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ISCTE

LICENCIATURA EM ANTROPOLOGIA
TEORIAS E PROBLEMÁTICAS DA ANTROPOLOGIA 4
2.Jun.2009

Recensão crítica da obra de Amitav Ghosh


In an Antique Land: History in the Guise of a Traveler’s Guide

ANA CANHOTO
N.º 27685
TURMA AC2
Reconhecido mundialmente pelos romances traduzidos em várias línguas, Amitav Ghosh é,
na actualidade, um dos mais conceituados escritores indianos. Dos contos aos ensaios
académicos, as suas obras estão recheadas de histórias de vida que nos orientam para o
questionamento sobre o legado colonial que permanece presente no tripartido subcontinente
da Ásia do Sul. Nelas encontramos uma incessante inquietação pelas ambiguidades que
persistem nos debates pós-coloniais, com referências à diáspora, às estruturas de dominância
simbólica herdadas do colonialismo e à perseverança dos paradigmas ocidentais na Índia da
actualidade (Amitav Ghosh «About» 2007a). Revela-nos também, através de uma escrita
onde predominam os diálogos, uma permanente preocupação pela sua incapacidade em
compreender os outros e em transmitir um conhecimento totalizante sobre estes.
Formado em História, com Mestrado em Sociologia, ambos pela Delhi University, e
terminando o seu percurso formativo com um Doutoramento em Antropologia Social na
Oxford University, Ghosh demonstra insurgir-se contra os historiadores indianos que se
consideram autoridade na descrição das histórias de vida e que negam o papel do comum
indivíduo como agente social. É esta sua postura que nos leva a considerar que a sua obra se
integra na linha dos Subaltern Studies, onde prevalecem os debates sobre uma história «...
estrangulada pelo “elitismo”, de ambas variantes “colonialista” e “nacionalista-burguesa”...»
(Vinay Lal «Subaltern Studies and its Critics: Debates over Indian History. History and
Theory 40 (February 2001)», 2005, 135-148, tradução minha) e que parece querer renegar o
papel dos grupos subalternos na construção de uma Índia antes, durante e após o
colonialismo.
Destacamos o seu interesse pelo «The Slave of MS. H.6», um mero escravo que lhe despertou
a atenção durante os primeiros anos da sua carreira académica e que está na origem deste seu
terceiro livro, In an Antique Land: History in the Guise of a Traveler’s Guide, publicado em
1992 e premiado com o New York Times Notable Book of 1993 (Amitav Ghosh, «Amitav
Ghosh», 2007b).
Situando-se nas fronteiras entre a ficção e a realidade, a autobiografia, a história e a
antropologia, neste seu diário de viagem por Lataifa e Nashawy, no Egipto, e por Mangalore,
na Índia, durante os anos 80 do século XX, Ghosh descreve-nos duas histórias. Na primeira
traça as suas experiências como um antropólogo indiano que se desloca ao Delta do Nilo em
três visitas distanciadas no tempo, para realizar um trabalho etnográfico para o seu
Doutoramento em Oxford. Na outra revela-nos a existência de relações pré-coloniais entre o
subcontinente indiano e a península árabe durante o século XII, através da história de um
mercador judeu e do seu escravo indiano. São duas histórias – a do narrador como etnógrafo,

