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O Portal Catolicanet,
lançado no mês de
junho de 2006, é dinâmico
e interativo, permitindo a
você, internauta, acompanhar
passo a passo a vida da
Igreja Católica no Brasil
e no mundo.

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votando em enquetes,
en­viando mensagens e
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para discussão.

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Atendendo às inúmeras sugestões dos leitores, a partir deste número Missões publicará uma nova rubrica:
HUMOR. Um sorriso faz bem ao ambiente e a saúde agradece. Aceitamos sugestões de piadas, que podem ser encaminhadas para
a Redação, via e-mail ou por carta. Vamos à primeira, então!

Humor
Três sujeitos: um construtor, um
jardineiro e um eletricista tentavam
responder à pergunta: qual é a profissão
mais antiga? Naturalmente, cada um
queria que fosse a sua.

- Disse o construtor: “Não que eu queira ser mais


do que vocês; mas, me darão razão: foram os meus
antepassados que construíram a Arca de Noé”.

- “Não seja por isso”, disse o jardineiro: “Não tenho


a menor dúvida: quem plantou e cuidou do Jardim
do Éden foi um jardineiro profissional”.

- “Grande coisa!” retrucou o eletricista. “Quando


Deus disse: Faça-se a Luz, quem vocês acham que
havia feito toda a instalação?”
EDITORIAL
Vida e missão neste chão!
SUMÁRIO
Jan/fev 2007/01

E
m 2007, a revista “Missões” continua apostando na for-
mação e informação para garantir uma cultura religiosa
rica e missionária. Alguns acontecimentos marcam o ano
que iniciamos. Na esfera política, começamos com novos
governadores, deputados estaduais, federais e senadores.
Outros parlamentares continuam em Brasília, juntamente
com o governo Lula, que foi reeleito para mais quatro anos de man- 1 - Cartaz oficial da Campanha
dato. Depois de sucessivos escândalos, a tentativa de aumentar da Fraternidade 2007.
Criação: DIZA E. Marketing Criativo
em 91% os seus próprios salários, através de um acordo entre
os líderes das bancadas e a recente disputa pela presidência da 2 - António Mutoua, moçambicano,
Câmara e do Senado, sinaliza continuísmo no comportamento dos no V FSM 2005, Porto Alegre, RS.
Foto: Jaime C. Patias
nossos políticos. Em Nairóbi, no Quênia, acaba de realizar-se o VII
Fórum Social Mundial, onde centenas de pessoas e organizações
recordaram que “um outro mundo é possível e necessário”.
Contudo, gostaríamos de destacar dois acontecimentos eclesiais  MURAL DO LEITOR--------------------------------------04
muito significativos que ocorrem neste novo ano: a Amazônia como Cartas
tema da Campanha da Fraternidade e a V Conferência Geral do  OPINIÃO--------------------------------------------------05
Episcopado Latino-Americano e Caribe, a realizar-se em Aparecida Compromisso com a mudança
Humberto Dantas
entre os dias 13 e 31 de maio, com a presença do papa Bento XVI
na abertura. “Discípulos e Missionários de Jesus Cristo, para que  PRÓ-VOCAÇÕES----------------------------------------07
Nele nossos povos tenham vida” é um tema muito apropriado e rico O que todo mundo mais quer na vida...
Rosa Clara Franzoi
para o momento em que vive a Igreja no continente. Continuamos
a série de artigos “Pelos Caminhos da América”, como forma de  VOLTA AO MUNDO-------------------------------------08
resgatar a histórica caminhada da nossa Igreja neste chão e nos Notícias do Mundo
Fides / ZENIT
preparar para esse evento tão significativo.
Nesta edição, damos especial atenção à Campanha da Fraternidade,  ESPIRITUALIDADE----------------------------------------10
A Missão no espírito de Cristo
com o lema “Vida e missão neste chão”. Além da preocupante questão Luiz Balsan
ambiental: grandes rios e florestas, devastação do verde e ameaça
à riquíssima biodiversidade; ocupação muitas vezes predatória  TESTEMUNHO-------------------------------------------12
Duas ofertas de uma família de fé
das terras sem respeito ao seu complexo e delicado ecossistema, Clemência Alves Sicupira
a Amazônia também faz pensar em questões sociais e antropo-
lógicas. Indígenas agredidos em suas culturas; esvaziamento do  FÉ E POLÍTICA -------------------------------------------14
O voto de pobreza versus o voto do patrão
território, crescimento caótico dos centros Humberto Dantas
Peter Macdiarmid

urbanos; ocupação de vastas áreas com


 FORMAÇÃO MISSIONÁRIA----------------------------15
projetos agropecuários, conflitos pela Pelos caminhos da América - Santo Domingo
ocupação e posse da terra. O impacto da Ramón Cazallas Serrano
urbanização, da economia e da cultura
 MISSÃO HOJE-------------------------------------------19
globalizadas sobre as populações locais A força do testemunho na China
gera migrações, desenraizamento social,
cultural e religioso; falta de infra-estrutura  DESTAQUE DO MÊS -----------------------------------20
e de serviços públicos nas novas áreas VII Fórum Social Mundial
de povoamento e nas explosivas reali- Alfredo J. Gonçalves
dades urbanas, desemprego, violência  ATUALIDADE----------------------------------------------22
e degradação dos costumes. Solidariedade e Amazônia CF 2007
A Amazônia, além disso, representa para a Igreja um conjunto Ivo Poletto
de desafios novos postos à sua ação evangelizadora. A Igreja  INFÂNCIA MISSIONÁRIA-------------------------------24
Católica esteve presente no meio dos povos amazônicos desde No amor solidário!
o início da evangelização do Brasil e quer agora aprofundar Roseane de Araújo Silva
sua presença e ação no meio deles. O lema “Vida e missão  CONEXÃO JOVEM--------------------------------------25
neste chão” aponta para os objetivos e a dupla preocupação da Juventude e projeto popular para o Brasil
Marcelo Naves
Campanha da Fraternidade. De um lado, fraternidade efetiva e
co-responsabilidade na defesa e promoção da vida; de outro  ENTREVISTA-----------------------------------------------26
lado, fraternidade em relação à Igreja local, com todas as suas Missão Compartilhada na Amazônia
Jaime Carlos Patias
organizações e expressões, para que ela esteja em condições
de assumir sua missão de anunciar o Evangelho aos povos  AMAZÔNIA-----------------------------------------------28
amazônicos. A CF de 2007 poderá ser uma ótima oportunidade Consciência política
Ricardo Castro e Luiz Ventura
de trazer a Amazônia para o coração da Igreja no Brasil; será
ocasião também para suscitar iniciativas e ações eficazes de  volta ao brasil---------------------------------------30
Notícias do Brasil
valorização e defesa desta vasta e ameaçada região.  Adital / CIMI / ZENIT

- Jan/Fev 2007 3
Mural do Leitor
Ano XXXIV - Nº 01 Jan/Fev 2007 Revista Missões e CEBs
“O Deus que está em mim saúda o
Diretor: Jaime Carlos Patias Deus que está em vocês”. Escrevo para ou jovens, demonstram dificuldades em ler
lhes parabenizar pela eficiência e dedi- e escrever. Parece que as chuvas diminuem
Editor: Maria Emerenciana Raia cação, e dizer que a revista Missões tem a cada ano que passa, tornando a busca
me ajudado muito em meus trabalhos nas por água cada vez mais difícil. Aumenta-
Comunidades Eclesiais de Base. Com o ram as bicicletas e motos, assim como os
Equipe de Redação: Joaquim F. Gon-
seu conteúdo, preparo temas e comen- carros, nas principais estradas do interior
çalves, Ramón Cazallas, José Tolfo e
tários para as celebrações. São tantas e nas ruas da cidade. A novidade são os
Rosa Clara Franzoi
riquezas! Uma delas foi a descoberta dos telefones celulares na cidade e no interior
“Gritos dos Excluídos”. Utilizei a revista próximo à vila de Moma, na Província de
Colaboradores: Vitor Hugo Gerhard,
na Romaria do dia 7 de setembro, onde Nampula e nas proximidades da empresa
Lírio Girardi, Luiz Balsan, Roseane de
fiz as minhas preces incluindo cada Grito. que atua na extração do titânio, minério
Araújo Silva, Júlio César, Manoel Apare- Foi tão emocionante que uma senhora que é exportado. Numa outra região há
cido Monteiro, Humberto Dantas, Luiz até gritou pelo problema de seu filho e exploração de ouro e pedras preciosas.
Carlos Emer, Giovanni Crippa todos ficaram comovidos. É gratificante Há certa corrida em busca destes recursos
ser assinante e fazer parte dessa família! naturais, contribuindo para a desagrega-
Agências: Adital, Adista, CIMI, Espero que, cada dia mais cresça os ção da família. Atraídos pelo sonho de
CNBB, Dom Hélder, IPS, MISNA, trabalhos na minha comunidade com os riqueza, líderes deixam as comunidades,
Pulsar, Vaticano belos artigos publicados na revista. Que mas o dinheiro fácil traz ilusões que não
Deus continue agindo e derramando dons melhoram em nada a vida. Nesses lugares
Diagramação e Arte: Cleber P. Pires e graças em suas vidas! percebe-se muita prostituição e bebedeira.
Os que realmente ganham são os poucos
Jornalista responsável: Selma O. Santos intermediários. Na agricultura cresceu muito
Maria Emerenciana Raia (MTB 17532) Coordenadora paroquial das CEBs a produção de algodão, o chamado ouro
Paróquia N.S. do Perpétuo Socorro, São José dos Campos, SP. branco. Com o ganho, alguns adquiriram
Administração: Eugênio Butti bicicletas e melhoraram as habitações. As
Projeto em Moçambique comunidades começam a construir capelas
Sociedade responsável: com material mais durável, como o cimento
Instituto Missões Consolata O projeto Igreja Solidária Sul3 – Moçam- e chapas de zinco. O povo nas comunida-
(CNPJ 60.915.477/0001-29) bique se concretizou a partir de julho de des cristãs segue organizado com seus
1994, com o envio da primeira equipe de ministérios e valorizando os sacramentos,
Impressão: Edições Loyola seis missionários. Mais de 40, entre padres, principalmente batismo e eucaristia. Já o
Fone: (11) 6914.1922 leigos, leigas, religiosas, religiosos já par- matrimônio tem menos procura, devido às
ticiparam e estiveram em várias dioceses tradições culturais e à prática da poligamia,
Colaboração anual: R$ 40,00 de Moçambique. No momento, temos uma realidade ainda muito presente na
BRADESCO - AG: 545-2 CC: 38163-2 cinco religiosas e um padre diocesano na vida do povo africano.
Instituto Missões Consolata arquidiocese de Nampula. No próximo mês É importante ressaltar que se vive o
(a publicação anual de Missões é de 10 números) de fevereiro serão enviados mais um padre acolhimento, a partilha e a alegria pela
e outra religiosa. Retornei de Moçambique chegada dos missionários. A equipe é
onde estive durante três meses, no mesmo muito valorizada em sua atuação na saúde,
Missões é produzida pelos
local onde havia trabalhado durante cinco educação e evangelização, fornecendo
Missionários e Missionárias da Consolata
anos e meio, entre os anos de 1994 a 1999. mais esperança e vida para a população.
Fone: (11) 6256.7599 - São Paulo/SP
Neste período, a vida do povo parece não Os missionários apoiam a construção de
(11) 6231.0500 - São Paulo/SP
ter mudado muito. Na Região Norte a man- poços comunitários e centros de alfa-
(95) 3224.4109 - Boa Vista/RR
dioca continua sendo o principal alimento, betização, que assistem mais de quatro
o povo caminha descalço pelas estradas e mil adultos. Tem crescido com ajuda das
Membro da PREMLA (Federação de Imprensa picadas. Crianças continuam morrendo sub- irmãs, a fabricação de remédios naturais
Missionária Latino-Americana) e da UCBC nutridas e a malária é constante. Aumenta alternativos, assim como a multi-mistura
(União Cristã Brasileira de Comunicação Social) os infectados com o vírus HIV. Doenças para tratamento e recuperação de subnu-
endêmicas como o cólera, a tuberculose e tridos. Muito impressiona a quantidade de
Redação a hanseníase (lepra) estão sendo tratadas, crianças. Nossa presença no meio deles se
Rua Dom Domingos de Silos, 110 mas não dão trégua. A presença de uma torna importante. Mesmo a presença física
02526-030 - São Paulo ONG italiana “Médicos para a África” tem é valorizada. Comigo foi o padre Fabiano
Fone/Fax: (11) 6256.8820 ajudado a coordenar com seriedade a Dalcim da Diocese de Vacaria.
Site: www.revistamissoes.org.br assistência sanitária do povo. Diminuiu um
E-mail: redacao@revistamissoes.org.br pouco o analfabetismo, porém, os que se Camilo Pauletti, sacerdote diocesano
alfabetizaram, sejam eles adultos, crianças e coordenador do Comire Sul 3.

4 Jan/Fev 2007 -
Compromisso

OPINIÃO
com a mudança
A formação política é preocupação da Igreja
Jaime C. Patias

Católica no Brasil. Assim, a CNBB tem


estimulado a criação de cursos de formação e
especialização nesta área.

têm relação direta com o conceito de democracia, que além de


incluir “todos” nas escolhas de representantes deve educar e
informar a sociedade para que exerça de forma consciente tal
direito. Como o Estado não cumpre a função de educar politi-
camente seus filhos, a Igreja Católica tem se ocupado de forma
ainda tímida nesta missão. A CNBB inaugurou em 2005 o Centro
Nacional Fé e Política “Dom Hélder Câmara”, o CEFEP (www.
cefep.org.br). E motivou a criação de centros de formação em
vários estados brasileiros.

São Camilo
Como mais nova iniciativa dessa natureza, contando com o
apoio da arquidiocese de São Paulo, o Centro Universitário São
Camilo lançou o Curso de Especialização (pós-graduação) em
Fé, Política e Bioética – esse último tema, a grande especialidade
da instituição – www.scamilo.edu.br.
Tais oportunidades marcam o compromisso da Igreja com
a discussão consciente de temas sociais. E ao contrário do
Estado, que cobra participação, mas não oferece educação, a
Igreja Católica estimula a consistência nas ações de seus fiéis.
Chegou o momento dos cidadãos acreditarem na importância
dessa formação para a vida social. Os representantes e seus
Frei Betto no V Fórum Social Mundial, 2005, Porto Alegre, RS. assessores, que têm seus mandatos políticos estimulados
pela força da Igreja, os jornalistas, os intelectuais e católicos
de Humberto Dantas em geral precisam se comprometer com tal formação. Mas a
despeito desse contingente, quem efetivamente deve prestar

A
atenção nesse conteúdo são os agentes do Ensino Médio – que
o longo dos últimos anos assistimos ao esforço da em breve terão a obrigação de ensinar Filosofia e Sociologia
Igreja Católica para debater temas extremamente em suas grades curriculares. Mais uma vez, parece ser essa
relevantes de nossa vida em sociedade. As Campa- a oportunidade da Igreja Católica se firmar como responsável
nhas da Fraternidade marcam de forma emblemática pela garantia da democracia. Suas centenas de escolas, mui-
tal afirmação. A despeito do assunto, que esse ano tas delas tradicionais, devem pensar em um conteúdo político
se concentra na Amazônia, todas as temáticas têm suprapartidário, capaz de levar os jovens à reflexão. Que os
em comum uma motivação política. As reflexões nos levam a cursos de Fé e Política sejam os grandes protagonistas na
conhecer a importância das leis, do papel do Estado, da fun- formação dos profissionais do ensino, cada vez mais respon-
ção de nossos representantes e, sobretudo, de nossa atuação sáveis pelo futuro do país. 
como cidadãos.
Diante desse último desafio, de contemplar nossa atuação, Humberto Dantas é cientista político, professor do Centro Universitário São Camilo e coordenador
a Igreja tem oferecido outra valorosa contribuição. Tais ações de Cursos de Formação Política na Região Episcopal Lapa e na Diocese de Osasco, SP.

