Vous êtes sur la page 1sur 12
OS USOS ESCOLARES DA LINGUA ESCRITA Elsie Rockwell Do Departamento de Investigaciones Educativas — México Tradugfo de Hordcio Gonzales Publicado originaimente em: FERREIRO, E. y GOMES PALACIO, M. Nuevas perspectivas sobre los procesios de lecture y escriture. México, Siglo Vointiuno, 1982. 1 rmaiores informagdes sobre esta coletines, ver Livros om Destaque, nesta revista —————— RESUMO ‘A autora discute a questfo dos usot que #0 faz de Iingua escrita no cotidiano escolar, enfocando trés processos de apropriaggo conhecimento que ocorrem simultaneamnte: a aprendizagem da festrutura da lingua esrita, dos usor erpecificemente exolaret da lingua escrita © de outros conhecimentos escolares atraws do “Magua escrita, Ressalta a importdncia da integragto da perspecti- 1a psicogenstica (referente 20 processo individual de apropriagso {do sistema de escrita) com a perspective sociogendtics (referent 120 procosso histbrico de apropriogio dos usos © signticados #0- ais diversos da escrita. SUMMARY ixcuses the question ofthe uses of written language Within the school everyaey Iife, focusing three processes of knowledge aoquisition that occur simultaneously: learning of ‘the writtan language structure, of the school uses of the written language and of other pieces of school knowledge through the writen language. Sho emphasizes the importance of integrating the peychogenetic perspective (referent to the individual process ff aequistion of the written system) with the sociogenetic perspective (referant to the historical process of aprehension of ‘the diferent social uses and maanings ofthe written language). ——————— eee Cad. Pesq., Siio Paulo (52): 85-95, fev. 1985 85 ‘A LINGUA ESCRITA E 0 PROCESSO DE APROPRIA- Ao E constante presenga e 0 uso da lingua escri dentro do Ambito escolar; por isso costuma-se qual car a escola como representante da “cultura letrada” iterate culture), com todas as conotagdes que habitual- mente s¢ associam a0 termo.’ Antes de accitar esta caracterizac3o 6 necessério porém reconstrulr, a partir do cotidiano escolar, 0 que acontece com a lingua escrita neste contexto particular. A tarefa no 6 simples jé que 6 possivel abordar o uso da lingua escrita de perspectivas muito diferentes. A lingua escrita esté relacionada com muitos dos vérios processos que se desenvolvem na esco- la, como a transmissio, a socializaglo, a reproducSo, @ destruiggo ou a resisténcia cultural, etc. Dentro de cada processo acontece algo diferente com a Ifngua escrita e Portanto é necessério analisé-la de modo diferente. ‘Apenas uma visfo integrada, impossivel de ser elaborada atualmente, poderia dar conta dos significado da lingua eserita no contexto escolar. Neste caso, optamos por centrar a andlise do uso da leitura e da escrita no processo de apropriago do conhecimento que se realiza na escola. Definimos a apropriago em termos sociais endo individuais. Por tum lado’ nos interessa distinguir a apropriagao da trans: rmissdo escolar, 20 concebé-la como um processo no qual '@ reconhece um sujeito ativo que organiza sua prépria aprendizagem. Mas ao definir a apropriagdo em termos sociais interessa-nos reconstruir, no 0 processo cogniti vo de aprendizagem que define a atividade do sujeito, mas a5 relagdes e praticas, institucionais, cotidianas, através das quais 0s alunos se encontram com e fazem seus 0s conhecimentos que a escola tenta transmitir. A escola representa um dos espacos (hé outros, claro) no qual confluem 0 processo individual (ou psico-genético) e 0 histérico (ou socio-genético) de construgio do conhecimento; um lugar em que, na tradiggo piagetiana, “o sujeito constréi seu préprio conhecimento para se apropriar do conhecimento dos outros”. (Ferreiro, 198-). A relagéo entre os dois nfo 6 simples. Por um lado, o resultado do process individual, isto 6, 0 conhecimento que ceda crianca ‘constréi, no & uma simples internalizagio ou reflexo do conhecimento social; quer dizer, pode ser bem diferente do que 0 conjunto de elementos que se the apresentam na sala de aula. Estes elementos escolares, por sua vez, 80 apenas uma selego institucional do acimulo de conhecimentos e usos gerados historicamente. Dentro da da escola os conhecimentos no existem “em abstrato” para que as criangas os a forma e “so dados” & crianca para que “faca alguma ‘coisa’ com eles, para que os use de alguma maneira. Este nivel escolar, cotidiano, que define os usos instru- mentais e sociais do conhecimento com os quais se de- fronta a crianga, funciona como mediador entre 0 pro- ‘cesso individual e o histérico. A leitura ea escrita aparecem como eixos do processo escolar de apropriagéo, tanto por ser 0 conhe- cimento inicial e mais importante que se transmite escolarmente, como por ser instrumental na aprendi gem de outros conhecimentos. Ao nos aproximarmos dos usos escolares da lingua escrita, dentro deste pro: ‘e550, 6 Util se levar em conta as perspectivas da pesquisa 86 psico-lingifstica e social sobre a Witeracy). Na pesquisa do processo individual de apropriagSo da leitura e da escrita, a perspectiva psico-lingUfstica baseia-se na conceposo de um sujeito que aprende — através de um processo complexo, porém Gnico e bastan- te auténomo (isto é, independente da variedade de méto- dos de ensino) — a dar sentido aos miltiplos exemplos de I’ngua escrita que se Ihe apresentam. O desenvolvi- mento cognitive do sujeito parece determinar certas constantes na apropriacdo da leitura e da escrita indepen- dontes das diferencas lingifsticas, cultur de escrita.? Em contraposigSo a isso, a pesquisa social nos mostra a grande variedade hist6rica e social existente nas Priticas que envolvem a leitura e a escrita, Nesta pers- pectiva a escrita adquire existéncia social, nfo como estrutura abstrata, mas através de diversas formas parti- culares, € vinculada de modo regular a processos sociais © a situagdes de interago social que Ihe déo sentido. Dentro desta diversidade histérica, a leitura e a escrita ‘tém sido tanto veiculo de maior apropriaggo ou sociali ago de conhecimentos, como instrumento de destrui ‘G0, mistificaggo © exercicio do poder. A consciéncia destes processos divergentes obriga-nos a certa cautela em atribuir conseqiiéncias sociais ou cognitivas univer- sais a0 processo escolar de apropriagso da leitura e da escrita.? ‘Ambas as perspectivas so importantes ao se estu- dar 0 que acontece com a leitura e a escrita dentro da escola. Permitem interpretar o que nela se observa com uma visio mais ampla que aquela definidas pelas cate- gorias diddticas. A primeira nos lembra o sujeito capaz de construir conhecimentos além dos elementos com que se defronta; a segunda nos torna conscientes de que a forma em que a leitura e a escrita existem na escola uma dentre as miltiplas alternativas hist6ricas, e que adquirem sentido em func&o dos processos socials que acontecem através da escolarizago. No entanto, tam- bém conduzem a um dilema. Por um lado, que opodes ou limitagBes os usos escolares da leitura e da escrita im- p3em ao processo de apropriagio de conhecimentos por jtura ea escrita, 1 Considerendo 2 associagfo da escola com a tradiedo “lows da, acquire forga a sua representatividade 20 nivel ideol6- ico deum patamar “universal” de conhecimentos; arpu- Tonts-se que 6 pela Ifpgua excita que s0 tom acerso a conhe- cimentos fora do contexto imedioto: que & pela {Que se desenvolve 0 pensamento abstrato @ crt Tad, este viés da escola pendendo para 0 “escrito” tem sido inerpretado como obstdculo educativo para aqueles alunos que no partilhem ume cultura “elssse'média"” compativel ‘com @ tadigfo “Tetrada”. As Implicagdes anteriores encon- ‘ramse no trabalho de pesquisadores como David R. Olson, J. Goody, Jerome Bruner, P. Bourdieu. Considero que 8 andliso do. quo ofetivamente 80 faz com @ lingua excite ne ‘escola permite questionar alguns destes pressupostos. Reprosontam esta corrente, entre outrot, Kenneth Goodman, Frank Smith e Emilia Fereio, Pesquisas importantes sobre esto toma ta por Michel Cole e Syiia Scribner, Shi Michael Smith, Thomas Laquer, Karen Reed Stephen oder, ¢ muitos outros. Cad, Pesq. (52) fev. 1985 parte de grandes grupos sociais? Por outro lado, que possibilidades o processo individual universal de apro- riago de conhecimentos oferece para generalizar ou gerar novos usos da lingua escrita a partir daqueles que caracterizam a prética escolar? Um estudo etnogréfico, realizado em um contexto particular, s6 pode contribuir parcial e comparati ‘mente para esclarecer 0 problema colocado. O nosso parte de informagies obtidas em oito escolas de tipos muito diferentes (estadual/federal, completas/unitérias, etc.) em uma zona agricola e industrial, de um estado da Repdblica Mexicana. Baseiase na andlise de todos os acontecimentos relacionados com a lingua escrita regis- trados a0 se observar cingiienta aulas de terceira a sexta série do Primeiro Grau’. A nossa inteneo é dar conta de ‘uma faceta a mais na variagdo social do uso da Ingua es- crita, e colocar a partir disso o problema que diz respeito & relaco entre a lingua escrita e 0 proceso escolar de apropriagéo. AESCOLA E A LINGUA ESCRITA Historicamente a escola estabeleceu uma distinedo entre “aprender a ler” e “ler para aprender”. Estas categorias definem uma forma de ver © processo de apropriagdo e uso da leitura e da escrita, que ndo $6 gera agrupamentos @ préticas escolares especificas, mas que também exerceu uma forte influéncia nas conceprdes, técnicas e teéricas a respeito da leitura e da escrita. ‘Adquirimos cada vez mais uma maior consciéncia do que 6 especificamente escolar nesta dicotomia. A pesquisa psico-lingiistica reconstréi um processo de aquisicéo da leitura em que néo se dissocia o “aprender a ler", no sentido de “dacifrar”, do “ler para aprender”, no sentido, de ler para compreender o significado de um texto. A pesquisa social descobre processos anteriores a escol. tanto no caso de “criangas sem escolarizapio” como no. caso de “sociedades som escolarizagéo”, nos quais 0 inicio no uso da lingua escrta n¥o inclu os requisites, formais que a escola define para “aprender a ler’ Dentro da escola, tradicionalmente, “aprender a Jer” constitu uma etapa prévia ao “ler para aprender”. ‘A primeira etapa encontra expressio formal nos progra mas da primeira série e no ‘’método” que se usa nesse ano, 0 qual é, talvez, 0 ponto de maior discusséo & controvérsia pedagégica de todo o primeiro yrau. No en: tanto, na prética escolar estabeleceram-se, seja qual for (© método utilizado, certas formas de ensino e certos, pressupostos impli citos a respeito do sistema de escrita Predomina a cépia para ensinar a escrever e a decifracdo, quer dizer, a “eitura oral”, para ensinar a “ler”. Quase todos os métodos implicam em uma seleco do tipo de letra e da seqiiéncia fonologica e Iéxica, com o pres- suposto de que se aprende do “fécil” para o “diffcil”. ‘Quase todos definem como problema central a relagdo fonema/grafia. Geralmente estabelecem uma série de “regras do jogo" que asseguram que se gerem palavras ue caibam dentro do esquema e da_seqiiéncia de ensi- rno, como a associagio com desenhos, sons ou formas, a6 regras de selegiio e troca de sflabas, etc. ‘Ao contrério, a atividade de ler e escrever supée, no “alfabetizado”, muitos outros conhecimentos estratdgias no incluidas no esquema mais simples que fundamenta sua introdugdo na primeira série: 0 leitor Os usos escolares da lingua escrita deve enfrentar uma grande variedade de tipos, ei cara “letra” constante nas suas miltiplas representacées gréficas; encontra materiais muito diferentes, ¢ uti todo tipo de informago que the proporciona tanto for- mato como contexto para entender aquilo que esté escrito; deve “decifrar” componentes ideogréficos que rompem com a suposta relacdo fonética; deve conhecer a distancia entre o escrito e 0 falado, tanto pelo cardter seletivo do que escreve (que nio representa, por exem- plo, a entonacio) como por aquilo que caracteriza 0 ‘escrito (separagio de palavras, por exemplo) e que ndo ‘tem referante nas pausas reais da fala. O leitor compe: tente, também, deve ser cada vez mais independente do signo gréfico para poder ler com fluidez e compreensic importa mais 0 que ele leva para o texto escrito, 0 conhecimento contextual e temético que permite antecipar_e encontrar 0 sentido do que esté lendo. (Smith, 1978). Depois da etapa inicial do ensino da leitura e da escrita, as atividades programadas para o Primeiro Grau, pressupdem certa habilidade no dom{nio da lingua escrita, mesmo quando 0s objetivos propostos sejam desenvolver a compreensSo da leitura e a expressio escri- ta. Dada a divergéncia entre as caracter sticas mais com- plexas do processo de ler e escrever e o ensino formal da leitura ¢ da escrita nas primeiras séries, o que acontece ‘na segunda etapa do Primeiro Grau, em que se usa a lingua eserita? A ESTRUTURA DO CONTEXTO ESCOLAR ‘A andlise do que acontece nas cltimas quatro séries do Primeiro Grau revela um processo bastante complex no qual interagem diferentes niveis de ativi- dade pera produzir as condigSes dentro das quais os alunos se apropriam de conhocimentos sobre a I{ngua eserita @ através dela. Ao reconstruir este processo achamos importante para a anélise no apenas 0 que 0 docente transmite, mas também 0 contetido implicito das atividades de ensino, assim como outra série de acon- tecimentos que, embora sejam desenvolvido na sala de aula, no sS0 percebidos como ensino. © nivel do “ensino” pode ser identificade como seqiiéncias de ages iniciadas pelo docente, que reque- ram a participagio dos alunos, nas quais geralmente so utilizados os materiais escolares, e nas que se faz explt- ito © “tema” programético que vai se tratar ou “dar” * Por tendemot uma unidade de ensino correspon dente a um "toma" definide, dentro de uma das quatro Great, de duroglo varivel (1 minutos ou dust horas. As ‘ulas‘analsadas correspondem 2 26 professores em 8 escoas. Distribuernse assim: Brea | Exo" | Matomi’] Clon: Soe] Ciene Nat] Tor] sent oA 3 7 s 5 a [3 ae 1 1 = 2 | 4 59 5 2 . 1 | 3 6 5 4 3 3 [45 Tot. we | 1s a 2 |s0 Por exemplo, Brice Heath, Shirley. What no bedtime story ‘meant: narrative skile at home and schol, 1980. Trabalho preparade pare a Terman Conference, Stanford Universit, 'An ethnography of literacy in 8 Vai Town, 87 Apetar da variagSo hist6rica e indivicual das formas de esnino encontradas nas aulas estudadas, existe um con: junto de conceitos e praticas generalizados, recorrentes, facilmente previsveis pelo seu caréter quase ritualizado, Eles constituem uma tradigio escolar bastante reconhe: cel pelos docentes, mesmo quando eles participam de formas diferentes dessa tradi¢Z0. Interessa este conjunto de priticas pelo peso que tém dentro do Primeiro Grau, ainda quando existe evidéncia de tendéncias contrérias, tanto antigas como recentes. Estas_mesmas atividades de ensino comunicam contetidos implicitos, entre os quais se encontram deter- minados pressupostos, usos e relagSes inclu/dos nas ati- Vidades de ler e escrever. Mesmo quando nfo se esteja ‘ensinando” explicitamente como ler e escrever, 0 uso da lingua escrita em qualquer atividade de ensino trane- mite algo a este respeito. Alm