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1990
APRESENTAÇÃO
O bordado faz parte da nossa cultura. É uma marca que identifica a ilha,
tal como sucede com o vinho. A sua presença suplanta as barreiras da ilha
para se postar em mesa ou cama nobre. Foi criado em meio pobre mas a
sua presença é quase sempre em mesa nobre.
A afirmação do bordado como mercadoria no sistema de trocas da ilha
com o exterior aconteceu apenas a partir da segunda metade do século
XIX. Esta situação é considerada como uma iniciativa de Miss Phelps que
lhe terá aberto o caminho do mercado britânico. Foi só a partir deste
momento que o bordado, até então uma actividade para uso e consumo
caseiro, se assume como um produto de grande procura e valorização pelo
mercado estrangeiro. Isto motivou uma profunda transformação.
Apareceram os exportadores especializados no seu comércio, provocando
uma mudança radical no sector produtivo.
Borda o pai,
borda a filha
e borda a mãe.
Bordado chines
No Mediterrâneo a divulgação do bordado esteve a cargo dos assírios,
egípcios, gregos e romanos. São inúmeros os registos arqueológicos onde é
possível testemunhar a importância do bordado para as civilizações do
mediterrâneo. Note-se que para os Gregos o bordado é considerado uma
invenção da deusa Minerva.
O bordado aplicado nas peças de vestuário era uma tradição que desde a
Idade Média estava ligada à realeza e nobreza. Os bordados em seda e
ouro são o adorno principal das peças de vestuário, alcançando, por isso,
elevado preço. A tradição diz-nos que estavam reservados para oferta a
reis, imperadores e príncipes.
B1
as mulheres do campo usam saias azuis debruada com vermelho, um capote curto,
geralmente vermelho ou azul claro, justo ao corpo, os quais formam uma vestimenta
simples e às vezes não deselegante, e uma capa curta vermelha debruada com uma tira
azul e um barrete pontiagudo azul; as que são solteiras amarram o seu cabelo no alto
da cabeça, sobre a qual algumas não usam cobertura. Os trabalhadores usam calças de
linho, uma camisa grosseira, um barrete azul, botas brancas, jaqueta curta feita de
tecido azul e no Inverno usam geralmente capas compridas, as quais, quando não chove
levam sobre o ombro.
Em 1840 Paulo Perestrelo da Câmara nota o aspecto particular do traje
madeirense o que desperta a atenção estrangeira:
Os trajes dos camponeses são muito diversos de outro qualquer país, e os estrangeiros
principalmente notão-lhe um gosto bizarro e extravagante. Consiste pois, em um par de
ceroulas largas, franzidas, mui curtas, que só chegão do embigo acima do joelho, muito
semelhante aos calções turcos; chamão-lhe cuecas e em geral são de serapilheira da parte
do Norte, e de pano de linho na do Sul; botas de canhão, amarellas, com um bico
arrebitado, como o das sandálias chinesas; uma camisa de pano de linho, um gibão de
cor e um funil de pano azul com um bico comprido, com duas orelhas, o qual
unicamente tapa a coroa da cabeça. O traje das mulheres também não deixa de ser
curioso e simples. Começa por quasi nunca usarem de calçado senão nas igrejas ou em
ocasiões de festejos; um saiote que pouco lhe desce dos joelhos, de uma fazenda de lã
fabricada no país a que chamão mafaruje, tingida com casaca de amoreira; um colete de
cor mui pequeno, por fora da camisa, uma capinha encarnada, e igual funil ao que usão
os homens, ainda diminuto, o qual para se sustentar na cabeça é necessário ser preso
com alfinete ao cabelo. Chamão-lhe carapuça.
O bordado Madeira manteve-se por muito tempo no segredo das arcas das
suas criadoras. Era trabalho de inestimável valor que por isso mesmo não
podia ser vendido, apenas era de usufruto familiar, prenda de enxoval ou
legado por morte. Por muito tempo o bordado foi considerado um
produto não vendável, que raramente saia do circuito familiar.
Foi a presença, cada vez mais assídua, deste doentes que provocou a
necessidade de criação de infra-estruturas de apoio: sanatórios,
hospedagens e agentes, que serviam de intermediários entre os forasteiros
e proprietários de tais espaços de acolhimento. Este último é o prelúdio do
actual agente de viagens. Então o turismo, tal como hoje o entendemos,
dava os seus primeiros passos. E foi como corolário disso que se
estabeleceram as primeiras infra-estruturas hoteleiras e que o turismo
passou a ser uma actividade organizada e com uma função relevante na
economia da ilha. E mais uma vez o inglês é o principal protagonista.
Hoje a ilha é tema de debate nos diversos areópagos científicos e cada vez
mais se sentem o apelo da comunidade cientifica para o seu conhecimento
e divulgação. Em certa medida esta próxima realidade vai ao encontro
daquilo que foi a História do arquipélago. Na verdade, o passado histórico
da ilha, relevado quase sempre pelos aspectos económicos e sociais,
esquece uma componente fundamental da inovação e divulgação
tecnológica que transformou a rotina das tarefas económicas e
revolucionou o quotidiano dos nossos avoengos. Mais do que isso, o
madeirense, além de exímio inventor — na inevitável tarefa de encontrar
solução para as questões e dificuldades do dia a dia —, foi também um
eficaz divulgador da sua tecnologia. A Madeira foi a primeira terra revelada
do novo mundo, escala para a navegação e expansão dos produtos
europeus no mundo atlântico. Com o século XVIII a ilha transforma-se
em escala obrigatória das expedições científicas que fizeram saciar a
curiosidade inata do Homem das Luzes.
