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INTRODUÇÃO
O motivo pelo qual decidimos retomar o assunto preende-se, essencialmente, com a neces-
sidade de alargar o desenvolvimento do tema a outros aspectos aí não abordados, de que
destacamos:
1
Vide nosso livro, artigo com o mesmo título, pp. 389-400. Este trabalho foi também publicado na revista Euro-
contas n.º 30, de Setembro/97.
Autor: Joaquim Fernando da Cunha Guimarães
O problema da internacionalização desemboca num outro que tem gerado muita polémica: o
da evasão e fraude fiscal3, que origina a perda de receitas por parte do fisco. Porém, não
devemos confundir este fenómeno com o planeamento fiscal (fiscal planning).
Uma das formas mais comuns da evasão e fraude fiscal internacional reconduz-se à utiliza-
ção pelo contribuinte de paraísos fiscais (Menezes Leitão, 1993: 306-7)4.
De notar que alguns desses paraísos fiscais (“off-shore”) não prevêem qualquer tributação
dos rendimentos das mais-valias e do capital. É o caso das Baamas, das Ilhas Cayman, das
Novas Ibéricas, das Ilhas Turks e das Caicos.
2
Harmonizar é “estabelecer harmonia entre”, isto é, “dispor ordenamente as partes de um todo”, é “por em
harmonia duas ou mais partes de um todo, duas ou mais coisas que devem concorrer para o mesmo fim”. Por
outro lado, harmonizar implica os aspectos colidentes do “quid” sobre que se opera, não coincidindo, pois,
com uniformizar (Pires, 1993: 19-20).
3
Menezes Leitão (1993: 304) sublinha como factores responsáveis pelo desenvolvimento da evasão e fraude
fiscal internacional o seguinte:
- a mobilidade dos indivíduos;
- a mobilidade dos capitais;
- a internacionalização das empresas;
- o aperfeiçoamento das práticas evasivas.
4
Citando BEAUCHAMP, “Guide Mondial des Paradis Fiscaux”, Paris, Grasset, 1981, p. 39, o autor aponta a
seguinte definição de paraíso fiscal: “Um país ou um território que atribua a pessoas físicas ou colectivas van-
tagens fiscais susceptíveis de evitar a tributação no seu país de origem ou de beneficiar de um regime fiscal
mais favorável que o desse país, sobretudo em matéria de impostos sobre o rendimento e sobre as suces-
sões.”.
5
É uma forma de paraíso fiscal. Duas outras formas costumam ser mencionadas: o estabelecimento de resi-
dência e a prática de preços de transferências (transfer pricing).
6
Assim chamado devido ao nome do presidente (Onno Ruding) do Comité de Peritos Independentes (compos-
to por 8 elementos). Este comité reuniu três vezes sobre estas matérias de Janeiro de 1991 a Fevereiro de
1992, altura em que apresentou o relatório. Nele se destacam as seguintes prioridades:
“a) Supressão das discriminações e distorções que entravem os investimentos transfronteiriços;
b) Fixação de uma taxa legal mínima para os impostos de sociedade assim como regras comuns para o cál-
culo de uma base tributável mínima, que evite uma concorrência fiscal excessiva entre os Estados com vista a
atrair os investimentos mobiliários ou lucros tributáveis das empresas multinacionais.
c) Encorajamento do máximo de transparência no domínio dos benefícios fiscais ao investimento, dando pre-
ferência, se possível, aos incentivos que não tenham carácter fiscal.” (Freitas Pereira, 1993: 81).
Autor: Joaquim Fernando da Cunha Guimarães
A optimização da lei fiscal resulta também da vocação natural do ser humano para contribuir
com o mínimo de impostos possível, dentro duma perspectiva legal ou não da sua acção.
Diz-se até que na Dinamarca existe um partido político cujo objectivo programático principal
é o não pagamento de impostos.
Ora, o comportamento fiscal do cidadão e a imagem que este tem da Administração Fiscal
(AF) são factores determinantes na prossecução dos objectivos da mesma. Estes factores,
muito importantes, foram bem sublinhados por Pombo Gruchinho (1993: 182) que destacou
a necessidade de avaliação da opinião dos cidadãos, de acordo com os seguinte progra-
mas:
- Programas de investigação que pretendam avaliar a opinião dos cidadãos acerca do fisco
e do seu funcionamento;
- Programas de exploração dos dados recolhidos nos Serviços de Informações e Apoio aos
Contribuintes;
A este respeito, Eduarda Azevedo (1993: 199) sublinha os esforços que a nível da UE se
estão a desenvolver:
Seja qual for a matéria contabilística que abordemos, ela tem necessariamente o seu en-
quadramento fiscal, por exemplo a nível da tributação indirecta (v.g., IVA) e da tributação
directa (v.g., IRC, IRS). Queremos com isto dizer que a Fiscalidade e a Contabilidade deve-
rão ser analisadas em conjunto, de forma a servirem de apoio à tomada de decisões. Obvi-
amente a problemática das mais-valias não foge a este regra.
7
A autora destaca o desenvolvimento de uma Fiscalidade do ambiente (1993: 197), exemplificando as medidas
da UE sobre a gasolina sem chumbo e o imposto sobre o dióxido de carbono/energia.
Autor: Joaquim Fernando da Cunha Guimarães
Sem querermos alongar esta problemática, até porque já o fizemos com maior desenvolvi-
mento noutro estudo8, iremos conceptualizar a Contabilidade de acordo com uma visão pa-
trimonialista da empresa e assumir o conceito de Fiscalidade numa óptica de escolha da
melhor opção entre várias que se colocam perante determinado facto patrimonial.
Lopes Amorim (1968: 36) apresentou a Contabilidade como a ciência do equilíbrio patrimo-
nial que tem por objecto o conhecimento do património de qualquer empresa (ou entidade)
no seu tríplice aspecto quantitativo, qualitativo e valorativo, em qualquer e em todo o
momento da sua existência, com a finalidade de estabelecer (ou permitir estabelecer) a aná-
lise da situação económica e financeira (social, até) para racional orientação da sua gestão
(em sentido lato).
Na senda do mestre, mais recentemente, Armandino Rocha (1991: 36) definiu a Contabili-
dade como a ciência do equilíbrio patrimonial, preocupando-se com todos os acontecimen-
tos que a possam influenciar e por isso os identifica, selecciona, analisa e promove medi-
das, processos, avaliação e comunicação de dados, facilitando a tomada de decisões.
