O Homem é um ser que se encontra numa encruzilhada entre o
mundo natural, pois é um ser biológico, e o mundo artificial, o mundo das construções ao qual é subjacente. Assim, o Homem está entre a natureza e a técnica, entre a magia e a ciência, entre o individual e o grupal/social. Etimologicamente, a palavra Antropologia advém das palavras latinas Anthropos (Homem) e Logos (Ciência), sendo portanto, a ciência que estuda o Homem, ou um tratado sobre o mesmo. A Antropologia constituiu-se como ciência autónoma em torno de três teorias: o evolucionismo Darwiniano (séc. XIX), o funcionalismo (1ª metade do séc. XX) e o estruturalismo (déc. de 60). A Antropologia “geral” tem como objectivo o estudo do Homem enquanto ser físico e cultural, nas suas semelhanças e diferenças. Dentro da Antropologia “geral”, existem “vários tipos de antropologias”; de maneira geral temos: A Antropologia Social, que pretende estudar o Homem enquanto ser social e cultural; A Antropologia Histórica, que se ocupa da evolução total do Homem; A Antropologia Física, que trata do Homem enquanto ser biológico e finalmente a Antropologia Cultural, a qual será mais aprofundada. A Antropologia Cultural estuda o Homem enquanto produtor de cultura, o que o distingue dos restantes animais. A sua especificidade reside no facto de estudar o Homem intemporal e anónimo, portanto, o Homem genérico. A partir de objectos culturais ou obras produzidas pelo Homem, isto é, catalogando estas chamadas realidades objectivas, o Antropólogo cultural chega aos comportamentos que estas mesmas objectivações implicam. Assim, o que distingue a Antropologia Cultural das outras “Antropologias” bem como das restantes ciências é o método de trabalho, que neste caso é o trabalho de campo, sempre em contacto directo com “aquilo” que se pretende estudar, uma vez que “a partir do objecto, chegas aos comportamentos”. O método consiste ainda na escolha do lugar de intervenção, como aliás é natural, e no levantamento de alguns factores, como geográficos ou morfológicos, vida e identificação dos habitantes da zona que se pretende estudar, bem como fazer uma representação da população activa para saber indícios de mentalidades e graus de evolução. Relativamente ás outras ciências, é de salientar que a Antropologia não é melhor ou pior, é simplesmente diferente, pois todas elas se complementam, uma vez que o Homem é um ser demasiado complexo que em si só consegue reunir três mundos: o psicológico, o cultural e o social. A Etnologia, chamada por muitos de Antropologia Cultural, tornou-se independente como ciência em 1830, contudo não é errado afirmar-se que possa ter nascido muito antes disso, por volta dos sécs. XV/XVI, na altura do movimento das descobertas. A Etnologia pode ser classificada como um ramo da Antropologia “geral” que estuda as expressões regionais da cultura do Homem, sendo que existem várias diferenças entre elas: se a Antropologia estuda o Homem no seu aspecto totalista e universal, a Etnologia estuda os diversos Homens nos variados grupos; se a Antropologia estuda o singular e pretende mostrar uma visão unitária do Homem, a Etnologia tem uma visão pluralista e diversificada. Resumindo, uma estuda o Homem, a outra estuda os homens. Etimologicamente, Etnologia é uma palavra que deriva dos termos latinos Ethnos (povo) e Logos (tratado), sendo portanto um tratado sobre o povo, aliás semelhante à etimologia de Antropologia. No início, era uma ciência destinada aos povos “primitivos”, hoje aplica-se também ás sociedades Ocidentais. Etnologia é portanto a ciência dos povos e dos seus costumes e tem como objectivo analisar as semelhanças e diferenças entre as sociedades e culturas humanas, bem como a evolução dos povos “primitivos a partir de material etnográfico, sendo que a Etnografia, que deriva das palavras latinas Ethnos (raça/povo) e Graphein (descrever), é a ciência que descreve os usos e costumes dos povos, tendo aparecido na Europa no séc. XIX. Tratando-se o Homem de um ser “hiper-mega complexo”, e uma vez que todas as abordagens parecem (e efectivamente são) insuficientes, podemos encarar a antropologia como mais uma, que em estreita articulação com as demais ciências sempre tentaram e continuarão a tentar explicar o que é o Homem enquanto, ser individual e tentam a Antropologia física e psicologia humana, ser cultural e temos a Antropologia cultural e enquanto ser social e ensaiam a Antropologia social, o Direito, a Economia, a História, entre outras. Assim, é o método que efectivamente “marca” e distingue a Antropologia Cultural, e é através desse método que talvez, algum dia, possamos compreender este ser tão simples e complexo, livre e condicionado que é o Homem.