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que assumimos ser Amitav Ghosh, pois este não o declara explicitamente e apenas refere que
o designam de «ya Amitab», e a de Bomma como objecto de estudo – que o autor nos vai
descrevendo ao longo da obra como se tratassem de crónicas de vida que, ocorrendo em
diferentes época, tocam-se e partilham acontecimentos semelhantes. É como se a história de
um passado não fosse assim tão distinta da história de um presente. Bem pelo contrário,
Ghosh faz-nos ver que o tempo é apenas circunstancial e que a ideia de acontecimentos
diferentes em tempos arcaicos e em tempos modernos não são mais que imaginações e
artificialidades, que apenas servem para justificar relações de poder e de dominação.
Dividido em seis partes – «Prologue», «Lataifa», «Nashâwy», «Mangalore», «Going Back» e
«Epilogue», parte à procura de Bomma, o escravo indiano da carta «…catalogada com o
número MS H.6, da Biblioteca Nacional e Universitária de Jerusalém …» (Amitav Ghosh, In
an Antique Land, 1994: 13, tradução minha) que, por constar em vários manuscritos, e não se
tratando de um monarca, nobre, militar, deverá ser alguém com uma elevada importância nos
acontecimentos históricos. E, utilizando como fonte alguns fragmentos das cartas, arquivados
na Geniza de Cairo (Alden Oreck, «The Cairo Genizah. Jewish Virtual Library», 2009), parte
à procura de reconstruir a sua biografia através da história de Abraham Ben Yiju, negociante
judeu tunisino que terá adquirido o escravo, seu assistente nos negócios, no Egipto e
posteriormente se terá fixado em Mangalore, na Índia.
Iniciando o seu percurso na aldeia egípcia de Lataifa, Ghosh vai-nos dando a conhecer os
locais por onde passa e as várias pessoas que com ele se vão cruzando e o que o auxiliam na
sua pesquisa. Do mesmo modo, apresenta-nos a viagem de outro indiano, o escravo, ao
Egipto, assim como a visita de Ben Yiju à Índia.
São-nos apresentados vários habitantes das duas povoações de Lataifa e de Nashawy, vários
escolásticos, um tanto obscuros por existirem apenas alusões dos mesmos. Destacamos
algumas figuras pela sua frequente aparição: o Doutor Aly Issa, professor na Universidade de
Alexandria e que o orienta para a casa de Abu’Ali, descrito como um irascível anfitrião,
Shaikh Musa e sua família, Ustaz Mustapha, Ustaz Sabry, Khamees, Zaghloul, Nabeel, entre
outros.
Ao longo da história que nos vai contando sobre a sua vivência entre estes e sobre a estância
de Bomma no Egipto, somos levados a pensar que estamos perante mais um outro por entre
muitos outros. O narrador é identificado como médico, não islâmico, não circuncisado e
adorador de vacas, um outsider1 que se transforma ele próprio em objecto antropológico,
tornando-se alvo de muitas questões e de várias tentativas de conversão ao islamismo.

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Porém, se por um lado ele é um outsider, por outro é também um insider, alguém que é
reconhecido como tendo um baixo estatuto por ser um hindu num país de islâmicos e um
etnógrafo de um país do Terceiro Mundo, distinguindo-se dos demais estrangeiros. Alguns
egípcios esperam dele certas atitudes, como prostrar-se perante as vacas, acto que para os
islâmicos é descabido e desprovido de significado. Ocorrem também conversações
conflituosas, sobre as quais Ghosh consegue nos surpreender com a afirmação do seu eu,
colocando de parte o seu papel de antropólogo distanciado e mostrando a sua realidade de ser
humano cultural. Destacamos um dos diálogos com o Iman Ibrahim2, cujo olhar o remete para
a primitividade, para o confronto entre a ideologia de uma Europa avançada, educada,
científica e com armamento e uma Índia arcaica, primitiva, que consente a cremação dos
corpos;

«De repente algo ferve na minha cabeça, dilemas e argumentos que eu já não
podiam conter em mim. ‘Nós também temos!’ gritei eu para ele. ‘No meu país
também temos essas coisas; temos pistolas e tanques e bombas. E elas são
melhores do que qualquer coisa que vocês tenham no Egipto – nós estamos mais
avançados que vocês.’» (Amitav Ghosh, In an Antique Land, 1994: 235-236,
tradução minha).

Mas, tal como nos demonstra a sua ira neste diálogo, também seguidamente nos dá a
indicação de um sentimento de culpa por incapacidade de atingir a harmonia entre duas
pessoas de diferentes culturas. Não tinha conseguido a mesma relação que teria Bomma e Ben
Yiju, onde a dissemelhança estaria conciliada por uma excelente relação, não de escravo e seu
amo, mas de parceiros nos negócios.
Contudo, Ghosh mostra reconhecer que nem só de vozes dissonantes são construídos os
diálogos e as relações entre indianos e egípcios no século XX e apresenta-nos vozes que
procuram apaziguar a diferença. Referindo Nabeel:

«‘Eles estão apenas a perguntar,’ disse ele, ‘tal como tu fazes; eles não pretendiam
fazer mal. Porque é deixas que o falatório sobre as vacas e a cremação e a
circuncisão te afecte tanto? São apenas costumes; é natural que as pessoas sejam
curiosas. Estas não são coisas que te deveriam chatear’» (Amitav Ghosh, In an
Antique Land, 1994: 204, tradução minha).

