Vous êtes sur la page 1sur 23

2ª Edição Eletrônica

BENEDITA SILVA DE AZEVEDO


Autora

Edição Eletrônica: L P Baçan


Novembro de 2009

Direitos exclusivos para língua portuguesa:


Copyright © 2009 da Autora

Distribuição exclusiva através de


BIBLIOTECA VIRTUAL DA AVLLB e SCRIBD

Autorizadas a reprodução e distribuição gratuita desde que sejam


preservadas as características originais da obra.
http://www.avllb.org

2
SUMÁRIO

A AUTORA 4
DEDICATÓRIA 5
APRESENTAÇÃO – L P Baçan 6
NOVO DESAFIO 7

3
BENEDITA SILVA DE AZEVEDO

Benedita Silva de Azevedo – Nasceu em Itapecuru-Mirim -Maranhão.


Morou na cidade de São Luís – MA, São Paulo – Capital, em Blumenau e
Itajaí – SC, na cidade do Rio de Janeiro e há 16 mora na Praia do Anil – Guia
de Pacobaíba – Magé-RJ. Recebeu o título de cidadã mageense, em 09 de
junho de 2003. Busca concretizar a instalação de um Centro Cultural em
Mauá, onde possa ministrar cursos profissionalizantes e culturais, bem como,
colocar a sua biblioteca particular, com 3.000 títulos, à disposição da
população, principalmente, das crianças e adolescentes.
Licenciada em Letras, com habilitação em Língua Portuguesa e
Literatura. Especializada em Educação e Pós-graduada em lingüística. Possui
um vasto currículo de Cursos de Atualização,
Seminários e Palestras, assistidos e ministrados, nos três Estados onde
residiu e trabalhou ao longo de 30 anos no magistério. Professora e escritora.
Pertence à Academia Mageense de Letras, cadeira 38, Patrono: Aluísio
Tancredo de Azevedo. www.acadmageenseletras.hpg.com.br. Ao Grêmio de
Haicai Ipê/SP, à Academia Virtual de Letras Luso-Brasileira (AVLLB),
Acadêmico fundador, cadeira 63, Patrono: Viriato Correia. www.avllb.org e
ao Portal CEN " Cá Estamos nós".
Livros publicados: Marista, 60 anos a serviço da comunidade
maranhense (1985); Voltando a viver, no Rio (2000); Trajetória (2001);
Participação em "Outonos" Antologia (2001); Shena e Hércules (infantil –
2002); Coordenadora do Projeto: Escritores do C.E. Mauá, com publicação
dos livros I e II (2002 e 2003); Organizadora da Antologia em Prosa e Verso I,
II e III (2003, 2004 e 2005) da Academia Mageense de Letras; O dia-a-dia de
uma professora (2004) e Nas Trilhas do Haicai – poesia (2004)
Livros eletrônicos: Fatalidades da Vida (2005)
Participação nas Antologias: A Gosto e Receitas de Família
E-mail:
bsazevedorj@globo.com

4
DEDICATÓRIA

Ao meu marido, filhos e netos pela


atenção, carinho e cuidados
a mim dispensados.

Aos amigos do magistério,


pelas experiências vividas
no tempo em trabalhamos juntos.

Á minha amiga Aparecida


Pelas experiências vividas
E à confiança em mim depositada

"O problema não é inventar.


É ser inventado, hora após hora
e nunca ficar pronta a nossa edição final"
(Carlos Drumonnd de Andrade)

Forjarei a minha essência até a morte.


(Benedita Azevedo)

Rio de Janeiro,
Novembro / 2009

5
APRESENTAÇÃO

Há, nas narrativas de Benedita, não apenas a intenção de contar uma


história, mas a de expor um drama, ou dramas, da atualidade. Só que ela o faz
de uma forma natural, verossímil e abrangente, sem exagerar nas pinceladas,
sem desconectar suas personagens do mundo real. Aliás, a grande personagem
de Benedita é o mundo real, de onde pinça situações aparentemente
corriqueiras, mas altamente significativas. Em "Novo Desafio", aborda o
problema da mulher que se divide entre o trabalho e a casa, mostrando a
tremenda carga emocional a que é submetida, as decisões e opções que tem
que tomar e a forma como a atividade profissional acaba envolvendo-a. O que
deveria ser prazeroso acaba se tornando um pesado fardo, forçando-a a anular-
se como mulher e esposa, provocando sofrimentos.
Só isso justificaria a narrativa, mas Benedita não perde contato com o
mundo real e expõe as mazelas de nosso sistema educacional, os problemas da
saúde pública, a ingerência política nas instituições e, de forma sutil, o que há
de melhor e pior na natureza humana. Tudo sem deixar de ser didática e
mostrar que "benvindo" é tão correto quanto bendito e benfazejo. É ler para
descobrir.

