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- Estamos ouvindo Glória Baker. Quem viveu no final dos anos 60 conhece muito bem a voz
dessa brasileirinha que sempre esteve entre nós através do grupo "Os Desafinados".
- Aliás, gravou 3 LPs com eles.
- Exatamente isso.
- Maravilhosa.
- Glória Baker faleceu semana passada num desastre de automóvel em Basel, na Suíça.
- Alô. É ele. Opa! Tudo bom? Lembro. O que você manda? Pois é, rapaz... eu ouvi. Que
negócio terrível né? Sei... Ah, bacana. Tenho, tenho muita coisa. Tenho um monte de
gravação, um monte de imagem inédita, tudo daquele tempo.
- Eu fico esperando você me ligar então? Tá falado? ... Vai rolar! Vai rolar! Aqui, olha. Estes
que eram os caras, olha. "Os Desafinados"...
- Vou dizer pra vocês qual o grande problema da Bossa Nova na minha opinião. Eu acho que é
muita... "tardinha", "bonitinho", "barquinho", porra é muito "inho"... Entendeu porra? Tinha que
pegar essa música aí dar um waaa pra dar uma porra!
- Que "waa", Dico? Que papo é esse? Tá parecendo um papagaio falando... chega de fossa...
- Não tô falando mal da Bossa... só que uma temática socialmente um pouco mais forte não ia
fazer mal, muito pelo contrário...
- Dico, Dico, eu não sou crítico, eu sou músico, tá? Vai fazer seu filme... e me devolve o disco
que te emprestei...
- Não esquenta. Tu tá falando isso pra caralho tem 4 dias... Eu só queria dizer que a arte é
produto da nossa qualificação como sociedade. Tá me ouvindo aqui, Joaquim? A arte é produto
da nossa qualificação como sociedade...
- Dico, tá muito chato! Toma um café aí!
- Eu não quero café! Mas eu comeria alguma coisa...
- Oi, pai.
- Vai, vamos lá. Não. É um "fá".
Quero você
como as águas precisam do mar.
Sem ter você,
desespero vendo o tempo passar.
Quero o teu carinho impossível
diferente,
como tudo o que vem de você.
No infinito dos teus olhos encontrarei
a paz perdida.
Olha pra mim
e verás quanta coisa ocultei.
Foi triste sim,
de saudades mil tormentos passei.
Chega pertinho e confessa
que também sente falta de mim.
Sei que voltou pra ficar,
afinal encontrou seu lugar...
[falas em inglês]
- Parabéns. Parabéns. Parabéns... Olha, foi muito bom. Pode ficar tranquilo. Já tá tomada uma
posição. Assim que tiver o dinheiro, eu te ligo.
- Tô grávida... do Mário.
- Do Mário?! Glorinha, como é que você me faz uma coisa dessas?
- Antes com ele né... ninguém vai poder dizer que te enganei!
- Você nunca jurou amor eterno mesmo né...? Mas também não achava que era uma
coisa tão passageira... quer dizer que fiquei na mão? Corneado pelo próprio corno?
- Para com isso. Para com isso... Aproveita que você vai pra Nova York... dá uma arejada. Fica
mais moderno!
- Vou viajar pra Nova York também, mãe. Não, não precisa ficar preocupada. A Idalina tá
aqui. Daqui a pouco eu volto. Vou comprar minha câmera. Claro que é mais barato. Só com o
dinheiro que vou economizar no aluguel vou comprar minha passagem. A senhora não acha
que é uma boa economia?
- E aí?
- Não tem aí.
- Como não? O que disseram?
- Que o elenco tá completo. Pronto.
- O que? Não tinha a jogada do cara do Itamaraty? [tipo "MOFAT" na Coreia]
- Geraldo, não tem Itamaraty. Quem escolhe é o gringo!
- O gringo é o que estava mais empolgado! O cara comprou "Eu Quero Você" sem pistolão
nenhum. Quem te falou isso?
- O cônsul me mostrou a lista.
- Foda-se. Não deu, não deu. Até que é melhor, a gente tá muito cru ainda.
- Que muito cru!? Tinha gente pior! Lembra lá do sabadaga... sei lá! Deve tá lá na lista agora.
- Davi, nem fala mal tá? Eu acho que foi esse seu inglesinho de araque que fudeu a gente!
- Aí. Quer saber? Vamos pra NY na marra! Joaquim, Joaquim... é o teu momento, é o teu
momento. O gringo se amarrou na sua música.
- Na nossa música né?
- Vamos embora!
