os comportamentos reativos podem ser, portanto, de
tipo esquizóide, camuflado, codificado; que não podem se expressar livremente como são
gerado na mente, como se sua exposição ao sol da realidade pudesse produzir algum risco ou
perigo imaginário.
Dissociação
Responder essas questões seria a mesma coisa que perguntar se mente e sociedade não
são as faces de uma mesma moeda. Onde o cérebro estaria representando apenas a matéria
intermediária entre esses dois espaços virtuais. Essa correspondência parece ser tão íntima
que, ás vezes, o próprio cérebro não a suporta e sinaliza para a estafa.
CAPÍTULO VIII
Atualmente estamos vivendo num mundo diferente. Tudo pode ser falso ou
verdadeiro, dependendo do lugar onde nos encontremos, das pessoas com as quais
convivemos ou do grau de dissociação da nossa mente. A maioria das condutas - nas relações
- avança cada vez mais para um plano inseguro e dissociado (esquizóide). Tal sensação de
incerteza dificulta saber onde existe verdade ou mentira nas manifestações humanas. Padrões
lógicos de “falso” e “verdadeiro” não existem somente para orientar respostas aos comandos,
nos computadores. A mente necessita também desses padrões bem definidos para se manter
estável. A violência pode ser um dos resultados dessa instabilidade reinante, se admitirmos
que nossa sobrevivência depende de um relativo grau de certeza.
A mente humana sempre perguntou "Por quê?" Essa tem sido a pergunta-base para a
compreensão do mundo desde tempos muito remotos. O mito é uma alternativa de resposta a
essa pergunta no espaço mental que trata dos seres sagrados, divinos ou semidivinos, num
tempo em que o mundo era diferente, e diz como, através da atividade destes seres, as coisas
vieram a ser como são. Ele mostra aos humanos aquilo que deve ser feito para manter a Vida
em harmonia e as origens das coisas que existem, com simbologia inerente ao grupo que o
cria. É uma forma simbólica de estruturar uma narrativa, onde a religiosidade, a magia e o
cotidiano se misturam para explicar as origens e os mistérios da tradição. Uma forma de
organizar e fundamentar os costumes, as normas e crenças; organizar os indivíduos para as
finalidades sociais, para a solidariedade e para a unidade grupal. Um instrumento mágico-
ético-moral da esfera mental.
181
A religiosidade, magia e realidade se fundem num mito e num ritual e são expressões
de solidariedade social e crença coletiva. Os seres humanos sozinhos nada são. Eles alcançam
significação e importância somente como membros de um grupo social. Os rituais sagrados e
as crenças simbolizam a mente extratemporal da sociedade. Da experiência ritual surge o
contato entre o sagrado e o profano, que alimenta a crença e produz a realidade.
A religião e a magia são fontes de poder; são meios de influenciar ou controlar o poder
sobrenatural, o maior de todos os poderes. A autoridade representativa de que são investidos
os executores do sobrenatural (sacerdotes, magos, feiticeiros) é necessária para a evolução da
cultura em certos povos. Essa é uma razão especial para manter o poder religioso nas mãos
desses representantes nas sociedades equilibradas. Porque, nessas sociedades, o poder é
apenas de representação, não de poder real.
Dissemos antes que os estímulos motivadores dos comportamentos numa Cultura são
inúmeros, porém o Eixo Cultural poderia ser compreendido como uma fusão de consensos
dos membros de um grupo, algo que poderíamos chamar de Tradição do Grupo. Essa tradição
estaria representando a síntese de tudo aquilo que esse grupo acredita; sua alma, seus
costumes, sua própria “identidade em grupo”. Estaríamos diante daquilo que resultaria num
Modelo Cultural. Os mitos, reunidos, são o contexto histórico do modelo cultural que explica
a tradição.