L P Baçan
Escritor, webeditor e webmaster

6
NOVO DESAFIO

Sim...sim...sim...sim....não...sim...sim... Aquele monótono repetir de


apuração de eleição com chapa única fez Lucília refletir no que seria daquela
escola após as eleições. Observou a Diretora que estava na função há cinco
anos. No semblante denunciava o descontentamento por ter de deixar o cargo.
Sabia que ela não se candidatara por não querer se indispor com sua adjunta
que a abandonara, praticamente sozinha, para resolver todos os problemas
administrativos e pedagógicos. Para candidatar-se precisaria arranjar outra
pessoa para compor sua chapa. Preferiu abrir mão da candidatura a romper
com sua companheira de função.
Sim...sim...sim...sim...sim...sim....não...Sim.
A monotonia continuaria ainda por algum tempo. Lucília observava a
colega de trabalho e pensou: "Como ficará a situação de Patrícia? Deve ser
bastante desagradável voltar para a sala de aula após tantos anos na direção e
com mais de sessenta anos. Os nossos alunos às vezes perdem os limites.
Alguns precisariam ter aulas de Ética e Moral. Fazem falta as aulas de Moral e
Civismo. Eles às vezes não sabem discernir o comportamento de estar em uma
sala de aulas e de estar num ambiente informal, onde podem falar à vontade o
que lhes vem à cabeça. Sem respeitar ninguém. Seria bom que ela tirasse umas
férias. Ela me falou que tem direito a uma licença de seis meses. Acho que é
hora de aproveitá-la."
E a apuração continuava. O Colégio possuía mais de mil alunos, pais,
professores e funcionários. Nem todos foram votar, mesmo assim ainda teriam
muitos votos para apurar.
Do outro lado do salão estava Patrícia. Percebia também o olhar perdido
de Lucília em suas divagações: "Lucília precisa de alguns tempos para
trabalhar no Projeto Pedagógico. Ela gosta de fazer atividades culturais com
os alunos, com vinte e quatro tempos de aulas, em nove turmas, ficava difícil
trabalhar as atividades extra classe. Bem que poderia ficar na coordenação,
agora que a coordenadora vai para a direção com o Professor de Matemática."
Lucília confabulou com a Professora que estava à sua frente:
– Estou achando Patrícia triste. Será que se arrependeu de não se ter
candidatado?

7
– Acho que não, ela tem uma neta que está com problemas de saúde.
Soube do resultado dos exames hoje e parece que não foi muito animador.
– Mesmo assim, acho que também está preocupada com a possibilidade
de voltar para a sala de aula.
– Pode até ser, mas por que ela não se candidatou? Acho que a direção
cansa mais que as aulas. E depois, mesmo nas férias, elas têm que vir à escola.
Sim...sim...sim...sim...sim...sim...sim...sim.. a professora que lia os votos
já estava cansada. Anunciou que faltavam poucos. O marido de Patrícia
chegou com a filha e as netas. Lucília sondou:
– Qual das duas está com problemas?
– É a mais magra, aquela que está atrás.
– Ela me parece triste. Você sabe qual é o problema?
– Ela falou qualquer coisa, mas eu não entendi direito. Depois você fala
com ela.
Terminou! Ganhou quase por unanimidade. Só dois votos contra.

*
Todos cumprimentaram os eleitos.
Patrícia falou que a escola ficaria em boas mãos, pois conhecia o novo
diretor desde pequeno e era uma boa pessoa. Falou também da nova diretora
adjunta, disse que em sua última gestão fora "o anjinho que caíra do céu" para
ajudá-la na coordenação pedagógica.
O novo diretor agradeceu a confiança que todos depositaram nele e pediu
a colaboração de Adriano, marido de Patrícia, para lhe dar uma força quanto à
manutenção elétrica e hidráulica que eram um pouco complicadas.
Principalmente a hidráulica, que trazia água de um poço artesiano a 600
metros de distância.
Os aplausos estouraram, foram unânimes. Mais uma vez, abraços e
beijos. Lucília encontrou-se com Patrícia e inquiriu:
– Você me parece preocupada, não era bem isso que queria, não é
verdade?
– Você, como sempre, é muito observadora. Depois conversaremos. Mas
eu a estava observando e percebi que estava longe, preocupada. Está
acontecendo alguma coisa?
– Estava pensando em você. De como poderá sentir falta da direção
quando voltar para a sala de aula.
– Estou pensando em me aposentar por idade. A turma lá de casa está
precisando muito de mim. Adriano pediu-me para ficar pelo menos durante

8
seis meses. Tenho férias vencidas. Nos cinco anos que trabalhei na direção
nunca as tirei.
– Mas, o que está acontecendo com a sua neta? Soube que não está bem.
– Esse é outro ponto que me leva a querer permanecer em casa por algum
tempo. Soubemos hoje o resultado dos exames. Ela está com um tumor na
cabeça. O médico falou que a cirurgia custa R$ 15.000,00 (quinze mil reais).
– Patrícia, a Santa Casa é um hospital muito bem aparelhado. Se você
quiser, falo com minha filha. Ela tem muitos amigos médicos. Alguns
trabalham lá.
– Quero sim, vou falar com meu filho. Vá lá em casa amanhã e converse
com ele. Pode ser que assim se anime um pouco. Ele e a mulher andam
arrasados.
– Vou sim, pedirei à minha filha que fale com sua amiga neurologista
para saber se há possibilidades de marcar uma consulta.
– Ficaremos muito agradecidos se isso for possível.

