Médicos e pacientes vêem os problemas de saúde de maneiras muito
diferentes, ainda que possuam o mesmo background cultural. Suas perspectivas estão baseadas em premissas diferentes: empregam diferentes sistemas de prova e avaliação da eficácia do tratamento. Cada um tem seus pontos fortes e fracos. O problema consiste em como garantir alguma comunicação entre eles no encontro clínico , entre o médico e o paciente. Este problema é visto através da apresentação das diferenças entre as visões médica e leiga dos problemas de saúde, ou seja, entre “enfermidade”(disease) e “ doença” (illness).
I-METÁFORAS DAS DOENÇAS
1) DOENÇA( ilness) e ENFERMIDADE( disease) –
( paciente) diferenciação:
R: O termo “doença( ilness) se refere a “ o que o
paciente está sentido enquanto se dirige ao consultório médico”, inclui não somente a experiência pessoal do problema da saúde, mas também o significado que o indivíduo confere à mesma ( Por que aconteceu isto comigo?; O que eu fiz de errado para merecer isto? Será que alguém provocou minha doença?); quanto à enfermidade(disease), podemos dizer que ela demonstra “ o que ele tem ao retornar para casa, do consultório” , mostra, portanto o que o órgão tem.
2) A OMS e o processo de saúde /doença.
R: A Organização Mundial da Saúde (OMS), define saúde
como “ um estado de completo bem estar físico, mental e social, e não simplesmente a ausência de doença ou enfermidade.
3. Modalidades de saúde, segundo algumas sociedades
ou grupos humanos:
R: ·(a) em grande parte das sociedades não
industrializadas, a saúde é conceituada como o equilíbrio no relacionamento do homem com o homem,com a natureza e com o mundo sobrenatural. Um distúrbio em qualquer uma dessas relações pode ser manifestado através de sintomas físicos ou emocionais; b) nas comunidades ocidentais, as definições de saúde tendem a ser menos abrangentes, mas incluem também, aspectos físicos, psicológicos e comportamentais, variando segundo as classes sociais; c) segundo algumas pesquisas, as mães da classe operária não consideravam seus filhos doentes, nem mesmo se eles apresentassem sintomas anormais, conquanto continuassem caminhando e brincando normalmente.
4. A definição funcional de saúde, comum em
populações pobres:
R: É aquela que está baseada na necessidade
(econômica) de continuar trabalhando, sejam quais forem seus sentimentos, e nas poucas expectativas com relação a assistência à saúde.
5. Significado de adoecer: Adoecer pode ser definido
como um processo social que envolve outras pessoas, além do paciente. A cooperação dos outros é necessária para que a pessoa adote os direitos e os benefícios do papel de doente- ou seja do papel socialmente aceito de “pessoa doente”.
6. Pessoas doentes: são aquelas pessoas aliviadas de
suas obrigações com respeito aos grupos sociais aos quais pertence – família, amigos, colegas de trabalho ou grupos religiosos. Esses grupos a) sentem-se obrigados a cuidar dos companheiros doentes, b)o papel do doente proporciona um canal semilegítimo de isolamento das responsabilidades de adulto e, c) uma base para ser atendido por outras pessoas
7. O processo de adoecer envolve, portanto,
experiências subjetivas de mudanças físicas ou emocionais e, com exceção dos indivíduos completamente isolados – a confirmação dessas mudanças por parte de outras pessoas.Para que haja esta confirmação deve haver: a) um consenso entre todos os envolvidos sobre o que constitui um estado de saúde ou de sintoma anormal e, b) uma conduta padronizada através da qual uma pessoa doente possa chamar a atenção sobre essas mudanças anormais para que receba cuidados e apoio.
8. O significado de enfermidade (disease) sem doença
(ilness) e doenças (ilness) sem enfermidade (disease).