Nessas condições, admite-se que os conteúdos psíquicos dos indivíduos dentro de uma
sociedade natural sejam guiados por normas oriundas da crença tradicional, ou seja,
desprovidas de interferências individuais, propiciando a expressão de comportamentos ativos
(construtivos). A utilização generalizada de sentimentos, princípios e valores de caráter
comum (solidariedade, generosidade, ética grupal), poderia explicar esse conteúdo construtivo
da conduta e da personalidade dos indivíduos nessas comunidades através do conjunto
representado por seu modelo cultural, onde os mitos atuam como eixo mental do grupo,
ordenando os comportamentos. Portanto, quem manda nos indivíduos são suas crenças e não
seus chefes. Cada um se dirige por si (por seu bom-senso) e todos estão sujeitos à tradição.
Essas são as sociedades que não necessitam do Estado para sobreviver e conviver. São
sociedades sem-Estado.
preleção diária para o grupo. A Palavra é detentora de grande fascínio e poder entre humanos.
Não serve apenas para expressar idéias e sentimentos - muito mais do que isso - possui
características indutoras do comportamento, ainda pouco compreendidas por nós. Isso fica
claro quando assistimos massas humanas humildes “hipnotizadas” pelas palavras de falsos
líderes religiosos, em busca de riqueza e salvação. Os fanatizados se suicidam ou matam.
Nas sociedades naturais, só o chefe indígena (para lembrar a tradição terrena) e o pajé
(para lembrar a tradição espiritual) são detentores do prestígio e poder de uso da Palavra-Lei-
Tradição; ao mesmo tempo lhes é negado (e a todos) o uso da Palavra-Ordem-Obediência.
O mistério, exótico e apenas aparente, desses costumes nos mostra a sabedoria contida no seu
cerne. No primeiro caso, a Palavra-Lei-Tradição representando a coesão, união e harmonia,
isto é, a ausência de poder de uns sobre os outros no grupo; em última análise, a ausência da
violência, da marginalidade e da miséria pela inexistência de um poder centralizado e
coercitivo. No segundo caso, a negação do uso da Palavra-Ordem-Obediência, para não
permitir o uso do poder, da violência e da diferença social e antinatural das classes sociais.
O “prestígio de representação” social entre os índios (chefe, pajé ou líder) proíbe o uso
do poder na competência (de dar ordens), assegurando assim a liberdade do grupo. A palavra
comum é de todos, mas assume conotação sagrada e de prestígio quando empregada por
representantes, que apenas podem invocá-la para lembrar e fazer cumprir a Tradição. A
Autoridade é a Tradição. Seus líderes são apenas representantes transitórios dessa autoridade
tradicional, mas não serão respeitados se derem ordens. A verdadeira Autoridade para êles é
filha do “respeito ao outro”, que é filho da Admiração; da verdadeira admiração por quem não
precisa usar o poder e a violência da coerção. O bom caráter da Autoridade constrói o
Respeito, que alimenta a admiração, que admira o bom caráter (prestígio) da Autoridade. É
preciso dizer que o autoritarismo (autoridade violenta e punitiva) destrói a admiração e
suprime a autoridade. Todo déspota, pela falta de autoridade que percebe em si mesmo,
realimenta a opressão e recebe como resposta, mais cedo ou mais tarde, a reação infratora dos
oprimidos.
A mitomania, entre nós, parece ser uma anomalia resultante do que o processo
civilizatório criou na mente; uma busca de equilíbrio mental, na desordem social dos dias
atuais, que continua camuflando a sintonia real na convivência.
184
O mundo virtual criado pelas mídias pode estimular a crença em falsos valores e
expectativas desejadas, que podem se tornar uma promessa de realidade. Assim é o mundo
virtual dos nossos dias, onde as promessas alimentam os sonhos, que realimentam a alienação.
Onde o comportamento alienado, quase sempre deságua na decepção, na insatisfação, na
incerteza.
Como felinos, preparamos armadilhas com diversas artimanhas e, escondidos atrás das
moitas da mentira e da dissimulação, esperamos nossas vítimas para saciarmos nossa fome de
riqueza, prestígio e poder. Somos os mais ferozes dos animais. Enquanto os felinos saciam
sua fome para sobreviver, nós atacamos de estômago cheio.
Não é certo que o progresso científico e tecnológico seja o responsável pelo declínio
na convivência. Não há relação direta entre essas coisas! Talvez devamos procurar essa
relação nos locais mais profundos da nossa consciência. Podemos usar todo o nosso tempo de
vida em busca dos sonhos estimulados pelos valores da sociedade em que vivemos. O tempo
nos dirá se eles eram reais ou apenas ilusões.