(...) o comércio alemão transformou esta indústria numa verdadeira riqueza para a ilha.
Pouco a pouco, foi removendo as dificuldades inerentes a um pessoal trabalhador boçal
como é a mulher do campo; compreendeu bem o que podia exigir dela, não lhe pediu
desenhos nem ideias, simplificou-lhe a preparação do trabalho e aproveitou-lhe o que
realmente ela podia dar; a parte meramente mecânica, material. Procurou os desenhos
fornecendo-lhe já estampados nas fazendas e exigindo-lhe apenas uma execução
minuciosa e perfeita.
A saída dos alemães em 1916 foi compensada com a chegada dos sírios
que rapidamente dominaram o mercado do bordado madeirense até 1925.
Aqui, o mercado norte-americano que desde 1910 vinha ganhando
importância, domina as exportações. Mas o século XX, uma esperança
segura para o comércio do bordado, trouxe à ilha mercadores franceses,
ingleses e americanos.
Máquina picotar
A cada vez maior procura de bordado implicou as necessárias inovações
técnicas devidas aos alemães e o aumento da mão-de-obra no bordado,
através do recrutamento no meio rural e do aperfeiçoamento da rede de
agentes de distribuição e recolha. O facto de os panos a bordar serem
apresentados às bordadeiras já estampados com os desenhos facilitou a
adesão de muitas mulheres a esta actividade que poderia ser partilhada
com a vida diária.
Museu do Bordado-aspecto
Hoje, passados os anos difíceis da segunda metade do século XX, a
perspectiva é de crescimento, não obstante a tendência para a diminuição e
envelhecimento da mão-de-obra.
AS CASAS DE BORDADO
Era verdade que os ingleses contribuíam hoje, como nenhum outro povo,
para o turismo na Madeira e fora até uma inglesa que tornara conhecidos,
no estrangeiro os bordados da ilha. Mas os alemães, que também gostavam
de viver no Funchal e lá tinham deixado muitas quintas e melhoramentos,
haviam dado à indústria uma expressão inteligente, valorizando-a e
enriquecendo-a cada vez mais. Se não fosse a questão dos sanatórios, que,
hoje, todos lamentavam, e que obrigara os alemães a abandonarem a
Madeira, a indústria dos bordados estaria próspera como nenhuma outra.
Os sírios, que, depois, se instalaram na ilha ou já lá tinham os seus agentes,
haviam estragado o negócio, criando uma tal barafunda que, hoje,
ninguém se entendia. Os bordados desvalorizaram-se, empobrecendo a
economia da Madeira. Tudo estava; não havia industrial que se encontrasse
satisfeito”
De acordo com a portaria 8337 foi estabelecida uma taxa sobre o valor das
exportações e as vendas locais para acudir às despesas da agremiação. Foi
com os fundos resultantes desta taxa que se construiu a sede, o actual
edifício do IBTAM, inaugurado nos anos cinquenta. Aqui o grémio
dispunha de armazéns para reserva de tecidos e linhas, situação que é ainda
hoje garantida no mesmo edifício.
(canção de MAX(1918-1980)
Em todos os momentos da História do bordado a referência mais comum
prende-se com a bordadeira. É ela, que com mãos de fada, dá o toque de
beleza aos pontos do bordado. A sua maestria, dedicação e sacrifício são
motivo constante de panegírico e admiração por todos os que descobrem
o bordado. Preservou na ilha a ancestral tradição de bordar e, antes que
em meados do século XIX, interviessem os estrangeiros a dominar o
circuito de produção e foi ela que criou os desenhos que tão
graciosamente esculpia à linha sob o pano.
Bordadeiras
BORDADEIRAS- 1863
CONCELHO BORDADEIRAS POPULAÇÃO
Nº % Nº
Funchal 844 4,7 17677
C. de Lobos 152
Ponta de Sol 10
Calheta 7
Santa Cruz 8
Porto Moniz 4
S. Vicente 4
Total 1029 0,9 110.249
900
800
700
600
500 S. Vicente
Porto Moniz
400
Santa Cruz
300 Calheta
200 Ponta de Sol
100 C. de Lobos
Funchal
0
Bordadeiras em 1863
20.000
10.000
Porto Santo
Santana
S. Vicente
Porto Moniz
Santa Cruz
Machico
Calheta
0
Ponta de Sol
C. Lobos
Funchal
BORDADEIRAS EM 1906
35
30
25
20
15
10
Porto Moniz
Porto Santo
Ponta de sol
5
Santana
S. Vicente
Calheta
Santa Cruz
Machico
0
R. Brava
C. de Lobos
Funchal
Porto Santo
Santa Cruz
Machico
Santana
2.000
S. Vicente
Porto do Moniz
Calheta
Ponta de sol
0
R. Brava
C. de Lobos
Funchal