- É na meada que a gente cresce. Vou jogar minha passagem no lixo não! Ó, vou na frente, e
compro os ingressos pro Carnegie Hall. Vamo ou não vamo?
- É isso! Nova York!
- Aqui vamos nóóóóóssss!!!
- Vocês podem observar que o cavalheiro faz a curva sem sequer inclinar o corpo. Reparou na
elegância? Sistema de aquecimento interno!
- Olha os caras...
[falas em inglês]
[Música "Copacabana"]
Ah se tu soubesses
Como sou tão carinhoso
E o muito, muito que te quero.
E como é sincero o meu amor,
Eu sei que tu não fugirias mais de mim.
Vem, vem, vem, vem,
Vem sentir o calor...
- É aqui?
- É. É aqui que eu moro. Não quer subir?
- Mas já amanheceu! Nem vi passar! Eu vou indo...
- Sabe o que eu acho?
- O que?
- Que você não vai embora.
- E aí, Dico!
- E aí, parceiro!
- Bom dia.
- Bom dia. Tô indo embora. Arrumei um lugar pra ficar, com uns amigos da minha mãe. Tô
dando baixa no hotel. Cadê o Quim? Tem que ligar pro Bill.
- Que Bill?
- Bill que você tá falando é qual? Aquele que comeu o seu "chibill"?
- Fica de piada aí... Eu tô falando sério! Tem que ligar pro Bill. Não bobeia não.
- Pode deixar, eu falo com ele.
- Esse aqui é o telefone de onde eu vou ficar. Qualquer coisa vocês me ligam.
- Isso aqui é um "1" ou é um "7"?
- É um "8"!
- Puta que pariu!
- Ah, Gera! Lembrei aqui cara! Teu fender jazz bass. Tu vai encontrar ele na 48, esquina com
Times Square. Nome da loja: Sammesh.
- Se mexe?
- Se mexe você! Sammesh. Vai lá!
- Aí parceiro! Valeu!
- Me ajuda aqui. Seu vagabundo! Não acorda nunca!
- Tchau, Dico!
- Viado!
- 4 dias fora, cara! Onde é que você tava? A gente tava preocupado com você. Onde é que
você tava??
- Ah... in heaven!
- Podia ter mandado notícia do "heaven", mané!
- Ué! Comprou?? Que beleza! Geraldão de baixo elétrico!
- Resolvi a sequência do assassinato...
- É? Fala...
- Espera. Você tá indo também?
- "Também" por que?
- Porque o PC foi pra casa de uns amigos da mãe...
- Ah é? Tem nada não. Vamos todo mundo arrumar malinha, que eu arrumei um lugar pra
gente ficar!
- É? Vamo pra onde hein?
- Pra onde? Pro palácio de uma princesa...
- E a princesa sabe que a gente tá indo?
- Of course, my friend! Eu sou doido, mas não sou maluco!
- Joaquim! Deu um susto na gente!
- Ô, meu galinhão favorito! Eu tava no céu, meu amigo! Não conseguia pensar em mais nada!
Era tudo que eu precisava e não sabia!
- É muito cara-de-pau! Vem cá, me explica essa história direito! Tá muito mal contada...
- Ô Quim!
- Que coisa horrível! Cadê a loção? Tá um fedor horroroso esse banheiro!
- Dico, copião tá uma merda. Tem que mandar lavar. Aqui. Tá tudo assim. O negativo pode
estar bom. A gente pode selecionar o que tá bom e mandar pro laboratório.
- Tá, vamos fazer isso aí. Alô? É ele. Oi? Desculpa, não tô te ouvindo, repete... agora tô.
- Dico, tenho um lance aqui que pode ajudar muito a vender o especial.
- Ah é? O que é?
- O filho da Glória tá chegando no Rio! Já pensou? Isso dá um grande gancho pro jornalismo.
Se chama Tony Goldfaber.
- Goldfaber...
- Já pensou? O problema é que eu tô sem equipe pra fazer isso. Meu prazo tá apertadíssimo.
- Mas então... por que é que a gente não resolve aqui mesmo, pela minha produtora?
- Aí é que tá o "pulo do gato".
- Posso fazer uns depoimentos do pessoal dos Desafinados... pensa aí, de repente, um show
de reencontro, uma coisa assim. São todos meus amigos de infância. Eu falo com eles.
- Mas olha. Com autorização, direito de imagem e o escambau (tudo).
- Fala, Rey Charles! Tudo bom? Em terra de cego, quem tem ouvido é rei!
- Manolo! Tranquilo?
- Só assim mesmo pra vocês aparecerem...
- Ih, olha aí quem tá aí! Ih, rapaz! Como é que tá?
