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Quando o assunto é a morte, o coração sofre muito com a ausência, que se configura como algo
que os olhos jamais voltarão a ver.
PERÍODO DE BUSCA
A dor psíquica, provocada pela perda, acarreta grandes alterações na vida daqueles que ficam e
que buscam, incessantemente, quem partiu, na tentativa de trazê-lo de volta para o real. O impacto da
perda de alguém a quem se ama desencadeia uma série de mudanças temporárias, tanto no
comportamento das pessoas quanto na forma de elas perceberem as situações do dia-a-dia.
Essas mudanças podem gerar certo estranhamento nos familiares e nas pessoas mais próximas.
A dor que acompanha a perda tem características peculiares e é descrita como uma “saudade que dói
dentro”. De fato, a perda traz uma sensação física de vazio, de falta, de um buraco no ser. Essa dor tem
momentos agudos, especialmente nos primeiros meses. Surge com uma intensidade tão forte que,
muitas vezes, provoca choro incontrolável. A dor é tão penosa que o enlutado – mesmo sabendo que a
morte é irreversível – começa a procurar a pessoa que morreu, ou até mesmo a aguardá-la, na
esperança de sua volta. Alguns relatos de enlutados revelam esta procura:
“Entro no quarto e tenho a impressão de que vou encontrá-lo lá”. (relato de uma mãe que perdeu seu
filho adolescente)
“Parece que ouço a voz dela, às vezes, dentro de casa”. (relato de um viúvo)
“Durmo abraçada às roupas dele... parece que ele fica mais perto assim”. (relato de uma viúva)
Para quem acompanha o enlutado, estes comportamentos podem parecer estranhos, pois dão a
entender que a pessoa não compreendeu a morte, não assimilou o acontecimento. Contudo, isto não é
necessariamente verdade.
A DIFÍCIL ADAPTAÇÃO
a sensação de estar vivendo um sonho do qual acordará. A idéia da morte ainda é difícil de ser aceita,
mesmo que se tenha consciência dela. É como se a cabeça não pudesse se adaptar à perda,
rapidamente, e agisse como se a pessoa falecida estivesse ainda viva.
Neste período inicial do luto, os momentos de saudade são muito intensos e causam sofrimento
ao enlutado que, em busca de alívio, sai à procura da pessoa falecida, mesmo sabendo que não a
encontrará. Assim, ainda que parecendo “sem sentido”, o grande motivador dessa busca é o sentir-se
um pouco mais próximo da pessoa que morreu.
- procurá-lo pela casa, sentar-se na cadeira que ele ocupava, folhear seus livros, tocar seus
objetos.
Essas atitudes, muito comuns nos primeiros meses, revelam a procura pela pessoa amada.
Procura que também pode ocorrer através dos sonhos. Neles, a pessoa falecida geralmente aparece
viva, conversa, anda e age como antes. Os sonhos são mais uma forma que a mente encontra para
rever a pessoa perdida e, gradualmente, adaptar-se à perda. Contudo, “não importa se o sonho é
feliz, haverá sempre um triste despertar”. (Colin M. Parkes, 1998)
FUGINDO DO SOFRIMENTO
Assim como algumas pessoas fazem da procura pelo morto uma forma de não sucumbir à dor
da perda, outras utilizam recurso diferente, como o afastamento de tudo que lembra a pessoa
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falecida. Para estas pessoas é como se, afastando-se das lembranças, elas pudessem também se
afastar da situação de morte.
“Desde que meu marido se foi, não consigo entrar em minha casa e rever nossas coisas”.
“Eu não quero que falem sobre isso (a morte da esposa), porque quanto mais falarem, mais me
farão acreditar que ela morreu”.
Geralmente, esse comportamento, com o tempo, dá lugar à vivência da saudade. A pessoa vai
se permitindo, lentamente, entrar em contato com os fatos da perda e pode dar continuidade ao seu
processo de luto.
CUIDADOS IMPORTANTES
É preciso dar atenção especial àqueles que vivem um processo de luto. Sabemos que não é
possível evitar a dor do outro. Contudo, é importante acompanhar o movimento do enlutado em
sua tentativa de aplacar a dor, e saber avaliar o quanto esse movimento está contribuindo para
ele, aos poucos, religar-se às pessoas de seu convívio e retornar aos afazeres cotidianos.
Tanto os comportamentos de procura pela pessoa que se foi, quanto os de fuga, são formas
não intencionais, que o enlutado assume para lidar com sua dor. Contudo, é preciso lembrar
sempre de que estas atitudes são temporárias e funcionam como uma proteção inicial para quem
perdeu alguém e sofre com esta ausência. Se, passados vários meses, a pessoa continua “vendo”,
“ouvindo” e procurando o ente querido, e ainda não consegue ligar-se ao trabalho e às pessoas
que ficaram, ou adotou uma postura de distanciamento contínuo do fato, será importante buscar
uma ajuda médica e psicológica, para um atendimento especializado.
Ana Lúcia Naletto e Lélia de Cássia Faleiros Oliveira são psicólogas clínicas do Centro
Maiêutica de Psicologia Aplicada , especializadas no trabalho com enlutados, desenvolvem projetos
de apoio à família no Cemitério Primaveras, por meio de palestras e grupos.
www.centromaieutica.com.br