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NOGUEIRA, Natania A. S.
natanianogueira@yahoo.com.br
Resumo
As histórias em quadrinhos têm conquistado um grande espaço dentro das escolas. Como um
instrumento de ensino, elas estão se tornando instrumentos importantes de introdução dos
alunos no mundo da leitura e do conhecimento. O Projeto Gibiteca Escolar, desenvolvido na
Escola Municiapal Judith Lintz Guedes Machado, Leopoldina (MG), usa deste instrumento
lúdico como uma ponte entre o estudante e o mundo das idéias, da criatividade e dos sonhos,
abrindo caminho para a formação de pessoas conscientes do seu papel na sociedade.
Introdução
Há algum tempo, o papel do professor das séries mais avançadas do ensino
fundamental era limitado a desenvolver o conteúdo com o qual trabalhava na sala de aula –
história, geografia, matemática, ciências, etc. –, sem se preocupar com algo fundamental: a
leitura e a interpretação. Estas eram habilidades que deveriam se desenvolvidas tão somente
nas aulas de português e literatura. No entanto, temos hoje uma realidade muito mais
complexa: nossas crianças e jovens lêem pouco e geralmente são incapazes de compreender o
que estão lendo.
Entendemos que a leitura é a chave para o desenvolvimento do aluno na escola.
Através da leitura ele aprende a interpretar melhor o mundo em que vive e a despertar a
imaginação e a criatividade. Um aluno/leitor compreende melhor os conceitos abstratos com
os quais tem que lidar na sala de aula. Esta habilidade deve ser desenvolvida já na Educação
Infantil1 e durante todo o Ensino Fundamental. Tendo em mente usar a leitura como uma
ponte para o conhecimento, foi concebido o Projeto Gibiteca Escolar, na Escola Municipal
Judith Lintz Guedes Machado, uma escola de periferia da cidade de Leopoldina (MG), que
atende alunos oriundos de famílias de baixa renda.
1
Incluímos aqui a educação infantil pois, mesmo não estando alfabetizadas, as crianças fazem uma leitura do
mundo através de imagens e da sua oralidade, sendo portanto a leitura à qual nos referimos um conceito bem
mais amplo e abrangente.
175
2
GONÇALVES, Jussemar Weiss . O campo da história na Escola Pública. In: Qual história? Qual ensino?
Qual cidadania? – Porto Alegre: ANPUH, Ed. Unisinos, 1997, p. 77
176
Não temos uma fórmula mágica, uma solução pronta sobre o conteúdo a ensinar,
mas sim uma proposta de como trabalhá-lo. O conteúdo que você irá desenvolver na
sua classe, ou seja, o seu objetivo de estudo, só pode ser determinado por você, em
sua atividade profissional concreta, a partir dos dados da realidade da sua escola, seu
período letivo, seus alunos[...]3
O ensino no Brasil não vai bem. É um fato inegável. As novas gerações não estão
“letradas”. Nossos jovens não criaram o hábito da leitura e por isto possuem uma grande
dificuldade em fazer associações, em interpretar textos simples, em compreender o que pedem
os professores, o que está escrito nos livros. Desta forma a aprendizagem acaba ficando
comprometida e o fracasso se não se faz visível nos índices de retenção escolar, aparece
claramente nas avaliações globais realizadas pelo Estado, devido à incapacidade no ato de ler.
Saber ler e escrever não é simplesmente o ato mecânico de juntar sílabas e emitir sons.
A leitura é uma atividade complexa que exige do leitor a capacidade de interpretar o texto; de
identificar e compreender o contexto no qual ele está inserido; de identificar idéias e signos
nele contidos. Nas palavras de Platão e Fiorin:
3
CABRINI, Conceição et. alii. O Ensino de História: revisão urgente.- 5. ed. São Paulo: Brasiliense, 1994,
p.32
4
FIORIN, José Luis, SAVIONI, Francisco Platão. Para entender o texto: leitura e redação. 2a edição – São
Paulo: Editora Ática, 1991, p. 13.
5
CALAZANS, Flavio Mario de Alcântara. História em quadrinhos na escola. – São Paulo: Paulus, 2004. p.
11.