185
Higidez e cura
Quais os significados de Saúde e Doença para nós? Se tivermos medo de morrer por
doença, violência ou acidente é sinal de que valorizamos a Vida. Melhorar a qualidade de vida
não significa apenas acumular bens e usufruir privilégios. É muito mais do que isso! Estamos
perdendo o costume de partilhar com outros o que temos, seja isso um bem material ou um
conhecimento qualquer. Diria mesmo que a verdadeira “doença mental” reside na
incapacidade de cada um, em olhar “o outro” como um cidadão, um parceiro, “um igual”;
nossos olhos materialistas o focam como objeto, usuário, contribunte, cliente...!
Em 1971 tomei conhecimento do livro de Ivan Illich – A Expropriação da Saúde –
obra que trata das questões da saúde e suas estatísticas. Revela, entre outras coisas, que
aproximadamente 95% das doenças conhecidas são autocuráveis e que os 5% restantes
necessitam de intervenção médica e de medidas preventivas. Por ser um pesquisador sério e
conceituado no meio científico o impacto da obra gerou incômodo nos setores que auferem
grande lucro, como a indústria farmacêutica e as clínicas e hospitais “caça-níqueis”.
Em estudos feitos por equipes médicas e por etnólogos interessados, tem-se descoberto
o significado dado pelas sociedades naturais aos mesmos conceitos (saúde e doença). Esses
conceitos já foram comentados no capitulo VI (Esquizofrenia nas sociedades naturais?).
O que eles não conseguem compreender é o “porquê” precisamos criar termos como
“saúde pública” e “saúde privada”. Saúde é “bem comum”; na lógica deles essa separação é
inconcebível. Não separam a religiosidade da magia e da ciência porque as sentem de forma
integrada à cultura, onde direitos, deveres e valores são tratados no mesmo plano de
igualdade. Um pagé não separa o cerimonial mágico, das beberagens de folhas e raízes que
administra, pois o “sente” como elemento agregado ao processo de cura (estímulo
psicológico).
Metaforicamente podemos comparar nossa sociedade com uma longa escada. Os que
estão nos degraus mais altos sentem medo de descer; os de baixo sonham em subir. Ambos
sonham em chegar no topo, mas, se perguntarmos o que pretendem fazer quando atingirem o
final, provavelmente não saberão responder. Não percebem que essa escada se apóia numa
base construída com a argamassa da sua cultura (?), constituída dos seus sentimentos,
princípios e valores. A Vida não é uma escada, mas um caminho plano; onde as pessoas
podem caminhar calmamente de mãos dadas e conversando. Essa estrada não tem fim.
Quando não podemos mais caminhar, nossos filhos e netos continuam a jornada. Caminhamos
para frente, não para o alto, posto que, do alto corremos o risco de cair.
Machismo e feminismo
Deus e Natureza estavam sentados sob uma frondosa árvore. Haviam concluído os últimos
retoques da Criação, quando a Natureza falou: - Você acha que está faltando alguma coisa?
Deus: - Acho que sim...Poderemos criar um animal mais evoluído, mais completo...
Natureza: - Como assim...?
Deus: - Um que possua qualidades especiais, talentos, habilidades...Inteligência!
Natureza: - Com que objetivos?
Deus: - Para administrar o que acabamos de criar.
Natureza: - Para isso teríamos que lhe conceder o livre-arbítrio, concorda? Isso não seria
perigoso?
Deus: - Não. Ele estaria sujeito às leis gerais que já criamos. Se não conseguir administrar
bem se auto extinguirá, pois estará preso ao conjunto e terá de preservá-lo para sobreviver.
Natureza: - Pensou no nome que dará a esta nova criatura?
Deus: - Pensei em chamá-lo de “ser humano”, o que acha?
Natureza: - Como seria esse “ser humano”?
Deus: - Um ser completo...Pensante! ...Poderíamos criar apenas um. No final de cada ano ele
se dividiria em dois, três, quatro...E assim iria aumentando em número...Até ocupar toda a
Terra!