- Jan/Fev 2007 5
Ameaça de morte no Pará
E
m repúdio às recentes ameaças de morte sofridas do Estado para eliminar esta publicação criminosa revela sua
pelo bispo da Prelazia do Xingu, dom Erwin Kräutler, a indiferença e descaso com relação a este gravíssimo problema
Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – Regional social;
Norte2 encaminhou, no dia 28 de dezembro de 2006, 3. Por trás deste desprezo da dignidade e da vida humana
uma carta ao presidente da República, com cópia ao está uma cultura de morte, assumida conscientemente por alguns
Ministério Público, governador do Pará e diversas enti- segmentos influentes da sociedade paraense que colocam à
dades ligadas aos direitos humanos. Missões publica a seguir disposição do crime o dinheiro, a mídia e os pistoleiros;
o protesto do Regional Norte2: 4. As questões pendentes que possibilitam este caos no
Pará, são as que dom Erwin Kräutler e outras pessoas preten-
“É com extrema preocupação que externamos à Vossa dem responder apaixonadamente com a palavra e com a vida:
Excelência os graves problemas que ora nos afligem. Há direitos humanos, meio ambiente, terra, pobres e vida humana
vários anos, a CNBB vem manifestando sérias apreensões e digna;
preocupações quanto ao desmatamento 5. Certos meios de comunicação social
Roberto Stuckert Filho/AG. O Globo

irracional, destruição do meio ambiente e no nosso estado, nem sempre resistem à


falta de salvaguarda para a biodiversidade tentação da veiculação profissional da men-
da nossa vasta Amazônia. tira, da utilização de meias verdades e até
As dioceses vêm trabalhando a questão do silêncio criminoso.
social há mais de duas décadas por meio
das Pastorais Sociais. E nossos religiosos Propostas
que atuam junto do povo vivenciando o sofri- Propomos algumas ações que podem
mento dos mais humildes, estão expostos às favorecer a erradicação total desta situação de
ameaças, sejam elas veladas ou explícitas, violência sistemática no estado do Pará:
como recentemente no caso de dom Erwin 1. É responsabilidade grave do Minis-
Kräutler, bispo da Prelazia do Xingu, vítima tério Público e da Polícia Federal, investigar
de ameaças dos detentores do poder político exaustivamente a origem e os autores das
e econômico na Transamazônica. Isso tudo listas públicas dos marcados para morrer, que
sem contar outros religiosos e religiosas, vêm proliferando vergonhosa e impunemente
lideranças e trabalhadores e trabalhadoras ao longo dos anos;
do campo que se encontram em situação de 2. Os meios de comunicação social não
vulnerabilidade por se oporem à implanta- devem se prestar à veiculação deste tipo de
ção dos grandes projetos econômicos que listas, que de fato, fortalecem o poder oculto
ignoram a existência das populações nativas, de organizações criminosas que agem livre-
dos pobres e dos excluídos. mente;
Preocupados com a ameaça de morte 3. A responsabilidade cidadã do Pará
a um dos nossos bispos, vimos, diante de deve concentrar-se na solução efetiva das
Vossa Excelência solicitar providências no sentido de que as problemáticas que estão na base desta situação estrutural de
causas sejam enfrentadas na busca de soluções efetivas, pois insegurança e fragmentação social, entre as quais: terra, meio
acreditamos que enquanto isso não ocorrer, continuaremos a ambiente, direitos humanos, vida e dignidade. Em torno dessas
conviver com tentativas de intimidação, violência e assassinatos questões e outras, propomos a realização de um debate público
de trabalhadores rurais, lideranças e religiosos. com a mais ampla participação possível dos diversos segmentos
Como ajuda para vossa reflexão, desejamos expor a nossa da população;
apreciação dos fatos. A ameaça de morte ao bispo da Prelazia do 4. Um exercício efetivo do Judiciário comprometido com a
Xingu, dom Erwin Kräutler nos deixa profundamente consterna- causa da justiça, deverá coibir energicamente todo o tipo de impu-
dos. Reconhecemos os esforços que já estão sendo efetivados nidade de grupos organizados de forma criminosa para eliminar a
por parte do Ministério Público Federal, da Polícia Federal e de vida, os direitos da pessoa e escarnecer a dignidade humana;
outros órgãos competentes na proteção da vida e integridade 5. A todos nós, cidadãos, pedimos neste grave momento
de dom Erwin e na investigação dos autores. Estas ameaças de turbulência social uma opção decidida pela PAZ e pela sua
se inscrevem num contexto antigo em nosso estado do Pará, condição irrenunciável, que é a justiça em todos os níveis.
de sucessivas listas de homens e mulheres marcados para “Bem-aventurados os que trabalham pela paz... e Bem-aven-
morrer e de inúmeros assassinatos perpetrados principalmente turados os que são perseguidos por causa da justiça, porque
no campo, e, na quase completa impunidade dos assassinos, deles é o Reino dos céus...” (Mat 5, 3).
intermediários e mandantes, o que nos impulsiona a refletir Esperando contar com o apoio de Vossa Excelência reite-
sobre alguns pontos: ramos expressões de elevada estima e respeito”. 
1. Uma sociedade que permite a publicação de listas de
marcados para morrer é uma sociedade doentia e sem razões Dom José Luís Azcona Hermoso
para a sua sobrevivência; Bispo da Prelazia do Marajó e responsável
2. A inoperância do Judiciário, da Polícia e dos órgãos pelas Pastorais Sociais e pela CJP- CNBB N2

6 Jan/Fev 2007 -
O que todo mundo

pró-vocações
Auto-realizar-se é
conseguir chegar

mais quer na vida...


a ser aquilo para
o qual fomos
criados.
de Rosa Clara Franzoi

Divulgação
N
este artigo vou tratar de algo que todo mundo busca
com grande ansiedade, mas, nem sempre encon-
tra, por não acertar o caminho. Começo com uma
simples pergunta: para que você estuda, trabalha,
come, dorme, passeia, vai às festas? Penso eu que
seja para sentir-se bem, ter amigos, agradar as pes-
soas a quem você ama, ser alguém na vida, não é assim? Se
pegarmos tudo isso e passarmos no “liquidificador”, obteremos
um delicioso “licor” com um nome: felicidade. “Seja feliz!” Não
é com esta expressão que normalmente finalizamos, cartas,
telefonemas, e-mails?

Mas, o que é a felicidade?


A resposta é tão importante, que dela vai depender o seu sem objetivo; e muito menos Deus. Ele nos quer realizados e
futuro. Veja: se você responder que ser feliz é possuir muito, felizes; e Ele também nos mostra o caminho. Vocação acertada,
passará a vida inteira acumulando riquezas e posses. Se res- vida feliz!
ponder que ser feliz é ter muita sabedoria, passará todo o tempo
precioso de sua vida devorando livros. E se responder que ser A pedra da felicidade
feliz é gozar a vida, viverá o tempo todo correndo atrás de pra- Conta uma lenda, que um jovem encontrou uma pedra. Ela
zeres mais excitantes, buscando mais adrenalina. E no final, o brilhava. Vendo que era diferente, interessou-se e, contente, a
que lhe sobrará? Estresse, frustrações, decepções. Conclusão: levou para casa. A dona da pedra era uma fada. Ao perceber
a felicidade não está nestas respostas. que a perdera, acionou sua fonte de adivinhação e viu que ela
havia sido encontrada por um jovem muito pobre. Pensou: “Que
A força propulsora dos desejos bom! Com a pedra, ele vai poder se realizar e ser feliz”. Em
No coração humano, há uma infinita variedade de desejos. sonho, ela explicou ao jovem que aquela pedra tinha poderes
Porém, existe um que é a força motora de todos os demais: o para atender três pedidos; porém, nenhum em beneficio próprio.
desejo de auto-realização. Auto-realizar-se é conseguir chegar O jovem não gostou do que ouviu. O que ele queria mesmo era
a ser aquilo para o qual fomos feitos. Veja, tudo o que fazemos, melhorar a sua, e não a vida dos outros. Guardou a pedra e até
o fazemos com uma finalidade definida. Se alguém fabricasse esqueceu-se dela. O tempo foi passando e ele nunca conse-
um objeto sem saber para que serve, diríamos que é, no míni- guiu sair daquela situação de aperto. Um dia, já idoso, o jovem
mo, um tolo; porque nenhum ser inteligente faz alguma coisa começou a revirar suas lembranças do passado e encontrou a
pedra com seu brilho. Lembrou-se dos supostos poderes que
tinha e decidiu usá-los em benefício das pessoas. Maravilha!
Quer ser um missionário/a? Começou realizando o desejo de um jovem desempregado;
revelou a uma mãe desesperada o paradeiro da filha desapa-
Irmãs Missionárias da Consolata - Ir. Dinalva Moratelli recida; e também devolveu a saúde a um parente doente. Ao
Av. Parada Pinto, 3002 - Mandaqui realizar a última ação, a fada novamente apareceu-lhe e disse:
02611-001 - São Paulo - SP “Meu jovem, de hoje em diante, tudo o que você pedir para você
Tel. (11) 6231-0500 - E-mail: rebra@uol.com.br mesmo, será realizado. Era necessário, porém, que antes você
tivesse proporcionado a felicidade a alguém, para merecer o
Centro Missionário “José Allamano” - Pe. José Tolfo atendimento dos seus desejos”.
Rua Itá, 381 - Pedra Branca
02636-030 - São Paulo - SP Conclusão: no muito possuir, no muito saber, no prazer, no
Tel. (11) 6232-2383 - E-mail: secretariamissao@imconsolata.org.br egoísmo, a felicidade não está. Ela é um bem que se multiplica
ao ser dividido (Maxwell Maltz). Não nos cansemos de procurar
Missionários da Consolata - Pe. César Avellaneda a vocação pela qual Deus nos criou; ali encontraremos o que
Rua da Igreja, 70-A - CXP 3253 tanto buscamos. 
69072-970 - Manaus - AM
Tel. (92) 624-3044 - E-mail: amimc@ibest.com.br
Rosa Clara Franzoi é missionária e animadora vocacional.

- Jan/Fev 2007 7
Somália
Ataque norte-americano
contra o terrorismo acirra conflito
“A prudência deveria guiar todas as atividades
humanas. Mais ainda quando se fala de um país como
a Somália. Este ataque pode jogar mais lenha na
fogueira, que já está a ponto de explodir”. Assim, dom
Giorgio Bertin, bispo de Djibuti e Administrador Apostó-
lico de Mogadíscio, expressou sua preocupação pelo
ataque realizado por um avião militar norte-americano
na tarde de 8 de janeiro, contra a aldeia de Badel, no
sul da Somália.

Peter Delarue
“Acredito que
este ataque
não aumente o
apoio da popu-
lação somali ao
frágil governo
Vaticano de transição e à
VOLTA AO MUNDO

Balanço trágico: 24 religiosos e leigos Etiópia” - conti-


mortos em 2006 nuou o bispo.
Segundo notícias da imprensa, no ataque, teria
Em 2006 foram assassinadas 24 pessoas ligadas sido morto um importante líder terrorista, conside-
à Igreja Católica, entre sacerdotes, religiosos, religio- rado culpado nos atentados contra as embaixadas
sas, leigos e leigas enquanto desempenhavam seu norte-americanas no Quênia e na Tanzânia, em
trabalho no campo missionário. A África é o continente 1998, enquanto outros expoentes do terrorismo es-
que registrou o maior número de vítimas: morreram tariam no alvo, há tempos, do serviço de inteligência
violentamente nove sacerdotes, uma religiosa e uma vo- ocidental que atua na região. Entre estes, estariam
luntária leiga. A nação com maior número de sacerdotes os responsáveis pela morte de Annalena Tonelli, a
assassinados é o Quênia – três –, seguida da Nigéria, voluntária católica italiana assassinada em 2003. “Há
com o falecimento de outros dois. anos, repito que os mandantes da morte de Annalena
Fotos: Divulgação

O segundo continente com mortes Tonelli e de outros cooperadores ocidentais estavam


violentas em 2006 é a América: em Mogadíscio, onde se instalaram elementos do
perderam a vida seis sacerdotes, extremismo islâmico, que conduziram uma campanha
uma religiosa e um leigo. O Brasil de ódio contra tudo o que representa o ocidente” -
é a nação onde a Igreja perdeu confirmou dom Bertin. “Isto não nos exime de reiterar
dois de seus que podem e devem existir outros caminhos para deter
membros. Per- o extremismo. Semear morte e destruição, além dos
deram a vida aspectos éticos, é deletério também para aqueles
Irmã Leonella Sgorbati
na Ásia dois que lutam contra o terrorismo”.
sacerdotes,
uma religiosa Estados Unidos
e um leigo. A Campanha em favor da família
Oceania foi ce- A Campanha de Comunicação Católica (CCC),
nário da morte Pe. Waldyr dos Santos da Conferência dos Bispos Católicos dos Estados
violenta de um religioso. Dentre os Unidos lançou recentemente um serviço em espanhol
mortos, destacamos o sacerdote mediante o qual ressalta a importância da família na
diocesano brasileiro de 44 anos, construção da sociedade norte-americana. Com o
José Carlos Cearense, encontrado Idalina Neto Gomes, título de “Família Unida, Esperança na Vida” (A United
morto, no dia 9 de maio, na casa Leiga missionária. Family has More Hope for Life), a campanha inclui três
paroquial junto à igreja Santa Maria dos Anjos, em versões de televisão e oito versões de vinhetas de
Delta, Minas Gerais, Brasil; a irmã missionária da rádio em que se enfatiza o papel da família tradicional
Consolata, Leonella Sgorbati, de 66 anos, assassi- como fator de estabilidade e desenvolvimento humano.
nada no dia 17 de setembro em Mogadiscio, Somália; As vinhetas de rádio começarão a ser veiculadas no
o padre Waldyr dos Santos, jesuíta brasileiro de 69 próximo mês de outubro de 2007, em 400 estações
anos e a voluntária leiga portuguesa Idalina Neto de rádio hispânicas dos Estados Unidos, enquanto
Gomes, de 30 anos, que foram assassinados no dia os anúncios televisivos iniciaram a transmissão em
6 de novembro por um grupo de homens armados janeiro. Ramón Rodríguez, diretor de desenvolvimen-
que atacou a residência de Angonia, na província to da CCC, disse que a série refletirá situações da
de Tete, em Moçambique e o padre Bruno Baldacci, vida real sobre matérias que têm a ver de maneira
sacerdote “Fidei donum” da diocese italiana de La direta com a comunidade hispânica, que chega a 44
Spezia, de 63 anos, que foi encontrado morto no dia milhões de pessoas nos Estados Unidos e que é,
30 de março em seu quarto na paróquia de Nossa hoje, a primeira minoria étnica daquele país. 
Senhora das Candeias, onde era pároco, em Vitória
da Conquista, Bahia. Fontes: Fides, Zenit.
8 Jan/Fev 2007 -
INTENÇÃO MISSIONÁRIA
Janeiro: a fim de que a Igreja na África se torne
testemunha cada vez mais autêntica da Boa
Nova de Jesus Cristo, e se comprometa em cada
nação na promoção da reconciliação e da paz. Fevereiro: a fim de que a luta contra as
enfermidades e as grandes epidemias no terceiro
mundo encontre no espírito de solidariedade uma
colaboração cada vez mais generosa por parte dos
de Vitor Hugo Gerhard
governos de todas as nações.