177
O hábito da leitura de quadrinhos, além de ser saudável, pode estimular o prazer pela
leitura. Em geral são os maus leitores que criticam as histórias em quadrinhos. Segundo DJota
Carvalho, várias pesquisas sobre a relação entre quadrinhos e educação já foram realizadas
Uma delas encomendada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação
(CNTE), em 2001, comprovou que:
[..]. alunos que lêem gibis têm melhor desempenho escolar do que aqueles que usam
apenas o livro didático – entre os estudantes da 4ª série da rede pública, a HQ
aumenta significativamente a performance do aluno: entre os que acompanham
quadrinhos, o percentual das melhores notas nas provas aplicadas foi de 17,1%,
contra 9,9% entre os que não lêem. Mais ainda, esta pesquisa mostra que
professores que lêem revistas em quadrinhos obtêm melhor rendimento dos alunos,
pois conhecem melhor o universo dos estudantes e se aproximam deles usando
exemplos deste universo como paradigma para as aulas. A pesquisa mostra , entre
outras coisas, que , entre os alunos da 4ª série cujos professores lêem HQs, a
proficiência em leitura é mais alta do que entre aqueles cujos professores não têm o
hábito de ler gibis. Na rede pública, 36% dos alunos de leitores de gibis têm
proficiência média alta e alta, contra 31,5% dos que não lêem.7
Uma das vantagens de se trabalhar com histórias em quadrinhos é que elas não
possuem uma faixa etária exata: há quadrinhos para todas as idades, da educação infantil até a
universidade. Na Europa, por exemplo, ensina-se latim usando-se Asterix. Asterix e outras
HQ’s européias são publicadas em latim com esta finalidade e com uma tiragem relativamente
grande. O preconceito que existe com relação aos quadrinhos é construído em cima da idéia
de que eles são coisa de criança ou, em alguns casos, coisa de menino. Há HQ’s de todos os
gêneros e para todos os gostos. Algumas são adaptações de clássicos da literatura, outras
possuem um argumento tão complexo que são indicadas para adultos com um certo grau de
conhecimento literário.
6
ALVES, José Moysés. Histórias em quadrinhos e educação infantil. Psicol.cienc. prof. Brasília, vol..21,
num.3, set. 2001. Disponível em: < http://scielo.bvs-psi.org.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-
32001000300002&lng=pt&nrm=is>. Capturado em: 05/02/2006.
7
CARVALHO, DJota. A educação está no gibi. – Campinas, SP: Papirus, 2006. p. 38-39.
178
Como professora de História, tenho feito algumas experiências com o uso de HQ’s
com meus alunos, tanto no Ensino Fundamental, quanto no Ensino Médio. O estudante deve
aprender a trabalhar as informações que adquire através da leitura. Uso os quadrinhos como
uma forma de expressão do aluno que, desafiado a exercitar sua capacidade criativa, acaba
por criar seu próprio conhecimento. As HQ’s ajudam os estudantes a compreender melhor o
conteúdo estudado em sala de aula.
Os bons resultados obtidos com meus alunos foram a motivação para que um projeto
ainda mais ambicioso fosse então concebido: a criação de uma gibiteca10. Não apenas um
espaço dentro de uma biblioteca, mas um espaço exclusivo para armazenar e manusear HQ’s.
Propus, então, à diretoria da escola Municipal Judith Lintz Guedes Machado e aos colegas
professores da Educação Infantil e do Ensino Fundamental que aderissem ao projeto. Por
8
ALVES, José Moysés.Op. Cit. , 2001.
9
SILVA, Diamantino da . Quadrinhos para Quadrados. Porto Alegre; Bels, 1979. p. 106
10
Grosso modo, a gibiteca é um espaço destinado ao armazenamento e divulgação de Histórias em Quadrinhos,
que pode ser público ou não. Nas gibitecas os leitores têm acesso a uma enorme variedade de quadrinhos (terror,
ficção científica, humor, aventura, etc.) e nelas este tipo de material literário pode receber um tratamento
apropriado, que inclui a conservação de exemplares, de publicação recente, ou aqueles considerados raros. A
primeira gibiteca inaugurada no Brasil foi a Gibiteca de Curitiba, em 1982. A maior gibiteca do Brasil é mantida
por um organismo do Estado: a Gibiteca Henfil. Órgão do Departamento de Bibliotecas Infanto-Juvenis da
Secretaria de Cultura do município de São Paulo, ela foi inaugurada em 1991 e conta com o maior acervo do
país, 100.000 exemplares.
179
11
A Gibiteca da USP, através do professor Waldomiro Vergueiro fez importantes doações para a Gibiteca
Escolar, ainda no ano de 2006.
12
O I Seminário sobre Quadrinhos, Leitura e Ensino foi realizado no dia 18 de maio de 2007 e teve a
participação dos professores: Waldomiro Vergueiro (USP), Octavio Aragão (UFES), Arthur Soffiat (UFF) e
Valéria Fernandes (Colégio Militar de Brasília).
