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Revista da FAE

O capital humano como elemento estratégico


na economia da sociedade do conhecimento
sob a perspectiva da teoria do agir comunicativo

Osmar Ponchirolli*

Resumo
Este artigo tem por objetivo verificar a importância da teoria do agir co-
municativo de Habermas na era do capital humano, analisado como um
elemento estratégico fundamental no mundo organizacional. Os dados
foram obtidos mediante entrevistas semi-estruturadas com dez gerentes
da Volvo do Brasil e um questionário aplicado em um dos setores da
empresa. A análise dos dados revela que o impacto da nova economia
sobre os esquemas interpretativos de seus gestores necessita de uma
racionalidade não somente cognitivo-instrumental mas também de um
modelo de racionalidade comunicativa, onde as manifestações simbólicas
dos homens encarnam saberes (convicções) intersubjetivamente partilha-
dos. Tanto as ações de caráter cognitivo-instrumental como as ações ori-
entadas ao entendimento são comuns e indispensáveis no planejamento
estratégico de uma organização. O agir estratégico não pode ser concebi-
do simplesmente como uma manipulação instrumental.
Palavras-chave: capital humano; elemento estratégico; racionalidade
comunicativa; aprendizado flexível.

Abstract
The purpose of this research was to verify the importance of Habermas’
communicative acting theory in the human capital era. The human capital
was analyzed as a fundamental strategic element in the organizational
world. The method that characterizes this research is the case study with
the use of multiple evidence data. The data was acquired through semi
structured interviews with ten managers of Volvo do Brasil, in the
metropolitan region of Curitiba - CIC and through a questionnaire applied
in one of the company’s sectors. The data reveals that the impact of the
new economy on the interpretative outline of its administration are in
need of not only a cognitive-instrumental rationality, but of a model of
communicative rationality, where the symbolic manifestations of men
embodies understandings (convictions) inter-subjunctively shared. Both
the actions with a cognitive-instrumental character and the actions oriented * Filósofo, Bacharel em Teologia,
to the understanding are common and essential in the strategic planning Mestre e Doutorando em
of an organization. The strategic acting is not conceived only as instru- Engenharia de Produção pela
mental manipulation. Universidade Federal de Santa
Catarina (UFSC). Professor da FAE-
Key words: human force; strategic element; communicative ration; Business School.
flexible learning. E-mail: osmarp@bomjesus.br

Rev. FAE, Curitiba, v.5, n.1, p.29-42, jan./abr. 2002 |29


Introdução da “exportação” de modelos de gestão, tecnologia
e estruturas organizacionais.
A economia mundial está passando por uma O ambiente das organizações se ampliou e,
grande transformação, que se manifesta tanto na na literatura especializada, passou-se a analisar
base produtiva quanto nos âmbitos financeiro e esse fenômeno incorporado à noção de sistemas
político. Essas mudanças têm se refletido sobre abertos com ênfase em processos de mudanças.
os diversos mercados e estão associadas à Com os estudos ambientais, os pesquisadores
emergência da denominada Terceira Revolução organizacionais preocuparam-se em entender o
Industrial, à formação de blocos econômicos, ao trinômio ambiente-estratégia-estrutura, incluindo
grande aumento do volume de recursos aí os modelos produtivos.
transacionados no sistema financeiro Considerando este contexto, tem-se o novo
internacional e ao fortalecimento do liberalismo paradigma produtivo, conhecido como
como expressão política desse novo processo. “aprendizado flexível”, que apresenta algumas
O fenômeno da globalização está presente e características, conforme mostra o quadro 1.
parece irreversível. No aspecto organizacional, ele
se manifesta na internacionalização das empresas, QUADRO 1 - MUDANÇAS NO PARADIGMA TECNOLÓGICO

o que provoca mudanças internas em diversos VELHO PARADIGMA NOVO PARADIGMA


níveis. Parece necessário fazê-las avançar, com o Intensivo em energia. Intensivo em informações e
estudo das mudanças organizacionais ocorridas a conhecimento.
Grandes unidades de produção e Redução no tamanho da produção
partir da adoção de estratégias internacionais número de trabalhadores. e no número de trabalhadores.
referentes à importância do capital humano. Produto homogêneo de uma Diversidade de produtos.
unidade da produção.
Desde Max Weber (1946), a teoria das Padronização. Customised (dirigida ao cliente).
organizações vem concentrando esforços na Mix estável de produtos. Mudanças rápidas no mix de
produtos.
compreensão do fenômeno organizacional. O Plantas e equipamentos Sistemas de produção flexível.
estudo das estruturas foi destaque durante as Especializados.
Automação. Sistematização.
décadas de 60 e 70. A partir daí, enfatizaram-se Habilidades especializadas. Multi-habilidades interdisciplinares.
as considerações sobre o ambiente
FONTE: NAKANO (1994, p.11)
organizacional. As organizações passam a ser
percebidas como sistemas abertos que realizam
trocas com o ambiente externo, sendo, portanto, Nesse sentido, exige-se do capital humano
suscetíveis de mudanças. aptidão para trabalhar em equipe, para adaptar-
Após a Segunda Guerra Mundial, a nova ordem se a mudanças no tipo de atividade que irá
econômica internacional diminuiu barreiras desempenhar, para exercer liderança.
comerciais, favoreceu a cooperação entre países e O presente artigo pretende contribuir para os
o estabelecimento de acordos de comércio. Essa estudos que visam à determinação das possíveis
nova disposição incrementou sobremaneira as razões do fazer do gerente de Recursos Humanos,
trocas internacionais, ampliando as atividades o que significa desvendar sua racionalidade
organizacionais. A expansão do comércio mundial intrínseca. Um modelo de racionalidade configura
levou à internacionalização das empresas não só um certo “paradigma” filosófico predominante
em termos de expansão de mercados, mas também numa época. A expressão paradigma não é usada

