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RAIZ-6 Belém 20.06.

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tronco . viagens

Do movimento frenético do Mercado Ver-o-Peso à excelência do Theatro


da Paz, da riqueza da cultura marajoara à importância do açaí, as nuances
de Belém do Pará encantam quem se dispõe a conhecer essa cidade exótica.
POR MÔNICA TRINDADE CANEJO E MAURÍCIO DE PAIVA FOTOS MAURÍCIO DE PAIVA

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Complexo arquitetônico
do Ver-o-Peso ,
principal cartão-postal
de Belém do Pará,
declarado patrimônio
cultural pela Unesco.

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BEM ANTES DO NASCER DO SOL, os barcos já chamar de contributiva. É ação prazerosa de pre-
estão percorrendo os igarapés e furos, passando servação de cultura. É bem diferente, por exem-
de casa em casa em busca de sua carga. Aos plo, das carvoeiras, em que as crianças trabalham
poucos, ficam lotados de cestos abarrotados de em troca de comida e dinheiro”. Segundo ele, a
frutos do açaizeiro. Depois chegam a portos de presença das crianças acaba por se tornar um ele-
pequenos municípios e são descarregados. Mas a mento de união familiar, parte do legado indígena.
viagem ainda não acabou. Serão ainda mais algu- Mulheres e adultos também interagem com a
mas horas em outros barcos antes que o produto “panha” dos frutos, debulha dos bagos e seleção.
chegue a outro porto, a outra feira. Dessa vez, o O baldeador de açaí Manuel Lobato da Fonseca
número de embarcações ancoradas e descarre- Trindade, conhecido como BG, conta que ainda
gando é muito, muito maior, assim como o movi- de madrugada passa de casa em casa para bus-
mento de trabalhadores e compradores. A singu- car a produção dos sítios e levá-la até o porto de
lar feira do açaí divide espaço com as incontáveis Abaeté, em Abaetetuba. De lá o açaí segue por
barraquinhas que vendem ervas milagrosas do poucas horas até chegar a Belém. Tudo deve ser
outro lado do cais, com o artesanato, o mercado feito “rapidola” – como ele explica –, já que o pro-
de ferro, da carne, o mercado de peixe e um sem- duto é perecível e deve chegar ao seu destino em
fim de outros produtos. Nascido no alto de uma até 24 horas. O transporte por definição é o bar-
palmeira, em uma mata preservada à beira de al- co, que segue por furos e igarapés até alcançar
gum rio amazônico, o miúdo e escuro açaí agora os grandes rios que desembocam na capital,
está numa cidade grande e populosa, enfrentan- num emaranhado de caminhos fluviais. “O rio é a
do o susto do movimento frenético do Mercado nossa rua. O pão chega por ele, eu levo os meni-
Ver-o-Peso, principal entreposto da fruta. Ele che- nos pra escola da vila por ele.” Depois do trabalho
gou a Belém. E aí é preciso abrir um parêntese: o duro de ribeirinho é a hora de provar o fruto do
açaí é uma das mais importantes referências da trabalho diário. Claro, como base de qualquer re-
cultura paraense. Esqueça aquela mistura de pol- feição é o próprio açaí que faz a diferença. O po-
pa congelada e xarope de guaraná que se vende deroso ouro negro, batido ou amassado na hora,
nas lanchonetes de academias de outras capi- pode vir acompanhado de peixe, carne, camarão
tais. Famoso no resto do país por seu alto teor de e arroz. Se for apenas uma merenda, com um
vitaminas e minerais, açaí, por aqui, é uma poten- pouco de açúcar. O que nunca pode faltar para
te história na várzea do estuário amazônico. acompanhá-lo é a farinha, de preferência de tapio-
São séculos de tradição no extrativismo e no ca. Só na capital são consumidas mais de 700 to-
consumo desse fruto, que é colhido no alto de neladas de açaí por mês, e o estado é responsá-
uma elegante palmeira, nativa da mata amazôni- vel por 92% da produção nacional.
ca. Tarefa que muitas vezes cabe às crianças. Há quem defina a capital paraense como exóti-
Ágeis e leves, elas se enroscam no tronco do açai- ca, quem a chame de portal da Amazônia, há
zeiro em busca dos cachos, sem que isso signifi- quem lembre da chuva que cai quase diariamen-
que trabalho infantil. Pode-se dizer que é a ma- te nos finais de tarde. O fato é que se trata da
nutenção de um modo de vida familiar, em que principal cidade do estado mais desenvolvido de
crianças e adultos estão integrados numa mesma todo o Norte e palco das mais importantes passa-
atividade. Quem explica é Mario Jardim, coorde- gens históricas que marcaram a região, desde
nador do núcleo de Botânica do Museu Emílio que foi fundada, em 1616, quando portugueses ti-
Goeldi. “Temos no açaí um diferencial, pois mes- veram a intenção de proteger a foz do rio Amazo-
mo a presença das crianças na coleta não pode nas. Em face da grande multiplicidade indígena
ser tida como trabalho infantil, tão combatido no da região, esse encontro só poderia ter gerado
Brasil, mas sim uma atividade que eu costumo uma herança rica e única.
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Seu Santana, baldeador de açaí, no Igarapé Miri, levando cestos com a fruta para o porto de Abaeté.

