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INSTITUTO POLITÉCNICO DE VIANA DO CASTELO

ESCOLA SUPERIOR DE TECNOLOGIA E GESTÃO

MESTRADO EM TURISMO, INOVAÇÃO E DESENVOLVIMENTO

MUSEUMS, ARTS AND HERITAGE STRATEGIES

GESTÃO DE PATRIMÓNIO E TURISMO

O CASO DO CENTRO HISTÓRICO DE GUIMARÃES

PAULO CALDEIRA

JANEIRO DE 2011

VIANA DO CASTELO
Paulo Caldeira | Janeiro 2011

RESUMO

Numa altura em que Guimarães se prepara para ser uma das capitais europeias da cultura em
2012 depois de em 2001 ter visto o seu Centro Histórico declarado pela UNESCO como
Património Cultural da Humanidade, o que levou a recém-criada entidade regional de turismo
do Porto e Norte de Portugal a instalar na cidade a delegação do produto turístico Touring
Cultural e Paisagístico e Património, este estudo procurou, de uma forma empírica,
percepcionar se têm sido seguidas as estratégias correctas de preservação da memória
colectiva no sentido do desenvolvimento sustentável local através do turismo. Do trabalho
realizado resulta sobretudo a recomendação de que nenhum lugar pode querer ter um rótulo se
depois não aplica o planeamento e os conceitos de gestão cultural de território de forma
correcta.

PALAVRAS-CHAVE

Património da Humanidade, Gestão Cultural, Turismo, Planeamento, Desenvolvimento


Sustentável.

2
Paulo Caldeira | Janeiro 2011

ÍNDICE

I. CAPÍTULO
APRESENTAÇÃO

1. INTRODUÇÃO
1.1 ENQUADRAMENTO
1.2 A JUSTIFICAÇÃO DO ESTUDO
1.3 A QUESTÃO: «QUE GUIMARÃES ÉS TU?»
1.4 A METODOLOGIA

II. CAPÍTULO
CONCEITOS E TEORIAS

1. PATRIMÓNIO, MUSEALIZAÇÃO E USUFRUTO TURÍSTICO


1.1 A CONVENÇÃO DA UNESCO E AS GUIDELINES
1.2 A CARTA INTERNACIONAL SOBRE TURISMO CULTURAL
1.3 A CARTA DOS ITINERÁRIOS CULTURAIS
1.4 O CONCEITO CONTEMPORÂNEO DE MUSEU
1.5 A CONVENÇÃO PARA A PROTECÇÃO DO PATRIMÓNIO ARQUITECTÓNICO DA EUROPA
2. TEORIAS CONCEPTUAIS
2.1 CIDADE, IDENTIDADE E MEMÓRIA
2.2 CIDADE E PLANEAMENTO ESTRATÉGICO
2.3 CIDADE, GESTÃO CULTURAL E CRIATIVIDADE

III. CAPÍTULO

ESTUDO DE CASO

1. O CENTRO HISTÓRICO DE GUIMARÃES


1.1 BREVE CARACTERIZAÇÃO?
1.2 O PROCESSO DE CLASSIFICAÇÃO PELA UNESCO
1.3 A VISITA SIMULADA
1.4 OS QUESTIONÁRIOS
1.5 REVISÃO DE PONTOS CRÍTICOS
2. VISITANTES E RESIDENTES

IV. CAPÍTULO
CONCLUSÕES
RECOMENDAÇÕES

BIBLIOGRAFIA

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Paulo Caldeira | Janeiro 2011

I. CAPÍTULO
APRESENTAÇÃO

1. INTRODUÇÃO
1.1 ENQUADRAMENTO

O sítio electrónico New York Times (NYT)1 considerou recentemente a cidade de Guimarães
como um do 41 lugares a visitar em 2011 no âmbito de uma lista que inclui Singapura,
Manchester, Talin. Melbourne, Antuérpia e Londres, entre outros. O crítico de destinos
turísticos Charly Wilder do NYT diz que esta é uma cidade jovem que possui uma vida
artística intensa.

O artigo começa por afirmar que uma série de acontecimentos recentes, como a sua selecção
para Capital Europeia da Cultura em 2012 e classificação com Património Cultural da
Humanidade por parte da Unesco para abordar depois a dinâmica do Centro Cultural Vila
Flor, adjectivando-o como «um centro cultural de mentalidade contemporânea que abriu em
2005 junto de um palácio do século XVIII e inclui anfiteatros, uma área de exposições,
estúdios de artistas e um moderno restaurante». No entanto, o pequeno trecho referente a
Guimarães parece carecer de alguma credibilidade 2, uma vez que termina com a referência ao
primeiro Festival Internacional de Dança Contemporânea que o centro cultural vai receber em
Março.

Entretanto, já no dia 12 de Dezembro de 2010, a Câmara Municipal de Guimarães organizou


uma curta cerimónia com centenas de velas acesas para assinalar o nono aniversário da
classificação do Centro Histórico vimaranense como Património Cultural da Humanidade por
parte da UNESCO (United Nations Educational, Scientific, and Cultural Organization), a
Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura.

Nove anos depois, autarquia trata agora de dar corpo ao que se propôs com a candidatura que
apresentou à Comissão Europeia para ser uma das Capitais Europeias da Cultura em 2012

1
Disponível em http://travel.nytimes.com/travel/guides/europe/portugal/guimaraes/overview.html
2
Tal credibilidade é colocada em causa pela experiência de 25 anos de jornalismo activo por parte do autor deste estudo por se considerar
que o artigo terá sido escrito, tal como transparece da navegação da página electrónica onde cada leitor pode contribuir com as suas
sugestões, com base em informações retiradas de outras fontes e não de uma visita in loco.

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Paulo Caldeira | Janeiro 2011

num projecto arrojado que envolve vários milhões de euros para projectos que se pretendem
ser estruturantes para o futuro com o contributo de diversas entidades e individualidades
nacionais e estrangeiras.

Isto quer dizer que, em menos de uma década, a Câmara Municipal de Guimarães assumiu o
Centro Histórico da cidade-berço não só como um património que deve ser fortemente
cuidado e preservado, mas também como uma fonte (e o pilar principal) de atracção turística e
como motor fundamental para o desenvolvimento sustentável do município neste início do
século XXI.

1.2 A JUSTIFICAÇÃO DO ESTUDO

Aquando da elaboração do caderno de candidatura a Património Cultural da Humanidade, o


próprio presidente do município, António Magalhães, não só se assumiu como o principal
responsável do dossier3 como justificou a necessidade da classificação usando como
argumento principal que «o Centro Histórico de Guimarães encerra nas suas eclécticas
edificações parte significativa da História do nosso território». E o documento faz referência à
evolução secular e temporal dos vários espaços urbanos da cidade como um contributo «para
o carácter verdadeiramente ímpar deste conjunto arquitectónico» onde pontificam os edifícios
medievais, os paços aristocráticos do século XVI e os diferentes conjuntos urbanos burgueses
do século XIX, «enquanto no século XX se assistiu à edificação de infra-estruturas
imprescindíveis às novas vivências quotidianas».

De igual modo, no dossier de candidatura4 da cidade de Guimarães a Capital Europeia da


Cultura 2012, António Magalhães cria expectativas altas ao manifestar-se convicto da
vocação e da capacidade do município para, «com os seus cidadãos e as suas instituições,
celebrar e sublinhar, em 2012, a riqueza e diversidade culturais europeias», devido ao
que classifica de tradição de intervenção cultural e aos «resultados obtidos em termos de
requalificação urbana e realização de investimentos» no Centro Histórico de Guimarães.

Por outro lado, no que ao sector turístico diz respeito, o Plano Plurianual de Investimentos 5
refere que «o estatuto de cidade fundadora da Nação Portuguesa, o reconhecimento pela
UNESCO do Centro Histórico como Património Cultural da Humanidade e a designação de
Guimarães como Capital Europeia da Cultura em 2012, proporcionam um inestimável

3
Ficha-resumo disponível em http://www.unesco.pt/cgi-bin/cultura/temas/cul_tema.php?t=14
4
Documento disponível em http://www.guimaraes2012.pt/arq/fich/Candidatura.pdf
5
Documento disponível em http://www.cm-guimaraes.pt

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prestígio, uma ímpar projecção internacional e uma oportunidade única para a afirmação
de Guimarães enquanto destino de excelência de turismo histórico-cultural». E são apontadas
entre as acções de maior destaque o programa de acção Guimarães – Capital Europeia da
Cultura 2012 com «objectivo global posicionar Guimarães como o centro regional de
excelência, de referência nacional, na fileira do Turismo Histórico-Cultural»; e a
execução do projecto «Centro Histórico de Guimarães – Património Mundial…
Experiência Excepcional», candidatado ao Programa ON.2 Eixo Valorização e
Qualificação Ambiental e Territorial. Este aspecto é, aliás, realçado na edição de Novembro
de 2010 da newsletter da Turismo PORTO E NORTE6:

Esta publicação reforça ainda uma outra questão: o facto de Guimarães ser a sede do produto
Touring Cultural e Pauisagístico e Patrimónios no âmbito da PORTO E NORTE.

Sucede porém que até à obrigatoriedade decretada pela administração central, o Município de
Guimarães sempre se assumiu como uma unidade isolada no contexto da promoção turística,
através da chamada Zona de Turismo de Guimarães, e nunca cedeu ás negociações, primeiro
para que integrasse a antiga Região de Turismo do Verde Minho7 e depois Região de Turismo
do Minho8 e na entrevista agora publicada neste meio informativo9 da PORTO E NORTE, o
presidente do município diz que a reforma institucional do turismo foi importante para a
afirmação Guimarães no contexto regional e nacional, não só porque «a escolha dos destinos
turísticos exige a estes escala», como não é fácil «promover só uma Cidade, como Guimarães,
mesmo sendo Património Cultural da Humanidade». E além de salientar que a organização de
serviços e a promoção de campanhas a cargo de uma única entidade «facilita muito», a
dispersão de meios «não era o melhor modelo», aponta como fundamental «relevar
Guimarães como uma das principais âncoras da região, o que temos conseguido».