*
Lucília foi para casa e pediu para que a filha se informasse com uma das
amigas médicas, se haveria possibilidades de marcar uma consulta. Ela
ofereceu ajuda e quis saber se a pessoa era carente. Ela disse que não, mas que
tinha dificuldades para desembolsar uma quantia tão alta, assim como nós.
Lucília telefonou para Patrícia e comentou o resultado da conversa que a
filha teve com a amiga.
– Patrícia, minha filha acabou de conversar com uma amiga que se
colocou à disposição, se precisar de uma tomografia.
– Ela já fez a tomografia. Ele solicitou uma ressonância magnética para
continuar a pesquisa.
– A ressonância é mais difícil.
– Ela já fez a ressonância, ele disse que ela está com um tumor na cabeça.
– Nesse caso, marque uma consulta com a neurologista, para que ela
avalie os exames e dê um parecer.
– Você poderá fazer isso pela gente? Lá em casa anda todo mundo de
cabeça quente.
– Pedirei para que Joseane fale com as amigas.

9
No outro dia, tentaram falar, pelo telefone, com a neurologista, mas não
conseguiram. Joseane foi até à clínica onde trabalhavam e expôs os fatos para
a amiga. Ela marcou uma consulta para avaliar o caso. Pediu que levassem
todos os exames feitos. Tentaria reunir a equipe de neurocirurgiões para
avaliar os exames e dar uma opinião.

*
Lucília tentou entrar em contato com Patrícia, pelo telefone, para lhe
falar sobre a consulta. Ligou várias vezes, mas não conseguiu. Ao chegar do
Colégio soube que ela ligara várias vezes. Pensou que tinha acontecido
alguma coisa com a neta e estava tentando telefonar quando a campainha
tocou. Joseane atendeu e gritou lá de baixo:
– Mamãe, é a dona Patrícia e o marido. Posso mandar subir?
– Pode! – respondeu, preocupada com o que poderia estar acontecendo.
Teria acontecido alguma coisa com a neta?
Lucília deslocou-se até o topo da escada para receber a amiga. Ao vê-la
adiantou-se preocupada.
– Como está a sua neta?
– Está bem! Não tem sentido as dores de cabeça após tomar os remédios.
Mas, estou aqui para fazer um convite a você. Fui convidada para trabalhar na
Coordenadoria e indiquei o seu nome para a Gerência de Ensino. Estou
tentando ligar a um bom tempo, mas não consegui. Então resolvi vir
pessoalmente.
– Para quando será isso?
– Solange vai ligar daqui a pouco para conversar com você. Mas parece
que é para começar logo.
– Logo agora, que deixei a GLP para ficar pelo menos mais dois dias em
casa!
O telefone tocou. Era Solange. Falou que estava formando sua equipe de
trabalho e gostaria de que ela fizesse parte dela.
– Você pode me dar um tempo para pensar?
– Não, gostaria de que você estivesse amanhã às dez horas para
assumirmos todas juntas.
– Há algum curso preparatório, para se tomar conhecimento do trabalho
que se vai fazer?
– Não, vamos pegar no tranco.
– Quantas horas de trabalho por dia?
– Oito. Você pode escolher das oito às dezessete horas ou das nove às
dezoito.

10
– Além do dinheiro das aulas, há algum adicional?
conversar com você. Mas parece que é para começar logo.
– Logo agora, que deixei a GLP para ficar pelo menos mais dois dias em
casa!
O telefone tocou. Era Solange. Falou que estava formando sua equipe de
trabalho e gostaria de que ela fizesse parte dela.
– Você pode me dar um tempo para pensar?
– Não, gostaria de que você estivesse amanhã às dez horas para
assumirmos todas juntas.
– Há algum curso preparatório, para se tomar conhecimento do trabalho
que se vai fazer?
– Não, vamos pegar no tranco.
– Quantas horas de trabalho por dia?
– Oito. Você pode escolher das oito às dezessete horas ou das nove às
dezoito.
– Além do dinheiro das aulas, há algum adicional?
– Há, tenho certeza de que você vai gostar. Posso contar com você?
– Pode. Amanhã estarei aí às dez horas.
Lucília desligou o telefone e Patrícia festejou:
– Esta nortista é arretada! Podemos ir juntas. Você pode me apanhar as
oito e meia? Poderemos dividir a gasolina, o que você acha?
– Acho ótimo irmos juntas. Se tiver de gastar dez reais de gasolina por
dia, não valerá a pena. O salário vai todo.

*
No outro dia foram para Magé. Chegando lá os outros elementos da
equipe já estavam reunidos na sala de Solange, com o subsecretário de Estado
que fora dar apoio na troca de pessoal. A antiga equipe deixava a
Coordenadoria e a nova assumia.
Lucília sentiu-se constrangida ao ser apresentada para a Gerente de
ensino que saía.
– Esta é Lucília, será a nova Gerente de Ensino. Se você puder, passe o
serviço para ela.
A Gerente mostrou os armários e disse que ali ela encontraria tudo de que
precisava para trabalhar e saiu. Lucília ficou meio perdida, sem saber o que
fazer.

11
Na sala, ao lado, a assessora da Gerência de Administração, também
acabara de assumir. Fez o seguinte comentário:
– Não sei o que vou fazer.
– Eu também não. Acho que vou vasculhar os armários e ver o que há
neles – comentou Lucília e começou a ação.
Na equipe da gerência permaneceu somente a tia de Solange. Foi a
salvação de Lucília. Ela conhecia alguns aspectos do trabalho e muito bem
tudo a respeito de matrículas, sua área de atuação.