Para Fernandes Ferreira (1984a: 8), a Fiscalidade9, qualidade do que é fiscal, é a disciplina
que se ocupa da matéria dos impostos. Acrescenta ainda que (1984b: 5) é uma expressão
que hoje tem um sentido técnico amplo e que corresponde aos anseios dos que querem
apetrechar-se para uma vida profissional com conhecimentos variados e práticos sobre as
estruturas dos órgãos da Administração Fiscal, actuação destes e dos contribuintes perante
as imposições legais, designadamente as acções necessárias ao lançamento, liquidação e
cobrança dos impostos.
Cimourdain de Oliveira (1997: 33) observa que nas últimas décadas aparece muito, quer em
Portugal quer no estrangeiro, a par da expressão Direito Fiscal, o termo Fiscalidade, aliás de
conteúdo mais lato, pois inclui, para além do Direito Fiscal, o estudo da Técnica Fiscal e da
Política Fiscal. Acrescenta ainda que se distingue, por outro lado, da Ciência Fiscal, na me-
dida em que esta expressão implica a visão abstracta e científica daquelas matérias, ao
passo que o termo Fiscalidade indica um tratamento predominante concreto e técnico.
8
Sob o título “Auditoria Fiscal”, publicado na Revista de Contabilidade e Comércio n.º 217 – Vol. LV – 1.º tri-
mestre 1998, p. 65 – 118.
9
Etimologicamente “Fiscalidade” é uma palavra derivada de “fisco”, proveniente do latim “fiscu”, e é a designa-
ção dada quer ao Estado, considerado como tributador dos cidadãos, quer ao tesouro público, por recolher
todas as receitas provenientes de tributos (cf. Grande Dicionário da Língua Portuguesa, Ed. Círculo de Leito-
res, p. 97).
Autor: Joaquim Fernando da Cunha Guimarães
Fernandes Ferreira (1996: 473) destaca que a influência da Fiscalidade é cada vez maior na
gestão. Não há praticamente transacção ou decisão que não apresente implicações fiscais.
Por outro lado, havendo variedade de situações surge diversidade de tratamento fiscal, i.e.,
surgem, na prática, diferenciações e distorções várias na legislação ou na execução da lei
fiscal10.
Ainda na opinião deste especialista (1996: 480) a Fiscalidade assume, para os gestores, um
carácter instrumental e ajuda para boas decisões.
Nessas relações há quem defenda uma convergência total, uma divergência total ou uma
complementaridade de princípios.
10
Sublinha ainda que a Fiscalidade acarreta, hoje, não só estudos tradicionais de Direito Fiscal como também
de outras matérias. A relacionação do Direito com as disciplinas de Economia e Contabilidade permite enten-
der mais convenientemente o sentido de certos conceitos e de expressões usadas nos diplomas fiscais.
11
AMAT SALAS e D. BLAKE (1995: 653), citando NASER, K. H. M. (1993: 59) in “Creative Financial Accounting:
its nature and use”, London, Prentice Hall, referem que este autor apresenta a seguinte definição de Contabili-
dade Criativa:
“O processo de manipulação da contabilidade para aproveitar-se dos vazios das normas contabilísticas e das
possíveis eleições entre diferentes práticas de valorimetria e contabilização que esta oferece, para transformar
as contas anuais que têm de ser nas que, para os que preparam, prefiram que sejam.”.
Autor: Joaquim Fernando da Cunha Guimarães
Portugal, tal como a maioria dos países do Sul da Europa (v.g., Espanha, França,
Itália), através dos seus normativos contabilísticos e fiscais, reconhece a aplicação
daquele último modelo (é a chamada corrente continental da normalização conta-
bilística). Nestes países a normalização contabilística e fiscal assume um papel
primordial na relevação dos factos patrimoniais.
12
Estudo sob o título “Auditoria Fiscal”, op. cit..
Autor: Joaquim Fernando da Cunha Guimarães
Quando se toma uma opção fiscal não nos podemos abstrair dos seus efeitos contabilísticos
que, na nossa opinião e salvo melhor, assumem duas facetas:
2.ª A utilização de certas práticas contabilísticas divergentes das regras fiscais origina cor-
recções extracontabilísticas nas declarações de rendimentos (v.g., Q17 da DR22) que, por
influência da estimativa do IRC (conta “86 – Imposto sobre o rendimento”), afectam
(in)directamente o mesmo resultado contabilístico.
No mesmo articulado o autor sublinha que devemos compreender que, enquanto não existir
um Direito específico da Contabilidade, outros ramos do direito, e concretamente em primei-
ro lugar o Direito Fiscal, tenham de tomar o encargo de estabelecer normas reguladoras em
matéria contabilística que directamente se relacione com matéria fiscal. Nessa fase, o Direi-
to Fiscal teve necessariamente de substituir-se a um Direito Contabilístico ainda inexisten-
te15.
Fernandes Ferreira (1993: 230) reforça a ideia ao referir que a Administração Fiscal apenas
deverá impor normas sobre matérias contabilísticas para efeitos de apuramentos fiscais
extracontabilísticos (e não para relevações contabilísticas), quando se lhe revelar de todo
necessário fixar orientações tendentes a evitar quebras menos justificadas de impostos.
13
No prefácio ao nosso livro, p. 15-6.
14
Citando o Prof. francês Robert Teller (1984) relativamente ao que se passava em França e que Cimourdain de
Oliveira equiparou a Portugal.
15
O mestre sublinha ainda que o Direito Fiscal não tem de dizer o que são custos e o que são proveitos do
exercício, isto cabe ao Direito Contabilístico. O que o Direito Fiscal tem de dizer, isso sim, é o que, para efei-
tos fiscais, não são custos e o que não são proveitos.
Para Fernandes Ferreira (1993: 221), o Direito da Contabilidade encontra-se ainda hoje disperso pelo POC,
pelo Código das Sociedades Comerciais, pelo Código do Mercado de Valores Mobiliários, pelo Código do Re-
gisto Comercial e legislação bancária e financeira.
Autor: Joaquim Fernando da Cunha Guimarães
Por último, sublinhamos que a designação “Contabilidade Fiscal” começa a ser usada com
certa propriedade, como no caso dos nossos vizinhos espanhóis16, sendo definida como
aquele conjunto de critérios de natureza tributária (fiscal) dirigidos à qualificação, valorização
e imputação temporal dos proveitos (ingressos) e custos (gastos), enquanto determinantes
do resultado (benefício) empresarial.
De acordo com o dicionário17 a mais-valia é o aumento do valor adquirido por uma mercado-
ria ou a diferença entre o preço do custo e o preço de venda.