Por outro lado, depois de salientar que «o principal produto estratégico que Guimarães tem de
promover é o Turismo Cultural e Paisagístico», o autarca vimaranense aponta que a afirmação
turística de Guimarães «terá de ser sempre feita com referência à história, ao nosso orgulho de
termos sido o Berço da Nação Portuguesa»

6
In http://issuu.com/_air/docs/newsletter_tpen_6_novembro2010
7
Esta entidade de turismo englobava praticamente todos os concelhos do distrito de Braga (á excepção de Barcelos e Esposende que
faziam parte da Região de Turismo do Alto Minho) e ainda todos os concelhos do Vale do Sousa, no distrito do Porto.
8
Esta figura esteve sempre em cima da mesa da gestão turística da região minhota mas a sede de poder de vários dos intervenientes
nunca deixou que este processo chegasse a bom porto.
9
Quando as publicações são elaboradas pelo próprio organismo, há sempre que desconfiar das afirmações produzidas.

6
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E ao referir-se «à grande referência cultural que somos» com a designação de Guimarães para
Capital Europeia da Cultura 2012 (CEC 2012), António Magalhães reconhece na entrelinhas
que é ainda necessário promover «o nosso exemplo de requalificação patrimonial» centro
histórico10 distinguido em 2001 como Património Cultural da Humanidade.

Só que o presidente da Câmara Municipal de Guimarães mostra claramente uma dispersão de


argumentos e conceitos quando refere que, além de no âmbito da CEC 2012 estar em curso a
requalificação das antigas unidades, «onde no século XIX se iniciou a instalação industrial na
cidade, situadas no centro urbano» e onde será instalado um novo campo universitário, a
cidade berço também tem para mostrar «edifícios emblemáticos recuperados» que hoje são
sede do Centro Cultural Vila Flor, do Arquivo Municipal, da Delegação do Turismo (em
pleno Centro Histórico) e do Tribunal da Relação.

Associando depois a componente paisagística da Montanha da Penha, e o Teleférico que a


serve, e o património arqueológico da Citânia de Briteiros, à «cidade moderna» com
equipamentos como Multiusos (espaço polivalente onde decorrem feiras e eventos) e o Parque
de Ciências e Tecnologia (Avepark), o autarca assume claramente que «a âncora de tudo isto
é no presente a CEC 2012, no âmbito da qual serão concretizados programas: Campurbis,
Plataforma das Artes, Casa da Memória, requalificação urbanística de todo o centro da
cidade11, Parque ambiental da Veiga de Creixomil, entre outros, que serão novos pólos
atractivos».

Acima de tudo esta entrevista à newsletter da PORTO E NORTE trata Guimarães como um
enorme destino turístico mas os dados oficiais, do barómetro encomendado pela própria
entidade regional, indicam que o principal destino é a cidade de Braga 12 e que até Viana do
Castelo consegue ultrapassar a cidade berço no conjunto das dormidas.

10
O conceito de centro histórico tem levado a várias discussões com arquitectos paisagistas e urbanistas a defender que a cidade é um
todo e o centro histórico não é o centro de nada mas a maioria consensual dos pensadores de cidades refere-se ao centro histórico como o
local onde nasceu a cidade, ou seja, o centro como ponto de partida para o desenvolvimento das polis.
11
Não se consegue perceber este conceito uma vez que o próprio edil refere ter orgulho na reabilitação do Centro Histórico, que
logicamente integra o Centro da Cidade.
12
Um recente estudo realizado pela BRANDIA CENTRAL para o Instituto de Turismo de Portugal revelou que não existe a marca PORTO E
NORTE mas antes as marca PORTO e a marca NORTE, sendo esta associada sobretudo ao Minho e, neste espaço geográfico de limites
históricos bem definidos, os destinos mais referenciados são Braga, Gerês e Viana do Castelo e a região que historicamente se designou
por Alto Minho.

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1.3 A QUESTÃO: «QUE GUIMARÃES ÉS TU?»

Em matéria de Gestão Territorial é afirmado que quer na salvaguarda dos elementos e espaços
patrimoniais fundamentais para a preservação da História, no reforço da identidade e
afectividade dos cidadãos com a sua cidade, quer na perspectiva e incremento de
acções e desafios capazes de catapultar a cidade para novos e mais qualificados
patamares de desenvolvimento e sustentabilidade, «o PLANEAMENTO
TERRITORIAL assume-se como um domínio fundamental e estruturador da política
urbana do Município, nele se plasmando um conjunto de directrizes e acções condicionadoras
do desenvolvimento do território» olhado sempre sob a perspectiva positiva do termo.

Perante este cenário que se apresentou importava verificar se Guimarães tem sabido de facto
capitalizar as duas iniciativas (Património Cultural da Humanidade e CEC 2012) que têm por
base a âncora do Centro Histórico não só em termos de atracção de visitantes mas, sobretudo,
ao nível da correcta recuperação e preservação e consequente musealização13 do espaço
urbano a partir do qual se foi desenvolvendo a polis e do restante território-cidade
envolvente14.

A questão de partida basea-se aliás no estudo de marca que foi feito no âmbito do projecto
Guimarães – Capital Europeia da Cultura 2012 até porque João Campos, o designer que
tratou de desenvolver a nova imagem da cidade berço refere nas justificações para o modelo
apresentado15 que «se por um lado estamos a falar de identidade, esta em específico deveria
ter como princípio a capacidade de reflectir a diversidade cultural e a multiplicidade de
visões, próprias de uma cultura fragmentada».

E adianta que o conceito base «procura reflectir Guimarães naquilo que é verdadeiramente
diferenciador, reconhecido nacionalmente e único na história de Portugal – o seu papel na
fundação da nação», pelo que o símbolo agrega a muralha em representação do Património da
Humanidade, o desenho da viseira de um elmo que presta homenagem à visão de D. Afonso
Henriques e a forma de um coração 16 em evocação plena do orgulho «e sentimento vivo de
pertença dos vimaranenses em relação à sua cidade».

13
Este conceito está claramente explicitado na revisão de literatura que foi feita e se reproduz mais adiante neste trabalho.
14
Este é o conceito de Itinerário Cultural como se verá mais adiante.
15
In http://xiiistudios.com/Guimaraes2012_casestudy_JCampos_xiiistudios.pdf
16
Nos últimos anos, o coração tem sido aproveitado por inúmeros designers chamados a traduzir graficamente marcas territoriais, numa
expressão repetida que começou aquando da organização do Campeonato Europeu de Futebol em Portugal em 2004.

8
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E ao realizar-se uma pesquisa prévia sobre a questão surgiu uma pequena curta-metragem em
vídeo realizada por quatro alunos no âmbito da disciplina de Teoria de Arquitectura II do 2º
Ano do curso de Arquitectura da Universidade do Minho intitulada «Sonho de Habitar
Guimarães» num documento audiovisual que revela uma percepção invulgar sobre o papel
que o arquitecto não deve desempenhar com se trata de abordar a questão do património
enquanto memória que importa preservar mantendo o seu carácter definidor que não se limita
apenas às pedras mas também aos residentes:

«Com uma pequena ideia na cabeça, o nosso grupo partiu á busca de depoimentos dados por
algumas opiniões de turistas, e num passeio a pé procurou verificar e observar alguns dos
locais que constituem Guimarães, especulando sobre movimentações e acções das suas gentes.
O que tentamos transmitir com o trabalho é a maneira como os responsáveis tentam passar aos
turistas a ideia de que é um sonho habitar Guimarães. Assim numa abstratização, criamos um
espaço que marca o centro de Guimarães, apenas separando duas realidades bem diferentes que
vivem lado a lado. O túnel representa uma montra de locais que interessa mostrar, deixando
para o lado o mostruário de locais mais degradados e sujos que são escondidos e a nosso ver, é
simbolizado por uma serie de objectos dispostos aleatoriamente criando desordem. O turista
chega a Guimarães e é encaminhado para os locais designados património e centros turísticos.
O habitante, de certa forma, ajuda o turista e guia-o a visitar estes mesmos centros. O estudante
influenciado pelo trabalho escolar ocupa um certo espaço neste meio e evidencia no seu
desenho (estratos da cidade). O "mitra", como habitante ocupa um outro espaço não apreciado
pelo publico em geral e o deslocado apenas por passagem no seu dia-a-dia vê-se metido no
meio de estas duas realidades. Assim, estas cinco personagens tipo ensaiam relações e expõem
o sonho de habitar Guimarães, criticando esta separação estratigráfica entre a fachada bonita e
apresentável do centro turístico, da fachada suja e degradável do outro centro mais escondido e
pobre». In http://www.youtube.com/watch?v=YvPDxUkIxXg&feature=related

1.4 A METODOLOGIA

O método de estudo para este trabalho parte precisamente do conceito frisado pelo autor da
nova imagem de Guimarães quando afirma que, «á semelhança de qualquer comunidade,
população ou cultura constituída por diferentes individualidades», a identidade escolhida para
a CEC 2012 é um conjunto de pequenos núcleos de sentido, «onde o todo é maior do que a

9
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soma das partes» e onde se apela à participação popular «ao facultar as ferramentas
necessárias para que cada individuo possa apropriar-se à sua maneira do símbolo»17.

Deste ponto de vista, o presente trabalho comecçou com uma revisão bibliográfica prévia que
serviu ao autor para vestir a pele de turista anónimo utilizando a observação (com registo
fotográfico e elaboração de uma grelha de avaliação). Deste modo, para melhor aferir das
percepções de um visitante a Guimarães, e mais concretamente ao Centro Histórico, foi
programada uma visita de dois dias, com uma noite reservada numa unidade hoteleira de três
estrelas com vista panorâmica para toda a cidade. A visita realizou-se entre os dias 20 e 21 de
Dezembro (uma segunda e uma terça-feira), em plena semana de férias do Natal,
propositadamente para procurar verificar qual era a afluência real de visitantes no âmbito
normal de época baixa.

