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[AULA 1]
Neste aspecto, o jornalismo tem uma confiança tal em seu discurso que se aproxima
da ciência: define verdade, à maneira de Isaac Israeli (Século IX), como adequação
desse discurso à realidade. Não passou certamente pela cabeça de Isaac Newton, ao
enunciar a Lei da Gravitação Universal, discutir se seria ou não conveniente para a
humanidade continuar ignorando os princípios da gravidade, que sempre existiu. Da
mesma forma, seria insensato imaginar que Alan Turing destruísse os originais de sua
pesquisa sobre a máquina universal de processamento de informações, na década de
30, por antever que os computadores poderiam causar desemprego.
Pelo jornalismo passam discursos ideológicos que provêm, em maior escala, dos
setores dominantes das sociedades. O mesmo ocorre com outros mídia, como a
universidade, as escolas de ensino médio e primário, produtos artísticos e de
recreação. No entanto, a visibilidade da presença desse discurso no jornalismo é
maior, uma vez que suas mensagens são mais explícitas e se reportam a assuntos de
interesse imediato.
A cada uma das máximas de Grice corresponde uma regra da estilística tradicional.
Assim, a informação deve ser a necessária para os fins do documento e não
excedente; ser verdadeira ou, no mínimo, verossímil (admitindo-se que alguns
documentos, como algumas falas, são realmente maliciosos); ser relevante, não-
ambígua, concisa, estruturar-se segundo preceitos lógicos e com a clareza necessária
para ser compreendida pelo(s) destinatário(s).
Máximas de Grice
1. Máximas da quantidade
a. Faça sua contribuição tão informativa quanto necessário (para os
propósitos reais da troca de informações);
b. Não faça sua contribuição mais informativa do que o necessário.
2. Máximas da qualidade
Tente fazer sua contribuição verdadeira
a. Não diga o que acredita ser falso;
b. Não diga algo de que você não tem adequada evidência.
3. Máxima da relação
Seja relevante
4. Máximas da maneira
Seja claro
a. Evite a obscuridade;
b. Evite expressões vagas e ambíguas;
c. Seja breve (evite a prolixidade);
d. Seja ordenado
Ao lado de textos construídos com esses cuidados, existem outros, com estrutura
particular: os retóricos, preocupados com o convencimento. A oratória desenvolveu-se
notavelmente nas cidades gregas em que as assembléias enfeixavam todo ou quase
todo o poder. Prosperou em Roma, quer na forma de discursos políticos, dirigidos à
elite, quer como conclamação às massas (já se chamavam assim, naquele tempo),
quer como parte da decisão jurídica, em que se arbitra o que é, a partir de então,
imposto como verdadeiro.
"O discurso citado", escreve Mikhail Bakhtin (BAKHTIN,1992, pp. 144 fls), "é o discurso
no discurso, a enunciação na enunciação, mas é, ao mesmo tempo, um discurso sobre
o discurso, uma enunciação sobre a enunciação". O discurso citado "é visto pelo
falante como a enunciação de uma outra pessoa, completamente independente na
origem, dotada de construção completa e situada fora do contexto narrativo". A partir
dessa existência autônoma, o discurso de outrem "passa para o contexto narrativo,
conservando o seu conteúdo e ao menos rudimentos de sua integridade lingüística e de
sua autonomia estrutural primitivas".
Bakhtin observa que quem apreende a enunciação de outrem "não é um ser mudo,
privado de palavra, mas, ao contrário, um ser cheio de palavras interiores". No
discurso jornalístico, pelo menos em suas formas canônicas (a notícia e a reportagem),
as formas de citação usuais são o discurso direto e o indireto; outros processos, como
o discurso indireto livre (em que o narrador assume a subjetividade do indivíduo
citado) não são considerados legítimos. A única responsabilidade que o jornalista se
impõe diante de uma citação (embora não seja sempre esse o entendimento legal) é
que ela esteja conforme a essência (ou a forma, se entre aspas) do discurso citado.
Ainda assim, quem cita escolhe o que cita e, de muitas maneiras, assume posições em
face da citação.
1. Em discurso direto:
2. Em discurso indireto:
b. Marta Suplici anunciou seu voto em Mário Covas, "em caráter pessoal".
1.O Ministro da Fazenda disse, ao longo da entrevista, que a prorrogação da CPMF "é
indispensável", "mais do que necessária", "essencial" e que o aumento de 50 por cento
da alíquota "não pode ser descartado", "é provável", "está quase decidido".
A literatura - pelo menos, essa literatura - passou a ser o padrão ao qual deveriam
conformar-se os discursos institucionais. É por esse tempo que nasce o jornalismo,
caracterizado, inicialmente, como publicismo e com a tarefa histórica de confrontar a
aristocracia a serviço da ideologia burguesa. Os grandes jornalistas do Século XVIII
foram escritores, nem sempre brilhantes, e críticos do poder aristocrático;
consideravam-se e eram considerados portadores da verdade iluminista. O jornalismo
era, ao mesmo tempo, retórico e literário.
Foi na América que o sensacionalismo atingiu sua máxima ampliação. Tratava-se, aí,
de integrar recém-chegados de várias procedências, muitos deles mal dominando o
inglês. O modelo capitalista conduziu à concentração da indústria da informação,
produzindo distorções tais que um dos magnatas da imprensa da época, Hearst, foi
acusado de ter promovido a guerra contra a Espanha pelo domínio sobre Cuba em
troca de privilégios de cobertura jornalística.
Na verdade, esse estilo que valoriza a objetividade não alcança por igual todos os
gêneros do jornalismo. Magazines, por exemplo, continuam inserindo mais adjetivos e
advérbios do que seria canonicamente desejável; o estilo Time combina um
vocabulário básico restrito com vocábulos técnicos, palavras de gíria e adjetivação
erudita. Editoriais e artigos aproximam-se mais da retórica clássica; seções
especializadas assumem freqüentemente discursos intimistas ou excessivamente
técnicos; a crônica e a crítica são gêneros que se aproximam da literatura.
Os poucos escritores dessa época lidos ainda hoje eram acusados por seus
contemporâneos de praticar um estilo pobre e vulgar. É o caso de Lima Barreto, de
Monteiro Lobato e de Oswald de Andrade (este, desde muito antes de se tornar
conhecido, com a Semana de Arte Moderna de 1922).