- Tudo bem?
- E aí negão?
- E aí?
- Tamo vendo essa coisa linda...
- Vai beber alguma coisa, senhor?
- Quero um conhaque. Na conta do Manolo esse aí.
- Traz mais um e põe na conta dele também.
- Vamos dar uma geral na conta do Manolo...
- Andei pensando esses dias. Na verdade a gente nunca se separou né? Porque ficou um
negócio forte, bonito entre a gente né?
- Coisa de viado né!
- Você também podia ter se tornado um arquiteto como eu. O cinema te engoliu e a música me
abandonou.
- Voltando aquele papo. Eu tava pensando em relembrar o nosso encontro com a Glória,
com uma conversa filmada. Fazer um filme, um DVD. Porque eu tenho todo aquele
material do tempo dos Desafinados. A gente podia pensar nisso, o que vocês acham?
- Por mim tudo bem. Você pode fazer, você tem o material.
- Tá meio "esculhambado". Tô tentando recuperar isso aí com o pessoal da televisão.
- Essa história de TV sempre rola um grana danada, mas estão sempre fudendo a gente com a
história do cachê né?
- A gente pode fazer isso aqui mesmo. Posso dar um toque pro meu assistente trazer a
câmera.
- Vai nessa.
- Ah não, espera aí. O sinal aqui tá uma merda. Eu vou falar ali...
- É o mesmo. É igualzinho!
- Essa história de celular que não pega...
- Continua a mesma figurinha... Não mudou nada!
- Ó o jeitão dele, disfarçando!
- Caio, tudo bom? Escuta, pega uma câmera e se manda pra cá. Pro Manolo, porra! Não, acho
que... bom, traz 2 mil... mas tem que ser já.
- É. O tempo é cruel...
- Você tá com quantos anos, PC?
- Sei lá. Eu sou do tempo que tinha muito mais gente viva.
- Muito mais. E bota gente nisso!
- Glória... a primeira imagem que me vem na cabeça é dela abrindo a porta pra gente de blusa
vermelha... uau!
- Agora é de verdade, tô indo mesmo! Vê se aprende a tocar bateria nesse tempo que você vai
ficar aqui.
- Vê se toma um banho quando chegar lá!
- Isso. Vou tomar sim. Mas aproveita pra estudar bateria nesse tempo que você vai ficar em
Nova York. Vocês estão em Nova York, seus safadões! Nova York, porra! A gente se vê no
Brasil.
- E aí?
- Tô puto nas calças!
- Não esquenta não... isso se resolve. Vai tomar um banho... pra relaxar!
- De água gelada... eu não vou não...
- Coragem, irmão...
- O boiler quebrou!
- Vamos celebrar, não seja um otário, é dia de festa, meu aniversário. Meu aniversário!
- Eu pensava que era no sábado!
- Eu sabia que você ia esquecer!
- Eu tava com o sábado na cabeça!
- Vamos brindar!
- Saúde!
- Twenty-five!
- Tá ficando velho...
- 1/4 de século!
- Cartão do Dico.
- Lê aí!
- Amigos queridos, por onde andam vocês? Afinal saiu a grana pro meu filme. Estou
animadíssimo e ansioso pela volta de vocês. Espero estar filmando dentro de 8 semanas.
Vamos trabalhar? As coisas aqui estão fervendo, em todos os sentidos. Voltem pra casa. O
lugar de vocês é aqui.
- Vem cá. Você acha que vai ficar aqui de graça também? Pode vir ajudar!
- Ele é um safado! O negócio dele é comer!
- Ah, agora falou tudo! Sabe o que me deu vontade de comer hoje? "Rabada com agrião"...
Não aguento mais esse negócio de falafel, pretzel, chega disso... eu quero é uma caipirinha...
- Toma um vinho por enquanto! Não reclama, bebe!
- Caramba, que surpresa! Como você tá? E essa barriga, como tá? 8 meses já? Nossa! Eu aqui
já virei picolé várias vezes... Tô precisando pegar uma onda em Ipanema. Ele tá aqui, Luiza. É,
tá mais velho do que ontem. Dá um beijo no Rio por mim!
- Oi Lu, que bom te ouvir! Obrigado, meu anjo! Eu também, mas... é caro né, não dá pra ficar
telefonando. Como você tá? E a Miranda? Muita saudade de vocês. A gente se mudou do
hotel. Pra casa daquele produtor, o que comprou a música. Exatamente. Eu tô bem, sem
problemas. Não, não... diferente, por que? Mas tô com saudades. Mas daqui a pouco eu tô
aí. Toma conta dela que já tô chegando. Tá bom. Também. Tá. Fica com Deus então. Tá. Um
beijo. Tá bom. Obrigado! Beijo! Tchau!