No primeiro dia optou-se por fazer o reconhecimento de toda a área do centro histórico
deixando as visitas ao Paço dos Duques e ao Castelo de Guimarães para o dia seguinte, com a
preocupação de verificar qual era a vivência da cidade durante o período nocturno.

Foi elaborada uma grelha de avaliação do tipo likert (com classificação de 1 – muito mau - a 5
– muito bom) onde se anotaram os pontos de verificação préviamente estabelecidos 18 e que
foi utilizada em separado para o espaço público sob a alçada da Câmara Municipal e para o
espaço gerido pelo Instituto dos Museus e Conservação (IMC). Ao mesmo tempo foram
sendo registadas imagens que mostrassem o real estado de conservação do espaço.

Registou-se ainda uma visita anónima ao Posto de Turismo da Praça de Santiago onde se
pediu informações sobre a cidade tendo o funcionário disponibilizado (mas apenas após
insistência e a compra de um guia não oficial) um mapa, um guia oficial e uma agenda
cultural da cidade.

Posteriormente foram realizados dois questionários escritos e remetidos por via electrónica 19:
um a Vítor Marques, da Guimarães Turismo, e outro a Tom Fleming, um dos principais
impulsionadores do projecto Norte Criativo da Fundação Serralves e que esteve também na
elaboração do projecto Capital Europeia da Cultura 2012. Com estes dois questionários
procurou-se abordar não só à àrea do Turismo propriamente dita e a forma como se oferece a

17
No sítio electrónico da CEC (http://www.guimaraes2012.pt/?op=25) é possível criar um logótipo personalizado para cada visitante dessa
página da Web.
18
Ver apêndice 1
19
Ver apêndices 2 e 3

10
Paulo Caldeira | Janeiro 2011

interpretação do espaço ao visitante, mas também clarificar ideias quanto a gestão dos espaços
urbanos, pelo desenvolvimento sustentável e pelo novo paradigma das cidades criativas que
percorre transversalmente a programação da CEC 2012.

Por último, passou-se depois à pesquisa de documentos oficiais (sempre mantendo o


cruzamento dessa literatura com outras fontes), além de terem sido recolhidas imagens
antigas e visionadas reportagens e outros elementos audiovisuais disponíveis nas plataformas
web.

II. CAPÍTULO
CONCEITOS E TEORIAS

1. PATRIMÓNIO, MUSEALIZAÇÃO E USUFRUTO TURÍSTICO


1.1 A CONVENÇÃO DA UNESCO E AS GUIDELINES

A Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) adoptou
em 1972 a Convenção do Património Mundial, Cultural e Natural, que tem por objectivo
proteger os bens patrimoniais dotados de um valor universal excepcional, e quatro anos
depois são criados o Comité do Património Mundial e o Fundo do Património Mundial,
conforme determinado pelo texto da Convenção que, no seu artigo 1º considera como
património cultural:

- Os monumentos: obras arquitectónicas, de escultura ou de pintura monumentais,


elementos de estruturas de carácter arqueológico, inscrições, grutas e grupos de
elementos com valor universal excepcional do ponto de vista da história, da arte ou da
ciência;

- Os conjuntos: grupos de construções isolados ou reunidos que, em virtude da sua


arquitectura, unidade ou integração na paisagem, têm valor universal excepcional do
ponto de vista da história, da arte ou da ciência;

- Os sítios: obras do homem, ou obras conjugadas do homem e da natureza, e as


zonas, incluindo os sítios arqueológicos, com um valor universal excepcional do
ponto de vista histórico, estético, etnológico ou antropológico.

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Em 1979, foram feitas as primeiras inscrições de bens na Lista do Património Mundial tendo
Portugal depositado o instrumento de ratificação da Convenção um ano depois. Já em 1992,
foi criado o Centro do Património Mundial, um organismo autónomo do Secretariado da
UNESCO encarregado de gerir administrativamente todas as questões relacionadas com a
Convenção do Património Mundial.

As cidades inscritas na Lista do Património Mundial formaram entretanto a Organização das


Cidades Património Mundial, sediada em Montreal e que promove a reflexão e o intercâmbio
de experiências relacionadas com a gestão dos sítios classificados, e da qual fazem parte as
cidades portuguesas inscritas na Lista do Património Mundial (Angra do Heroísmo, Évora,
Porto, Sintra e Guimarães).

Conforme estipulado nas Orientações para a aplicação da Convenção do Património Mundial,


o Comité do Património Mundial é composto por 21 representantes dos Estados-parte, eleitos
para mandatos de 6 anos, e tem quatro funções essenciais:

- Identificar, com base nas propostas de inscrição apresentadas pelos Estados-parte, os


bens culturais e naturais de valor universal excepcional e inscrevê-los na Lista do
Património Mundial;

-Vigiar, em ligação com os Estados-parte, o estado de conservação dos bens inscritos


na Lista do Património Mundial;

- Decidir quais os bens, de entre os inscritos na Lista do Património Mundial, que


devem ser incluídos na "Lista do Património Mundial em Perigo";

- Determinar os meios e as condições mais apropriadas de utilização dos recursos do


Fundo do Património Mundial para ajudar, na medida do possível, os Estados-parte a
salvaguardar os seus bens de valor universal excepcional.

Regularmente, o Comité Intergovernamental para a Protecção do Património Mundial,


Cultural e Natural um guia onde constam as designadas Orientações Técnicas para a
Aplicação da Convenção do Património Mundial20 sendo a versão mais actualizada datada de
2008 e publicada em língua portuguesa em Julho de 2010.

Neste upgrade constante da Convenção da UNESCO são actualizados os conceitos


designadamente quanto aos Critérios para avaliação do valor universal excepcional e o que
20
Disponível em http://whc.unesco.org/
12
Paulo Caldeira | Janeiro 2011

anteriormente era apresentado em dois conjuntos separados passou a ser definido com base
em 10 critérios.

Como tal, os bens propostos devem (entre outros):

(i) representar uma obra-prima do génio criador humano;

(ii) ser testemunho de um intercâmbio de influências considerável, durante um dado


período ou numa determinada área cultural, sobre o desenvolvimento da arquitectura
ou da tecnologia, das artes monumentais, do planeamento urbano ou da criação de
paisagens;

(iii) constituir um testemunho único ou pelo menos excepcional de uma tradição


cultural ou de uma civilização viva ou desaparecida;

(iv) representar um exemplo excepcional de um tipo de construção ou de conjunto


arquitectónico ou tecnológico, ou de paisagem que ilustre um ou mais períodos
significativos da história humana;

(v) ser um exemplo excepcional de povoamento humano tradicional, da utilização


tradicional do território ou do mar, que seja representativo de uma cultura (ou
culturas), ou da interacção humana com o meio ambiente, especialmente quando este
último se tornou vulnerável sob o impacto de alterações irreversíveis;

(vi) estar directa ou materialmente associado a acontecimentos ou a tradições vivas,


ideias, crenças ou obras artísticas e literárias de significado universal excepcional (o
Comité considera que este critério deve de preferência ser utilizado conjuntamente
com outros);

Além disto, para ser considerado de valor universal excepcional, um bem deve também
responder às condições de integridade e/ou de autenticidade e beneficiar de um sistema de
protecção e gestão adequado para assegurar a sua salvaguarda.

Do ponto de vista da Autenticidade, o documento refere entre outros pontos que, conforme o
tipo de património cultural e o seu contexto cultural, pode-se considerar que os bens
satisfazem as condições de autenticidade se os seus valores culturais estiverem expressos de
modo verídico e credível através de uma diversidade de atributos, entre os quais:

• Forma e concepção;

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Paulo Caldeira | Janeiro 2011

• Materiais e substância;

• Uso e função;
• Tradições, técnicas e sistemas de gestão;
• Localização e enquadramento;
• Língua e outras formas de património imaterial;
• Espírito e sentimentos; e
• Outros factores intrínsecos e extrínsecos.

No que à Integridade diz respeito, a UNESCO refere que esta é uma apreciação de conjunto e
do carácter intacto do património natural e/ou cultural e dos seus atributos. Estudar as
condições de integridade exige portanto que se examine em que medida o bem:

a) Possui todos os elementos necessários para exprimir o seu valor universal


excepcional;

b) É de dimensão suficiente para permitir uma representação completa das


características e processos que transmitem a importância desse bem;

c) Sofre efeitos negativos decorrentes do desenvolvimento e/ou da falta de


manutenção.

E mais adiante refere entre os requisitos ao nível da Protecção e Gestão, não só, «que todos os
bens inscritos na Lista do Património Mundial devem ter uma protecção legislativa,
regulamentar, institucional ou tradicional adequada que garanta a sua salvaguarda a longo
prazo», como deve ser concebido «um sistema de gestão eficaz em função do tipo,
características e necessidades do bem proposto para inscrição e do seu contexto cultural e
natural». E sobre este último aspecto, além de considerar como condição essencial a
participação de todas as partes interessadas, a organização afirma que «uma gestão eficaz
deve incluir um ciclo planificado de medidas de longo prazo e quotidianas destinadas a
proteger, conservar e valorizar o bem proposto para inscrição».