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Para conhecer um pouco dessa herança, é in-


dispensável uma visita ao mítico Mercado Ver-o-
Peso, um daqueles lugares onde se pode ver, a
um só tempo, a gastronomia, o artesanato, cren-
ças e o democrático cotidiano do caboclo local.
“Faz querer quem não me quer”, “Abre caminho
para a felicidade”, “Verdadeiro banho para olho
grande”. Assim se anunciam, sem deixar dúvidas,
as promessas dos vidrinhos coloridos, pendura-
dos nas barraquinhas aprumadas do mercado.
Mais à frente, próximo às lanchonetes, estão os
cestos e as cerâmicas artesanais. Do lado de
fora, as torres do mercado de peixe dividem o ce-
nário com os barcos que aportam quase que inin-
terruptamente na doca do Ver-o-Peso. Em seu
vaivém, as embarcações transportam todo tipo de
produtos encontrados no maior mercado ao ar li-
vre da América Latina, também considerado o
melhor em iguarias.
Em funcionamento desde 1688, era a princípio
um posto onde os colonizadores verificavam o
peso de mercadorias para fazer a cobrança de im-
postos, o que lhe teria batizado como “haver o
peso”. De lá também partiam os carregamentos
de borracha e chegavam imigrantes sírios, italia-
nos e libaneses em busca de uma vida melhor.
Hoje, reúne os mercados de peixe, de carne, e a
feira do açaí.
A musicista belenense Judie Kristie dá outro
bom motivo para ir até o mercado: depois de
uma noite de farra, com chorinho ou o brega nas
boates, “o bom é amanhecer no Ver-o-Peso, to-
mando um caldo de mocotó”. Para o forasteiro,
chama a atenção a quantidade de frutas. Pêra e
maçã aqui não têm vez, as donas do lugar são
taperebá, cupuaçu, murici, pupunha, tucumã.
Mas impera, sem dúvida, o açaí, que merece
uma feira exclusiva, em que negociantes com-
pram a abundante produção vinda do interior e
de ilhas próximas.
Baldeador de açaí Belém não seria a mesma, não fosse a respon-
Manuel Lobato da sabilidade da força dos povos indígenas que habi-
Fonseca, com seus tam e habitaram o estado. Um dos mais significa-
sobrinhos, trabalhando tivos, talvez de todo o país, é o Marajoara. Em pla-
em açaizeiros na mata. cas, camisetas, vasos e muitos outros objetos ex-
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postos na cidade, encontram-se referências aos