A P
arece uma contradição que não nos entra na cabeça:
s notícias da Igreja Católica que nos vêm da África quanto mais cresce o conhecimento nos campos da
são promissoras e motivo de alegria. O número dos técnica, das ciências, sobretudo aquelas voltadas para
batizados cresce a cada dia. As vocações para a vida o bem-estar da humanidade, mais cresce também a
consagrada e sacerdotal estão em alta e os seminários fragilidade humana diante das doenças, das pestes e
e casa religiosas de formação estão cheios. O número outros males que nos assolam. Basta ver o número assombroso
de cristãos, leigos e leigas, que se empenha no projeto de evan- de mortes provocadas por epidemias e enfermidades massivas.
gelização é grande, mesmo que ainda insuficiente, para atingir Pessoalmente, encontro três razões para isso: enquanto a saúde
toda a população que não conhece a Boa Nova. Os projetos das pessoas for entendida por muitos como um mercado e uma
sociais, sejam no campo da saúde ou da caridade direta (dar mercadoria capaz de gerar lucro, estaremos sujeitos a essas
pão a quem tem fome), são visíveis, necessários e urgentes e mazelas; enquanto a pesquisa e o estudo do sofrimento humano
fazem da Igreja uma presença marcante no tecido da sociedade. for entendido como propriedade privada, com marcas e patentes
As muitas obras destinadas à educação dos “miúdos”, como são registradas em nome de pessoas físicas ou jurídicas, estaremos
chamadas as crianças daquele continente, e mesmo os projetos sujeitos a interesses nem sempre edificantes; enquanto os governos
de educação voltados para os adultos estão contribuindo de e os Estados estiverem gastando mais com armas que matam
forma decisiva para a melhoria na qualidade de vida daquelas do que com instrumentos que salvam vidas, voltados mais para
populações. pretensas seguranças nacionais e menos para a segurança de
Entretanto as notícias de caráter social, econômico, de cada indivíduo, entendendo a saúde de seus povos como uma
segurança e de organização da sociedade civil são ainda mo- questão de redução de danos, selecionando vidas humanas e
tivo de grande preocupação. As economias nacionais não são deixando outras tantas perecerem, não deixaremos de ser uma
capazes ainda de suprir as necessidades mais elementares de mera massa de manobra, submissa e passiva.
sobrevivência de muitas populações; a geração de riqueza e Entretanto, não sou uma pessoa pessimista. Vejo com alegria,
renda, mesmo levando em conta os muitos recursos naturais, ao menos três bons caminhos de superação do sofrimento huma-
humanos e tecnológicos, ou carecem de uma melhor distri- no, fundado, na solidariedade e no trabalho silencioso e muitas
buição ou são desviadas para outros mercados, sedentos de vezes anônimo, a saber: a Pastoral da Criança, já conhecida e
consumo; as guerras e a violência diária são de uma tamanha praticada em muitos países, capaz de aliviar o sofrimento dos
agressividade que tolhe a vida de muitos inocentes, às vezes pequenos e garantir-lhes uma entrada na vida com algumas
por motivos banais, às vezes no contexto de guerras fratricidas, condições mais favoráveis para o seu pleno desenvolvimento;
forjadas e alimentadas pelo mercado internacional de armas e as muitas iniciativas no campo da saúde alternativa, resgatan-
munições. Há um longo caminho a ser percorrido por aqueles do a sabedoria popular e as fórmulas caseiras e tradicionais
povos e nações até que se chegue a um patamar razoável de no cuidado da saúde e no alívio do sofrimento; as inúmeras
convivência humana que respeite os direitos e a dignidade de organizações de médicos e outros servidores desta área que,
cada pessoa e de cada etnia. gratuita e voluntariamente dedicam uma boa parte de seu tempo
Cabe à Igreja Católica, sua hierarquia e membros, uma dupla na busca de soluções comuns para a dor humana e atendem
tarefa: levar ao conhecimento dos homens e das mulheres do diretamente as pessoas com necessidades especiais.
continente africano a Boa Nova de Jesus Cristo, acalentando em A ciência e a técnica estão a serviço da pessoa e não o
seus corações a semente do Reino de Deus e todas as suas con- contrário. Somos os sujeitos e destinatários do conhecimento
seqüências, único caminho capaz de gerar uma nova sociedade, humano e seu desenvolvimento e não cobaias de seus expe-
fundada na justiça e no amor. Compete igualmente à Igreja, a rimentos. Somente quando a pessoa humana e sua dignidade
tarefa de contribuir eficazmente no processo de reconciliação e estiverem no centro das preocupações é que teremos alguma
de paz, ajudando a curar as feridas que a história humana gerou chance na eliminação das graves feridas que fazem a huma-
nos corações, nas mentes e nos corpos destes povos sofridos. nidade sofrer. 
Sem o bálsamo do perdão não se poderá pensar no hoje e no
amanhã de uma África pacificada e mais feliz. Vitor Hugo Gerhard é sacerdote e coordenador de pastoral da Diocese de Novo Hamburgo, RS.

- Jan/Fev 2007 9
A Mis
espiritualidade

no espír

de Luiz Balsan todo o nosso ser. Porém, quem é revestido Instituto e a necessidade de aumentar
de Cristo é chamado a constantemente significativamente o pessoal para respon-

O
revestir-se Dele. Somos convidados a der às exigências da Missão, ele afirma
Bem-aventurado José Alla- assumir um compromisso: deixar realizar va que não é o número que conta, mas a
mano, fundador dos missio- em nós o dom do batismo. A ação de Deus qualidade, e recordava que é necessário
nários e das missionárias da exige a cooperação do homem. O convite sermos santos sacerdotes, missionários
Consolata não se cansava de de São Paulo: revesti-vos do Senhor Jesus, e missionárias. E dizia ainda: “não me
falar sobre a importância da é um empenho constante para aprender basta ser cristão, mas missionário; e devo
santidade na vida religiosa. de Cristo, assimilar o seu modo de ser, de ter esta intenção, e não basta querê-lo,
Isto é, a centralidade da pessoa de Cristo pensar e de fazer, para que aquilo que o mas devo ter o espírito. Quem não tem o
neste caminho. Ele transmitiu aquilo que o batismo realizou em nós possa realmente espírito de Cristo, de apóstolo do Redentor,
Espírito lhe concedeu experimentar: sua tornar-se existencial. se não tem este espírito de fazer-se santo
própria experiência espiritual; seu cons- Allamano, em uma das conversas com neste modo, este não lhe pertence. Não
tante esforço por revestir-se de Cristo. seus missionários, dizia que não basta ser somente deveis ter o espírito de Nosso
batizado e freqüentar as celebrações do- Senhor; mas deveis ter os pensamentos,
Revestir-se do Senhor Jesus minicais para ser realmente cristão. A vida as palavras, as ações de Nosso Senhor.
São Paulo nos fala da necessidade de de fé, ao invés, é outra coisa. Para poder Vós deveis ser missionários na cabeça,
todo cristão revestir-se do Senhor Jesus. apresentar-se como cristão, é necessário na boca e no coração” (Conferências Es-
No batismo, nós somos revestidos de que o homem todo seja transformado à pirituais do Servo de Deus José Allamano
Cristo, de tal modo que sua vida invade imagem de Cristo. Vendo a expansão do - CS III, 16).

10 Jan/Fev 2007 -
ssão
capítulo 1 do livro do Gênesis, versículo
31, através da qual o autor quer apresentar
a obra de Jesus como uma nova Criação.
As palavras de Allamano não deixam
transparecer tal interpretação. Ao invés,
colocam em evidência o fato que, em toda

rito de Cristo
a vida, desde o momento da Encarnação
até o Calvário, Jesus fez tudo em sintonia
com a vontade do Pai. Por isso, o fundador
insiste que “não basta fazer o bem, mas
é preciso fazê-lo bem; que cada uma de
nossas coisas boas seja feita com reta
intenção e com todas as circunstâncias
queridas por Deus” (CS II, 669). Esta frase
acena a dois elementos fundamentais: a
reta intenção e a sintonia com a vontade
de Deus. Fazer o bem bem-feito implica
uma atitude espiritual eucarística: “Todas
as nossas ações se queremos fazê-las
bem, devemos fazê-las por Ele, com Ele
e n’Ele” (CSS II, 305).
Fazer bem o bem se refere também à

No dia 16 de fevereiro comemoramos a festa do Bem- execução material das obras. Neste caso,
um acúmulo de trabalho pode impedir de

aventurado José Allamano. A sua espiritualidade coloca realizá-lo a contento. Por isso, demonstra-se,
por exemplo, contrário a assumir um terri-

Cristo e a Missão no centro da nossa vida. tório de Missão demasiadamente extenso.


Quer, em vez disso, que os seus se limitem
a assumir os territórios que conseguem
atender adequadamente. Não lhe importa
que sejam feitas muitas coisas, mas que
aquilo que se faça, seja bem-feito.

Inseridos no mundo
Quando Allamano fala da imitação
Eu Nele e Ele em mim nós, Cristo age em nós e através de nós de Cristo, não se refere à cópia material
Allamano sublinha com ênfase a fra- (CSS I, 420). do Seu comportamento ou repetição das
se de São Paulo: “... vivo, mas não sou Suas ações. Esta expressão indica, ao
mais eu, é Cristo que vive em mim” (Gl Manso e humilde de coração invés, uma íntima participação do cristão
2, 20). Ele compreende esta frase como Dentro desta perspectiva de revestir-se na vida de Cristo e, ao mesmo tempo, de
expressão de uma união existencial com de Cristo, há alguns elementos para os Cristo na vida do cristão. Mas, existe outra
Cristo, a ponto que o apóstolo sente a sua quais Allamano orienta de modo particular expressão que aponta para significado
vida plenamente permeada pelo Senhor. a atenção dos seus missionários. Nota igualmente importante. Muitas vezes,
Devido à sua presença na vida de Paulo, como Cristo viveu harmoniosamente uma sugere aos seus para que perguntem:
Cristo é para ele um novo princípio de intensa atividade apostólica e uma intensa o que Cristo faria se estivesse no meu
atividade. O apóstolo assimilou de tal intimidade com o Pai, manifestada de lugar? Uma pergunta simples que exige
forma a mensagem de Cristo que Ele modo particular no silêncio e na oração um constante discernimento de conhecer
faz parte intrínseca de sua identidade e (CS I, 265). Em segundo lugar, recorda o coração de Cristo, a sua forma de sentir
parte constitutiva do dinamismo de sua que o próprio Jesus pediu para ser imitado e de se relacionar com a vida, com os
personalidade. Esta realidade Allamano na humildade e na mansidão: “aprendei outros e com o Pai, e fazer próprias as
expressa com a frase: fazer uma só coisa de mim que sou manso e humilde de suas atitudes fundamentais no contexto de
com Cristo (CSS II, 304). Ele reconhece, coração”. Reconhece a mansidão como hoje. Isto é, o nosso revestir-se de Cristo
portanto, em Paulo um coração que vibra virtude constante em todo o ministério comporta assumir plenamente a dimensão
pelo seu Senhor e este amor constituiu o apostólico de Cristo e quer que seja uma da própria existência. Isto quer dizer que
motivo fundamental da sua adesão a Ele. atitude que caracteriza a vida e atividade o cristão vive inserido no seu tempo, em
O seu é um amor apaixonado por Cristo e dos seus missionários. Sabe que qualquer seu mundo, mas, ao mesmo tempo, em
pela humanidade. O cristão participa de tipo de violência constitui um verdadeiro constante referência à pessoa de Cristo.
tal forma da vida de Cristo, a ponto de empecilho para a evangelização. Um Isto o leva a viver como Ele, mas no pró-
poder dizer: eu vivo no Senhor. Allamano terceiro elemento ao qual o fundador dá prio contexto sociocultural e histórico. Um
percebe que Cristo tornou-se para Paulo a particular atenção o une a tantas pessoas contínuo discernimento torna-se, então,
pessoa central a partir da qual o apóstolo que, presenciando quanto Jesus realizava condição essencial para a realização de
organiza toda a sua experiência. Quando nas suas obras, cheios de admiração uma autêntica vida cristã. 
Cristo vive em nós de forma permanente, exclamavam: “Ele tem feito tudo bem”
esta sua presença torna-se explícita em (Mc 7, 37). Na exegese atual identifica- Luiz Balsan é missionário, professor de Espiritualidade e
nosso agir. Isto significa que, vivendo em se nesta frase de Marcos uma alusão ao doutor em Teologia.

- Jan/Fev 2007 11
Duas ofertas
testemunho

de uma família de fé
Missionária trabalha há Graças ao esforço e à religiosidade de
meus pais, meus irmãos e eu pudemos
- como ela mesma dizia – ele deveria ser
muito importante. Quando ela partiu, eu não
15 anos em Moçambique ter uma infância abençoada, transcorrida
num clima de serenidade e muita união.
modifiquei meus hábitos. Continuei dando
os meus passeios, curtindo as festinhas
e celebra 25 anos de Sempre fui uma pessoa alegre e quando
adolescente, gostava muito de estudar,
e os amigos. Mas, o meu interior estava
mudando. Eu comecei a sentir um vazio,
vida religiosa. mas, sobretudo, “adorava” sair com amigas
e amigos, ir às festas; enfim, gostava de
uma insatisfação. Eu não sabia explicar;
mas bem lá no fundo, uma voz me dizia
tudo o que interessa a uma jovem alegre que eu tinha que procurar algo mais,
de Clemência Alves Sicupira e sadia. Até meus 17 anos vivi uma vida porque não era esse o meu caminho. Eu
despreocupada. O futuro parecia estar ficava lembrando aquilo que minha irmã

P
tão distante, que não valia a pena perder comentava em casa a respeito do que
ara mim é uma satisfação recor- tempo e preocupar-se com ele. sentia quando começou a pensar em ser
dar a minha história. Considero religiosa. Percebi que tudo se encaixava
uma graça a oportunidade de Deus fala através de fatos com o meu estado interior.
poder relembrar e experimen- Um fato marcante chamou-me à rea- Eu notava que, de repente, meu co-
tar, sempre de novo, a infinita lidade. Minha irmã, Eudoxa, nos deixara ração se sensibilizava diante dos mais
bondade de Deus ao convidar para se tornar missionária da Consolata. pobres, dos doentes, impelindo-me a fazer
a minha pessoa, de origem simples e hu- Ainda que eu não o demonstrasse, aquilo algo por eles. Desde pequena, sempre
milde para o desempenho de uma tarefa mexeu comigo. Especialmente no silêncio freqüentei a igreja em companhia da
tão grande como é o serviço missionário. da noite eu ficava refletindo. No meu con- minha família. Aquilo, para nós filhos,
Sou de origem baiana, filha de Adão ceito, minha irmã era uma ótima jovem. Se era normal. Notei, porém, que a minha
Alves Sicupira e Santa Vieira Miranda. largara a família para ir atrás do seu sonho participação começava a ser diferente;
Fotos: AMV/MC

Irmã Clemência com os coordenadores dos jovens das comunidades da paróquia, Massinga.