E por último, a UNESCO refere-se à Utilização Sustentável do património mundial apontando


que o «Estado parte e seus parceiros devem certificar-se de que tal utilização sustentável não
tem efeito negativo sobre o valor universal excepcional, a integridade e/ou a autenticidade do
bem», sem que para certos bens, «a utilização humana não é apropriada».
14
Paulo Caldeira | Janeiro 2011

1.2 A CARTA INTERNACIONAL SOBRE TURISMO CULTURAL

Em 1999, o ICOMOS (Conselho Internacional de Monumentos e Sítios) aprovou uma Carta


alusiva à Gestão do Turismo nos sítios com Património Significativo onde se refere que o
objectivo fundamental da gestão do Património consiste em comunicar o seu significado e a
necessidade da sua conservação tanto à comunidade local como aos visitantes. Deste modo,
refere o documento, «o acesso físico, intelectual e/ou emotivo, sensato e bem gerido aos bens
do Património, assim como o acesso ao desenvolvimento cultural, constituem ao mesmo
tempo um direito e um privilégio». E o ICOMOS estabelece seis princípios:

 Princípio 1
Uma vez que o turismo se transformou num dos veículos mais importantes para o
intercâmbio cultural a conservação dos espaços patrimoniais deve
proporcionar oportunidades responsáveis e bem geridas, não só para os
membros da comunidade de acolhimento, bem como proporcionar aos visitantes a
experimentar e compreender a cultura e o património da comunidade.
 Princípio 2
A relação entre os Sítios com património e o Turismo é dinâmica e pode
envolver valores conflituosos, pelo que ela deve ser gerida de forma
sustentável para as gerações actuais e futuras.
 Princípio 3
O planeamento para conservação e para o turismo em locais com património deve
assegurar que a experiência do visitante vai ser gratificante e agradável.
 Princípio 4
As comunidades de acolhimento e devem ser envolvidas no planeamento da
conservação do património e do turismo.
 Princípio 5
As actividades do turismo e a conservação do património devem beneficiar a
comunidade de acolhimento.
 Princípio 6
Os programas de promoção turística devem proteger e valorizar os
recursos naturais e o património cultural.

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Paulo Caldeira | Janeiro 2011

1.3 A CARTA DOS ITINERÁRIOS CULTURAIS

Já em 2008, a Assembleia-geral do ICOMOS aprovou a Carta dos Itinerários Culturais21


onde procura ilustrar «a concepção contemporânea dos valores do património para a
sociedade, enquanto recurso para um desenvolvimento social e económico durável».

Referindo que os Itinerários Culturais «representam processos evolutivos, interactivos e


dinâmicos das relações humanas interculturais, realçando a rica diversidade das contribuições
dos diferentes povos para o património cultural», o ICOMOS considera tais instrumentos
turísticos «não são simples vias históricas de comunicação que possuem elementos
patrimoniais ou que servem como ligação entre si, mas fenómenos históricos singulares». Ou
seja, na definição do ICOMOS, um Itinerário Cultural deve também reunir as seguintes
condições:

a) ser o resultado e o reflexo de movimentos interactivos de pessoas e de trocas


pluridimensionais contínuos e recíprocos dos bens, das ideias, dos conhecimentos e
dos valores sobre os períodos significativos entre povos, paises, regiões ou
continentes;
b) ter gerado uma fecundação mútua, no espaço e no tempo, das culturas implicadas, que

se manifeste tanto no seu património tangível como intangível.


c) Ter integrado, num sistema dinâmico, as relações históricas e os bens culturais
associados à sua existência.

E em consequência disto, o ICOMOS considera que a um Itinerário Cultural «não é suficiente


assegurar só uma protecção dos seus componentes patrimoniais de forma parcial ou aleatória»
sendo necessária a realização de «inventários rigorosos desses elementos, bem como verificar
a sua autenticidade e integridade», o que reclama «um sistema coordenado de medidas legais
e de instrumentos adequados que garantam a conservação e a valorização da sua estrutura
integral e do seu sistema de valores autênticos no seu conjunto».

De igual modo, refere a carta do ICOMOS, ao longo da sua utilização, o Itinerário Cultural
pode promover uma actividade de interesse social e económico de uma importância
excepcional para o desenvolvimento equilibrado, pelo que:

21
Disponível em http://icomos.fa.utl.pt

16
Paulo Caldeira | Janeiro 2011

1. Deve-se prestar uma atenção especial no sentido de evitar a confusão conceptual


entre rotas turísticas, mesmo as de interesse cultural e os Itinerários Culturais. No
entanto é preciso reconhecer também que o Itinerário Cultural é uma realidade
que pode ter uma grande importância para a coesão territorial e para o
desenvolvimento durável. Deste ponto de vista, deve-se encorajar o conhecimento,
assim como o bom uso durável dos Itinerários Culturais, adoptando medidas
relativas à eliminação dos riscos e à preparação da visita turística. Para este fim, a
protecção e a promoção do Itininerário Cultural devem integrar de forma
harmoniosa uma infraestrutura suplementar – turística, viária, de informação, de
interpretação e de apresentação – com a condição essencial de não atentar contra a
autenticidade, a integridade e o sentido dos valores históricos e culturais do
Itinerário, como os elementos essenciais a transmitir aos visitantes.
2. A visita turística deverá ser administrada racionalmente de acordo com os estudos
prévios de impacto ambiental, e de uma regulamentação de uso público e de
participação social, bem como medidas de controle e de monitorização destinadas
a evitar os impactos negativos do turismo.
3. A promoção turística de um Itinerário Cultural deverá assegurar em todos os casos
a participação prioritária da população local e das empresas turísticas locais e
regionais. Deve-se evitar que a sua exploração turística seja gerida exclusivamente
por grandes empresas multinacionais ou de paises desenvolvidos implicados no
traçado histórico do Itinerário.

E em matéria de Gestão, aquele organismo internacional refere que a gestão dos Itinerários
Culturais exige «uma coordenação transversal a fim de garantir a integridade das políticas no
domínio da protecção, da preservação, do uso e da conservação, do ordenamento do território
e do turismo». Mas adverte que tal sistema de governance deve ser participado pelos
habitantes da zona.

1.4 O CONCEITO CONTEMPORÂNEO DE MUSEU

Apesar de muitos dos pensadores da área artística continuarem a persistir na ideia de que um
Museu é apenas um espaço fechado onde se organizam memórias e se explica o passado, as
mais recentes teorias vão tão longe que há já quem fale do conceito do «museu dentro do

17
Paulo Caldeira | Janeiro 2011

museu»22, onde o espaço urbano ganha força na ligação entre o passado e o futuro da
sociedade que o usufruiu e frequenta.

Os próprios estatutos do ICOM23 (adoptados na 16ª Assembleia Geral do organismo realizado


na cidade holandesa de Haia, a 5 de Setembro de 1989 e alterados pela 18ª Assembleia Geral
que decorreu em Stavanger, na Noruega, a 7 de Julho de 1995 e pela 20ª Assembleia Geral
ocorrida em Barcelona, Espanha, a 6 de Julho de 2001) estabelecem, no segundo artigo, que
«um museu é uma instituição permanente, sem fins lucrativos, ao serviço da sociedade e do
seu desenvolvimento, aberto ao público, e que adquire, conserva, estuda, comunica e expõe
testemunhos materiais do homem e do seu meio ambiente, tendo em vista o estudo, a
educação e a fruição».

Mas apesar desta visão aparentemente redutora que pode colher aplausos entre os defensores
da museologia tradicional24, o ICOM adverte que tal definição «deve ser aplicada sem
quaisquer limitações resultantes da natureza da entidade responsável, do estatuto territorial, do
sistema de funcionamento ou da orientação das colecções da instituição em causa» e engloba
nesse conceito «os sítios e monumentos naturais, arqueológicos e etnográficos e os sítios e
monumentos históricos com características de museu pelas suas actividades de aquisição,
conservação e comunicação dos testemunhos materiais dos povos e do seu meio ambiente».

E a definição abrange ainda «os centos culturais e outras instituições cuja finalidade seja
promover a preservação, continuidade e gestão dos recursos patrimoniais materiais e
imateriais (património vivo e actividade criativa digital)»25.

1.5 A CONVENÇÃO PARA A PROTECÇÃO DO PATRIMÓNIO


ARQUITECTÓNICO DA EUROPA

A Convenção para a Protecção do Património Arquitectónico da Europa aprovada a 3 de


Outubro de 1985 na cidade espanhola de Granada depois de a Conferência Mundial sobre

22
As ideias modernistas na arquitectura de museus aparecem em forma de projecto no segundo quartel do século XX, quando Le
Corbusier projecta para os arredores de Paris o Museu Sem Fim tendo a teoria arrebatado mais força em 1943, quando Frank Lloyd Wright
deu início ao projecto do Museu Guggenheim em Nova Iorque e levou a que os próprios aspectos arquitecturais dos edifícios que albergam
as exposições passassem a ser considerados obras de arte urbana e, em consequência disso, parte de um museu mais alargado que olha
para a cidade como um repositório evolutivo de vivências culturais de uma determinada comunidade.
23
Criado em 1946, o ICOM é uma organização não-governamental (ONG) que mantém relações formais com a UNESCO e tem estatuto
consultivo no Conselho Económico e Social das Nações Unidas.
24
Em seu sentido lato, os museus são tão antigos quanto a própria história da humanidade e alguns autores consideram que el es existem
desde que o ser humano começou a coleccionar e a guardar objectos de valor em salas construídas especialmente para esse fim.
25
In http://www.icom-portugal.org/conteudo.aspx?args=55,conceitos,2,museu

18
Paulo Caldeira | Janeiro 2011

Políticas Culturais realizada na Cidade do México, em 1982, ter observado que «o património
cultural de um povo compreende as obras dos seus artistas, arquitectos, músicos, escritores e
cientistas, e também o trabalho de artistas anónimos, expressões da espiritualidade do povo e
do sistema de valores que dão sentido à vida» como a língua, os ritos, as crenças, os lugares e
monumentos históricos, a literatura, as obras de arte e os arquivos e bibliotecas.

E dentro deste ponto de vista, para os responsáveis políticos que participaram no encontro de
Granada, o património arquitectónico não só «é a parte mais imediatamente perceptível do
património cultural» como pode desempenhar «um papel importante no equilíbrio do
desenvolvimento cultural a nível regional, nacional do contexto europeu» e porque a sua
conservação pode contribuir para o desenvolvimento económico. De tal modo que o artigo
quinto da Convenção Europeia adopta o disposto no artigo 7º da Carta Internacional para a
Conservação e Restauração de Monumentos e Sítios, aprovada pelo Conselho Internacional
de Monumentos e Sítios (ICOMOS), em 1964, onde se afirma que «o monumento é
inseparável da história de que é testemunha e a partir do contexto em que ela ocorre».