Terá sentido, dentro desse contexto, estudar uma forma de língua escrita, que no
sentido clássico se chamaria de "culta" e, ainda mais, não literária? Há duas respostas
possíveis. Uma refere-se a questões essencialmente técnicas - facilidades operacionais
que o estudo da língua escrita simplificada em que os jornalistas se expressam oferece
para uma compreensão formal documentada do idioma. Esmiuçaremos isso na próxima
aula.
Outra resposta tem que ver com um raciocínio de outra natureza. Ele nos remete a um
anúncio de banco que a televisão veicula; nele, um ator declara que seu apoio à
globalização e comenta: "um só mundo, falando a mesma língua". Como aconteceu
sobre o Império romano, o inglês, novo latim, tende a ser língua universal e, assim
sendo, substituir os idiomas nacionais como língua de cultura.
Dentre as línguas nacionais, o português é uma das mais vulneráveis: é falado por um
grupo de países pobres, está sendo varrido da Ásia e, no entanto, materializa uma bela
tradição cultural. A sobrevivência da língua, em sua forma escrita e "culta", relaciona-
se com a sobrevivência do estado nacional, dentro do qual construímos nossa
identidade, validamos nossos poucos direitos civis, as habilitações profissionais e
acadêmicas.
Preservar o português em suas formas escritas é, assim, como observa o Prêmio Nobel
de Literatura José Saramago, uma atitude política de sentido, a essa altura,
fortemente contestador.
[Aula 2]
O efeito da reforma do Jornal do Brasil foi notável, não tanto pelo aumento da tiragem
(que se elevou bastante, mas não a ponto de torná-lo o líder em vendas na cidade),
mas, principalmente, pelo prestígio que o jornal assumiu como porta-voz das
aspirações da nova classe média que ocupava postos de decisão nas empresas estatais
e multinacionais. Como conseqüência, a reação dos concorrentes foi intensa.
A maneira encontrada pelo Jornal do Brasil para modificar, do dia para a noite, o estilo
de todo texto do jornal foi a institucionalização de um procedimento já adotado no
Diário, de maneira informal: reescrever as matérias, ampliando as atribuições do copy
desk, seção da redação existente na imprensa americana com a incumbência de
revisar originais. Foi exatamente contra o copy desk do JB que se concentrou a
campanha movida tanto por jornais do Rio de Janeiro, principalmente O Globo, quanto,
em caráter preventivo, pelos de São Paulo.
A razão principal é que o copy desk era um corpo de profissionais com visão técnica do
jornalismo, excluído do sistema de injunções que tradicionalmente se instituíra na
imprensa. Naquela época, as empresas jornalísticas, com raras exceções,
remuneravam oficialmente todos os redatores e repórteres com o salário mínimo
permitido por lei. Muitos eram funcionários públicos ou de empresas prestadoras de
serviços públicos; para esses, o jornalismo era um segundo emprego, relacionado com
o primeiro - no jornal, defendiam os interesses do principal empregador. Para outros, o
próprio dono do jornal conseguia, com seu prestigio, a inclusão em folhas de
pagamento de repartições do governo. Nos casos (como os dos jovens redatores) em
que havia necessidade de pagar além do mínimo, o dinheiro saía por fora, isto é, sem
o recolhimento de encargos previdenciários, sem a obrigação de remunerar as férias e
indenizar por ocasião da dispensa.
1-
a - Passaram todos.
b - *Have passed (they) all
c - *Ont passé ( ils) tous
2-
a - Chove.
b - *Raine
c - *Pleut
3-
a - Sevódnia utrom vam zvoníl Sómov (russo)
Hoje de manhã para vocês telefonou Somov
4-
a - Chonaic Seán an madra (irlandês)
Viu João o cachorro
D - Note-se que a descrição gramatical, no caso dessas duas gramáticas, parte dos
conceitos de sujeito e predicado em Aristóteles. Este sustentava o ponto de vista de
Parmênides, sobre a unidade do ser, para o qual as sentenças apenas podiam predicar
estados. No entanto, na visão dialética de Heráclito, a primazia não pertence ao
sujeito, mas aos estados, já que não há dois sujeitos iguais em estados ou tempos
distintos: "não se pode tomar banho duas vezes na mesma água de um rio". O mundo
é dado em fluxo e, portanto, todos os seres estão também em fluxo.
E - Observe-se que a precedência é dada à função, não ao argumento, seja ele sujeito
ou objeto do verbo. Esse modelo funcional domina praticamente todas as gramáticas
contemporâneas, desde a semântica de Montague e as representações da lingüística
computacional até o gerativismo de Chomsky a partir da Teoria dos Princípios e
Parâmetros(onde os argumentos são chamados de externo, o sujeito, e internos, os
objetos), embora possa conviver, aí, mesmo no minimalismo, com a precedência
atribuída ao sujeito nas sentenças nas primeiras versões da Teoria Gerativa.
O corte é feito na artéria femural, a principal da coxa, quatro dedos acima do joelho...
e não:
O corte é feito, seis centímetros acima da borda da rótula, na artéria femural, ramo
primário da aorta descedente que se nomeia como artéria ilíaca até o ponto em que,
ao sair da região ínguino-crural, assume esse nome ...
1. a teoria geral por detrás dessas escolhas é de que a precisão é sempre relativa,
dependendo do contexto da enunciação. Se um político sofre de câncer, isto basta
numa notícia destinada ao público em geral, mas não bastará certamente a seu médico
assistente, que precisará averiguar a natureza, tamanho e localização do tumor, no
mínimo. A informação de que uma nave experimental é movida a jatos de partículas
subatômicas ou íons é adequada e bastante para um público com formação básica
escolar completa, mas nitidamente insuficiente para umfísico, que gostaria de dispor
de detalhes sobre o funcionamento desse motor iônico; a mesma informação é, por
outro lado, inacessível a pessoas sem formação básica completa ou que não prestaram
a atenção merecida às aulas de ciências - daí o bom senso de se acrescentar no jornal
uma explicação suplementar tal como "este é um tipo de motor que só existia em
filmes de ficção e histórias em quadrinhos".
1. de maneira paralela ao que ocorre quanto aos itens léxicos, utilizam-se as formas
sancionadas no registro formal e aceitas no registro coloquial da linguagem.
