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Editorial
Somos meio. Fazemos seis e parece que já não. Somos menos e parece que
ainda agora. Temos coisas no casaco e saímos com elas por aí, à espera que
nos atropelem para não termos que as matar sem as dizer. Esperamos no fundo
calados e discretos. Comemos de tudo o que nos dão. Gostamos de quase quase
nada. Saímos quase quase sempre e dançamos até ser sol. Ricardo Galésio

CAPA
Aurora
escultura de Jennifer Maestre

FICHA TÉCNICA
Director de Arte e Conteúdos
Ricardo Galésio
Colaboradores
Ana Elisa, Ângelo Fernandes, Clara Tehrani, Dhanank Pambayun,
Francisco Nogueira, Jennifer Maestre, Pedro Palrão, Rui Ogawa,
Sara Toscano, Sónia Bettencourt, Tatu
Agradecimentos
Dhanank Pambayun, Jennifer Maestre, Volte-Face 
Francisco Nogueira
stage

Sufjan Stevens @ Casino de L’Aliança del Poblenou (Barcelona)




Kanye West @ Cool Jazz Fest


Lundum Ensemble @ Festival Urbano Pedras de Água (Rua Augusta) Manuel João Vieira @ Fundação Calouste Gulbenkian (Paris)


Panda Bear @ B.Leza

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DJ Shadow presents The Hyphy Movement @ Lux


Kalibrados @ Cool Jazz Fest (Jardim Marquês de Pombal, Oeiras) TY @ [2] Apolo (Barcelona)

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Pedro Palrão

Amor ao sol
Ali estavas tu, no teu vestido de linho branco, banhada pelo prenúncio do Havia algo de reconfortante nos teus olhos. O castanho arenoso dotado de
crepúsculo que se avizinhava, beijada pela brisa morna soprada pelo sol que brilho fazia-me sentir em casa…imaginei o cheiro a areia molhada de quando
mergulhava lânguido no horizonte. Mirava-te, imerso no calor que me lambia a choravas…gostava de imaginar que podia secar as tuas lágrimas ao envolver-
pele como labaredas…o desconforto que me percorria o corpo soçobrava por te te em mim…via castelos formarem-se nos teus olhos, estátuas perenes mas
poder olhar. perfeitas…convictas de que nenhuma espuma teimosa as poderia derrubar, de
Saciava-me por ver os teus olhos brilharem e sorrirem ao mesmo tempo que que nenhum ímpeto seria mais forte do que o delas.
os teus lábios. Quando gargalhavas, o teu corpo ria-se contigo, estremecia Como gostava de te poder conhecer…ver-te à distância de um pátio tornava-
suavemente num tremor ténue que mesmo assim era perceptível. se insuficiente…via-me afastar de ti quanto mais te queria perto…até que te
Sorri quando protegeste os teus olhos com a sombra dos teus dedos…apeteceu- levantaste para ires embora.
me beijar-te…não de forma impulsiva, implodindo enquanto te espremia nos Ali me quedei inerte…acenando-te adeus com as lágrimas que sentia formarem-
meus braços…um beijo sereno, um mero encostar dos meus lábios aos teus… se nos olhos…soprando-te um beijo de despedida no suspiro que desprendi
quem sabe percorrer-te o rosto salpicando-o…palpando-te, comprovando que com algumas gotas de ânimo que me abandonaram…mas sorri, afinal não te
existes pelo sabor da tua pele. Não o fiz porque julguei não ser a altura indicada… conhecia, embora tivesse vivido contigo uma bela estória.
estavas tão ocupada…soltavas um rio de palavras que corria fluido, entusiasmado, Chamei-te Madalena…porque os traços delicados do teu rosto tal nome me
convicto da força da sua corrente e orgulhoso em banhar garbosamente as suas deram a ler. Por breves instantes foste o meu Mundo, o Amor de uma vida…foste
margens. Soavam-me a música, pequenos acordes que viajavam no ar até mim uma parte de mim enquanto bebia um café queimado ao ar livre…deste-me
para embalar o meu coração por ti embevecido, por ti perdido e conquistado… alento (que levaste a esvoaçar no teu vestido quando foste embora), fizeste-me
pulsando de um ardor sentido. sorrir…incendiaste os meus olhos…deste-lhes um novo brilho ainda que possam
Não conseguia evitar sorrir-te…sentia o meu corpo sorrir-te pela melodia que a não mais te ver…
tua presença emanava…todas as minhas veias latejavam e ansiavam sentir-te. Amei-te? Não sei…será talvez muito para o pouco que conheci de ti…mas fui
Recorriam à minha mente imagens dos meus braços à tua volta, aconchegando- feliz por momentos…pude erguer o rosto e meter a mão ao peito para ouvir o
te, aquecendo-te pelo calor do meu sangue fervilhando de ternura. Desenhei que dizia o meu coração…ele que tem apenas murmurado lamentos lânguidos
nos campos do meu pensamento nós dois deitados a olhar o céu…inspirando o e tristes…que chora pelo que não alcança…esse amor que tem andado tão
ar soprado pelas nuvens que sorriam para nós, moldando-se à nossa imagem. arredado da minha vida…
vi-nos explorar as profundezas do mar como se de nós próprios se tratasse,
vasculhando segredos mas ignorando a escuridão, enquanto nadávamos juntos
num ondular suave, compassado...como se de ondas nos tratássemos… 17
Volte-Face
É poesia e design experimental na mistura. Diz quem viu que sim, que eu não
vi. É revista de primeira que já é segunda, onde os versos se confundem com
cmyk e passam a palavra a quem os ouve. Diz quem viu que sim, que eu não vi.
Criam ao vivo outras formas de a fazer. Falam alto, tocam coisas e passam coisas,
outras coisas. Querem juntar para não perder. Fazer amor de todas as maneiras
e são surpreendentes nisso mesmo. Armam escarcel, fazem barulho, sentem
friozinhos, imaginam itinerâncias. Depois voltam ao pecado capital. Dia 5, às
22h30, no Music Box Lisboa. Eu vou ver.