E o documento defende também que os princípios da conservação integrada do património


implicam «uma cooperação efectiva entre os vários serviços administrativos competentes, a
fim de colocar a política desejada em vigor» relembrando a necessidade de tal cooperação
envolver as autoridades públicas, organizações privadas e o público em geral no processo de
decisão, especialmente no contexto da protecção do património arquitectónico.

2. TEORIAS CONCEPTUAIS
2.1 CIDADE, IDENTIDADE E MEMÓRIA
A urbe enquanto espaço multidisciplinar onde convivem e interagem diferentes valências
tenderá a ser influenciada por cada uma dessas valências. Para Avraham (2004), a imagem de
uma cidade tende, em termos genéricos, a ser influenciada por factores como:

 As características e dimensão da população e do espaço;

 O seu status ou poder político;

 A sua taxa de crime;

 O número e carácter das instituições nacionais situadas dentro da cidade:

 A sua localização;

19
Paulo Caldeira | Janeiro 2011

 O seu historial;

 O valor turístico e cultural;

 Product placement em filmes e séries da televisão que foram filmadas na cidade;

 Natureza e volume de cobertura pelos mass media;

 Beleza natural e patrimonial.

Já Kotler et al (1999), definem quatro vantagens competitivas em que se pode alicerçar a


imagem de uma cidade: design (o lugar com carácter); infra-estrutura (lugar como propiciador
de ambientes); serviços básicos (lugar como fornecedor) e atracções (lugar como
entretenimento e recriação).

Partindo de diferentes modelos consultados e referenciados por diversos autores, importa


assumir um conjunto de factores chaves para o marketing mix urbano resumindo-se as
variáveis críticas no processo de comunicação da imagem:

 Comércio urbano;

 Paisagem e design urbano

 Infra-estruturas espaciais;

 Actividades urbanas;

 Organização | Gestão;

 Comunicação

 Publicidade e promoção;

 Regeneração física de larga escala;

 Arte pública e estatuária cívica;

 Regeneração cultural;

 Parcerias público privadas


Deste modo, todo o conjunto urbano, como o edificado, a qualidade e design do
mobiliário urbano, a sinalização adequada, a limpeza, a segurança pública, as facilidades
ao nível do espaço público, a atmosfera que se respira, as pessoas que residem e
frequentam o centro urbano constituem o que a diversa bibliografia designa de
amenidades. Este factor que interfere na imagem do centro urbano é transmitido ao
visitante a partir daquilo que se designa de percepção cognitiva.

20
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A importância da cultura na atracção aos espaços urbanos, e na sua imagem, é subscrita


vários autores que destacam a necessidade de haver uma maior atitude empreendedora das
entidades com responsabilidades políticas para que as cidades se tornem mais
competitivas. Esta atitude proactiva, empreendedora, deve-se manifestar em termos de
estabelecimento de parcerias entre o sector público e privado. E estas interacções afectam
crescentemente o carácter e bom desempenho dos espaços locais através da conciliação de
agendas e actividades dos vários actores intervenientes na gestão do centro urbano.

Como se vê, os espaços urbanos e as suas dinâmicas dependem muito da pró-actividade


das suas comunidades e capacidade de diálogo que estas tiverem porque em consequência
da crescente integração da economia mundial, as cidades vêm competindo cada vez mais
entre si procurando criar valores que as diferenciem. Uma das formas mais flexíveis de
construir imagens favoráveis e de uma forma relativamente mais fácil é o recurso á
realização de grandes eventos. Richards e Wilson (2005), destacam a importância destes
eventos, por si por vezes capazes de ajudarem a construir novas marcas territoriais, como
foram os casos da expo de Sevilha e as olimpíadas de Barcelona. Não é por acaso que «as
cidades competem ferozmente pela honra de receberem eventos como os jogos olímpicos,
o campeonato do mundo ou uma exposição mundial».

Richards e Wilson (2005), num estudo sobre o impacto da iniciativa Capital Europeia da
Cultura 2001 em Roterdão, concluem que o efeito maior se nota sobre os seus residentes,
enquanto os visitantes consideraram a imagem da cidade também a partir de outras
características, como o elemento água e a sua arquitectura urbana. Nesse mesmo estudo,
os autores salientam que a realização de grandes eventos culturais, como o caso das CEC,
tendem a não deixar grandes marcas junto dos turistas estrangeiros, já que esses
acompanham o evento quando ele vai para outras cidades. Tal como outros autores,
Richards e Wilson (2005), reforçam a ideia de que os grandes eventos terão pouco
impacto futuro na imagem das cidades que os acolhem a menos que se dê continuidade à
política cultural com a realização de outros eventos.

2.2 CIDADE E PLANEAMENTO ESTRATÉGICO


O planeamento estratégico é, fundamentalmente, um processo adequado à complexidade
dos sistemas modernos, porque não concebe o plano como um “produto” finalizado, mas
sim como um processo em constante avaliação. Ferreira (2005) refere que alguns autores
propõem até a designação de management (gestão) ou de planification (planificação) para

21
Paulo Caldeira | Janeiro 2011

substituir a designação de “planeamento”. Esta redefinição do conceito de planeamento


estratégico fá-lo aproximar mais da sua génese, o meio empresarial e, ao mesmo tempo,
destrinça-o das metodologias de planeamento convencional.

A grande meta do planeamento estratégico consiste na identificação de um projecto de


futuro, mobilizador e sustentado. Procura melhorar a capacidade competitiva de um
território, divulgar as suas potencialidades, aproveitar os seus recursos endógenos e tentar
debelar as suas fragilidades. Para traçar estes objectivos, o planeamento estratégico
alicerça-se num dos seus pilares fulcrais que é a participação e o envolvimento de diversas
entidades públicas e privadas na formatação do rumo e dos meios para atingi-lo. A
celebração de parcerias e de “contratos de cidade” é o resultado mais visível desta
cooperação.

Assim, o planeamento estratégico deve ser entendido como um processo de condução da


mudança, fundamentado numa análise participativa da situação prospectivada, com a
correspondente concentração de recursos nos temas considerados mais críticos. As
estratégias, para surtirem efeito, para além de incidirem sobre os domínios críticos do
território, devem registar uma boa adesão dos actores envolvidos na sua concretização.

Depois, cada estratégia desdobra-se num conjunto de acções concretas e o marketing


territorial assume-se como um instrumento ao serviço do planeamento estratégico por
diversas razões. Desde logo, porque também possui uma raiz empresarial e, ao pretender
promover os recursos de um território em espaços mais vastos, dá um importante
contributo para robustecer a sua posição competitiva no mercado.

Ora, como defende Kotler (2009) a finalidade do marketing é a de tornar uma localidade
mais permeável à realização de investimentos, à chegada de novos moradores ou de
turistas ou para captar a organização de eventos mediáticos. O problema é que os
mercados se deslocam e mudam com mais celeridade do que a capacidade de resposta dos
territórios, tal como advertem Kotler et al (1993).

Neste caso, o objectivo do marketing passa pela construção de uma nova imagem do
lugar, substituindo as já existentes, vagas ou negativas junto dos potenciais residentes,
investidores ou visitantes. Deste modo, González (2001) defende que o marketing
contribui “para promover o desenvolvimento sustentável de um território, contribuindo
para melhorar a economia, o ambiente e a qualidade de vida, aumentando a eficácia da

22
Paulo Caldeira | Janeiro 2011

utilização dos recursos”. Num efectivo processo de planeamento de marketing, as acções a


empreender não respeitam apenas e só à divulgação, à publicitação. Essa é uma das
tarefas. A montante, conta com todo o trabalho de diagnóstico interno e externo sobre
potencialidades e debilidades dos recursos locais, ao estudo dos mercados interessados na
oferta, à análise dos meios de atingir os públicos seleccionados e à participação de redes
de actores em todo esse processo.

E é neste ponto que existe outra clara conexão com o processo de planeamento
estratégico. O marketing territorial, ao invés do empresarial, apoia-se na colaboração e na
participação das entidades públicas e privadas, dotadas de visões e de motivações
variáveis, mas mobilizadas por um objectivo comum: o desenvolvimento e a afirmação
local. É por esta razão que Kotler et al (1993) argumentam que o potencial de um
território não depende tanto da sua localização geográfica e dos seus recursos, mas mais
da vontade, da habilidade, da energia e dos valores das organizações existentes.

Temos desta forma que assumir que o marketing territorial, ao promover a emancipação
económica e o reforço da capacidade competitiva de um território, assume-se como um
instrumento ao serviço do planeamento estratégico.

Ao procurar assegurar uma imagem eficaz e atraente, com base nas potencialidades locais,
para que um território se torne mais apelativo para o seu mercado externo, mas também
para o interno, o marketing territorial abrange a função de análise do mercado, a definição
de uma estratégia de mercado, a formatação de uma estratégia de comunicação e de
promoção.

2.3 CIDADE, GESTÃO CULTURAL E CRIATIVIDADE


Pelo que já se viu, temos necessariamente de chegar à conclusão primeira de que abordar
a questão do Marketing Territorial implica acima de tudo olhar de uma forma transversal
para o lugar em estudo e atender ao paradigma da Gestão Cultural de Território porque o
percurso da cidade foi desenhado enquanto espaço vivencial, um lugar privilegiado de
fixação de pessoas e de negócios.

À medida que nos aproximávamos dos finais do século XX, um conjunto de novas
circunstâncias (sociais, culturais, políticas, tecnológicas e económicas) vieram introduzir
novas regras, às quais a cidade teve que se adaptar sob pena de perder actualidade. A par
da sua função como “lugar de vivência” e de permanência, a cidade tornou-se

23
Paulo Caldeira | Janeiro 2011

progressivamente, e cada vez mais, um “lugar de passagem”, assumidamente de natureza


compósita e plural, onde residentes, investidores e turistas buscam usufruir de
experiências inesquecíveis e qualidade de vida. Estamos, portanto, perante um novo
paradigma de cidade, encarada como um produto (especial), simultaneamente um lugar de
permanência e de passagem, mas sempre destinado a ser vivido (por residentes, visitantes,
investidores).