Construções em desuso, como as mesóclises, são definitivamente suprimidas; há forte
tendência em favor da próclise em lugar da ênclise, por ser este o uso coloquial
corrente no Brasil; pela mesma razão, é mais comum a forma analítica do que a
sintética do pretérito mais que perfeito etc.
4. os períodos costumam ser mais curtos do que no uso formal. Períodos muito longos
(com mais de 20 palavras, em média, dependendo, naturalmente, do grau de coesão)
são de leitura difícil e seletiva quanto ao nível cultural do leitor. A brevidade é
evidentemente maior nos enunciados destinados a serem lidos, no rádio ou televisão, e
nos que se destinam à veiculação noticiosa pela Internet.
5. As sentenças são construídas, quase sempre, na terceira pessoa, com exceção das
citações em discurso direto. Os tempos preferenciais, nas notícias, são o passado
perfeito, o futuro e o presente pelo futuro, reservando-se o presente concomitante ou
freqüentativo para as interpretações e as formas imperfeitas para descrições que
caracterizam os actantes - personagens e entidades em geral que interferem no
enunciado. O subjuntivo é de uso restrito e há nítida preferência pelo infinitivo
impessoal.
[Aula 3]
É evidente que, do ponto de vista lógico, uma coisa só pode ser idêntica a si mesma e,
como todas as coisas existentes estão situadas no espaço e em fluxo no tempo, essa
identidade só subsiste no mesmo espaço e no mesmo tempo. Um afresco medieval no
teto de uma igreja é distinto da imagem do mesmo afresco medieval na tela do
computador ou na gravura exposta em um museu, por mais exata que seja a
reprodução. Não havendo como separar a percepção de um objeto das relações que o
cercam, nem de igualar a representação desse objeto por observadores inseridos em
circunstâncias diferentes, cada fruição do objeto, em espaço e tempo distintos, é uma
experiência única.
Dois produtos industriais de uma linha de montagem não são logicamente idênticos: se
fossem, submetidos às mesmas condições, se deteriorariam de modo exatamente igual
e no mesmo instante, o que não acontece. A própria idéia de semelhança recobre
critérios distintos: duas coisas podem ser semelhantes porque se parecem na forma
(como as pérolas), porque têm desempenho similar (como os computadores) ou
porque despertam os mesmos sentimentos (como as feras). A definição de categorias
depende da pragmática da relação: a denominação pinheiro, em português, recobre
vários tipos diferentes de árvores em russo; a cultura aimara reconhecia dezenas de
sementes distintas para o que chamamos de amendoim.
É a gestão do modelo que vai definir sua amplitude, isto é, o conjunto de coisas a que
ele se aplica. Modelos mentais representam objetos e relações, a que vão
corresponder, nas proposições, argumentos (nomes) e funções (verbos, adjetivos,
advérbios); estruturam-se conforme os estados de coisas do mundo mas, por terem
estrutura dimensional, podem ser manipulados mais livremente do que as
representações proposicionais, aprisionadas a regras sintáticas.
Ao atualizar um modelo, remeto a primitivos conceituais que devem ser inatos - por
exemplo, a noção de fluxo. Suponhamos que tenho o modelo mental de "avião" como
algo estrutural equivalente a "artefato + que voa". Se ouço dizerem "o avião que
passa", atualizo o modelo no tempo-espaço (seria diferente a dimensão espaço-
temporal se dissesse "a nave interplanetária"). Mas se me reporto ao "avião em que
viajo", atualizo o modelo para "eu-dentro-avião"; naturalmente, o modelo será
diferente se sei como é um avião por dentro ou não, se já viajei ou não em avião. No
entanto, se imagino "o avião que piloto", atualizo o modelo "eu-dentro-avião" para
"eu-comando-avião", com o grau de discernimento de que disponha sobre a tarefa da
pilotagem.
A questão da intensão tem que ver com o princípio de Leibnitz (Eadem sunt quorum
unum potest substitui alteri salva veritate), segundo o qual, se duas coisas são a
mesma, então uma pode substituir a outra sem afetar o valor de verdade. Isso não
ocorre em contextos proposicionais, ditos opacos. Num exemplo clássico,
(iii) Electra sabe que Orestes é seu irmão, mas não sabe que o homem diante dela é
Orestes.
( iv) Não há, pois, do ponto de vista de Electra, como substituir "um homem", na
sentença ( i), por "Orestes".
Sendo variável do discurso, a designação genérica pode sempre ser especificada por
uma atribuição. Se tenho a designação genérica árvore, ao acrescentar o atributo
florida, restrinjo o sentido; se acrescento do meu jardim, restrinjo ainda mais e, por aí,
posso especificar a denominação de modo que ela termine se aplicando a uma só
entidade e se torne, então, nome próprio, o da única árvore florida do meu jardim. O
mecanismo, aí, é o de interseção de conjuntos conceituais, isto é, das coleções de
objetos a que se reportam funcionalmente os nomes: o conjunto das entidades que
são árvores, primeiro, porque árvore é o núcleo semântico da locução: depois, dentre
as árvores, as floridas e, dentre essas, a (as) que está (estão) no meu jardim.
Nomeado os conjuntos pelas iniciais maiúsculas:
x = AÇ FÇ J
Numa gramática categórica, a representação para nome genérico é t/e. Nesse tipo de
álgebra, o denominador indica com que elemento o nome genérico deve combinar-se e
o numerador o resultado da combinação: nomes genéricos devem combinar-se com
um nome próprio para formar uma predicação completa. Assim:
2.
e - Maria (entidade)
t/e - jornalista (nome genérico)
t - A Jornalista Maria; Maria, jornalista; ou Maria é jornalista. (predicação completa)
Note-se que t/e não é mais específico do que e, porque este, por definição, é o nome
próprio da entidade nomeada; no entanto, permite acrescentar um predicado a e,
gerando a proposição predicativa t.
O verbo ser (é) afirma a relação entre e e t, transformando uma locução (a Jornalista
Maria, ou Maria, jornalista) em sentença, à qual agrega as noções de tempo, modo e
aspecto (Maria foi/era/ tem sido/pode ser... jornalista). A partir de Alfred Tarski
(TARSKI, 1974), considera-se que uma sentença tem valor de verdade (é verdadeira
ou falsa), enquanto uma locução pode designar uma entidade ou conjunto de
entidades, mas não tem valor de verdade, isto é, não pode ser dita verdadeira ou
falsa.