R: Enfermidade (disease) sem doença (ilness) apresenta-
se como a ênfase dada na utilização da terminologia diagnóstica, podendo haver anormalidades físicas, constatadas, em geral, a nível celular ou químico, sem que o paciente se sinta doente., caso da hipertensão, elevado colesterol no sangue, infecção por HIV, que podem ser descobertos em exames médicos de rotina; Já as doenças (ilness) sem enfermidade (disease), nesse caso , m ostra que o paciente sente que “algo está errado “ na sua vida – física, emocional ou socialmente, mas, apesar de seu estado subjetivo, o médico lhe diz, após exame físico que “ não há nada errado com você”. A maioria dos sintomas dessa situação é provocada pelo estresse da vida diária, por vários distúrbios psicossomáticos, por hipocondria (como a doença dos estudantes de medicina) e por uma grande variedade de doenças (ilness) populares.
9) A ênfase dada pela técnica tradicional e moderna
quanto à coleta de dados sobre os processos subjacentes às enfermidades(disease).
R: ·(a) o método tradicional buscava ouvir a apresentação
dos sintomas pelo paciente e da evolução dos mesmos (a história), e então investigar os sinais físicos objetivos (o exame); b) a medicina moderna vem depositando uma confiança cada vez maior na tecnologia diagnóstica para a coleta e mensuração de fatos clínicos; c) a saúde, ou a normalidade é definida através da referência a determinados parâmetros físicos e bioquímicos, tais como peso, altura, contagem e pressão sangüíneas, ritmo cardíaco e respiratório;
10). O que indicam as faixas numéricas quanto à saúde
e à enfermidade e o significado da divisão “ corpo” e “alma”?
R: Para cada medida existe uma faixa numérica : 1) um
“valor normal”- no qual o indivíduo, é considerado normal ou saudável”; 2) um valor superior ou inferior a esta faixa é “ anormal” e indica a presença de “enfermidade” (disease).O dualismo conceitual remonta ao século XVII e pode ser atribuído a Descartes, que dividiu o homem em “corpo” (a ser estudado exclusivamente pela ciência) e “mente” ou “alma” (objeto de estudo da filosofia e da religião). Mais recentemente, a mente humana tornou-se objeto de estudo dos psiquiatras e dos cientistas do comportamento ( no lugar dos pastores e religiosos), enquanto que o corpo – visto cada vez\ mais como uma máquina animada – passou a ser estudado pela ciência médica com sua tecnologia diagnóstica, o que significa que, basicamente, o dualismo persiste.
II-METODOLOGIA DAS METÁFORAS DAS
DOENÇAS
1) A existência na zona rural e urbana de DOENÇAS
POPULARES atreladas á tradição popular e inalterada pelo modelo médico. Doenças graves e de risco também se tornaram “ doenças populares”(câncer, as doenças cardíacas e a AIDS).
2) ASSOCIAÇÃO DAS DOENÇAS: a)na imaginação das
pessoas; b)a crenças tradicionais, versando sobre: c)a natureza moral da saúde, da doença e do sofrimento humano;
3) SIMBOLISMO: doenças difíceis de tratar ou controlar, que se
referem a:
a) grande parte das ansiedades mais comuns das pessoas; b) o
medo como inimigo comum (político, econômico, social, ideológico, etc); c) o colapso do ordenamento da sociedade; d) de uma invasão, ou; e) de uma punição divina;
4) MATÁFORA , preconceito e estigma NA MENTE DAS PESSOAS:
são mais do que uma condição clínica são uma metáfora para os diversos perigos da vida cotidiana:
a) Metáfora, segundo o Aurélio (1986), consiste na
transferência de uma palavra para um âmbito semântico que não é o do objeto que ela designa, e que se fundamenta numa relação de semelhança subentendida entre o sentido próprio e o figurado.
b) Estigma pode ser entendido como uma cicatriz, marca,
sinal que uma determinada doença física ou psíquica representa numa pessoa ou num grupo. Ex: os estigmas da varíola, da lepra, da AIDS, etc.
c) Preconceito são crenças a respeito de membros de um
grupo étnico identificados segundo suas qualidades indesejáveis (Alport,1954:1979), exemplo como “nego”, “ polaco” “baiano”,etc. d)Discriminação é o tratamento diferencial dos outros por causa de sua etnia e, mais particularmente, é a negação aos membros de um grupo étnico á igualdade de acesso aos recursos de valor, como habitação, empregos, educação, renda, poder e prestígio. O preconceito alimenta a discriminação; e seus atos são freqüentemente justificados por preconceitos(Turner1999:121-122).