*
Os trabalhos estavam todos atrasados e Lucília começou atendendo às
cobranças da SEE. Foi um desafio tentar cumprir tudo que era cobrado pela
manhã para estar pronto à tarde. Ela chegava às sete e meia e começava
despachando o que ficara do dia anterior. O telefone e o fax entravam em ação
e as cobranças se multiplicavam. Ela e sua assistente trabalhavam sem parar e
quando percebiam já passava das catorze horas. Elas saíam para o almoço, as
quatro juntas: Solange, Patrícia, sua assessora, Lucília e sua assistente.
Comiam no Semi-Deus, um restaurante que servia comida a quilo; e tomavam
sorvete de passas ao rum, na praça em frente, depois voltavam para trabalhar
até às dezoito horas e algumas vezes até às dezenove.

*
A folga a que todos tinham direito uma vez por semana ninguém
conseguia usufruir, pois o trabalho acumulado não permitia. Ao final do
primeiro mês Lucília pretendeu folgar, pois tinha alguns compromissos
particulares inadiáveis para resolver. Ao meio dia, na hora do almoço, o
telefone tocou, era Patrícia pedindo que ela passasse mais tarde para resolver
uma pendência. Ela desligou e voltou à mesa. Cinco minutos depois, novo
telefonema, ela deveria ir imediatamente.
– Por favor, me deixa terminar de almoçar que vou logo – respondeu
Lucília – já um pouco aborrecida. Pois tinha dois compromissos marcados
naquela tarde: um com o pedreiro que já aguardava alguns dias para continuar
as obras da casa da Rua Antônio Pinheiro e outro com um senhor para
contratar a abertura de um poço artesiano, pois o de manilhas estava quase
seco.

12
Quando levantou da mesa, novo telefonema de Patrícia apressando-a. Ela
apressou a neta de seis anos que estudava naquele horário, pois às sextas a
filha trabalhava o dia todo e ela ficava encarregada de cuidar dos deveres dos
netos e levá-los à escola. A criança menor começou a chorar dizendo que era
muito cedo e que não teria ninguém para ficar com ela, na escola. Ela se
acalmou e achou que a criança estava com a razão. As aulas começavam às
treze horas e naquela hora as portas ainda estavam fechadas.

*
Ela deixou a criança na escola e foi para Magé. Chegando lá as duas
estavam na sala de Solange. Lucília perguntou o que havia para ser resolvido
com tanta urgência.
– Eu estava conversando com Dona Patrícia e cheguei a algumas
conclusões e precisava conversar com você, pois estão diretamente ligadas à
Gerência de Ensino.
– Alguma coisa para ser aplicada ainda hoje? – perguntou incrédula.
– Não, mas eu precisava falar logo com a equipe, para que na segunda-
feira, cedo, coloquemos tudo em prática.
– Agora eu tenho de ir. Dona Patrícia, a senhora pode passar as idéias
para Lucília.
– Eu não acredito que vocês me tiraram da mesa e de dois compromissos
marcados, com muita antecedência, para me falarem de algo que, afinal, não
tinha tanta urgência assim.
– Desculpe Lucília, eu achei melhor lhe chamar porque Solange estava
um pouco ansiosa.
– Mas se não era assim tão urgente, e se era você Quem ia me passar o
assunto, porque não me falou por telefone ou me pediu para passar em sua
casa mais tarde?! Assim eu não teria de adiar meus compromissos, para
domingo, e atrapalhar o final de semana que eu ia sair com meu marido, para
Miguel Pereira, onde íamos visitar a minha cunhada que não anda bem de
saúde.
– E o teu marido não pode resolver essas questões do pedreiro e do
homem do poço? Lá em casa quem cuida desses assuntos é o meu marido.
– Pois na minha, se eu não estiver por perto, ele acaba pagando uma obra
com o dinheiro que eu pago as duas. Ele não sabe fazer negócios.
– Eu não acredito.
– Isso não vem ao caso. Os problemas são meus e só eu posso resolvê-
los. Não gosto de misturar assuntos particulares com trabalho.

13
*
Lucília só voltou para casa às dezoito horas. Essa foi a única vez que
tentou folgar. Diante do acontecido achou melhor não criar perspectivas em
casa e disse que a partir daquele dia não teria mais nenhuma folga durante a
semana. A família não gostou da idéia, pois ela saía de casa, diariamente, às
seis e meia e chegava depois das dezenove horas, muito cansada, e na maioria
das vezes, sentava-se em frente à televisão tentando ouvir o noticiário e
dormia sem banho e sem jantar.
Os trabalhos prosseguiam. Semanalmente a Gerência de Ensino tinha
reunião na SEE e Lucília, às vezes, ia ao Rio três vezes por semana, numa
viagem de setenta quilômetros de distância.
Certa vez, ela e Solange passaram o dia inteiro no prédio da Rua da
Ajuda nº 5, indo de setor em setor, tentando descobrir os projetos em
andamento. Alguns já estavam sendo tocados de acordo com as cobranças.
Outros estavam com datas vencidas e não poderiam mais ser desenvolvidos.
Outros, ainda, estavam com datas vencidas, mas poderiam ser retomados.
A pressão aumentou. Havia necessidade de se compor a equipe do
Ensino. Vários professores foram convidados. Alguns não aceitavam porque
tinham GLP (dobra de aulas com um salário adicional), outros porque o
horário era incompatível com a disponibilidade que tinham, outros ainda, por
não quererem deixar suas salas de aula e perderem a docência e precisarem
trabalhar 30 anos ao invés de 25. Só então Lucília soube que perderia a
docência nas duas matrículas. Ficou muito preocupada e procurou Solange
para esclarecer o assunto. Ela sugeriu que desse 8 aulas naquela que faltasse
menos tempo para se aposentar e continuasse com 24 tempos na
Coordenadoria.
A princípio, levou um memorando ao CIEP 128, para assumir duas
turmas. Não conseguiu compatibilizar o horário. Ofereceram 4 tempos no
CIEP 444. Ela não aceitou, pois ficava longe. Para ir de Mauá até lá eram 25
quilômetros. Gastaria o dinheiro da matrícula com gasolina. Acabou aceitando
quatro tempos de aulas e quatro no (Projeto Pedagógico), na Oswaldo Cruz,
em Mauá, a oito quilômetros de sua casa.