A palavra "o/a", antes de um nome genérico, pode atuar como o operador lógico iota (i
), individualizando a entidade (como quando digo "o jornalista apurou a notícia",
referindo-me a determinado jornalista e a determinada notícia) ou particularizar a
categoria designada pelo nome genérico em relação a qualquer outra (como quando
digo "o jornalista é um questionador", querendo dizer que todo/qualquer jornalista é
questionador, ou que ser questionador é predicado da categoria/conjunto/espécie dos
jornalistas). Em determinados contextos, diferencia a relação equativa da relação
predicativa:
Em (4 a), João da Mata é o único guia da expedição ao Alto Purus e, portanto, guia da
expedição ao Alto Purus é designação própria de João da Mata; em (4 b) e (4 c), não
se afirma essa unicidade e, portanto, guia da expedição ao Alto Purus é apenas um
nome genérico predicado a João da Mata.
III - Nomes relacionais - Entidades não são designadas apenas por nomes próprios ou
nomes genéricos, isto é, pelas categorias a que se afirma pertencerem. Podem ser
designados também a partir de relações que mantêm com outras entidades não
consideradas similares. Por exemplo, irmão (de Pedro), causador (da briga), vencedor
(da corrida). Nomes relacionais correspondem a predicações, designando a entidade a
partir de funções (ser irmão de x, causar y, vencer z).
Essas designações, que Luria chama de genitivas (LURIA, 1987) e os nomes genéricos
diferem
a. do ponto de vista semântico, porque nomes genéricos reportam-se a conjuntos de
entidades (árvores, carros, pessoas, mares, rios, aviões etc.), enquanto nomes
relacionais (irmão, marido, causador, matador, vítima etc.), não se reportam a
qualquer entidade salvo quando acompanhados da designação da entidade com que se
estabelece a relação (irmão, marido, matador de alguém; causador de algo; vítima de
alguém ou de algo);
b.do ponto de vista sintático, porque, quando um nome genérico é acompanhado de
um atributo, pode-se afirmar a relação predicativa (4 a-b-c); isso não ocorre em um
nome relacional, exatamente porque ele já expressa, em si, uma relação (5 a-b-c).
Pode-se, no entanto, predicar a relação à entidade (6 a-b-c):
Nomes relacionais rotulam não apenas entidades que mantém relações com outras,
isto é, argumentos de funções, mas as próprias funções, constituindo, portanto,
elementos de uma lógica de segunda ordem, isto é, uma lógica que permite predicar
funções. Assim, consideremos funções e designações relacionais a elas referidas:
8 - a - Carlos viajou de Londres a Paris, semana passada, pelo túnel sob o Canal da
Mancha.
b - A viagem de Carlos, de Londres a Paris, semana passada, pelo túnel sob o Canal da
Mancha, foi uma aventura fascinante.
10 -
a - X matou Y, no tempo t, no lugar l, com a arma A, pelo motivo M.
b - O assassino ....
c - A vítima ...
d - O crime ...
e - A causa ...
f - A arma...
Na série (10 a-f), os parágrafos indicados por (10 b-f) estão integrados ao lead pelo
instrumento de coesão que são as nomeações relacionais. De forma menos
esquemática (variando a ordenação, intercalando outras informações etc.), este é o
molde básico de notícias produzidas industrialmente.
Acontece, aí, que é exatamente a denominação relacional que permite estruturar como
exposição, isto é, como ordenação lógica (no caso, situando o todo no primeiro
parágrafo lógico e as partes, uma a uma, nos parágrafos subsequentes) um evento
seqüencial. Não precisamos explicitar tudo que sabemos sobre o assassino para depois
falar de tudo que sabemos sobre o crime, tudo sobre a vítima etc.
[Aula 4]
O mundo externo, percebido pelos órgãos dos sentidos, é reconstruído na mente como
realidade virtual. Essa representação se faz por modelos compostos de traços. Modelos
são, portanto, representações constituídas de conjuntos de traços que se especificam
ou particularizam a cada proposição.
Criar um cenário implica não apenas distribuir papéis temáticos mas também priorizar
algum(ns) aspecto(s) em detrimento de outros. Assim, posso considerar a construção
da casa de (1 a-c) como investimento (1-a), dimencioná-la pelo espaço que ocupa(1-
b) ou sugerir seu valor como criação artística (1-c) em distintos cenários
proposicionais, onde ela ocupa o papel temático de tema e, por hipótese, designa o
mesmo objeto:
1-
a - A casa custou quinhentos mil dólares
b - A casa ocupa oitocentos metros quadrados.
c - A casa foi projetada por Niemeier.
2-
a - O Mário morreu
b - O Mário morreu de aids
c - A aids matou o Mário
A noção de predicação tem sido aplicada ora à sentença, onde o funtor seria em geral
o verbo (discute-se este papel no caso das sentenças copulares e de sentenças sem
verbos ou small clauses, como "João considera a prova difícil" ) , ora a locuções, onde
(a) adjetivos atuariam como predicados (3-a) e (b) preposições (3-b) ou, mesmo, em
português, o artigo indefinido (3-c) atuariam como funtores, estabelecendo relações
funcionais entre dois termos. Sob certas condições, a simples justaposição de um
termo genérico a um nome próprio já é capaz de indicar a predicação (3-d):
3-
a - casa confortável - C(c) = a casa [é] confortável
b - casa de pedra - F(c, p) = casa [é] feita de pedra
c - Armstrong, um astronauta - A(a) = Armstrong [é] [um dos da categoria de ou
pertence à categoria de] astronauta
d - O Marechal Rondon - i M(r ) = [determinado] Rondon [é] [um dos da categoria de
ou pertence à categoria de] Marechal
Tomemos o caso de uma sentença que admite vários papéis temáticos, como é o caso
daquelas nucleadas por verbos de movimento, que mapeam cenários de deslocamento
no espaço-tempo:
Poderíamos admitir também que o verbo ir (foi) atribui ou admite esses papéis
temáticos, mas sua realização, em cada caso, decorreria de funtores particulares: de
para origem, para para destino, de para instrumento e em para tempo decorrido. O
uso de de com mais de uma significação funcional (ele tem mais de uma dezena) na
mesma sentença não implica ambigüidade uma vez que os argumentos internos
regidos em cada caso (Ponta Grossa e automóvel) não a admitem.