“Diluindo as fronteiras na arte e revigorando a forma de se dizer poesia na


contemporaneidade, a performance VOLTE-FACE #2 propõe-se oferecer um
vibrato de palavra, imagem, som e movimento na pluralidade de estímulos que
a actuação permite.

No Music Box Lisboa, no seu compromisso de trazer novo fulgor à noite lisboeta,
a performance VOLTE-FACE #2 retempera a cena contemporânea na movida
empolgante das ideias efervescentes.”

www.volte-face.conflitoestetico.com 19
Pixel. É assim que se trata. Tragikpixel. Ilustra e pormenoriza. Nasceu na Indonésia
e faz destas coisas.

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Clara Tehrani

untitled
“O pessoal junta-se aí de vez em quando” – diz o de cabelo desgrenhado. As luzes vermelhas dos carros desligaram-se. A fila avançou muito lentamente.
Não que os outros tenham um aspecto mais aprumado, mas este destaca-se Avançou apenas o suficiente para que os pneus não ficassem colados ao asfalto.
claramente na categoria negligé. Há umas miúdas à mistura. São poucas “mas O sol estava a pique. Reflectia nos vidros e cegava. Podia jurar que a loucura
quando começámos não havia nenhuma aqui em Lisboa”. Os que se cruzam era assim. Nada acontecia. Absolutamente nada. E o rádio tocava uma qualquer
com este espectáculo involuntário apontam o dedo às acrobacias. Indiferença. O entrevista irrelevante e monocórdica.
grupo não reage à admiração. Não liga a nada mais. A mais baixinha e a mais O som do bombo faz ricochete nas paredes da estação. Ela não desiste. Ouve
alta fazem parelha. Fazem guerra com a dança, movimento contra movimento. as instruções. Estuda a posição. “Visualiza na cabeça que o corpo vai atrás”, diz
Estava um calor do piorio. A primeira amostra de calor do ano tem sempre a ele.
mesma consequência - congestionamento absoluto. Parada na fila de trânsito, Pelas janelas escancaradas não corria uma brisa. Parecia Agosto. Parecia Marrocos,
tudo a sua volta parecia derreter. Ondas de calor evaporavam os capots dos naquela expedição de há 2 anos. Há já 5 minutos que não andava um centímetro
carros à volta. O fumo que os tubos de escape tossiam ritmadamente enchia o que fosse. Se ao menos tivesse um cigarro...
ar. Como lhe apetecia um cigarro. É em situações destas que sentimos o vício Visualizar na cabeça. Ela fecha os olhos, assenta a mão no chão, palma aberta,
nas entrenhas. Em busca de uma distracção que lhe tirasse a conseciência do antebraço prependicular, ancas alinhadas e equilibradas em cima do cotovelo.
suplício por que se passa para se ter umas horas de paz, começou a brincar com Ok. Estava no limite. Não havia solução, nunca iria sair dali. Precisava mesmo
os rolinhos naturais do cabelo. de um cigarro. Olhou em volta. O tipo do carro atrás está a fumar. Vou lá cravar
O tipo da sweat da Carhart é, sem dúvida, o melhor. Aliás, percebe-se que é um.
a referência dos outros. É paciente. Aceita a liderança e distribui panfletos de Está tudo no sítio. Ele puxa por ela. É só dar o impulso final.
experiência. A mulatinha bebe-lhe os movimentos. Está em transe, num estádio Levantou-se determinada. Parou a contemplar a altura da ponte. Hipnotizante.
de absoluta concentração. É agora. Tenta copiar. Cai. Repete, vez após vez, após Agora!
vez. Cai sempre. Zé, a miúda saltou! 27
SÃO 5ª FESTA DO JAZZ
LUIZ DO SÃO LUIZ
MAIO A FESTA DO JAZZ PORTUGUÊS
11 MAIO DAS 21H3O ÀS 2H