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aqui em seu sentido estrito, como modelo de 1 A sociedade do conhecimento


ciência historicamente situado numa determi-
nada área do conhecimento, mas em seu sentido Hoje é consenso, entre muitos teóricos, que
mais amplo, como conjunto de pressupostos que a era industrial se esgotou e que a sociedade do
estruturam e condicionam o pensamento de toda conhecimento emergiu como uma nova
uma época. modalidade econômico-social.
Sendo a globalização um novo elemento Investimentos para desenvolver recursos
ambiental, é necessário observar como as essenciais já não podem ser considerados
estratégias na área de Recursos Humanos estão despesas; constituem aquilo que será necessário
gerando mudanças na estrutura organizacional, para assegurar vantagem a médio e longo prazos.
principalmente em relação ao capital humano. O aprender a conhecer, a fazer, a conviver e o
É fundamental, como tem enfatizado SENGE aprender a ser são as habilidades e competências
(1990, p.150), que as organizações promovam o principais no mercado competitivo.
aprendizado. As empresas com larga atuação Essas habilidades e competências nos
internacional, que conseguem administrar as orientam à compreensão do escopo da
fronteiras organizacionais em diferentes países e transformação que está ocorrendo no mundo e
manter inter-relações entre os aspectos globais e nos ajudará a prosperar no próximo século. Tais
locais, parecem colher melhores resultados. competências abrangem métodos para envolver
Compreender as atuais transformações é e inspirar as pessoas, fazer evoluir as equipes e
condição sine qua non para permanecer como as alianças.
ator no palco econômico da história mundial. Essas competências parecem transcender as
Saber ler os novos paradigmas e responder com formas tradicionais e atingir a essência do que é
eficiência e eficácia aos seus desafios é essencial. preciso para ser um líder de mercado em
Este artigo tem por objetivo verificar a constante evolução. Da estratégia de mercado e
importância da teoria do agir comunicativo de da tecnologia da informação às alianças globais
Habermas na era do capital humano, analisado e estratégicas, a arte da previsão tem sido bem
como um elemento estratégico fundamental no mais complicada e incerta hoje.
mundo organizacional. O mundo, segundo economistas e historia-
O método que caracteriza esta pesquisa é o dores, experimentou duas profundas mudanças
estudo de caso, com utilização de fontes múltiplas na base da economia e da estrutura social. Na
de evidências. Os dados foram obtidos mediante primeira grande etapa do desenvolvimento
entrevistas semi-estruturadas com dez gerentes econômico os homens passaram de uma
da Volvo do Brasil e um questionário aplicado em economia tribal de caça e coleta para uma
um dos setores da empresa. A análise dos dados economia agrícola. Essa transição começou há
foi efetuada de forma descritivo-interpretativa, aproximadamente 8.000 anos e hoje está quase
abordagem predominantemente qualitativa, totalmente completa em todo o mundo, exceto
utilizando-se, para tanto, a análise de conteúdo em algumas poucas sociedades primitivas, em
e a análise documental. áreas como a Bacia Amazônica e Nova Guiné.

