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Hoje, quem quiser adquirir valores morais e éticos neste mundo "moderno" terá de
aprender as regras sozinho. Portanto, para não perder mais tempo, vamos começar
com a primeira lição.
Vou mostrar a importância de criar um código de ética com um exemplo real. Vou
romancear os personagens para os proteger, mas a história é verdadeira.
Um amigo de infância, o Zeca, casou-se com a garota mais linda de nossa turma.
Ela tinha uma irmã mais nova e mais bonita de 16 anos. Nosso comentário era que
ele estava casando com a irmã errada, mas estávamos todos morrendo de inveja.
Após dois anos de casado, o Zeca acabou transando com a linda cunhada e foi
prontamente descoberto pela esposa. Só falamos disso por seis meses. Ele se
desculpou dizendo: "Não sei o que passou pela minha cabeça, ela simplesmente se
entregou". Fato mais comum do que se imagina, fruto da rivalidade entre belas
irmãs.
Muitos anos depois, cada vez que encontrávamos o Zeca tentávamos disfarçar
nosso sorriso malicioso. Mesmo vinte anos se passando, toda vez que eu o
encontro, a primeira imagem que me vem à mente é: "Lá vem o Zeca, aquele que
transou com a cunhada".
Isso é totalmente injusto de minha parte, afinal seu crime não durou mais que meia
hora, e ele nunca voltou a repeti-lo. Já sofreu e pagou seu pecado, e mesmo assim,
vinte anos depois, nós ainda o estávamos condenando. Pelas leis brasileiras, ele já
teria cumprido pena e seria perdoado.
Por isso as gerações mais velhas criam uma moral e uma ética, uma religião, uma
filosofia de vida transmitida às novas gerações para que elas não façam besteiras
que possam marcá-las para o resto da vida. Transgredir a moral e a ética de sua
comunidade traz penas bem mais severas que transgredir as leis de seu país.
Ter uma religião e não seguir os preceitos que ela advoga, algo que ocorre com
freqüência, é o pior dos dois mundos: aí você não procura uma ética melhor que o
satisfaça nem segue a ética determinada por sua religião.
– O Zeca, aquele que papou a cunhada? – disse meu filho com um sorriso
malicioso.
Acho que ninguém de nossa turma tem hoje inveja do Zeca. Ele não somente
pagou o preço, mas esse preço vai ser pago agora por seus filhos, netos e talvez
bisnetos. Posso até imaginar daqui a trinta anos um comentário desses:
– Não é o neto do Zeca, aquele que foi pego na cama com a cunhada?
As conseqüências podem ser muito mais severas que as leis impostas pelo Estado,
como descobriu meu querido amigo Zeca, aquele que transou com a cunhada.
Artigo Publicado na Revista Veja, edição 1733, ano 35, nº1, 9 de Janeiro de 2002.