O7 12, 13 MAIO DAS 14HOO ÀS 2H


Ângelo Fernandes

CONCERTOS
WORKSHOPS
JAM SESSIONS
MASTERCLASSES
ESCOLAS DE JAZZ
ENTRADA LIVRE
NOS CONCERTOS
DAS 14H ÀS 19H

MAI ~ O7 Até 6 Mai 17 Mai a 16 Jun


OUTRAS CANÇÕES II OUTRA VEZ!!!

3, 4 e 5 Mai BRUNO
CICLO NOVOS X 9
CAMANÉ E A ORQUESTRA
SINFÓNICA PORTUGUESA 5€
p/ menores
de 30 anos
NOGUEIRA
MATRIOSHKA QUINTA A DOMINGO ÀS 21H
Direcção Musical e Direcção de Orquestra: A SOLO
NOVOS HUMORISTAS …SOU DO TAMANHO DO QUE
UM ESPECTÁCULOS DOS Pedro Moreira; Arranjos: Pedro Moreira, VEJO E NÃO DO TAMANHO DA
ALCÓMICOS ANÓNIMOS Filipe Melo, Mário Laginha e Bernardo Sassetti. MINHA ALTURA
QUINTA A SÁBADO, ÀS 23H30 COLABORAÇÃO: ORQUESTRA SINFÓNICA QUINTA A SÁBADO, ÀS 23H30
JARDIM DE INVERNO PORTUGUESA JARDIM DE INVERNO

SÃO LUIZ TEATRO MUNICIPAL BILHETEIRA todos os das das 13h às 20h;
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CÂMARA MUNICIPAL DE LISBOA


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CRU A

on search engines
castanheira infértil
peito enorme
como o urso-polar faz para se deter do calor
o vento frio fustigava
candeeiros bons bonitos e baratos
imagens da peça de teatro no meio do caminho tinha uma pedra
fundação da máquina singer em portugal
fuck
livros esotéricos para baixar
onde comprar brindes de casamento
pensamentos acerca de uma mulher desconhecida
fotos de prateleiras para exposição de calçados
eu quero apenas uma imagem de osmose normal
consumismo/capitalismo
como os clientes funcionam na estética
ironia frases soltas que deverão ser presas
encaracolados com franjas 39
Sónia Bettencourt

pensamos
emocionalmente exausto numa sensação brusca de libertação e corro para um
buraco branco que tenho na parede. O espelho.
A minha cara. Fico a contemplá-la. Não a compreendo. As caras das pessoas que