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Na segunda grande etapa, os homens Embora possa parecer muito frio e desumano
passaram da economia agrícola para a economia referir-se a pessoas como capital, trata-se de uma
industrial. Essa etapa teve início na Grã-Bretanha associação que é realidade. Na sociedade do
há aproximadamente 250 anos e espalhou-se pela conhecimento a educação é universal e os níveis
Europa Ocidental, América do Norte e Japão no crescem para as novas áreas de conhecimento, que
século XIX. Desde a Segunda Guerra Mundial, a requerem mais treinamento e educação atualizada
industrialização tem se difundido de maneira para sua aplicação. Profissionais universitários e
extensiva pela Ásia e parte da América Latina. especializados tornam-se o maior grupo
A terceira etapa da história social dos homens empregado.
é o desenvolvimento da economia e da sociedade A “depreciação” do capital humano está
baseadas no conhecimento. Este processo ligada à rapidez com que o conhecimento e a
começou nos Estados Unidos há cerca de 25 anos tecnologia se tornam obsoletos. A educação
e, atualmente, está se disseminando rapidamente contínua constitui um grande desafio para o
tanto nos Estados Unidos como no restante dos capital humano.
países industrializados desenvolvidos do mundo –
O único caminho para os trabalhadores da sociedade
Canadá, Europa Ocidental e Japão. Suas variáveis
do conhecimento manterem suas habilidades e
críticas e fundamentais são informação e conhecimentos e atuarem efetivamente como capital
conhecimento. Analisaremos a forma dominante humano é se comprometendo com um aprendizado
de economia e a direção para a qual esta economia contínuo e vitalício, o que afetará todos os
está se movendo. Aproximar-se da teoria do agir trabalhadores, tanto como indivíduos quanto como
empregados ou empregadores. Numa sociedade em
comunicativo é fundamental para a compreensão
que as pessoas retornam à escola ou são treinadas
deste novo contexto. para novas carreiras na meia idade, seminários
ocasionais de dois dias serão inadequados. (CRAWFORD,
1994, p.44).
1.1 Aproximação com a teoria do
O estudo do conhecimento humano é tão
agir comunicativo
antigo quanto a própria história do homem e tem
sido o tema central da Filosofia e epistemologia
O capital humano é o ponto central na
desde o período grego. O conhecimento também
transformação global. Como afirma CRAWFORD
começa a ganhar redobrada atenção recen-
(1994, p.17), as mudanças que vêm ocorrendo
temente. Não só teóricos socioeconômicos, como
são tensas e turbulentas para muitas pessoas, mas
Peter Drucker e Alvin Toffler, chamaram a atenção
transformar o mundo numa economia baseada
para a importância do conhecimento como recurso
em conhecimento é, provavelmente, o passo com
e poder gerencial, como também um número
maior probabilidade de sucesso já dado na história
crescente de estudiosos nas áreas de organização
do desenvolvimento econômico do mundo. Para
industrial, gerenciamento da tecnologia,
a maior parte da população mundial este
estratégias gerenciais e teoria organizacional
desenvolvimento irá melhorar sensivelmente a
passou a teorizar sobre a administração do
condição de vida, libertando-a do excessivo
conhecimento.
trabalho e esforço físico de sobrevivência,
permitindo que desenvolvam seu potencial Atualmente é consenso que a criação do
humano de maneira plena. conhecimento é a principal fonte de competiti-

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vidade internacional. DRUCKER (1994, p.69) suprir as necessidades das pessoas.


argumenta que, na nova economia, o conheci- Nesse sentido, queremos propor o espaço
mento não é apenas mais um recurso, ao lado do capital humano como espaço privilegiado do
dos tradicionais fatores de produção, trabalho, ca-
agir comunicativo. Este é um trabalho que busca
pital e terra, mas sim o único recurso significativo.
explicar o que se expressa como conteúdo
TOFFLER (1990) corrobora essa afirmação, normativo da teoria da ação comunicativa,
proclamando que o conhecimento é a fonte de
esclarecendo quais conseqüências podem resultar
poder da mais alta qualidade e a chave para a
desse conteúdo normativo para a práxis na área
futura mudança de poder. O conhecimento
produtiva.
passou de auxiliar do poder monetário e da força
física à sua própria essência, e é por isso que a
batalha pelo controle do conhecimento e pelos
1.2 A teoria da ação comunicativa
meios de comunicação está se acirrando no
mundo inteiro. O conhecimento é o substituto
definitivo de outros recursos. Não podemos negar que, neste final de século,
Busca-se inspiração e referência na reflexão a filosofia registra o fato auspicioso da
filosófica de Jürgen Habermas, especialmente nos extraordinária ascensão da Ética. O debate ético,
estudos que fundamentam a sua teoria da ação hoje, está ao alcance de todos os interessados na
comunicativa. Filósofo alemão contem-porâneo, discussão de problemas morais. A ética ao alcance
herdeiro da Escola de Frankfurt, Habermas de todos renasce. Seu desafio é encontrar um
desenvolve uma teoria crítica da sociedade ponto de partida novo, abrangente e capaz de
contemporânea a partir de uma crítica dos modos interpretar o homem, a terra e o universo nas suas
de racionalidade nela encarnados. novas circunstâncias.
A mudança de paradigma que Habermas Entramos na fase da política global em
propõe é a de que o parâmetro da racionalidade matéria de saúde, educação, economia,
de crítica deixa de ser o sujeito cognoscente que tecnologia e ecologia. Nesta perspectiva global,
se relaciona com os objetos para conhecê-los e a questão central, em nossos dias, é esta: qual a
manipulá-los, passando a ser a relação intersub-
importância da teoria do agir comunicativo para
jetiva que os sujeitos estabelecem entre si a fim
compreendermos o valor inestimável do capital
de se entenderem sobre algo (HABERMAS, 1992,
humano neste final de século?
Tomo I, p.499).
Temos consciência de que para responder a
O interesse de Habermas é elaborar uma
esta questão não basta um paradigma ético,
teoria da racionalidade que contemple, além do
elemento cognitivo-instrumental, o elemento limitado ao alcance de suas premissas. Os modelos
prático-moral e o elemento estético-expressivo religiosos, filosóficos e científicos também são
(HABERMAS, 1990, p.291). insuficientes quando unidirecionais. Num mundo
Nossa intuição quanto à possível fecun-didade pluralista como o nosso é preciso que vários
da reflexão habermasiana para a economia se deve paradigmas éticos tentem interpretar os
à constatação de que os objetivos gerais da variadíssimos aspectos da realidade.
economia se colocam na perspectiva de No entanto, optou-se pela teoria do agir
transformar os recursos em bens e serviços para comunicativo como um dos paradigmas mais
importantes nesta virada de milênio.
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Princípios básicos da teoria duas ou mais pessoas procuram expres-
da ação comunicativa samente chegar a um acordo voluntário
de modo a poder cooperar. A ação
comunicativa é constituída de sentidos
A teoria da ação de Habermas parte do suposto
compartilhados e envolve um esforço
de que os homens agem como sujeitos dotados de
explícito e concentrado para alcançar um
capacidade de ação e que a concretizam, em
acordo sobre o espectro das reivindicações
conjunto, de acordo com a sua racionalidade (agem
de validade.
em função de uma razão, de interesses, no sentido
weberiano). Ao se agir estrategicamente pode-se forçar
os outros a contribuírem para determinada meta,
A concepção teórica de Habermas está voltada
e neste agir inclui-se, por exemplo, emitir ordens,
principalmente para a reconstrução das condições
ameaças, mentiras e outras proposições
existentes (no sentido da totalidade Durkheiniana),
pois os indivíduos, quando socializados, manipuladoras.
comunicam-se por meio da linguagem e não há Para Habermas, a prática cotidiana orientada
como evitar o emprego dessa linguagem que está para o entendimento está permeada de
voltada para o entendimento; daí, a razão idealizações inevitáveis que permitem ao médium
comunicativa ( HABERMAS , 1993, p.95-112). da linguagem coloquial a reprodução de nossa
Portanto, a ação, para Habermas, expressa a vida. Essas idealizações estão associadas aos
intenção do agente em relação à realidade, e conteúdos normativos que se encontram em
quando se afasta de uma relação intencional com a nossas práticas, das quais não podemos prescindir
realidade (objetiva, social e subjetiva) perde qualquer porque a linguagem (associada à “visão do
conteúdo cognitivo, normativo e expressivo. Nesse
mundo”) é constitutiva para as formas de vida
sentido, existem quatro tipos básicos de ações:
socioculturais. (HABERMAS, 1993).
1) a ação estratégica/teleológica, que ocorre
Para Habermas, os problemas do Sistema não
quando as decisões e o comportamento
são sempre econômicos mas derivados,
de pelo menos uma pessoa (um agente)
geralmente, da base social. Entretanto, só a
são incluídos no cálculo correspondente
aos meios e fins; sociedade capitalista, por meio da institucionali-
zação formal, permite um mecanismo baseado
2) a ação normativa se dá quando a intenção
exclusivamente no mercado para regular o acesso
básica é atender às expectativas
à propriedade e a distribuição de riqueza.
recíprocas mediante o ajuste de conduta
a normas e valores compartilhados; A função do mercado é liberar a ordem política
3) a ação dramática, em que o objetivo das pressões em favor da legitimação (no sentido
principal é a auto-representação. Está da lei). Assim, a ideologia burguesa oculta a
ligada à projeção de uma imagem pública exploração do trabalho através da fachada
e à “representação de papéis” (no sentido impessoal dos contratos de trabalho involuntários
do interacionismo simbólico de (no sentido das condições de liberdade universal
Goffmann). Toda ação dramática é impli- na troca de equivalentes no mercado). Desse modo,
citamente estratégica e visa a obter uma o conflito de classes se desloca da arena politizada
resposta determinada de certa audiência; da interação social para o domínio não-normativo
4) a ação comunicativa, que ocorre quando e impessoal das transações do mercado, descolando-