12 Jan/Fev 2007 -
Irmã Clemência com jovens da paróquia, Massinga.

sentia mais interesse pelas coisas de para os dois anos do Juniorato Internacional. situação: falta de perdão, desemprego,
Deus. Uma alegria estranha tomava conta Regressando ao Brasil, foi-me proposto consumo de drogas, prática da violência
do meu coração. Entendi, então, que só o curso técnico de enfermagem, como e do sexo livre, a idéia do descartável...
podia ser a voz de Deus mostrando-me preparação para a Missão. Fiz o curso no Jovens que sejam capazes de testemunhar
um outro caminho. Comecei a confiar em hospital Santa Marcelina, em Itaquera, São a todos que é possível construir e viver
Maria, Mãe de Jesus, pois tinha certeza Paulo. O estágio foi uma ótima experiên- um mundo diferente, onde todos, de mãos
que ela me iluminaria. Como não é pos- cia, porque me colocou em contato direto dadas, se empenhem em encontrar o ca-
sível esconder certas coisas, meus pais com os doentes. Foi ao término do curso minho do desenvolvimento social, cultural
perceberam que o meu comportamento que recebi, com alegria, a tão esperada e religioso, na paz, no diálogo e não pela
estava diferente. Não foram necessárias notícia do meu próximo trabalho: Missão força e que se sintam responsáveis pelo
muitas explicações para entenderem o que em Moçambique, África. A minha pressa bem comum. Temos que caminhar muito
estava se passando comigo. Não foi fácil de chegar lá era tanta, que em pouco para que isso se torne realidade.
para eles, pois já era a segunda filha que tempo eu parti. Hoje, após 15 anos de
os deixava. Mas, como eram pessoas de contato com esse povo-irmão, posso afirmar Bodas de prata
muita fé, fizeram, mais uma vez a Deus a que estou muito contente. Contente, por Este ano de 2007 é para mim um ano
sua oferta. Através de minha irmã Eudo- estar onde estou e fazer o que faço. Em especial. Estou celebrando os meus 25
xa, que a esta altura já estava fazendo o qualquer lugar deste mundo, a Missão é anos de Profissão Religiosa. É um ano de
segundo ano de Noviciado em São Paulo, sempre desafiadora. Posso dizer que as muita gratidão a Deus pela sua fidelidade
entrei em contato com as missionárias. dificuldades sempre me acompanharam; para comigo. É tempo de reafirmar, com
Depois de um ano de acompanhamento, porém, nunca me venceram. Deus sempre renovado amor, ardor e entusiasmo mis-
disse “adeus” a tudo e a todos e rumei sustenta quem nele confia! sionário a minha opção por Jesus. Nesta
para São Paulo, onde dei início à minha ocasião sai espontânea do meu coração
formação religiosa. Não posso dizer que Pastoral da Juventude esta oração: “Senhor, toma a minha vida,
a separação foi fácil; porém, tratava-se Devido às necessidades locais, tive a minha liberdade e a minha memória, o
de uma escolha, e com a força de Deus que deixar a área da saúde e assumir a meu entendimento e toda a minha von-
consegui fazê-la. Pastoral da Juventude. Um trabalho im- tade. Tudo eu recebi de ti. Agora, todos
portante, mas difícil, com sérios desafios os dons que me deste, com gratidão eu
Uma inexplicável atração porque vivemos numa sociedade que corre os devolvo a ti, dispõe deles conforme o
Nos meus primeiros anos de forma- atrás do mais fácil e onde “tudo parece teu agrado. Dá-me somente o teu amor
ção eu gostava muito de ouvir as irmãs ser permitido”. Diante disso, muitas vezes e a tua graça e isto me basta”.
falarem das Missões, do trabalho que os nos perguntamos: onde fica a escala dos Vale a pena arriscar a própria vida
missionários e missionárias realizavam na valores humanos, sociais, éticos? E para os por Jesus! Ele é o “único” que tem a
África. Aquilo ia reforçando e esclarecendo cristãos, os valores evangélicos ensinados resposta certa para todas as perguntas
a minha idéia de Missão. Ela parecia uma por Jesus? Moçambique ainda se recupera e indagações do coração humano. Para
aventura; e ao invés de me deixar com de uma longa e fratricida guerra civil; e os que o procuram, sempre há indicado-
medo, me cativava sempre mais; de fato, nós missionárias e missionários sentimos res. Ele sempre envia sinais, símbolos,
eu sempre gostei de aventuras, de desafios, a responsabilidade de formar jovens que acontecimentos... Basta prestar atenção
do desconhecido e do risco. Ao terminar tenham uma consciência clara da sua para perceber bem no fundo do coração
a formação, fiz minha primeira Profissão dignidade e liberdade, da sua cidadania a proposta dele: vem e segue-me! 
Religiosa em 1981. Trabalhei na pastoral e também da sua fé. Jovens que sejam
em diversos lugares, indo depois à Itália capazes de enfrentar os desafios da própria Clemência Alves Sicupira é missionária em Moçambique.

- Jan/Fev 2007 13
O voto de pobreza versus
fé e política

o voto do patrão
Durante a campanha eleitoral, o cidadão regras extremamente rígidas e padrão de conduta rigoroso, se
torna profissão. Em discurso recente, um senador inocentado de
foi chamado de “patrão”, mas quem teve corrupção após mais uma “rodada de pizza”, disse estar cansado
de sua profissão. Devemos destacar que cargo de representação
autonomia para aumentar os próprios NÃO é profissão. Como o próprio nome já diz, essas funções
são representativas da sociedade, e não podem ser vistas como
salários foram os “empregados”. atividade profissional. Se esses sujeitos têm vencimentos, tal
questão deve ser entendida como um montante que representa
a quantia necessária para a manutenção desse compromisso.
de Humberto Dantas Mas não é assim que funciona. Aqueles que a Justiça chama
de “nossos empregados” se vêem como classe, capaz de definir

N
privilégios que os cidadãos sequer sonham ter.
as eleições de 2006 o Tribunal Superior Eleitoral,
TSE, foi elogiado por sua campanha de conscien- Aumento dos parlamentares
tização sobre o exercício do voto. Apesar de ainda Completa o lamentável cenário a recente discussão acerca
estarmos muito distantes de uma ação consistente e dos aumentos nos vencimentos dos congressistas. Em um
instrutiva, as rápidas inserções no rádio e na televi- simples ato, tomado após as eleições, os “salários” aumentaram
são afirmavam que o cidadão “é o patrão” dos seus cerca de 90%. A sociedade, indignada, assistiu a Justiça barrar
representantes. Em termos éticos, a mensagem está coberta a medida. Mas sabemos que esse tipo de atitude é frágil, e logo
de razão. No entanto, notamos que isso pouco funciona. O os congressistas chegarão onde desejam. A imprensa, crítica
cargo de parlamentar no Brasil, por exemplo, é desejado pelos fervorosa do reajuste, apontou duas justificativas: primeiramente
benefícios que garante. A lógica de servir a nação é aparen- a decisão faz parte do pacote de benesses que o presidente da
temente secundária, e ilumina poucos dos 594 congressistas. Câmara dos Deputados, o “comunista” Aldo Rebelo (PC do B-
Dentre inúmeras vantagens encontramos: elevados salários, SP), e o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL),
imunidades e privilégios perante a Justiça, aposentadoria breve lançaram para tentar a reeleição no cargo. Tal questão é prova
e diferenciada, passagens aéreas e aviões em época de crise, cabal de quanto os parlamentares agem em causa própria no
verba de correio, auxílio-moradia, motorista, equipe de gabinete, momento de negociarem. As campanhas não se pautam em
influência em temas de relevância nacional etc. Assim, uma função interesses da sociedade, e sim em vantagens pontuais. Em
democrática fundamental termina se transformando no emprego segundo lugar se destaca a questão de equiparar o salário dos
sonhado por todos. O que deveria ser um compromisso com parlamentares ao dos ministros do STF. Ou seja, de R$ 13.000,00
para R$ 25.000,00 - sem contar os benefícios. Tal medida parece
encontrar respaldo legal, mas aqui temos outro grave desvio de
Gervasio Baptista/ABR

conduta. O ministro Marco Aurélio Mello, que acumula o cargo


de presidente do TSE, disse recentemente que os ocupantes do
cargo máximo do Judiciário ganham tão pouco que fizeram voto
de pobreza! Pobreza? Quem recebe R$ 25.000,00 mensais e
tem uma série de benefícios tem direito de reclamar de salário?
Pode até estar insatisfeito com o que recebe, tendo em vista seu
padrão de vida. Mas quem ganha mais de 60 salários mínimos
não pode falar em miséria... Devemos lembrar que uma família
brasileira comum vive, de acordo com a Constituição Federal,
dignamente com R$ 375,00. E que o aumento máximo previsto
para o salário mínimo o elevará para R$ 420,00. Os ocupantes
da torre do “Castelo do Poder” devem se lembrar que continu-
amos nos virando com algo bem distante de R$ 13.000,00 ou
R$ 25.000,00, da sensação de sermos patrões e da ética da
representação. Fiquemos atentos! 

Humberto Dantas é cientista político, professor do Centro Universitário São Camilo e coordenador
Central Única dos Trabalhadores (CUT) reúne assinaturas na rodoviária de Brasília
contra o aumento dos parlamentares. de Cursos de Formação Política na Região Episcopal Lapa e na Diocese de Osasco, SP.

14 Jan/Fev 2007 -
FORMAÇÃO mISSIONÁRIA

Pelos caminhos da América


A Conferência de
Santo Domingo
de Ramón Cazallas Serrano

A IV Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano foi realizada

A
em Santo Domingo, capital da República Dominicana, em 1992. s pessoas se perguntavam
em 1992, o que estava sendo
celebrado... Falava-se em
500 anos, mas, de quê? Para
Divulgação

muitos, tratava-se dos cinco


séculos de evangelização do
continente latino-americano, para outros,
os 500 anos de sua invasão, para alguns
o “descobrimento”, ou a “ocupação”. Não
faltou a polêmica entre estas diferentes
concepções na IV Conferência do Epis-
copado Latino-Americano.
Santo Domingo foi diferente de
Medellín e Puebla, o impacto não foi
o mesmo das duas reuniões anterio-
res. Mesmo que a preparação tivesse
sido séria, a impressão, segundo o
cardeal Aloísio Lorscheider, era que
se desejava torpedear a Conferência.
Houve certas modificações com rela-
ção às precedentes: Não foi seguido
o método “ver, julgar e agir”, típico da
América Latina. Durante a celebração,
muitos bispos sentiram a mão pesada
de Roma com intervenções, à margem
das decisões que se iam tomando nas
assembléias. O documento definitivo
ficou retido muito tempo na capital da
Itália, com muitas correções no texto
apresentado pelos bispos. Todas estas
circunstâncias não encontraram eco
imediato nas Igrejas do continente e
Santo Domingo permanece como apên-
dice na vida eclesial latino-americana,
sem a “garra” e a influência de Medellín
e Puebla, passando por cima de certos
temas que foram “chaves” nos anos
precedentes. Mesmo assim, alguns
aspectos da IV Conferência continuam
válidos e, de certa forma, se fazem
ainda presentes na vida da Igreja. O
tema escolhido em Santo Domingo
foi “Nova Evangelização, Promoção
Igreja de Santo Domingo, República Dominicana.
Humana, Cultura Cristã”.

- Jan/Fev 2007 15
A nova evangelização de re-evangelização, mas, sim, de
Foi o próprio papa João Paulo II uma nova evangelização. Nova em
que em Porto Príncipe, capital de Haiti, seu ardor, nova em seu método, nova
Alfredo ESTRELLA

no ano de 1983, falando ao Plenário em sua expressão”.


do CELAM, disse: “A comemoração “A nova evangelização tem como
do meio milênio de evangelização terá ponto de partida a certeza de que em
pleno significado se for um compromisso Cristo há uma riqueza insondável que
vosso, como bispos, junto com vosso nenhuma cultura, de qualquer época,
presbitério e fiéis, compromisso não extingue, e a qual nós homens sempre
podemos recorrer para enriquecer-nos”

Divulgação
(João Paulo II, Discurso Inaugural, 6,
Santo Domingo).

Divulgação
A nova evangeliza-
ção não significa par-
tir do zero, já houve
uma primeira, e
não significa
re-evange-
lizar para

Inculturação
João Paulo II

A do Evangelho inculturação do Evangelho é um processo


que supõe reconhecimento dos valores
evangélicos que se têm mantido mais
ou menos puros na atual cultura; e o
reconhecimento de novos valores que
coincidem com a mensagem de Cristo.
Mediante a inculturação, busca-se que a
sociedade descubra o caráter cristão desses valores,
os aprecie e os mantenha como tais. Além disso,
pretende a incorporação de valores evangélicos que
Angelo Costalonga

estão ausentes de cultura, ou porque se tenham obs-


curecido, ou porque tenham chegado a desaparecer.
“Pela inculturação, a Igreja encarna o Evangelho nas
diversas culturas e simultaneamente introduz os povos
com as suas culturas na sua própria comunidade,
transmitindo-lhes os seus próprios valores, assumindo
o que de bom nelas existe, e renovando-as a partir
de dentro.” (Redemptoris Missio, 52, SD 230). A fé,
ao se encarnar nessas culturas, deve corrigir seus
erros e evitar sincretismos. A tarefa da inculturação
da fé é própria das Igrejas particulares sob a direção
dos seus pastores, com a participação de todo o povo
de Deus. Os critérios, fundamentais neste processo
são a sintonia com as exigências objetivas da fé e
a abertura à comunhão com a Igreja Universal (cf.
Redemptoris Missio, 54, SD 230).

16 Jan/Fev 2007 -
FORMAÇÃO mISSIONÁRIA

corrigir as deficiências do passado. modernidade; esta situação nova a defesa da vida diante da presença
Ela surge na América Latina como traz consigo também novos valores, destruidora de uma cultura de morte; a
resposta aos problemas apresentados a ânsia da solidariedade, da justiça, inculturação do Evangelho; e tudo isto
pela realidade de um continente no a busca religiosa e a superação de em meio às situações de urbanização,
qual há um divórcio entre fé e vida, a ideologias totalitárias; pobreza e marginalização.
ponto de produzir clamorosas situações ► os destinatários da nova evan-
de injustiças, desigualdades sociais e gelização são também a classe A promoção humana
violência. Implica enfrentar a grandiosa média, os grupos, as populações, O tema mais “latino-americano” de
tarefa de infundir energia ao cristianismo os ambientes de vida e de trabalho Santo Domingo foi aquele da promo-
da América Latina. marcados pela ciência, pela técnica ção humana. Na linha de fidelidade à
Constata-se que depois de 500 e pelos meios de comunicação tradição da América Latina, a Confe-
anos de evangelização, a Igreja se social; rência reafirmou o compromisso com
encontra perante uma quantidade de ► o conteúdo da nova evangelização os pobres e entendeu a promoção
“massas” excedentes, numa situação é Jesus Cristo, Evangelho do Pai, humana como componente essencial da
de pobreza e exclusão que suscita que anuncia com gestos e palavras evangelização, como afirmava Puebla.
algumas questões: que evangeliza- que Deus é misericordioso para Nesse sentido, a opção pelos pobres
ção foi esta que realizamos, que não com todas as suas criaturas. foi retomada e reafirmada, assim como
conseguiu frear a exclusão? A margi- Como destaque de Santo Domingo o compromisso de transformação da
nalização será por acaso o resultado temos o papel e o protagonismo dos sociedade. O tema da promoção hu-
da nossa evangelização? Foram os leigos e leigas, especialmente na nova mana foi um acréscimo do papa João
corações que se fecharam ou foram evangelização. Ninguém melhor do que Paulo II. Feliz acréscimo!
os nossos métodos, ou nosso ardor? eles para chegar a todos os ambientes A promoção humana é uma dimen-
As respostas permanecem, para po- e situações onde é difícil a presença de são privilegiada da nova evangelização.
dermos fazer uma reformulação em outros agentes de pastoral. Os jovens Jesus ordenou aos seus discípulos
nossa evangelização. são chamados também com especial que repartissem o pão multiplicado à
empenho para que estejam presentes multidão necessitada, de modo que
Novos ares com espírito cristão e crítico nas novas “todos comeram e ficaram saciados”
Santo Domingo trouxe também situações. Reafirma-se, como em Pue- (cf. Mc 6, 34-44). Curou os enfermos,
novos respiros: bla, a opção preferencial pelos jovens, “passou a vida fazendo o bem” (At 10,
► o sujeito da nova evangelização é não só de modo afetivo, mas, também 38). No final dos tempos nos julgará no
toda a comunidade eclesial: papa, efetivamente. amor (cf. Mt 25).
bispos, sacerdotes, religiosos e Renova-se o sentido da Missão Ad Os bispos constataram na Confe-
religiosas e todos os homens e Gentes sabendo que não pode haver rência as seguintes situações: a não
mulheres que constituem o povo nova evangelização sem projeção para eqüitativa distribuição dos bens da
de Deus; o mundo não-cristão. O desafio missio- terra; a desigualdade no exercício da
► a nova evangelização tem como nário de Puebla foi assumido desde a cidadania, a discriminação, a corrupção
finalidade formar pessoas e comuni- nossa pobreza, reconhecendo, porém, nos serviços públicos; a busca não do
dades maduras na fé e dar respostas que a consciência missionária Ad Gen- bem-comum, mas dos interesses parti-
à nova situação provocada pelas tes ainda é insuficiente ou frágil. culares; a violação constante dos direitos
mudanças sociais e culturais da humanos fundamentais, o crescimento
Desafios da evangelização da violência com o desemprego, os
Claudio Morneau

Foram considerados desafios em seqüestros, os roubos, os assassinatos.