Neste diálogo Ghosh chama-nos a atenção que o etnógrafo não deixa de ser uma entidade
cultural que deverá, contudo, compreender que a sua posição de interrogador também o torna
alvo de interrogações, pois ele é fonte de curiosidade. E nem sempre o trabalho de um
etnógrafo é apenas recolher informações no terreno, sem que tome consciência das
adversidades. Tal como existem situações de exposição da dissemelhança, também ocorre o

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reconhecimento da partilha de algo em comum, pois não somos uma identidade estática, mas
sim um conjunto de identidades onde algo se assemelha onde quer que estejamos, nem que
seja a pertença comum à espécie humana.
Ao incluir, nesta obra, esta sua discussão com o Imam, Ghosh pretende ainda se expor como
etnógrafo sem autoridade de explicar a cultura egípcia, pois «’… nem sequer sabe escrever
Arábico’» (Amitav Ghosh, In an Antique Land, 1994: 234, tradução minha), subvertendo o
tradicionalismo etnográfico no qual o etnógrafo se reconhece com poder para descrever o
outro, distanciando-se deste. Deste modo, faz evidenciar o quanto a linguagem é contingente
e pode levantar problemas ao etnógrafo enquanto tradutor. Tal é exemplo o diálogo sobre a
circuncisão com Jabir, sobrinho de Abu’Ali, e no qual o narrador se sente «… apanhado na
ratoeira da linguagem.» (Amitav Ghosh, In an Antique Land, 1994: 62, tradução minha). Não
só Ghosh não tinha conhecimentos da língua árabe durante o tempo em que trabalhou em
Lataifa, como também este termo é portador de um simbolismo específico para os nativos
islâmicos - «purificar». E sendo o narrador alguém não circuncisado, sente-se eticamente
obrigado a se afirmar como impuro, expondo-se ao risco. Contudo, novamente Ghosh
espanta-nos ao descrever o diálogo que se prossegue, levando-nos a imaginar o seu
constrangimento perante perguntas como: «‘E quando vais ao barbeiro cortar o cabelo, tu
cortas os pelos nas axilas como nós?...apontando o dedo para a pélvis. ‘Não cortas aí
também?’» (Amitav Ghosh, In an Antique Land, 1994: 62, tradução minha).
Somente oito anos após ter saído do Egipto e à data do seu regresso, em 1988, o autor nos
informa ter aprendido árabe, com o objectivo de facilitar a comunicação com os nativos.
Porém, refere que esta aprendizagem não terá sido assim tão útil quanto esperava,
contrariamente aos conhecimentos que adquiriu sobre o dialecto medieval judæo-árabe,
presente nos escritos hebraicos, e sobre o qual veio a confirmar ser semelhante ao ainda
utilizado no século XX em Lataifa e Nashawy.
Entretanto Ghosh vai continuando a sua investigação sobre Ben Yiju, constatando que este
terá saído de Aden e chegado às costas do Malabar aproximadamente em 1132, onde
permaneceu cerca de duas décadas. E seguindo-lhe o rasto, o autor viaja para Mangalore em
1990 à procura de informações sobre o escravo.
Nesta cidade fala-nos um pouco da história da zona. Somos inteirados da presença de Duarte
Barbosa, «navegador português», que terá visitado a cidade de Mangalore durante o século
XVI e nesta terá encontrado mercadores «… ‘árabes, persas, gujaratis, korasanis, e
decanis’…» (Amitav Ghosh, In an Antique Land, 1994: 243, tradução minha), justificando a
existência de vários comerciantes com origem no Médio Oriente e no Norte de África numa