do que, as atividades propostas pelo professor as vezes exigem implicitamente, u permitem, certas estratégias de leitura ou de escrita que nunca foram “ensinadas” aos alunos. Portanto, é ecessdrio analisar também 0 conteddo implicito do en- sino para poder avaliar 0 que ele significa em fungio de apropriagéo do conhecimento. Por outro lado, dentro da sala de aula acontecem diversas atividades de leitura e de escrita que se encon- tram fora dos momentos formalmente definidos como atividades de ensino. De um lado existem ages do pro- fessor (com ou sem a participagio de alunos, mas que estes costumam presenciar) nas quais ele usa a leitura 2 escrita ou se relaciona com outras pessoas com base emalgo escrito. s proprios alunos, por outro lado, léem e escrevem “extra-oficialmente' (Fiering, 1981), isto é, sem que isso seja indicado pelo professor e também, interagem ampla- mente entre eles atavés de, ou com base na Iingua escri: ta, Em ambos os casos (0 professor como modelo e 2 prética auténoma dos alunos) apresentam-se pressupos: tos e usos da lingua escrita que nem sempre coincidem com aqueles que o ensino formal comunica, explicita ou implicitamente, e se estabelecem alternativas de relages sociais dentro das quais se pratica a leitura e a escrit informages adicionais sobre a lingua escrita @ seu uso, No contexto composto por todos estes niveis de atividade ¢ contedido, os alunos empreendem o trabalho, préprio da apropriaggo de conhecimentos. Embora a evidéncia de observacdo em classe no seja suficiente para reconstruir o resultado do processo de aprendiza- gem (nem 6 a nossa intenco fazé-lo), nos permite colo: ‘car problemas a respeito da relago entre o procesto individual de apropriagio e a interago no contexto social, especificamente 0 escolar, dentro do qual se esenvolve. Inicialmente, parece necessirio destacar trés processo de apropriagSo que esto em jogo simul- taneamente. © primeiro se refere & estrutura da lingua escrita em si, como “objeto de conhecimento”, aos pres supostos de base que a vinculam com a lingua oral e as relacdes e elementos m{nimos necessérios para poder ler e escrever. Em segundo lugar, os alunos se defrontam ‘com um outro objeto de conhecimento, os usos especi ficamente escolares da lingua escrita, e @ necessidade de “encontrar sentido” neste sistema de regras supde um processo adicional de apropriagio, nem sempre coinci- 88 dente com o primeiro processo. Por iitimo, os alunos se encontram diante da pos- sibilidade ou da exigéncia de se apropriarem de outros conhecimentos, os conteddos do curriculo académico, ‘que se comunicam ou se expressam, em certa medida, através da lingua escrita. Este Gltimo processo de apro- priagio ¢ provavelmente 0 mais complexo, no apenas Porque no Primeiro Grau os momentos em que se “en- sina” contetdos implicam a mediago do docente na atividade de ler e escrever, mas também porque os conhecimentos nunca se extraem de uma maneira sim- ples do texto escrito: a “compreensio" da leitura nfo 6 uma habilidade abstrata; 6 necessério levar_conheci- mentos a0 texto para poder compreendé-lo. Este fato implica necessariamente em uma relagéo independente ‘com 0 fendmeno expresso no texto, ou numa relagso social, mediadora, no processo de apropriagio de conhe- ccimentos a partir da leitura. A LINGUA ESCRITA NAS ATIVIDADES DE ENSINO. O que se 16 ¢ 0 que s0 escrove Embora dentro da sala de aula quase no haja momentos em que no se observe algum uso da lingua escrita, sua natureza & restrta, especificamente escolar, @ ndo representativa do leque de usos sociais da leitura da escrita. ‘A leitura se centra em um tipo de materi de texto, que todos os alunos possuem, mas que, como livro, tem caracter(sticas especiais, escolares. Além dos livros de texto, s6 costumam existir dicionérios, e alguns livros “que so do professor” (outros livros de texto ou de consulta, antologias de poemas, etc). Os livros da hima reforma (1972-1976) de espanhol e matemitica, contém leituras ¢ exercicios, isto 6, sio livros nos qui ‘0 escrevem ou se faz alguma coisa. Os de Ciéncias so bbasicamente livros de leitura, j4 que as atividades so indicadas & parte, nos livros para o professor. No entan- to, todos o¢ livros tém um estilo de redago que se dirige diretamente crianga; dio a ela instrugdes para exerct- cios ou pesquisas ¢ intercalam perguntas (de recapi- tulagSo, ou de relaglo com a propria experiéncia) nos ‘textos explicativos. Diferentemente dos livros anteriores, estes ddo uma nova importéncia a0 componente gréfico; ‘contém ilustragdes as quais o texto se refere e fotos com legenda, e toda uma série de sinais ~ circulos, seta, cai xinhas, cores — que 6 necessério interpretar. Trata-se en- to de livros especiais, com exigéncias especificas, nem sempre comparéveis a outros tipos de materiais de lei ‘ura (© que se escreve dentro do processo escolar de en- sino, 6 também seletivo. O mais usual 6 torner a “escre vver"* 0 que jf estava escrito em algum livre. Se usa somente a letra script e se criam uma série de recursos _gréficos com significado especial para as tarefas escolares, (riscos, quadriculados, margens, espacos). Hé regras implicitas na escrita que restringem o léxico e as estru- ‘uras sintdticas permitidas. Quando se escreve para regis ‘rar 0 que se disse, ou quando se “inventa", hé tendéncia 1 recorrer a certas formas, como as listas ou definigdes formais. ‘A lingua escrita também influi na Ifngua oral uti- lizada na escola. Por exemplo, 0 ditado & uma forma da Cad. Pesq. (52) fev. 1985 fala que se desenvolve sobretudo na escola, com tom inconfundivel — sinal de escrevar — e sintaxe incom- preens‘vel sem uma referéncia ao contexto em que ela sedi. Prof.: “Ougam bem... pomos aspas para escrever 0 nome da moeda, depois se escreve Argentina”. “Letra 0 inciso a, pentdgono, jé sabem como é ‘que se faz 0 inciso a? . .. Como é que ele fecha?” Prof.: “PBem questiondrio sobre o tema de repra- dugao, sobre o tema de reprodugao, dos vegetais, do, das plantas, reprodugio... um ponto e tra vessio. Ao se falar de plantas, virgula, abrem Ponto de interrogaeso, Que matéria... jf abriram a interrogaglo? ... estd se tratando e deixam uma linha para respond ‘A. declamagio de poemas é outro exemplo da lin: guagem oral e gestual que deriva sua forma da lingua es- crita. A prépria leitura oral mostra a relagdo especial que ‘se ostabelece entre a lingua escrita @ a fala. Um professor expressa aos seus alunos este efeito: “Posso estar conver- sando, e é Ifngua oral de palavra, mas se voois léem, 6 ingua oral escrita”. ‘A lingua escrita se apresenta na escola sob estas formas. As atividades que se realizam com ela podem se classificar em dois grupos: umas tendem a reproduzir as caracter‘sticas da primeira etapa do ensino da leitura e da escrita (a “cépia" e a “decifracéo"); outras tendem a mostrar 0 uso da leitura @ da escrita na transmisso de ‘outros conteddos curriculeres; € sobretudo nestes Ultimos casos que se percebe a interpretacdo e @ produ- (do de textos escritos. Como se lé e escreve: a cbpia e a decifragio © currfoulo das Gitimas quatro séries do Primeiro Grau nfo inclui formalmente o ensino da leitura e da escrita. No entanto na realidade persistem, durante todo. © Primeiro Grau, préticas geradas durante a etapa prévia de “aprender a ler”. Encontrase assim a tarefa de “copia de uma ligdo do livro de texto, para que “pr quem a escrita’” (0 professor avalia letra, ortogratia, for- ‘mato) ou a solicitagio de leitura oral diante do grupo ou em coro para “ouvir como Idem. A copia se entrega por paginas, is vezes sem que importe que repitam ou cor- tem