que somos eternos estavam no autocarro tinham um sentido, a minha não. Quero me decidir se a acho
bonita ou feia. Então faço uma careta, destapo um dente, enrugo a pele descorada,
arregalo os olhos avelã, emaranho o cabelo castanho… Nada esclarece a minha
«(…) Escrever torna-se uma verdadeira neurose. Ela vem ocupar o lugar de Deus dúvida. Trinta anos, penso. Que número demasiado redondo, tão longe e tão perto
que partiu para nunca mais voltar (…)» do fim.
Jean-Paul Sartre Observo através do espelho o que me está por detrás: mesas, cadeiras, livros,
Cds, copos sujos, garrafas de cerveja, beatas amontoadas nos cinzeiros, chávenas
As pessoas saem do autocarro e espalham-se pela rua. Três horas. «Três horas é de café… (afrodisíacos que já pouco efeito têm sobre mim.), uma secretária
sempre tarde ou cedo para aquilo que queremos fazer.», li em qualquer lado. É amontoada de folhas de papel, desorganizada… Enfim, uma casa coberta de pó e
a hora em que fazemos a digestão com o estômago vazio. de neuroses.
Um sol frio arrepia-me até aos ossos. A luz anémica provoca-me dores de cabeça. Retiro do espelho um rosto que não parece humano e regresso à cadeira das
Uma náusea, diria. tempestades cerebrais, enquanto a noite respira-me e entrelaça-me em seu
Dirijo-me para casa a passos largos, por um caminho estreito e vazio, como segredo. O diabo mora ao lado. De súbito paro e, ao mesmo tempo em que o
se alguém estivesse à minha espera. Gostaria de ter alguém à minha espera. último gole da cerveja me molha as entranhas, vejo uma frase vir lá de cima e
Aborreço-me pela primeira vez de estar sozinho. pesco-a: «pensamos que somos eternos».
O coração dá-me um baque de contentamento quando avisto a minha pequena Recosto-me na cadeira e deslizo muito suavemente para o fundo do pensamento,
moradia: simples, pacata, sumida entre campos. O melhor é o silêncio. Dá-nos cheio de sede e de dúvidas: Como não se afundar em sonhos? Como não se banir
noites bem dormidas. No entanto, o meu sono está atrasado. Uma noite bem da existência? Como não fazer promessas? Como não caminhar para um tempo
dormida seria o suficiente para me varrer da cabeça todas as minhas histórias. findo? Como não deixar pegadas na areia?
Já não consigo estar sozinho no meio daquelas vozes alegres, ver personagens a Como não deixar saudades? Como não cultivar devaneios?
rir, a pensar todos juntos e a reconhecer satisfeitos que são da mesma opinião. Como não conversar com fantasmas falantes? Como não viver a realidade do mundo
Raios os partam! inteiro? Como não se deixar enganar?
Escrevo dez, quinze páginas numa noite e nunca digo a verdade. Zango-me Como não desconfiar da natureza humana? Como não se revoltar? Como não borrar
comigo próprio. «Como é possível mentires com a verdade na mão?», digo de um livro? Como não se atulhar do vazio? Como não desabar sem rumor? Como não
mim para mim. gritar em silêncio?
Olho para um copo de cerveja do dia anterior, em cima da secretária. Tenho A cerveja acabou, reparo. E saio para comprá-la.
vontade de dizer: «Não escrevo mais!». O sol está frio. Mais um dia que se repete.
Será que posso manter a solidão quietinha no seu lugar? Entrei no autocarro e paguei o bilhete para todo o lado e para lado nenhum,
Á medida que vou envelhecendo sinto uma necessidade cada vez mais forte de simplesmente seguindo vida fora, história adiante, cercado de pessoas com caras
escrever um livro. Isto não está provado. Mas é uma hipótese que sai de mim cheias de sentido, ainda que umas cegas, ainda que outras surdas, todas vivendo
próprio numa maneira de unificar as minhas perguntas, o meu desespero e a uma aventura com violência. Acomodadas. Agora, eu as detesto, não sei por quê.
minha angústia. Parece que quando se vive nada sucede. As pessoas entram e saem de um
Gosto de escrever sem emendas, de uma só vez. Mas perco o equilíbrio momento vivido como se de um autocarro se tratasse – apressadas, sisudas e aos
facilmente. Dou por mim estonteado, a cavalgar na cadeira, de frente para trás, solavancos.
embriagado pela cerveja e por meus pensamentos. Muitas vezes levanto-me Como se fossem eternas. 41
a
Ogaw
Rui

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Sara Toscano

o que foi a primavera


 Antigamente, no século XXI, a Primavera era uma estação de fartura e felicidade Há registos desses dias que retratam uma adolescente mulçumana, encapuçada
celebrada por muitos povos, herdeiros de tradições milenares. com um lencinho negro, a abraçar, para a fotografia, uma escultura da cinderela
  nua a ajeitar a liga no meio do jardim; registos de um casal de 60 anos a beijar-
Numa região do Norte da Europa, nos arredores de Amesterdão, os festejos se apaixonada e interminavelmente debaixo do sol; de grupos de mulheres
começavam no fim de Março com o florir dos primeiros bolbos de tulipas. livres a rir sozinhas à sombra das árvores e de um sério pai de familia partir para
  a terceira cerveja porque enfim, “chegara a Primavera e fazia calor”.
Pessoas de todo o mundo voavam até à cidade e cumpriam duas horas de  
peregrinação, encafuados em comboios e autocarros, ultrapassando regras de Inclusive, no longínquo ano de 2007, a Princesa Victoria da Suécia voou aos
segurança e conforto, movidos pelo desejo de explorar um dia num dos principais jardins para participar na abertura da época das flores porque se celebravam os
locais de culto de todo o mundo: Keukenhof. 300 anos do rei sueco Linnaeus, “o Rei das Flores”.
   
