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E n s a io s & A r tig o s

13.05.2009

O perigo nacionalista
RODRIGO CONSTANTINO*

“A individualidade sobrepuja em muito a nacionalidade e, num determinado homem,


aquela merece mil vezes mais consideração do que esta.” __ Arthur Schopenhauer

A linha que separa o patriotismo do nacionalismo é bastante tênue, às vezes. Defender a


pátria, ou seja, seu direito à propriedade e liberdade, é algo totalmente diferente de
colocar a nação acima dos próprios indivíduos que a formam. Mas muitos ignoram isso,
confundindo patriotismo com nacionalismo. O último é uma forma nefasta de
coletivismo, que transforma o indivíduo em meio sacrificável em prol dos “interesses
nacionais”. Ele invariavelmente desemboca na xenofobia. O amor à pátria vira o ódio ao
estrangeiro. Demagogos sempre foram espertos ao utilizar o patriotismo genuíno dos
cidadãos para concentrar poder, estimulando o nacionalismo xenófobo. Ninguém
melhor que Hitler representa os enormes riscos disso. Seu nacional-socialismo chegou
ao poder na Alemanha em 1933 usando o discurso nacionalista, e só foi eliminado 12
anos depois, com uma guerra que destroçou milhões de vidas.

O escritor alemão Thomas Mann foi um ferrenho inimigo do regime nazista, desde seu
começo, tentando alertar o povo quanto ao perigo que ele representava. Exilado nos
Estados Unidos durante a guerra, Mann foi convidado pela BBC para fazer discursos
regulares a seus compatriotas, numa transmissão que muitos rádios clandestinos
puderam captar na própria Alemanha nazista. Esses discursos foram reunidos no livro
Ouvintes Alemães!, e mostram como Mann sempre manteve uma convicção
“inquebrantável” de que o nazismo jamais poderia vencer a guerra. “A humanidade não
pode tolerar o triunfo definitivo do mal, da mentira e da violência – ela simplesmente
não pode viver com isso”, disse Mann. O nazismo representa tudo que há de mais podre
na humanidade, e sua queda era inevitável. Hoje é bem mais fácil compreender isso,
mas o fato lamentável é que muitos alemães foram seduzidos pelo discurso nacionalista
de Hitler na época, assim como várias pessoas foram ludibriadas pelo comunismo
igualmente perverso.
Nesse contexto, creio que os ataques que Mann faz ao nacionalismo em seus discursos
merecem atenção, pois o nazismo pode estar enterrado, mas o nacionalismo não. Ele
veste novas embalagens, mas sua essência coletivista, que usa os indivíduos como peões
sacrificáveis, se mantém viva. Hitler e sua corja no poder souberam explorar esse
nacionalismo de forma pérfida, associando inclusive uma eventual queda dos
criminosos no poder à própria queda da Alemanha, como se os assassinos nazistas
fossem a Alemanha em carne e osso. Os nacionalistas sempre tentam apelar para esta
tática podre. Se seu líder é atacado ou criticado, o nacionalista afirma que é a nação que
está sendo alvo dos ataques. O líder é a nação! E os inocentes úteis acabam confundindo
tudo, incapazes de separar seus governantes do que sua pátria representa.

Mann reconhece que o nazismo tem suas origens nas idéias disseminadas pelo povo
alemão, como o “romantismo”, por exemplo. Mas seria absurdo concluir que o nazismo
é a Alemanha. Ele diz: “Sim, a história do nacionalismo e do racismo alemão que
resultou no nacional-socialismo é longa e terrível; ela vem de longe, é interessante no
início e se torna cada vez mais vulgar e abominável”. E acrescenta: “Mas confundir essa
história com a própria história do espírito alemão e amalgamá-las numa só é
pessimismo crasso e seria um erro perigoso para a paz”. Da Alemanha, afinal, vieram
Bach, Beethoven, Goethe, e o próprio Mann, entre outros. A Alemanha nazista é um
país doente, mas não são todos os alemães que representam esta doença abominável. É
preciso julgar indivíduos, não a nação, como se esta fosse um ente concreto. Fazer isso
seria cair no mesmo erro nacionalista.