5) As doenças tornaram-se metáforas para tudo que não é
natural considerado social ou moralmente errado na sociedade.
a) Na Idade Média as doenças epidêmicas, são consideradas
como metáforas da desordem social, um colapso das ordens religiosa e moral; b)Nos Séculos XVIII e XIX a sífilis, a tuberculose e o câncer foram usadas como metáforas do mal; c)No Século XX, o câncer, na mídia e no discurso literário e popular ganharam o seguinte contorno: 1) possessão demoníaca; 2) os tumores são malignos ou benignos como “forças”; 3) os pacientes sentem-se aterrorizados; 4) procuram curandeiros religiosos para exorcizar; 5) “câncer” forma demoníaca que destrói, gradualmente o tecido social.As terapias oficiais e as alternativas ( de grupos sociais, étnicos e institucionais) podem ser assim (algumas )discriminadas: a) Xamanismo – entre os indígenas; b) Orixás e Entidades da Umbanda e do Candomblé ( consulta e oferendas); c)Religiões cristãs e católicas- bênçãos, penitência, exorcismo, etc; d) Religiões e Filosofias orientais- trabalho da mente contra o desequilibro corporal ou somatização das doenças;
III- DOR E CULTURA(Helman,1994:165-175)
A dor, de uma forma ou de outra, é parte inseparável do cotidiano, e
provavelmente o sintoma mais comum encontrado na prática médica, onde ela se apresenta como uma característica de muitas transformações fisiológicas normais, tais como a gravidez, o parto e a menstruação, como também de um ferimento ou de uma doença.
Além disso, muitos métodos de cura e de diagnóstico
envolvem alguma espécie de dor, por exemplo, cirurgias, injeções, biópsias ou secções de veia.Mas em cada uma dessas situações a dor é mais do que um processo neurológico: há também fatores sociais, psicológicos e culturais que devem ser considerados..Desta forma, algumas proposições devem ser consideradas como:
• Nem todos os grupos sociais e culturais reagem á dor da
mesma forma; • O background cultural pode exercer grande influência na maneira como as pessoas percebem e reagem á dor, em si mesmas ou em outras pessoas; • Fatores culturais podem também influenciar o modo como as pessoas comunicam a dor, se o fazem aos profissionais de saúde ou a outras pessoas.
a)O comportamento da dor: fisiologicamente, segundo
Weinman(1968), a dor pode ser considerada como uma “ espécie de alerta que chama a atenção sobre uma lesão de um tecido ou um mais funcionamento fisiológico”.(...).Devido ao seu papel biológico da dor, ás vezes assume-se que a mesma independe da cultura, no sentido de que consiste em uma reação biológica universal a um tipo específico de estímulo, como um objeto pontiagudo ou extremos de frio.Contudo, os antropólogos estabeleceram diferenças entre as duas formas de reação:1) uma involuntária instintiva, como o recuo diante de um objeto pontiagudo; 2)uma voluntária, a) a eliminação da fonte da dor e de providenciar no tratamento do sintoma( tomando uma aspirina , por exemplo); b) requerendo a ajuda de outra pessoa para aliviar o sintoma.
b)Tipos de comportamento da dor:
1) A dor privada, segundo Engel (1950), é um dado privado,
onde dependemos de uma demonstração verbal ou não-verbal, por parte da pessoa, a respeito do fato. Quando isto acontece, a experiência e a percepção privada da dor tornam-se um acontecimento público e social: a dor privada transforma-se em dor pública.(...).em algumas culturas, a capacidade de suportar a dor sem esquivar-se, isto é sem manifestar o comportamento de dor, por ser um sinal de virilidade, e faz parte dos rituais de iniciação que marcam a transição do menino em homem.(...).Outras formas menos dramáticas de ausência do comportamento de dor ocorrem em indivíduos semiconscientes, paralisados ou em bebês muito jovens para expressar seu sofrimento, ou ainda em situações em que tal comportamento possa ser mal recebido por outras pessoas.Portanto, a ausência do comportamento de dor não significa necessariamente a ausência da “dor privada”.