Para Teixeira Ribeiro, citado por Martins (1997: 12)18, as mais-valias definem-se como sen-
do “os aumentos inesperados, imprevistos, do valor dos bens” 19.
16
A editora CISS-Gestión tem publicado um manual de folhas soltas com o título “Contabilidad Fiscal en la Em-
presa”.
17
Grande Dicionário da Língua Portuguesa, Ed. Círculo de Leitores, 1996, p. 651.
18
Cf. referência bibliográfica: “Lições de Finanças Públicas”, 1991, p. 258.
19
Este conceito é aqui referido a propósito da tributação das mais-valias dos títulos representativos do capital
das sociedades anónimas: as acções.
Autor: Joaquim Fernando da Cunha Guimarães
los do POC/89, bem como nas Directrizes Contabilísticas, não são usadas estas expres-
sões, referindo-se antes “perdas em imobilizações” (conta 694 do POC/89, em relação às
menos-valias) e “ganhos em imobilizações” (conta 794 do POC/89, relativamente às mais-
valias)21.
O n.º 1 do art.º 42.º do CIRC, sob o título “Conceito de mais-valias e de menos-valias”, apre-
senta a seguinte definição:
Além disso, o n.º 6 do art.º 42.º delimita no conceito das MVF e mvf o seguinte (definição
pela negativa):
No que concerne à clarificação dos elementos relevantes do regime das mais-valias e me-
nos-valias, destacamos a posição de Meireles (1994: 2-3):
“Resulta, por outro lado, da noção em apreço, que nem todos os ganhos obtidos
ou as perdas sofridas relativamente a elementos do activo imobilizado são consi-
deradas mais-valias ou menos-valias realizadas. São apenas, como tal considera-
20
Em estudo publicado no nosso livro (p. 115-141) sob o título “As Demonstrações Financeiras” justificámos a
nossa preferência pela utilização da expressão “Demonstrações Contabilísticas” em detrimento da de
“Demonstrações Financeiras”.
21
Veja-se também o exemplo da nota 10 do anexo ao balanço e à demonstração dos resultados em que se
refere “alienações” e “transferências e abates”.
22
Com a redacção dada pelo art.º 7.º da Lei n.º 71/93, de 26 de Novembro (Orçamento Suplementar do Exercí-
cio de 1993), e que está em vigor no Continente desde 8 de Dezembro de 1993 e nas Regiões Autónomas
desde 18 do mesmo mês, cf. Circular da DGCI n.º 10/94, de 14 de Março. A redacção vigente desde 1/1/89
até àquela data não contemplava a parte final desse artigo (“e tendo em conta o disposto no n.º 6 do art.º
44.º”).
23
Com a redacção do art.º 1 do Decreto-Lei n.º 420/93, de 28 de Dezembro (em vigor desde 1/1/94).
24
Com a redacção do Decreto-Lei n.º 263/92, de 24 de Novembro (em vigor desde 1/12/92).
Autor: Joaquim Fernando da Cunha Guimarães
dos, os que resultam de transmissão onerosa, qualquer que seja o título por que
se opere, de sinistros e de afectação permanente a fins alheios a actividade exer-
cida. Portanto, os ganhos ou perdas relativos a imobilizações que não derivem
destes factos, não são considerados mais-valias ou menos-valias para efeitos do
IRC” (Sublinhado nosso).
Por outro lado, o n.º 1 do art.º 41.º - “Mais-valias” do CIRS estabelece um conceito genérico
e remete para os art.os seguintes (42.º a 47.º) a sua concretização25.
Os conceitos aqui referidos são, obviamente, válidos para efeitos fiscais nas respectivas
cédulas em apreciação.
25
Com a seguinte redacção: “1 – O valor dos rendimentos da categoria G é o correspondente ao saldo apurado
entre as mais-valias e as menos-valias realizadas no mesmo ano, determinadas nos termos dos artigos se-
guintes.”.
26
Com a seguinte redacção: “As mais-valias potenciais ou latentes, ainda que expressas na contabilidade, inclu-
indo as reservas de reavaliação legalmente autorizadas.”.
27
Com a seguinte redacção: “As menos-valias potenciais ou latentes, ainda que expressas na contabilidade..”.
28
Vide nosso livro, p. 391-2.
29
Ocorre-nos um episódio real que não resistimos a narrar (pedimos desculpa pela eventual inoportunidade,
mas julgamos que o sentido de humor a que tão bem Pinheiro Pinto nos tem habituado faz falta). Presenciá-
vamos uma sessão de um Curso da DGCI quando o monitor falou desta dicotomia. Então interviemos, dizen-
do: o colega referiu as MVC e as MVF mas há uma terceira de que se esqueceu - a mais valia estar calado,
que nem é contabilística nem fiscal mas que ocorre no dia-a-dia.
30 Relativamente ao enquadramento das MV e mv , o CIRC destina os seguintes articulados:
F f
- rt.º 20.º (proveitos ou ganhos) – Mais-valias realizadas;
Alínea f) do n.º 1 do a
- rt.º 23.º (custos ou perdas) – Menos-valias realizadas;
Alínea i) do n.º 1 do a
- Art.os 42.º a 44.º (conceitos, correcção monetária e reinvestimento) – Regime das mais-valias e menos-valias realizadas.
De notar que as alíneas dos art.os 20.º e 23.º consideram-se cláusulas gerais que são complementadas pelos art.os 42.º 44.º.
a
Autor: Joaquim Fernando da Cunha Guimarães
Sublinha-se, contudo, que a MVF ou a mvf poderá influenciar o resultado líquido do exercí-
cio através do cálculo da estimativa do IRC (86 a 241), pois poderão incluir-se, positiva ou
negativamente, no apuramento do lucro tributável.
- Potenciais (ou latentes): são as MV/mv não realizadas ou não efectivas, que não são tribu-
tadas em IRC por força dos art.os 21.º e 24.º32;
- Realizadas (ou fiscais ou efectivas): são os ganhos (MVF) e as perdas (mvf) que resultam
da realização através de qualquer uma das situações previstas no n.º 3 do art.º 42.º do
CIRC e que poderão ou não ser tributados, dependendo do reinvestimento.”33.
Somos de opinião que esta distinção é fundamental para avaliarmos os efeitos fiscais ine-
rentes à tomada de decisões, i.e., à Fiscalidade.
Por outro lado, o conceito de “valor de realização” consta expressamente do n.º 3 do art.º
42.º do CIRC e do art.º 42.º do CIRS (vide Anexo n.º 1).