o texto pela metade;a leitura se interrompe na meta- de da frase, para ver se 0s alunos estavam observando por ‘onde-ia quem lia. O professor retoma a importincia das, “letras”, que caracterizam o ensino inicial da leitura e da escrita. Observa-se, por exemplo, que por se tratar de uma cépia, feita letra a letra, “no devem existir erros de ortografia, deve ser tudo igual”. Ao se escutar a leit +a oral, apontam-se 05 erros em que se “retiram ou acres- centam letras 20 que o texto diz”. O "‘silabar” tolera-se desde que a leitura reproduza exatamente a seqiéncia das “letras”. . Em qualquer tarefa de “escraver", o docente refe: re-se constantemente aos aspectos formais do exercicio: a letra, @ posi¢o das palavras, as linhas, etc. Por vezes se produz uma escrita pouco parecida 3 normal, jé que os alunos devem fazer certas letras de duas linhas, com determinados espacos, etc. ‘Nas ltimas séries se introduzem explicitamente (8 sinais convencionais (pontos, tragos, parénteses, etc). Neste ensino se repete a mensagem implicita que caracte- Os usos escolares da lingua escrita Fiza a introdugZo do alfebeto no primeiro ano: no con- texto escolar, a escrita, a gratia, apresenta-se como bési- ca; dele se derivam a expresso oral e o significado. Assim, inicialmente, as letras. “servem" para “pronun- ciar"” certo som, para formar certa palavra; a mesma coisa acontece com os sinais. Um professor desenha 0 ponto de interrogagio na lousa. “Este sinal serve para perguntar.”” Coloca exemplos e pergunta: “Que tipo de enunciado & este?”; os alunos respondem sem problema: “In terrogativo”. Depois pede que escrevam exemplos: inventam, entre outros: Me dé de comer?, Que bonitas so as flores? (Ao escrever parece que o sinal, ¢ nfo a func#o comunicativa, define o tipo de enunciado). As formas iniciais de ler e de escrever, assim-como 05 critérios implicitos que 0 professor usa para corrigir (8 alunos, tendem a persistir nas outras matérias mesmo quando no se esté “ensinando” a ler e escrever. A “ob- pia” & prética tio ritualizada que constitui a resposta automética das criangas quando 0 professor escreve al: ‘guma coisa na lousa ou ento quando indica que abram 05 livros “na pégina tal”. (Quando néo se trata de copiar, 6 necessério deter aos alunos, is vezes, com frases tais ‘Ndo, ndo fagam nada, vamos ler...). A copia se torna assim uma forma de recapitular ou estudar, como também de registrar tarefas, resumos, definigdes ou ter- mos que o professor destaca ou introduz ao ensinar determinado tema. ‘Ainda assim. a leitura oral faz parte de muites atividades organizadas pelo professor, embora variem as, préticas: hd grupos em que os alunos esto bem treina: dos, na velha tradicdo, em “dar leitura” a tudo 0 que eles ou 0 professor escrevem, antes de iniciar a atividade propriamente dita. Em outros grupos, a leitura oral 6 esporédica, dificilmente integrada & aula que o professor estd dando; alunos, com poucas exceges, nfo conse: guem “ler” bem em voz alta, € o professor assume a leitura oral perante o grupo. Um professor introduz © gravador na aula, @ isso entusiasma as criangas; no tentanto sua indicago continua a ser: "é para voods ouvi- rem como léem”. A leitura oral torna-se sempre uma for- ma de avaliagfo da habilidade de leitura da crianca; "'sabem ler"’ aqueles que podem ler um texto, em tom de ditado, a0 grupo. Geralmente os professores insistem na necessidade de que seus alunos “compreendam’ aquilo que Iéem. Mas na prética a compreenséo tende a se colocar como uma fase posterior & propria leitura. Ao pedir a leitura oral as criancas, 0 professor tende a intervir quando 0 aluno “perde o lugar”, “pula palavras” ou quando “néo se faz ouvir" ("vood esta rouca, nfo pode ler", “olha por onde vamos", “no acrescente palavras”). Deste modo, @ reprodugio exata do texto, na forma “oral” apresenta-se como passo prévio 8 compreensio do contetido, que se pede com reflexéo posterior sobre 0 que foi lido. Escuta-se: “Leiam para compreender”, mas ‘do: “compreendam para poder ler”. Como se Ié ¢ se escreve: a produgio e interpretagio de textos ‘Se por “escrever” entendemos formular, no apenas “copiar", e por “ler” entendemos “interpretar”, nfo apenas decifrar, encontramos outro eixo de andlise 89 do que acontece na sala de aula. Embora os dois pro- cessos — a produglo e a interpretagdo de textos — se realizem no contexto escolar, esto sujeitos a regras espe- cificas de uso escolar, que se referem a como ¢ a quem se escreve e se Ié dentro das situagées de “ensino”. ‘A escrita, como produgio de textos, se distribui desigualmente entre professores ¢ alunos. O que se esc ve mais freqientemente na'sala de aulas (excluindo o ‘que se copia de algum texto) inclui o seguinte: oracées, problemas, definigSes, resumos, listas, perguntas e res- ostas a perguntas. Disto, aos alunos 6 se pede que “formule” listas, oragBes © respostas a perguntas; 0 resto tende a ser da alcada do professor, isto &, textos ‘que ele produz e eles copiam. O “texto livre” se observa apenas excepcionalmente. Implicitamente, © professor é “modelo” de como escrever dentro do Ambito escolar. Sua tendéncia 20 escrever (€ muito diferente a0 expér) é se basear em algum livro, @ selecionar ou modificar os textos, sobre- tudo para proporcionar definigdes e resumos. No caso dos questionérios, geralmente “formula” perguntas que artem textualmente das afirmagdes do texto correspon- dente. Nestes casos, 0 proprio processo de “formular”” observa'se como uma busca silenciosa no livro, @ o dita- do inequivoco de uma pergunta ou uma definicio. ‘Os problemas ¢ as oragdes no requerem a consulta a livros; no entanto, freqlentemente se geram a partir de estruturas fixas, de “formulas” em que se substituem palavras © quantidades. Os problemas correspondem @ determinados tipos de operagées que se praticam com maior freqdéncia (X tem tantos Y, e vai divid-los entre tantos 2) ‘A andlise de “oragies” parte de um esquema abs- trato, sujeito-predicado, que ¢ decompSe em: niicleo do sujeito-modificadores - ncleo do predicado (verbo) = objeto direto - objeto indireto, etc. Os exercicios pe- dem que se separem ou marquem com iniciais ou riscos cada parte. Ao introduzir este esquema no processo de tensino escolar acontecem duas coisas: ou 6 necessério controlar estritamente 0 tipo de oracdo que se ant cuidando que tenhe sujeito explicito no inicio, do verbo e do “complemento”, nessa ordem, ou se trata de aplicar 0 esquema, mecanicamente, conforme a or- ddem linear dos elementos em qualquer frase. AA professora inicia uma aula de gramética, pergun- tando 0 que esté fazendo Francisca, uma das menines. Um menino diz: “Esté consertando a carteira”. Pede-ihe, entéo, que escreva na lousa. Ele comeca: “conserta. . . ." A professora apaga: “Com o no- ime, se comega com o nome, ié dissemos". Quando acaba, 9 professora diz: “Af temos 0 ‘que? Alunos: “Oragdo”. (esta palavra parece ser sada, na escola, 36 para a lingua escrital. Como 0s professores costumam pedir 20s alunos que “inventem” oragdes para depois analisé-las, freqiien- temente se encontram exemplos como os seguintes: Empreste-me a tua boneca P ‘Queboni too coelho”” $s P “Compra carne ne mercado minha mie” NS Vv oD «OF Encontrase alm disto um treinamento explicito nna formulacSo de oragSes: “isto no ¢ uma oragio”, “os péssaros no cantam, trinam”, “acrescente onde esto, porque esté incompleta”, etc. ‘Nunca observamos que ‘fosse pedido aos alunos, Para “‘inventarem’ problemas ou perguntas; s6 om ‘duas..ocasi6es thes foi pedido um “resumo"” de uma ligo, depois de uma discussio sobre a mesma. Pede-se 2 les |istas de palavras