2) Dor pública, e o seu comportamento, e particularmente,
seus aspectos voluntários, é influenciado por fatores sociais, culturais e psicológicos, determinando: a) se a dor privada será traduzida em comportamento de dor e, b) a forma que tal comportamento assume bem como as condições sociais em que ocorre.
3) Aspectos sociais da dor: deve-se considerar que a dor
pública implica em relação social, duradoura ou não, entre o indivíduo com dor e outra pessoa ou pessoas. A natureza desta relação determinará se a dor será revelada em primeiro lugar, como será revelada e a natureza das respostas á mesma. Segundo Lewis(1981), as expectativas do indivíduo com dor são importantes nesse caso, principalmente em relação às reações possíveis a sua dor, alem dos custos e benefícios sociais de sua manifestação: “As chances de solidariedade e preocupação, como também o deslocamento da responsabilidade da doença para outras pessoas influenciam no modo como a doença será revelada”(...).
Os tipos permitidos de comportamento de dor numa
sociedade são aprendidos na infância, e, segundo Engel, (1950) ela desempenha um papel importante no pleno desenvolvimento psicológico do indivíduo: “ A dor está... intimamente relacionada com o aprendizado sobre o meio ambiente e seus perigos...e sobre o corpo e suas limitações”. A dor é parte integrante de todos os relacionamentos precoces: na infância provoca o choro, que provoca uma resposta por parte da mãe ou de outra pessoa. No início da infância, dor e castigo estão ligados: a dor é infligida pelo mundo adulto devido a um “ mau” comportamento. A for pode assim significar que ele é mau e, por isso, deve sentir-se culpado e tornar-se um meio importante de “ reparação da culpa”.
Ela está presente também nas relações de agressão e poder,
assim como nas relações sexuais. Engel descreve o “ paciente propenso á dor: ele é particularmente sujeito á dor “psicogênica” e, sua personalidade caracteriza-se por sentimentos de culpa intensos. (172).
d) Aspectos culturais do ESTRESSE:
Segundo Selye(1936), o estresse representa a resposta
generalizada do organismo às exigências ambientais.É um mecanismo fisiológico inerente, que prepara o organismo para reagir em face dessas exigências.Nem todo estresse é prejudicial; em nível mais moderado (eutress), entretanto, a reação pode causar mudanças patológicas, e até a morte.A influência ambiental real que produz o estresse seja física,psicológica ou sociocultural é denominada de fator estressante. Selye descreveu a seqüência de eventos através dos quais um organismo responde a um fator estressante como a síndrome generalizada de adaptação (SGA). De um modo geral, essa síndrome apresenta três estágios:
a) o estágio de alarme, em que o organismo se conscientiza da
presença de um estímulo nocivo específico; b) o estágio de resistência ou adaptação, no qual o organismo recupera-se em um nível funcional superior àquele anterior ao estresse; c) o estágio de exaustão, em que o processo de recuperação, sob o efeito contínuo dos fatores estressantes, não são mais capazes de atingir e restabelecer a homeostase. Neste estágio final as mudanças fisiológicas ocorridas já se tornaram patológicas, resultando em doença ou morte. (...) Embora seja muito utilizado como modelo básico para todas as pesquisas sobre o estresse, o modelo original de Selye foi criticado em vários aspectos, particularmente por supervalorizar as dimensões fisiológicas de resposta ao de estresse. Os psicólogos como Weinnan(1981) ressaltam a importância de respostas psicológicas ou estratégias de manejo do indivíduo ao se confrontar-se com um fator estressante.Estas variam desde um estado de choque inicial, com ansiedade ou sensação de perigo iminente, passando por tentativas de lidar com a situação desagradável ( em nível subjetivo), até uma variedade de reações psicológicas mais estremas, tais como depressão, isolamento, suicídio ou apelação para tranqüilizantes químicos. Todas essas respostas são influenciadas pela personalidade, experiência, escolaridade, ambiente social background cultural do indivíduo, que como tais, são objeto de maior interesse para o cientista social do que as respostas puramente fisiológicas ao estresse.(Helman:1994:247-248).