INCESTO E ALIANÇAS EXOGÂMICAS
Existem tribos que permitem uma grande liberdade marital, outras
insistem na virgindade pré-nupcial, outras ainda acreditam nos casamentos entre primos e há as que os proíbem. Não há efectivamente, uma uniformidade de atitudes relativamente ao acasalamento, mas existem aspectos de carácter universal. Em todas as sociedades, existem preferências relativamente à escolha de parceiro, baseadas nomeadamente na cultura e há ainda as chamadas “relações proibidas” e aqui estamos a dar o verdadeiro sentido à palavra, o incesto. As proibições ao incesto existiram desde sempre, e nem os antropólogos culturais conseguem explicar em pormenor quando surgiram pela primeira vez, o que se sabe é que as razões são de carácter cultural e não biológico. Já tem acontecido que pessoas que desconheciam o seu parentesco se sentissem atraídas, nomeadamente a história de “Os Maias”, e se efectivamente chegassem a praticar o acto sexual e mais tarde viessem a saber do seu parentesco, ficavam cheios de horror e vergonha; assim, o horror do incesto não é biológico mas sim cultural uma vez que foram criadas uma série de regras culturais para impedirem este tipo de uniões, designadamente as uniões entre parentes ou afins na linha recta ou parentes no segundo grau da linha colateral. Uma das razões para a proibição universal do incesto é o horror instintivo, isto é, a repugnância natural em trocar material genético com alguém que o tenha idêntico ao meu. Outra das razões é a degeneração biológica, uma vez que há um grau muito elevado de probabilidades de nascença de “aberrações”. A terceira mas não menos importante razão, é o facto de casar fora ou morrer fora, isto é, existem maiores probabilidades de estabelecer alianças estratégicas e aumentar o património e morrer fora, que nos repugna e alerta para ter uma terra onde morrer, onde voltar à terra mãe, uma vez que o incesto leva à exclusão social e desta forma a pessoa tem de morrer fora, numa terra que não a sua. A última razão é a continuidade cultural e o papel da família; ao me reproduzir, estou a fazer uma “cópia” de mim próprio, e portanto devo comportar-me e dar bons exemplos, para que a vida e a sociedade sigam o seu rumo natural. De maneira geral, é de esperar que cada geração seja mais perfeita que a anterior e o incesto produz precisamente o efeito contrário, levando à involoção, realçando desta forma os aspectos negativos da espécie. Assim, ao proibir-se o incesto, incentivam-se as alianças exogâmicas, alianças estas que consistem em procurar parceiro fora do seio familiar, o que naturalmente levará à evolução; por outro lado existe a endogamía, que se resume à escolha de parceiro no círculo familiar, é portanto um sinónimo de incesto. A título de curiosidade existe ainda o sororato (casar- se com a irmã da mulher) e o levirato (casar-se com o irmão do marido depois da sua morte). Em jeito de conclusão, a combinação do tabu do incesto e a exogamía, serve essencialmente para estabelecer alianças e ampliar as relações pacíficas para além do grupo, promover a mistura genética e portanto a evolução, e manter os papéis familiares, protegendo-os contra conflitos social e potencialmente destrutores.
CULTURA
Para assegurar a sua sobrevivência o Homem sempre desenvolveu
acções sobre o meio, das quais resultou tudo o que nos rodeia: os campos cultivados, os automóveis, os medicamentos, etc. É a fraqueza biológica que obriga o ser humano a intervir no meio, a produzir cultura. Contudo não se manifesta apenas nas produções materiais: as formas de comportamento, os usos e costumes, os sistemas e valores… constituem a cultura. A cultura, que etimologicamente advém do particípio do verbo colere, que significa cultivo dos campos, é um fenómeno universal que se manifesta em todas as sociedades humanas, como forma de responder ás necessidades dos seres humanos. A fome, a sede, a comunicação… são necessidades básicas cuja realização assume diferentes caracterizações ao longo da história, e ainda hoje se manifestam de diferentes maneiras em diferentes lugares, não existindo desta forma, uma uniformidade na resposta a todas estas necessidades, podendo concluir assim, que não há uma cultura, mas várias culturas. A diversidade cultural manifesta-se em diferentes padrões culturais: o que comemos e quando comemos, o modo como nos cumprimentamos, entre uma infinidade de outros exemplos, constituem comportamentos padronizados, previstos numa determinada sociedade. Geralmente, o indivíduo não tem consciência da existência dos padrões de cultura, estando convicto de que o seu comportamento exprime tão-só os seus gostos e desejos pessoais, mas a verdade é que todos os seus comportamentos estão condicionados pela cultura em que está inserido. Desde que nasce, qualquer ser humano passa por um processo de aprendizagem consciente ou inconsciente e de interacção com os outros, começa portanto, o seu processo de Enculturação, que funciona também como processo unificador ao proporcionar experiências comuns, nomeadamente a interacção com os pais e avós. A cultura é transmitida pela aprendizagem e pela linguagem., existindo três tipos de aprendizagem: a aprendizagem individual situacional, que acontece sempre que nos é fornecido qualquer tipo de informação; a aprendizagem social situacional, que é efectuada enquanto grupo, quando há interacção de informações; e a aprendizagem cultural, que implica a utilização de símbolos e signos, tratando-se portanto, da aprendizagem académica. Existem também vários (três) tipos de cultura: Cultura nacional (cultura de uma país), cultura internacional (difusão directa e indirecta) e sub-culturas (quando num país cada região tem a sua própria cultura). As culturas não são rígidas nem fechadas, reflectem os processos de desenvolvimento da sociedade, as suas aquisições e mudanças. Por outro lado, cada cultura relaciona e reinterpreta o seu sistema, no contacto com as diferentes culturas. Assim, a Aculturação designa os processos complexos de contacto cultural, provocando um conjunto de mudanças culturais devido ao contacto continuo com outras culturas, assimilando desta forma, hábitos e valores culturais de outra sociedade que não a sua, sendo a emigração exemplo disso mesmo. A dinâmica tem os seus aspectos negativos: A Desculturação, que pode ser considerada como um atentado à identidade cultural dos povos, uma vez que subtrai e destrói o património cultural; e o Etnocentrismo que é a tendência a aplicar os próprios valores culturais para julgar o comportamento e as crenças criadas noutras culturas, podendo assim conduzir a atitudes racistas bem como á criação de preconceitos. Conclui-se assim, que o Etnocentrismo é o oposto da relatividade cultural. A cultura tudo abarca, mas infelizmente os povos estão a perder a sua cultura e começam já a adoptar uma cultura internacional, a princípio europeia, asiática, americana… mas esta também está a acabar e qualquer dia teremos uma cultura mundial, e seremos todos “americanos”.