Santo Domingo: a crescente seculari- São constatações que parecem escritas
zação, que leva ao materialismo, ao he- hoje, pela sua atualidade.
donismo, ao ateísmo, ao consumismo,
à indiferença religiosa, ao relativismo Seus desafios
moral; o avanço das seitas e o pluralismo ► os direitos humanos: a dignidade e
religioso junto com a ignorância religio- a igualdade das pessoas enquanto
sa, com um conhecimento superficial criadas à imagem e semelhança
da fé, incapaz de transformar a vida de Deus, não só são violados pela
das pessoas e dos seus ambientes; repressão e terrorismo, mas, tam-

Manifestação afro na PUC, São Paulo, SP.

- Jan/Fev 2007 17
FORMAÇÃO mISSIONÁRIA

bém pela existência de condições prudência, ao mesmo tempo com “pa-

Jaime C. Patias
de extrema pobreza e de estruturas resia evangélica”. Até que Cristo entre
econômicas injustas que originam verdadeiramente na consciência das
grandes desigualdades; pessoas, nas suas atitudes vitais, nas
► a ecologia: a natureza como dom suas instituições e em todas as suas
de Deus que temos que cuidar e estruturas.
desenvolver com critérios éticos A segunda forma de cultura que
e não só por e com proposta de aparece no documento é a oposição
desenvolvimento sustentável; entre cultura da vida e cultura da morte,
► a terra: dom de Deus e lugar sagrado no sentido de valores que defendem
para muitos dos habitantes do con- a vida e a dignidade humana e outros
tinente, especialmente do mundo que a menosprezam.
indígena; a sua justa distribuição
entre todos os povos favorecendo Os desafios pastorais
os despossuídos; A IV Conferência apontou alguns de-
► o trabalho: a realidade desafia uma safios para a Igreja latino-americana:
cultura de trabalho e de solidarie- ► ruptura entre fé e cultura, conse-
dade; no que se refere ao mundo qüência do fechamento do homem
dos trabalhadores, alerta-se para moderno à transcendência, e da
uma deterioração em suas condi- excessiva especialização que im-
ções de vida e no desrespeito aos pede a visão de conjunto;
seus direitos; escasso cumprimento ► escassa consciência da necessida-
das normas estabelecidas para de de uma verdadeira inculturação
os setores mais débeis (crianças, como caminho para a evangelização
Participante do CAM2 COMLA7.
aposentados, doentes); da cultura;
► a família e a vida são desafios de pecífico, contrapondo-se aos poderes ► incoerência entre os valores do povo,
especial urgência na promoção da morte, adotando a perspectiva de inspirados em princípios cristãos, e
humana: fortalecer a vida da Igreja Jesus Cristo encarnado, que salvou as estruturas sociais geradoras de
e da sociedade a partir da famí- o homem partindo da fraqueza, da injustiças, que impedem o exercício
lia; proclamar que Deus é o único pobreza e da cruz redentora. dos direitos humanos;
Senhor e que o homem não pode Os bispos afirmam que querem ► o vazio ético e o individualismo
ser amo ou dono da vida humana; desenvolver uma evangelização incul- reinante, que reduzem a funda-
promover políticas que promovam turada e em relação aos irmãos indíge- mentação dos valores a meros
a vida e denunciem com coragem nas e afro-americanos, com especial consensos sociais subjetivos.
tudo aquilo que vai contra ela. atenção indicam: Tudo isto influi na evangelização
► oferecer o testemunho de Jesus para rever os métodos e prestar atenção
Cultura cristã numa atitude humilde, compreensi- às novas culturas. Não podemos ser
O tema mais diferente e instigante va e profética, num diálogo respei- sujeitos passivos, mas criativos com a
de Santo Domingo é o da cultura cristã. toso, franco e fraterno e conhecer novidade do Evangelho. A Igreja não
Aparece em duas formas ao longo suas próprias línguas; existe para se defender, mas para propor
do documento e é assim que entrará ► promover a inculturação da liturgia, uma boa notícia para todos. A proposta
na vida da Igreja latino-americana: a acolhendo seus símbolos, ritos e da Igreja deve ser sempre positiva,
primeira diz respeito às culturas dos expressões religiosas; nova, de encorajamento para o homem
povos latino-americanos, sobretudo ► acompanhar a reflexão teológica, de hoje. Jesus não era antiquado, mas
às culturas oprimidas, afirmando-se respeitando suas fórmulas cultu- veio ao encontro de cada homem e de
sempre a necessidade de evangelizá- rais; todo o homem. Ele é a “nossa lei e a
las. Dá indicações especiais sobre as ► acompanhar estes povos na defesa nossa norma”.
culturas indígenas e afro-americanas. A da sua identidade e no reconheci- Santo Domingo está em perfeita
América Latina e o Caribe configuram mento dos seus próprios valores, continuidade com Medellín e Puebla,
um continente multiétnico e pluricultural. como também ajudá-los a manter faz parte do patrimônio teológico e
Nele convivem, em geral, povos nativos, vivos seus usos e costumes com- pastoral da Igreja latino-americana.
afro-americanos, mestiços e descen- patíveis com a doutrina cristã. Talvez tenha sido pouco estudada,
dentes de europeus e asiáticos, cada Sendo a parte mais diferente de rezada e amada. Medellín, Puebla e
qual com a própria cultura que os situa Santo Domingo, é consenso comum Santo Domingo foram um kairós, tempo
em sua respectiva identidade social, que estamos no começo da incultu- de Deus, que preparou para Aparecida,
segundo a cosmovisão de cada um. ração com estes povos. Há algumas a V Conferência do Episcopado Latino-
Uma meta da evangelização in- experiências sábias por parte de alguns Americano, que será realizada este
culturada será sempre a salvação e cristãos, mas nem sempre as autori- ano, em maio. 
libertação integral de determinado povo dades competentes respeitam o que
ou grupo humano, que fortaleça sua está escrito e decidido. É um campo Ramón Cazallas Serrano é missionário e diretor do Centro
identidade e confie em seu futuro es- ainda por explorar com sabedoria e Missionário José Allamano em São Paulo.

18 Jan/Fev 2007 -
A força do testemunho

Missão
história missão
daHoje
na China
Num contexto onde não é permitido
aos missionários evangelizar, a
presença xaveriana na China se
caracteriza pela força do testemunho
e pelo contato pessoal.

A
presença dos missionários xaverianos na China muitas vezes com a perseguição e o martírio.
continental caracterizou-se desde o começo por uma Para a Igreja chinesa o desafio principal é o de conseguir
atitude de escuta e de atenção à realidade. Sentíamos reencontrar sua unidade interna. Essas divisões históricas estão
antes de tudo que devíamos conhecer a China e os hoje bem longe de uma solução. A unidade é, sem dúvida, um
chineses para poder aprender o que a Providência dom a ser pedido, mas também um esforço que deverá levar a
tinha feito ao longo dos séculos, e para entender Associação Patriótica a procurar a liberdade dos condicionamen-
qual podia ser o significado da nossa presença num lugar onde tos políticos, e os cristãos clandestinos a ser um instrumento do
podíamos fazer praticamente tudo, menos exercer a função de perdão incondicional de Deus.
presbíteros e anunciar explicitamente o Evangelho. Um outro desafio é, sem dúvida, o de anunciar o Evangelho
Seguiram-se então os longos anos de estudos, o estímulo fora das igrejas, onde ficou preso por um longo período por
para procurar tudo o que podia abrir-nos causa das diversas situações políticas.

Angelo Costalonga
à riqueza dessa cultura e representar um Os cristãos deverão ser capazes de bri-
motivo de aproximação com os chineses. lhar mais do que as luzes da cidade, e de
Surgiu como conseqüência o que pode- expressar um modelo de vida que saiba
mos definir de “pastoral da amizade”, que preencher aquele vazio de valores que
representou a tentativa de valorizar cada uma sociedade centrada na economia
pessoa com a qual tínhamos contato em deixa como herança.
nossos compromissos de estudo e trabalho. Para nós, missionários, um dos maiores
A população é muito grande (oito vezes a desafios é o de crer na força do testemunho
do Brasil), mas a aproximação em nível que a comunidade pode oferecer. A China
pessoal é capaz de colocar em evidência de hoje exige dos estrangeiros uma pre-
a unicidade e a dignidade de cada pessoa sença especializada em setores técnicos
e de proporcionar a experiência do amor e científicos. Esse tipo de presença e de
pessoal de Deus. condicionamento leva consigo a tentação
de fazer-nos acreditar que nosso valor está
Unidade na Igreja no que temos e não no que somos. Isso
A primeira coisa que causa surpresa pode nos levar a colocar nossa confiança
chegando à China é a vitalidade do povo, em nossas capacidades humanas, mais
alimentada nestes anos por um grande que na força da Cruz. Existe também o
otimismo rumo ao futuro. O grande de- perigo de nos dividir, mergulhando cada
senvolvimento econômico do país nestes um em seu campo específico, esquecendo
últimos 15 anos foi superior a 10% por ano. o valor da vida comunitária.
Isso contribuiu para melhorar a qualidade de Estamos mais do que convencidos que
vida dos chineses, mas ao mesmo tempo, não são as obras que tocarão o coração dos
criou em nível social aquela diferença entre chineses, mas o nosso sim a Deus que todo
ricos e pobres que não existia na sociedade comunista. dia renovamos no anonimato, no silêncio, na aridez, no encontro
Também a Igreja foi sacudida por estas mudanças socioeco- com nossos limites. Sentimos que a Igreja universal nos sustenta
nômicas e foi obrigada a confrontar-se com uma nova realidade. com sua oração e com seus dons. Percebemos que o nosso “ser
Poderíamos dizer que uma parte dela - a Associação Patriótica presbíteros” não pode alimentar-se do seu aspecto exterior de
- deixou-se conduzir por estas mudanças e aceitou compromissos serviço à comunidade cristã, mas é, sem dúvida, enriquecido
com o poder e o dinheiro, limitando ou até decretando a morte pela redescoberta de sua essência mais verdadeira que é “dar a
de sua dimensão profética. Por outro lado, encontramos cristãos vida”, ou seja, colocar-nos à disposição dos chineses com uma
“clandestinos” que permaneceram fiéis à sua fé, muitas vezes existência carregada do sim expresso a Deus. 
vivida de maneira muito tradicionalista (pelo fato de vivê-la às
escondidas, com pouco contato com o mundo exterior), não qui- Este artigo é a síntese de uma entrevista com um xaveriano que vive e trabalha na China há
seram diluí-la em fáceis negociações, e por isso estão pagando vários anos. Por motivos de segurança, não podemos divulgar nomes de pessoas e lugares.

- Jan/Fev 2007 19
Solidariedade e
Destaque do mês

Campanha da Frater
de Ivo Poletto
Para os povos da região, a CF é um reforço às suas
iniciativas em favor de “outra Amazônia”.

A
colhendo o grito vindo da região,
a Campanha da Fraternidade de
2007, organizada pela CNBB,
assumiu o tema “Fraternidade
e Amazônia”, com o seguinte
lema: “Vida e missão nesse
chão”. Com isso, estamos convidados a
renovar a memória e a participação na
Páscoa de Jesus na “páscoa” da Amazônia.
Por quê? Como? Para quê?
De fato, a Amazônia e seus povos es-
tão vivendo tempos desafiadores. Por um
lado, os que sempre a consideraram uma
região distante, com florestas misteriosas
e com povos vivendo longe da civilização
e do progresso, estão festejando sua “in-
tegração ao desenvolvimento”. No outro
extremo, os que desejam que ela seja um
“pulmão da humanidade”, propõem a sua
preservação, já que a derrubada dessa
floresta certamente agravará o aqueci-
mento da Terra, provocando desastres
ambientais e sociais.
De fato, as iniciativas de progresso
econômico que avançam na Amazônia
repetem o que foi feito nas regiões consi-
deradas “desenvolvidas”: a derrubada da
floresta, para extrair e vender madeira de
lei e para implantar empresas de pecuária
ou de monoculturas agrícolas, além de
transformar em mercadorias a água, os
minérios, a biodiversidade – “bens” ainda
abundantes na região. É isso que carac-
teriza a economia de mercado assentada
na livre iniciativa capitalista, cada vez mais
integrada à globalização financeira de
cunho neoliberal. Muitos, porém, denun-
ciam isso como algo insustentável, uma
ameaça real à vida no planeta.
É nesse contexto de ganância nacional
e internacional que se pretende usar a
Amazônia para gerar lucros incalculáveis
e de propostas de preservação ambiental
defensivas, que a Campanha da Frater-
nidade nos convoca para a prática da

20 Jan/Fev 2007 -
e Amazônia
Outros biomas
Existem no Brasil, além da Amazônia,
outros cinco biomas: Cerrado, Pantanal,
Caatinga (semi-árido), Mata Atlântica e
Pampa. Nosso país é, então, a unidade
de seis biomas, seis diferentes berços
de vida. De fato, em cada um deles, os
elementos necessários para a vida se
articulam, se relacionam e dependem

rnidade 2007
uns dos outros de forma diferente. Com
isso, as formas de vida e as culturas são
diferentes. Quem pensa o desenvolvimento
como um caminho comprometido com a
qualidade de vida de todas as pessoas e
de todos os demais seres vivos, precisa
desenvolver iniciativas que garantam a
convivência com as condições de cada
um destes biomas.
solidariedade fraterna, de irmãos e irmãs. Concluindo, a solidariedade propos-
Cecília de Paiva

