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Acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul no Processo No 70049844483 que considera atípica a conduta de uma funcionária em copiar dados da empresa antes de sua dispensa. Análise sob a perspectiva de Furto ou Furto Eletrônico. Invasão de dispositivo informática não analisada.
Acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul no Processo No 70049844483 que considera atípica a conduta de uma funcionária em copiar dados da empresa antes de sua dispensa. Análise sob a perspectiva de Furto ou Furto Eletrônico. Invasão de dispositivo informática não analisada.
Acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul no Processo No 70049844483 que considera atípica a conduta de uma funcionária em copiar dados da empresa antes de sua dispensa. Análise sob a perspectiva de Furto ou Furto Eletrônico. Invasão de dispositivo informática não analisada.
1 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIRIO TRIBUNAL DE JUSTIA APELAO CRIME. CRIMES CONTRA O PATRIMNIO. FURTO QUALIFICADO PELO ABUSO DE CONFIANA. CPIA DE ARQUIVOS E DOCUMENTOS INFORMTICOS. ATIPICIDADE DA CONDUTA. ABSOLVIO. Tanto a narrativa contida na denncia como os substratos probatrios colacionados aos autos revelam que a r copiou, para si, possivelmente infringindo contrato firmado perante sua empregadora, arquivos e documentos informticos gravados em disco rgido de computador conduta atpica e que no se subsume quela abstratamente prevista no artigo 155 do CP. Precedentes doutrinrios de que o verbo nuclear previsto no tipo subtrair pressupe o apoderamento da coisa mvel alheia mediante apreenso e ulterior remoo do local onde se encontrava, exigindo-se, para a consumao do ilcito, que a res seja inclusive transportada para lugar onde a vtima no mais possa, ainda que precariamente, realizar vigilncia sobre a mesma. Inviabilidade de se considerar que a acusada, copiando, para si, dados e arquivos informticos, tenha tirado os mesmos da esfera de disponibilidade ou custdia da empresa ofendida, visto que simplesmente duplicou e gravou os mesmos em dispositivo do tipo USB, permanecendo a informao originria acessvel respectiva detentora de seus direitos autorais. Ausncia de animus furandi ou rem sibi habendi que impe, nesse contexto, considerar atpica a conduta noticiada, razo do acolhimento do pleito absolutrio nos termos do artigo 386, inciso III, do Estatuto Penal Adjetivo. APELAO DEFENSIVA PROVIDA. APELO MINISTERIAL DESACOLHIDO.
NOP N 70049844483 (N CNJ: 0291040-55.2012.8.21.7000) 2012/CRIME
2 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIRIO TRIBUNAL DE JUSTIA ACRDO
Vistos, relatados e discutidos os autos. Acordam os Desembargadores integrantes da Stima Cmara Criminal do Tribunal de Justia do Estado, unanimidade, em negar provimento ao apelo ministerial e em dar provimento ao recurso defensivo, ao efeito de absolver a r nos termos do artigo 386, inciso III, do Cdigo de Processo Penal. Custas na forma da lei. Participaram do julgamento, alm da signatria, os eminentes Senhores DES. CARLOS ALBERTO ETCHEVERRY (PRESIDENTE E REVISOR) E DES. JOS CONRADO KURTZ DE SOUZA. Porto Alegre, 29 de abril de 2014.
DES. NAELE OCHOA PIAZZETA, Presidente e Relatora.
RELATRI O DES. NAELE OCHOA PIAZZETA (PRESIDENTE E RELATORA) O MINISTRIO PBLICO ofereceu denncia contra NARA ELISA FOLLMER (nascida em 13-07-1974 fl. 347), com 34 anos de idade poca do fato, como incursa nas sanes do art. 155, 4, inciso II, do Cdigo Penal, pelo fato assim narrado na pea acusatria: [...] Entre os dias 03 e 04 de setembro de 2008, durante o horrio comercial, na rua Pinheiro Machado, 87, Centro, Nova Bassano/RS, a denunciada, mediante abuso de
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3 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIRIO TRIBUNAL DE JUSTIA confiana, subtraiu, para si, diversos arquivos digitais referentes ao banco de dados da vtima Medabil S/A, com contedo sigiloso posto que tratavam, dentre outras coisas, de indicadores gerenciais, tabelas salariais e projetos e execuo atinentes atividade industrial desempenhada (documentos das fls. 21 a 23 e CD-Roms no anexo). Para tanto, a acusada desempenhava as funes de Coordenadora de Recursos Humanos na Medabil S/A e ante a natureza do cargo ocupado e a confiana nutrida pelos direitos da empresa sua pessoa Nara tinha acesso direito aos arquivos referidos. Contudo, em razo de oportunidades em empresa concorrente, a r solicitou seu desligamento junto Medabil S/A e quando de sua sada (no penltimo e ltimo dias), acabou por copiar (mediante a utilizao de dispositivo compatvel com USB) os documentos digitais em apreo, sem autorizao para tal. [...]. Recebida a exordial acusatria em 10-03-2009 (fl. 146). A r foi citada pessoalmente (fl. 149) e, por intermdio de defensor constitudo, apresentou resposta acusao com rol de testemunhas (fls. 159-164). Inexistindo quaisquer das causas previstas no art. 397 do Cdigo de Processo Penal, foi determinado o regular prosseguimento do feito (fl. 158). No decorrer da instruo, foram ouvidas 09 (nove) testemunhas (fls. 192-210, 256-257, 317-318v, CD fl. 294) e 01 (um) informante (fls. 238-239), bem como interrogada a acusada (fls. 341-342).