com determinada letra, ou de determinado tema: cinco plantas medicinais, cinco produtos da comunidade, etc. Outra ocasigéo que os alunos tém de formular 0 que “escrover dentro das atividades do ensino, € 20, responderem as perguntas de um questiondrio. Alguns professores insistem em que devem pensar, compreen- dor 0 que léem e entio escrever, ¢ nfo apenas copiar. No entanto, a tendéncia mais ritualizada, habitual e diffcil de se modificar na prética, ¢ que os alunos bus- quem a resposta “textual” na ligo. Dada a estrutura usual das perguntas, que apenas invertem a ordem das palavras das frases do texto, 6 poss(vel de fato localizar aquela que corresponda a resposta e responder “correta- mente”, sem ter compreendido o texto nem a pergunta. Nota-se este procedimento na forma com que os alunos vio “lendo”, apontando palavra por palavra no texto ¢ ‘na pergunta. Alguns professores tentam deter essa pré- tica. Diz uma delas: “Quero que leiam @ assimitom e di ‘pois respondam, no que copiem”’. Talvez por isso existe 2 tradigdo de organizar a “compreensdo” como atividade de interrogago oral dos alunos por parte do professor. A interpretago de um texto se dé sobretudo com relagfo aos livros de texto, embora haja professores que trazem um outro material de leitura ou entdo, recomen- dam aos seus alunos que “leiam, leiam qualquer coisa, revistas, contos . ..”" Os livros de texto foram criados com a intengdo de chegar diretamente as criangas, inde- endentemente do que o professor fizesse. Mas dentro do ensino escolar, o uso dos livros é mediado pelo pro- fessor. E 0 professor quem seleciona e aponta 0 que se ler, @ quem estrutura a leitura em vor alta ou em silén- cio, repetindo ou ampliando 0 texto escrito, interrom- pendo @ reiniciando a leitura. A leitura do texto “inte- ‘gra-se” a uma aula sobre o tema; para consegut-lo, 0 pro- fessor utiliza toda uma série de estratéaia Excepcionalmente pede-se aos alunos que resolvam lum exercicio do livro a partir da leitura em siléncio das, instruges. O professor pede leitura oral ou ele mesmo 16 as instrugGes, as interpreta e, se necessério, ajuda indi- Vidualmente cada crianca a resolver 0 exerc{cio. Se 0 for- mato ou a simbologia impée dificuldades especiais & ta refa, 0 professor pode optar por converté-la em uma ver- ‘so mais familiar, que se resolve na lousa, para depois copiar as respostas no livro. ‘A leitura em grupo de ligdes ou textos mais lon- ‘90s se realize sobretudo nas éreas de Ciéncias Sociais ¢ Naturais; a atividade tende a se converter em uma aula demorada, na qual a leitura oral, &s vezes inaudivel, por parte dos alunos, ocupa uma fraggo do tempo, sendo interrompids pelo professor para intercalar com expli: cagbes, exemplos, anedotas, perguntas, desenhos ou esquemas, definicées, em apoio @ compreensio do texto. Geralmente € 0 professor quem interpreta 0 tex- to. Isto pode significar desde uma pardfrase ("Aqui 0 Cad. Pesq. (52) fev. 1985 texto estd nos dizendo . ..") até uma longa exposicio, “"prefécio” ou “ampliacao" do texto. Ao se ampliar 0 texto & possivel ir em qualquer diregdo: um texto sobre as terriveis condie6es da Idade Média permite recapitular a hist6ria da libertaglo da escraviddo na América; um outro texto sobre cultura eclesidstica medieval conduz 20 tema da relagdo do Governo com a Igreja na atuali- dade. Ao se falar em posos d'égua, abordase natur mente a comparacfo com pogos de petréleo. No pro- ‘2880, 0 professor pode acrescentar experiéncias pré- pias, informagdo, exemplos ou termos que se relacio- nam’ com o texto; pode apontar “erros"” no texto, conforme seu crtério, e apelar pare elementos do contexto dos alunos. Toda esta atividade de “‘interpretagéo de um texto” no qual o professor se torna_ implicitamente modelo de “como ler”, no sentido de como compreen: der a0 se ler, contrasta com a tarefa mecinica de res: onder questiondrios de “compreensio de leitura’ Dentro do processo de “leitura oral” de uma licéo também se podem observar diversas formas de avaliar @ compreensio dos alunos ou anti de comprometé- los na interpretagSo do texto. As vezes estas tentatvas adquirem forma de perguntas ritualizadas (na forma de forages incompletas que os alunos deve “adivinhar # dizer em coro 2 altima palavra, termo relterado jé pelo professor, que os alunos respondem mais com base no que acaba de ser exposto do que com base no texto lido. Outras vezes, 0 professor néo dé pistas 20s alunos para que respondem, mas busca igualmente uma respos- ta muito especifica; esta situago pode levar os alunos a nfo responderem, a solicitarem um questionério excite Em outras aulas,.o professor consegue ditigir @ leitura do texto @ a participagdo dos alunos em um esforeo mais consistente para obter a compreensfo do texto. Estes usos mostram tanto 2 complexidade do processo como a estrutura que subjaz dando 20 pro- fessor mais “autoridade” na interpretagdo do texto, 16 que ele conserva a possibilidade de selecionar, re tar, repetir ou elaborar as respostas que oferecem os alunos. 1. Um professor trabatha com seu grupo de alu- nos, sobre a ligéo “O Ciclo da Agua”. Depois de comentar 2 tarefa (determinar a direcdo dos ventos), 0 professor pede que vérios alunos leiam. © texto 4: “0 vento leva as nuvens de um lugar para outro. Por isso @ dgua que evapora em um lugar pode cair em forma de chuva em outro muito distante. ..”" Ao escutar a leitura dos alu nos, © professor comenta: “O importante é enten- der’ que Iéer, no s6 ler assim”. E em seguida: “Agora sim, 0 que entenderam?” Vérios alunos tentam explicar: “0 vento leva as nuvens”, “A gua evapora”, etc. O professor néo retoma as respostas mas diz: “Olhem bem. . .", ¢ comeca 2 desenher um esquema detalhado na’louse para para explicar 0 contetido do texto. “E o que diz 0 ‘nosso texto . . .” Em seguida desenha um mapa do México, e se antecipando ao proximo pardgra- fo do texto, explica de onde vim os ventos € as chuvas. Comenta a evaporaglo @ as criancas res onder a suas perguntas, compreendendo aparen- temente a explicacio do texto. Os usos escolares da lingua escrita 2. O professor pede novamente leitura: “De maio até setembro ou outubro os ventos trazem ar com muita gua em forma de vapor. . . para a maior parte da Repiiblica.” Vérios léem o mesmo. Professor: “Bem. . . 0 que nos estfo trazendo os. ventos? Vérios alunos: “Chuva”, “égua", “ar”, “ventos”, Professor: Leiam bem, para que entendam .. . nl trazem nuvens.” Pede nova leitura. "De quais ventos (fala)?”” Um aluno responde: “do mar. © professor pede nova leitura, “porque néo com- preenderam”. Professor: “. .. as nuvens se formam em que luga- res?" Vérios alunos:"Em charcos", “lagos”, "mar “Oceano Pacttico” (respostas pertinentes ‘evando em conta toda a explicago anterior) © professor no retoma as respostas, mas resume: “No mar se formam nuvens que trazem @ chu- va..." (Segue a leitura @ @ interrogagdo, com res- ppostas cada vez mais timidas por parte dos alunos.) 