*
Depois de muitas tentativas formaram a equipe do Ensino. Alguns se
adaptaram outros foram trocados e outra começou uma corrida para conquistar
espaço. Numa das saídas da gerente para a SEE, para um Seminário do

14
"Projeto Nova Escola", onde foram discutidas as grades curriculares do Ensino
Fundamental e Médio, num trabalho cansativo e desgastante, ao voltar ela
percebeu um ambiente estranho. A assistente da gerência chamou-a na sala de
reuniões e lhe expôs os fatos: A professora da equipe da gerência, encarregada
do trabalho com os professores do Ensino Fundamental, teria procurado a
Coordenação para reclamar de que gostaria de ter mais liberdade para
trabalhar, pois a gerente pedira para ver os ofícios que saíam da gerência e que
eram assinados pela coordenadora.
Ela fez uma reunião com a equipe e esclareceu que o fato de pedir para
ver os ofícios, fazia parte do gerenciamento do setor. Que se tudo estivesse
certo a equipe teria acertado, porém, se desse errado, a responsabilidade seria
da gerente. Para isso existia o cargo, do contrário cada um receberia suas
funções e levaria diretamente à Coordenação. Tudo se esclareceu e os
trabalhos seguiram seu rumo.

*
A Coordenadoria Regional recebeu dois projetos de capacitação para
professores. "Ler, Escrever e Contar", para professores de primeira à quarta
séries e "Concretizando as Grandes Áreas do Conhecimento" para professores
do Ensino Médio e de quinta à oitava série.
O primeiro com inscrições para 100 professores e o segundo para 160.
Foram mandados ofícios para as escolas. Houve algumas argumentações com
diretores que achavam muito difícil dispensar tantos professores ao mesmo
tempo, mas tudo ficou resolvido.
Houve alguns problemas com a alimentação para todo esse pessoal, pois
o Projeto não previa esse item. Só com a colaboração das escolas, que
enviaram contribuições, foi possível a concretização dos referidos projetos.

*
A situação em casa ficava complicada. O marido de Lucília andava
aborrecido, pois como disse à enteada, perdera a companheira de dança as
sextas e de todas as horas, pois ela chegava tão cansada que não dava mais
conta de nada. Às vezes dormia sentada com a roupa que chegava do serviço.
O marido começou a sair de casa sem dizer para onde ia. Num domingo
em que todos estavam em casa, ele saiu às oito horas da manhã e só retornou
depois da meia noite. Lucília quis saber por onde andou, ele disse que não
tinha mais mulher e que ela o tinha abandonado às traças. E que se soubesse

15
que um dia isso iria acontecer, não teria casado com ela. Perguntou se ela não
lembrava que pedira para ela deixar o trabalho para poderem levar uma vida
em companhia um do outro. Principalmente, agora, que poderia lhe oferecer
uma vida mais tranqüila, até porque, ela não poderia estar se matando daquele
jeito, devido aos problemas de visão.
A primeira reação de Lucília foi de revolta. Disse a ele que mesmo que
ela estivesse com problemas, ele não tinha o direito de querer manipulá-la
daquele jeito.
Que o que ele estava fazendo era chantagem e não aceitava esse tipo de
pressão. O marido ficou assustado com a reação dela e ponderou:
– Você acha que vale a pena comprometer um relacionamento de catorze
anos, por um trabalho que não te está dando nada em troca? Você está
gastando o que ganha na gasolina e no almoço no restaurante e trabalhando
quanto tempo mais do que suas duas matrículas? Faça as contas e veja se está
sendo racional!
Ele tinha razão, mas ela não queria se convencer de que, realmente não
estava valendo o sacrifício. A gratificação que lhe fora prometida não tinha
previsão para sair. Nem tinha sido publicada em Diário Oficial a sua função
como Gerente de Ensino.

*
Ela continuou a trabalhar, saía de casa às seis e meia da manhã e chegava
depois das dezenove horas. Começou a perceber que o marido nunca estava
em casa. Sentava-se na poltrona para ver o Jornal Nacional e acabava não
vendo nada. Acordava no meio da noite, e todos já estavam dormindo.
Num fim de semana, o marido disse que não estava com vontade de
dançar. Esse era um hábito que tinham. Dançavam uma vez por semana, não
só porque gostavam, mas por recomendação médica, para prevenir e combater
a artrose. Lucília ficou preocupada. Primeiro as saídas, agora recusar-se a
dançar, a coisa que ele mais gostava como lazer? Alguma coisa não estava
bem. Ela precisava tomar uma atitude.