A relação funcional em de Ponta Grossa seria entre a função verbal rotulada, isto é, o
termo que designa a fórmula funcional (a ida), e um designativo de lugar (Ponta
Grossa); em para Foz do Iguaçu seria entre esse termo (ida) e um designativo de
lugar (Foz do Iguaçu); em de automóvel, seria entre o termo (ida) e um designativo
de instrumento ou meio do transporte (automóvel). Como a função verbal não está
efetivamente rotulada na sentença (onde a palavra ida não aparece), cada um dos
papéis temáticos referidos a ela teriam o caráter de elementos de uma lógica de
segundo grau (a lógica de primeiro grau não permite predicar funções como se fossem
argumentos), o que explica o entendimento tradicional desses complementos como
advérbios.
A teoria dos agentes inteligentes está vinculada à visão intuitiva que atribui atos
objetivos a atitudes, tais como crenças, vontade, esperança, medo ou desejos. Essa
abordagem, dita intencional, admite uma primeira ordem, qual seja a das atitudes
(crenças, vontades etc.), uma segunda ordem, qual seja a das atitudes motivadas por
atitudes (crenças de crenças, temor de crenças etc.), uma terceira ordem e assim por
diante. A atribuição de tais intenções a agentes não humanos pode ser acusada de
antropomórfica; no entanto, vários autores contemporâneos a defendem, na medida
em que permite a melhor compreensão da operação de um dispositivo, seja ele uma
máquina ou item de um sistema simbólico, tal qual é o lingüístico.
A questão central é que, nos contextos opacos, a verdade dos componentes não
assegura a verdade do conjunto (eles não são thruth functional), de modo que o
formalismo lógico a ser adotado terá que ser outro. Qualquer formalismo alternativo
deve dar conta de um modelo semântico (já que a Lei de Leibnitz é descumprida) e de
uma linguagem de formulação, isto é, de uma sintaxe. As abordagens existentes são
as da lógica modal, que introduz operadores modais sem função de verdade - como
necessário ou certo (N) e provável (M) - e a da metalinguagem, isto é, uma linguagem
que inclui termos ou rótulos denotando fórmulas de outra linguagem, dita linguagem-
objeto.
Quanto ao problema semântico, a solução pode vir da semântica dos mundos
possíveis, onde as crenças, conhecimento ou objetos dos agentes podem ser situados
em mundos irreais, inexistentes, admitindo-se a relação de acessibilidade entre eles. A
tese da correspondência entre esses mundos torna essa semântica atraente como
ferramenta teórica; no entanto, ela suscita alguns problemas, particularmente o da
onisciência lógica: teríamos que admitir, para aplicá-la, que os agentes raciocinam de
maneira perfeita. Assim, numa abordagem epistêmica, um agente não poderia saber
de ou crer em algo que não fosse verdadeiro.
Neste caso, os elementos que circundam o núcleo têm o papel de comentários, isto é,
podem ser suprimidos sem afetar o sentido expresso da proposição. Assim, em (5), se
Cândido Emiliano Rondon é um nome próprio, no universo da história brasileira
conhecida pela comunidade falante-ouvinte, então Marechal e índio baixinho, magro e
obstinado são comentários:
Se esses predicados são logicamente dispensáveis, no nível da sentença, por que são
mantidos no discurso, considerando a máxima de Grice segundo a qual não se deve
informar mais do que o necessário? A questão admite algumas considerações:
a.em primeiro lugar, em jornalismo e nos discursos em geral dirigidos a público
indeterminado, não se dispõe de informação confiável sobre o repertório de cada
receptor da mensagem. Assim, a presunção de que determinada expressão é um nome
próprio não pode ser universalmente assumida. Os elementos adicionais podem
funcionar como facilitadores para a localização do personagem na memória de longo
prazo, de modo que, sabendo que Cândido Emiliano Rondon foi militar e que tinha tal e
qual aspecto alguém possa mais facilmente lembrar-se da existência dele e da entrada
enciclopédica derivada, talvez, da menção em livros escolares. Ou, na hipótese de o
receptor não acessar essa informação na memória de longo prazo, ele poderá inferir
que um marechal que era índio comandou tal tropa e registrar na memória de curto
prazo (e talvez, em seguida, na de longo prazo) que Cãndido Emiliano Rondon era seu
nome;
Locuções que têm como núcleo nomes genéricos compõem, com as predicações que as
circundam, uma relação lógica incluída na Teoria dos Conjuntos. Pode-se tratar de uma
interseção de conjuntos conceituais, como, por exemplo, em 7:
7 - Os políticos do PSDB que estiveram com Pérsio Arida dizem que ele não se
preocupa muito com as denúncias.
Neste caso, colocam-se duas hipóteses. Ou se trata de (i) rótulo ou termo decorrente
de uma função proposicional que opera em um único mundo, real ou possível, ou (ii)
de rótulo ou termo que decorre de uma função de atitude proposicional, isto é, remete
à relação entre mundos (reais ou possíveis) dotados de acessibilidade um ao outro.
A hipótese (i) remete ao sistema de rotulagem que transforma em termos (a) uma
função proposicional ou (b) os argumentos da função, referidos ao papel que
desempenham na função. Por exemplo, em A matou B, os termos crime, assassino e
vítima:
Vimos o papel que esse tipo de designação desempenha na coesão da notícia em sua
forma clássica. Em jornalismo, há forte tendência de se produzirem nomes próprios ou
designações próprias a partir de relações funcionais; isto se deve a que esses nomes
devem ser freqüentemente referidos, em um mesmo texto ou em textos consecutivos,
já que os assuntos têm durabilidade no tempo; precisam ainda ser citados em
construções compactas, como os títulos. Assim, o assassinato do bancário Afrânio de
Lemos por um tenente da Aeronáutica, na Ladeira do Sacopã, em Ipanema, Rio de
Janeiro, na década de 50, ficou conhecido como o crime do Sacopã; o assassinato de
uma jovem chamada Cláudia por um jovem milionário e um cabeleireiro, na década de
70, passou a ser o caso Cláudia; a contratação de empréstimos irregulares e desvio de
verbas destinadas ao pagamento de precatórios por governadores (entre eles o de
Santa Catarina), nos anos 90, tornou-se o caso dos precatórios; e a mulher que matou
a filha do amante em um conjunto residencial do bairro da Penha, no Rio de Janeiro,
foi conhecida por muito tempo (pelo menos até seu julgamento) como fera da Penha;
um assassino de mulheres ficou conhecimento como bandido da luz vermelha, numa
citação de Carril Chessman, a quem a imprensa americana deu primeiro esse apelido;
outro criminoso em série, este de São Paulo é o maníaco do parque. Assassinos são
geralmente nomeados, e não seus crimes ou suas vítimas, porque é neles,
sobreviventes do caso, que se concentra a atenção da Polícia e da Justiça. Na tradição
jurídica americana, onde se busca designação neutra para os eventos criminais, eles
são usualmente nomeados como caso A x B, em que A é o acusador, B o réu e x se lê
versus.