Temos assim que, para falar numa estratégia de Marketing Territorial que se socorra (e
deve fazê-lo sempre, sob pena de basear decisões que colidam com as ligações dos
residentes ao seu lugar) de uma correcta Gestão Cultural de Território, olhar para a cidade
aos mais diversos níveis. É preciso abordar as várias vertentes que fazem o território
citadino, desde o urbanismo, à arquitectura, às tradições, às vivências sociais diárias, aos
movimentos artísticos locais e ao tecido económico.

Se Castells (2000) define cidades globais enquanto um local onde capital, inovação,
tecnologia, interacções organizacionais, símbolos e sons fluem em uma rede de infra-
estruturas, serviços de apoio e profissionais especializados, Oosterbeek (2007:35)
considera ser necessário mudar o paradigma na esfera da gestão do património e da
cultura, seguindo dois eixos: «primeiro o reconhecimento de que a cultura (material e
imaterial, memorial e performativa) é uma expressão indissociável da economia e dos
interesses e tensões interpessoais e inter-sociais que nela se geram; segundo, que é preciso
incorporar as pessoas, os cidadãos, nos processos de decisão e gestão cultural (ou
territorial), em função das novas dinâmicas».

E Albuquerque (2006) aponta a evidência de que no panorama actual da rede de produção


e circulação dos bens culturais no contexto de uma economia da criatividade, o desafio
que se coloca às cidades de pequena e média dimensão é o de «abraçar as problemáticas
inerentes à cultura como factor de desenvolvimento económico e evoluir para a discussão
em torno da vitalidade cultural de uma cidade».

Como já se viu os recursos físicos (arquitectura, urbanismo, parques, ruas, monumentos,


transportes, etc.), geográficos (localização, morfologia, topografia), culturais (eventos
desportivos, festivais, exposições, produções teatrais, dança, concertos, etc.), históricos
que dão forma ao produto cidade, contribuem de forma determinante para a formação da
sua identidade, devendo integrar a essência da estratégia de posicionamento e a marca da
cidade.
24
Paulo Caldeira | Janeiro 2011

Contudo, Laundry et Bianchini (1995) considera que “produzir” uma cidade atractiva é
diferente de “construir” uma cidade atraente. Ou seja, não basta investir no
embelezamento de espaços públicos e em obras faraónicas. É necessário dotar a cidade de
uma vasta panóplia de soluções que permitam a sua sustentabilidade futura, como
“produto” apetecível não só para os residentes, mas também para novos “consumidores”.

E sobre a questão da criatividade, estes autores alertam que historicamente, «a


criatividade sempre foi a alma da cidade» que a fez funcionar como mercados, comércio
e centros de produção, com a sua massa crítica de empresários, artistas, intelectuais,
estudantes, administradores e políticos. São lugares onde a interacção cria novas ideias,
artefactos e instituições, «e onde as pessoas viveram as suas necessidades, aspirações,
sonhos, projectos, conflitos, lembranças, angústias, amores, paixões, obsessões e medos».

III. CAPÍTULO

ESTUDO DE CASO

1. O CENTRO HISTÓRICO DE GUIMARÃES


1.1 BREVE CARACTERIZAÇÃO?

Se recorrermos ao Manual do Municípe26, temos a definição de que a cidade de


Guimarães possui características ímpares que a distinguem de outras cidades portuguesas
e a colocam num lugar de relevo na História de Portugal pois «aqui terá acontecido a
Batalha de S. Mamede» onde a vitória de D. Afonso Henriques foi decisiva para a
fundação da Nação Portuguesa ao garantir a independência do Condado Portucalense face
ao Reino de Leão, reconhecida em 1143, nos termos do Tratado de Zamora.

Anteriormente, no século X, a Condessa Mumadona Dias mandou construir na sua terra,


Vimaranes, um convento de frades e freiras (transformado em colegiada no séc. XVII) que
se tornou num pólo de atracção e de fixação populacional. Para defesa deste agregado
populacional, Mumadona mandou erguer o Castelo, entre os anos de 959 e 968. A então
villa Vimaranes desenvolve-se em volta destes dois pólos dinamizadores – o Convento e o
Castelo – envolvidos pela muralha protectora entretanto edificada.

26
Documento disponível no sítio electrónico da Câmara Municipal de Guimarães apresentado pelo presidente da autarquia como o
documento de apoio ás necessidades de resolução de problemas burocráticos.

25
Paulo Caldeira | Janeiro 2011

Com o passar dos séculos, Guimarães foi palco do desenvolvimento de algumas indústrias
como a cutelaria, a fiação e tecelagem de linho, o curtimento das peles e a ourivesaria, e
em 1853, a Rainha D. Maria II27 eleva a vila à categoria de cidade, sendo a partir daqui
fomentado e autorizado o derrube das muralhas. Contudo, ainda hoje é possível observar
alguns vestígios e panos completos.

No entanto, o documento não diz mais nada sobre a história vimaranense e trata logo de
apontar ao munícipe uma série de recordações mais recentes relativas aos vários
mandatos do ainda presidente da Câmara Municipal.

É referido, por exemplo, que a construção, nos anos mais recentes, «de um conjunto de
equipamentos colectivos com grande qualidade arquitectónica e funcional», associada às
acessibilidades disponíveis e ao interesse patrimonial, simbólico e histórico da cidade,
dotaram Guimarães de «uma notável capacidade de atracção de grandes eventos culturais,
desportivos, sociais e institucionais».

E veja-se o que se diz depois:

«A Capital Cultural da Lusofonia, em 1998, o Guimarães Jazz, desde 1992, o Mundial


de Andebol 2003, o Campeonato Europeu de Futebol 2004 ou o Dia de Portugal, em
2005 são meros exemplos que confirmam a existência de equipamentos e recursos que
provaram, no passado recente, a capacidade organizativa e logística da cidade e a sua
especial vocação para acolher eventos particularmente exigentes pela sua dimensão
nacional e internacional. Do Estádio D. Afonso Henriques ao Multiusos de Guimarães,
de um vasto conjunto de Igrejas às praças do Centro Histórico, da Citânia de Briteiros
à Montanha da Penha, do Paço dos Duques de Bragança ao Parque da Cidade, do
Centro Cultural Vila Flor ao Complexo Multifuncional de Couros, vários são os
locais, que se perfilam para acolher as várias propostas da Capital Europeia e que são
procurados, actualmente, para a realização de eventos culturais, desportivos ou
profissionais.» (Manual do Munícipe de Guimarães, 2010: 3)

Até quando aponta os Pontos de Interesse Cultural e Turístico, o documento aponta de


imediato que «a reabilitação e recuperação do parque habitacional do Centro Histórico, bem

27
A mesma monarca elevou Viana do Castelo á categoria de cidade em 1848.

26
Paulo Caldeira | Janeiro 2011

como os arranjos urbanísticos em toda a área intramuros e zona “tampão” da cidade


contribuíram, incondicionalmente», para a candidatura de Guimarães a Património Mundial
da Humanidade.

E ao enumerar pontos turísticos como Monte da Penha, o Parque da Cidade, o Horto


Municipal, S. Torcato, o Campo da Ataca, as Caldas das Taipas, a Citânia de Briteiros, os
percursos pedestres de S. Torcato e a Rota da Citânia, o Manual trata logo de redireccionar o
percurso ao afirmar que «este espaço [o resto do concelho] pode e deve ser complementar à
oferta turística do maior pólo de desenvolvimento e atracção turística, que é a cidade de
Guimarães, o seu Centro Histórico e a sua forte ligação às origens da identidade portuguesa»,
sendo depois relatados os vários investimentos previstos no âmbito do programa CEC 2012.

Para além disto, fica-se desde logo com uma ideia da teia burocrática que rege uma qualquer
intervenção na cidade, especialmente na área do centro histórico, onde qualquer intervenção
tem de percorrer, nada mais, nada menos que três pelouros relacionados com o urbanismo, a
reabilitação e o património. Mas se se tratar de um investimento relacionado com a cultura ou
o turismo terá de recorrer ainda há mais um: ou o do turismo, ou do da cultura.

1.2 O PROCESSO DE CLASSIFICAÇÃO PELA UNESCO

A candidatura do Centro Histórico de Guimarães a Património Cultural da Humanidade teve


por base um trabalho de cariz essencialmente urbanístico iniciado pelo então Gabinete
Técnico Local (GTL) que, mediante financiamentos municipais, nacionais e comunitários
(sobretudo estes dois últimos durante o primeiro quadro comunitário de apoio), levou a cabo
um conjunto de acções que incidiu sobre alguns edifícios e sobre espaços públicos como
forma de induzir o investimento privado.

E aquando da sua inscrição na Lista de Património Mundial em 2001, a UNESCO considerou


que Guimarães «tem um considerável valor universal em virtude de as técnicas de construção
especializadas aqui desenvolvidas na Idade Média terem sido transmitidas às colónias
portuguesas em África e no Novo Mundo», tornando-se nas suas características distintivas;
que o passado histórico de Guimarães «está estreitamente associado com o estabelecimento da
identidade nacional portuguesa e da língua portuguesa no século XII»; e que «estando
excepcionalmente bem preservada», Guimarães ilustra a evolução de tipos particulares de

27
Paulo Caldeira | Janeiro 2011

construção, desde o povoado medieval até à cidade dos nossos dias, e particularmente dos
séculos XV a XIX.

O que por muitos é classificada como «a mais bem sucedida operação de reabilitação urbana
efectuada em Portugal» começou em 1983 quando a Câmara Municipal, tal como todos os
outros municípios do país, deu início ao Plano Director Municipal (PDM) tendo entregue a
tarefa ao arquitecto paisagista Nuno Portas28 que logo levantou preocupações quanto ao
estado de conservação dos edifícios da área intramuros.