Natureza: - Não seria melhor dividi-lo em duas metades?
Deus: - Como assim..?
187
Deus e Natureza, após essa última decisão, despediram-se e foram embora por caminhos
comuns: um para o lado de dentro, e outro para o lado de fora, da consciência humana.
Cultura e ordenação
Uma verdadeira cultura é aquela que engloba os indivíduos num grupo, sob
parâmetros estáveis, não permitindo cisão interna. Pela estratégia central do “bem estar
comum”, e através de “deslocamento do poder” para esfera inalcançável pelo homem e
distante do plano terreno, esse tipo de estrutura promove a liberdade, estimula a identidade e
orienta para a coesão entre os membros. Divulga a tolerância e anula a violência. A
obediência á tradição em um grupo bem estruturado socialmente é tão forte que não permite a
qualquer indivíduo sequer pensar em desviar-se das normas. Leis não são necessárias porque
as regras estão inscritas na mente e manifestas no comportamento. Dinheiro também não é,
posto que esse tipo de associação prescinde de moeda e não usa o conceito de “mais valia”.
Espiritualmente goza do privilégio de escolher no ambiente seus símbolos e entidades
sobrenaturais. Não conhece pecado, logo não sente culpa. Economicamente está situado no
interior da fonte de seu sustento, necessitando apenas extrair ou cultivar no território, os
produtos ali existentes. Não trabalha excessivamente porque não aprendeu a acumular. Elege
a Vida como espaço de convívio e respeito mútuo.
Quem lê o parágrafo anterior pode ter a impressão de que estamos falando de uma
utopia ou divagando no campo do idealismo. Engana-se. Falamos de pequenas sociedades
ainda existentes na atualidade e, na sua maioria, residentes na floresta ou em áreas protegidas
ou reservas. Grupos que ainda preservam suas tradições e temem o contato com a civilização.
Chama atenção o grau de integração á natureza com que estão habituados e o respeito quase
religioso que dispensam ao ambiente.
Esses grupos são alvo de intensa curiosidade por parte de alguns pesquisadores. Tem
seus sentimentos, princípios e valores tão diferenciados dos que costumamos vivenciar que,
na maioria das vezes, são confundidos e mal interpretados, como de fossem seres exóticos de
outro planeta.
188
diferentes sociedades pelas características do comportamento geral dos seus membros e pela
lógica dos resultados (problemas, soluções).
Senso de ridículo
A moda é uma criação civilizada que permite rápida rotatividade no modo de vestir,
calçar, falar, comportar-se, num período determinado, e comercializada nesse tempo. No
190
momento em que deixar de gerar lucros, torna-se ridículo seu uso. Porém novos produtos são
lançados e copiados por pessoas que se imaginam elegantes e necessitam de “status”.
Velhos se comportam como adolescentes, e adultos como crianças. Ficar velho não
significa: maior experiência e sabedoria. Geralmente significa perder espaço social, tornar-se
ridiculamente ultrapassado e produtivamente inútil.
Muitas pessoas se expõem ao ridículo por puro exibicionismo, para ganhar dinheiro ou
para aparecer na mídia.
Lideranças
Ser líder representativo do grupo significa seguir e divulgar as tradições; ser sábio,
generoso e falar com clareza. O privilégio da liderança resulta do bom exemplo, da coragem,
da admiração emprestada pelos membros. O líder cuida das tradições e representa o grupo nos
cerimoniais e perante outros grupos. Precisa fazer isso toda a sua vida para merecer esse
privilégio e não é possuidor de bens materiais diferenciados do resto do grupo. É escolhido
por consenso.
Ser líder (político) significa, na maioria das vezes, ser eleito em eleições livres (e
obrigatórias!), possuir bastante dinheiro para financiar sua campanha, prometer muito,
comprar votos, ser esperto (desonesto), saber fraudar e estar imbuído de interesses próprios.