31
Compreende-se que assim seja, caso contrário estaríamos a aplicar duas vezes os coeficientes de correcção
monetária: uma pela reavaliação e outra pelo apuramento da MVF/mvf.
32
Incluem-se, por exemplo, as reservas de reavaliação, cf. dispõe a alínea b) do art. 21.º do CIRC.
33
Impõe-se uma correcção à parte final desta última classificação. Assim, onde se lê: “… e que poderão ou não
ser tributadas, dependendo do reinvestimento”, deve ler-se: “… e que poderão ser tributadas num ou mais
exercícios, dependendo das condições do reinvestimento do valor de realização.”.
34
Cf. Dicionário da Língua Portuguesa, Porto Editora, 6.ª Edição, p. 1399.
35
De notar que a Directriz Contabilística n.º 16 sob o título “Reavaliação de Activos Imobilizados Tangíveis”
apela ao conceito de “realização” relativamente ao uso ou alienação dos bens que originam o excedente obti-
do do processo de reavaliação.
36
O texto é comum nas duas notas explicativas, variando, obviamente, nas referências a perdas (conta “694” e
ganhos (conta “794”).
Autor: Joaquim Fernando da Cunha Guimarães
2.4 REINVESTIMENTO
Fernandes Ferreira (1993: 6) clarifica que a palavra “reinvestimento” não significa somente o
sentido de que reinvestir será só depois de desinvestir, pelo que considera inapropriada a
redacção do art.º 44.º ao referir-se a “reinvestimento do valor de realização do investimento
alienado”. Assim, sublinha que a palavra “reinvestimento” quer dizer simplesmente investir
outra vez, investir de novo, repetir investimento, logo não significará investimento posterior
ao desinvestimento do investimento anterior.
- Art.º 15.º do Dec. Lei n.º 442-B/88, de 30 de Novembro, que aprovou o CIRC;
37
Cf. Grande Dicionário da Língua Portuguesa, Ed. Círculo de Leitores, Lisboa, 1997, p. 456.
38
Cf. relatório da CDRF, p. 656. É o caso, por exemplo, dos investimentos de substituição, pois, não raras
vezes, o investimento novo terá de se iniciar antes de se vender o antigo (v.g., edifícios industriais).
39
Este articulado foi revogado pelo n.º4 da Lei n.º 71/93, de 26 de Outubro, que aprovou o Orçamento Suple-
mentar de 1993, já atrás referida.
40
Com a redacção do Decreto Regulamentar n.º 16/94, de 12 de Julho.
Autor: Joaquim Fernando da Cunha Guimarães
Esta distinção é fundamental para se diferenciar a MVF tributada por valores de realização
não reinvestidos, i.e., a mais-valia fiscal não associada (MVFna), da mais-valia fiscal tributa-
da diferidamente – Mais-Valia Fiscal associada (MVFa).
Estes dois conceitos estão associados aos efeitos fiscais inerentes ao reinvestimento do
valor de realização. Assim, o contribuinte vende (ou qualquer outra forma de abate) imobili-
zado (bens velhos) – valor de realização - para adquirir imobilizado (bens novos) e este pro-
cesso é incentivado por benefícios fiscais, através da “não tributação” e ou “tributação diferi-
da”.
Os dois conceitos estão sempre ligados à existência de mais-valias fiscais e não de menos-
valias fiscais, ou melhor, para seguirmos a terminologia do n.º 1 do art.º 44.º do CIRC,
quando a diferença entre as mais-valias e as menos-valias realizadas (ou fiscais) é positiva.
A “não tributação” significa que a MVF não é acrescida ao lucro tributável (linha 18 do Q17
da DR22).
A “tributação diferida” significa que a MVF originada pela realização dos bens antigos – Mais
Valia Fiscal associada (MVFa) – é deduzida ao valor de aquisição43 dos bens novos para
efeitos de tributação. A MVFa acompanha o ritmo de amortização dos novos bens onde se
concretizou o reinvestimento do valor de realização, ou seja, é acrescida ao lucro tributável
numa percentagem equivalente ao período de vida útil dos bens novos44.
41
Veja-se, por exemplo, o art.º 8.º do recentemente aprovado Dec. Lei n.º 31/98, de 11 de Fevereiro.
42
O art.º 44.º do CCI, com a redacção do D. L. n.º 437/86, de 27/12, era enunciado da seguinte forma:
“Os lucros retidos ou levados a reservas e que dentro dos três exercícios seguintes ao da formação dos mes-
mos sejam reinvestimentos na própria empresa…” (Sublinhado nosso).
43
Ou valor de produção, se o bem novo resulta do processo produtivo próprio da empresa (conta “75 - Traba-
lhos para a própria empresa”).
44
Como teremos oportunidade de visualizar mais à frente, este é o factor principal de gestão fiscal destas ope-
rações.
Autor: Joaquim Fernando da Cunha Guimarães
Para a interpretação dos efeitos contabilísticos e fiscais das mais-valias é necessário com-
preender as bases teóricas em que assentam a tributação do rendimento e, no caso em
apreço, em cédula do IRC.
Como é referido no item 5 do preâmbulo do CIRC, o conceito de lucro tributável que se aco-
lhe em IRC assenta numa noção extensiva de rendimento (“rendimento acréscimo”), de
acordo com a denominada teoria do incremento patrimonial.
Nesta perspectiva, o n.º 2 do art.º 3.º do CIRC estabelece que o lucro consiste na diferença
(leia-se “acréscimo”, quer seja positivo ou negativo) entre os valores do património líquido
no fim e no início do período de tributação, com as correcções estabelecidas no Código.
Além disso, o n.º 1 do art.º 17.º do CIRC aprofunda aquele conceito de lucro e determina
que o lucro tributável é constituído pela soma algébrica do resultado líquido do exercício e
das variações patrimoniais positivas (art.º 21.º do CIRC) e negativas (art.º 24.º do CIRC)
verificadas no mesmo período e não reflectidas naquele resultado, determinadas com base
na contabilidade e eventualmente corrigidas nos termos do CIRC.
Por outro lado, a alínea a) do n.º 3 do art.º 17.º do CIRC estabelece que a contabilidade de-
verá estar organizada de acordo com a normalização contabilística e outras disposições
legais em vigor para o respectivo sector de actividade, sem prejuízo da observância das
disposições previstas no CIRC.
b) O incremento patrimonial é medido pela variação (positiva ou negativa) dos capitais pró-
prios (situação líquida) da empresa;
c) Os art.os 21.º e 24.º enumeram grande parte das variações patrimoniais não reflectidas no
resultado líquido (aumentos e diminuições as contas da classe 5 do POC). Assim, por força
desses articulados, tais variações não são incluídas no lucro tributável (não inscritas nas
linhas 2 e 3 do quadro 17 da DR22), pois constituem excepções aí previstas45.