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se, assim, o eixo das relações de produção e de sistêmicos que estabilizam plexos de
acumulação de capital para a demanda de ação não pretendidos mediante um
consumidores (transmutam-se produtores e entrelaçamento funcional das conse-
vendedores de força de trabalho em consumidores qüências da ação”.
de bens e serviços). Levando em conta os pressupostos teóricos
Na construção teórica sobre o mundo da da Teoria do Agir Comunicativo de Habermas, é
vida, Habermas fundamenta-se em Weber em preciso, neste momento, esclarecer de uma forma
dois aspectos: mais aprofundada os modelos de racionalidade,
1) Em relação à questão da diferenciação partindo da concepção de Habermas.
entre “âmbitos culturais independentes”,
onde a ciência, o direito, a moralidade e a
arte constituem práticas culturais 1.3 Modelos de racionalidade
independentes, cada uma é regulada por
seus princípios próprios e específicos. Esse Os modelos de racionalidade remontam às
processo de autonomização envolve, duas relações fundamentais em que o homem
segundo Habermas, a “racionalização das se envolve ao realizar suas ações: as relações
imagens do mundo”. Há uma com a natureza e as relações com os outros
desfetichização do mundo na medida em homens. Com a natureza a relação é de
que se separa natureza da cultura e se conhecimento e de domínio; com os outros
traça uma distinção entre mundo físico, homens a relação tem a característica básica
governado por leis causais, e o mundo de uma interação simbolicamente mediada.
humano, permeado de significados e (OLIVEIRA, 1989, p.15-16).
propósitos. Nesta distinção, a natureza A noção de “racionalidade” emerge
deixa de ser uma projeção das exatamente dessa capacidade de o homem agir
preocupações humanas. Este processo de sobre a natureza e de interagir com os outros. Na
racionalização implica a formalização da realidade somente às pessoas atribuímos o
mesma razão. Segundo Habermas, a predicado de racionais ou de irracionais, e isso
racionalidade já não consiste em certas tão-somente sob o ponto de vista do que falam
idéias substantivas, senão nos procedi- ou do que fazem. Interagindo pela fala ou agindo
mentos que sustentam as idéias e estão pela intervenção na natureza, as pessoas podem
implícitos em todo ato de fala. comportar-se de forma mais ou menos racional.
2) A modernização implica uma segunda Segundo Habermas (1992, p.27), se
forma de diferenciação que se estabelece tomarmos como modelo as ações do homem
entre sistema e mundo da vida. É sobre a natureza, em que há a utilização de um
condição necessária para o saber (convicção) não-comunicativo, estaremos
desenvolvimento do capitalismo que a optando por um conceito de racionalidade
integração sistêmica se desprenda da cognitivo-instrumental que tem a conotação de
integração social, como vimos. A uma auto-afirmação em êxito no mundo objetivo
reprodução da sociedade depende, cada possibilitada pela capacidade de manipular
vez mais, do surgimento de “mecanismos informadamente e de se adaptar inteligen-

