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Imagens no espelho: reflexdes sobre a pratica docente Betania Passos Medrado “Na verdade, a linguagem existe para que as pessoas possam relatar a estria de suas vidas, eventualmente mentir sobre elas, expressat seus desejos e temores, tentar resolver problemas, ava- liar situagdes, influenciar seus interlocutores, predizer o futuro, planejar agdes.” Margarida Salomao Para Maturana e Varela (2003), 0 espelho, metaforicamente representando a capacidade de reflexdo, é um bom exemplo para se pensar na linguagem enquanto faculdade poderosa que possuimos para entender as nossas agdes no mundo, lembrando que elas resultam das nossas mais diversas interacdes. Ao contrario de outros animais, o homem é capaz de relacionar a imagem tefletida no espelho a sua propria existéncia e consciéncia, por mais que a imagem lhe cause estranheza ou o surpreenda. ‘Ao tera chance de descrever e interpretar a propria pratica — de se olhar no espelho -, o professor pode, através do seu discurso, nao apenas descons- truir seu habitus didatico (BourDiEU, 1991), mas também influenciar as re- presentacdes que um grupo todo tem do processo de ensino e aprendizagem. Esta é a grande importancia do discurso como impulsionador de praticas transformadoras (FaincLouGH, 2001, 2003). Esta éa concep¢ao que temos de linguagem, que esta, inerentemente, vinculada a uma reflexdo sobre a cons- trucao do conhecimento do professor, visto que os sentidos esto vinculados as escolhas discursivas que fazemos e na forma como significamos o mundo (Satomao, 1999). Neste capitulo, buscamos, por meio de narrativas orais de professoras de Lingua Inglesa, observar como elas atribuem sentidos ao seu fazer pedagdgico 92 Linguistica aplicada e reconstroem suas agdes durante um processo de espelhamento. Este trabalho, resultado de uma pesquisa de doutorado, serviu de gatilho para o projeto “Pra- ticas discursivas e construgao identitaria de professores em desenvolvimento”, vinculado ao Programa de Pés-graduagaio em Linguistica — PROLING/UFPB. Assim, organizamos este capitulo em seis segdes, nas quais discorreremos sobre 0 projeto e suas propostas de investigagao; o marco tedrico que serviu de base para a andlise do corpus; os instrumentos utilizados para a coleta de dados e a anilise qualitativa dos dados. Um projeto O projeto citado anteriormente nasce da convicgao de que hoje temos 0 compromisso cientifico na Linguistica de fazer pesquisa observando a lingua como situada e conduzida por uma realidade sociocultural, que esta, imprete- rivelmente, atrelada a atividade humana. Consideramos que o professor constréi o mundo da sua pratica docente e as representagdes que tem de si mesmo a partir das leituras (reflexdes) que faz das suas mais diversas experiéncias. Nesse momento, seu mundo de significa- des é criado ou, usando termo de Marcuschi, discretizado. Segundo esse autor, o mundo comunicado é sempre fruto de uma agdo cognitiva e nado de uma identificagaio de realidades discretas aprendidas diretamente. O mundo éum continuo de sensagdes e a realidade empirica nao tem um contorno imediatamente apreensivel. A ago de discretizagao do mundo na forma como 0 comunicamos € um trabalho sociocognitivo sistemdtico (Marcuscui, 2003, p. 47). Nos Ultimos anos, principalmente a partir da década de 1990, as vozes de professores tém-se manifestado através de textos escritos ¢ orais (video- biografias, narrativas, relatos autobiograficos), que sao resultantes das mais diversas possibilidades de olhar para a pratica. Pensando na importancia de um discurso de professores que parece legitimar a meméria profissional, optamos por fazer dos relatos de professores de Lingua Inglesa da tede publica 0 nosso objeto de investigagio. Os relatos autobiograficos — ou narrativas — permitem que elaboremos explicagdes sobre as imagens que, socialmente, o professor constr6i de si mesmo e do seu trabalho. Com isso em mente, acreditamos que 0 discurso dos professores nao pos- sui uma relacao objetiva com um mundo exterior, Unico e tangivel, isto é, nao Imagens no espelho 93 retrata uma realidade a priori, como nos alerta Marcuschi na citagéo anterior. A partir desse raciocinio, acreditamos que nfo podemos deixar de considerar que entre o ser humano e o mundo que ele constrdi existe a nossa capacidade cognitiva de organizago e construg4o conjunta das experiéncias. Essa capa- cidade envolve a memoria dos professores, seu raciocinio, suas interagdes sociais e suas emogdes, que vém a tona no discurso sobre si mesmos. Pesquisas que enfocam a relagao entre linguagem e conhecimento tém legitimado a ideia de que tal relagdo se da de maneira integrada com as agdes, as crengas e os propdsitos que temos no nosso convivio social. Dito isso, vemos que nao é interessante isolar 0 discurso dos relatos autobiograficos e analisd-lo fora do seu contexto sécio-histérico, haja vista que a linguagem nao é autonoma nem independente de outras habilidades humanas (Lakorr, 1977), como 0 afeto, as emogées ¢ as crengas. Portanto, faz-se necessario que olhemos para os relatos como um espago no qual as professoras constroem suas identidades, organizam e dao sentido as suas experiéncias.? Dentre os pesquisadores contemporaneos que tratam a cognigao como um evento social, encontra-se Tomasello (2003), 0 qual sustenta que a cogni¢ao éa“[...] capacidade de cada organismo compreender os coespecificos como seres iguais a ele, com vidas mentais e intencionais iguais as dele” (Toma- SELLO, 2003, p. 7). O olhar que Tomasello langa a cogni¢ao implica a ideia de que os individuos se imaginam na pele mental do Outro, a fim de que nao sé aprendam do Outro, mas através do Outro, permitindo que compreendamos que os outros fazem escolhas, ¢ que estas sao motivadas por uma representagao mental que elaboramos de algum objetivo ou meta. Tomasello (2003) atesta que o ser humano difere de outras espécies ani- mais, principalmente por sua capacidade de combinar, transformar, adaptar e transmitir conhecimentos adquiridos aos coespecificos através do processo de sociogénese e evolucao cultural cumulativa. Entender 0 Outro como agente intencional igual a si mesmo possibilita, ao pesquisador, a existéncia de pro- cessos através dos quais os individuos colaboram entre si para criar artefatos e praticas culturais, gerando, também, processos de aprendizagem cultural e internalizagao. Para esse autor, a linguagem nao cria novos processos cognitivos do nada, € claro, mas quando as criangas interagem com outras pessoas intersubjetivamente e adotam suas convengées comunicativas, esse processo social cria uma nova forma de representago cognitiva —uma forma que nao encontra contrapartida em outra espécie animal (TomasELto, 2003, p. 298).

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