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MANIFESTO CONTRA A LEI DE TORTURA DOS EUA

Por Ticiano Alves e Silva; Oacir Silva Mascarenhas; Daniel Leite


Ribeiro e Rodrigo Tourinho Dantas.
Acadêmicos do 8º Período da Faculdade de Direito da Universidade
Católica de Salvador (UCSAL).

A insensatez parece não ter mais limites! No dia 29 de setembro de 2006,


sexta-feira, com apenas uma canetada, o tal George W. Bush sancionou uma lei que
liquidou um patrimônio constitucional edificado ao longo de séculos ao custo de muito
sangue e de muitas vidas.

O Ato das Comissões Militares de 2006, ou Lei n. 3.930, ou ainda Lei dos
Detentos, institui legislação própria para tratamento de suspeitos de terrorismo
(pasmem: eles não estarão sujeitos à Constituição!), prevendo, dentre outras
inconstitucionalidades (?), tribunal militar de exceção, poderes ao tal George W. Bush
de definir quem são os “combatentes inimigos” e quais métodos de interrogatório são
aceitáveis, desde que eles não causem danos físicos "sérios" ou psicológicos
"permanentes", além de desobrigar o Inquisidor Mor de tornar públicos seus critérios.

Conclui-se, pois: RELATIVIZOU-SE O IRRELATIVIZÁVEL:


LEGALIZARAM A TORTURA! Afinal, como já ensinara Bobbio, o único direito
absoluto é o direito de não ser submetido à tortura. Mas o lamento ganha contornos de
consolo diante da pior das constatações: PIOR NÃO PODE FICAR.

No livro “Diário de um Século”, o notável Norberto Bobbio conta um


episódio marcante em sua vida que o fez chegar a conclusão da irrelativização do direito
à não-tortura. Conta o jusfilósofo que durante o regime fascista de Mussolini ele foi
obrigado pelo ditador a redigir do próprio punho uma carta de apoio ao regime
totalitário. Sob ameaça de ser torturado, assim ele o fez. Nessa sua autobiografia, pede
desculpas a todos os intelectuais da época por ter sucumbido ao medo da tortura:
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“O intelectual tem o dever de lutar pela liberdade, enfrentando, se


necessário, a fogueira que queima o corpo e purifica a alma; a tortura que esmigalha
cada centímetro da carne e dos ossos e faz explodir o grito da dor nas ruas e nas
catedrais, nas tribunas e nas sinagogas, levando multidões a rasgar regras de
inquisições, a derrubar bastilhas e incendiar bunkers, a levantar bandeiras de
liberdade até então arriadas”.

A prática ignóbil e abjeta da tortura deveria, hodiernamente, ser apenas um


registro histórico. Como é sabido, essa prática não é recente. As mulheres chinesas
foram torturadas por séculos para atingir o ideal dos pés pequenos; os condenados
franceses passaram por suplícios sangrentos, como relata Michel Foucault em “Vigiar e
Punir”; os métodos empregados na Inquisição para obter confissões eram de uma
crueldade sem precedentes e a repressão dos regimes totalitários aos dissidentes sempre
foi feita ao custo de muito sangue e muita dor frutos da tortura. Cesare Beccaria, na
segunda metade do século XVIII, no opúsculo “Dos Delitos e Das Penas” fere de morte
todos os argumentos que tentaram legitimar a tortura (Beccaria defendia que a prática
da tortura era inútil contra o criminoso comum e injusta como tormenta do inocente).
MAS QUANDO SE PENSA QUE A TORTURA É FATO PASSADO...

A despeito do retrocesso jurídico, humano e filosófico perpetrado nesta


última sexta –feira nos EUA, o repúdio à tortura está consagrado nos mais importantes
documentos de direitos do mundo, sejam eles constituições, convenções, declarações,
acordos, ou o que for, porquanto a hediondez característica de tal prática odiosa
desautoriza que se lhe admita como aceitável, como agora se quer na Terra da
Liberdade.

Impressiona que a Terra da Liberdade caminhe em direção oposta a que


justamente deveria, a realizar, sem coações, o que almeja declaradamente os terroristas
com tanta violência: a destruição da sociedade ocidental e de seus valores, o que inclui,
por óbvio, seu sistema constitucional fundado na dignidade humana.
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Num mundo sofrido, marcado por tantas guerras e disputas, no qual se luta
sempre por um futuro melhor para as próximas gerações, não há como se cogitar um
posicionamento de uma Nação tão desprovido de sapiência.

Martin Luther King, Mahatama Gandhi, dentre muitos outros, dedicaram


suas vidas à princípios como a liberdade, a paz, a igualdade. Do seu sangue brotaram,
para nós, os valores que hoje temos como intocáveis, inatingíveis. A positivação de uma
norma diametralmente oposta a tudo aquilo conquistado pela Sociedade ao longo do
tempo é apagar o passado, esquecer a História, ir contra a maré de progressos
alcançados com tantos esforços.