Com efeito, a alínea b) do art.º 21.º do CIRC estabelece que as mais-valias potenciais ou
latentes, ainda que expressas na contabilidade, incluindo as reservas de reavaliação legal-
mente autorizadas46, não concorrem para o apuramento do lucro tributável, pois só há lugar
45
Sobre este assunto vide estudos publicados no nosso livro (p. 49-73, 273-288).
46
Por Despacho de 21/12/89 – Proc.º 1794/89, foi entendido que neste clausulado também se incluem as reava-
liações do activo imobilizado não enquadráveis em diploma legal (as denominadas reavaliações livres ou ex-
traordinárias).
Autor: Joaquim Fernando da Cunha Guimarães
A tributação das pessoas colectivas com base no lucro não é uma questão pacífica, falando-
se hoje noutras formas de tributação que estão a ser equacionadas nomeadamente no âm-
bito da harmonização da tributação directa da UE.
Porém, o n.º 3 do art.º 7.º da referida Lei n.º 71/93, de 26 de Novembro, veio estabelecer um
novo regime de tributação das mais-valias fiscais, dado que se passou de um regime de
“não tributação” (ou “exclusão de tributação”) para um regime de “diferimento de tributação”.
47
A tributação com base nos fluxos de caixa conceitualmente é baseada no consumo, mas é neutral em relação
à formação do capital.
48
Se for positivo denomina-se “lucro tributável”, se for negativo é ”prejuízo para efeitos fiscais”, cf. DR22.
49
Cf. nosso livro p. 398. De notar que este quadro não aborda as situações previstas na Circular da DGCI N.º
10/94 de 14 de Março (regime transitório de um para outro regime).
Autor: Joaquim Fernando da Cunha Guimarães
3. Saldo (–) MVF e mvf (MVF < mvf) ∆– no campo 230 Idem
4. Saldo (+) MVF e mvf (MVF > mvf)
4.2 Há reinvestimento
- Ano N (ano da venda do bem ∆+ no campo 218 da ∆+ no campo 218 da
antigo) MVFNA MVFNA
e
∆+ no campo 207 da
MVFA x Taxa do novo
bem
Queremos com isto dizer que a decisão do órgão gestionário de vender (ou qualquer outra
das situações relativas ao valor de realização) determinado bem dependerá, não raras
vezes, da identificação desse valor de realização e ou da opção ou não pelo seu reinvesti-
mento.
Leonor Fernandes Ferreira (1996: 26-7) sublinha que a opção pelo reinvestimento dos valo-
res de realização constitui um dos factores em que a Fiscalidade intervém na aplicação das
poupanças das empresas.
Autor: Joaquim Fernando da Cunha Guimarães
Contudo, às vezes, na prática, o “justo valor” é aquele que “dá mais jeito” ao comprador e ao
vendedor e não o correspondente ao valor de mercado. Neste caso, há também uma influ-
ência sobre a Fiscalidade, pois influenciará obviamente o cálculo das mais-valias.
O reinvestimento é, sem dúvida, o parâmetro que maior influência tem sobre o efeito fiscal
das mais-valias realizadas.
Na verdade, uma empresa poderá, por exemplo, vender um determinado bem com a inten-
ção de adquirir um outro (de substituição ou não), mas poderá não optar pelo benefício fiscal
inerente àquele articulado. Esta opção origina a tributação da mais-valia fiscal no exercício
da alienação (acréscimo ao lucro tributável), em vez da tributação diferida.
Tal decisão é influenciada por diversos factores, alguns dos quais já salientámos no nosso
estudo a que nos temos vindo a referir, nomeadamente:
- a mais-valia fiscal não associada (MVFna), que será tributada no exercício em que se alie-
nou o bem antigo.
b) Opção pelo RT, originando que a mais-valia realizada seja também totalmente associada
ao valor do novo bem e, consequentemente, tributada diferidamente ao longo da vida útil do
novo bem ou até à sua realização.
50
Tradução do Inglês “fair value”. O conceito de “justo valor” está expresso na Directriz Contabilística n.º 13 da
seguinte forma: “Justo valor é a quantia pela qual um bem (ou serviço) poderia ser trocado, entre um compra-
dor conhecedor e interessado e um vendedor nas mesmas condições, numa transacção ao seu alcance”. So-
bre a designação “justo valor” destacamos a posição de Carqueja (1995: 70), que refere: “Os auditores já há
muito fizeram corresponder aos termos «fair value» os de valor adequado ou valor apropriado e, que eu saiba,
nunca consideramos como alternativa de tradução os termos «valor justo»”.
Autor: Joaquim Fernando da Cunha Guimarães
O art.º 44.º do CIRC não estabelece qualquer regra quanto à escolha dos bens em que se
deve concretizar o reinvestimento, pelo que os bens novos poderão ser diferentes dos bens
antigos.
Na maioria dos casos, poderá dizer-se que ao órgão de gestão interessará um diferimento
da tributação o mais alargado possível, pelo que a opção pelo reinvestimento deverá ser
orientada para os bens de maior duração, i.e., bens com maior utilidade esperada.
Deste modo, admitindo que a empresa utiliza as taxas máximas de amortização das tabelas
fixadas pelo Decreto Regulamentar n.º 2/90, de 12 de Janeiro, o reinvestimento numa viatu-
ra ligeira de passageiros (taxa de 25%) originará um diferimento da tributação da mais-valia
realizada por 4 anos, ao passo que o reinvestimento num edifício industrial (taxa de 5%)
provocará esse diferimento por 20 anos.
Por outro lado, se a empresa associar essa mais-valia à aquisição de um terreno, a mais-
valia não será tributada enquanto o terreno não for vendido, ou seja, o diferimento da tribu-
tação da mais-valia é reportado para a altura em que o terreno for alienado.
Daqui resulta inequívoco que a escolha (opção) do bem em que se concretiza o reinvesti-
mento é fundamental para um melhor aproveitamento do benefício fiscal do art.º 44.º do
IRC.