Não é necessário que possua destacada sabedoria, competência ou espírito público. É
recomendável que esteja vinculado a interesses de empresas ou grupos econômicos que
possam usufruir o poder do seu mandato no futuro. Não precisa passar por qualquer teste que
possa comprovar sua sanidade mental ou seus traços de caráter. Geralmente entra pobre e sai
rico no final do mandato. Possui privilégios que vão desde altos proventos até a imunidade
parlamentar. Nos casos em que comete crimes só pode ser preso ou afastado do cargo após
um prolongado e complicado processo regimental que nem sempre resulta em perda do
mandato. Pode empregar parentes e amigos e aumentar seu próprio salário. Seus eleitores
quase sempre não o conhecem e nem acompanham sua vida parlamentar. Nas sociedades
civilizadas o líder é quase sempre um aventureiro desconhecido sobre o qual o eleitor tem
poucas informações e nenhuma admiração genuína.
191
Amizade
Ser amigo significa gostar de alguém com lealdade e admiração. O amigo é escolhido
pelo sentimento e pelo prazer do contato. Amigos andam sempre juntos, pescam, caçam e se
divertem. Em alguns grupos ter vários amigos é sinal de prestígio e facilita as empreitadas,
onde certas atividades a executar necessitam de vários braços. Normalmente o amigo é
chamado de “cumpadre” (ou equivalente na língua do grupo), termo esse que encerra, ao
mesmo tempo, afeto e desejo de proximidade parental.
Ser amigo também pode significar a mesma coisa entre civilizados. Porém, na maioria
das vezes, ter amigo pode significar uma opção vantajosa, como por exemplo: o amigo
possuir bastante dinheiro, dar carona, fazer empréstimos, apresentar pessoas influentes,
indicar clientes, facilitar acessos, conseguir empregos e outras vantagens. Enfim, uma opção
de uso do outro como fonte de benefícios em proveito próprio. Muitas pessoas se queixam
que foram esquecidas pelos amigos tão logo seu dinheiro acabou, seu prestígio diminuiu ou
seu poder se esgotou. Oportunismo e parasitismo são comuns nas relações entre civilizados.
Nas sociedades civilizadas o verdadeiro amigo é quase sempre uma peça rara encontrada por
acaso. Um acidente de percurso. Um caso onde estão presentes: respeito e admiração
verdadeira.
Sentimentos
forma aberta, sem constrangimento ou mentira. Um jeito livre de expressão, que não acumula
tensão; que conduz a emoção e a idéia para ser compreendida pelas outras pessoas tal como
foi criada no psiquismo. Sem camuflagem!
Ser sintônico nas sociedades naturais é o padrão normal. Mentir ou enganar é tão
desnecessário, que há grupos que não possuem, na sua língua, palavras que expressem essas
ações. Seria mesmo uma incoerência utilizar essas estratégias numa cultura que visa o bem
estar geral. Como a palavra tem valor positivo e real, tudo o que é dito é entendido como
verdadeiro. O hábito de mesclar sentimento, pensamento e voz para expressar-se (sintonia) é
uso de rotina.
Princípios
Ser uma pessoa boa e confiável é seguir as regras da tradição. Os hábitos individuais
são tolerados desde que não se oponham ao consenso. Usar de condições vantajosas para se
sobrepor aos objetivos gerais, passa a se constituir em delito e desrespeito á tradição. A
moralidade e a ética são propriedade de uso do grupo. Por norma a conduta individual deve
refletir o desejo do grupo.
Valores
O valor fundamental está centrado na consciência coletiva de bem estar. O foco dos
interesses gerais está voltado para a figura humana. O inconsciente do não-civilizado parece
estar moldado a manter a coerência entre o discurso e a prática diária.
O valor fundamental está centrado na consciência individual de bem estar. O foco dos
interesses gerais está voltado para a quantidade de poder que um indivíduo possa adquirir
através do dinheiro, da fama ou da função de poder político-institucional que consiga deter. O
inconsciente do civilizado parece estar fadado a manter a incoerência entre o discurso e a
prática diária.
Concluindo
Ora, se o meio social é o terreno das relações entre os indivíduos, a qualidade dessas
relações é que vai determinar o aparecimento dos comportamentos ativos e reativos. Com
isso, o meio social sofre alterações significativas para melhor ou para pior, configurando e
reproduzindo os sentimentos, princípios e valores circulantes no modelo cultural. A qualidade
desses conteúdos circulantes no meio ambiente social fecham o ciclo, estimulam
comportamento ativos e reativos, que influenciam e sofrem influência nas situações de
contato pessoal. As distorções inerentes ao processo civiliz atório podem ter provocado
mudanças nos sentimentos, princípios e valores humanos com as disputas por prestígio, bens
materiais e poder.