grafismos deste povo. Mas os Marajoara, assim
como outras culturas pré-cabralinas do Pará,
como a Santarém e a Tapajônica, foram mais que
bons desenhistas. Habitantes do arquipélago de
Marajó, entre os anos 400 e 1350 d.C., deixaram
entre seus vestígios uma cerâmica ricamente de-
senhada, tanto na forma como na decoração. Em
uma experimental expedição européia que des-
ceu o rio Amazonas em 1542, o cronista portu-
guês Frei Gaspar de Carvajal escreveu que “fa-
zem e formam imagens de barro em relevo, de
tipo romano; e assim vimos muitas vasilhas [...]
taças e outros vasos e tinas tão altas quanto um
homem [...] mui formosas e de excelente barro”.
Observando sua simbologia, pesquisadores de-
fendem a idéia de que se tratava de uma socieda-
de muito bem organizada, com hierarquia, divi-
são de trabalho e uma profunda relação com a
sobrenaturalidade, características que podem
colocá-los ao lado dos incas no que se refere a
desenvolvimento social.
Belém é o lugar ideal para ver as peças marajoa-
ras. Em vários museus, como o do Estado e o For-
te do Presépio, encontram-se expostas urnas fu-
nerárias, pratos e vasos autênticos. Já em Icoara-
ci, onde há um ateliê ao lado do outro, junto com
cerâmica comum é possível encontrar boas répli-
cas produzidas por artesãos que se especializa-
ram em copiar peças arqueológicas. O mais fa-
moso deles foi Mestre Cardoso, falecido neste
ano, aos 76 anos de idade. O mestre começou a
se dedicar a este trabalho na adolescência e pas-
sou toda a sua vida estudando desenhos e for-
mas. Hoje, sua esposa e filhos continuam a tare-
fa. Deo Almeida é outro que se destaca. Utilizan-
do-se de fotos de peças originais, reproduz com
cuidado cada detalhe. Mas ele prefere dizer que
não faz réplicas, mas cópias. “Uma réplica, na
verdade, exigiria que todo o processo fosse feito
da mesma forma. E não se pode afirmar que a
queima, por exemplo, é idêntica”, explica. Carregadores do
Além do açaí, do Ver-o-Peso e dos Marajoara, Mercado Ver-o-Peso,
uma manifestação cultural de Belém que não no auge do movimento
pode ficar de lado é o Círio de Nazaré, que acon- no cais, ao amanhecer.

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Comércio de ervas
que segue antiga
tradição indígena,
no Mercado Ver-o-Peso;
vista do interior
do Theatro da Paz.
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tece em outubro. É nada menos que a maior pro- um conjunto de construções históricas que fo-
cissão do país. No ano passado, o número de ram integradas para se tornar um único ponto de
fiéis beirou os 2 milhões. A tradição começou em atração. Lá estão o Forte do Castelo, que abriga
1700, quando um pescador chamado Plácido en- um bem cuidado museu de arqueologia e histó-
controu a imagem da santa nas margens de um ria, a Casa das Onze Janelas, com exposição de
igarapé e, em sua homenagem, uma capela foi arte moderna e contemporânea, e a Igreja de
construída. Nos primórdios da procissão, a ima- Santo Alexandre, erguida no século 18 e restaura-
gem era levada por um carro de boi. Até o dia em da para se tornar o Museu de Arte Sacra. Outra
que o carro atolou e, para livrá-la do atoleiro, foi parada indispensável é o complexo São José Li-
preciso usar uma corda, puxada por muitos ho- berto. A construção de 1749 era inicialmente um
mens. Os fiéis gostaram tanto da idéia que o car- convento franciscano, depois transformado em
ro de boi foi aposentado e, em seu lugar, a corda depósito de pólvora, quartel, olaria, hospital e pre-
virou símbolo da procissão. São 400 metros de sídio, que esteve em atividade até o ano 2000. Hoje,
corda, que os devotos se esforçam para tocar to- abriga o Museu de Gemas, a Oficina de Jóias e a
dos os anos, à espera de serem agraciados pelo Casa do Artesão, com exposições permanentes
gesto. A festa continua nas casas belenenses, da produção atual de artesanato e ourivesaria,
pois o Círio representa uma comemoração fami- com destaque para a confecção de jóias com de-
liar tão ou mais importante que o Natal. No lugar senhos inspirados no próprio Pará.
do peru e do leitão, a mesa é ocupada pelas comi- O ápice de todo este processo é, indubitavel-
das típicas do cardápio paraense. Sabores que mente, o imponente Theatro da Paz. Construído
podem parecer até extravagantes, como o do durante o auge do ciclo da borracha, no século
pato no tucupi, feito à base de mandioca e jambu, 19, o primeiro teatro de ópera da região Norte
uma erva que provoca dormência na boca. Há passou por uma completa restauração em 2001 e
também a maniçoba, um cozido de carne de por- se mantém em intensa atividade. A programação
co e folhas de mandioca-brava, que começam a inclui espetáculos de dança, teatro e festivais de
ser preparadas com uma semana de antecedên- ópera que se realizam regularmente. Judie Kris-
cia, para tirar o “veneno”. tie, que há alguns anos se mudou para São Pau-
Mas, se até agora se falou na Belém secular, de lo para estudar piano, lembra com saudades do
tradições tão arraigadas no gosto popular, vale festival de música de câmara. “Uma das melho-
lembrar que nos últimos anos a capital passa por res coisas do Theatro da Paz é que ele é acessível
um processo de revitalização turística. Se em ou- a qualquer pessoa. No festival, além de gente do
tros lugares a expressão lembra guias recitando mundo todo, vão os moradores de Belém de to-
textos decorados e lojas de lembrancinhas, em das as camadas sociais, que fazem até torcida
Belém esse processo procura valorizar a cultura para os grupos locais.” Talvez este seja mais um
contemporânea, como na Estação das Docas. O diferencial de Belém: uma cidade onde o que é
antigo armazém foi reformado e transformado popular agrada ao gosto erudito, enquanto o eru-
em um conjunto de bares e restaurantes. Longe dito, por sua vez, não deixa de ser popular.
de se resumir a um bom lugar para tomar uma Tão cativante, que soa atual o poema “Belém Complexo Ver-o-Peso ao amanhecer;
cerveja gelada ao refresco da brisa que sopra do do Pará”, escrito por Manuel Bandeira em 1928, réplica de cerâmica marajoara;
rio Guamá, tornou-se uma espécie de centro cul- que termina dizendo: “Nunca mais me esquece- festividade de Círio de Nazaré.
tural. Na Estação das Docas acontecem freqüen- rei/ Das velas encarnadas/ Verdes Azuis/ Da
temente mostras de cinema, espetáculos tea- doca de Ver-o-Pêso/ Nunca mais/ E foi pra me
trais, apresentações musicais e de grupos para- consolar mais tarde/ Que inventei esta cantiga:/
folclóricos, além de exposições de artes visuais. Bembelelém/ Viva Belém!/ Nortista gostosa/ Eu
O mesmo ocorre com a Feliz Lusitânia. A área é te quero bem”.
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Santa Julia do Jurupari,