De salientar ainda que o já referido art.º 8.º do Dec. Lei n.º 31/98, de 11 de Fevereiro, que
veio permitir a reavaliação de bens reportados a 31 de Dezembro de 1997, além de manter
a obrigatoriedade, já consagrada nos dois últimos diplomas (Dec. Lei n.º 49/91, de 25 de
Janeiro e Dec. .Lei n.º 264/92, de 24 de Novembro), de reinvestimento total do valor de rea-
lização dos bens reavaliados, acrescentou que, no caso de alienações de “Investimentos em
imóveis” (classificados no POC na conta “41- Investimentos financeiros”) o reinvestimento
possa efectuar-se em bens da mesma natureza.
A Câmara dos ROC emanou a Interpretação Técnica n.º 4, de Dezembro de 1993, sob o
título “Verificação do Imposto Diferido no Reinvestimento das Mais-Valias52 nas Alienações
de Elementos do Imobilizado Corpóreo”, em que alerta os ROC para considerarem no seu
parecer (certificação legal das contas) as situações que dão lugar à contabilização do
imposto diferido quando esses efeitos forem materialmente relevantes.
51
Não tratamos aqui o caso em que o reinvestimento se concretiza em vários bens, o que originará a divisão da
tributação diferida das mais-valias realizadas por esses bens, tendo em conta a possibilidade de existência de
diversas taxas. No nosso estudo apresentámos um caso prático desta situação.
52
Quanto a nós impunha-se desde já corrigir o título desta norma, já que não são as mais-valias que são rein-
vestidas mas o valor de realização. Neste sentido, após nossa sugestão, temos conhecimento que a CROC
está a preparar uma rectificação a essa Interpretação Técnica.
53
Vide, por exemplo, nosso livro (p. 249-258) estudo sob o título “A Estimativa do IRC”.
Autor: Joaquim Fernando da Cunha Guimarães
Contabilística que apele para a contabilização dos impostos diferidos, nos termos da Norma
Internacional de Contabilidade n.º 12 (NIC 12), de Julho de 1979, sob o título “Contabiliza-
ção dos Impostos sobre os lucros”, tal interpretação é, pelo menos, de discutível aplicação54.
A referida NIC 12 faz efectivamente a distinção entre as diferenças temporais (ou temporá-
rias) e as diferenças permanentes55 que existem entre o resultado contabilístico e o resulta-
do fiscal e, efectivamente, o diferimento de tributação das mais-valias por valores de realiza-
ção reinvestidos suscita diferenças temporárias que, a serem contabilizadas, têm reflexos no
apuramento dos resultados do exercício56.
4.1 AS S.G.P.S.
Nos termos do n.º 2 do art.º 7.º do Decreto-Lei n.º 495/88, “as mais-valias e menos-valias
obtidas pelas SGPS, mediante a venda ou troca das quotas ou acções de que sejam titula-
res é aplicável o disposto no art.º 44.º do CIRC, sempre que o respectivo valor de realização
seja reinvestido, total ou parcialmente, na aquisição de outras quotas, acções ou títulos emi-
tidos pela Estado, no prazo aí fixado.”.
Considerando, contudo, que o art.º 44.º do CIRC já sofreu algumas alterações (ver Anexo
n.º 2), designadamente a inclusão dos n.os 6, 7 e 8 que, quando foi publicado aquele diploma
das SGPS, não existiam, surgem algumas dúvidas, a saber:
- Com a redacção inicial do art.º 44.º do CIRC, a interpretação do n.º 2 do art.º 7.º do Decre-
to-Lei n.º 495/98 não oferecia dúvidas, pois então o saldo positivo das mais-valias/menos-
valias realizadas não era tributado em IRC (exclusão da tributação). No fundo esse diploma
só pretendeu alargar o âmbito do n.º 1 do art.º 44.º não o restringindo somente ao imobiliza-
do corpóreo;
54
O que poderá justificar-se pelo facto de a CROC a considerar como “Interpretação”.
55
A NIC 12 consagra como métodos de contabilização dos efeitos fiscais o “método do diferimento” e o “método
da responsabilidade”. De acordo com esta norma, as diferenças temporais são as diferenças entre o lucro tri-
butável e o resultado contabilístico de um período que surgem porque o período em que algumas rubricas de
proveitos e de custos foram incluídas no lucro tributável não coincidem com o período em que elas foram in-
cluídas no resultado contabilístico. As diferenças temporais originam-se num período e revertem num ou em
mais períodos subsequentes. As diferenças permanentes são as diferenças entre o lucro tributável e o resul-
tado contabilístico de um período em que se originam no período corrente e que não revertem nos períodos
subsequentes.
56
Sem nos querermos alongar nesta questão, poderíamos, de certa forma, deduzir que a Directriz Contabilística
n.º 18, ao hierarquizar a aplicação das normas contabilísticas, constitui também um “handicap” para a aplica-
ção da NIC 12 e respectivo tratamento dos impostos diferidos. Constatamos, porém, que no nosso país tal
prática não tem muitos exemplos de aplicação, e aqueles de que temos conhecimento resultam essencial-
mente de imposições de empresas-mãe localizadas noutros países em que tal prática contabilística é utiliza-
da.
Autor: Joaquim Fernando da Cunha Guimarães
“De facto, não se pode ignorar que nas SGPS se está perante situações de rein-
vestimento dos valores de realização de activo imobilizado financeiro e que o n.º 6
do artigo 44.º do CIRC refere expressamente que o «valor da diferença positiva
entre as mais-valias e as menos-valias não tributado nos termos do n.º 1 (do artigo
44.º) será deduzido ao custo de aquisição ou ao custo de produção dos bens do
imobilizado corpóreo em que se concretizou o reinvestimento».
Assim, parece-nos que a remissão feita no artigo 7.º do DL 495/88 para o artigo
44.º do CIRC não pode abranger o seu n.º 6, tanto mais que à data da entrada em
vigor do regime jurídico das SGPS não existia tal imposição, nem sequer o legis-
lador aquando das alterações teve tal intenção, uma vez que aí só foram contem-
plados os bens do imobilizado corpóreo.”.
Ainda nesta matéria, sublinhamos o exemplo apresentado por Pinheiro Pinto (1997) relativo
ao caso do reinvestimento realizado por uma SGPS na aquisição de acções de uma socie-
dade que mais tarde se dissolve (ver Anexo n.º 3).