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temente às condições de um entorno contingente. normas e vivências que podem ser justas ou sinceras.
Mas se tomarmos como modelo as Com isso, além do elemento cognitivo-instrumental
manifestações simbólicas dos homens que a racionalidade comunicativa permite integrar
encarnam saberes (convicções) intersubjeti- também os elementos prático-morais e estético-
vamente partilhados, estaremos optando por um expressivos (HABERMAS, 1990, p.291).
conceito de racionalidade comunicativa. Esse
conceito aponta para a capacidade de agir sem
coações e de produzir consensos mediante a fala 1.4 O capital humano como
argumentativa, com o que os sujeitos da elemento estratégico
comunicação asseguram a unidade do mundo
objetivo, a intersubjetividade do contexto em que Todos os seres humanos possuem valor
desenvolvem suas vidas. intrínseco. A noção de capital humano surgiu
Tanto as ações de caráter cognitivo- recentemente. Humano, do latim hominem (para
instrumental como as ações orientadas ao humanos), está relacionado a pessoas. Determina
entendimento são comuns e indispensáveis no nossa espécie: o ser humano é uma pessoa. Capital,
planejamento estratégico de uma organização. do latim caput (para cabeça), tem muitas
O agir estratégico não pode ser concebido sim- interpretações. No uso comum significa o primeiro,
plesmente como uma manipulação instrumental. maior ou melhor. Na contabilidade moderna denota
lucro líquido – os ativos restantes de um negócio
O agir comunicativo resulta da aplicação, em
após todos os passivos serem deduzidos.
contextos de ação social, do modelo de
racionalidade que emana dos processos de A noção de capital humano desenvolveu-se
entendimento de validez criticáveis. A linguagem rapidamente nos últimos séculos, como mostra o
aparece com todo o seu potencial de motivar a quadro 2, a seguir.
convicção e de gerar consenso. No início do século XIX, o termo se ampliou
de dinheiro ou título mercantil para significar o
O agir estratégico, que resulta somente do
próprio valor. Capital passou a significar uma
modelo de racionalidade que emana dos processos
unidade de valor vinculada ao trabalho
de intervenção na natureza com o fim de uma
empreendido para criá-la. Esse vínculo entre
manipulação com êxito, não passa de um meio de
dinheiro e trabalho abalou a Europa devido à obra
transmissão de informações e de influência de uns
de Karl Marx (1867), O Capital. Nela o autor
sobre os outros e sobre a situação da ação,
argumentou que a força de trabalho era a fonte
induzindo o comportamento. Nesse sentido, o de todo valor e que os investimentos em terra ou
capital humano não é levado a sério. tecnologia apenas transferiam valor, mas não o
É importante notar que o aspecto cognitivo- adicionavam. Ele propôs o comunismo como um
instrumental não fica excluído da reflexão sistema econômico.
habermasiana, mas é integrado como momento Enquanto Marx declarava esse princípio, a
particular de uma idéia de racionalidade mais ampla. Revolução Industrial impunha uma visão
A racionalidade comunicativa tem essa maior completamente diferente no mundo capitalista –
amplitude e é um conceito mais rico porque a a de que os seres humanos eram indispensáveis e
linguagem permite que se estabeleça um intercambiáveis; que eram um meio necessário para
entendimento não só acerca de objetos dos quais um determinado fim.
se possa predicar a verdade, mas também sobre Foi nesse período árido que a noção de