3. Ao terminar 0 texto o professor pede que obser- ‘ver uma ilustrago sobre o Ciclo da Agua no livro. Depois de um minuto pergunta: “o que véem?” E aponta a diferentes alunos. Primeiro oferecem palavras: “nuvens”, “tios”, etc. O pro- fessor repete tudo, em tom de aceitagd. Os alunos comegam a descrever processos: “chove a agua se filtra para baixo”, “a agua esquenta f s0be outra vez forma nuvens”. O professor repete tudo, as vezes em tom de néo ter percebido antes; “atés des montanhas também chove. » 6 verdede..”, diz. A mengéo da filtragdo da Sgua pela terra leva a uma discussdo em que as crian- 8 fornecam, com explicages amplas, os seus conhecimentos sobre a profundidade dos pogos na Sua comunidade. Durante esta aula se mostra de que forma a leitura de uma ligfo faz parte de uma trama de interagfo em {ue 0 professor &, geralmente, o responsével por inter preter 0 texto, Os alunos respondem as perguntas do profestor de forma diferente, no que diz respeito & am- plitude e & certeza, nos trés momentos da aula: quando 8s perguntas se eferem a0 que o professor expés respon ‘dem com feclidade, as vezes ajudados pelas “pistas” ‘dadas pelo prOprio professor; quando se referem ao tex- to, 20 contrério, responder parcialmente, com palavras tomadas do texto; 0 professor tende a oferecar explica- Ges mais complatas, sem retomar ou validar 0 que dizem of alunos. Quando se referem & ilustracdo, as res- postas e os comentarios sf0 cada vez mais amplos,¢ sf0 actitos pelo professor de tal forma que até se rompe a relagdo assimétrica caracteristica da leitura do texto. 0 time momento mostra que as interacbes anterio- res nfo implicam em ume “inibigfo" ou “falta de compreensfo" por parte dos alunos, mas que apontam para alguma caracter‘stica bésica de como se mangje @ interpretagio do texto escrito, dentro da. interagio docente-aluno. Se bam que neste caso os alunos estejam compro: mmetidos, até com entusiasio, na atividade de ler ¢ en- contrar 0 sentido 20 texto, 6 sobretudo através da com- plexa trama de interaglo verbal com 0 professor que ‘este procesto se dé no ensino escolar. A “"compreenss0 de leitura” € fundementalmente social neste contexto ot {e talvez em muitos dos contextos extra-escotares). Mas © tipo de relagio que se estabelece na escola entre do- Cente e alunos, imprime certas caracteristicas a0 proces- $0; nele esto em jogo 2 dupla autoridade do professor. ‘A “autoridade"” de quem “sabe mais" e portanto pode contribuir mais ao texto, e a “autoridade” institucional ‘que assume frente aos alunos. As criancas, dentro desta relacdo assimétrica, entram em um duplo processo, no melhor dos casos, de tratar de interpretar 0 texto @ 20 mesmo tempo tratar de “‘interpretar” o que entende solicita 0 professor. Neste sentido a relagdo social ca racteristica da escola estrutura o processo de interpre: tagdo do texto que se ensina aos alunos. Como se é 0 se escrove: as estratégias impli citas das ceriangas. Através do “ensino” se comunicam, se solicitam @ se permitem determinados usos da Ifngua escrit deixa-se pouca margem para que os alunos elaborem textos diferentes aos caracteristicos da escola; “ler” requer sobretudo atender cuidadosamente as caract risticas precises do texto, recuperar e reproduzir as alavras exatas, na ordem encontrada. Mesmo quando © professor, a0 apresentar 0 tema, mostra outras for: mas de compreender 0 texto, isto se apresentamais como “aula do que como uma forma de “ler”. No entanto, a5 mesmas atividades que s¢ organizam para © ensino podem possibilitar ou gerar estratégias dite: rentes que os alunos colocam em prética 20 se defron- ‘tarem com a lingua escrita. Os resultados podem se integrar inconscientemente 20 processo de ensino, ou entéo ficar eliminados por contradizer as “regras”” impli citas da atividade escolar. Em muitas ocasides, por exemplo, parece que os alunos no podem: deixar de compreender o que véem escrito, ainda que nfo se pega isso. Como interpretar, or exemplo, que cometam “erros” ao copiar um tex: to, se no é porque, de fato, nfo copiam mas léem antes de escrever? Quando os alunos escrevem, um questionério ditado, no qual se dé grande importéncia 20 cuidado com a forma, a ortografia e a pontuacio, também com- Preendem o texto que escrever sem que isso seja pedido 2 eles. Por exemplo: imediatamente ap6s terminar o dita- do de um questionério, um aluno pergunta: Respond mos? E a professora adverte: “‘ndo, vo pesquisar”. O aluno protesta: “Isso jé sabemos”, indicando qui liara © conteddo das perguntas. Também prefarem con- sultar 0 livro (“no copie’, diria 0 professor) ao res- onderem seus questionérios. 3s alunos também costumam. antecipar as instru 96es, resolvendo os exercicios “da pagina tal”, apontada pelo professor, sem esperar suas indicagBes. As vezes isto implica em apagar logo em seguida o que fizeram, por ‘suas interpretagdes nfo coincidirem com as do professor (e nem sempre 6 0 aluno que néo entendeu). 0 encontro ‘com uma diversidade de formas escritas obriga-os as 2e8 a discriminar entre diversos significados do escrito, ‘mesmo quando as diferencas nunca sejam a eles explice. das; por exemplo, aprendem a “ler” as perguntas dos problemas escritos, sem procurar as respostas no préprio texto, como fariam com as perguntas de exercicios de eitura”, Durante algumas das atividades de leitura grupal 92 de textos, em que o professor intervém e pergunta aos. alunos, observam-se tentativas dos alunos de encontrar © significado do texto a partir do contexto, da ilustra- G0, de seus préprios conhecimentos ou experiéncias. Em’ um caso, a professora dirigiu a leitura de um relato no qual vérias criangas tocaram durante a noite dife- rentes partes de um elefante, e supdem que encontra- ram troncos, serpentes, etc. As tentativas da professora de recriar 0 suspense do relato e conseguir que imagi- nem o que as criangas sentiram, vé-se frustrada porque 5 alunos antecipam, a partir das Gltimas ilustragGes da ligdo, que se trata de um elefante. Em um outro caso, foram frustradas as tentativas de uma aluna de dar sentido, a partir da sua experiéncia, a uma ligdo sobre a Revolugdo Francesa Revolugdo Francesa. Depois de uma pausa o profes: sor diz: “Vamos ver, vooés, jé devem saber de cor, (digar) © pouco que saibam; fechar livros.” Uma aluna, Juliana, comeca a dizer alguma coisa sobre “os camponeses”. (O texto ¢ breve, mas menciona quatro vezes os camponeses).. © professor a interrompe: “No, néo, primeiro. . do que se trata?” 0s alunos no respondem. Professor: “Vamos ver, Angeles, o que & que havia na Frana?” A crianga responde que “aqui hé muitas terres fertéis, rios e carnelros”. (0 texto diz apenas que havia muito gado). Professor: “De carneiros, 0 que é que diz?” (tom sério). 0s outros alunos riem. A aluna nfo volta a falar. (isto acontece num pequeno povoado onde se criam carneiros) Do mesmo modo, durante as perguntas ou inter: pretaglo grupal de uma licéo, as criancas freqiiente- mente “cometem érros", porque respondem a pergun- tas com palavras diferentes das do texto, ou com base em inferéncias que fazem a partir do conjunto da ligio. Por exemplo, uma crianca responde “classes sociais”, ‘em lugar de dizer “nobres e servos”, que seria a frase correspondente a0 ponto em que iam na leitura; ms adiante 0 texto menciona que estas eram as classes sociais da época. ‘As estratégias representadas por este tipo de incidentes so necessérias para o desenvolvimento de uma competéncia real na leitura: consultar, avaliar, discriminar conforme 0 contexto, usar as ilustragdes ou adiantar-se na leitura para encontrar mais informa- fo, relacionar 0 texto com conhecimentos prévios ou experidncias préprias e organizar, a partir disso, a interpretago do texto. De alguma forma, os alunos aprendem @ usélas a0 se defrontarem com a tarefa de “encontrar sentido” na lingua escrita, No entanto, teste tipo de estratégia no encontra expresso dentro da estruturagdo da leitura formal; geralmente resultam preteridas diante da exigéncia de prestar atengio, & reproduzir a versio “textual” do que foi lido. OUTROS USOS DA LINGUA ESCRITA Dentro da escola, mas fora das atividades do Cad. Pesq. (52) fev. 1985 ensino, acontecem muitas outras coisas que implicam no uso da lingua escrita. Os professores encontram-se continuamente