Contrariamente ao que fizeram todos os municípios do país, Nuno Portas recusou a ideia de
atribuir a uma equipa exterior a elaboração de um Plano de Pormenor para o Centro Histórico
e propôs antes a criação de um gabinete municipal que se ocupasse dessa área segundo um
modelo coordenado pela própria equipa do PDM. A autarquia acede ao pedido, solicita a
assessoria de Fernando Távora e chama Alexandra Gesta (recém-licenciada em arquitectura) e
mais dois técnicos ligados á área do urbanismo.

Assumindo-se como a face vísivel da recuperação, Alexandra Gesta, agora vereadora da


Câmara Municipal, tem vindo a referir em diversas conferências que nos dois anos seguintes,
o primeiro gabinete estudou a situação, identificou problemas e interlocutores e estabeleceu
estratégias, mas só em 1985, tirando partido da decisão governamental de constituir Gabinetes
Técnicos Locais, é que a autarquia forma um GTL, amplia a equipa e estabelece três eixos
fundamentais: Reabilitação dos espaços públicos; Reabilitação dos edifícios municipais;
Apoio técnico e financeiro (na medida das disponibilidades) aos privados.

O problema é que só agora se começa a dar conta (por via da necessidade de modificar
regulamentos tendo em vista a concretização dos projectos inscritos em sede da CEC 2012)
que o designado PLANO GERAL DE URBANIZAÇÃO DA CIDADE DE GUIMARÃES
data do final dos anos 70 do século XX, a última revisão do Plano Director Municipal (PDM)
aconteceu em 1994 e é apenas nessa altura que aparece um documento intitulado
REGULAMENTO DE INTERVENÇÃO NO CENTRO URBANO E HISTÓRICO DE
GUIMARÃES (RICUH) e onde se afirma que «se torna necessário redefinir e formalizar os
processamentos e condicionantes que vêm sendo impostas para a reabilitação dos imóveis da
área», apesar de, por esta altura já se ter procedido á intervenção em diversos edifícios.

28
Um dos defensores dos ideais do que é conhecido como a Escola do Porto, um alegado movimento ligado á
arquitectura contemporânea portuguesa a que se ligaram nomes como os de Fernando Távora, Eduardo Souto
Moura e Siza Vieira e que tem por base as ideias fundamentais do francês Le Corbusier.
28
Paulo Caldeira | Janeiro 2011

Tal documento estabelece uma série de condicionantes e interdições no que diz respeito á
intervenção em edifícios do Centro Histórico mas comparando o RICUH com o levantamento
fotográfico que se remete em anexo digital com este estudo verifica-se uma série de
disparidades que colocam em causa a tal afirmação de Guimarães ter sido palco da «mais bem
sucedida operação de reabilitação urbana efectuada em Portugal».

Com 46 imóveis classificados como Monumento Nacional e Património de Interesse Público


e/ou Municipal (a grande maioria localizados no Centro Histórico), a Câmara Municipal de
Guimarães assume-se como o garante da preservação, do planeamento e da fiscalização mas
partilha a recuperação, reabilitação e gestão de todo o espaço com diversas instituições
públicas e privadas, além de a grande maioria dos edifícios não classificados no âmbito do
Instituto de Gestão do Património Arquitectónico e Arqueológico (IGESPAR) estarem sob a
propriedade exclusiva de privados. Além disso, segundo no Plano Plurianual de
Investimentos, a esmagadora maioria dos investimentos realizados pela autarquia são objecto
de financiamento nacional ou comunitário e qualquer intervenção em espaços classificados
requer sempre aprovação prévia por parte das entidades que tutelam o património devido às
restrições impostas pelos planos de pormenor.

A gestão do território do lado autárquico rege-se pelo Plano Director Municipal de Guimarães
e pelo Plano Geral de Urbanização de Guimarães onde estão plasmadas todas as
condicionantes mas não existe qualquer Plano de Gestão concreto para o Centro Histórico de
Guimarães29 nem tampouco um gabinete específico para esta área, estando as competências
autárquicas distribuídas por vários departamentos municipais.

No entanto, o Plano Plurianual de Investimentos refere que o projecto Guimarães – Capital


Europeia da Cultura 2012 constitui uma oportunidade ímpar para (re)desenhar um novo
modelo territorial sob os desígnios da Coesão Urbana e ao qual se deu o nome de MAPA
2012, «um projecto municipal que, neste contexto, desenvolverá actuações urbanísticas
no concelho de Guimarães, valorizadoras do património paisagístico, cultural e
arquitectónico, da mobilidade urbana e do ambiente».

Constituem-se como objectivos do MAPA 2012:

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A única cidade portuguesa classificada como Património Cultural da Humanidade pela UNESCO a dispor de um instrumento deste
género é o Porto estando disponível para consulta em http://www.portovivosru.pt/destaque_04.php

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 Detectar/propor núcleos de referência, através da qualidade da sua arquitectura


e seus espaços urbanos, da sua escala, da sua capacidade de acolher actividades
que propiciam o encontro humano, ensaiando uma reabilitação formal e
funcional de todo o “contínuo urbano”, estreitando relações entre “o centro” e
“a periferia”, interconectando potencialidades e funcionalidades
complementares;
 Iniciar a progressiva adaptação de núcleos urbanos aos actuais modos de vida e
às suas mais estritas exigências (de segurança, de conforto, etc.), conservando
a sua identidade, para o que, para além da arquitectura, importa manter e atrair
a população (residentes, visitantes, trabalhadores);
 Investir, reabilitando, na requalificação dos espaços públicos, assim como em
equipamentos e infra-estruturas, como estratégia indutora ou revivificadora do
interesse público e privado.

O MAPA 2012 terá ainda as seguintes atribuições:


 Elaborar projectos de reabilitação de espaços públicos e de recuperação de
edifícios;
 Promover e acompanhar as respectivas obras;
 Promover, através de concursos públicos, a elaboração de projectos de espaços
públicos e de edifícios;
 Propor a aquisição de edifícios e/ou terrenos para equipamentos culturais;
 Propor a aquisição de obras de arte.

A implementação do MAPA 2012 decorrerá em simultâneo com um rol de intervenções


urbanísticas já em curso na cidade de Guimarães (financiadas a 80 por cento por fundos
comunitários) e em paralelo com a programação prevista para a Capital Europeia da Cultura
2012 e, em nenhum documento oficial é feita referência á criação de um modelo de Gestão
específico mas apenas à Fundação Cidade de Guimarães. Uma pessoa colectiva de direito
privado de utilidade pública, com duração indeterminada constituída pelo Decreto-Lei nº
202/2009, de 28 de Agosto e que tem como tarefa essencial a concepção, planeamento,
promoção, execução e desenvolvimento do programa cultural do evento Guimarães 2012
Capital Europeia da Cultura. É admitido, no entanto que, «findo o evento, a Fundação poderá
vir a assumir a gestão do património cultural e dos respectivos equipamentos, propriedade do
município de Guimarães, e de outros que lhe sejam afectos, com vista à promoção da cultura,
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desenvolvendo a criação e a difusão em todas as suas modalidades». O total dos investimentos


a realizar continuam por quantificar verdadeiramente e descobrir todos os documentos é tarefa
quase impossível uma vez que o Plano de Actividades e o Plano Estratégico da Fundação não
estão acessíveis e os vários projectos enumerados no sítio electrónico do projecto CEC 2012
não referem valores.

Por outro lado, o IGESPAR revelou recentemente em conferência de imprensa que, no


âmbito do evento Guimarães 2012 – Capital Europeia da Cultura, o Paço dos Duques,
Unidade Museológica do Instituto dos Museus e da Conservação – Ministério da
Cultura promoverá um conjunto de intervenções nos Monumentos e espaços exteriores
afectos ao serviço, num valor global de 2.000.000€, com um financiamento de
80% de fundos comunitários.

Segundo os responsáveis do organismo estatal, «as intervenções planeadas vêm de


encontro a um conjunto de necessidades verificadas no âmbito do serviço e inserem-se
em diferentes domínios: conservação, reforço de estruturas, estudo e divulgação, segurança
e acessibilidades, tendo os projetos sido desenvolvidos salvaguardando o principio da
reversibilidade».

Em paralelo, regista-se um crescente aumento do número de imóveis adquiridos pela empresa


municipal CASFIG30 no centro histórico e onde têm vindo a ser realojados algumas famílias
com problemas de desemprego e outras situações de exclusão. Uma questão a que a Rede
Social de Guimarães ainda não conseguiu dar resposta.

1.3 A VISITA SIMULADA

A avaliação mediante uma grelha com base na escala de Likert 31, embora subjectiva, coloca
sérios problemas ao nível do estudo uma vez que do somatório de todos os pontos, o espaço
urbano registou apenas a classificação de satisfatório em dois itens (os parques de
estacionamento e os acessos) enquanto a área do Instituto dos Museus e da Conservação
(IMC) recebe uma apreciação global satisfatória (se exceptuarmos a questão da segurança no
Castelo) e obtém mesmo a classificação de muito bom ao nível dos espaços para exposições
temporárias e de bom ao nível da manutenção, imagem e marketing, tendo sido, aliás o Paço

30
http://www.casfig.pt/empreendimentos.php
31
Disponível em apêndice na versão digital

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dos Duques o único local onde se vislumbrou placas interpretativas e/ou informativas
consonantes com o layout estandardizado da UNESCO.

Registou-se ainda uma visita anónima ao Posto de Turismo da Praça de Santiago onde se
pediu informações sobre a cidade tendo o funcionário disponibilizado um mapa, um guia e
uma agenda cultural da cidade32 onde ressalta sobretudo a venda do projecto CEC 2012 sendo
o símbolo da UNESCO remetido para segundo plano. Note-se, no entanto, que tais elementos
de informação, financiados pela Turismo de Portugal E.P. estavam também disponíveis no
Paço dos Duques onde o manacial informativo existente é francamente superior ao do Posto
de Turismo.

1.4 OS QUESTIONÁRIOS

Posteriormente foram realizados dois questionários escritos on-line 33: um a Vítor Marques, da
Guimarães Turismo, e outro a Tom Fleming, um dos principais impulsionadores do projecto
Norte Criativo da Fundação Serralves e que esteve também na elaboração do projecto Capital
Europeia da Cultura 2012.