Mas, ser solidários com quem? E a favor ta pela CF pode e deve traduzir-se em
de quê? ações que promovam caminhos de de-
senvolvimento que convivam com as
Objetivo da CF características, potencialidades e limites
O objetivo geral da CF nos ajuda a da Amazônia, apoiando as práticas e as
perceber a opção assumida pela CNBB, propostas dos seus povos; e em ações
e que deveria ser assumida por todos os que “amazonizem” os demais biomas,
seguidores e seguidoras de Jesus: conhe- enfrentando os desequilíbrios causados
cer a realidade em que vivem os povos da pelo progresso predador, recompondo,
Amazônia, sua cultura, seus valores e as no que seja possível, as energias vitais
Equipe da CF do Regional Oeste I em oração.
agressões que sofrem por causa do atual que existiam em cada bioma, diminuindo
modelo econômico e cultural, e lançar um novos motivos de alegria. a dependência da vida em relação à bio-
chamado à conversão, à solidariedade, a Para os povos amazônicos, a CF é diversidade amazônica.
um novo estilo de vida e a um projeto de um reforço às suas iniciativas em favor de Como luz, fonte de critério para julga-
desenvolvimento à luz dos valores huma- “outra Amazônia”, em que todas as formas mento e decisões e como motivação para
nos e evangélicos, seguindo a prática de de vida, e de modo especial a humana, esta prática da solidariedade, a CF nos
Jesus no cuidado com a vida humana, colaboram umas com as outras. Contam propõe, mais uma vez, uma pergunta: e
especialmente a dos mais pobres, e com com a solidariedade de todo o Brasil para Deus viu que a Amazônia está bem? Re-
toda a natureza. multiplicar esse tipo de “economia” - que tomando a mensagem presente nos dois
deve ser sempre “cuidado com a casa poemas da Criação, guardados no Gênesis,
Até hoje a Amazônia de todos os seres vivos” -, em que estão
presentes valores, culturas, espiritualida-
somos convidados a perceber o sentido da
obra amorosa de Deus, trazendo-a para
foi pensada de forma des e religiões.
Para os que não vivem na Amazônia,
nossos dias como base para examinar se
nós, feitos à sua imagem e semelhança...
colonialista. a solidariedade pode e deve andar em
duas direções: a) reconhecer, apoiar e
com a missão de cuidar do jardim da vida,
estamos assumindo nossa missão, fazendo
Até hoje a Amazônia sempre foi pen- reforçar as iniciativas e propostas dos com que a Amazônia e os demais biomas
sada de fora e para fora, isto é, de forma povos amazônicos, no enfrentamento deixem Deus – e nós com Ele – feliz, porque
colonialista. A CF nos convida a conhecer do que ameaça a vida e na construção tudo está muito bom. E se não está, que
quem são, o que desejam ser e o que da Nova Amazônia; b) acolher a Amazô- a profecia utópica presente no final do
propõem como caminho de desenvolvi- nia como uma profecia, respondendo ao livro do Apocalipse - o novo céu e nova
mento os povos da Amazônia. É a partir desafio que ela apresenta: como está o terra, a cidade santa, a nova Jerusalém
deles que se faz a crítica profética das bioma em que você vive? O que pode e - seja geradora de esperança de que a
agressões dos projetos colonialistas. Se deve ser feito em sua região para que o humanidade se reencontrará com o seu
prestarmos atenção, com o coração aber- Brasil e o mundo não dependam tanto da projeto, o seu Reino. O Deus-conosco
to, desejando superar a desinformação e Amazônia para continuar vivendo? continua amando apaixonadamente seus
os preconceitos, descobriremos que os De fato, não seria cínico propor e filhos e filhas, e quer reconstruir as me-
povos da região, com sua história de 12 defender a preservação da Amazônia lhores condições de vida para todos os
mil anos, são portadores de propostas de e continuar pensando que as demais seres em todos os biomas através das
convivência, também econômica, com o re­­­­­­gi­õ­e­s do país é que são “desenvolvi- obras realizadas pelas pessoas humanas,
bioma Amazônia. Eles querem a floresta das”? Afinal, se o caminho do progresso criadoras como Ele. 
em pé, os rios e lagos com águas limpas e passa pelo desmatamento, pela poluição
toda a rica biodiversidade preservada como dos rios, lagos e mar, pela modificação Ivo Poletto é filósofo, sociólogo e teólogo, assessor da Cáritas
condição para a qualidade de sua própria completa dos diversos biomas, seria Brasileira e da Semana Social Brasileira. Trabalhou 18 anos com
vida. E se, agindo assim, colaboram com justo exigir que os povos amazônicos a CPT, tempo em que atuou especialmente na Amazônia. Mem-
a vida de todo o planeta, experimentam não se “desenvolvam”? bro da comissão que elaborou o texto-base da CF 2007.

- Jan/Fev 2007 21
VII Fórum Social M
Atualidade

Um outro mundo e uma outra África s


de Alfredo J. Gonçalves

Fotos: Jaime C. Patias

O
Fórum Social Mundial de 2007
foi realizado entre os dias 20
e 25 de janeiro, na cidade de
Nairóbi, no Quênia. Depois da
América Latina e da Ásia, esta
foi a vez da África. A última
edição do FSM, mais do que qualquer
outra serviu para um olhar retrospectivo
e outro prospectivo. Comecemos olhan-
do um pouco para trás. Sabemos que
o FSM nasceu como espaço de oposi-
ção e alternativa ao Fórum Econômico
Mundial, hospedado em Davos, Suíça, à
sombra dos Alpes. Enquanto um focaliza
os problemas relacionados aos países
do hemisfério sul, o outro se concentra
nos países do norte; para o primeiro, o
enfoque é marcadamente social, para
o segundo, econômico e financeiro. Um
procura centrar sua atenção na qualidade
de vida das populações pobres, o outro
se preocupa predominantemente com o
crescimento e os lucros das empresas numa Palco de abertura do V FSM 2005, Porto Alegre, RS.
economia globalizada. Embora situados
em hemisférios distintos, um ao norte outro que tem reunido dezenas de milhares de do planeta. A realidade mais crua e os
ao sul do planeta, ambos reúnem pessoas pessoas, resulta o conceito amplificado mistérios mais profundos parecem dar-se
e instituições de todo mundo. de uma nova cidadania, plural e univer- as mãos. Ao mesmo tempo, desertos e
Ainda em termos retrospectivos, a sal caracterizada pelo slogan “um outro florestas coexistem com outros biomas,
realização do FSM, desde Porto Alegre, mundo é possível”. tão variados quanto imprevistos.
Brasil, até Caracas, Venezuela, passando É a África da subnutrição e da magia,
por Bombaim, Índia, tem representado um Um povo que quer viver das guerras e guerreiros, ao lado de alguns
imenso laboratório de alternativas viáveis. Em termos prospectivos, é sintomático vilões oportunistas, sejam eles políticos
Espaço para análise e aprofundamento o fato desta edição do FSM ter se reali- das mais variadas ideologias, religiosos
dos principais problemas que afligem a zado na África. A riqueza e a pobreza do dos mais diferentes matizes, ou cientistas
humanidade, para intercâmbio e confronto continente africano, uma convivendo ao sem escrúpulos. Lugar de lutas misturadas
de histórias e culturas diferentes, para cru- lado da outra, já se tornaram lendárias. com celebrações, de risos misturados
zamento de distintas experiências místicas. As páginas, imagens e palavras da mídia com lágrimas e, como conseqüência, de
Simultaneamente, o FSM proporciona nos acostumaram a esse duplo imagi- migrantes e de refugiados amontoados
momentos decisivos para forjar novas nário: de um lado, crianças, adultos e em campos cercados de arame farpado.
práticas políticas e sociais, no exercício velhos esqueléticos e raquíticos, com as Terreno fértil para as doenças infeccio-
concreto da democracia. Tempo e lugar vértebras desenhadas sob a pele negra, sas, como a AIDS, por exemplo, que ali
de encontros e reencontros; troca de de olhos tão grandes como a fome e o prolifera e dizima a população, em meio
saberes e expressões culturais, idiomas medo que moram neles; de outro, uma à precariedade das condições sociais e à
e credos, bandeiras e cores, moedas e natureza pujante, num clima tropical, onde indiferença do resto do mundo. Continente
valores; oficina viva onde as diferenças, o subsolo também pode surpreender por historicamente devastado pela cobiça
longe de dividirem os povos, provocam seus bens ocultos. Ali os contrastes entre estrangeira de impérios e colonizadores,
entre eles um enriquecimento mútuo. uns poucos ricos e uma massa de pobres onde a política do saque e da exploração
Desse gigantesco laboratório de idéias, é mais agudo do que em qualquer lugar secular fez com que a riqueza do solo

22 Jan/Fev 2007 -
Mundial
sabedoria e sonho mergulham as raízes
Carta de Princípios num terreno marcado, ao mesmo tempo,
pela colonização histórica e pelas lutas
O Comitê de entidades brasileiras de libertação.
que idealizou e organizou o primeiro
Fórum Social Mundial, realizado em Perguntas que incomodam
Porto Alegre de 25 a 30 de janeiro Diante do FSM em Nairóbi, algumas
de 2001, estabeleceu uma Carta de
Princípios para que se orientasse a perguntas se impõem. Convém começar

são possíveis
continuidade dessa iniciativa. Desta- questionando se seus participantes encon-
camos alguns itens desta Carta: traram-se abertos e permeáveis à riqueza
O FSM é um espaço aberto de histórico-cultural desse continente, ainda
encontro para o aprofundamento da desconhecido por grande parte do mundo.
reflexão, o debate democrático de
idéias, a formulação de propostas, Mantiveram eles seus esquemas fixos e
a troca livre de experiências e a imutáveis, ou se deixaram surpreender e
articulação para ações eficazes, de interpelar pelas novidades de um conti-
entidades e movimentos da sociedade nente revestido, a um só tempo, de magia
civil que se opõem ao neoliberalismo
e combate? Em curtas palavras, neste
e ao domínio do mundo pelo capital e
por qualquer forma de imperialismo, e Fórum houve espaço para a África e os
estão empenhadas na construção de africanos, continente e povo muitas vezes
uma sociedade planetária orientada a esquecidos pelo resto do planeta?
uma relação fecunda entre os seres Tratou-se, sem dúvida, de um momento
humanos e destes com a Terra.
O FSM de Porto Alegre foi um
decisivo para a trajetória do FSM. Se, em
evento localizado no tempo e no Davos, o Fórum Econômico teima em
espaço. A partir de agora, na certeza deixar o continente africano à margem de
Conferência sobre Utopia no V FSM 2005. proclamada em Porto Alegre de que seus projetos e metas de desenvolvimento,
“um outro mundo é possível”, ele se em Nairóbi, o Fórum Social fez da África
torna um processo permanente de
busca e construção de alternativas,
o centro inquestionável de seus debates.
que não se reduz aos eventos em que Se, ao longo de séculos de história, a
se apóie. As alternativas propostas no África esteve submetida a uma série de
FSM contrapõem-se a um processo de invasores e saqueadores, é hora de se
globalização comandado pelas grandes deixar penetrar e questionar por suas
corporações multinacionais e pelos
governos e instituições internacionais inquietações. Nenhum outro mundo será
a serviço de seus interesses, com a possível, se essa região do planeta con-
cumplicidade de governos nacionais. tinuar sendo esquecida.
Elas visam fazer prevalecer, como Vale aqui uma rápida passagem pelo
uma nova etapa da história do mundo, Evangelho. Em seus relatos, a pedagogia
uma globalização solidária que respeite
os direitos humanos universais, bem de Jesus é marcada por uma nota curio-
como os de todos(as) os(as) cidadãos sa: trazer para o centro aquele que, por
Participantes do V FSM 2005.
e cidadãs em todas as nações e o motivos de doença, abandono, exclusão
meio ambiente, apoiada em sistemas e social ou pobreza, se encontra à margem
instituições internacionais democráticos
da sociedade. Assim, estrangeiros, mulhe-
a serviço da justiça social, da igualdade
e da soberania dos povos. res, crianças, leprosos, pecadores, coxos,
O FSM será sempre um espaço publicanos, prostitutas etc., desfilam nas
aberto ao pluralismo e à diversidade páginas do Evangelho e na caravana de
de engajamentos e atuações das enti- Jesus não como assistidos passivos, mas
dades e movimentos que dele decidam
participar, bem como à diversidade de
como reais protagonistas.
gênero, etnias, culturas, gerações e ca- Aqui está o nó central da questão:
pacidades físicas, desde que respeitem no Fórum Social de Nairóbi, ou a África
esta Carta de Princípios. Não deverão se tornou a principal protagonista dos
participar do Fórum representações debates, ou tudo não passou de retórica.
partidárias nem organizações militares.
Poderão ser convidados a participar, Evidente que, para muitos movimentos
Marcha de Abertura do V FSM 2005. em caráter pessoal, governantes e sociais, entidades e ONG’s, isso exige
parlamentares que assumam os com- mudanças tanto nos conteúdos como nos
engendrasse a pobreza de sua gente. promissos desta Carta. métodos de ação. Talvez esse nó pudesse
África negra e mãe, pátria dos tambores O FSM, como espaço de articula- ser traduzido em uma última pergunta, ao
ção, procura fortalecer e criar novas
e atabaques, linguagem forjada no ventre articulações nacionais e internacionais mesmo tempo crucial e interpeladora: até
da terra e no coração da selva, que traduz entre entidades e movimentos da que ponto, em nossas práticas diárias, os
a força e a energia de um povo que não sociedade, que aumentem, tanto na mais pobres e excluídos estão realmente
se deixa vencer. África de ricas danças e esfera da vida pública como da vida presentes? E mais: até que ponto são
privada, a capacidade de resistência
de gestos solidários, onde corpo e alma eles, os pobres e os excluídos, os reais
social não violenta ao processo de
se entrelaçam numa coreografia vívida desumanização que o mundo está sujeitos dos programas e atividades que
e alegre, como a mostrar que ninguém vivendo e à violência usada pelo Es- levamos adiante? 
mata o sonho de quem tem os pés na tado, e reforcem as iniciativas huma-
terra e os olhos postos no horizonte. África nizadoras em curso pela ação desses Alfredo J. Gonçalves é sacerdote carlista, e assessor da Comissão
movimentos e entidades.
de sagas ancestrais, onde resistência, para o Serviço da Caridade, Justiça e Paz – CNBB.

- Jan/Fev 2007 23
No amor
solidário!
Infância
Missionária

de Roseane de Araújo Silva

M
ais um ano recomeça e, com ele, renovamos a
nossa esperança em dias melhores e também
em grandes feitos, sejam eles pessoais ou não.
Neste ano, a Campanha da Fraternidade traz ao “Deus tem um sonho (...) Sonho semente
nosso cotidiano o “chão amazônico”, região de
grandes dimensões, ocupando cerca de 59% do que nasce miúdo mas toma o mundo...”
território brasileiro, tanto como objeto de cobiça de diferentes Gogó e Pedro Casaldáliga
nações pelo seu potencial hídrico e extrativista, quanto como
foco das atenções dos ambientalistas do planeta. Paralela a esta

Lírio Girardi
situação, apresentamos alguns dados de uma recente pesquisa
sobre tráfico de mulheres, crianças e adolescentes para fins de
exploração sexual. No Brasil predomina a faixa etária de 12 a 18
anos, de maioria afro-descendente e sexo feminino, migrando
de uma região para outra ou até mesmo para fora do país. Na
Região Norte esta forçada migração acontece entre os próprios
estados, estendendo-se até aos grandes centros urbanos do
país; no exterior, aos países limítrofes tais como a Venezuela,
as duas Guianas, Suriname e Colômbia, assim como a Espanha
e Holanda na Europa.
A exploração normalmente está organizada através de redes,
mantendo-se através de agências de emprego como babás,
domésticas, mercado da moda, espaços de entretenimento,
indústria do turismo, sendo também comum o aliciamento através

Sugestão para
o grupo Crianças participam de celebração em Roraima.
Acolhida de casamentos (o que torna mais difícil a caracterização, devido
Motivação (objetivo): refletir em grupo a realidade das crianças ao envolvimento afetivo das vítimas). Na Amazônia a exploração
e adolescentes explorados em terras brasileiras, principalmente
sexual ocorre nos portos, em cárceres privados nas fazendas e
na região amazônica e o amor incondicional do Deus da Vida
para com todas as pessoas. garimpos, sem falar no absurdo leilão de virgens. Esta situação
Oração: Rezemos pelos missionários e missionárias da região torna-se um pesadelo alarmante para a defesa da vida destas
amazônica que convivem com a realidade da exploração de crianças e adolescentes, nos reportando ao choro de Raquel
crianças e adolescentes. Que o amor de Deus os fortaleça e pela morte dos inocentes (Mt 2, 18). Não é possível ficar apenas
encoraje-os a enfrentar estes desafios. olhando tudo isto!
Partilha dos compromissos semanais. Jesus o Bom Pastor veio para que todos nós tenhamos “vida
Leitura da Palavra de Deus: 1ª Carta de João 4, 7-11 Deus
em abundância” (Jo 10, 10b-11) e nos convida a defender a vida
é amor.
Compromissos missionários: O amor de Deus nos aproxima dos povos da Amazônia, principalmente as crianças e adoles-
de todas as pessoas criadas à imagem e semelhança dEle. A centes. Comprometer-se com Jesus é fazer um compromisso
leitura nos fala do amor concreto do Pai enviando seu Filho com as suas ovelhas. Isso só será possível na medida em que
Jesus ao nosso meio. Como amigos de Jesus precisamos procurarmos entender a realidade da Amazônia, buscando
estar atentos ao que afasta as crianças e adolescentes do seu compreendê-la, percebendo a diversidade de possibilidades
convívio, impedindo-os de tornarem-se seus amigos também. econômicas, culturais, sociais e políticas produzidas pelo cole-
Na maioria das vezes, a nossa atitude contribui para este
tivo de homens e mulheres, de todas as faixas etárias. Somos
distanciamento também. Vamos refletir juntos sobre o que
causa o afastamento de tantas crianças e adolescentes do chamados a integrar esta “muxira” (rede) de solidariedade e
amor de Deus? respeito aos povos da Amazônia, a partir do nosso chão, da
Momento de agradecimento ao Deus da Vida pelas crianças realidade das nossas crianças e adolescentes. Das crianças
e adolescentes que com sua vivacidade e alegria nos fazem do mundo – sempre amigas! 
perseverar na construção do Reino do Pai.
Canto e despedida Roseane de Araújo Silva é missionária leiga e pedagoga da Rede Pública do Paraná.

