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Esta seção tem procurado apresentar artigos que analisem Buscando uma definição para
conceitos científicos de interesse direto dos químicos de forma o calor
crítica e atualizada.
Tanto a física quanto a química inte-
Neste artigo, os autores têm por objetivo focalizar a utilização do
ressam-se pelo estudo das trocas tér-
conceito de energia na química, especialmente no que se refere aos
micas entre os corpos. Francis Bacon
processos de troca de calor. Assim, questionam como vem sendo
(1561-1626), um dos fundadores da
utilizada a expressão ‘energia química’, o que contribui para
ciência experimental moderna, buscou
analisarmos como, de forma geral, lidamos acriticamente com as
reunir elementos que pudessem expli-
definições da ciência.
car a natureza e melhor colocar o calor
a serviço da humanidade. Investigador
energia química, calor, energia
meticuloso, Bacon propôs que fossem
listados todos os fenômenos em que
ele estivesse presente e também aque-
D
esde que o ser humano surgiu entre outras realizações. Todavia, se les em que estivesse ausente. Depois, 19
na face da Terra, deparou com entendermos por química não um passou à elaboração de uma terceira
estranhos fenômenos que ho- conjunto de técnicas de manipulação lista (ou tábua, conforme sua própria
je dizemos estar ligados ao conceito e produção de materiais e sim uma denominação), com o objetivo de dis-
de energia. Dentre eles, possivelmente ciência que articula planos de investi- tinguir os graus de manifestação mais
o fogo foi o mais impressionante. Do- gação empírica a modelos explicativos ou menos intensa.
miná-lo significava dar um grande pas- racionais, é preciso responder que o
so para lidar com a escuridão, o frio e começo só se dá efetivamente com Se entendermos por
outras situações pouco confortáveis Boyle, no século XVII. química não um
impostas pela natureza. Por que razão com ele e não com conjunto de técnicas
A importância do fogo para os se- outros? Toda demarcação tem seus de manipulação e
res humanos foi tal que diferentes mito- critérios (que inclusive podem ser produção de materiais
logias fizeram relatos dele. Os antigos questionados), mas, em função do que e sim uma ciência que
gregos, por exemplo, consideravam- foi dito, as palavras do próprio Boyle articula planos de
no propriedade dos deuses. Quando são esclarecedoras: investigação empírica
o titã Prometeu1 roubou o fogo sagrado a modelos explicativos
de Zeus para ofertá-lo aos seres huma- “Os químicos se têm deixado
guiar até agora por princípios racionais, é preciso
nos, sofreu na carne o peso da ira divi- responder que o seu
na: condenado a viver acorrentado a estreitos e sem nenhum alcance
começo só se dá
um rochedo, tinha seu fígado devorado elevado. A preparação de medi-
efetivamente com
por um abutre todos os dias2. Uma vez camentos, a extração e a trans-
Boyle, no século XVII
comido pela ave, o órgão se regene- mutação de metais era seu ter-
rava durante a noite para novamente reno. Eu trato de partir de um As tábuas baconianas pretendiam
lhe servir de alimento ao amanhecer. ponto de vista completamente arrolar observações isentas de qual-
Tendo aprendido a fazer a queima distinto, pois considero a quí- quer teorização prévia. Assim, tocar em
(cujo princípio só seria estabelecido mica não como um médico ou um recipiente contendo cal virgem
muitos séculos mais tarde por Lavoi- um alquimista, mas como deve (óxido de cálcio) logo após a adição
sier), será que o ser humano teria considerá-la um filósofo. Tracei de água ou manusear o esterco recen-
começado a fazer química? À primeira um plano de filosofia química te de um cavalo eram experiências que
vista somos tentados a dizer que sim, que espero completar com mi- acusavam a presença do calor. Por
uma vez que o domínio das técnicas nhas próprias experiências e outro lado, perceber que certos metais
de combustão permitiu o desenvolvi- observações.” (apud Papp e (ouro, por exemplo) não produziam ca-
mento da cerâmica e da metalurgia, Prelat, 1950, p. 56-57). lor sensível quando dissolvidos pela
Resenha
Conversando sobre ciência, caminhos têm percorrido. Como em O diálogo que se evidencia na es-
ética e cultura na educação qualquer conversa, torna-se dessa trutura é perseguido, com sucesso, no
maneira instigante sabermos inicial- conteúdo e na forma dos textos, por
Em tempos de globalização, nos
mente com quem conversamos e de meio dos quais somos levados a parti-
22 quais a relevância da produção da
que lugar falam nossos parceiros. cipar de discussões críticas sobre
ciência é, muitas vezes, dissociada de
Além dos organizadores do livro, pas- temas como currículo e políticas curri-
suas dimensões éticas, culturais e hu-
samos a conhecer Alice Casimiro Lo- culares, provisoriedade e falibilidade
manas, é estimulante ter contato com
pes, Antonio Flavio Moreira, Eduardo das noções científicas, impacto das
uma obra como Ciência, ética e cultura
Mortimer, Gelsa Knijnik, Marcelo novas tecnologias sobre o papel e a
na educação, organizada por Attico
Giordan, Nélio Bizzo, Otavio Maldaner, formação docente, o diálogo entre lin-
Chassot e Renato José de Oliveira.