ocupados em diversas atividades em que se 16 e se oscreve; as criancas também encontram numerosas ocasides de por em prética seus conheci mentos sobre @ lingua escrita. Se néo se levam em con: ta estes momentos, ficaria incompleta a apreciagio do contexto dentro do qual os alunos se apropriam da lingua escrita © trabalho dos professores implica de fato em rmuitas fungSes adicionais as do ensino. A documen- tagdo escolar e as comissBes so duas des atividades fem que se desenvolvem, de forma rotineira, a interp: tagdo de textos e 0 registro escrito; recebern-se of cos, reenchem-se formulérios, levam-se cadernos de inscri- ‘6es, assisténcia, cotas, caixa escolar, compra e venda da cooperativa, etc. Além do que, na escola se recebe ma- terial escrito de outros tipos: circulares, cartazes de cam: panhas, volantes, convocagdes para concursos ou para Segundo Grau, folhetos sindicais, antincios comerciais, etc. Este material entra, é lido e comentado entre pro- fessores © as vezes também com os alunos. A relagéo escolar com os pais dos alunos gera agendas escritas na lousa, atas anotadas em livros especias, recados sobre as tarefas, disciplina, uniformes, cotas, etc. anotados em bithetinhos ou no caderno do aluno, As condigdes de trabalho dos professores (com sua exigéncia de cumprir com multiplas funcdes) assim como 2 prépria natureza do trabalho de ensino no Primeiro Grau (diferente das do professor de niveis superiores) os obriga a que, durante o tempo em que estejam com 0 grupo, consultem os livros de texto @ outros materia, conhecam materiais ou disposicdes que acabam de che- gar, revisem os programas, preparem as proximas ati dades, Estes momentos constituem uma parte do proces: so real de formacfo dos professores, da sua prépria apropriagéo de usos e conhecimentos através da Iingua escrita. As vezes sua prOpria atividade implica na leitura fe na escrita da maneira a contrastar com aquela que cos: tumam exigir de seus alunos: fazem anotagSes como lembretes, em letra cursiva em seus livros ou cadernos; mem siléncio, seletivamente, folheando os livros de texto; néo Idem para memorizar ou repetir 0 texto, ‘mas para interpreté-lo diante dos alunos, acrescentando seus préprios conhecimentos; fazem pausas entre uma explicagdo e outra, para pensar, para compreender o que o livro diz. Os alunos so testemunhas de toda esta atividade cotidiana; examinam, quando podem, o material escrito que encontram na mesa do professor/participam, ou pelo menos so “objeto” de muitos destes usos escola: res de lingua escrita. Observam os professores, como ‘observam qualquer adulto que 16 ou escreve {incluindo © observador) e refletem sobre o que fazem. A atividade do professor constitui assim um modelo cheio de usos alternativos, da prética normal de leitura e escrita pré- prias do trabalho docente. Por outro lado, os préprios alunos tém um con- junto de praticas especiticas em que aparece a Iingua escrita. © espago escolar deixa muitos intervalos e re- cantos onde aflora a atividade auténoma das Dentro da sala de aula, além da interacfo formal com © professor, existe uma rede de interacdo entre os alu- nos. Grande parte desta atividade de fato acontece em Os usos escolares da lingua escrita relagio a tarefa escolar; inclui tudo aquilo que, da pers: Pectiva docente, pode parecer uniformemente como “colar”: consulta entre as criangas, comparagio de verses escritas, copiadas ou “inventadas"; interoémbio @ leitura geral de seus cadernos; correges espontineas de um para outro, as vezes em tom de “professor que corrige”, ”. As criangas estdo muito atentas a0 que. um companheiro escreve na Jousa, ou do que deve ler: levantam, sem permissfo, para ajudar, gritam correcdes, pedem para substitul-lo, Re- tornam da fila diante da mesa do professor, para dar recomendacSes aos seus companheiros sobre como fazor o exercicio. Com 0 mesmo énimo realizam outras atividades de leitura e escrita no solicitadas pelo professor, Idem revistas ou estorias as escondidas (alguns professores também fazem isso em momentos de descanso), material implicitamente proibido no cbdigo escolar. Examinam cartazes € avisos, colados na escola, dirigidos aos adultos. Entram em outras salas, ¢ se entrosam com 0 que af $2 ensina, através do que esté escrito na louse ou do expos- to em jornais murais e paredes. Ocupam os momentos li res dentro da sala de aula folheando os livros de texto. Dois alunos, que partilham uma carteira, folheiam cada um o seu livro de Ciéncias Socials, se detendo para ler titulos, legendas de fotos e comentando entre eles. Examinam com cuidado os detalhes das. gravuras; Idem 0 escrito nos selos postais represen- tados em uma pégina; comentam. “Assim eram os arrinhos, olha como estavam”. . . Léem: ‘Villa sentado na cadeira presidencial junto a sapato"” se corrigem, sem olhar novamente o texto escri- to, rindo, “Zapata!” As crlangas ocupam folhas de cadernos para escre- ver e desenhar, para enviar recados uns aos outros. Tam- bém encontramos aqueles que permanecem na sala du- ante 0 recreio para escrever na lousa ou em cadernos. A letra cursiva os fascina, para uns significa um obstécu- lo para a compreenséo de cartas e recados escritos por adultos; uma menina consulta-nos sobre a leitura da lista (em cursiva) das mercadorias da cooperative que the entregaram para serem distribuidas. Outros copiam tex- tos em cursiva e tentam praticar este tipo de letra, come- ‘gando com suas préprias “assinaturas” ‘Todas estas atividades “extra-ensino” que s0 reali- Zam na escola abrem o leque de usos da Iingua escrita 3 qual estéo expostos ou na qual participam os alunos. E a partir desta experiéncia conjunta, que se realiza na escola mas nem sempre pertence & escola, que as crian- ‘¢25 geram 0 processo de “apropriagso” da leitura e da escrita, TRES FORMAS DE APROPRIAGAO DE LEITURA E DAESCRITA. No processo social de apropriago podem-se iden tificar pelo menos trés dimens6es diferentes relacionadas com a leitura e a escrita, conforme se refiram ao sistema de escrita em si, aos usos escolares da lingua escrita, ou 20 acesso @ outros conhecimentos através da lingua ‘escrita. Em cada caso 0 que o contexto escolar fornece, ‘ensina ou exige ¢ diferente, ¢ provaveimente a atividade cognitiva do aluno integra de forma distinta a experién- cia escolar relativa a cada dimensSo. 'No primeiro caso, 0 “objeto de conhecimento” 93 © sistema de escrita em si, assim como os pressupostos que 0 leitor/escritor deve dominar para poder usar a Iingua escrita. As criancas se defrontam com este objeto, ‘como com muitos outros de seu mundo, @ tentam, a pa tir da Idgica de seu préprio desenvolvimento cognitivo, "‘descobrir seu significado”. O processo implica em co: ‘nhecer, progressivamente, diversas caracteristicas do sis- tema, da natureza alfabética (no silabica) da escrita, até as restrigdes léxicas e sintéticas implicitas na maioria dos textos lidos ou solicitados na escola, etc. Além disso, para chegar a ser leitor “competente”, devem aprender a ler com maior “eficiéncia"; isto implica em sacrficar a preciso na reproducio oral do texto lido e antecipar 0 sentido, “evar significado a0 texto”, para poder com preendé-o no palavra por palavra, mas através de uni- dades maiores. No contexto escolar, geralmente no se transmite este tipo de conteddo explicitamente. De fato, é um ‘eonhecimento to complexo que dificilmente se pode ‘explicar ou ensinar. (Seria to impossfvel como ensinar sintaxe & crianga que aprende a falar). No entanto, na medida que persista a pritica de copiar e decifrar, basea- da na importancia priméria da correspondéncia