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QUADRO 2 - DESTAQUES DA HISTÓRIA DO "CAPITAL" mais eficazes. Temos certeza de que as empresas
1611 Randle Cotgrave define capital como a riqueza não podem alcançar resultados positivos ou
possuída por um indivíduo. duradouros a menos que aprendam, também, a
1776-1790 Adam Smith e Edmund Burke escrevem sobre o capital gerenciar e aumentar o valor de seus funcionários
social de uma empresa e sobre a importância de como força de trabalho.
começar um empreendimento (comércio) com capital.
Michael HAMMER (1996) e James CHAMPY
1793 Jeremy Bentham estende a noção de capital dos
níveis individual e empresarial para o nacional.
(1996) tiveram a brilhante idéia de acrescentar
1867 Karl Marx afirma que todo valor vem da mão-de-obra. o elemento humano que faltava nas atuais
1911 As idéias de Frederick Taylor compartimentam o seqüências de reengenharia. Ao revisar e
trabalho, reduzindo seu valor percebido. reestruturar as empresas em relação à mudança
1979 Theodore Schultz e Sir Arthur Lewis recebem o no serviço ao cliente, os adeptos da reengenharia
Prêmio Nobel de Economia por seu trabalho pioneiro
melhoraram sua eficácia e desempenho
sobre capital humano.
financeiro. Sobre a resistência dos gerentes em
1998 Em um obituário do Chicago Tribune, Theodore
aplicar a reengenharia, Champy afirma que a
Schultz é aclamado como "o pai do capital humano".
A noção de capital humano ganhou bastante
própria gerência, e não apenas as empresas, têm
reconhecimento, havendo quase dois milhões de de passar por uma reengenharia.
sites sobre o assunto na Internet. As empresas precisam perceber que os seres
FONTE: FRIEDMAN (2000, p.16) humanos, em seu trabalho, não são apenas
pessoas movimentando ativos – eles próprios são
“recursos humanos” surgiu. Percebemos que
ativos que podem ser valorizados, medidos e
desde os sistemas de valor do século XIX os
desenvolvidos como qualquer outro ativo da
industriais focalizavam novos meios de
corporação. São ativos dinâmicos que podem ter
engenharia e produção. A função das pessoas e
seu valor aumentado com o tempo, e não ativos
o trabalhador em geral não eram muito
inertes que perdem valor. Com certeza são os
valorizados. Os funcionários eram tratados como mais importantes de todos os ativos. Os sistemas
parte da produção e, o pessoal, como criados para recrutá-los, recompensá-los e
empregados de estoque. desenvolvê-los formam uma parte principal do
Os gerentes seniores de hoje praticaram o valor de qualquer empresa – tanto quanto ou
planejamento estratégico nos anos 70, a gestão mais do que outros ativos, como dinheiro, terras,
da qualidade total ( TQM ) nos anos 80 e a fábricas, equipamentos e propriedade
reengenharia nos anos 90. Cada um desses intelectual. O valor da empresa e, portanto, o
movimentos trouxe contribuições significativas valor para o acionista (o valor das ações de uma
para o desempenho corporativo. Poderiam ter empresa) podem ser depreciados quando o
tido melhores resultados caso tivessem assumido capital humano é mal gerenciado.
o valor do capital humano por completo. Os A teoria do agir comunicativo nos deixa claro
recursos humanos, em cada um desses que o alto valor do capital humano é uma matéria
movimentos, eram analisados como um meio econômica difícil e urgente nesse contexto da
intercambiável ou mesmo indispensável para sociedade do conhecimento. Nesse sentido, devido
algum fim maior: domínio de mercado, maior à crescente importância e escassez do capital
qualidade de serviços e produtos ou processos humano e à plenitude do capital financeiro, as

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empresas em todo o mundo apresentarão uma conta com 60 EAGs. O questionário foi aplicado
tendência natural de utilizar capital financeiro para em uma dessas equipes, no setor X, pelo seu
obter e alcançar seu capital humano. gestor. A seguir apresentam-se algumas reflexões
A teoria da ação comunicativa possibilita uma a partir dos dados que se conseguiu coletar.
efetiva participação em redes e acelera o processo O conceito de EAGs adotado pela Volvo do
de aprendizagem, o que permite a melhoria Brasil encontra um certo embasamento teórico
contínua do ajuste organização-ambiente. Não é definindo os aspectos comportamentais das EAGs.
nosso objetivo, aqui, aprofun-darmos o estudo A expectativa de melhorar os processos e atingir
sobre alianças estratégicas, mas observamos que os objetivos de negócios é evidente na
as pesquisas sobre este tema têm aumentado em implementação das EAGs. Segundo um dos
diversidade de abordagens. Apresenta-se como gerentes, “verifica-se a preocupação com a
um instrumento alternativo altamente flexível, necessidade de atender a visão e os princípios da
cuja eficácia é determinada por uma série de organização: teamwork, desenvolvimento
contingências. individual, otimização dos recursos, adequação à
nova estrutura hierárquica, desenvolvimento
organizacional contínuo, processo de comu-
3 Estudo de caso nicação mais rápido e aberto”.
A teoria do agir comunicativo é fundamental
O estudo de caso deu prioridade a uma para reconstruir a visão técnico-instrumental
empresa do setor industrial onde o foco principal simplista que percebemos no universo
foi a área de recursos humanos e suas interfaces organizacional. Os gestores, em sua grande
com o planejamento estratégico da organização. maioria, se dão conta de que o modelo tradicional
Realizou-se a abordagem de um diagnóstico de estrutura organizacional mostra-se menos
do estágio atual da empresa, no que se refere às eficiente nas condições atuais de competitividade
suas políticas de recursos humanos, mediante do mercado global. Há uma preocupação com os
entrevista com alguns gerentes das mais diversas aspectos de qualidade, produtividade, serviço,
áreas da empresa e um questionário com os flexibilidade e redução de custos operacionais.
colaboradores da organização, isto é, os Uma das deficiências consiste em permanecer
empregados de um determinado setor. na visão técnico-instrumental. Atualmente, a
As equipes autogerenciáveis (EAGs) foi um concepção dominante de razão prática na ciência
dos trabalhos mais significativos na Volvo do Brasil social é a estratégia. Essa concepção é mais
em Curitiba, no ano de 1999. Segundo um dos explicitamente adotada por aqueles que
gerentes, e seguindo o procedimento da consideram a si mesmos teóricos da escola
Qualidade 20143, o conceito de EAGs na Volvo é racional. Esta escola tenta fornecer um claro
o seguinte: “são grupos de pessoas com atividades delineamento de um modelo minimal do sujeito
interdependentes. (...) Grupo íntegro de e ser teoricamente rigorosa no vincular suas
colaboradores responsáveis por todo um processo assertivas sobre as características do sujeito a suas
ou segmento de trabalho com o mínimo de hipóteses sobre os fenômenos políticos. Sua
supervisão direta”. caracterização do sujeito é clara em relação ao
que são dois aspectos essenciais de qualquer
Atualmente a Volvo do Brasil em Curitiba