Roseli Schnetzler, Tarso Mazzoti e guagem científica e linguagem cotidia-
Aqui, não há lugar para a frieza e o arti-
Wildson dos Santos. Muitos deles fa- na, problemas ‘da vida real’ e educa-
ficialismo de discursos impessoais so-
bre o conhecimento ou a noção de que zem parte da comunidade de autores ção, opções éticas, fazer científico e
este se constitui em produto acabado, que, assim como os organizadores, já liberdade, entre outros, tratados em
elaborado por seres dotados de inteli- escreveram artigos para Química Nova linguagem clara, farta de exemplifica-
gência superior aos quais se deve res- na Escola e alguns são inclusive ções. Ao final, encontramos uma ses-
peito e veneração. Ao contrário: o con- editores associados desta revista. são “Para saber mais”, com sugestões
vite ao diálogo, à conversa, à constru- Em seguida, primeiros leitores e bibliográficas amplamente comenta-
ção mútua dos textos é expresso logo leitoras com perfil próximo ao do das.
na brilhante introdução, na qual fica público-alvo tecem considerações A voz que une as diferentes vozes
claro que a intenção do livro não é “que iniciais sobre os textos. Encontram-se, na tessitura do livro é uma que des-
se faça a luz”, mas sim que “se esta- dessa forma, abertos os canais de confia de discursos dogmáticos e
beleça o diálogo”. participação para todos nós, leitores e autoritários, que clama pela iluminação
De fato, voltado para professores e leitoras, nas conversas sobre ciência, da ciência pela ética, que exorta à
professoras do ensino fundamental e ética e cultura no fazer em educação. transformação da educação em um
médio, o diálogo não se resume a uma A utilização da Internet no processo de processo voltado ao resgate da cida-
intenção: a própria estrutura do livro já produção do livro e seu potencial co- dania e ao desafio das exclusões. É a
revela um caminho original para que mo veículo para o sonhado segundo esse coro de vozes que somos convi-
se viabilizem essas trocas entre edu- volume — fruto das múltiplas conver- dados a unir as nossas. Vale a pena
cadores e educadoras. Nesse cami- sações que certamente ocorrerão — aceitarmos o convite!
nho, antes de mergulharmos nos textos indica a apropriação crítica da informá- (Ana Canen, professora adjunta da
dos 12 autores, somos inicialmente tica para a construção de novas for- Faculdade de Educação da UFRJ)
apresentados a eles: são os próprios mas de pensar a relação escrita– Ciência, ética e cultura na edu-
autores que nos revelam alguns de leitura, ressaltando a originalidade e cação. CHASSOT, Attico & OLIVEIRA,
seus dados biográficos, quem são, fecundidade do livro que ora recomen- Renato José de (orgs). São Leopoldo:
quais suas áreas de interesse, que damos ao público. Unisinos, 1998. ISBN 85-85580-83-6.