Tom Fleming, por exemplo, considera que Guimarães tem uma grande oportunidade com o
projecto CEC 2012 mas adverte que «esta é apenas uma e que uma mudança radical no
repensar do papel da cidade para a região e o papel da cultura na cidade Guimarães vai
perder essa grande oportunidade», por exemplo de enveredar pelo modelo das designada
actividades ligadas às indústrias criativas.

E sobre os novos investimentos a realizar, o investigador não tem dúvidas em afirmar que a
criação de novos espaços urbanos «é um elemento importante como parte de uma
abordagem abrangente» mas considera que «o investimento em talentos é muito mais
importante». Segundo Fleming, a cidade deve ser um meio facilitador para desenvolver
actividades criativas e se os espaços não atingirem essa finalidade não cumprirão os seus
objectivos.

32
Versões pdf disponíveis em anexo na versão digital
33
Disponíveis em apêndice na versão digital

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Vítor Marques, da Guimarães Turismo, é um dos defensores da teoria de que o projecto


Capital Europeia da Cultura 2012 abrirá definitivamente as portas à projecção de Guimarães
enquanto destino de turismo histórico-cultural com a consequente influência na atractividade
de investimento privado para a reabilitação completa do Centro Histórico.

No entanto, Marques denota alguns problemas nas respostas dadas e por isso colocam-se
sérias dúvidas acerca das informações fornecidas, uma vez que, se por um lado o colaborador
da Câmara Municipal de Guimarães referencia um bom relacionamento entre entidades na
gestão do Centro Histórico e um crescente aparecimento de novas actividades e residentes,
por outro queixa-se da falta de financiamento para a reabilitação dos espaços.

Além disso, Marques referenciou um número algo enigmático: o número de turistas tem
crescido mais de 6 por cento, mas o documento oficial 34 relativo a 2010 evidencia um
decréscimo superior a 21 pontos percentuais

1.5 REVISÃO DE PONTOS CRÍTICOS

 PROCESSO DE PLANEAMENTO
Todos os documentos de planeamento do município estão a ser objecto de revisão e
têm sofrido diversas vicissitudes apesar de a Câmara Municipal garantir que os
processos estarão concluídos em meados de 2011. Além disso, não se detectou uma
verdadeira ligação entre as dezenas de organismos públicos, municipais e nacionais
envolvidas (desde o IGESPAR à Câmara Municipal, passando pelo Turismo de
Portugal) mas antes uma gestão casuística.
 PESSOAL E ORÇAMENTO
O Plano Plurianual de Investimentos da Câmara Municipal não tem verbas específicas
destinadas ao Centro Histórico e em termos de recursos humanos estes estão divididos
por diversas divisões e empresas municipais, pelo que se torna quase impossível
detectar quantos funcionários municipais estão afectos directamente á área em causa.
 IMAGEM E MARKETING
O material promocional existente identifica principalmente a iniciativa Guimarães –
Capital Europeia da Cultura 2012 e é pago através de fundos exteriores. De igual
modo, o Plano de Marketing realizado há cerca de seis anos para Guimarães nunca
chegou a ser aplicado e não existe merchandising oficial que não apenas o elaborado
pelo Estado no âmbito da Rede Portuguesa de Museus. Os sítios electrónicos, apesar
de já disponibilizarem alguns meios inovadores, como áudio guias e mapas virtuais,
são de difícil consulta e estão em processo de revisão e remodelação.

34
Disponível em anexo na versão digital

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 PLANO DE INTERPRETAÇÃO
Apesar de os mapas e guias serão de boa qualidade, colocam problemas ao nível da orientação
da visita, uma vez que o guia da cidade, por exemplo, inclui descrições de lugares como as
Caldas das Taipas e a Citânia de Briteiros (localizadas a mais de 10 quilómetros do centro
urbano). A sinalização é deficiente e, em alguns casos é mesmo inexistente, situação
justificada pelos responsáveis locais com o roubo recente das placas interpretativas do Centro
Histórico.

 Não existem PROGRAMAS DE PROMOÇÃO ou MANUTENÇÃO


próprio nem tampouco nenhuma checklist preventiva para a gestão
urbana.

1.6 VISITANTES E RESIDENTES

Os números mais recentes indicam que o Paço dos Duques de Guimarães recebeu, em 2010, a
visita de 290 mil pessoas enquanto os números registados pelos Postos Municipais de
Turismo sinalizaram pedidos de informação de cerca de 70 mil pessoas. Tanto para o
IGESPAR como para a Câmara Municipal de Guimarães estes números estão a corresponder
às campanhas de marketing da cidade.

Contudo, o estudo efectuado revela que o turismo histórico-cultural de Guimarães é incipiente


e notícias recentes confirmam que grande parte dos visitantes da cidade berço escolhe a
cidade vizinha de Braga para pernoitar. Esta será talvez a ponta do iceberg de uma estratégia
municipal mal conseguida pelo facto de a obtenção da classificação como Património
Cultural da Humanidade se ter baseado sobretudo nos aspectos urbanísticos e muito antes de
estar terminado muito do trabalho necessário para que se assegurasse a sustentabilidade do
destino turístico.

Para além disto, apesar da Câmara Municipal de Guimarães nunca ter divulgado dados
concretos, são vários os casos de edifícios devolutos, ou mesmo em ruínas, e outros imóveis
do centro histórico à espera de compradores porque perderam os habitantes originais ou até
mesmo a função inicial a que estavam destinados.

Por outro lado, as notícias mais recentes confirmam a preocupação dos responsáveis
autárquicos na crescente deterioração do tecido socioeconómico do centro histórico e do
crescimento de prédios devolutos ou em adiantado estado de degradação.

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IV. CAPÍTULO
CONCLUSÕES

Um estudo como o que foi efectuado necessitava ainda de maior profundidade tanto na
pesquisa e cruzamento de fontes como na realização de um inquérito verdadeiramente
representativo das percepções de visitantes e residentes.

Contudo, da análise efectuada verificaram-se diversas desconformidades entre o conceito que


preside á atribuição da classificação de Património Cultural da Humanidade e a realidade do
Centro Histórico de Guimarães, não apenas ao nível do cumprimento de directivas como ao
nível do impacto socioeconómico (verdadeiramente não mensurado em nenhum dos
documentos disponíveis) local como em termos da repercussão de boas práticas na área
envolvente, ou seja, o restante espaço urbano que compõe a cidade.

Além disto, os dados estatísticos existentes evidenciam um discurso diferente do que é


frequentemente utilizado pelos gestores e políticos que ditam as directivas no município pelo
que se levantam alguns problemas éticos quando se cruza, por exemplo, os números oficiais e
as declarações prestadas. Tanto mais que, do que se pode constatar da análise fria dos dados, o
crescimento do número de visitantes começou apenas em 2005, altura em que a Câmara
Municipal procedeu á inauguração do moderno Centro Cultural Vila Flor, palco de variados
eventos artísticos, muitos deles de carácter único em Portugal.

De igual modo, os estudos do perfil do turista e da percepção dos residentes, apesar de


efectuados no âmbito da Universidade do Minho, colocam sérias reservas quanto á
metodologia de inquérito utilizada em ambos os casos e mostram clara dissonância em relação
aos relatos registados na imprensa na local.

Ao mesmo tempo, apesar de todas as ideias defendidas pelos teóricos que contribuíram para a
elaboração da candidatura de Guimarães a Património Cultural da Humanidade defenderem o
seu bom trabalho, levando o poder político a vender a imagem de que se está perante «o mais
bem sucedido plano de reabilitação urbana alguma vez realizado em Portugal», o cruzamento
com a literatura e os registos efectuados demonstram que Guimarães está a percorrer o mesmo
caminho pelo qual passou a cidade do Porto: classificação como Património da Humanidade –
Capital Europeia da Cultura. O problema poderá estar nos conceitos defendidos pela
designada Escola do Porto, a corrente da arquitectura a que estão ligados nomes como Siza

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Paulo Caldeira | Janeiro 2011

Vieira e Fernando Távora, que acaba sempre por partir da acção em centros históricos
degradados para a modificação e implementação de soluções em espaços urbanos
circundantes mas esquece o planeamento da cidade enquanto todo cultural.

Deste modo, não se encontram cumpridas algumas das principais ideias que devem presidir
tanto à preservação do património como à sua conversão em mais-valias para a população
residente o que levanta a questão pertinente de saber se não terá a Câmara Municipal de
Guimarães de repensar a estratégia, aproveitando o facto CEC 2012 para apostar no novo
paradigma da Gestão Cultural do Território que passa pela criação de um único gabinete
multidisciplinar que responda por todo o processo de defesa, salvaguarda, reabilitação,
promoção e dignificação do património edificado.

RECOMENDAÇÕES

Para estudos futuros fica a advertência de que algumas investigações encontradas sobre o
Centro Histórico de Guimarães carecem de fiabilidade e actualidade pelo que importará
avaliar correctamente o que vai restar na cidade berço para lá de 2013.

Além disso, o poder político necessita de rapidamente encontrar uma solução que permitam
corrigir a trajectória seguida pelos pensadores da reabilitação do Centro Histórico de
Guimarães pois que não se pode defender posições extremistas como a de não permitir que
alguns proprietários privados façam obras deixando apenas alguns aspectos marcantes da
memória da cidade, quando a própria autarquia construiu um cubo de betão armado para
alojar a Polícia Municipal em pleno espaço intramuros e decidiu agora que o Largo do Toural
não só vai perder mais uma estátua, como o piso da praça será alvo de uma obra de arte que
irá aproveitar as pedras originais para reproduzir o Casco Histórico.

De tudo resulta afinal uma pergunta: Quem queres ser tu Guimarães?

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Paulo Caldeira | Janeiro 2011

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NOTA FINAL: todos os apêndices e anexos referenciados no trabalho estão reunidos na versão
digital

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