Se nos fosse concedido o direito e o poder para analisar o que acontece na atualidade
com as sociedades civilizadas sob o ponto de vista de sua “sanidade mental”, diríamos que ela
se encontra gravemente enferma. Delírios de grandeza, alucinações produtivas, dissociação
das funções integradoras e a esperança ilusória de reintegrar-se por intermédio de soluções
onde a figura humana continue não ocupando o centro e a razão da Vida, permitem a
continuidade de toda essa alienação.
regra. Outras empregam o seu tempo amealhando bens e prestígio. Outras ainda acreditam
que podem alcançar o êxito (?) e que as injustiças, a miséria e a fome são questões dos
governos.
Aprendizagem subliminar
Da mesma forma que nas religiões, existem as pessoas fixadas na ideologia científica.
São as que querem provar tudo através da metodologia científica. Como se essa fosse a única
e a mais correta das vias para se alcançar respostas adequadas em todos os casos de dúvida. É
compreensível que a natureza humana, talvez pela sua imcompletude, procure as verdades,
freqüentemente por vias extremistas. Há ainda as pessoas que se agasalham entre as duas
vertentes buscando, em ambas, substrato lógico para suas dúvidas. Essas possuem uma
tendência mágico-utilitária tentando extrair dessa fusão, algo de esotérico e de científico, uma
forma de apaziguar suas incertezas.
Olhando sem amarras para o mundo civilizado vejo-o como um gigantesco balcão
comercial, como se fora um hipermercado de proporções oceânicas. Sua suntuosidade abriga
produtos de várias qualidades, mas seus rótulos, bem planejados, parecem convincentes. Nós,
os crédulos, vamos ás compras com o bolso quase vazio, porém com a cabeça repleta de
estímulos subliminares. Não somos pessoas, somos consumidores vorazes de tudo o que possa
preencher nosso “vazio” existencial. Temos que ficar sozinhos procurando nas prateleiras da
vida àquilo que possa nos aliviar; seja o que for: religiões, verdades científicas, filosofias,
comida, conforto, etc. Saímos tristes na maioria das vezes por não termos encontrado os itens
essenciais para uma boa cesta básica: afeto, solidariedade, harmonia, paz e justiça. Esses
produtos são raros nesses lugares, mas, se formos para dentro de nós mesmos, talvez os
encontremos.
Uma das condições mais perversas no convívio social é a ilusão. Ela se veste com as
roupagens da mentira, da hipocrisia, da dissimulação, com as quais já nos acostumamos. Se
tentarmos vislumbrá-la e dissecá-la dentro das aspirações que movem a manada humana,
poderemos vacilar e perguntar: por que todos seguem a mesma direção? Estarei certo se
segui-los ou deverei procurar outro caminho?
O FUTURO
Sabemos que não é possível o retorno para formas naturais primitivas de organização
social. Sabemos também que desejar isso não passaria de uma divagação romântica. Existiria
uma proposta viável que conseguisse reunir os elementos positivos existentes nas sociedades
naturais e as condições construtivas oriundas da sociedade civilizada? Talvez sim... !
Certamente teríamos que retornar à questão do Modelo Cultural. Ele talvez seja um
plano indispensável que resume o conjunto “organismo-cérebro-mente-sociedade”. Uma
espécie de espaço-síntese dessas dimensões. É possível acreditar que os homens há milênios,
tenham buscado uma melhor disposição da organização social apenas por instinto? Se algum
dia, alguém quiser tentar alternativas eficazes, certamente terá que seguir algumas regras
indispensáveis:
Em que se sustenta nosso bem estar? Ás vezes estamos alegres e comunicativos, outras
vezes de mau humor e fechados. Muitas das vezes não sabemos de onde isso se origina. Se
estivermos “em equilibrio” é possível que devamos esse “estado” a uma base de
compensação. Isto é, algo que acreditamos ser ou ter. Se isso é posto em confronto, ficamos
desorientados e podemos nos tornar violentos.