180
década de 1970. Os alunos, principalmente as crianças dos anos iniciais, sentem-se atraídos
pelo ambiente despojado e alegre da gibiteca, onde eles podem desenhar, deitar no tapete em
meio a almofadas e transformar a leitura numa forma prazerosa de lazer. Para os adolescentes,
ela se torna igualmente um lugar de descontração, principalmente para meninos e meninas
que gostam de desenhar e usam o desenho como uma forma de expressão de seus sentimentos
e suas idéias. As HQ’s estimulam esta habilidade e acabam transformando o desenhista em
leitor.
A gibiteca age como um canalizador de sonhos. Ela transporta os leitores a um mundo
de fantasia do qual ele estava até então alienado. Muitas de nossas crianças nunca tiveram em
sua casa uma HQ. Entre os adultos que estudam no EJA (Educação para Jovens e Adultos)
poder ler uma história em quadrinho na escola é muitas vezes vivenciar uma atividade da qual
foram excluídos durante sua infância, seja por motivos econômicos, seja pela cultura familiar
ou simplesmente por não saberem ler e escrever.
Em um artigo intitulado “Educar é fazer sonhar”13 Francisco CARUSO e Maria
Cristina Silveira de FREITAS afirmam que educar depende da capacidade de fazer o aluno
sonhar e afirmam que despertar nele a criatividade é a melhor forma de prepará-lo para os
desafios da vida, pois no mundo moderno ela é necessária para a sobrevivência. Atrevo-me a
acrescentar que, além de fazer o aluno sonhar, é preciso fazer o professor sonhar junto com
ele.
As Primeiras Experiências
Há na gibiteca um espaço reservado para o professor, onde ele pode dispor de
periódicos e livros que versam sobre o uso das HQ’s na sala de aula e, também, relatos de
experiências que já foram realizadas na escola. Além de material impresso, contamos com
textos digitalizados, produzidos por educadores e pesquisadores de todas as partes do país,
centenas de tirinhas e HQ’s digitalizadas. Os professores são estimulados a conhecerem cada
vez mais o universo dos quadrinhos para que, desta forma, eles possam compreender melhor o
próprio universo dos seus alunos leitores e, ao mesmo tempo, ter mais segurança para usar
este material na sala de aula.
Alguns destes recursos estão sendo ainda timidamente utilizados, pois os professores,
em sua esmagadora maioria, ainda estão participando de um lento processo de inclusão
digital. Entretanto, o simples fato da Gibiteca estar oferecendo meios ao professor de
13
CARUSO, Francisco, FREITAS, Maria Silveira de. Educar é fazer sonhar. Princípios, São Paulo, Vol. 83,
p., 2006.
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ingressar no mundo da informática já é um grande estímulo para o trabalho. Além disto, neste
primeiro momento os professores também estão sendo apresentados aos quadrinhos. Para
trabalhar com este recurso é preciso entender como ele é produzido. Desta forma preparamos
para os professores da Educação Infantil e dos anos iniciais do Ensino Fundamental oficinas
de quadrinhos. Nestas oficinas – que também foram preparadas para alunos entre 11 e 15 anos
-, eles aprendem o processo de elaboração de uma HQ e a decifrar e usar os elementos que a
compõe, tais como balões, metáforas visuais, recordatórios, etc.
Segundo Nágila Caporlingua GIESTA, da Fundação Universidade Federal do Rio
Grande - FURG, que trabalha HQ’s e educação ambiental, vivemos em uma sociedade cada
vez mais escrita, onde a leitura é uma atividade de integração. Sendo assim, as HQ’s são um
recurso a mais na inserção das crianças no mundo das letras, dependendo do professor
encontrar o caminho para introduzir o aluno neste universo. Citando Giesta: “As
possibilidades das histórias em quadrinhos, como recurso no currículo escolar, são inúmeras,
dependendo do conhecimento e da habilidade profissional do professor para diversificar,
questionar e provocar a busca da informação destacada pelo leitor.”14
Aos poucos estão surgindo experiências que vão apresentando bons resultados no uso
dos quadrinhos na sala de aula, através da Gibiteca Escolar da Escola Municipal Judith Lintz
Guedes Machado. Vamos destacar, neste primeiro momento, três iniciativas. A primeira é a
da professora de série inicial Maria de Fátima Alves que desenvolveu uma pequena oficina
de HQ’s com alunos da escola, em diversos estágios de aprendizagem, que freqüentam dos
anos iniciais do Ensino Fundamental, para os quais ministra aulas de reforço. São meninos e
meninas de idades variadas com quem ela resolveu fazer um trabalho motivador: estudar
sobre folclore produzindo uma HQ.