- Algum de vocês pode me ajudar com esse tampo aqui, por favor? É só colocar pra lá.
Obrigada.
- Os meninos já ouviram falar em "Lady Godiva"? Não? Espero que não haja nenhum "Peeping
Tom" por aqui.
- Agora vocês vão ficar bem ceguinhos, e retribuir a hospitalidade da dona da casa, porque ela
precisa tomar um banho bem quente. OK?
- Ah, não dá mais não. Tá na hora de voltar. O bebê vai nascer daqui a pouco. Também tô me
sentindo culpado. Eu penso nisso o dia inteiro!
- Ah, que isso! Relaxa! Para com isso! Sabe de uma coisa? Eu queria mesmo era morar aqui!
Olha isso aqui! Um lugar que tem um lixo desses!
- Tira a mão daí! Isso é lixo!
- O lixo aqui é rico!
- É rico e sujo!
- Sujo nada. Vamos dar uma limpeza, eu forro ele, e vou dormir nele!
- Você não sabe quem sentou nisso. Vamos embora! Davi... vamos embora...
- Não, vamos levar esse sofá!
- Eu durmo no chão. Eu durmo no chão. Tá bom?
- Nesse frio, você vai dormir no chão? Esse sofá aqui tá uma beleza! Olha isso aqui!
- Oh! Aqui tem cadeira elétrica! Cadeira elétrica! Não é Niterói não!
- Que cadeira elétrica! Outro dia vi um cara levando uma TV no ombro! Pega aí. Ajuda aí! Bota
as compras aí em cima e vamos! Embora!
- A gente vai levar o sofá até em casa?
- Ah, é pertinho. Uma esquina, um quarteirão.
- Não vou fazer isso não. É muita humilhação! Dorme aí, mendigo!
- Pega aqui, Quim! Para com isso! Sofá novinho! Ô, Quim!
- Oi Glória!
- Tá acordado ainda?
- Posso entrar? Você tem outro cobertor?
- Não, não tenho não. Quer tomar alguma coisinha pra esquentar? É bom.
- Pode ser. Sem cobertor, só assim mesmo né!
- Senta aí. Vou ver o que eu tenho aqui... mmm olha que ótimo! Uma cachacinha!
- Porra, Gera! Tá molhando tudo aqui cara! Você tá apertando no lugar errado, tá vazando...
- Malandro fica só dando palpite... ajudar que é bom nada...
- Aí que beleza!
- Onde você tava?
- Fui resolver um negócio.
- Beleza!
- Mas tem notícia boa!
- Boa? Excelente!
- Fechamos com o jazz club. 3 noites! Segunda, terça e quarta!
- Aí Quim, as melhores noites lá!
- Pra mim não vai dar. Tô fora.
- Pra onde você vai?
- Marquei minha passagem pra amanhã.
- Como assim?
- Ah, não acredito!
- Tá na minha hora.
- Não não não... Quim, pelo amor de Deus! A gente tá aqui há 7 meses passando frio, fome,
problema... agora apareceu uma oportunidade pra gente tocar...
- Infelizmente a oportunidade apareceu tarde demais!
- Tá maluco?
- Eu preciso ir pô!
- Joaquim, a gente tem um projeto juntos.
- Não, Quim. Para de brincadeira. Que isso!
- Ué, cadê meu nome? O cara tirou meu nome?
- É, eu sei. Mas ele falou que vai consertar.
- Consertar? A música é minha!
- É nossa.
- Você não falou pra ele que isso é roubo?
- Ele garantiu que vai consertar. Você não fala que americano é foda? Confia!
- Quim, você só pode tá de sacanagem...
- Sacanagem nada. Minha filha vai nascer daqui a pouco e eu tô liso (sem dinheiro)!
- Eu também tô sem dinheiro, sem direitos...
- Mas eu encerrei a temporada. Desculpa. Eu preciso ir. Porra, esqueci o presenta da Miranda
na loja!
- Você tá fazendo isso por causa da Glória. Você tá puto comigo e tá querendo se vingar!
- Tá louco, Davi? Porra!
- Eu vou mesmo, brother... já volto.
- Mas eles já deram o flagrante. Acho melhor você vir dormir aqui.
- O que dá pra fazer é o consulado comprar os bilhetes de volta e evitar que eles fiquem
presos. Mas não podem mais voltar aos Estados Unidos!
- Você é como eu né? Não sabe dizer adeus...