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Revista da FAE

modelo minimal: uma concepção de ação e o capital humano elemento estratégico na


racionalidade. A ação é conceitualizada como o economia da sociedade do conhecimento.
comportamento intencional, interessado em si
próprio, dos indivíduos num mundo objetivado,
isto é, num mundo em que os objetos e os outros Conclusão
indivíduos estão relacionados em termos de sua
possível manipulação. A racionalidade da ação é O aumento das preocupações com o capital
correspondentemente conceitualizada como a humano tem ocasionado a quebra de muitos
vinculação eficiente das ações vistas como meios paradigmas, dentre eles o de que a viabilidade
para a consecução de metas individuais. dos projetos seja determinada unicamente por
seus resultados econômico-financeiros,
A meta específica que Habermas adota na
desconsiderando seus aspectos de aprendizagem
teoria da ação comunicativa é a de demonstrar
organizacional.
por que a modernidade representa um avanço
significativo no aprendizado humano. O modelo Obviamente esse paradigma vem sendo
comunicativo abre o fenômeno da modernidade quebrado somente quando se verifica que as
exigências de aprendizagem começaram a impor
para uma leitura mais complexa, leitura que
perdas econômicas aos agentes econômicos. A
localiza tanto o potencial universal racional
partir de então, a maioria dos pesquisadores tem
manifestado nas modernas estruturas de
dirigido sua atenção a essa questão, visto ser
consciência quanto o uso seletivo ou unilateral
uma das maiores mudanças para a formação de
desse potencial nos processos societais de
novos paradigmas, que passam a valorizar mais
racionalização ou modernização ocidentais.
o capital humano.
Quando a visão de treinamento e acom-
Poucas empresas medem o retorno de seus
panhamento das equipes fundamenta-se na investimentos em capital humano, e pouquís-
racionalidade técnico-instrumental, a produti- simas publicam seus resultados e descobertas.
vidade ideal ficará comprometida. Há, entretanto, uma grande evidência que indica
O grande desafio consiste em perceber que que práticas diversas de capital humano podem
as ações de caráter cognitivo-instrumental, como levar ao melhor desempenho financeiro das
as ações orientadas ao entendimento, são organizações, como é o caso da empresa na qual
comuns e indispensáveis no planejamento foi realizada a pesquisa. O estudo de caso mostra
estratégico da organização. O processo de algumas ações que a Volvo do Brasil vem
mudança de cultura organizacional com base praticando nos últimos anos para melhorar o
somente nas ações de caráter cognitivo- valor de seu capital humano.
instrumental não passará de um simples Há uma preocupação em recrutar profissio-
modismo. As ações orientadas ao entendimento nais qualificados capazes de contribuir para o
desvinculadas das ações de caráter cognitivo- desenvolvimento organizacional em um contexto
instrumental não provocarão mudanças empresarial de extrema competitividade. A
significativas. O ideal é trabalhar no sentido de gerência de recursos humanos faz propostas para
integrar os dois tipos de racionalidade. Nesse a unidade, baseadas em tendências passadas e no
sentido, a teoria da ação comunicativa tornará desenvolvimento de projetos futuros. O processo

