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ABORTO

A ética e a interrupção da gravidez

As ciências contemporâneas, sobretudo as ciências da vida (biologia, medicina, genética etc.), criaram uma
série de dilemas éticos que são estudados pela filosofia. O ramo da filosofia que estuda os problemas morais
que surgem dessas ciências é chamado bioética; e a subdivisão da bioética que cuida de assuntos específicos
da medicina, como o aborto, é chamada ética médica.

O aborto é um dos pontos mais difíceis da ética médica. Ele envolve aspectos religiosos, legais, médicos,
socioculturais e políticos. Neste artigo, examinaremos o aborto somente do ponto de vista da filosofia, expondo
os principais argumentos contra e a favor da interrupção intencional da gravidez.

Há duas posições opostas bem delimitadas na discussão sobre o aborto. A primeira, pró-vida ou conservadora,
defende o direito moral da vida do feto. A segunda, pró-escolha ou liberal, entende que a mulher tem um
direito moral sobre o próprio corpo, o que lhe permite fazer o aborto.

É claro que existem opiniões intermediárias. Alguns acham errado o aborto, mas defendem sua prática em
casos específicos (por exemplo, quando a mulher ou o filho correm risco de morte - ou quando a mãe foi vítima
de estupro). Do mesmo modo, entre aqueles que defendem o aborto, há os que são contra a prática sob certas
circunstâncias, por exemplo, quando a gestação se encontra num estado avançado. Além disso, existem
também situações que fogem a essas duas abordagens. Por exemplo, quando a mulher grávida precisa remover
o útero por conta de um câncer. Neste caso, o aborto seria um efeito colateral.

Principais argumentos
À parte todas essas questões, as duas posições contrárias ajudam a entender os dois principais argumentos do
problema ético do aborto.

O primeiro argumento diz respeito ao direito moral à vida do embrião ou feto. Ele afirma que, se os fetos têm
direito moral à vida, então o aborto é errado, pois a proteção à vida é um valor superior à escolha da mulher.

O problema com esse argumento é saber o que é exatamente uma pessoa, no sentido moral do termo, e se o
feto ou embrião se encaixa nessa definição. Se o embrião é uma pessoa, ele tem direito à vida, caso contrário,
é destituído desse direito.

A conceituação clássica do que é uma pessoa foi dada pelo filósofo inglês John Locke (1632-1704) no Ensaio
sobre o entendimento humano (1690). Ele define pessoa como "um ser inteligente, que possui razão e
capacidade de reflexão, e pode considerar a si próprio como uma coisa que pensa, em diferentes momentos e
lugares; que o faz apenas por essa consciência, que é inseparável do pensamento e que me parece essencial a
ele; sendo impossível para qualquer um perceber sem perceber que percebe".

Fetos não possuem autoconsciência, muito menos capacidade de reflexão ou memória. Portanto, não atendem
a essas características definidoras de um indivíduo. Mas, nesse caso, pacientes em coma ou estado vegetativo
também não teriam direito moral à vida, assim como crianças recém-nascidas, que não possuem ainda a noção
de self.

Uma forma de resolver isso é apelar para a doutrina de Aristóteles da potência e ato. Para Aristóteles, existe
um ser em ato e um ser em potência. Potência é a capacidade para realizar algo, enquanto ato é a realização
concreta dessa potencialidade. Por exemplo, se tenho a capacidade de andar (potência), e não for impedido por
condições externas, eu ando (ato).

Visto sob esta perspectiva, o feto seria um indivíduo em potencial e, em razão disso, realizar um aborto seria
privar o feto do direito a essa vida futura. Mas, nesse caso, a clonagem de humanos, que teoricamente pode
produzir outro ser a partir de uma célula, significa que qualquer célula poderia ser um indivíduo em potencial, o
que, nesse caso, é uma prerrogativa absurda.

Direitos da mulher
O segundo argumento postula que a mulher possui direitos sobre seu corpo e, portanto, pode se decidir pela
interrupção de uma gravidez indesejada ou de risco. O aborto, dessa maneira, seria um exercício inviolável dos
direitos da mulher.

Defensores desse argumento acreditam, em geral, que o feto ou embrião ainda não é um indivíduo com as
capacidades desenvolvidas, logo, não haveria conflito de interesses entre direitos da mulher e do feto. Nesse
sentido, deveria prevalecer a vontade da mulher.

Porém, há ainda um argumento derivado, mais radical, desenvolvido pela filósofa Judith Jarvis Thompson.
Segundo ela, ainda que o feto tenha direito à vida, o aborto é eticamente permissível, porque ele não permite
que se utilize do corpo da mãe contra a vontade dela.
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Thompson fornece o seguinte exemplo. Imagine um brilhante violinista que se encontra inconsciente, sofrendo
de uma doença renal fatal. Uma sociedade de amantes da música descobre que somente você possui o tipo
sanguíneo do violinista. Eles então o sequestram e conectam o sistema circulatório do violinista ao seu
organismo, de modo que seu rim filtre as impurezas de ambos os corpos. Um médico descobre a operação
clandestina e expõe a seguinte situação: caso você se desconecte, o violinista morre, mas se aceitar a condição
por um período de nove meses, salvará a vida dele.

Para Thompson, tanto você quanto o violinista têm os mesmos direitos à vida, só que esse direito não se
sobrepõe ao de decidir o que fazer com seu próprio corpo, direito este que o violinista não possui.

Assim, ao abortar, a mulher não estaria violando o direito à vida, mas somente privando o feto de um direito
que ele não tem de fato. Um dos problemas mais óbvios desse argumento é que a mulher pode escolher
engravidar ou não (a menos que tenha sido vítima de um estupro; nesse caso a analogia é válida), por isso
teria responsabilidades. Além disso, o aborto mataria um feto sadio, ao passo que o violinista morreria em
decorrência da doença.

Bem-estar
Já do ponto de vista utilitarista, o bem-estar da pessoa, e não seus direitos, é que seria levado em conta na
decisão. Como o feto ou embrião não tem ainda consciência de bem-estar, o aborto seria um ato moral
aceitável. Outro grupo alega que isso privaria o bem-estar futuro desse feto, que em determinadas condições
se desenvolveria plenamente.

Em resumo, a discussão evolui em torno de estabelecer se o feto é uma pessoa e, como tal, possui direito à
vida - e se, mesmo que tenha esse direito, ele se sobrepõe ao da mãe em determinar o que fazer com o próprio
corpo. A escolha do aborto é sempre circunstancial, pois envolve vários outros aspectos, além dos filosóficos.
No entanto, são debates éticos que fornecerão base para a elaboração de leis sobre o aborto e para a criação
de políticas públicas.

Referências bibliográficas
 BENNETT, Rebecca et al. "Bioética, Genética e Ética Médica", em Compêndio de Filosofia. BUNNIN, Nicholas
e TSUI-JAMES, E. P. (org.). 2ª ed. São Paulo: Edições Loyola, 2007.
 GALVÃO, Pedro (org.). Ética do aborto: perspectivas e argumentos. Lisboa: Dinalivro, 2005.

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