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época em que provavelmente existiria apenas «… uma linha de areia onde agora se
encontravam as docas…» (Amitav Ghosh, In an Antique Land, 1994: 242, tradução minha). E
mostrando-nos a origem da palavra Malabar, termo inventado pelos viajantes do Médio
Oriente, Ghosh justifica a escolha de Ben Yiju quanto a se fixar em Mangalore, bem como
especula sobre as origens de Bomma.
Quanto à procedência do escravo, o autor despudoradamente declara se encontrar a especular.
Sem se preocupar com o risco de uma não cientificidade, evidencia que não tem provas
concretas sobre a terra natal de Bomma, porém os factos apontam um caminho e este por sua
vez poderá ser o quanto baste para imaginar os factos reais.
Deste modo, fala-nos do seu percurso para descobrir qual seria o possível nome do escravo,
através da análise das iniciais B-M-A, e como especulativamente terá chegado «… à
conclusão que o Escravo do MS H.6 teria nascido numa das muitas comunidades
matrilineares que faziam parte do culto Bhuta de Tulunad.» (Amitav Ghosh, In an Antique
Land, 1994: 254, tradução minha).
A partir deste momento, o qual parece ter sido fundamental, percebemos que Ghosh nos conta
a história da relação entre Bomma e Ben Yiju que, tal como já o dissemos, não correspondia à
de senhor e de lacaio, mas sim a uma relação de duas pessoas que partilhavam confiança
mútua e a utilizavam tendo em vista atingir bons negócios em termos comerciais.
Muito embora comungassem diferentes religiões, estas não teriam tido impacto negativo na
relação entre ambos, pois estaríamos perante um judeu pouco ortodoxo e um hindu cuja
religião se afasta um pouco da actual noção de hinduísmo. Esta religião ter-se-á
estandardizado ao longo dos tempos e os cultos terão sofrido modificações, pelo que Bomma
terá feito parte de uma cultura que não corresponde ao actual hinduísmo bramânico. Do
mesmo modo, as religiões do Médio-Oriente seriam menos ortodoxas do que hoje as
imaginamos.
Com esta constatação, Ghosh faz-nos reflectir sobre o modo como olhamos a religião, como
algo estático, baseado em leis permanentes e fixas. Faz-nos reconsiderar que tal como o
etnógrafo traduz o que vê, do mesmo modo todos nós traduzimos o que observamos e essa
tradução sofre permanentes mutações afectas às transformações histórico-sociais. E o que
numa época parece mais ser um contrato comercial entre um senhor e escravo reside no facto
de estarmos perante um contexto em que a noção de escravo era distinta da concepção que
nós conhecemos hoje.
Talvez para melhor percebermos como a ligação entre ambos actores não tem
correspondência com a nossa actual ideia de relação de dominação da escravatura, Ghosh vem

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nos demonstrar que Bomma terá sido no início da sua relação com Ben Yiju apenas um
aprendiz e que posteriormente terá assumido os negócios com Aden, tendo-se tornado um
«shaikh», título que lhe está atribuído nas cartas de Kalaf ibn Ishaq. Aqui Ghosh acaba por
nos relevar o seu «orientalismo» de Edward Said, mostrando-nos como a escravatura e a
religião terão sido alvo de modificações após a expansão colonial do século XVI.
É neste âmbito que somos novamente inteirados da presença portuguesa em terreno indiano,
ao referir que as boas relações entre diferentes culturas sofreram um considerável impacto
com a chegada de Vasco da Gama à Índia e o consequente monopólio do comércio de
especiarias por parte dos povos colonizadores. A partir da data de 17 de Maio de 1498, nunca
mais as relações entre diferentes pessoas como Ben Yiju, Bomma e Ashu, uma escrava da
etnia Nair com que Ben Yiju terá casado, foram as mesmas «… e outra era começou na qual o
cruzamento dos seus caminhos teria sido tão pouco provável que possivelmente teriam todos
desaparecidos da memória humana.» (Amitav Ghosh, In an Antique Land, 1994: 286,
tradução minha). E só quinhentos anos passados da batalha dos portugueses contra os
islâmicos do Gujarat, na qual os primeiros saíram vencedores, foi tornada possível, por
Ghosh, a ideia de uma proximidade relacional entre os povos do «… Oceano Índico, do Mar
Arábico e do Golfo Pérsico.» (Amitav Ghosh, In an Antique Land, 1994: 288, tradução
minha).
Outros dois temas da actualidade que seguidamente nos apresenta neste seu livro são: a
globalização, evidenciada por uma história de intensas trocas comerciais entre o Egipto e a
Índia durante Idade Média, e o impacto do consumismo num país em desenvolvimento.
Em 1988, sete anos depois de se ter afastado do Egipto, Ghosh vem claramente nos dar
conhecimento de grandes modificações operadas nas duas localidades de Lataifa e Nashawy.
Na casa de Abu’Ali vários são os objectos da modernidade que chamam à atenção: um
frigorífico, um televisor, um rádio transístor, um relógio que toca música, entre outros, bem
como a casa está repleta de mobiliário, tendo desaparecido a velha e abarracada casa e esta
sido substituída por um edifício de três andares. O mesmo se verifica na habitação de Nabeel,
a qual Ghosh concebia como um conjunto de quartos de paredes de lama e agora se tornara
«… a inacabada armação de um grande bungalow.» (Amitav Ghosh, In an Antique Land,
1994: 318, tradução minha). Estas transformações, resultantes do impacto da ida dos homens
das aldeias para a primeira guerra no Golfo e seu consequente enriquecimento, vêem
evidenciar como se modificaram as ideologias e os paradigmas de governação dos países em
desenvolvimento.