24 Jan/Fev 2007 -
Juventude e projeto

conexão jovem
popular para o Brasil
de Marcelo Naves
Como cristãos, os jovens devem ter
a oportunidade de se interessar por

Q
ual o Brasil que nós queremos? Uma questão que projetos populares, ou seja, aqueles que
perpassa desde a juventude cristã, até os adultos
engajados em nossas pastorais. Como cristãs e busquem a transformação da sociedade,
cristãos, seguidores de Jesus de Nazaré e inspirados
no Evangelho, precisamos ter claro qual é o projeto
promovendo a dignidade das pessoas e
do Reino e do lado de quem estamos. A CNBB,
através da 4ª Semana Social Brasileira (17 a 19 de novembro de
assegurando os seus direitos.
2006), convocou toda a nossa Igreja e toda a

Jaime C. Patias
sociedade a lutar por um projeto popular para
o Brasil que, em 2007, continua com força
através da Assembléia Popular.
Jesus sempre optou, preferencialmente,
pelos marginalizados e explorados da socie-
dade. Nosso projeto é aquele que quer levar
vida, e vida plena a todos e todas. O Brasil
está inserido em um contexto mundial que tem
o neoliberalismo como projeto hegemônico.
O neoliberalismo condena à miséria social,
econômica e cultural milhares de pessoas na
América Latina, quase a totalidade da África e
no Brasil entrega o poder às empresas multi-
nacionais e aos bancos, e mantém cerca de
54 milhões de pessoas vivendo na pobreza.
Ora, são justamente essas as duas grandes
facetas de um projeto de nação: qual o lugar
que o povo ocupa na ordem social e quem
detém o poder.

Projeto para a juventude Jovem discursando no V FSM 2005, Porto Alegre, RS.
Nosso projeto popular deve promover a dignidade das pes- violência da ausência de direitos, sem trabalho ou educação. Sem
soas, assegurando os direitos sociais, políticos e civis a todos contar o número crescente de jovens que ingressam no tráfico
e todas e consolidando o povo no poder. Para chegar a isso, a de drogas ou superlotam a FEBEM e o sistema penitenciário.
própria CNBB propõe no documento 82, sete grandes opções Porém, não é possível pensar em uma melhoria substancial da
para um projeto de nação: 1) democratizar o Estado e ampliar população sem a transformação da sociedade, tendo a dignidade
a participação popular; 2) dever o modelo econômico e o pro- e a vida plena do povo no centro do projeto nacional, e não o lucro
cesso de mercantilização da vida; 3) ampliar as oportunidades dos bancos e grandes empresas. “É impossível a realização dos
de trabalho; 4) fortalecer exigências éticas em defesa da vida; direitos civis e políticos sem o usufruto dos direitos econômicos,
5) reforçar a soberania da nação; 6) democratizar o acesso à sociais e culturais” (Resolução nº 32/130 da ONU, 1977).
terra e ao solo urbano; 7) proteger o meio ambiente e a Ama- Portanto, a realização de um projeto popular exige a trans-
zônia. Assumir essas opções é estar ao lado dos movimentos formação da atual sociedade. De nós, cristãs e cristãos, e de
populares, das pastorais sociais e das entidades de luta pelos todos os jovens, exige a ousadia e a radicalidade em favor da
direitos humanos, trabalhando de forma comum e articulada, vida plena, acreditando e potencializando o povo no poder. Com
mobilizando e formando as massas populares. É urgente retomar o Coração Civil, temos que cantar com Milton Nascimento: “Os
a conscientização das bases. meninos e o povo no poder, eu quero ver”. 
À juventude só deve interessar um projeto popular. A maioria
dos jovens é marginalizada em nossa sociedade atual. Só na Marcelo Naves é professor e coordenador da Pastoral da Juventude da Arquidiocese de São Paulo.
cidade de São Paulo cerca de um milhão de jovens sofrem com a Texto publicado no jornal O São Paulo, em 17 de outubro de 2006.

- Jan/Fev 2007 25
Missão Compar
Entrevista

na Amazônia de Jaime Carlos Patias

Fotos: Arquivo CRB


A
ssumindo a dimensão proféti-
ca-missionária em seu serviço
de animar a Vida Religiosa e
Consagrada no país, a Confe-
rência dos Religiosos do Brasil
- CRB, promove e coordena
projetos solidários em áreas de Missão.
Em sua XX Assembléia Geral Ordinária,
realizada em julho de 2004, quando a
Instituição celebrava seus 50 anos de
existência, a CRB, escolheu como uma
de suas prioridades: “resgatar de forma
criativa a inserção em meios populares,
bem como a missionariedade em regiões
carentes, mundo urbano, Ad Gentes e
em realidades emergentes”. A mesma
Assembléia encorajou a construção de
alianças intercongregacionais para atuar na
Missão, em projetos comuns envolvendo
também outras parcerias.
Entrevistamos membros da presidên-
Casa do projeto na Comunidade da Ocupação "Jesus me deu", Manaus, AM.
cia da CRB e da Comunidade “Jesus me
deu”, na arquidiocese de Manaus, que ligiosos e Religiosas que nela trabalham. do Plano, foi um grande mutirão partici-
nos contaram sobre o Projeto de Missão Esta semente germinou e seu fruto se pativo, expressão da co-responsabilidade
Compartilhada na Amazônia, uma das chama Plano de Evangelização Solidária missionária dos religiosos e religiosas no
iniciativas que conta com a participação na Amazônia. A CRB, em aliança com a Brasil, envolvendo na reflexão e discerni-
de Congregações e Institutos de Vida Comissão Episcopal para Amazônia e em mento a CRB Nacional com as Diretorias
Religiosa e Consagrada em colaboração diálogo com as Igrejas locais, visando Regionais e a Vida Religiosa presente na
com a Igreja local. unir forças e somar recursos em vista de região através de uma sondagem e diálogo
uma ação evangelizadora transformadora com os bispos das Igrejas particulares e
Como surgiu o Projeto Missão Com- outros organismos eclesiais. As respostas
partilhada na Amazônia e como está "A experiência mostra que é possível dos Institutos, Congregações e Províncias
organizado? realizar uma missão compartilhada e foram generosas. Algumas liberando seus
O sonho de um grande mutirão solidário membros para a Missão Compartilhada,
no espírito da intercongregacionalidade, que isso pode ajudar na renovação da outras participando com ajuda financeira
gestado e coordenado pela CRB Nacional Vida Religiosa Consagrada". para a manutenção das comunidades e
em diálogo com as Regionais da Grande outras ainda, manifestando seu apoio,
Amazônia, remonta suas raízes em 2002, nas áreas de maior carência, em carta, sobretudo, com suas orações, como é o
na Assembléia Geral da CRB Regional, convocou os Institutos Religiosos e So- caso da Vida Religiosa Contemplativa.
Porto Velho, e foi reconfirmado em outubro ciedades de Vida Apostólica a dividirem
do mesmo ano em “Carta Aberta da Pastoral o seu ser missionário a “partir de sua Quais são as comunidades mis-
dos Ribeirinhos Regional Noroeste-CNBB”, pobreza...” De lá para cá, cada passo no sionárias intercongregacionais, onde
escrita por ocasião do 1° Encontro de Re- processo de elaboração e implementação atuam e como se sustentam?

26 Jan/Fev 2007 -
rtilhada
Projeto promove a
comunhão e fortalece a
consciência missionária
das religiosas e
religiosos no Brasil.

Atualmente, na Amazônia, contamos Missões Populares e do CIMI (Conselho Quais são as maiores dificuldades e
com quatro comunidades, sendo três na Indigenista Missionário). desafios da Missão Compartilhada em
diocese de Humaitá: Comunidade Mis- equipe na realidade amazônica?
sionária de Humaitá, constituída no mês Qual a contribuição que um estilo de Em vez de dificuldades, preferimos
de junho de 2005, integrada pelas Irmãs Missão Compartilhada, itinerante, e inter- falar de dimensões e situações diferentes.
Raquel Oliveira Leal, das Franciscanas congregacional pode fazer para tornar a Há momentos que a formação pessoal e
Missionárias Marianas e Antônia Maria Igreja no Brasil mais missionária? institucional parece ser uma dificuldade,
de Jesus, das Salvatorinas; Comunida- Cremos que podemos servir de alerta outras ocasiões é a falta de clareza do
de Auxiliadora do Urupiara, no município para os que sentem o apelo da Missão, como projeto e conhecimento da realidade
de Humaitá: Irmãs Gema Panazzolo, de nós sentimos ao responder o chamado da local. Quanto aos desafios na realidade
São José de Chambery e Claudete Fu- CRB. Unidos podemos atender esta necessi- amazônica, sentimos a falta de clareza
nes, Franciscanas de Nossa Senhora de dade da Igreja no Brasil, tornando a Missão da Missão de conjunto, da Igreja local e
Fátima; Comunidade de Manicoré, no mais rica com o diferente. A experiência o medo de se confrontar com as injus-
município de Manicoré, onde trabalham mostra que é possível realizar uma Missão tiças sociais. Diríamos que é um novo
as Irmãs Idalina Barion, das Carmelitas Compartilhada e que isso pode ajudar no jeito de viver uma Missão comum, é um
de Vedruna; Divina Vieira, das Irmãs de processo de renovação e refundação da aprendizado, é ser discípula e discípulo
Santa Dorotéa e Maria Satiko Kanashiro, Vida Religiosa Consagrada. a cada dia.
das Franciscanas da Divina Providência;
Comunidade da Ocupação “Jesus me deu”, Em se tratando de evangelização,
na arquidiocese de Manaus: com Irmãs com a Campanha da Fraternidade 2007
Josefina Gonçalves Ribeiro, Congregação sobre Amazônia - vida e missão neste
Irmãs Vicentinas; Raimunda Maria da C. chão, qual é, de fato, a ajuda que a
dos Santos, Missionárias Franciscanas Igreja naquela região precisa?
de Santo Antônio; Regina Itália Rocco, do Depois de quase um ano de inserção na
Apostolado Católico – Palotinas, além da realidade das periferias de Manaus, chão
integração de Ir. Claúdia Costa de Oliveira, propício e carente de Missão, sentimos
Religiosa Serva do Espírito Santo na equipe a necessidade de que nesse tempo forte
itinerante interinstitucional em Manaus. da CF- 2007, a Igreja se envolva com as
Para a manutenção destes Projetos políticas públicas da região, para combater
Missionários, a CRB Nacional abriu e Bispo dom Luiz benze a casa. as desigualdades sociais. Para isso, é
mantém um fundo de solidariedade com preciso despertar, sensibilizar e organizar
15% das contribuições dos associados e projetos alternativos que respeitem a cultura
conta com a partilha solidária de algumas deste povo e que os ajudem a viver com
Congregações e Províncias. dignidade o seu protagonismo próprio,
com seus dons, valores e culturas.
Como está organizado o trabalho
no dia-a-dia, quais são as atividades Qual a atitude e preparação que
que se realizam entre os ribeirinhos, deve ter a pessoa que se dispõe a viver
indígenas ou moradores da periferia a Missão da Amazônia, num projeto de
de Manaus? Ir. Regina, Ir. Graziete, e Ir. Raimunda. Missão Compartilhada?
Somos hoje integrantes do Projeto Em primeiro lugar, a pessoa deve estar
Missão Compartilhada na Grande Ma- aberta para acolher o diferente, buscar
naus, periferias e ocupações da zona informar-se sobre a realidade do povo
norte, somando forças na área missionária amazônico, se possível fazer um curso
tarumã. Nosso dia é preenchido pelas preparatório, saber ouvir e entender o
visitas às famílias; escuta dos seus cla- outro, no intuito de não impor outra cultura,
mores em nossa casa; acompanhamento mas sim acolher a riqueza própria do povo
das celebrações pastorais com formação amazônico. Estar disponível para viver
sistemática e presença nos grupos diver- numa comunidade de carisma, costumes
sos; nas lutas em favor da vida, tais como e valores diferentes. 
Associação de Moradores e outros. Na
arquidiocese, participamos das Pasto- Jaime Carlos Patias é missionário, mestre em Comunicação e
rais Sociais: Carcerária, Indigenista, das Frei Paulo Xavier, Ir. Maria de Lourdes e Ir. Josefina. diretor da revista Missões.

- Jan/Fev 2007 27
Consciência p
amazônia
Fotos: Luiz Ventura

Encontro na Escola de Fé e Política, Boa Vista, RR.