Nesses jardins, explodia a Primavera.  Assim, nesse ano, uma gigantesca procissão de flores reuniu, sob o tema da
  Celebração, milhares de pessoas, que aclamaram das ruas e das janelas de suas
As cores das flores eram tão diversas como as cores dos povos que se cruzavam casas, esculturas de mil cores.
entre canteiros. O curioso formato das pétalas era tão exótico como o recorte dos  
olhos de todas as raças que ao longo desses dias, admirava comovida a natureza. Era um encontro surpreendente!
E havia tantas combinações de flores como de roupas e penteados.  
  Porque o que os unia, nesse tempo, era a sagração da primavera! A capacidade
Nesses dias, ouvia-se o realejo, comiam-se goluseimas em excesso, despiam-se que o homem tinha de preservar, plantar e ver crescer a natureza. De a amar.
os camisolões e os mais ousados passeavam os pés descalços e calejados dos  
sapatos de inverno pela relva fresca, recém cortada dos jardins. Mas isso era antigamente. 53
 
jennifer maestre 55
A Jennifer faz esculturas com lápis. Corta-os em pedaços de uma polegada e
junta-os com um fio. Transforma-os nestas esculturas únicas, cheias de forma e
movimentos sinuosos.

“I am glad that my original inspiration is apparent in my work. People often


say the sculptures remind them of urchins or sea creatures. The nature of the
technique I use lends itself to very organic forms. I leave openings in many of
them, so the viewer can peer inside. The textures continue to intrigue me, and
the paradoxes. The pencil points are also rather fragile, belying the fierce aspect
of some of these works, adding another level of paradox. Pencils are familiar,
so people are drawn in, and can relate to some of the process, but at the same
time, often intrigued/repelled or vaguely disturbed, by the forms.
My inspiration continues to come from nature, organic forms and textures, but
often from the materials themselves. Some sculptures begin with plan, and
accidents that happen along the way inspire a whole new idea. Sometimes, I
just start with a pattern and see where it goes. I admit, I am still learning my
particular craft. I love the fact that my work continues to surprise me, and that I
don’t have total control.”

