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Adlia Prado, Ex-voto

PRADO, Adlia. Poesia reunida. So Paulo: Arx, 1991, P. 469


Na tarde clara de um domingo quente
Surpreendi-me,
intestinos urgentes, nsia de vomito, choro,
desejo de raspar a cabea e me pr nua
no centro de minha vida e uivar
at me secarem os ossos:
que queres que eu faa, Deus?
Quando parei de chorar
O homem que me aguardava disse-me:
voc muito sensvel, por isso tem falta de ar.
Chorei de novo porque era meio verdade
e era tambm mentira,
sendo s meio consolo.
Respira fundo, insistiu, joga gua fria no rosto,
vamos dar uma volta, psicolgico.
Que ex-voto levo Aparecida,
se no tenho doena e s lhe peo a cura?
Minha amiga devota se tornou budista,
toro para que se desiluda
e volte a rezar comigo as oraes catlicas.
Eu nunca ia ser budista,
por medo de no sofrer, por medo de ficar zen.
Existe santo alegre ou so os bigrafos
que os pem assim felizes como bobos?
Minas tem coisas terrveis,
a Serra da Piedade me transtorna.
Em meio a tanta rocha
de to imediata beleza,
edificaes geridas pelo inferno,
pelo descriador do mundo.
O menino no consegue mais,
vai morrer, sem foras para sugar
a corda de carne preta do que seria um seio,
agora s moscas.
Meu corao bom
mas no aceita que o seja.
O homem me presenteia,
Por que tanto recebo,
Quando seria justo mandarem-me solitria?
Palavras no, eu disse, s aceito chorar.
Por que ento limpei os olhos
quando avistei as roseiras
e mais o que no queria,
de jeito nenhum queria quela hora,
o poema,
o ex-voto,
no a forma do que doente,
mas do que so em mim
e rejeito e rejeito,
premido pela mesma fora
do que trabalha contra a beleza das rochas?

Me imploram amor Deus e o mundo,


sou pois mais rica que os dois,
s eu posso dizer pedra:
s bela at aflio;
o mesmo que dizer Ele:
sois belo, belo, sois belo!
Quase entendo a razo da minha falta de ar.
Ao escolher palavras com que narrar minha angstia,
Eu j respiro melhor.
A uns Deus os quer doentes,
a outros quer escrevendo (PRADO, 1991, p, 469).

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