população ribeirinha
próxima à cidade de Afoá,
onde são encontrados
fragmentos arqueológicos
de peças marajoaras.

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BELÉM, PARÁ

ONDE FICAR
Hotel Hilton de Belém
Av. Presidente Vargas, 882 – Campina - Tel.: (91) 4006-7000

Hotel Beira Rio


Av. Bernardo Sayão, 4804 – Guama – Tel.: (91) 4008-9000

ONDE COMER
Lá em Casa - comida regional
Av. Gov. José Malcher, 247 – Nazaré – Tel.: (91) 3242-4222 (há também uma filial
na Estação das Docas, com bufê no almoço)

Carvalho’s - serve peixes, crustáceos e paella


Travessa do Cruzeiro, 364 – Icoaraci – (91) 3227-0065

Sorveteria Cairu
Travessa Catorze de Março, 1570 - Nazaré

ATRAÇÕES
Estação das Docas
Boulevard Castilho França, s/nº - Campina - Tel.: (91) 3212-5525

Theatro da Paz
Praça da República, s/n – Centro – Tel.: (91) 4009-8750

Complexo São José Liberto


Praça Amazonas, s/n – Jurunas – Tel.:(91) 3230-4451

Museu do Estado do Pará


Palácio Lauro Sodré. Praça D. Pedro II, s/n – Cidade Velha – Tels.:(91) 4009-8831/ 8838

Jardim Feliz Lusitânia


Praça Frei Caetano Brandão s/n – Cidade Velha – Tel.:(91) 4009-8845

Basílica de Nazaré
Praça Justo Chermont, s/n – Nazaré – Tel.:(91) 4009-8400

MAIS INFORMAÇÕES
Site oficial da Secretaria de Turismo
www.paratur.pa.gov.br
Coordenadoria Municipal de Turismo
www.belemtur.com.br
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