Recentemente, a Lei n.º 103/97, de 13 de Setembro, que estabelece o regime fiscal das
sociedades desportivas (SD)57, no seu art.º 4.º (reinvestimento dos valores de realização)
alargou a aplicação do art.º 44.º do CIRC ao activo imobilizado incorpóreo relativo aos direi-
tos de contratação dos jogadores profissionais, desde que inscritos em competições despor-
tivas de carácter profissional ao serviço da SD.58
57
Como o próprio art.º 1.º do diploma refere, sem prejuízo do já estabelecido no art.º 24.º (regime fiscal) do
Decreto-Lei n.º 67/97, de 3 de Abril, que estabelece o regime jurídico das sociedades desportivas, bem como
o regime especial de gestão a que ficam sujeitos os clubes desportivos que não optem pela constituição das
SD.
58
Este articulado estabelece: “À diferença positiva entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante
transmissão onerosa dos elementos do activo imobilizado referidos no artigo anterior é aplicável, com as devi-
das adaptações, o disposto no artigo 44.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas,
desde que o valor da realização correspondente à totalidade desses elementos seja reinvestido na contrata-
ção de jogadores ou na aquisição de bens do activo imobilizado corpóreo afectos a fins desportivos até ao fim
do terceiro exercício seguinte ao da realização.”.
59
Com a redacção dada pelo Dec. Lei n.º 123/92, de 2 de Julho.
60
Na redacção primitiva, em vez da palavra “resultados” era referida a expressão “mais-valias ou menos-valias
realizadas”, pelo que julgamos que esta nova redacção se destinou essencialmente a contemplar também as
mais valias e as menos-valias contabilísticas.
Autor: Joaquim Fernando da Cunha Guimarães
Por outro lado, nos termos do n.º 4 do art.º 62.º do CIRC61, quando a sociedade para a qual
são transmitidos os elementos patrimoniais das sociedades fundidas ou cindidas detém uma
participação no capital destas, não concorre para a formação do lucro tributável a mais-valia
ou menos-valia eventualmente resultante da anulação dessa participação em consequência
da fusão ou cisão.
Por último, o n.º 1 do art.º 62-B do CIRC62 sobre “Regime especial aplicável às entradas de
activos” estipula que “os artigos 62.º e 62-A63 aplicam-se, com as necessárias adaptações,
às entradas de activos, desde que, verificados os requisitos nos mesmos mencionados, na
determinação ulterior das mais-valias ou menos-valias realizadas respeitantes às partes de
capital social recebidas em contrapartida da entrada de activos, estas partes de capital se-
jam consideradas pelo valor líquido contabilístico que os elementos do activo e do passivo
transferidos tinham na contabilidade da sociedade que efectua a entrada de activos”.
Neste contexto, considerando que a fusão ou cisão não implica a interrupção da actividade,
não entram no apuramento do lucro tributável das sociedades fundidas ou cindidas todos os
resultados derivados dessas operações. Na verdade, as eventuais mais-valias daí resultan-
tes, tendo em conta os condicionalismos previstos naqueles articulados, serão meramente
potenciais, daí que a sua tributação (e ou diferimento de tributação, no caso de opção pelo
reinvestimento) seja “transferida” para a nova sociedade fundida ou cindida, na qual o patri-
mónio será objecto de realização.
61
Com a redacção da Lei n.º 30-C/92, de 28 de Dezembro, que aprovou o OGE/93.
62
Aditado pelo Decreto-Lei n.º 6/93, de 9 de Janeiro.
63
Para não alongarmos a questão, referimos somente que este articulado, aditado também pelo Dec. Lei
123/92, de 2 de Julho, reporta-se às fusões e cisões de sociedades de diferentes Estados membros da União
Europeia.
64
Esta Circular revogou a n.º 4/90, devido à publicação do Dec. Lei n.º 238/91, de 2 de Julho, que transpôs para
o ordenamento jurídico português a 7.ª Directiva da UE sobre consolidação de contas.
65
Cf. item 7.3.3 da Circular n.º 15/94.
Autor: Joaquim Fernando da Cunha Guimarães
Como podemos verificar, o regime previsto neste diploma não abrange os rendimentos das
mais-valias, pelo que a estas se lhes aplica o regime geral de tributação.
A problemática fiscal das mais-valias tem sido uma das matérias objecto de tratamento
internacional, designadamente através dos designados acordos (convénios) para evitar a
dupla tributação.
66
Os n.os 2 e 3 do art.º 61.º constituem excepções a esta regra, mas a sua abordagem não é significativa para o
presente trabalho.
Autor: Joaquim Fernando da Cunha Guimarães
A dupla tributação jurídica internacional pode ser definida, em termos gerais, como a inci-
dência de impostos equiparáveis em dois Estados (ou mais) relativamente a um mesmo
contribuinte, ao mesmo facto gerador e a períodos de tempo idênticos67.
Os impostos que incidem sobre as mais-valias variam de país para país, verificando-se a
existência nomeadamente dos seguintes regimes:
- Tributação das mais-valias como rendimento normal acrescido a outras fontes de rendi-
mento (v.g. alienação de activos das empresas);
O referido art.º 13.º da Convenção não trata o problema do modelo de tributação, pelo que
cabe ao direito interno de cada Estado contratante determinar se as mais-valias devem ser
tributadas e, na afirmativa, de que modo.
A maior parte dos Estados que tributam as mais-valias fazem-no no caso de alienação de
bens e, nalguns deles, só tributam as mais-valias realizadas. Mesmo estas, nalguns casos,
não são tributadas se o produto da alienação (valor de realização) for afecto à aquisição de
novos activos.
A partir de 1 de Janeiro de 1996 entrou em vigor em Espanha uma nova lei do imposto
sobre sociedades (Lei 43/1995, de 27 de Dezembro) que substituiu a anterior no que respei-
ta à tributação dos lucros das empresas.
Por outro lado, pelo Real Decreto 573/1997, de 14 de Abril, foi aprovado o Regulamento do
Imposto sobre Sociedades e foram modificadas outras normas tributárias.
O regime actual da tributação das mais-valias em Espanha (Art.º 21.º da Lei supracitada) é
semelhante ao nosso 69, com algumas particularidades que passamos a descrever:
67
Cf. “Introdução” do “Modelo de Convenção Fiscal sobre o Rendimento e o Património da OCDE”, publicação
n.º 172 dos Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, do Centro de Estudos Fiscais da DGCI, Lisboa, 1995, p. 9.
68
Era o caso de Portugal antes da reforma fiscal de 1989, através do Código do Imposto de Mais-Valias.
69
Em Espanha, também se passou, no caso do reinvestimento do valor de realização, de um regime de “não
tributação” ou “exclusão da tributação” para um regime de “tributação diferida”.