Em uma locução nucleada por um termo ou rotulo que remete a função, os elementos
predicados ao núcleo têm com ele relações que derivam da função originária. Assim,
em (8 -a), do Fluminense frente ao América de Natal, por 2 a 0, no Maracanã, sábado
último, são argumentos da função (8-b), designada pelo rótulo derrota:
Tomemos o exemplo 9:
[Aula 5]
Aristóteles teorizou sobre essa situação, criando a noção de proposição completa - isto
é, daquela que consiste do sujeito, do que lhe é atribuído ou predicado e do maior
número possível de circunstâncias entre as de tempo, lugar, modo, instrumento, causa
e conseqüência. É daí que vem a síntese de Laswell - quem ou que, o quê, onde, como
(e com que), por que e para que.
Em primeiro lugar, temos que considerar que proposições desse tipo, nas
circunstâncias do jornalismo, têm como núcleo verbos de ação ou processo objetivos,
isto é, que expressam transformação evidente, deslocamentos ou enunciações; verbos
dos campos semânticos de fazer, ir e dizer, isto é, fazer de alguma forma, ir (ou vir)
de alguma forma, dizer de alguma forma. No mundo das experiências sensíveis a que
o jornalismo se reporta, não há espaço para verbos de ação subjetiva como pensar ou
imaginar: não posso afirmar como fato o que suponho que alguém estava pensando ou
imaginando; devo limitar-me ao que constatei, ao que se tornou explícito para mim,
como observador e é, por hipótese, verificável. Verbos de ação subjetiva só têm valor
de verdade (se têm) na primeira pessoa, ou então em textos ficcionais, quando a ação
é atribuída a um personagem por quem o está criando. Na eventualidade de surgir um
verbo de ação subjetiva em um texto desses (o que é raro), deverá forçosamente ser
entendido como subordinado a um verbo de enunciação: se o presidente sabe,
acredita, duvida ou espera tal coisa, é que (ou alguém disse por ele - o porta-voz da
Presidência, talvez) disse que ele sabe, acredita, duvida ou espera
A proposição completa pode ser ordenada a partir de qualquer de seus termos. Pode
começar:
a. pelo sujeito, construindo-se com verbo de ação na voz ativa - "O assaltante A matou
B...";
b. pelo objeto direto, construindo-se com verbo de processo (inacusativo, ergativo) na
voz ativa ("B morreu após ser assaltado por A...") ou verbo de ação ação na voz
passiva - "B foi morto por A...";
c. pelo objeto indireto, usando-se um verbo de antonímia recíproca - "A embaixatriz da
Dinamarca recebeu do Presidente da República a medalha..." em lugar de "O
Presidente da República deu à Embaixatriz da Dinamarca a medalha ...";
d. por uma circunstância, tornada sintagma circunstancial externo - "Com uma chave
de fenda, o assaltante matou ...";
e. por uma circunstância transformada em sentença pelo emprego de um verbo (ou
locução verbal) relacional, nominalizando-se, eventualmente, a ação principal -
"Uma chave de fenda serviu para o assaltante matar...", "A esquina mais
movimentada da cidade foi cenário do assassinato...".
As versões aderidas aos fatos no texto interpretativo, estas sim, são vulneráveis à
crítica. Da mesma forma a escolha de assuntos suscitados por um fato relevante.
Considerem a possibilidade de a clonagem de mamíferos gerar reportagens unilaterais
distintas: uma sobre os perigos da ciência e outra sobre as perspectivas abertas à
pecuária e à preservação da biodiversidade. É claro que essas reportagens apontam
para ideologias distintas e contraditórias.
3 - Esquematização do lead
Consideremos um lead em nível profundo ou conceitual. Ele é, então, uma proposição
completa, constituída de sujeito, verbo, complementos do verbo, mais as
circunstâncias de tempo, lugar, modo, instrumento, causa e conseqüência.
c. verbos de enunciação são geralmente that-verbs, isto é, verbos que exigem como
argumento proposições em discurso direto ou indireto ("P", d; dkP) ou rótulos de
citação (declarou-se a favor do projeto).
A relação causal pode ainda ser substituída por uma relação temporal ou consecutiva:
"por causa da queda do avião, 75 pessoas morreram" = "setenta e cinco pessoas
morreram quando o avião caiu"; por causa de uma semana de chuva, mil pessoas
perderam suas casas = "ao fim de uma semana de chuva, mil pessoas ficaram
desabrigadas". No caso, expressa-se a ambigüidade clássica "post hoc ergo propter
hoc" - "o que vem depois é causado por".
[Aula 6]
Pelo critério do senso comum, a língua, como as outras habilidades, seria aprendida
por imitação, a partir dos comportamentos da comunidade falante. Não exigiria muita
inteligência, já que praticamente todos os humanos são capazes de utilizá-la para
comunicar mensagens, expressar sensações ou sentimentos. Na essência, poderia ser
descrita como um dicionário a que se aplica sistema limitado de regras, formando a
infinidade de enunciados que compõem a fala ou discurso. Descrever uma língua tem
sido sempre entendido como explicitar essas regras.