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4 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIRIO TRIBUNAL DE JUSTIA Atualizados os antecedentes criminais (fl. 347). Apresentados memoriais pelo Ministrio Pblico (fls. 349-356), pela assistente de acusao (fls. 358-359) e pela defesa (fls. 362-390). Sobreveio sentena (fls. 391-396), publicada em 26-10-2011 (fl. 396v), julgando procedente a denncia para condenar a acusada como incursa nas sanes do art. 155, 4, inciso II, do Cdigo Penal, pena de 01 (um) ano e 06 (seis) meses de recluso pena-base fixada em 01 (um) ano e 06 (seis) meses de recluso, assim tornada definitiva , a ser cumprida inicialmente em regime aberto, cumulada com 20 (vinte) dias-multa no valor unitrio de 1/30 (um trinta avos) do salrio-mnimo vigente poca do fato. O Ministrio Pblico interps recurso de apelao pleiteando o aumento da pena aplicada (fls. 399-403). A condenada interps recurso de apelao (fl. 404), em cujas razes postula a absolvio por atipicidade da conduta (fls. 419-448). Recebidas e contrariadas as inconformidades (fls. 450-451v, 457-466), vieram os autos a esta Corte, manifestando-se o ilustre Procurador de Justia, Delmar Pacheco da Luz, pelo provimento do recurso ministerial e pelo desprovimento do recurso defensivo (fls. 470-474v). Convertido o julgamento em diligncia (fls. 478-479). A r foi intimada da sentena pessoalmente (fl. 483). Conclusos para julgamento. VOTOS DES. NAELE OCHOA PIAZZETA (PRESIDENTE E RELATORA) Eminentes Colegas. NARA ELISA FOLLMER foi condenada a 01 (um) ano e 06 (seis) meses de recluso, em regime aberto, e 20 (vinte) dias-multa no valor
NOP N 70049844483 (N CNJ: 0291040-55.2012.8.21.7000) 2012/CRIME
5 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIRIO TRIBUNAL DE JUSTIA unitrio mnimo, pela prtica do crime previsto no art. 155, 4, inciso II, do Cdigo Penal. H duplo apelo. O Ministrio Pblico postula o recrudescimento da privativa de liberdade aplicada r. Esta, por sua vez, pugna pela absolvio por atipicidade da conduta. Apenas a irresignao defensiva merece trnsito. Conforme consta da exordial acusatria (fls. 02-03), NARA, ao desligar-se da empresa qual prestava servios de assessoramento, teria subtrado, para si, mediante abuso de confiana e utilizando-se de dispositivo informtico compatvel com entradas do tipo USB, coisa alheia mvel consistente em arquivos digitais constantes do banco de dados do referido estabelecimento, sem autorizao para tanto e em infringncia a termo de sigilo ento firmado quando de sua contratao. Todavia, mister observar que tanto da narrativa ftica como, igualmente, dos substratos probatrios colacionados ao grampo dos autos, conclui-se que a conduta perpetrada pela denunciada se consubstanciou em copiar documentos cibernticos para si, o que no se amolda noticiada figura ou a tipo penal outro constante do Ordenamento Jurdico vigente poca do fato. Segundo leciona Paulo Jos da Costa Jr. 1 , por subtrair entende-se o apoderamento de coisa alheia, mediante apreenso e ulterior remoo do local onde se encontra, semelhana do instituto da contrectatio do Direito Romano. Este, alis, considera o furto consumado apenas quando houver deslocamento da res
1 da Costa Jr., Paulo J. Comentrios ao Cdigo Penal. Parte Especial. Volume 2. 2 edio, atualizada e ampliada. So Paulo: Editora Saraiva, 1989. p. 198.
NOP N 70049844483 (N CNJ: 0291040-55.2012.8.21.7000) 2012/CRIME
6 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIRIO TRIBUNAL DE JUSTIA para ponto onde quem a possua no mais possa vir a exercer gerncia sobre a mesma. Tal a origem do hodierno entendimento doutrinrio e jurisprudencial de que, para a consumao da subtrao no crime de furto, no basta que o agente tome a coisa para si (apprehensio) e a remova do lugar onde estava (amotio), exigindo-se, igualmente, que esta seja transportada para onde a vtima no mais possa realizar qualquer vigilncia sobre a mesma, ainda que de modo precrio (ablatio). Nesse sentido, arremata o referido doutrinador 2 que o furto resta consumado apenas [...] quando apreendida e deslocada a coisa alheia mvel, fora da esfera de disponibilidade ou de custdia de seu titular. Tambm leciona Guilherme de Souza Nucci 3 que [...] o furto est consumado to logo a coisa subtrada saia da esfera de proteo e disponibilidade da vtima, ingressando na do agente. imprescindvel, por tratar-se de crime material (aquele que se consuma com o resultado naturalstico), que o bem seja tomado do ofendido, estando, ainda que por breve tempo, em posse mansa e tranquila do agente [...]. Com base em tais assertivas e tornando ao caso posto, tenho que a conduta descrita na denncia e demonstrada ao longo da instruo processual d conta de fato outro que no o crime do artigo 155 do CP. No houve furto eletrnico, este bem caracterizado nas hipteses onde o criminoso, utilizando-se de computador ou dispositivo mvel conectado internet, logra, por exemplo, acessar conta bancria