Os alunos receberam todas as informações sobre o tema, necessárias para compor um
roteiro razoavelmente coerente e depois receberam noções básicas de como fazer uma HQ. A
professora participou de uma das oficinas que tivemos na escola, para professores, e resolveu
exercitar suas recém-adquiridas habilidades com estes alunos. Ela avaliou o trabalho levando
em conta o conteúdo e o uso correto de elementos que compõem uma HQ (como balões,
metáforas visuais, etc). Segundo a professora, o trabalho de produção de HQ’s foi estimulante
pois incentivou-os a usar da criatividade, transformando um trabalho escolar em uma
atividade lúdica, prazerosa.
14
GIESTA, Nágila Caporlíngua. Histórias em quadrinhos: recurso no ensino e na investigação educacional In:
XIII Encontro Nacional de Didática e Prática de Ensino, Recife/PE. Anais do XIII ENDIPE, 2006.
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se sentem muito motivados a freqüentarem a escola vieram fora do seu turno de aula e
fizeram aproximadamente três horas de oficina de quadrinhos. Uma grande vitória para o
projeto, para os alunos e, principalmente, para a professora, que está apostando na leitura para
formar estudantes mais interessados e cidadãos mais informados. A professora já trabalhava
com quadrinhos em suas aulas, na forma de atividades. Usando tirinhas do Snoopy
(personagem de Charles Schulz) ela propõe exercícios que misturam desde questões
gramaticais (identificar locuções verbais, vocativos e onomatopéias) até interpretação.
Segundo Flávio Calazans15 o limite do uso dos quadrinhos está no limite da
criatividade do professor.
É ele que sabe avaliar a melhor forma de utilizar as HQ’s com seus alunos. Alguns
autores sugerem que os quadrinhos podem ser trabalhados de três formas básicas: a) através
da análise critica da história; b) incentivando a criação de histórias em quadrinhos pelos
próprios alunos; c) utilizando os quadrinhos como um meio de expressão e conscientização
política.
As parcerias
Faz parte deste projeto a busca de parcerias com membros da comunidade e com
organizações governamentais e não-governamentais. O Projeto Gibiteca tem sido divulgado
por meio eletrônico através de um blog16. Nele são registradas as experiências realizadas
pelos professores, as atividades promovidas pela gibiteca e disponibilizados textos sobre
HQ’s. Recebemos a colaboração de profissionais ligados à área, através de pequenos artigos
e, é claro, os comentários deixados pelos leitores e os resultados das enquetes que realizamos
ocasionalmente.
Alguns grupos já fizeram contatos conosco através do site e nos ofereceram, além de
doações, apoio para nossas atividades. Entre estas pessoas e instituições temos educadores,
ilustradores, editoras, quadrinistas, escritores, colecionadores, enfim, pessoas que se
interessam pela divulgação das HQ’s nas salas de aula e que acreditam na sua função
educativa. O uso da internet tem sido uma estratégia importante, seja como forma de divulgar
o trabalho realizado na Gibiteca, seja como canal de comunicação com outros profissionais,
possibilitando a troca de experiências e informações.
15
CALAZANS, Op. Cit. p. 17
16
www.gibitecacom.blogspot.com
184
Conclusão
Para muitas pessoas que tomam conhecimento do projeto, usar as HQ’s nas escolas,
como instrumento de ensino pode parecer uma novidade. Mas não é bem assim. Já existem no
Brasil e mesmo no exterior várias iniciativas de aproximar o leitor – jovem ou adulto – das
histórias em quadrinhos.18 No Brasil há gibitecas espalhadas por várias cidades do país, mas
ainda são em número reduzido. Embora as HQ’s sejam uma mídia popular, ainda há quem
restrinja o espaço que elas ocupam como forma de leitura, ensino e comunicação.
Com o projeto “Gibiteca Escolar” estamos também combatendo este preconceito e
mostrando, na prática, que o ato de ler é livre, só pode fazer bem e que o leitor não tem idade.
Se à primeira vista o projeto parece um tanto ambicioso, posso afirmar com toda a segurança
17
HagáQuê é um software, um editor de histórias em quadrinhos com fins pedagógicos desenvolvido na
Unicamp. O HagáQuê foi desenvolvido de modo a facilitar o processo de criação de uma história em quadrinhos
por uma criança ainda inexperiente no uso do computador, mas com recursos suficientes para não limitar sua
imaginação. E, como resultado do crescente uso por pessoas com necessidades especiais, o software vem
passando por um processo de redesign visando melhorar sua acessibilidade. Para mais informações acesse o site
http://www.nied.unicamp.br/~hagaque/
18
. Em Portugal, por exemplo, temos a Bededeteca de Lisboa (lá as HQ’s são chamadas de banda desenhada, nos
países de língua francesa elas são as bande dessinées), na França há no Museu de Angoulème a Fanzinothèque de
Pottiers Criada em 1989 por iniciativa do “Conseil Communal des Jeunes de Poitiers”, a Fanzinoteca desenvolve
suas atividades em duas direções: a documentação e o patrimônio de um lado e organização de eventos de outra.
