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' Pobres no Rio vivem dias de horror ’

Escrito por Gabriel Brito e Valéria Nader


18-Abr-2009

Estamos na porta de entrada de tempos (ainda mais) difíceis no país. Com


crise, desemprego e muita violência nas grandes cidades, os políticos, sem
romper seus pactos, precisam apresentar soluções para combater tal quadro.
Dessa forma, é produzida uma série de medidas que mais combatem os pobres
do que a pobreza. Pintam as paredes, mas não mexem na estrutura interna do
‘prédio’.

Por conta disso, o Rio de Janeiro vem sendo palco de seguidas políticas de
limpeza e segregação social, como mostram os choques de ordem e agora o
levantamento de muros no entorno de favelas, levados a cabo por prefeitura e
governo do estado, respectivamente.

Para a socióloga Vera Malaguti, do Instituto de Criminologia Carioca, o que


vemos é a expressão de um fascismo estatal mancomunado com grandes
interesses econômicos. O governo pretende levantar 11 mil metros de muros,
com 3m de altura, começando pela zona sul, cuja expansão de favelas não
chegou à metade do aferido na zona oeste, de 11,5% - dados do Instituto
Pereira Passos.

Malaguti aponta que os pobres no Rio de Janeiro são vítimas de crescente


truculência oficial e vistos como ‘lixo humano’ que precisa ser removido da
cidade, uma vez que a presença dessa parcela da população é prejudicial aos
grandes negócios e à especulação imobiliária.

Correio da Cidadania: Como você vê a idéia do governo local de


construir muros no entorno de favelas, sob a alegação de preservar
algumas áreas verdes da cidade?

Vera Malaguti: É um absurdo e vem junto do circo de horrores do qual vem


sendo palco o Rio de Janeiro, através de extermínios da polícia (a que mais
mata no mundo), das remoções dos pobres, demolição de casas em áreas
populares ilegais...

Enfim, é todo um festival de truculência, em articulação da prefeitura com o


governo do estado, completamente ligados aos grandes negócios privados,
como os esportivos, e impondo um cerco fascista sobre os pobres. E, além do
muro, que é uma vergonha, as remoções voltaram à pauta.

Todo o processo é capitaneado pelas Organizações Globo, com campanha


diária no RJTV, no jornal O Globo, sempre focalizando a pobreza como detrito,
como algo que conspurca o ambiente. E tudo em nome dos grandes negócios
privados, uma vergonha.

O Rio de Janeiro talvez esteja passando pelo seu pior momento desde Lacerda.
Parece uma volta com força total da UDN, terrível.
CC: O que pensa do fato de as favelas escolhidas para receberem os
primeiros muros se localizarem em bairros mais nobres ou de classe
média, mesmo com a expansão recente de tais favelas estando abaixo
de índices considerados preocupantes, inclusive em comparação com
outras?

VM: Aí fica clara a parceria do governo com a especulação imobiliária, afinal,


são áreas nobres, e ter os pobres ali não lhes interessa.

É tão chocante, tão óbvia, essa mistura de truculência fascista com Parcerias
Público-Privadas sinistras! Estou sendo enfática, mas é que chegamos num
ponto... Ontem mesmo houve o assassinato pela polícia de um menino da
Maré, a população tentava protestar e era reprimida da pior forma possível
pela mesma polícia. E tudo sempre sob a desculpa do tráfico.

Acho que o fim do brizolismo no Rio foi muito ruim. Para exemplificar, uma das
coisas que O Globo fez para comemorar os 45 anos do golpe militar foram
acusações levianas sobre o Brizola, ao mesmo tempo em que o associava ao
crescimento das favelas. O vazio criado por sua morte, junto ao
estraçalhamento das forças de esquerda, deixou o fascismo ocupar a cidade.

CC: Ao se juntar tal ação com a também recente medida dos choques
de ordem, vemos que as políticas de higienização nas grandes cidades
têm sido levadas ao paroxismo, não?