*
Na segunda-feira, ao chegar na Coordenadoria, leu no jornal, O Dia, a
notícia de que todos os professores aprovados nos concursos de 1998 e 2001
seriam nomeados, ainda no mês de outubro. Ela ficou preocupada. Sabia que
na transição do governo do Estado, quando o governador renunciasse, para se

16
candidatar à presidência, tudo iria mudar. E como seu cargo era de confiança,
ela provavelmente, seria dispensada da Gerência. Precisaria tomar uma atitude
imediatamente. Suas duas vagas, no Colégio Estadual Mauá, ocupada naquele
momento, por duas professoras, uma contratada e a outra com GLP,
provavelmente seriam preenchidas pelas novas nomeações e ela, sabe Deus,
onde iria parar. Com dificuldades para dirigir a noite, devido à falta de visão
no olho direito, não poderia arriscar-se a ser mandada para uma escola longe
da sua residência. A condição que impôs a si, para assumir suas matrículas,
era que as aulas fossem perto de casa, com fácil acesso.
Naquele momento começou a pensar em deixar seu trabalho na
Coordenadoria. Precisava retomar suas duas lotações no Colégio onde optara
para trabalhar, por ocasião da escolha de vagas dos concursados de 1997 e
1998, a duas quadras de sua residência. Era uma decisão séria que teria de
tomar imediatamente. O trabalho burocrático, decididamente, não era o seu
forte, principalmente se não tinha liberdade para formar a sua equipe de
trabalho. Nas indicações feitas por políticos, nem sempre as pessoas estão
preparadas, para desempenhar as funções que lhe são oferecidas, gerando uma
série de problemas administrativos. Na maioria das vezes faltam-lhes
competência e habilidades. Não sou contra a política, mas que haja critérios;
que não sejam mandadas para a educação pessoas que não estejam preparadas.
Para isso existe a lei exigindo a formação adequada para o professor, e por que
não, para as pessoas que vão acompanhar todo o trabalho desses profissionais?

*
Naquele dia chegou em casa e não encontrou o marido. Tinha saído às
nove, para o Rio, e não dissera o que fora fazer. Ela decidiu que no outro dia
pediria o seu retorno ao Colégio. Só lhe faltava perder a lotação na Unidade
Escolar perto de sua residência, e ainda por cima, perder seu par dançante e
companheiro de todas as horas. Não perdeu tempo. Sentou-se ao computador e
escreveu a carta seguinte e o pedido de retorno à sua Escola de origem.

Praia do Anil – Magé, 02 / 10 / 2001

Caríssima amiga Solange.

O trabalho de qualquer cidadão deve ser gratificante a ponto de lhe


deixar a vontade de retornar no outro dia, mesmo que tenha a mesa repleta de
despachos deixados do dia anterior. Mas, para isso é preciso ter-se objetivos
pessoais claros e acreditar que o seu trabalho é ponte, elo entre você e o outro.

17
Nessas condições pode-se encarar um horário rígido e desgastante sem se
incomodar com as reivindicações dos entes queridos que se preocupem com a
sua saúde e o seu bem estar.
Embora eu tenha vibrado com o convite feito por você, às dez e meia da
noite, para assumir no outro dia, às dez da manhã, um trabalho que julguei
livrar-me-ia do abuso de alguns alunos e de uma desgastante rotina de
correções de trabalhos e redações sem nexo, nada se compara à maratona de
uma Gerência de Ensino de uma Coordenadoria Regional, se você realmente
se preocupa e assume o que precisa ser feito.
Nos primeiros dias, julguei que o desconforto e cansaço que sentia eram
em razão de não ter recebido a relação das atividades que deveria executar e
por estar com apenas um elemento efetivo na equipe. Tentei de todas as
maneiras executar com a equipe, as atividades que me eram cobradas via
ofícios, fax e telefones. Desde o dia vinte de agosto, quando assumi, tentei
fechar a porta, fazer um levantamento e relatar as condições em que foram
encontrados os trabalhos. Mas em uma Gerência de Ensino não adianta
somente fechar a porta para não ser interrompido. Há de se desligar o telefone
para não se receber cobranças de resultados com prazos vencidos a cada hora.
Com o passar dos dias troquei os braços do meu marido pelos braços da
poltrona, pois chegava a casa tão cansada que dormia em frente à televisão ao
tentar repousar um pouco antes de tomar banho e jantar. Acordava pela
madrugada sem banho e sem jantar. Ele, penalizado, deixava-me dormir um
pouco e acabava dormindo também. No outro dia saía para caminhar e eu para
o trabalho e voltávamos a nos encontrar, por alguns minutos, antes de mais
uma vez eu adormecer.
No final da primeira semana ele reagiu dando-me o troco e deixando-me
sozinha sem dar satisfações. Quando reclamei, disse que estava abandonado
feito um vira-latas e que de nada tinha adiantado o esforço que fizera para
tirar-me da sala de aula, pelo menos por dois dias na semana, dando-me uma
mesada correspondente ao valor da GLP, no horário noturno, porque agora,
além de passar todos os dias fora de casa, chegava inutilizada para qualquer
atividade noturna. Mesmo assim, não lhe dei ouvidos, ainda estava cheia de
entusiasmo pelo trabalho.
Depois de cinco semanas, tentei ficar em casa no meu dia de folga, para
resolver alguns projetos particulares urgentes. Quando o telefone começou a
tocar solicitando a minha presença no trabalho, as coisas começaram a se
complicar. Larguei tudo: o marido à mesa almoçando sozinho, os projetos que
seriam executados naquela tarde foram transferidos para domingo,
atrapalhando o final de semana. A neta de seis anos chorando por ter de
acelerar a sua rotina, o almoço interrompido, tudo isso, acabou atrapalhando o