Há vários pontos discutíveis nessa visão, em sua unilateralidade: culturas distintas são
capazes de comunicar-se; classes conflitantes de uma sociedade, ainda quando
conscientes desse conflito, permanecem utilizando a mesma língua; e é difícil imaginar
qual o conteúdo ideológico de mensagens como "prevê-se chuva para amanhã",
"causas externas - crimes, suicídios e acidentes - são a principal causa de morte de
jovens em São Paulo", "duzentas pessoas morreram no incêndio de um circo em
Bombaim" ou "os aeroportos de Curitiba e Confins operam esta manhã por
instrumentos".
Alguns autores não distinguem língua e discurso e consideram ambos ideológicos. Mas
surgem novos problemas: embora as ideologias possam mudar rapidamente - no
momento, por exemplo, em que o grupo dominante de uma sociedade, como
aconteceu no Brasil, abandona a bandeira do nacionalismo para aliar-se à globalização
- os acervos lingüísticos mudam lentamente. Tirando-se a mudança temporária de
formas de tratamento - de seigneur para citoignen - e algumas inovações no jargão
político - esquerda e direita (os socialistas de Babeuf sentavam-se à esquerda, no
Parlamento, e os nomes à direita), por exemplo - a Revolução Francesa pouco mudou
o francês. O mesmo aconteceu com a Revolução Russa e com o fim da União
Soviética: uma reforma ortográfica e, no mais, a substituição temporária de gospodin
(senhor) por tavarich (camarada). O número de sentidos que se alteram, em cada
caso, é limitado e as regras combinatórias não parecem sofrer alteração.
Vários desses pressupostos têm sido alterados recentemente. Pode-se supor que
alguns dentre eles, dados por óbvios, são apenas decorrência de antigas crenças. Por
exemplo, a oposição entre cultura e natureza lembra o instante mágico em que Deus
teria soprado a vida no primeiro homem; evidentemente, o ar da respiração parecia ao
autor desse conto a melhor imagem para a imaterialidade da alma
Entre os enunciados que causam estranheza - além dos regionalismos, pidgnins, falas
crioulas, caipiras e desvios desqualificadores - figuram os discursos pernósticos.
Tomemos dois deles - fi-lo porque qui-lo e estou ministro - o primeiro atribuído ao
gramático e ex-presidente Jânio Quadros, o segundo a um literato que foi Ministro da
Educação, Eduardo Portela.
Jânio deu a resposta quando lhe perguntaram porque renunciou em 1961 - e ele,
obviamente, não queria dar maiores explicações. Fi-lo porque qui-lo é estranho não
apenas por causa do múltiplo sentido de qui-lo na língua falada (também medida de
peso, redução de quilograma, e conteúdo gástrico) - mas principalmente pelo sistema
complicado de inferências exigido para sua compreensão. Jânio Quadros não se referia
a algum produto feito por ele (um bolo, por exemplo), mas ao próprio ato de fazer.
Diz-se, nesses casos, que o verbo é performativo - reporta-se a uma performance.
Fi-lo se entenderia como "fiz assim", "fiz desse jeito" ou "fiz o que fiz". Para que a
proposição tenha sentido, é necessário atribuir ao segundo verbo uma atitude
proposicional, modulando um verbo de ação (quis fazer). Mas esse entendimento ("fiz
o que fiz porque quis fazer o que fiz") só pode ser alcançado, com alto custo de
processamento, depois de se porem de lado vários padrões mais prováveis, como o de
que dois pronomes oblíquos numa seqüência de verbos devem ter o mesmo referente
(como em ame-o ou deixe-o, eu o acompanhei porque o amava etc.); não é o caso,
porque o segundo lo refere-se á totalidade da primeira parte da conjunção (fi-lo).
No entanto, em quando cheguei, o ônibus tinha sido assaltado, não tenho opção. Como
o evento chegar é instantâneo, e as duas sentenças estão unidas pela marca temporal
quando, se disser que o ônibus foi assaltado, estarei dizendo que os dois eventos - a
chegada e o assalto - foram simultâneos. O mais-que-perfeito é aí obrigatório, e sou
obrigado a produzir uma das duas variantes, com esse tempo analítico (mais coloquial)
ou sintético (atualmente caindo em desuso, no Brasil): quando cheguei, o ônibus tinha
sido assaltado ou quando cheguei, o ônibus fora assaltado.
Esses conceitos refletem concepções sobre (a) a finalidade do jornalismo, (b) seu
papel social e (c) o publico alvo.
Escritos à maneira dos discursos, com linguagem retórica, esses textos tinham
tratamento doutrinário. Ao lado do modelo clássico, aristotélico, em que se teoriza
primeiro para exemplificar depois, com os fatos, o empirismo faria nascer outra
estrutura, partindo dos fatos para a interpretação - no caso da imprensa burguesa,
inevitavelmente atribuindo todos os problemas aos controles estatais da produção, do
comércio e do fluxo de idéias.
Com a voga do romance histórico, houve um retorno à Idade Média, onde a burguesia
situava seu passado mitológico: na luta contra os impostos, na afirmação das culturas
locais, na valorização do trabalho artesanal e da "vida simples" do campo. Restos de
tradição medieval, a resistência dos místicos ao avanço da ciência e os costumes rurais
combinaram-se para ressaltar episódios fantásticos, milagrosos, degenerações e
mostruosidades.
Mas o objetivo institucional era outro: adaptar as pessoas às novas formas de viver, ao
salário e ao consumo. A maior parte dos jornais passou a desempenhar esse papel
didático: em lugar do articulista de fundo, chegaram os críticos - de teatro, de
literatura, de moda, de vida em sociedade etc. Raramente analíticos, com muito mais
certezas do que dúvidas, cuidavam de ensinar as pessoas o que era adequado assistir,
ler, vestir, aonde ir, como se comportar e que idéias ter. O mesmo objetivo
transbordava para as páginas de noticiário, onde proliferavam histórias edificantes (de
ascensão individual, de iniciativas de caridade, de feitos generosos) e as promessas
redentoras (de educação pública, de exaltação das novidades técnicas - o trem, o
telégrafo, o telefone).
O jornalismo é, assim, não apenas instrumento do poder, mas também o que o torna
visível e discutível. E é também um prestador de serviços que nos permite acompanhar
o fluxo dos negócios, as políticas de salários, as correntes culturais, o estado das
estradas, a previsão do tempo, o discurso dos cientistas, dos juristas, dos religiosos,
dos agnósticos, dos que pensam viver no futuro e dos que pretendem a volta do
passado.