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Ana Elisa

seetadino
Gosto de algumas coisas. Gosto de viajar, mas agora nem sequer estou em viagens O que se deve fazer é pedir a identificação ao passageiro e passar a multa.
de longa distância, agora só faço estas viagens suburbanas. É um trabalho, sei Se o passageiro não tiver identificação, tem que se esperar na paragem pela
lá, limitado. Mas gosto. O que me chateia são as rotinas. Mas por exemplo a polícia, mas isso não nos interessa a nós, nem à cp. Ah, ah, nem ao passageiro,
camaradagem é muito boa. Isso é bom. claro. Nós tentamos ser compreensivos e muitas vezes dizemos às pessoas para
É uma profissão perigosa, porque joga com regras e os portugueses não gostam saírem e comprarem o bilhete. Os do metro passam logo multa.
de jogar pelas regras do jogo. E depois chateiam-se e são agressivos. Há uns A maioria dos casos é por não terem bilhete, mas depois uns têm bilhetes
tempos atrás era realmente muito perigoso. Depois começaram a aumentar os caducados, outros têm passes feitos no computador, passes dos meses passados,
polícias e começou a melhorar. Mas as viagens à noite continuam a ser perigosas. bilhetes que só dão até meio da viagem. Vê-se tudo.
Há uns tempos atrás foi um esfaqueado. E isto por causa de um bilhete...é muito Nas primeiras estações faz-se bem, corre-se o comboio de uma ponta à outra
triste de facto. Mas é comum porem-nos fora do comboio, dar pontapés, murros, num instante. Mas depois pára-se na gare oriente, ou entrecampos, sete rios,
estalos. Quando vêm 5 ou 6 é que é pior, aí já sabemos que eles vão ser uns cacém e quando se olha para trás lá vêm as pessoas todas agrupadas, e enchem
brutos e que vão fazer coisas estúpidas por estarem em grupo. Não se pode fazer tudo num instante...nessas alturas só apetece sair da estação.
muita coisa, alguns de nós evitam ir às carruagens da frente, a maioria deles fica Era bom que desse para acreditar nas pessoas, e não ser preciso andar a picar os
ao pé do maquinista. Isso é a toda a hora, dizerem palavrões, ironia, ameaças... bilhetes. É verdade, estaria desempregado. Ou teria outra vida.
as ameaças verbais são as mais comuns, mas sempre se controlam melhor. E Olhe, gosto quando as pessoas tiram logo a carteira, com os passes e bilhetes,
depois o governo também não faz grande coisa, não ajuda em nada. O Sindicato aquele movimento que todas as pessoas fazem quando nós aparecemos numa
bem pode tentar mas isto não está a levar a lado nenhum. carruagem.
Já devo ser há uns 15/16 anos. Eu sempre gostei de comboios, mas vim para Gosto de Lisboa sim. E mesmo assim acho que não é muito perigosa, em algumas
revisor porque uma pessoa de família me disse que estavam a abrir vagas e formações que temos dão-nos exemplos de situações bem piores do que as que
tinham poucas pessoas, na altura pensei que podia ser. ocorrem cá. Mas Lisboa é muito bonita, o rio, passar no comboio debaixo da
Hora de ponta não dá, pelo menos há ali uns 2 ou 3 comboios que é impossível, ponte, a luz, é uma cidade bonita sim. Mas muito desorganizada, verdade seja
vem com muita gente. Gosto da linha de Cascais, por causa do rio, sempre dita.
é mais agradável, mas é uma linha perigosa. A mais segura é sem dúvida
a da Azambuja. A pior é a linha de Sintra. Atacam mesmo em grupo. E nem
sequer falo dos ataques aos revisores, muitos roubam e são agressivos com os B.I.
passageiros. Nesses casos é ligar para a policia, ou tentar fazer alguma coisa. Rui Gomes
Mas os passageiros acham sempre que os revisores têm que fazer alguma coisa. 36 anos
Acho que nos vêem como figuras de autoridade. Revisor da CP 69
Ricardo Galésio

playstation
A senhora, transpirada, rodou sobre o buraco que ela própria abrira no chão e
começou a cuspir bolinhas de sabão. O senhor cansado, morrido de trabalhar,
fincou pé no alcatrão, despiu-se de preconceitos e fez o jogo de cruzar. Luzes
mil se espalharam nas cortinas, serviram de argamassa para tirar ali da praça a
menina do patrão. A buzina da conduta fez de freira e fez de puta em horário
laboral, reformou-se dias à frente e foi servir de contrabando para bem de muita
gente. E o ardina, que era fresco e dormia, sem pudor, com as carnes meio
vivas da Zulmira lambideira, encontrou o seu amor numa cave quase suja nos
subúrbios da aldeia. Viram, também, na loja dos discos pedidos, truques baixos
de ouvido que tentaram a intervenção em dias de azia lá para os lados de
Abril. E o Camões era cego de uma perna e tinha artrite reumatóide na cabeça
cutilóide da barriga varicosa. O mendigo foi buscar os sacos de plástico que tinha
para dormir e sufocou ao pensar que a velha bolorenta se deitava, essa sedenta,
erotizando o bojador. E na loja conveniente da rua principal, iogurte, o natural,
derretia na parada, desejando a transpirada, à porta do cabaret. E um a um,
entre as mentes mirabolantes do futuro RGB, um lacaio très très chic esperava a
sua vez de morrer por este mês com as mãos num joystick. 71
TATU 73
www.myspace.com/tatu43
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laurear a pevide
lisboa nova iorque
FESTIVAL EXPOSIÇÃO
Creamfields Lisboa Comic Abstraction: Image-Breaking, Image-Making
19 de Maio, no Parque da Belavista Até 11 de Junho, no MoMA

PERFORMANCE
Volte-Face #2 são paulo
5 de Maio, às 22h30, no Music Box Lisboa EXPOSIÇÃO
Goya
Em Maio, no MASP
porto
CONCERTO
Ute Lemper
4 de Maio, às 22h00, na Sala Suggia da Casa da Música

helsínquia
EXPOSIÇÃO
Reddress
Até 27 de Maio, no DesignMuseo

londres
EXPOSIÇÃO
Gilbert & George: Major Exhibition
Até 7 de Maio, na Tate Modern a CRU A número seis sai a 5 de Junho 85

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