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Rapunzel o feminino na prisão

Por Carlos São Paulo


Os nossos antepassados criavam histórias para explicar os fenômenos
da natureza. Assim, os gregos antigos personificavam acontecimentos
geofísicos como os raios, os trovões e os terremotos, na figura de
Zeus, um deus muito poderoso que governava o olimpo, lugar onde habitavam as
divindades grego-latinas. Por meio dessas imagens e desses contos, torna-se possív
el
entender a natureza humana. Similarmente, os Contos de Fadas também revelam
padrões que coordenam o comportamento, permitindo ampliar a margem da consciência
e, assim, influir de forma leve e prazerosa em decisões importantes que o destino
se nos
apresenta.
Rapunzel é um conto de fadas dos Irmãos Grimm. Por se tratar de uma história
sobre uma garota criada numa imensa torre, prisioneira de uma bruxa dita malvada
,
busquei entender a natureza feminina quando presa em um aspecto negativo do mund
o
da mãe. Ao me debruçar sobre essa narrativa para compreender esse enfoque, terei o
cuidado de não reduzir suas imagens a um mundo lógico e linear. A psique não é lógica,
ela é analógica. Não irei também explicar os acontecimentos da história, tomando o
sentido claramente expresso ou literal. Tentarei um procedimento semelhante ao q
ue
faço com os sonhos e outras produções da alma humana. Minha intenção é conseguir
que nossas conexões ocultas se revelem e, para isso, precisamos treinar nossos olh
os
para ver as imagens, nossos ouvidos para ouvi-la e o coração para envolvê-la com
paixão.
O conto começa, como todos os contos de fadas, em um lugar e um tempo
indeterminado (era uma vez e há muito tempo...), e isso é uma característica do
inconsciente. Trata-se da história de um casal que queria ter filhos e morava vizi
nho a
uma bruxa. A mulher engravida e deseja a todo custo comer os raponços que pertence
m
ao quintal alheio. O marido vai buscá-los, mas evita enfrentar a vizinha e furta o
s
raponços. É surpreendido pela dona do espaço e implora por misericórdia. Consegue a
anuência da velha, mediante uma negociação em que abre mão da filha, prometendo-lhe
entregá-la depois do seu nascimento.
Na psicologia analítica, o Ego é um complexo normal, regente da consciência,
porém bem menor do que a personalidade inteira. Na psique, outros complexos se
formam e impedem o funcionamento normal do Ego. Um dos exemplos é o complexo
materno, que como a trama da história mostra, ao ameaçar o Ego, a saída é negociar.
Caberia fazer aqui, uma aproximação analógica do cônjuge que furta com o Ego que
evita se confrontar com o complexo materno, representado na imagem da bruxa.
Os complexos são entidades autônomas dentro da psique e, por isso, se
comportam como seres independentes (Jung, 1991). A negociação é para o Ego, como
podemos entender, uma forma de acolher um desejo imediato com o prejuízo futuro da
nova vida -aí representada no bebê que ainda ia nascer. Um exemplo dessa situação
encontra-se em usuários de drogas que na busca do êxtase sacrifica a vida para deixá-l
a
aprisionada aos encantos do mundo mágico da feiticeira.
Outro aspecto interessante para se olhar nessa negociação entre a bruxa e o
homem ou entre o Ego de um homem e o seu complexo materno, é a busca do lucro
imediato em detrimento do processo criativo de uma relação entre o masculino e o
feminino. Porém a promessa de sacrifício visa a um objetivo maior -o de não deixar o
feminino morrer. A maga ficará com todo o fruto do processo.
Na história, quando Rapunzel atingiu os doze anos, a bruxa veio buscá-la e
trancou-a numa torre alta que tinha apenas um quarto no topo, e nenhum acesso po
r
escadas ou portas. A feiticeira quando queria subir à torre, pedia para Rapunzel j
ogar
suas tranças e subia por ela. Compreendo essa torre como o símbolo fálico
representativo de mãe negativa capaz de aprisionar o feminino que desabrocha em su
a
filha, dificultando-a no relacionamento com o sexo oposto. Doze anos é uma idade e
m
que a menina é despertada por Eros, um deus que os gregos representavam como uma