1) Fatores que influenciam a resposta ao estresse: mo modelo de
Selye, o estresse representa uma resposta patológica ás exigências ambientais, mas que, no entanto, essa resposta é mediada por uma série de outros fatores, dentre eles: a) as características individuais; b) o ambiente físico em que o indivíduo vive; c) o amparo social de que dispõe; d) seu status econômico; e) seu background cultural;( idem,252-253).
2) Estresse “culturogêrnico”: a cultura pode tanto proteger o
indivíduo do estresse quanto torná-lo mais vulnerável ao mesmo. Ou seja, determinadas crenças, valores e práticas culturais podem aumentar o número de fatores estressantes aos quais o indivíduo se expõe. Por exemplo, cada cultura tem sua própria definição de “sucesso” (em oposição ao “fracasso”), “prestígio”( em oposição ao “ desprestígio”), “ bom comportamento” ( em oposição ao “mau”) e de “boas notícias” ( em oposição às “más”). Tais conceitos variam consideravelmente de uma sociedade para outra.(...).
Em cada sociedade, os indivíduos tentam atingir as metas
definidas, os níveis de prestígio e os padrões de comportamento que o grupo cultural espera dos membros, e, um fracasso na conquista destas metas(mesmo que pareçam absurdos a indivíduos de outras sociedades) pode gerar frustração, ansiedade, depressão, e até o complexo de desistência do desistido”, descrito anteriormente.
Algumas crenças podem constituir fatores diretos de estresse, como
o caso de um indivíduo ser amaldiçoado ou enfeitiçado por outro, mais poderoso, contra o qual ele tenha poucos recursos de defesa.(...) outros valores culturais que podem induzir ao estresse são: supervalorização de atividades do tipo de guerra ou disputa acirrada por um pretendente, por dinheiro bens ou prestígio. A distribuição desigual de riquezas numa sociedade, determinada pela “cultura econômica”, geralmente constitui fator de estresse para a população mais pobre, cuja vida se resume numa luta diária pela sobrevivência. (Helman:1994254-255).
IV-INTERAÇÃO E REPRESENTAÇÃO DRAMÁTICA DO EU
4.1 MEAD(1934)- segundo o autor, a interação ocorre , através da
emissão de sinais e gestos, quando: a) um corpo emite sinais ao se mover em seu meio ambiente; b) outro corpo vê esses sinais e altera seu curso de ação em resposta a eles, emitindo , assim, seus próprios sinais; e, c)o corpo original torna-se consciente dos sinais desse corpo secundário alterando seu curso de ação à luz desses sinais.(...).Também pensava que os homens interagem num modo único e especial, e os sinais que os homens enviam, lêem, recebem e respondem são simbólicos na medida em que eles significam a mesma coisa para o corpo que envia e para o corpo que recebe.(...).
Mead observou que a capacidade de ler gestos
simbólicos permite que os homens absorvam papéis ou assumam o papel do outro.O que ele queria dizer é que, pela leitura dos gestos alheios, podemos nos imaginar em seu lugar; podemos assumir seu ponto de vista e ter uma percepção do que é provável que eles façam.(...).Todos nós assumimos papéis em toda situação, mas geralmente não temos a consciência desse processo até que nos encontremos numa situação complicada em que hesitamos a cada palavra e gesto emitidos pelos outros.(...) isto é interação simbólica e é o meio pelo qual nos ligamos dentro da cultura e seus valores, crenças e normas.