18
nosso projeto de dançar às sextas-feiras, seguindo uma sugestão médica de
exercícios freqüentes para o alívio de sua artrose e também por ser a nossa
opção de lazer. Gostamos muito de dançar.
Tentei, sinceramente, dar o melhor de mim para realizar um bom
trabalho. Não sei trabalhar sob pressão constante, além da que eu mesma
imponho-me, devido ao meu temperamento agitado. Hoje, quando percebi que
a minha presença seria indispensável para que os cursos de final de semana
tenham um andamento satisfatório, cheguei à conclusão de que não agüento
esse pique e de que não é esse o meu objetivo: Afastar-me de todas as minhas
atividades intelectuais em prol do trabalho gerencial. Quero ler, escrever e
contar histórias para meus netos e alunos, além de contextualizar a minha
própria história.
Portanto, para que eu não passe os anos que me restam sozinha, sem o
meu companheiro dançante e para que eu possa desfrutar da convivência com
meus netos, enquanto tenho essa oportunidade, peço que você entenda as
minhas razões de querer voltar à sala de aula. Lá é o meu lugar.
Espero que você seja muito feliz e atinja todos os seus objetivos. Um
abraço
Lucília

Além da carta informal, Lucília redigiu um ofício encaminhando o seu


pedido de demissão à função de Gerente de Ensino.

Magé, 02 outubro de 2001

Ilmª. Srª. Coordenadora Da CR12–Serrana IV

Prezada Senhora

Atendendo aos apelos de meus familiares, que se estão sentindo


abandonados por mim, solicito o meu desligamento da Gerência de Ensino e
retorno à minha Unidade Escolar.
Aproveito a oportunidade para manifestar a minha admiração pelo
esforço e competência como V. S. vem administrando esta Coordenadoria.
Desejo-lhe muito sucesso. Tenho certeza de que concretizará tudo que
busca. Vossa Senhoria merece.

Atenciosamente
Lucília

19
*
A Coordenadora ao receber a carta ficou aborrecida, pediu desculpas e
disse que naquele momento não poderia dispensá-la, pois era um momento de
consolidação da equipe. Foi até à livraria "Sinal Verde". Ao retornar entregou-
lhe um belo cartão, com as seguintes mensagens:
"Também vos digo que, se dois de vós concordardes na terra acerca de
qualquer coisa que pedirem, ser-lhes-á concedido por meu pai, que está nos
céus. Pois onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, ali estou eu no
meio deles".

Lucília,
Pelos momentos que passamos juntas.

"É tão bom saber que, ombro a ombro estás comigo, não atrás a me
criticar, nem à frente para não me enxergar, mas ao meu lado, para crescermos
e cultivarmos, todo amor, respeito e ajuda que em nossas vidas Jesus
ministrar".
Por isso, eu não posso ficar sem você em nossa equipe.
Perdoe o meu egoísmo. Com muito carinho,
Sua amiga:
Solange

Lucília ao sair de casa dissera aos familiares que iria apenas despedir-se
dos colegas de trabalho. A filha achou ótima idéia e prometeu que naquele dia
mandaria fazer um almoço especial para comemorar o retorno da harmonia
familiar.
E agora? Como avisar que teria de trabalhar mais um pouco, para que a
amiga pudesse se organizar. A alegria transformou-se em preocupação. Teria
de telefonar para casa dizendo que chegaria no mesmo horário de sempre: às
dezenove horas. Pegou o telefone e deu a notícia. A filha achou que era
brincadeira. Disse que ela não poderia fazer aquilo, principalmente, ao marido
que estava todo feliz esperando-a para o almoço.
Ela pediu à filha que procurasse conversar com o padrasto e dissesse que
ela teria de ficar trabalhando até o final de outubro, para concluir os dois
cursos que estava organizando. Mas que seria definitiva a sua saída. Não
queria sair deixando inimizades. Afinal fora convidada por duas amigas que
confiavam em seu trabalho.

20
Desligou o telefone e foi até à sala da coordenadora. Prometeu que ficaria
até o dia 30 de outubro e que faria o curso "Contextualizando as Grandes
Áreas do Conhecimento", como professora da Área de Códigos e Linguagens
e não como Gerente de Ensino. Ficou tudo acertado.

*
A agenda do mês de outubro estava recheada de grandes atividades:

* Organização e execução do curso "Ler, Escrever e Contar" para


professores do primeiro segmento do Ensino Fundamental; ministrado pelo
corpo docente da UERJ.

* Organização do curso "Contextualizando as Grandes Áreas do


Conhecimento", para professores da Área de Códigos e Linguagens;
ministrado pela ABEU no início de novembro, mas teria de ser organizado
antes dela sair.