fonema/ ‘gratia, resta pouco espaco, nas atividades de ensino, para (© desenvolvimento de todos os conhecimentos que a leitura e a escrita requerem. Mesmo quando na prética, as vezes pela exigéncias das tarefas escolares, of alunos conseguem efetivamente desenvolver estratégias dife- rentes daquelas transmitidas, o que se tenta avaliar ou reconhecer como "boa" leitura ou escrite nfo corres- onde a aste conhecimento impiicito. Talvez por isso, quando nfo se esté “ensinando” a ler e escrever que 08 alunos tém maior possibilidade de observar ou parti- cipar em atividades de producio e interpretacio de textos e obter mals informagdo sobre a lingua escrita. E significativo que seja durante as aulas de Ciéncias Sociais e Naturals que a leitura e a escrita adquiram ida, e onde se apresentam mais ocasiées de compreen- der 0 que é ler e escrever. O leque de praticas de leitura @ escrita que realizam tanto professores como alunos, fora do ambito do “ensino” (sem contar as que se ver ficam fora da escola) acrescanta modelos @ usos alter- nativos. Em conjunto constituem as condiges escolares 8 partir das quais se realiza 0 processo de apropriagio da Hingua escrita Paralelamente, os alunos se defrontari com esse outro “objeto” na sala de aula, o sistema de usos esco- lares da lingua escrita. O sistema de usos escolares der va algumas de suas regras ou conteddos implicitos de sua insersSo na estrutura de relages sociais que caracte- riza a instituicdo, que outorga autoridade a0 professor, assim como de outros processos @ fungGes escolar como a socializacdo para certo tipo de trabalho (Para- dise, 1979) — presentes nas mesmas atividades cua in: tencdo 6 transmitir conhecimentos. E por este fato que nfo se trata de um problema de método ou conheci- mentos do professor. S6 6 compreensivel neste contexto institucional e social mais amplo, a tendéncia & assime- tria entre professores e alunos na producdo e interpreta: 80 de textos, assim como a tendéncia a0 dominio das “formas” em lugar dos conteddos do conhecimento escolar. ‘Aprender na escola & sobretudo aprender a fazer coisas, aprender “usos” dos objetos escolares, entre eles 94 dda lingua escrita. O pressuposto € que ao se “fazer” as coisas se conhecem as caracter/sticas do objeto; em certa medida 0 contato escolar com livros @ objetos ara escrever possibilita, efetivemente, a apropriacfo da lingua escrita. Mas geralmente o que se ensina a fazer com a I(ngua escrita na escola, ainda quando 0 ensino s9ja muito bom, 6 pouco representative do leque social de usos da leitura e da escrita; além disso pode comuni- car pressupostos diferentes dos que caracterizam a ativi= dade de ler e escrever em contextos no escolares. Algu: mas vezes, o$ alunos se véem obrigados a acsitar contra- digdes entre o sistema de usos escolares e o sistema da agua escrita Por exemplo, em alguns dos usos escolares, @ lin- ‘qua escrita tende a se converter em um objeto sem qu quer referente que no seja ela propria. Na cépia, no ditado, na leitura mecdnica a atenodo se dirige explicita- mente para a forma do escrito e nao para o seu signitica- do. Inventam-se oragdes que devern ter certas caracter‘s- ticas formals, pontos, ordem ¢ quantidade de palavras & que so usadas para fazer alguma coisa — marear, subli- nnhar, etc. — mas nfo para comunicar algo. Os alunos aprendem a realizar todo tipo de exercicios (como os questionérios) sabendo o que tém a fazer com 0 texto, sem ter que entendé-lo. Em todas estas préticas se faz alguma coisa com a Hingua escrita; copia-se, desenha-se, verbalizase, assina- ‘do se faz lingua escrita; aprende-se a fazer algo com © texto ¢ 20 mesmo tempo aprende-se a néo Ié-lo, tratar de compreendé-lo. O sentido que tem o texto es- tito na escola néo provém da sua possibilidade de refe- réncia a outra realidade, mas da sua utilidade dentro de determinada atividade escolar: “oragdo” significa que se marca com Se P; “poema”” é 0 que se declama com os ‘gestos cléssicos. ‘A interpretaggo de um texto escrito na escola, requer (assim como também a compreensio de um dié- logo requer) conhecer porque se produziu, por quem @ para quem, durante que atividade, etc. Como consequén- cia, diferentemente do que geralmentase afirma, a {(ngua escrita tem na escola um sentido extremamente depen: dente do contexto. 0 terceiro processo se refere a relago entre 0 uso da lingua escrita e a apropriagio dos contaidos acadér 05 transmitidos pele escola. A andlise do que acontece nas salas de aula tem demonstrade como pode ser com: plexa esta relago na escola, Néo se trata de uma simples atividade de user a “compreensio de leitura", como se {fosse esta uma hebilidade prévia, atil para tudo, para se ‘obter novos conhecimentos. Mas isto em princ(pio, por- que ler (com compreensio, no hé outra alternatival supe, de fato, levar 20 texto escrito conhecimentos prévios. No entanto, a lingua escrita representa tam- bém , historicamente, a possibilidade do acesso 20 co: hecimento de fendmenos ou acontecimentos fora do ‘contexto"” imediato; mas na escola, pelo menos 2 nivel do Primeiro Grau, este processo néo se realiza diretamente, mas mediado pela relacdo entre o profes- sor @ 0 aluno. A interpretagéo do texto 6 um processo. social, no qual o docente aparece como indispensével ‘na medida em que possui maiores conhecimentos com relago a0 tama do texto. Por outro lado, é justamente através desta atividade escolar de interpretar o texto Cad. Pesq. (52) fev. 1985 {que 05 alunos podem aprender mais sobre a “leitura”, uma leitura que depende no mais do conhecimento do sistema de escrita, mas da interago entre sujeitos @ texto, em determinada situagéo social. A partir do que se observa na sala de aula, s6 & poss(vel indicar a existéncia de um nivel de atividade proprio dos alunos, fem que se desenvolve ao longo do Primeiro Grau uma rocura permanente do sentido da Ingua escrita. ‘Ao diferenciar entre estes trés processos © nosso intuito € apenas problematizar a relagio entre lingua escrita e 0 contexto escolar, em funcio do processo social de apropriagio. Resolver alguns dos problemas REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS BRICE HEATH, Shirley. What no bedtime story means: nara: ‘ive skills at home and school. In: TERMAN CONFERENCE. ‘Stanford University, 1980, FERREIRO, E. Los procetos constructivot de apropriacién de Ia escritur. In: FERREIRO, €. & GOMEZ PALACIO, (eds) ‘Nuevas perspectivas sobre los procesos de lectura@escrture, México, Siglo XX1, 1982. FIERING, Suzan. Un official writing. In; ETHNOGRAPHIC ‘monitoring of chikiren’s acquisition of readingllanguage {ars skils in an out of classrooms, Os usos escolares da lingua escrita colocados requer nfo apenas mais pesquise, como também maior desenvolvimento taérico. Concluindo, apenas gostaria de apontar que no provesso de com Preender 0 que acontece seria um erro separar, como se se tratasse de objetos ou etapas diferentes, 0 processo Psicogenético (de apropriacio do sistema de escrita) do rocesso socio-genético (de apropriagdo de usos e signi- ficados sociais diversos). Precisa-se superar isso traba- thando na direeSo de definigbes que permitam integrar as duas perspectivas na conceituacso da apropriaglo da leiturace da escrita. HYMES, OH. et cation, 1981 SMITH, Frank: Resding. Cambridge, Cambridge University Press, 1978. SMITH, Michael. An ethnography of literacy in a Val Town, 1978, PARADISE, Ruth. Le socialicacion pare el trabajo: la interac ‘i6n_maestroslurmno. Departamento de Imvestigtciones Edducativas, 1978, (Tess de maostia). Informe final. National Institute of Edu- ca

Vous aimerez peut-être aussi