Outros processos, segundo Mead, devem ser enfatizados e
envolvidos na interação humana, como (1)a mente humana, como um processo oculto nos bastidores da ação que antecipa as conseqüências da escolha de um curso de ação; assim com base nessa avaliação prévia, escolhemos ou selecionamos uma ação específica, ou ela apresenta como um ensaio imaginário, no qual , como qualquer bom ator que vá interpretar, ensaiamos nossa ação de diferentes formas e, avaliamos a reação da platéia a essas alternativas.(...); (2) outro processo rotulado pelo autor é o EU, pelo qual nós nos vemos a nos mesmos como um objeto em cada situação em que nos encontramos, exatamente como vemos outros objetos, pessoas, carros, cadeiras, casas etc.;(3) o eu refletido, , configura-se como os gestos dos outros, ou um espelho no qual nós o vemos refletidos; (4) cada um de nós tem uma auto-imagem que é a nossa percepção dos gestos dos outros e seus gestos reais, que molda nossos comportamentos a fim de não violar essa imagem.(...).Em síntese, o homem se revela e se reconhece nas relações com outro e com as coisas por meio de símbolos.(Tumin,1999:63-64). 4.2 A REPRESENTAÇÃO DRAMÁTICA DO EU: Goffman(1959)
Visto que todos nós somos atores num palco,
orquestramos nossas emissões de gestos para nos representar sob uma certa luz, como um certo tipo de pessoa, e como um indivíduo que espera certas reações dos outros.Alguns de nós são, é claro, melhores atores do que outros.(...) Goffman apresenta e distingue alguns espaços de interação entre o palco e bastidores como :
a)no palco, as pessoas constantemente manipulam e orquestram os
gestos de modo a trazer à tona reações desejados dos outros, reações que sustentam sua auto-imagem e que correspondem à exigências normativas da situação;
b)nos bastidores, as pessoas relaxam um pouco e tiram suas
máscaras.Eles permitem alguma privacidade com companheiros que compartilham as dificuldades de subir ao palco.para Goffman, muitas interação acontece nas idas e vindas entre os bastidores e o palco. Se você duvida disso, examine suas próprias rotinas diárias.Você está nos bastidores quando está se preparando para ir à escola, no banho, com escova de dente, secadores de cabelo. bobs, maquiagem, desodorante e gel para cabelo.(...).Sem os bastidores, a vida seria extremamente estressante, e , ainda, sem o palco, a organização social seria problemática;
c)o uso de adereços físicos, no qual o nosso corpo faz parte
dele.Um grupo de pessoas de um círculo fechado, ao interagir está dizendo algo às pessoas fora desse círculo; duas pessoas que andam juntas, de mãos dadas, estão numa interação muito diferente do que outro casal que mantém alguma distância um do outro,etc.(...).Assim, como posicionamos nossos corpos em um gesto, o qual “ diz algo” sobre o fluxo de interação, e suamos “linguagem corporal” , posição olhares, toques e outras insinuações para criar significados sobre o que está acontecendo;
d)objetos no espaço, é outro adereço que se apresenta nas mesas,
cadeiras, paredes, portas, divisórias e qualquer coisa que seja objeto físico que comunique alguma coisa sobre uma interação;
e)outro adereço é o vestuário, que diz muito aos outros e, como
conseqüência, estrutura o fluxo de interação.Reagimos e respondemos muito diferentemente a um professor usando paletó e gravata do que a um vestido informalmente. Os vários tipos de vestuário, emblemas de associações distintivos atléticos, dizeres em camisetas, etc. todos influenciam de modo sutil o fluxo de interação; f)outro aspecto da teatralização é o que Erving Goffman(1959) chamou de manipulação de percepções em que orquestramos gestos, estruturas de palco e posição de corpo para apresentar uma fachada, para mostrar determinado eu à nossa platéia e para receber certos tipos de reações.Então, quando estamos no palco, gerenciamos nossos gestos e outros adereços disponíveis. Tal manipulação dá ao comportamento de cada pessoa uma coerência, facilitando a sintonia de comportamentos.É claro que, como enfatizou Goffman, as fachadas podem tanto manipular quanto decepcionar, como por exemplo quando um “ homem de bem” apresenta uma fachada que mascara suas intenções verdadeiras de roubar. Todos nós fazemos isso às vezes, espero que em menor grau, mas ainda nos percebemos apresentando uma fachada que não é lá muito verdadeira. (Tumin:2000:64-66).