2 Idem, p. 199. 3 NUCCI, Guilherme de Souza. Cdigo Penal Comentado. 11 edio. So Paulo: RT. 2012, p. 763- 764.
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7 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIRIO TRIBUNAL DE JUSTIA alheia e desta surrupiar, para si, clandestinamente, soma em dinheiro, tirando-o da esfera de disponibilidade do correntista. Veja-se que, em concreto e diferentemente do exemplo supra, a denunciada to somente copiou dados e arquivos informticos para si, em momento algum vindo a tir-los da esfera de disponibilidade da ofendida o que s ocorreria quando exclusse os mesmos do respectivo sistema informatizando, tornando-os indisponveis ao legtimo detentor de seus direitos autorais. Logo, impossvel falar em animus furandi ou rem sibi habendi, o que impe seja a r absolvida nos termos do artigo 386, inciso III, do Estatuto Repressivo. Esta seria, alis, uma das questes que poderiam ser levantadas no presente caso e que conduziriam, da mesma maneira, reforma do decreto condenatrio prolatado em Primeiro Grau de jurisdio. Nesse sentido, reflexo deve ser feita acerca da possibilidade de se considerar informaes gravadas em disco rgido de microcomputador ou em servidores remotos como coisa mvel; h de se perquirir, tambm, se dados informticos, os quais no passam de meros bits e bytes, possuiriam contedo economicamente aprecivel a ponto de caracterizar elementar do artigo 155 do Cdigo Penal 4 . Igualmente, sabe-se da impossibilidade de se realizar simples exerccio analgico para, como pretende o rgo Ministerial, considerar a conduta retratada na incoativa como furto, sob pena de desvirtuamento do princpio da legalidade elencado no artigo 1 do Estatuto Repressivo e no inciso XXXIV, do artigo 5, da Carta da Repblica.
4 Bitencourt, Cezar R. e Prado, Luiz R. Cdigo Penal Anotado e Legislao Complementar. Editora Revista dos Tribunais: 1997, p. 571.
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8 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIRIO TRIBUNAL DE JUSTIA Mais. Em ateno ao princpio da anterioridade 5 e porque o caso concreto no englobaria, ao meu sentir, violao indevida de mecanismo de segurana, sequer cogito em desclassificao da conduta descrita na incoativa para o crime de invaso de dispositivo informtico previsto no artigo 154-A do Cdigo Penal 6 , este com redao dada pela Lei n 12.737/2012. Por fim, consigno que NARA, quando de sua admisso junto empresa ofendida, assinou acordo de sigilo 7 circunstncia que, ao menos sob corte cognitivo, sinaliza provvel quebra de contrato cvel pactuado entre as partes e cuja resoluo dever ser pleiteada, caso do interesse do prejudicado, em instncia judiciria competente para sua respectiva anlise. De modo que nego provimento ao recurso ministerial postulando o recrudescimento das penas cominadas a r e dou provimento ao apelo defensivo, ao efeito de absolver a mesma nos termos do artigo 386, inciso III, do Estatuto Penal Adjetivo.
DES. CARLOS ALBERTO ETCHEVERRY (PRESIDENTE E REVISOR) - De acordo com o(a) Relator(a). DES. JOS CONRADO KURTZ DE SOUZA - De acordo com o(a) Relator(a).
DES. CARLOS ALBERTO ETCHEVERRY - Presidente - Apelao Crime n 70049844483, Comarca de Nova Prata: "NEGARAM PROVIMENTO AO
5 Artigo 1, do Cdigo Penal. 6 Cdigo Penal, art. 154-A. Invadir dispositivo informtico alheio, conectado ou no rede de computadores, mediante violao indevida de mecanismo de segurana e com o fim de obter, adulterar ou destruir dados ou informaes sem autorizao expressa ou tcita do titular do dispositivo ou instalar vulnerabilidades para obter vantagem ilcita: Pena - deteno, de 3 (trs) meses a 1 (um) ano, e multa (Includo pela Lei n 12.737, de 2012) 7 Fl. 103 dos autos.
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9 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL PODER JUDICIRIO TRIBUNAL DE JUSTIA APELO MINISTERIAL E DERAM PROVIMENTO AO RECURSO DEFENSIVO, AO EFEITO DE ABSOLVER A R NOS TERMOS DO ARTIGO 386, INCISO III, DO CDIGO DE PROCESSO PENAL. UNANIMIDADE."