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Necessidade versus ganância


14 Março2011  |  11:46

Jeffrey D.
Sachs

O grande líder moral indiano Mohandas Gandhi disse a famosa frase de que existe Terra suficiente para as
necessidades de todos mas não existe Terra suficiente para a ganância de todos. Mais do que nunca, a visão
de Gandhi está a ser posta à prova.

O mundo está a atingir o limite da utilização de recursos. Sentimos os seus impactos todos os dias em
cheias, secas e tempestades catastróficas - e consequente subida dos preços cobrados aos consumidores. O
destino depende agora se cooperamos ou somos vítimas de uma ganância auto-destrutiva.

Os limites à economia global são novos e resultam da dimensão, sem precedentes, da população mundial e
da expansão, nunca antes vista, do crescimento económico em todo o mundo. Actualmente, há sete mil
milhões de pessoas em todo o mundo, o que compara com apenas três mil milhões e meio há um século. O
rendimento médio per capita é 10 mil dólares, sendo 40 mil dólares nos países ricos e 4 mil dólares nos
países em desenvolvimento. Isto significa que a economia mundial está a gerar uma produção anual total de
70 biliões de dólares, face aos 10 biliões de dólares em 1960.

A economia chinesa está a crescer a uma taxa anual de 10%. A Índia está a crescer, aproximadamente, à
mesma taxa. Antes a região com mais baixo crescimento, África está agora a crescer a uma taxa média de
5% ao ano. No total, os países em desenvolvimento estão a crescer a uma taxa de 7% e as economias
desenvolvidas a 2%. Ou seja, a taxa média de crescimento da economia global é 4,5%.

Por muitas razões, estas notícias são boas. O rápido crescimento económico dos países em desenvolvimento
está a reduzir os níveis de pobreza. Na China, por exemplo, a pobreza extrema, que há 30 anos atingiu cerca
de metade da população, caiu, actualmente, para 10% ou menos.

No entanto, a história do crescimento global tem um outro lado que é necessário perceber claramente. Com a
economia mundial a crescer entre 4 a 5% ao ano, irá duplicar a sua dimensão em menos de 20 anos. Se
extrapolarmos a taxa de crescimento actual, a economia global, que hoje vale 70 biliões de dólares, irá
atingir os 140 biliões de dólares em 2030 e os 280 biliões de dólares em 2050.

Se deixarmos que a ganância prevaleça, o nosso planeta não terá capacidade para suportar este crescimento
económico exponencial. O peso da economia está já a ter impactos na natureza, a destruir rapidamente as
reservas de combustíveis fósseis que a natureza criou ao longo de milhões de anos, enquanto as alterações
climáticas têm provocado enormes instabilidades em termos de chuvas, temperaturas e tempestades
extremas.

Todos os dias, assistimos ao impacto destas pressões nos mercados. Os preços do petróleo superaram os 100
dólares por barril, à medida que a China e a Índia e outros países importadores de petróleo se juntam aos
Estados Unidos numa luta violenta pelas reservas, em especial do Médio Oriente. Também os preços dos
alimentos estão em máximos históricos, o que contribui para aumentar a pobreza e os distúrbios sociais.

Por um lado, há mais bocas para alimentar e, em média, com um maior poder de compra. Por outro lado, as
ondas de calor, secas, inundações e outros desastres provocados pelas alterações climáticas estão a destruir
as colheitas e a reduzir a oferta de sementes nos mercados mundiais. Nos últimos meses, a produção de
cereais de diversas regiões da Rússia e da Ucrânia foi atingida por violentas secas, enquanto enormes cheias
atingiram o Brasil e a Austrália; actualmente, outra seca está atingir a produção de cereais no norte da China.
Mas há uma questão muito perigosa e que é pouco falada. Em muitas áreas populosas do mundo, incluindo
as regiões produtoras de cereais do norte da Índia, do norte da China e do oeste norte-americano, os
agricultores estão a recorrer a águas subterrâneas para regar as suas colheitas. Os grandes aquíferos que
fornecem água para rega estão a esgotar-se. Em algumas zonas da Índia, o nível freático diminuiu vários
metros ao ano nos últimos anos. Alguns poços profundos estão próximos do ponto de esgotamento e prevê-
se um aumento da salinidade à medida que a água do oceano se infiltra nos aquíferos.

Sem mudanças, uma calamidade é inevitável. E é aqui que Gandhi entra em jogo. Se a nossa sociedade se
rege pelo princípio da ganância, com os ricos a fazerem tudo para serem mais ricos, a crescente crise de
recursos provocará um "gap" cada vez maior entre ricos e pobres - e possivelmente levará a uma luta cada
vez mais violenta pela sobrevivência.

Os ricos vão tentar usar o seu poder para obter mais terras, mais águas e mais energia e, se for necessário,
muitos vão apoiar meios violentos para o fazer. Os Estados Unidos já seguiram uma estratégia de
militarização no Médio Oriente com a ingénua esperança de garantir um abastecimento seguro de energia.
Agora, intensifica-se a competição por essas reservas, à medida que a China, a Índia e outros países
procuram os mesmos recursos (que estão a esgotar-se).

Uma tomada de poder semelhante está a ser tentada em África. O aumento do preço dos alimentos está a
levar a uma apropriação de terras, à medida que políticos poderosos vendem a investidores estrangeiros
grandes extensões de terras de cultivo, deixando de lado os direitos tradicionais dos pequenos agricultores
pobres. Os investidores estrangeiros esperam utilizar grandes explorações mecanizadas para gerar produtos
destinados à exportação, deixando pouco ou nada para as populações locais.

Em países como os Estados Unidos, Reino Unido, China e Índia, os ricos desfrutaram de rendimentos cada
vez mais elevados e de um crescente poder político. A economia norte-americana está refém de
multimilionários, da indústria petrolífera e de outros sectores chave. As mesmas tendências ameaçam as
economias emergentes, onde a riqueza e a corrupção estão a aumentar.

Se a ganância prevalecer, o motor do crescimento económico vai esgotar os nossos recursos, marginalizar os
mais pobres e levar-nos a uma profunda crise económica, política e social. A alternativa é um caminho de
cooperação social e política, tanto a nível nacional como internacional. Haverá suficientes recursos e
prosperidade se utilizarmos fontes de energia renováveis, práticas agrícolas sustentáveis e um regime
tributário razoável para os ricos. Este é o caminho da prosperidade partilhada através de melhores
tecnologias, justiça política e consciência ética.

Jeffrey D. Sachs é professor de Economia e director do Instituto da Terra na Universidade de Columbia


University. Sachs é também conselheiro especial do secretário-geral das Nações Unidas para os Objectivos
de Desenvolvimento do Milénio.

© Project Syndicate, 2010.


www.project-syndicate.org
Tradução: Ana Luísa Marques

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