O próprio exemplo de Mann é por ele utilizado para condenar a visão nacionalista:
“Nenhum artista constrói sua obra para engrandecer a fama de seu país e de seu povo. A
fonte da produtividade é a consciência individual, e mesmo que a simpatia que ela
desperta venha beneficiar a nação em cuja língua e tradição se baseia, há acaso demais
em jogo para que uma pretensão de reconhecimento se justifique. Vocês, alemães, não
deveriam, ainda que quisessem, agradecer-me hoje por minha obra! Ela não foi feita por
causa de vocês, e sim por uma necessidade pessoal imperiosa”. Eu confesso que sempre
achei estranho sentir “orgulho nacional” só porque outros indivíduos nascidos no
mesmo local do mapa atingiram o sucesso internacional. O orgulho sempre me pareceu
algo bastante pessoal, dependente de nossa trajetória individual.
As próprias fronteiras nacionais chegam a ser questionadas por Mann em seus
discursos: “Em um momento da história em que é tão evidente que aquilo que é
nacional perde importância a cada dia que passa – em que a mera nação não pode mais
resolver nenhum problema, seja ele político, econômico, espiritual ou moral, e em que a
necessidade de redução e da limitação da soberania nacional se impõe –, eles se
refestelam no nacionalismo, provocam uma guerra de opressão nacionalista, uma guerra
pelas idéias criminosas da supremacia racial e da escravização dos povos por alguma
linhagem eleita de senhores”. De fato, o estudo histórico da origem das nações – muitas
formadas pela conquista territorial imposta e arbitrária, já serviria para amenizar essa
idolatria ao conceito de nação.

Mann demonstra revolta com a manipulação que os nazistas fazem com todos os
conceitos, incluindo o patriotismo. Ele chama o nacional-socialismo de “avesso de
Midas”: tudo que ele toca apodrece, em vez de virar ouro. E não poderia ser diferente
com o patriotismo. Nas mãos do nazismo, ele vira “arrogância estúpida, furiosa
insolência racial, auto-endeusamento maníaco e assassino, ódio, violência e loucura”.
Foi nisso tudo que o nazismo transformou o amor à pátria. Os líderes nacionalistas são
apenas egoístas que manipulam as massas em benefício próprio. Eles mesmos não
costumam colocar a nação acima de seus próprios interesses. “Os nazistas não se
importam com a Alemanha; eles estão preocupados é com a própria pele”, afirma Mann.
É sempre assim: o nacionalismo é uma arma poderosa de exploração nas mãos de
oportunistas. O povo deverá se sacrificar pela nação, o que na verdade quer dizer: o
povo será escravizado em prol dos interesses de seus governantes. Por isso, Mann
acusa: “Nunca houve traidores mais ordinários de sua pátria do que esses nacionalistas”.

Por fim, justificando sua escolha de permanecer nos Estados Unidos após o fim da
guerra, Thomas Mann diz a seus compatriotas: “Pois eu não sou nacionalista, quer
vocês me perdoem isso ou não”. Eu também não sou nacionalista, e tenho calafrios
quando escuto gente falando em nome dos “interesses nacionais”, ou que devemos nos
sacrificar pela nação. Geralmente, essas pessoas querem apenas usar os outros em
benefício próprio. Portanto, caro leitor, muito cuidado com os nacionalistas!

* Economista, articulista, autor de quatro livros: "Prisioneiros da Liberdade", "Estrela Cadente:


As Contradições e Trapalhadas do PT", "Egoísmo Racional: O Individualismo de Ayn Rand", e
"Uma Luz na Escuridão". É membro-fundador do Instituto Millenium e diretor do Instituto
Liberal.

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