Autor: Joaquim Fernando da Cunha Guimarães
- Imobilizado corpóreo;
- Imobilizado incorpóreo;
b) O valor de realização pode ser reinvestido dentro do prazo compreendido entre o ano
anterior à data da entrega ou posto à disposição do elemento patrimonial e os três anos se-
guintes.
- Para qualquer bem (amortizável ou não), nos períodos tributáveis concluídos nos 7 anos
seguintes ao encerramento do período tributável em que se venceu o prazo do reinvesti-
mento;
Para melhor compreendermos este regime, admitamos que uma empresa alienou em 1997
um bem que gerou uma mais-valia fiscal de 1.000 e o valor de realização foi totalmente rein-
vestido, no mesmo ano, na aquisição de um bem de 10.000 contos, amortizável à taxa de
10%.
Deste modo, a amortização anual do novo bem é de 1.000 (10.000 × 10%) e prolongar-se-á
por 10 anos (de 1997 a 2006 inclusive). Assim, o contribuinte poderá optar por:
- Incluir no lucro tributável a mais-valia fiscal de 1.000 no período de 1997 a 2006 (100 em
cada ano);
- Ou incluir no lucro tributável dos exercícios de 2001 a 2007 os mesmos 100, pois o rein-
vestimento só se venceu em 31/12/2000 (três anos após a realização).
Em termos conclusivos, podemos inferir que em Espanha, tal como em Portugal, as mais-
valias são tributadas diferidamente, com matizes pontuais, nomeadamente no que respeita
aos bens em que se pode concretizar o reinvestimento e aos prazos de diferimento.
Autor: Joaquim Fernando da Cunha Guimarães
Izquierdo Llanez (1997: 193) apresentou um quadro comparativo70, que a seguir transcre-
vemos, sobre os ganhos de capital das pessoas colectivas procedentes da transmissão de
activos fixos em alguns países da Europa:
Tributação Diferimento do
Ajuste
como imposto
País Tributação do tipo especial da
rendimento em caso de
inflação
ordinário reinvestimento
Alemanha Sim Não Não Sim
Áustria Sim Não Sim Sim
Activos possuídos durante 5
anos tributam a 19,5% e em
Bélgica Sim Não Sim
determinados casos chegam
a estar isentos
Ganhos por vendas de ac-
Dinamarca Sim ções mantidas mais de 3 Sim Não
anos estão isentas
Sim Não, com ex-
Espanha Sim Não cepção das
(parcial) PME’s
Finlândia Sim Não Não Não
Para activos possuídos du-
França Sim Não Não
rante mais de 2 anos – 18%
Sim, e, no caso
Na transmissão de imóveis
das acções,
tipos de 25 a 10% (desde 5 a
Grécia Sim Não pode chegar a
20 anos de posse). Venda
evitar a tributa-
de participações a 20%.
ção
Holanda Sim Não Não Sim
Irlanda Sim Sim ao tipo de 40% Sim Sim
Itália Sim Não Não Não
Isenção do imposto na
Luxembur-
Sim transmissão de determina- Não Sim
go
das acções
Portugal Sim Não Sim Sim
Reino Uni-
Sim Não Sim Sim
do
Suécia Sim Não Não Não
70
Dados reportados a 31/12/95, excepto Espanha que são relativos a 1 de Janeiro de 1996. Este quadro foi
elaborado pelo próprio autor a partir de “European Taxation”, International Bureau of Fiscal Documentation,
Amsterdão, 1996 e Coopers & Lybrand International Tax Network, “International Tax Sumaries”, Jhon Willey &
Sons, Nueva York, 1995.
Autor: Joaquim Fernando da Cunha Guimarães
ANEXO N.º 1
VALOR DE REALIZAÇÃO
1
Com a redacção do Decreto-Lei n.º 141/92, de 17 de Julho.
2
Com a redacção do Decreto-Lei n.º 263/92, de 24 de Novembro.
Autor: Joaquim Fernando da Cunha Guimarães
ANEXO N.º 2
ART.º 44.º
REINVESTIMENTO DOS VALORES DE REALIZAÇÃO
(Redacção Actual) *
1 - Não concorre para o lucro tributável do exercício a que respeitar, na parte que tenha
influenciado a base tributável, a diferença positiva entre as mais-valias e as menos-valias
realizadas mediante transmissão onerosa de elementos do activo imobilizado corpóreo ou
em consequência de indemnizações por sinistros ocorridos nestes elementos sempre que o
valor de realização correspondente à totalidade dos referidos elementos seja reinvestido na
aquisição, fabricação ou construção de elementos do activo imobilizado corpóreo até ao fim
do terceiro exercício seguinte ao da realização. a)
7 - A dedução a que se refere o número anterior será feita proporcionalmente à parte que no
total a reinvestir represente o valor de cada bem em que se concretizou o reinvestimento. b)
a)
Redacção pela Lei n.º 52-C/96, de 27 de Dezembro de 1996 (OE de 1997), em vigor desde 1 de Janeiro.
b)
Redacção do n.º 3 do art.º 7.º da Lei n.º 71/93, de 26 de Novembro (OE Suplementar de 1993), em vigor
desde 8/12/93.
c)
Redacção pela Lei n.º 21/97, de 21 de Janeiro de 1997.
ENUNCIADO:
Suponhamos que a Sociedade A, SGPS alienou uma participação de capital (quota ou ac-
ções), sendo fiscalmente relevantes os seguintes valores:
No prazo legalmente previsto para o efeito, o valor de realização da venda atrás referida
(500 000) é reinvestido na aquisição de acções da Sociedade K, S.A..
RESPOSTA:
Por conseguinte, o resultado da partilha não será, neste caso, de 50 000, mas antes de:
Conclui-se, pois, que a tributação do ganho apurado na partilha virá substancialmente redu-
zida em comparação com a que decorreria da tributação imediata da mais-valia inicial e
apenas virá mais agravada se existir uma parcela do rendimento imputável à dissolução que
seja qualificada como mais-valia (como acontece no cenário 2).
Autor: Joaquim Fernando da Cunha Guimarães
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do Estatuto dos Benefícios Fiscais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 215/89, de 1 de Julho.
Autor: Joaquim Fernando da Cunha Guimarães
INTERPRETAÇÃO TÉCNICA N.º 4 da Câmara dos Revisores Oficiais de Contas, sob o títu-
lo “Verificação do imposto diferido no reinvestimento das mais-valias nas alienações de ele-
mentos do imobilizado corpóreo”.
LEI N.º 103/97, de 13 de Setembro, sobre o Regime fiscal das Sociedades Desportivas.