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De modo semelhante Ghosh inteira-nos das transformações que Ben Yiju terá encontrado em
Aden cerca de duas décadas após ter deixado esta região. Desconhecendo as sucessivas
guerras entre Cristãos e Judeus e os ataques à sua terra natal Ifriqiya por parte dos Cristãos,
Yiju não tem conhecimento que a sua família ter-se-á mudado para a Sicília e quando retorna
em 1149 «… escreve aos seus irmãos uma longa carta de Aden.» (Amitav Ghosh, In an
Antique Land, 1994: 302, tradução minha). Tendo viajado acompanhado dos dois filhos
adolescentes, Ghosh revela-nos que este terá sido um trágico regresso. A morte de amigos, de
um filho e o casamento de sua filha e afastamento desta para a Sicília, parece ter feito deste
mercador judeu um homem «… ferido no coração» (Amitav Ghosh, In an Antique Land,
1994: 317, tradução minha). Três anos após o seu regresso, Yiju abandona a sua terra e
aparentemente vai para o Egipto, momento em que Ghosh nos indica ter perdido o seu rasto.
Deste modo chegamos ao fim das histórias de Bomma, Yiju e de Ghosh, como etnógrafo e
narrador, com a percepção que o autor nos apresenta os acontecimentos do presente através do
passado e vice-versa. Ghosh parece querer nos dizer que só se torna possível uma
compreensão do percurso de ambos escravo e mercador através do seu entendimento sobre os
actuais habitantes de Lataifa e Nashawy. É como se as falhas da história pudessem ser
colmatadas pela perspectiva sincrónica dos acontecimentos, como se a percepção das várias
histórias de vida num espaço e num tempo só fossem viáveis se conhecermos os seus
pormenores, pois mesmo os momentos mais mundanos podem ter o mesmo valor
significativo que os acontecimentos mais complexos.
É assim que Amitav Ghosh torna inegável que a sua obra reflecte as teorias pós-coloniais que
procuram articular a história de um passado de dominação colonial e um presente onde o
desejo é o desenvolvimento e a modernização. O mesmo se verifica no que concerne à
construção deste seu trabalho etnográfico em termos de linguagem.
Constituído de uma literatura mágico-realista, onde se misturam factos e ficção, Ghosh
demonstra aqui uma escrita solta, fluida, afastando-se da ideia de convencionalismo. Podemos
afirmar que este livro não é um romance, não é uma monografia etnográfica ou histórica,
contudo está presente a etnografia, a antropologia, a sociologia e a história, mas também a
fantasia.

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1
Utilizámos o termo outsider por não termos encontrado palavra em português com significado
equivalente. O nosso objectivo é fazer corresponder o narrador a alguém que é forasteiro, estrangeiro,
estranho, que não pertence à mesma cultura. Do mesmo modo utilizamos o termo insider, como
alguém que é de dentro, que partilha algo em comum.
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Em 2002 Ghosh publica uma colectânea 18 prosas escritas ao longo de 20 anos, denominada The
Iman and the Indian: Collected Prose. Amitav Ghosh, «Amitav Ghosh», 2007b; Mukul Kesavan, «
The written world» The Hindu, 2002.

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BIBLIOGRAFIA:

CHAMBERS, Claire 2006 «Anthropology as Cultural Translation: Amitav Ghosh’s In an


Antique Land» Postcolonial Text, Vol 2, No 3 (2006). Disponível em:
http://postcolonial.org/index.php/pct/article/view/489/320 (acedido em 28 de Maio de 2009)

GHOSH, Amitav 1994 [1992] In an Antique Land: History in the Guise of a Traveler’s
Guide. New York: Vintage.

 2007a «About». Disponível em:


http://www.amitavghosh.com/about/index.php (acedido em 12 de Maio de 2009)

 2007b «Amitav Ghosh». Disponível em:


http://www.amitavghosh.com/about/cv.doc (acedido em 12 de Maio de 2009)

KESAVAN, Mukul 2002 «The written world» The Hindu. Literary Review. Disponível em:
http://www.hindu.com/thehindu/lr/2002/08/04/stories/2002080400100100.htm (acedido em
28 de Maio de 2009).

LAL, Vinay 2005 «Subaltern Studies and its Critics: Debates over Indian History. History and
Theory 40 (February 2001), 135-148» Libcom.org. Disponível em:
http://libcom.org/files/vinay.pdf (acedido em 12 de Maio de 2009).

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