criança de asinhas, armado de arco e flechas. Criança porque o amor não pode ter
consciência -é inocente. Asinhas, por ser livre e fluir com facilidade. Flechas para
ferir
ao provocar o sentimento de incompletude, tão necessário para se obter a volúpia.
Um dia, o canto melódico de Rapunzel atraiu um príncipe que cavalgava no
bosque. Extasiado pela voz, foi procurar a menina até descobrir a forma como a bru
xa
conseguia subir na torre. Era por meio dos cabelos da garota. Ele então conseguiu
fazer
o mesmo e a pediu em casamento. Tomando o príncipe como a necessidade de aquele
feminino se completar, percebemos o complexo materno sendo ludibriado tal qual o
furto dos raponços lá na sua origem. O Ego, ao buscar o encontro com a sua alma,
procurou driblar o complexo, em lugar de confrontá-lo.
O meio de comunicação com Rapunzel, o feminino preso, são os seus cabelos,
ou seja, aquilo que flui da cabeça como acontece com as idéias e fantasias. As
características positivas daquele feminino são, portanto, o canto e suas tranças.
Percebemos que ambos são meios para o acesso tanto do ânimus positivo representado
na figura do príncipe, como para o complexo materno, também figurado na feiticeira.
Os métodos são os mesmos. Do que depende a escolha? Qual das duas relações será
escolhida?
Rapunzel acertou fugir com o príncipe e praticamente delatou a existência do
seu amado para a bruxa, quando comentou que o príncipe era mais leve do que ela. C
om
isso, a maldosa mulher cortou os cabelos da garota e a expulsou para viver em um
deserto. Enquanto isso, atraiu o príncipe para o alto da torre e o empurrou até os
espinhos de baixo, que o cegaram. Não adiantou o plano consciente da jovem mulher,
de unir-se ao sexo oposto, pois ainda não estava pronta para viver essa
heterossexualidade. A relação homossexual entre os femininos ainda se fazia necessária
.
Considero que sentimentos profundos por uma pessoa do mesmo sexo não são
homossexuais num sentido que implique uma fixação sexual. São sentimentos
saudáveis e enriquecedores que provêm da bissexualidade psicológica. Quando falamos
sobre o comportamento sexual de um indivíduo, temos que considerá-lo do ponto de
vista da força do ego e, particularmente, observar a freqüência e a intensidade da ânsia
que os impulsos sexuais causam no indivíduo.
A bruxa cortou os cabelos de Rapunzel, isto é, cortou os aspectos positivos de
sua alma, interrompendo as idéias e fantasias, levando-a a uma depressão. São nesses
períodos de esterilidade, improdutivos, que algo se prepara para surgir, como o
despertar das potencialidades adormecidas -foi assim na história da Bela Adormecid
a quando
a rainha recebe a notícia de que terá filhos. Nessa nossa história, podemos
concluir que o projeto da mãe negativa era o amor possessivo ( ...pensei que te isol
ei do
resto do mundo , disse a bruxa numa passagem da história).
Conta o enredo, que um dia Rapunzel, com sua bela voz, cantava linda canção
quando o príncipe que por ali passava ouviu-a e encontrou-se com ela. As lágrimas de
Rapunzel reverteram a visão do príncipe. E assim viveram felizes para sempre.
Verifiquei o quanto o ato falho da garota, em comparar a bruxa ao príncipe, foi o
erro da
consciência para permitir o exercício da Função Transcendente que se exprime por meio
de um símbolo para fazer a transição de uma atitude ou condição psicológica para uma
outra (Andrew Samuels, Bani Shorter, Fred Plaut, 1988). Foi assim que ocorreu no
conto de João e Maria quando marcaram o caminho, para voltar à pobreza, com as
migalhas de pão, e os passarinhos como um símbolo da Função Transcendente,
desmarcam o caminho neurótico de repetição.
Percebemos nessas histórias o quanto a aridez precede o momento da criação.
Na vida, torna-se necessário o recuo para podermos avançar melhor.
Bibliografia
Andrew Samuels, Bani Shorter, Fred Plaut. (1988). Dicionário Crítico de Análise
Junguiana. Rio de Janeiro: Imago.
Jung, C. G. (1991). A Dinâmica do Inconsciente. Petrópolis: Vozes.

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