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de recrutamento está em constante processo de transparecer desconhecimento em relação aos
melhoria, uma vez que os gerentes solicitam avanços que estavam acontecendo em outros
feedback de recentes contratações e ajustam o setores da empresa. Assim, o desenvolvimento de
programa apropriadamente, levando em conta o equipes deve abranger a empresa como um todo,
capital humano já existente. buscando uma maior integração entre os seus
Ao esclarecer sua estratégia e avaliar seus diversos setores.
programas atuais, a empresa decidiu por Uma outra área trabalhada na pesquisa foi a
programas de benefícios flexíveis, medida que avaliação do capital humano. O sistema que a
aumenta o compromisso e a motivação dos Volvo do Brasil desenvolveu está completamente
funcionários. O gerenciamento do desempenho integrado com as iniciativas de RH na empresa.
tem sido um elemento valorizado na Volvo do A mudança da estrutura organizacional
Brasil. A melhoria contínua do desempenho foi geralmente é lenta, a menos que os gestores tendam
um foco-chave na empresa. As equipes auto- a alterá-la deliberadamente. Uma maneira de mudar
gerenciáveis são um exemplo riquíssimo de que a uma estrutura organizacional é empenhar-se para
Volvo do Brasil está interessada em melhorar o criar uma organização que aprenda a aprender, que
recrutamento. A revisão na estrutura organiza- se transforme continuamente por estimular a
cional nos últimos anos conduziu a empresa a dedicação de seus funcionários à mudança,
um processo de alteração completa na cultura – adaptação e inovação organizacional. Uma
de uma cultura hierárquica para uma cultura organização que aprende geralmente tem uma
orientada por resultados e competências. estrutura organizacional achatada, com
As reuniões das equipes autogerenciáveis são pouquíssimos níveis de comando, focaliza a criação,
feitas regularmente no sentido de garantir que aquisição, transferência de conhecimento e
todos os grupos estejam conscientes do papel que modificação de comportamento para implementar
exercem para alcançar os objetivos do negócio a inovação organizacional adequada a um ambiente
(como revelou o resultado da entrevista realizada competitivo.
em um dos setores da empresa onde funcionam Uma das grandes limitações da empresa
as equipes auto-gerenciáveis). Além disso, estudada está na não criação de equipes de
avaliações das chefias pelos subordinados foram aprendizagem multidisciplinares e salas para
introduzidas como uma atividade de desenvol- aprendizagem autodirecionada, workshops para
vimento de equipe. compartilhá-la e sessões regulares de estratégia
A Volvo do Brasil oferece um dos exemplos de fora do ambiente de trabalho. A comunicação
gerenciamento de desempenho – o empowerment. ascendente não é fortemente encorajada. A título
O empowerment sem poder econômico pouco de exemplo, dois dos entrevistados não estavam
significa, e não há expressão mais clara de poder sabendo o que os outros setores faziam em relação
do que a autoridade orçamentária. Um aspecto à criação de equipes autogerenciáveis.
importante do movimento de empowerment, como Na área de recursos humanos, os gerentes
mostram os resultados da pesquisa, é o trabalho que se encontram de frente à multiplicidade de
em equipe. Percebeu-se que essa visão necessita saberes intervenientes, em suas práticas aliadas à
abranger a empresa em sua totalidade e não crise e à indefinição no tocante a um quadro
somente a área operacional. teórico-conceitual de referência, encontram
Alguns gerentes entrevistados deixaram dificuldades para um adequado discernimento das

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situações com que se deparam. Para não convivência humana, no caso a reconstrução
transformarem suas práticas em ações sim- teórica de condições e pressuposições que
plesmente arbitrárias, é preciso que encontrem acompanham a linguagem comunicativa e que
razões capazes de fundamentá-las, garantindo, explicitam um determinado modelo de
com isso, a identidade e coerência do exercício racionalidade. Como reconstrução teórica a
profissional. filosofia estabelece o seu referencial crítico-
Foi com o objetivo de subsidiar a construção reflexivo com base no que se depreende de
de uma identidade profissional que se buscou, situações concretas do mundo vivido, e não em
com este trabalho, algumas perspectivas teórico- imagens-ideais de homem e de sociedade.
metodológicas para o universo organizacional, A novidade da construção teórica está em
baseando-nos, para isso, na reflexão filosófica de ter sido projetada com base na arquitetônica de
Habermas. uma concepção de administração que busca
O estudo sobre a sociedade do conhecimento realizar-se como ação comunicativa. O próprio
e de Habermas, em seu esforço de resgatar o líder, ao adotar uma atitude fundamental voltada
potencial de racionalidade comunicativa em ao entendimento, estará encarnando a
contextos interativos do mundo da vida, racionalidade comunicativa sem uma prática. E
argumenta-se no sentido de que a organização só esta pesquisa buscou ser uma contribuição para
alcançaria um bom êxito no cumprimento de suas que tal atitude pudesse ser teoricamente refletida,
finalidades por meio da otimização deste potencial permitindo que o administrador pudesse
de racionalidade em seus processos estratégicos fundamentá-la mediante a explicitação de sua
em relação ao capital humano. O interagir voltado racionalidade intrínseca.
ao entendimento constitui, nessa perspectiva, a Finalmente, cabe ressaltar que o adminis-
própria condição de possibilidade para a realização trador, especialmente os gestores de recursos
de finalidades estratégicas como as que se referem humanos, na busca da construção de sua
à reprodução e à renovação de tradições culturais, identidade profissional, terá condições de
ao estabelecimento de solidariedades e de padrões fundamentar sua prática baseando-se em
de convivência e à socialização dos conhecimentos motivos de racionalidade. Fundamentação esta
por parte do capital humano. que ultrapassa o âmbito das proposições
O diferencial que marca a pesquisa não baseadas em argumentos que emergem da
está numa pretensa novidade absoluta ou num estrutura racional das interações e dos saberes
delineamento de práticas jamais imaginadas ou que constituem os objetos de entendimento.
totalmente ausentes nos meios O propósito de refletir sobre o capital
organizacionais. O diferencial está na com- humano sob a teoria do agir comunicativo de
preensão e na articulação dessas práticas à luz Habermas é identificar as oportunidades de
de um novo enfoque teórico, sob a égide de melhorias e desenvolvimento – não é um exercício
um novo paradigma. de olhar em retrospecto para focalizar tudo o que
Foi o próprio referencial habermasiano que está errado na organização, mas um exercício de
acabou dando as características metodológicas olhar adiante e explorar os meios de acrescentar
à investigação. A filosofia de Habermas se valor e causar diferença no futuro.
apresenta como reconstrução teórica de
condições e pressuposições que subjazem à

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Referências

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