Vous êtes sur la page 1sur 2

Miguel Frasquilho

Educação a marcar passo; Portugal na cepa torta

No último sábado teve lugar, em Lisboa, a maior manifestação de sempre


de professores contra um Governo. Foram perto de 100 mil os
manifestantes que desceram a Avenida da Liberdade em direcção ao
Terreiro do Paço, e neste número, ao que se sabe, estiveram mais de dois
terços (!) dos docentes do ensino público básico e secundário do
Continente.

Já nas semanas anteriores as manifestações de professores tinham sido uma


constante de Norte a Sul do País e a luta promete não ficar por aqui.

Tenho para mim que este clima de guerrilha instalado na educação portuguesa
era a última coisa de que o país necessitava para que o nosso sistema
educativo pudesse progredir e qualificar os portugueses como tão
desesperadamente precisamos. Como a literatura científica da especialidade
mostra, a qualificação dos recursos humanos de um País é o factor de
desenvolvimento sustentado mais importante. Sem uma população qualificada,
nunca Portugal conseguirá ser um país da "primeira divisão europeia" e atingir
um grau de desenvolvimento que é, hoje, e cada vez mais, uma miragem. (…)

Desde logo porque a tão inicialmente propalada (quer pelo primeiro-ministro,


quer pela ministra da Educação) cultura de rigor nunca chegou, na verdade, a
ser colocada em prática – e a terrível cultura facilitista do "eduquês", em vez de
ser combatida foi, ao invés, tragicamente reforçada. Quando se devia ter
introduzido a realização de exames nacionais no quarto e sexto anos de
escolaridade, complementando os já existentes no nono ano, o que sucedeu foi
que não só aqueles exames nunca viram a luz do dia, como estes (os do nono
ano) foram mais facilitados: hoje, no final do ensino básico, apenas duas
disciplinas (Português e Matemática) são avaliadas e as provas globais que
existiam em outras disciplinas acabaram? E os exames existentes continuam a
não ser comparáveis de ano para ano – pelo que não podem mostrar com
fidelidade o progresso dos alunos nem orientar positivamente os estudos.
Praticamente todos os estudantes chegam, assim, ao ensino secundário (ao
décimo ano) não por mérito seu, mas porque o sistema está montado para que
assim aconteça. Não será difícil perspectivar que, uma vez no ensino
secundário, estes jovens não progridam como até aí? Está-se, assim, não a
formar uma população melhor preparada para abraçar mais tarde uma carreira
profissional (como Portugal bem necessitaria), mas apenas a trabalhar para
melhorar artificialmente as estatísticas do abandono escolar, mascarando uma
situação que continua a ser trágica. Por exemplo, tenho as maiores dúvidas
que a introdução do ensino do Inglês no terceiro ano do ensino básico venha a
dar frutos sem um sistema de avaliação rigoroso e exigente. Pois não é já
verdade que a Matemática e o Português são disciplinas obrigatórias?... Mas
não é por isso que a maior parte dos estudantes atinge nestas disciplinas um
conhecimento sequer sofrível (por exemplo, sabe-se que cerca de 30% das
crianças terminam o primeiro ciclo do básico sem saberem ler?).

Aliás, se o leitor (ainda) tem dúvidas sobre a cultura facilitista do Governo,


basta lembrar-se (i) das "Novas Oportunidades", que em muitos casos é um
embuste feito à medida para acolher aqueles que, a partir da conclusão do
ensino básico, não conseguem ter aproveitamento (e que, com uns mesitos de
frequência de aulas – mas sem avaliação –, ganham direito a um diploma?
que, assim, claro está, nunca lhes devia ser atribuído; (ii) do novo Estatuto do
Aluno, que praticamente acaba com as reprovações por faltas, sendo, portanto,
um claro convite à ausência das aulas por parte dos alunos, e deixando de lado
o desejável caminho da exigência, do rigor e da justiça.

Mas também ao nível dos professores as opções do Governo têm deixado, em


minha opinião, muito a desejar. Primeiro, pelo clima de guerrilha e crispação
sempre crescente – para o que muito contribuiu um Estatuto da Carreira
Docente que menoriza claramente os professores – e que atingiu, agora, as
proporções que se conhecem. No fundo, os professores são, desde há muito,
apresentados como os "maus da fita". Quem não se recorda da afirmação da
Ministra da Educação, "perdi os professores, mas ganhei o País"?... Ora, a
batalha da qualificação dos portugueses nunca poderá ser vencida contra os
professores. Nenhum general, por melhor que seja, pode ganhar uma batalha
em conflito com os seus soldados?

Mas com as relações entre o Governo e os docentes em deterioração


acelerada, entrou em cena a avaliação dos professores. "A cereja no topo do
bolo", o que fez transbordar o copo. Quero deixar muito claro que sou
totalmente favorável à avaliação dos professores (como, afinal, sucede em
qualquer outra profissão). Mas, dito isto, como é possível propor-se que os pais
intervenham na avaliação dos docentes? Ou que as classificações dos alunos
contem para a folha de serviços dos professores que as atribuíram? Ou que o
processo de avaliação seja integrado por colegas que claramente não têm
competência na área em questão (como, por exemplo, professores de
Trabalhos Manuais tomarem parte na avaliação de professores de
Português)?... Não é absurdo, caro leitor?...

Isto para além de o modelo de avaliação proposto não ter sido debatido como
podia e devia; ter sido implantado à pressa e sem qualquer tempo
experimental; e ser uma enorme teia burocrática, complexa e centralizada que
obstaculiza o trabalho dos professores, diminui a autonomia das escolas e
impõe a mesma grelha de avaliação para todos os estabelecimentos,
independentemente da sua natureza (ensino pré-escolar, básico ou
secundário), da sua dimensão (terem poucos ou muitos alunos), de as turmas
serem mais ou menos problemáticas? (…)

In Jornal de Negócios, 11/03/08

Vous aimerez peut-être aussi