Nada mais que paradoxal- é uma das formas como se pode entender a
excrescência jurídica perpetrada pela maior potência mundial.

O mais triste neste atentado ao patrimônio constitucional secular é que ele


foi perpetrado no país em que a doutrina dos direitos humanos é mais desenvolvida e
sólida, confirmando a tese segundo a qual os EUA são a terra do paradoxo. A terra em
que os valores ocidentais de liberdade foram desenvolvidos e protegidos ao extremo
sucumbe diante da ameaça dos terroristas, sem se perguntar se legalizar a tortura não é o
maior dos atentados terroristas.

Terrorismo, segundo os dicionários, é O USO DO TERROR E DA


VIOLÊNCIA COMO MEIO DE COAÇÃO. E esta prática da tortura nos
interrogatórios nada mais é do que o terror e a violência aplicados institucionalmente
como meios de coação a fim de se arrancar a fórceps informação (verdadeira ou falsa,
não importa) que possa pôr enjaulado àquele tido como simplesmente “suspeito” ou
“combatente inimigo”, sem saber ao certo o que vem a ser isso, já que os critérios do tal
George W. Bush nascem no seu íntimo e lá permanecem, porquanto a Lei de Tortura
garante aos cidadãos o DIREITO DE NÃO SABER. ENFIM, TERRORISMO E
TORTURA SÃO FACES DA MESMA MOEDA!!!

Reitera-se que esse é apenas um aspecto, o pior deles, diga-se, que se extrai
da Lei de Tortura aprovada. Mas o simples fato da lei conceder ao Mr. Enxofre (talvez o
presidente venezuelano Hugo Chávez o chamasse assim) o poder de definir quem são os
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“combatentes inimigos” já é de fazer estremecer o mais duro dos tiranos. Cláusula mais
generalíssima do que esta nunca se viu na história do Direito e aliada à reserva mental
absoluta do tal George W. Bush na escolha dos critérios a serem escolhidos no combate
ao terrorismo leva-nos a pensar para onde vai o Direito. Expressões como estas nada
mais são que manipulações semânticas carregadas de um subjetivismo autorizador de
arbítrio desmesurado e, pior de tudo, incontrolável.

De igual modo acontece quando se prevê métodos de interrogatório que não


causem danos físicos “sérios” ou psicológicos “permanentes”, em que a imprecisão do
que venha a ser “sério” e “permanente” franqueia as piores arbitrariedades. Mas a
questão definitivamente não é essa. Ainda que o dano físico não seja sério ou o
psicológico não seja permanente, tal prática não desnatura o ato de tortura, estando esta
configurada e devendo, pois, ser repudiada até o fim!

Cumpre ressaltar que, infelizmente, o tal George W. Bush já demonstrou há


muito sua inaptidão para lidar com o terrorismo e seu desprezo por valores universais.
Basta relembrar, para tanto, a conivência com que foram processados e julgados os
militares norte-americanos que fizeram da prisão em Abu Graib um genuíno castelo dos
horrores, em que as mais perversas práticas de tortura foram consumadas. Mesmo com
amplíssima divulgação midiática, nada se fez e não se espera que se faça, inda mais
agora que trataram de institucionalizar a mais abominável das violações aos que se
chama de Direitos Humanos.

Em termos práticos, questionamos a eficácia da referida medida. Qual o


benefício que essa funesta lei trará no combate ao terrorismo? Nenhum!, porque o
terrorismo, pelo menos o não-institucionalizado, não se vê, até que perpetre o ataque.

Tem-se, pois, como balanço geral, à luz de uma análise jurídica, filosófica,
sociológica, histórica, política, até pragmática, enfim, geral, como inaceitável a
legalização do último direito irrelativizável, qual seja, a não- tortura, representando tal
institucionalização verdadeiramente um atentado à consciência ética universal, com
repercussões maléficas sobre todo o mundo, e não somente dentro das fronteiras norte-
americanas.
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Ora, quando se toma conhecimento de uma violação aos Direitos Humanos,


ainda mais sobre os auspícios do Estado, onde quer que seja, contra quem quer que seja,
pensa-se, sempre, invariavelmente, mesmo que remotamente, que tal poderia ser feito
contra si, e também por isso tais direitos são chamados de humanos e tidos como
universais e sua violação desperta revolta.

As conseqüências, lá e cá, do baque sofrido pelo constitucionalismo


democrático de direito com a aprovação da Lei de Tortura não podem ainda ser
avaliadas, mas a revolta que nos tomou imediatamente à notícia de tal aprovação
legislativa não pode ser medida, senão pela leitura do quanto manifestado nestas
apressadas linhas e pelo desejo que temos todos de ver repercutido tal atentando ao
patrimônio constitucional. INSTAMOS TODOS À REFLEXÃO PELA
VALORIZAÇÃO E PELA PRESERVAÇÃO DAS CLÁUSULAS
CONSTITUCIONAIS SUPRANACIONAIS QUE SE PRETENDEM
IMUTÁVEIS!!, para que também Bobbio possa descansar em paz.

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