* Recepção de todos os Gerentes de Ensino do Estado do Rio de Janeiro,


decidido por sorteio, na última reunião da gerência, onde foi sugerido que, as
reuniões mensais, a partir daquela data, fossem feitas nas Coordenadorias.
Magé foi o primeiro município sorteado.

A homenagem a Darcy Ribeiro seria o último evento que iria organizar e


participar.
*
Todas as atividades da agenda foram realizadas. A homenagem a Darcy
Ribeiro seria no dia 30.
No dia anterior ao evento, fez reuniões distribuiu tarefas, providenciou
tudo, carregou objetos para o CIEP 128, onde seria realizada a homenagem.
No dia 30 ficaria na Coordenadoria concluindo seu trabalho, pois queria
deixar tudo em ordem. Aquele seria o seu último dia na Gerência. Iria para o
local da Homenagem às 15 horas para supervisionar todos os arranjos.
Ao chegar, ficou decepcionada. Tudo que tinha combinado e planejado
estava por fazer. Procurou a diretora e perguntou se havia alguma maneira
dela colaborar. Precisava encher os balões, não daria para fazer o que tinha
planejado, mas teria de fazer alguma coisa, pois tinha criado expectativas,
contara para a Coordenadora do projeto, cuja culminância seria aquela
homenagem, como tinha idealizado o evento. Às dezesseis horas a equipe
encarregada achava que estaria tudo em ordem e que não precisava ficar tão

21
aflita. Felizmente, o caseiro do CIEP usou o compressor do gabinete dentário
e encheu os balões para fazer o arranjo da entrada. O cavalete que tinha
conseguido para montar o painel de boas vindas, com um desenho da foto de
Darcy, feito por um aluno, estava dentro da barraca de uma escola, autorizada
por uma pessoa da sua equipe da Gerência. Ela não teve dúvidas, pediu que
colocassem na entrada, onde ela tinha planejado e para isso tinha solicitado,
com bastante antecedência, a uma escola vizinha o empréstimo do tal
cavalete... Pediu a colaboração de uma professora do CIEP 128 para montar o
painel. Ficou tudo pronto, mas os balões que deveriam cair em cascata das
cestas de basquete, não foram arranjados.

*
Mais uma vez recorreu ao caseiro para organizar os fogos. Ao retornar as
meninas da sua equipe tinham emendado o cartaz, trocando a frase;
"Benvindos ao sonho!", por "Bem-vindos ao sonho". Ela perguntou quem o
tinha feito? A diretora disse que tinha sido as meninas da gerência. Ela tentou
explicar que as duas maneiras estavam certas, devido ao fato de o primeiro ser
um verso destacado de um poema, onde se leva em conta a sonoridade. Mas
teve de engolir os sorrisinhos de deboche, daqueles, que por lhes faltar
conhecimento lingüístico, só conheciam a segunda forma.
Embora o evento tenha sido um sucesso, Lucília deixou para trás uma
certa angústia. Não gostara daquela atitude de rasurarem o cartaz e ainda
aquele ar de superioridade. Numa atitude de afronta, aliás, o que já tinha
acontecido antes, com os comentários feitos às costas, o que fizera ela tomar a
decisão de deixar a Gerência. Como já ia mesmo sair, sublimou o assunto.
Após o término do evento, pegou o carro e foi para casa, com a sensação de
impotência diante da atitude das autoridades de contratarem pessoas não
habilitadas para tratarem de um setor tão importante como a educação.

*
No final de semana, Lucília fez uma visita a Patrícia, queria saber
notícias da neta, aquela do problema na cabeça. Estava tudo sobre controle. A
equipe da Santa Casa achou que não seria necessária uma cirurgia, pelo menos
naquele momento. O problema deveria ser acompanhado com atenção, mas
que não havia razão para ficarem desesperados.

22
Após marcar consultas, algumas vezes, e não conseguirem encontrar o
médico, na Santa Casa, a família resolveu permanecer com o médico
particular para o acompanhamento do caso.

*
No ano seguinte, ao organizar um exercício para sua turma de 1º ano do
Ensino Médio, pesquisou em vários livros as palavras compostas, inclusive
aquelas formadas pelo prefixo bem. Encontrou no Dicionário de Dificuldades
da Língua Portuguesa de Domingos Paschoal Cegalla a seguinte explicação:
"Bem-vindo. Assim, com hífen de acordo com o código ortográfico
oficial.
Parece-nos melhor grafia benvindo. Tanto mais porque a pronúncia que
se ouve, mesmo entre pessoas cultas, é / benvindo / e não / bêim-vindo /. A
grafia deveria subordinar-se à fonética, tal como ocorre com bendito,
benfazejo e benquisto. Advogamos essa grafia, simples e autêntica, para os
demais vocábulos compostos formados com o prefixo bem, sempre que o
segundo elemento o permitir".

Lucília tirou xerox da explicação para seus alunos e levou uma cópia,
também, para as meninas da Coordenadoria que emendaram o seu cartaz na
homenagem a Darcy Ribeiro.

Uma delas ficou meio sem graça, a outra riu pra valer e deu um abraço
em Lucília e a terceira saiu correndo pra vê-la na moto com o marido.

Praia de Mauá – Magé – RJ,


10 / 01 / 2003
Benedita Silva de Azevedo

23

Vous aimerez peut-être aussi