5 - SOCIEDADE DA COMUNICAÇÃO E DE CONSUMO:
5.1 A comunicação de massa deve ser caracterizada,
fundamentalmente, com base em seus contornos gerais, ou seja, pela forma como ela é definida por seus produtores e pelo modo como ela é recebida pela sociedade. Segundo as conceituações mais genéricas da Teoria da informação, ela é uma forma de comunicação social voltada para ampla faixa de público, que é anônimo, disperso e heterogêneo.Nesse sentido, para atingir esse público, deve-se voltar- se prioritariamente para a obtenção da chamada grande audiência, pelo recurso à utilização de seus meios e técnicas de difusão coletiva. (Ferreira:2001:168)
(...)Quanto à forma como é definida por seus produtores,
antes de qualquer consideração, a comunicação de massas é um negócio definido pelas convenções e regras, que são estabelecidas pela lógica do mercado, ou seja, ela é uma atividade empresarial como qualquer outra, sustentada pelos aportes de publicidade e da propaganda. A redução da presença do Estado, ela é cada vez menor em todo o mundo; as atividades de comunicação social comprova esse fato. De qualquer forma, qualquer consideração a ser feita sobre os produtores de comunicação de massa deve partir desse seu caráter capitalista essencial: na condição de negócio, ela deve dar lucro a quem investe em sua produção.
As implicações que podem ser inferidas dessa constatação são
evidentes e produzem impactos importantes em todos os setores da vida social, notadamente no âmbito cultural: os meios divulgam(comunicam) apenas os produtos, que são considerados vendáveis: de uma notícia a uma tela de teatro, de um filme a um espetáculo musical, de uma forma de conexão à rede mundial de computadores a um candidato a qualquer cargo eletivo na vida política. Essa redução da comunicação ao mero caráter de mercadoria, vendável ou não, “coisifica” indivíduos, destrói identidades culturais coletivas centenárias ou milenares e tenta impor uma lógica de pensamento único, para a qual pretende não oferecer saída: a sociedade só existiria do ponto de vista de sua finalidade, para comprar e vender em escala global. .(idem:169).
5.2 A sociedade do consumo e o individualismo: a sociedade de
consumo atual existe e caracteriza-se por possuir uma única finalidade: produzir mercadorias para serem vendidas, continuar produzindo mais mercadorias, a qualquer modo e custo, vendê-las indefinidamente. Seu círculo produtivo, virtuoso para alguns e vicioso para outros, engloba todos os aspectos de suas relações sociais, constituindo uma espécie de teia fundada unicamente nos atos de produzir e adquirir mercadorias, que se tornam, por isso, o fio condutor central de todas as relações humanas dessa sociedade, que é estruturada com base na lógica da reprodução do capital. Esse é o sentido dado por alguns autores, quando conceituam esse tipo de organização social como sociedade produtora de mercadoria. Trata- se em termos objetivos, de uma sociedade que encara a produção de bens apenas e tão-somente para o atendimento do que foiçou convencionado designar de demanda de mercado, que é o que define esses bens como mercadorias. Nesse sentido, a sociedade de consumo consiste e é reduzida a um grande mercado, ou negócio, no qual só sustenta a vida e existe quem tem algum objeto para vender ou algo a comprar.(idem:185).
(...) Uma vez que esses valores ( liberdade e igualdade, a
competição, a concorrência e as vantagens nas situações de mercado) modelam e orientam a ação de indivíduos, instituições e empresas, o individualismo leva ao descompromisso ou ao compromisso meramente mercadógico com as causas e as necessidades públicas e coletivas; a competição, por sua vez, leva todos à condição de adversários potenciais ou declarados, em uma espécie de luta darwinista por privilégios a serem ávida e devidamente consumidos, transformados em uma entidade econômica atomizada,denominada mercado, os indivíduos estão sós, tornam-se ilhas cercadas de coisas e objetos por todos os lados, ou ilhas sem mar em volta quando estão na condição de não poder consumir(Ferreira:2001:187).
5.3 O ato de consumo, que no passado referiu-se à utilização de
objetos que atendiam ás necessidades humanas vitais, foi convertido em consumismo e colocado, como foi definido, em uma espécie de pedestal sagrado mercantilista, por meio da imposição de uma luta incessante dos indivíduos pela posse de bens materiais. A sacralização do consumo e o “ culto dos objetos” são devidamente articulados pelas mensagens da propaganda divulgadas no mercado pelos sistemas de mídia e objetivam a manutenção, a eficácia, a reprodução e a perpetuação da sociedade produtora e consumidora de mercadorias.(idem:189).