Ela funciona como uma grande empresa e classifica e arquiva toda produção amadora (música, HQ’s, literatura,
etc.) Ela possui a disposição do público um fundo de mais de 50.000 documentos e publicações. São organizadas
de 2 a 3 exposições anuais deste material. E é a única fanzinoteca do mundo que mantém atividades constantes.
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que ele não está além da capacidade de qualquer educador verdadeiramente comprometido
com seu trabalho. Grandes projetos começam com pequenos passos. Se a escola não possui
uma sala para que se monte uma gibiteca, ela pode ocupar um pequeno espaço na biblioteca
ou mesmo num armário dentro da sala de aula. O acervo pode ser formado pelos próprios
alunos, que podem ler as HQ’s em sistema de rodízio. O professor pode dar aos alunos a
responsabilidade de reformar e conservar as HQ’s do grupo e apoiar, por exemplo, a produção
de fanzines19.
Com o tempo, os envolvidos no trabalho percebem que as aulas se tornaram
diferentes. Os alunos se sentem responsáveis e ganham mais confiança. Os professores
sentem-se motivados a trabalhar mesmo quando as condições não são boas, quando faltam
recursos e o salário é baixo. Encontram prazer em educar porque voltam a sonhar. Eles
começam a notar o interesse dos alunos, mesmo daqueles mais rebeldes em participar das
aulas.
Pode parecer que o uso de HQ’s e a criação de gibitecas nas escolas esteja aqui sendo
apresentado como um remédio milagroso para o ensino. Não é esta a nossa intenção. Colocar
uma gibiteca ou promover pequenos projetos e adaptar o uso dos quadrinhos nas salas de aula
é uma das várias propostas que a escola pode acolher a fim de valorizar o ensino, seus alunos
e seus professores. Esta é a experiência que tenho vivenciado com o projeto Gibiteca Escolar.
Em pouco tempo de funcionamento, ela tem despertado na escola o desejo de ser melhor, de ir
ao encontro de novos desafios e a ser cada vez mais autônoma. Nossos alunos são criados em
comunidades carentes onde a realidade é dura. Muitos vão à escola porque lá eles encontram
um prato de comida e um copo de leite. Agora eles estão encontrando também um espaço para
sonhar, para expressar suas idéias e para desenvolverem habilidades que nem mesmo sabiam
que existiam.
Nossas expectativas são as melhores possíveis, dado o interesse dos professores e a
ansiedade demonstrada pelos nossos alunos, dos mais jovens aos mais velhos. Mas sabemos
que existem muitos obstáculos que deverão ser vencidos. Estamos promovendo pequenos
cursos e eventos envolvendo toda a comunidade escolar e colegas de outras escolas tentando
divulgar a leitura e o uso das HQ’s nas salas de aula, assim como os benefícios de se ter uma
gibiteca.
Sabemos que há resistências entre professores e que há vícios e tabus a serem
superados, mas acredito que com o tempo e com esforço em equipe, estaremos mudando
19
Fanzines são HQ’s amadoras, produzidas muitas vezes de forma artesanal e que são vendidas ou distribuídas
diretamente por seus autores.
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muito mais do que a forma de aprender, mas também de se relacionar com colegas e alunos na
escola. Mais do que um instrumento de ensino, a gibiteca é um instrumento de união,
agrupando em torno de si um corpo docente que pode crescer não apenas profissionalmente,
mas também em sua auto-estima, o que contribui para a qualidade do ensino e do ambiente
escolar.
REFERÊNCIAS
CABRINI, Conceição et. alii. O Ensino de História: revisão urgente.- 5. ed. São Paulo:
Brasiliense, 1994.
CARUSO, Francisco; FREITAS, Maria Silveira de. Educar é fazer sonhar. Princípios, São
Paulo, Vol. 83, p., 2006.
FIORIN, José Luis; SAVIONI, Francisco Platão. Para entender o texto: leitura e redação. 2.
ed. São Paulo: Ática, 1991.
GONÇALVES, Jussemar Weiss. O campo da história na Escola Pública. In: Qual história?
Qual ensino? Qual cidadania? – Porto Alegre: ANPUH, Ed. Unisinos, 1997.
SILVA, Diamantino da. Quadrinhos para Quadrados. Porto Alegre: Bels, 1979.