VM: Exatamente. O velho projeto fascista, com essa maneira de olhar os


pobres como lixo humano na cidade, se consolidou, sendo orquestrada
também pela grande imprensa tal proposta de apartheid.

Os pobres no Rio de Janeiro vivem dias de horror. Acho que as forças de


esquerda, libertárias, precisam se organizar contra isso. Tudo começou pela
questão criminal, o que é um problema, pois até a esquerda embarca no
discurso de luta contra o tráfico, sempre localizada nas favelas.

Daí para choques de ordem, remoções, muros, é um passo. É um projeto


higienista reciclado, em nome da ordem na cidade, dos grandes negócios de
Copa, Olimpíadas, dos grandes capitais que circulam no Rio. Tais negócios são
uma obsessão para o governo e a prefeitura, que sempre estão em viagem
buscando grandes investimentos.

Enquanto isso, pau nos pobres aqui. É um projeto sinistro.

CC: Essas medidas não podem potencializar o ódio entre classes, na


medida em que reforçam uma idéia segregacionista?

VM: Claro, isso não vai dar certo. Durante um tempo, algumas forças
progressistas do Rio aceitaram a pauta criminal da direita, e assim o fascismo
encontrou sua brecha, sendo que acaba se alastrando para a questão
habitacional, ambiental, onde muitas vezes se refugia, como neste caso dos
muros, aliás.

Uma vereadora do PV foi uma das que mais defenderam os muros, sempre fala
em remoções nas favelas da zona sul, como a dos Tabajaras, uma vez que as
áreas verdes na cidade se concentram mais na zona sul e posto 9.

Tais equívocos abrem o caminho para o fascismo mais explícito, que vemos
nessa mistura de truculência contra os pobres e grandes negócios (com
ilegalidades) particulares.

CC: Você acredita que o levantamento dos muros vai impactar de


alguma maneira, ainda que a curto prazo, nos índices de
criminalidade?

VM: Acho que vai emparedar os pobres e produzir outros efeitos, intra e
extramuros. É mais uma grande violência, portanto, entrará nesse moinho
gerador de ódios.

Espero que isso possa ser barrado, apesar de todo o esforço da grande
imprensa. Fazem pesquisas dizendo que os favelados são favoráveis à
remoção, pesquisas para legitimar tais ações... Não deve faltar sociólogo para
fazer esse tipo de trabalho e dizer que os pobres estão doidos para serem
emparedados e removidos da cidade.

No Rio de Janeiro, neste momento, essas forças, que envolvem institutos de


opinião, empresas de publicidade, grande imprensa, setor imobiliário, estão
totalmente articuladas na varredura da pobreza da cidade. E da pobreza
rebelde, que é uma marca do Rio de Janeiro há muito tempo, pois foi uma
cidade quilombola, depois janguista, brizolista...

Estamos diante de um conjunto de interesses escusos, mais uma ‘blitzkrieg’.

CC: Diante do quadro atual, quais medidas seriam efetivas a seu ver,
tanto a curto como a longo prazos?

VM: O inverso disso tudo, uma outra maneira de olhar a cidade. Construir
políticas habitacionais democráticas, projetos em que as classes populares
sejam protagonistas.

Não bastam bons projetos para os pobres, é preciso que esses setores estejam
no centro, que a juventude, ao invés de ser criminalizada, seja participante
central dos projetos que a libertem dessa concepção de muros, cadeias,
extermínio. Temos de produzir outro projeto brasileiro, que não contenha essas
conjugações.

É complicado resolver a violência, ninguém tem a solução. Mas uma cidade


democrática é gerida de outra forma, e assim produz soluções também
democráticas e libertadoras, capazes de permitir que todos usufruam a cidade,
apesar das diferenças.
Em suma, é o oposto de tudo isso.

Valéria Nader, economista, é editora do Correio da Cidadania;


Gabriel Brito é jornalista.

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