É como dizer: “Viver eu quero, conviver é preciso!”. Essa frase resume e reduz as
aspirações humanas ao mesmo tempo. Olhe para trás e veja o que já foi feito. Se os resultados
fossem bons seríamos hoje uma sociedade feliz, sem problemas. Mas ainda temos todo o
tempo que o futuro nos oferece. Qual será nossa próxima tentativa?
&
199
SUGESTÕES DE LEITURA
ANTROPOLOGIA
CLASTRES, Pierre - Arqueologia da Violência. S. Paulo, Brasiliense,1982
CLASTRES, Pierre - A sociedade contra o Estado: pesquisas de, antropologia política. Rio de
Janeiro, 1973, F. Alves.
CLASTRES, Pierre – A Fala Sagrada. Campinas - S. Paulo, Papirus editora,1990
HOEBEL,E Adamson e FROST, Everett L - Antropologia Cultural e Social. S. Paulo, Cultrix, 1993
LÉVI-STRAUSS, Claude - Tristes Trópicos. Lisboa, edições 70 LDA, 1993, Grafidois LDA
MONTAGU, Ashley - Introdução à Antropologia. S. Paulo, Cultrix, 1977
MALINOWSKI, Bronislau - Los Argonautas del Pacífico Occidental: un estudio sobre comercio y
aventure entre los indígenas de los archipiélagos de la Nueva Guinea melanésia. Barcelona, 1975,
Ediciones 62
MALINOWSKI, Bronislau - A Vida Sexual dos Selvagens. Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1983.
NÓBREGA, Clemente – O Glorioso Acidente. Rio de Janeiro, Objetiva Editora Ltda,1998
ROSA, Heliandro Abreu – Sobre a Origem do Homem. Porto Alegre, editora Mercado Aberto Ltda,
1988.
ARQUEOLOGIA
PIGGOTT, Stuart - A Europa Antiga: do início da agricultura à Antigüidade Clássica. Lisboa,
Fundação Calouste Gulbenkian, 1981.
FROUS, André - Arqueologia Brasileira. Brasília, ed. Universidade de Brasília, 1992.
BIOLOGIA
CARTHY, John D. - O estudo do comportamento. S.Paulo, ed. Nacional e ed. da USP, 1969.
CHAPMAN, Garth - Os líquidos do corpo e suas funções. S. Paulo, ed. Nacional e ed. da USP, 1970.
DARWIN, Charles - Origem das Espécies. B.Horizonte: Itatiaia, S.Paulo: ed. da Universidade de
S.Paulo, 1985.
DINIZ, Artur - Viagem através da Célula. S.Pau1o, ed. Científica e Cultural Ltda., 1970
SOUNIS, Emílio Leão de Mattos - Bioestatística: princípios fundamentais, metodologia estatística,
aplicação às ciências biológicas. S.Paulo, Mc Graw-Hill do Brasil Ltda., 1972.
ECOLOGIA
BRANCO, Samuel Murgel - O desafio amazônico. S.Paulo, Moderna, 1989.
DORST, Jean - Antes que a natureza morra: por uma ecologia política. S.Paulo, ed. da Universidade
de S.Paulo, 1973.
200
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abstêmio, 109
alterações do comportamento, 115, 138, 142
Antropologia , 161
associal, 107
autoritarismo, 147
Ch
cipó, 54
comando ordem-obediência, 132
Comportamento Ativo, 28
conhecimento intuitivo, 130
crimes hediondos, 105
emoções, 141
Etnologia, 130
fantasias, 131
festas de iniciação, 105, 106
207
heterossintonia, 137
Heterossintonia, 137
hipocrisia, 115, 132, 138
homossintonia, 136
livre-arbítrio, 157
T
tradição, 51, 53, 54, 106, 147
Tradição, 147
tuxaua, 48, 49
usufrutuários, 157
valores, 28, 29, 47, 105, 106, 107, 109, 115, 131, 138, 141, 156, 157
Valores, 156
voracidade, 107
yanomami , 50
Yanomami, 52