Em Manaus e Roraima, organizam a partir das beiradas dos rios até os aglomerados
de palafitas e favelas das cidades da Amazônia. É necessário

exemplos da importância das resistir às práticas históricas colonizadoras, resgatando e tecendo


novas relações que superem a mentalidade da conquista, da

Escolas de Fé e Política para o depredação da natureza, do trabalho escravo, da violência e do


conflito no campo e na cidade.

exercício da cidadania. A Igreja e a conscientização


A Igreja na Amazônia vem fazendo um processo lento,
de Ricardo Castro e Luiz Ventura doloroso e decidido de se tornar coerente com as exigências
evangélicas dessa realidade, principalmente de colocar-se ao

A
lado dos pobres, daqueles que não têm voz nem vez, dos es-
dinâmica dos movimentos sociais no contexto espe- quecidos e humilhados. Esses pobres têm rosto e nome. São
cífico da Amazônia brasileira, deixa de ser somente indígenas e ribeirinhos empurrados de suas terras tradicionais
sobre questões agrárias e ambientais, para se tornar para as periferias das grandes cidades, em nome de um de-
educação de cidadania e democracia. Existe uma busca senvolvimento tecnológico que não valoriza as pessoas. São
de formação mais participativa, para que as ações mulheres e crianças que em condições precárias de vida, morrem
sociais sejam melhor projetadas e efetivadas. de fome e não têm os direitos respeitados, porque a política na
As lutas dos povos da Amazônia, tanto da cidade como do Amazônia ainda é sustentada pelas práticas do coronelismo. São
interior, vêm da sua capacidade de resistência contra os gran- jovens que perdem sua identidade cultural rica em diversidade e
des projetos de desenvolvimento que não levam em conta os valores humanos, para o neoliberalismo capitalista que invade
interesses da região, nem as práticas culturais destes povos e nossos sistemas educacionais e religiosos.
sua convivência com a natureza. É uma história de ocupação e A realidade social e política de Roraima traz consigo vários
exploração que destrói a natureza e o povo amazônico. problemas, há décadas. O poder político se mantém nas mãos de
Cabe aos movimentos sociais e à sociedade civil organizada, umas poucas famílias, vinculadas aos escândalos de corrupção
resistir através do reconhecimento dos muitos rostos que habitam e ocupação ilegal de terras. Economicamente, o aparelho estatal
a região. Diversidade de grupos, etnias, comunidades que se assume a maior parte dos empregos, garantindo currais eleito-

28 Jan/Fev 2007 -
política
população de mais de 70 mil pessoas. Estas áreas em Manaus
são consideradas as mais violentas da cidade, surgidas através
de ocupações de terra, por muitas pessoas oriundas do interior e
de outros estados do Norte e Nordeste. As condições da saúde
pública, das escolas, dos postos médicos, da segurança e do
saneamento básico ainda são precárias. Sendo assim, a partir
destes inúmeros problemas sociais é que, entre tantas ações,
um grupo de mais de 50 pessoas, se propôs a enfrentar esta
situação, através de cursos de qualificação sociopolítica para
melhor formar uma consciência cristã capaz de participar da
construção de uma sociedade mais justa.

rais, sem uma política econômica que o apóie além do incentivo Roraima
fiscal para os grandes produtores agrícolas vindos de outras No Plano Diocesano de Evangelização de Roraima, alicer-
áreas do país com a promessa da monocultura e da exportação. çado sobre os eixos de Serviço-Diálogo-Anúncio-Testemunho,
Perpassa essa realidade a discriminação e a violência vividas nasceu a Escola de Fé e Política. A diocese assumiu a priori-
pelos povos indígenas e a migração enganada de milhares de dade de oferecer um espaço de formação para as lideranças
pessoas vindas do Nordeste, iludidas pelos políticos. cristãs e das comunidades de base. Em 1998, a Escola de Fé
O maior desafio para a Igreja na Amazônia neste momento, e Política foi assumida diretamente por alguns dos movimentos
é construir um modelo que fortaleça as resistências do povo e da Igreja, principalmente pelo Conselho Diocesano dos Leigos
que gere cidadania participativa, tanto na sociedade como no (CDL) e pelo Centro de Defesa dos Direitos Humanos (CDDH).
interior das comunidades de fé. Uma grande tarefa é evangeli- Formou-se uma equipe, elaborou-se uma proposta, mas o certo
zar a partir da vida do povo e de suas culturas negra, cabocla e é que a Escola não conseguia decolar. Foram anos de trabalho
indígena, valorizando os elementos essenciais dessas culturas de conscientização, de formulação, de tentativas. Nunca foi
no seu jeito de centralizar Deus, o ser humano e o mundo criado abandonada, mas até 2004 não saiu do papel. Foi somente ao
como base para o verdadeiro desenvolvimento. O grande desafio longo destes dois últimos anos que a Escola caminhou simulta-
da fé cristã é interagir com a política. Fé que luta pelos direitos neamente em quatro locais. Em Boa Vista, reunindo lideranças
humanos das comunidades tradicionais. Fé que se anima na de comunidades dos diversos setores, mas sempre com maior
luta por condições dignas de vida. Fé que cria laços, vínculos, participação das comunidades da periferia; em Caracarai, São
alianças com todos aqueles movimentos e Igrejas que, no diálogo Luiz de Anaua e Rorainópolis, as principais regiões do sul do
promovem a justiça que gera a paz. Estado, marcadas pelos sofrimentos das famílias camponesas,
a grilagem de terras e a corrupção política.
A proposta da Escola está estruturada em volta de cinco
grandes questões: Realidade Social e Política, Doutrina
Social da Igreja, Bíblia, Direitos Humanos e Ética. Todos os
participantes e o próprio bispo dom Roque, reconhecem a
importância e necessidade desta Escola. Mas também, e
precisamente por este reconhecimento, o momento atual
está sendo de avaliação e retomada.

Escolas de Fé e Política
Esta tem sido a caminhada de Fé e Política no con-
texto amazônico. Para muitos participantes da Escola, “o
maior desafio é aprender a unir a fé com a vida, a fé com
a política na busca do Reino proclamado por Jesus aos
pobres da Galiléia e sonhado no mito da “terra sem males”
pelos nossos antepassados indígenas. Esse desafio está
presente no objetivo central da formação: “integrar Fé e
Política na vida e na ação dos agentes de pastoral inseridos
Trabalho em grupo durante encontro da Escola de Fé e Politica, Boa Vista, RR. na Igreja e na sociedade, que leve a uma atuação na ação
evangelizadora para que seja um testemunho profético na
Manaus construção de uma sociedade justa e solidária, expressão do
Na IV Assembléia Arquidiocesana de Manaus – Projeto 1.2 Reino de Deus”. A realidade política iluminada pela fé nos livra
– “Capacitação de agentes de pastoral e de novos leigos em da indiferença, da alienação e das espiritualidades intimistas e
processo de engajamento”, se estabeleceu como prioridade a personalistas de nosso tempo. Aprendemos a importância de
formação, de modo sistemático e permanente, das comunidades participar de modo consciente e a partir da fé dos acontecimen-
cristãs e de suas lideranças. A preparação destes agentes deveria tos políticos da comunidade e da sociedade de maneira geral.
proporcionar uma formação humana, espiritual, pastoral, bíblico- Aprendemos que muitos aspectos da vida dependem diretamente
teológica e sociopolítica, em vista de uma atuação mais consciente de decisões políticas, não somente dos parlamentares, mas
e comprometida na ação evangelizadora da Igreja nas áreas de também dos cidadãos. 
periferia da cidade. O Setor 10 está na Zona Leste, periferia de
Manaus e engloba os bairros Val Paraíso I e II, Colônia Chico Ricardo Castro é missionário, doutor em Teologia, professor no Instituto de Teologia, Pastoral
Mendes e Nova Esperança, Areal do Mindú, Monte Sião I e II, e Ensino Superior da Amazônia (ITEPES) e assessor da Associação Serviço de Ação, Reflexão e
Cidade de Deus I, II e III, Braga Mendes, Bairro Novo, Pantanal Educação Social (SARES).
e parte da quarta etapa do Jorge Teixeira, o que representa uma Luiz Ventura é missionário leigo da Consolata e trabalha na periferia de Boa Vista, Roraima.

- Jan/Fev 2007 29
Violência contra a mulher Assassinato de indígenas em 2006
Em 2006, só no estado do Rio de Janeiro, 300 Um levantamento preliminar dos assassinatos
mulheres foram assassinadas. O número de agres- de indígenas ocorridos em 2006, realizado pelo
sões que não terminaram em morte, as chamadas Conselho Indigenista Missionário, aponta o número
lesões corporais, foi muito grande também: 24.176 de 40 vítimas. 20 dos homicídios ocorreram no Mato
casos foram registrados nas delegacias de polícia Grosso do Sul. Na Bahia houve quatro casos. Em
nos primeiros seis meses do ano. Na maioria dos Minas Gerais foram três mortes. Houve duas mortes
casos, tanto de morte quanto de lesão corporal, os em Rondônia, Alagoas e Mato Grosso. Os estados de
agressores tinham algum tipo de relacionamento amo- Roraima, Maranhão, Espírito Santo, Ceará, Acre, Pará
roso com as vítimas, eram maridos, companheiros, e Pernambuco contam, cada um, com um homicídio.
namorados, amantes ou parentes próximos, como Para o CIMI, a análise dos números, das motiva-
pai, tio, irmão. Este quadro se reproduz em outros ções, dos autores e das armas usadas demonstram
estados brasileiros. O ano de 2007 começa com um a urgência de que o poder público – com apoio de
caso que chamou a atenção da imprensa nacional: um toda a sociedade – organize de uma vez por todas
presidiário, em São Paulo, beneficiado com o indulto sua ação no Mato Grosso do Sul, a partir de estudos
de Natal, manteve a ex-mulher em cativeiro dentro sérios que permitam o conhecimento da realidade
da própria casa por mais de 48 horas. A própria filha daquela população e que levem a soluções duradou-
do casal, de cinco anos de idade, também presa na ras. O número de homicídios é ainda preliminar, pois
casa, conseguiu sair fugida pelos fundos, depois de será complementado com informações obtidas pelos
VOLTA AO BRASIL

mais de 30 horas de cativeiro. escritórios regionais da entidade, que trabalham no


Nos últimos dois meses do ano de 2006, dois levantamento dos dados que serão publicados no
outros casos se mantiveram na mídia por dias. Um Relatório de Violência contra Povos Indígenas no
camelô, com ciúmes doentios da mulher, invadiu Brasil em 2006, previsto para abril. O levantamento é
um ônibus, seqüestrou 55 passageiros e manteve a baseado em informações de comunidades indígenas
mulher sob a mira de um revólver e espancamento e no acompanhamento de jornais de todo o país. Do
durante todo o dia. O comandante da Polícia Militar total dos homicídios, dois são decorrência direta de
se declarou com pena do agressor porque ele “é um conflitos fundiários, segundo indígenas: um na Bahia,
pobre homem corroído pelo ciúme”, disse o coronel. entre o povo Tupinambá, e outro no Pará, entre os
Mas o estado físico da vítima mostrava o contrário. A Kayapó. O CIMI continua avaliando, como publicou
moça estava desfigurada, com hematomas por todo o no livro Direitos Humanos no Brasil em 2006, que “os
corpo, o maxilar quebrado, e teve que ser amparada dados demonstram que as tensões internas vividas
para chegar à ambulância que a levou ao hospital. pelas comunidades indígenas vêm sendo transferidas
Semanas depois este homem foi liberado pela Justiça, para o seu interior, causando desequilíbrios nas rela-
enquanto corre o processo. A juíza responsável pelo ções entre as pessoas, propiciando brigas, facilitando
caso considerou que ele não representava perigo para o consumo de álcool e drogas, levando ao surgimento
a vítima e determinou apenas que ele se mantivesse de assassinatos dentro da própria comunidade”.
longe da mulher ou voltaria para a prisão. Semanas
depois, um coronel da Polícia Militar matou a mulher Mais de oito milhões visitaram
a facadas, alegou que ela tinha “caído” sobre a faca Aparecida em 2006
e também foi liberado pela Justiça para responder em Segundo dados da Assessoria de Imprensa do
liberdade. A juíza alegou que o esclarecimento do crime Santuário Nacional de Aparecida, foi registrado durante
não depende da prisão do acusado e que o fato de ele o ano de 2006 um movimento de 8.109.610 visitantes
estar solto não prejudicaria as investigações. no Santuário, cuja construção se iniciou em 11 de
Para a historiadora Lana Lage, da Comissão de novembro de 1955, sendo que o maior número de
Segurança da Mulher, o fato dessas juízas serem visitantes em um só dia foi de 178.718 pessoas, no
mulheres não faz com que elas tenham um olhar dia 12 de novembro. A Basílica foi construída para
feminista para julgar casos de violência contra a custodiar a imagem de Nossa Senhora da Conceição
mulher. Lana diz: “Quando a gente fala que a vio- Aparecida, que foi encontrada em 1717 por três pes-
lência contra a mulher encontra apoio numa cultura cadores em um rio, nos arredores da cidade, situada a
brasileira marcada pelo patriarcalismo, não estamos 160 quilômetros de São Paulo. Em virtude dos relatos
dizendo, absolutamente, que só os homens sejam de milagres ocorridos e pelo aumento da devoção a
afetados por essa cultura. Essas representações Nossa Senhora, sob o título de Aparecida, em 1929
que a sociedade brasileira tem sobre as relações ela foi proclamada Rainha do Brasil e sua Padroeira
de gênero, representações calcadas nesse modelo Oficial, por determinação do papa Pio XI. No dia 12
patriarcal, são comuns a homens e mulheres. Se o de outubro é comemorada sua festa no Santuário de
movimento feminista e os trabalhos acadêmicos sobre Aparecida, sendo que em 2006, o movimento regis-
a mulher, numa perspectiva de gênero, têm procurado trado foi de 158.967 peregrinos. Porém, o recorde de
mostrar a origem social de muitas das diferenças e visitantes no dia da festa da Padroeira foi de 215 mil
das desigualdades entre homens e mulheres não peregrinos, em 12 de outubro de 1996. O Santuário
faria sentido dizer que só pelo fato de uma pessoa irá receber a visita de Bento XVI para a abertura da
ser mulher, em termos anatômicos, biológicos, auto- V Conferência Episcopal da América Latina e Caribe,
maticamente teria consciência feminista. Ela auto- que irá acontecer de 13 a 31 de maio deste ano. 
maticamente teria consciência crítica em relação à
sua condição feminina. E essa consciência também
se dá no campo da cultura”. Fontes: Adital, CIMI, ZENIT.
30 Jan/Fev 2007 -
Pontifícias Obras Missionárias (POM)

lançam livro para a Juventude Missionária


As situações concretas da Missão no mundo atual convidam-nos
a seguir Jesus nos diferentes desafios dos contextos e situações em
que vivemos imersos.
Após um processo de vivência missionária iniciado já há mais de
uma década na Pontifícia Obra da Infância Missionária, sentimos hoje
necessidade de continuidade e aprofundamento. Dos diferentes pon-
tos do país nos chegam apelos a darmos prosseguimento ao trabalho
realizado, agora que os primeiros membros desta Obra se tornaram
adolescentes e jovens e anseiam por seguir na mesma linha de formação
e ação que vinham trilhando.
Os grupos de Juventude Missionária já são uma realidade entre nós.
Depois de um tempo de “gestação”, após o 1º e 2º Encontro Americano
de Jovens Missionários (Enajomis 1 e 2) – em Quito (Equador, 2002)
e La Guaíra (Venezuela, 2004) –, dos quais participaram pequenas
delegações do Brasil, chegou também a hora de articularem-se os
esforços e as iniciativas missionárias de nossos jovens. Com este
objetivo, em maio de 2005, reuniu-se em Brasília, DF, um grupo para
pensar em como dar um passo adiante... e chegou-se à conclusão de
que se devia formalizar os grupos de Juventude Missionária ligados à
Obra da Propagação da Fé.
Não se quis criar um novo movimento, mas articular e apoiar os
jovens que desejavam atuar na Missão, bem como prestar um serviço
de coordenação aos jovens missionários já encaminhados, com acento
e destaque para a Missão Ad Gentes.
O jovem necessita de formação para cumprir eficazmente a Missão
que recebeu no batismo. Por isto oferecemos este subsídio, que não
deverá substituir as iniciativas e a criatividade dos grupos, mas irá ajudá-
los a manter e amadurecer a sua identidade de missionários que vivem
como verdadeiros apóstolos da vida, da solidariedade, do Evangelho,
pela Missão Ad Gentes.

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CentroMissionário
José Allamano
Casa de Retiros e Encontros
ATENDEMOS: Congregações e grupos religiosos, Atividades do mês de FEVEREIRO
movimentos, paróquias, empresas, associações e
outros.
Dia 4: Retiro Espiritual e leitura orante da
A casa possui: Palavra, das 9h00 às 17h00.
► 47 quartos com banheiro individual com uma
ou mais camas, podendo alojar 115 pessoas; De 22 a 25: Escola de Formação Missionária.
Objetivos da Missão. Promoção dos valores
► Capela com capacidade para do Reino. A primeira evangelização. Missão,
80 pessoas e 2 oratórios; Evangelização e Pastoral.

► Auditório com 120 lugares e sala de Dia 25: Encontro para jovens.
palestras para 50 pessoas; Das 15h00 às 18h00.
► 4 salas pequenas para grupos;

► Ampla área externa com quadra esportiva, Atividades do mês de MARÇO


espaço coberto com churrasqueira, cozinha e
muito mais. Dia 4: Retiro Espiritual e leitura orante da
Palavra, das 9h00 às 17h00.

Dia 17: Formação Missionária.


Das 14h30 às 18h00.

Dia 25: Encontro para jovens.


Das 15h00 às 18h00.

PARA MAIS INFORMAÇÕES:


Rua Itá, 381 - Pedra Branca - 02636-030 - São Paulo - SP
Tel.: (11) 6232-2383 - E-mail: secretariamissao@imconsolata.org.br

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