Sabe-se hoje - desde que isso foi comprovado pelas pesquisas funcionalistas das
décadas de 1930 e 1940 - que a opinião pública forma-se muito mais pela troca
interpessoal de idéias do que pela influência direta dos meios de comunicação social.
Restou a acusação de que os meios de comunicação estabelecem a agenda de temas
abordados por esses grupos - as famílias, os círculos de amigos, os segmentos
profissionais. No entanto, tem sido sempre, privilégio do poder determinar os assuntos
da ordem-do-dia: isto muito antes de existirem meios de comunicação com a
amplitude dos de hoje. Atribuir o agenda setting aos meios de comunicação é uma
forma de inocentar as estruturas de poder que incluem os meios de comunicação, mas
também a máquina do Estado, a escola e a gestão das empresas.
1. Linguagens do jornalismo
O período do jornalismo educador/ sensacionalista deixou, como grande legado para a
técnica jornalística, a pesquisa sobre as formas de se tornar o texto acessível às
pessoas comuns. A modalidade escrita da língua tinha tradição elitista, porque a
alfabetização era limitada a círculos jurídicos, clericais e acadêmicos. Foi preciso um
longo caminho para se buscar a relação necessária entre o texto e a fala corrente,
considerando dois fatores contraditórios: de um lado, a alta comunicabilidade do texto
coloquial; do outro, seu caráter restritivo, familiar, tribal ou comunitário.
[Aula 7]
Argumento:
Mário da Silva
Predicados:
O diretor Mário da Silva = Mário da Silva é o diretor
O diretor Mário da Silva, que assinou a demissão = Mário da Silva é o diretor e assinou
a demissão.
O felizardo diretor Mário da Silva = Mário da Silva é diretor e é o felizardo
O diretor Mário da Silva, de Botucatu = Mário da Silva é o diretor e é de Botucatu.
O único diretor presente, Mário da Silva, = Mário da Silva é o único diretor presente.
Argumento:
Casa
Predicado:
A casa de Pedro = a casa pertencente a Pedro, a casa onde Pedro mora, a casa que
Pedro construiu, a casa que Pedro projetou.
Oposição ser/estar – (a) Ser é de uso exclusivo nas predicações consideradas pela
língua como inerentes (cargos, etapas, deverbais agentivos): é presidente, é janeiro, é
autor. (b) Estar é de uso exclusivo em predicações que indicam algo em
processamento ou eventual, como os gerúndios: está construindo, está prestes a sair,
está processando, está com dinheiro.. (c) Nos contextos em que ser e estar são
admissíveis, a distinção é geralmente de aspecto (estar = ser por algum tempo): está
apaixonado/é apaixonado; está rico/é rico.
Sintaxe –
1 - A natureza distinta da relação funcional tem implicações sintáticas. A primeira delas
é a impossibilidade de ser afirmar relação entre o termo relacional e seu complemento:
A aferição dos papéis temáticos (agente, paciente etc.) e dos casos regidos pelos
verbos depende, evidentemente, de outras considerações. Uma das mais óbvias é a de
que os diferentes casos atribuídos aos itens léxicos decorrem regularmente de um
processo clítico que se realiza pela adição de afixos (pondo-se à margem a tradição do
registro gráfico, preposições podem ser consideradas prefixos de locuções tanto quanto
as desinências são sufixos agregados ao radical de palavras). Nas línguas declinadas,
onde os casos aparecem de forma manifesta - isto é, em regra, sufixal - , predominam
os sufixos, com ou sem preposições; essa dupla marcação permite que uma mesma
forma - digamos, o acusativo latino - seja complemento direto do verbo e, com o
acréscimo de preposição (ad), represente, após um verbo de deslocamento, o lugar
para onde. Nas línguas não declinadas, isto é, que não evidenciam o caso pela adição
de sufixos ao radical, o sistema de preposições combina-se com outros mecanismos
(como, por exemplo, a ordenação mais ou menos rígida das palavras nas sentenças)
para estabelecer adequada discriminação de caso e papel.
A - Lógicas e pragmáticas -
- à identidade, igualdade, pertinência, analogia - igualar, equivaler a, diferir de, incluir,
conter ou locuções verbais como ser idêntico a, fazer parte de, ser igual a etc.
- à comparação - superar, destacar-se de etc.
- à valores, quantias - pesar, custar etc.
- à dimensão - ter, ocupar, medir (a estrada tem/mede dois quilômetros) etc.
- à duração - durar, demorar, prolongar-se por, levar (a viagem leva duas horas),
coincidir com etc.
- à instrumento - utilizar, empregar etc.
à posse/uso - ter, possuir (Há uma nuança semântica: enquanto ter tem coisas em
geral como objeto, possuir deve ter como complemento coisas concretas, com um
traço de relacionamento material; assim é possível possuir uma casa, mas não possuir
pensamentos); por antonímia recíproca, pertencer.
Circunstâncias discursivas
- à causalidade/conseqüência - provocar, motivar, causar, determinar etc.; por
antonímia recíproca, resultar, decorrer etc.
- finalidade - objetivar, pretender, destinar etc.
[Aula 8]
Erros Comuns
Ortográficos – menos relevantes por causa dos corretores ortográficos incluídos nos
programas de edição de texto. A exceção é o caso de palavras semelhantes, com
sentidos distintos, como
- Incipiente (iniciante)/insipiente (ignorante)
- Esperto/experto
- Obcecar (cegar, levar a erro)/obsedar (impor-se, poderar-se do espírito de alguém)
- Etnológico (estudo de etnias)/etimológico (estudo da origem das palavras) /Enológico
(relativo a vinhos)
- Orográfico (estudo de montanhas)/ holográfico/ ortográfico
De estrutura lógica – Os textos jornalísticos organizam-se segundo uma lógica
subjacente. Se narrativos, são seqüências adicionadas umas às outras e marcadas pela
sucessividade interna dos núcleos verbais. Se expositivos, pela subordinação de dados
factuais (tornados documentação) a versões (tornadas tópicos), que atuam como
organizadoras ou classificadoras das informações. Quando essas normas não são
obedecidas, os textos deixam de ser textos, no sentido de algo que se tece, e passam
a ser encadeamentos desordenados de sentenças impossíveis de se compreender.