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FONTE: http://www.ipv.pt/forumedia/4/7.

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Valores e Educação num mundo em Mutação


(Aproximação levinasiana)

André Veríssimo

Investigador Universidade do Porto, GFMC;

Prof. da ESJ e de Pós-Graduação em Jornalismo (Filosofia da Ciência), UP.

1. São já numerosos os pensadores que se debruçaram sobre a problemática educacional


dos valores. Educar nos valores e para os valores - que homem e para que sociedade,
para que mundo, para que futuro?

A construção de um sistema de valores e a aquisição dos conhecimentos, atitudes e


capacidades necessárias à cidadania, numa sociedade democrática, ilustrariam as duas
faces da auto-realização: a face interna ou expressiva que visa, sobretudo, responder às
necessidades, motivações e regulações interiores, e a face externa ou adaptativa que
visa, sobretudo, responder às exigências, pressões e critérios do ambiente

Alerta-se para as duas vertentes constitutivas do ser humano - personalização e


socialização - a que a educação imperiosamente deve atender, qualquer que seja a via de
auto-realização do educando.

Joel Rosnay um dos nomes associados a teorias de tendência sistémica e ecológica, nos
seus livros O Macroscópio (1977) e Caminhos da Vida (1984) faz a apologia dos
valores que emergem na sociedade organizada com base no pensamento; este permite
uma visão global do mundo associada a uma abordagem unificadora, capaz de integrar
os contributos oferecidos pela ecologia, pelas teorias dos sistemas e da informação. 1

Abandonando abordagens de carácter linear, preconiza uma abordagem centrada nas


interdependências e apresenta uma teoria sistémica da educação, integrada numa visão
global do mundo. Para este autor, a educação sistémica considera o homem na sua
multidimensionalidade. Em termos práticos, esta forma de conceber a educação, evitaria
definições muito precisas, que podem ameaçar a imaginação. A educação deve procurar
sempre uma visão integrada dos saberes e relacionar entre si os factos e os
conhecimentos a adquirir. Enquanto a primeira perspectiva acentua os valores centrados
na auto-realização da pessoa-em-sociedade, Rosnay frisa a importância da correcta
articulação entre a diversidade dos valores e a complexidade da realidade factual.
Toffler (1984) coloca, argutamente, o problema de um futuro, certo e desconhecido,
onde será preciso, com as competências de hoje, lidar adequadamente com o ainda-não-
mudado, a mudança e o já-mudado.

Alvin Toffler (1984), perspectiva a relação entre a educação e a sociedade em termos de


futuro. Diz-nos que o amanhã será, forçosamente, diferente do hoje e que não se pode
conceber uma educação em ordem ao futuro com base em imagens do passado ou do
presente. A educação compete desenvolver a capacidade de adaptação à mudança. Isto
supõe uma interacção constante entre a escola e a comunidade. Daqui se deduz que a
escola, nos seus diversificados sub-sistemas, deve reconhecer, teórica e praticamente, o
alcance educativo de actividades, consideradas muitas vezes não produtivas, como, por
exemplo, as ecológicas.

O problema educativo assume um carácter fundamental e prioritário para quem acredita


que é possível uma sociedade diversa da existente, de modo que integre as diferenças,
supere as contradições e estimule um reconhecimento mais efectivo da importância
máxima e ímpar do ser humano. Que exigências coloca aos alunos o mundo de amanhã?
Que tipo de estrutura terá capacidade para os acompanhar, de modo a sentirem-se
realizados como alunos, valorizados na sua pessoa, enriquecidos com instrumentos
aptos e novos para o mundo novo, de morte/transmutação do velho, de um tempo novo?

Heidegger repete em profundidade esta tradição, propõe uma notável rearticulação da


mesma. Os saberes antropológicos tratam da morte segundo a cultura e a história;
supõe-se que os saberes biogenéticos tratam da morte segundo a natureza. Todavia, por
necessários e ricos que possam ser, semelhantes saberes devem pressupor, diz
Heidegger, um conceito da morte propriamente dita.

O conceito mesmo de cultura pode parecer sinónimo de cultura da morte, como se, a
cultura da morte fosse um pleonasmo ou uma tautologia. Porém semelhante
redundância é a única que pode fazer que se leia a diferença cultural e o encerramento
dos limites. Porquanto que toda cultura significa um tratado ou um tratamento da morte,
cada uma delas trata do fim segundo diferentes segmentos. A diferença entre a natureza
e a cultura mesmo no caso entre a vida biológica e a cultura entre o homem e o animal,
é como costuma pensar-se de modo habitual de acordo com a doxa filosófica - a relação
com a morte e transmutação das civilizações -- a verdadeira fronteira do humano estaria
aí! ( Jacques Derrida, In princeps). O instrumento da civilização é a educação.

Não se pode pensar em (in)sucesso escolar/social sem pensar em aprendizagem. Por


aprendizagem entendemos a "capacidade que pomos em acção quotidianamente para
dar respostas às solicitações e desafios que se nos colocam devido às nossas interacções
com o meio" (Pinto, 1992: 17). E a acção envolvente pressupõe uma ética do agir
condicionado a valores. "Actualmente, a palavra usa-se fundamentalmente em três
sentidos: a) no sentido de ordem moral ou ordem ética, entendida como a totalidade do
dever moral; b) no sentido de estrutura fundamental de ideias morais ou ideias éticas,
reconhecidas por um indivíduo ou por um grupo; e) no sentido de conduta moral
efectiva de um indivíduo ou de um grupo, ou seja, como moral efectiva." (Patrício,
1993: 155).
A relação fundamental do homem - fundamental, porque é ela que funda qualquer outra
- é a relação ética, que é a relação com o Bem. A ordem por que estes mandamentos é
apresentada não deixa dúvidas sobre a qual pertence o primado. Já se pode perguntar se
a experiência ética da pessoa humana começa pelo primeiro ou pelo segundo. Diremos -
e julgamos dizê-lo, em consonância com o personalismo ético de Emmanuel Levinas -
que começa pelo segundo. Por outro lado, também se pode perguntar se é possível amar
a Deus sem esse amor se repercutir no próximo - que é o ser humano com quem me
cruzo na vida. Para Patrício (1993) a doutrina axiológica de Nicolai Hartmann sustenta
a independência dos valores estéticos face aos lógicos e aos éticos. O mundo dos
valores é uno e coerente. Assim, todos os valores convergem para o núcleo axiológico
central. Esse núcleo é o Bem.

E a tese fundamental de Emmanuel Levinas, o cerne do seu cogito ético: sou


responsável pelo outro, pelo próximo, sou responsável pelo seu bem. O egoísmo é, deste
modo, recusado e superado. A relação ética é, na sua essência, uma relação altruísta. A
projecção desta posição na relação pedagógica transforma o educando no objecto e
centro dos cuidados éticos e pedagógicos do educador. O educando é, no fim de contas,
o próximo. Um próximo assaz próximo: não apenas alguém com quem o educador se
cruza na vida, mas alguém que lhe é entregue, que se lhe entrega, a ele em quem se
confia plenamente.

Enquanto intervenção intencional no devir antropológico, a educação perderia sentido


sem a crença na possibilidade de aperfeiçoamento humano. Uma possibilidade que pode
sempre ser posta em causa pelos limites que são inerentes à vontade humana. A ideia de
limite, a ameaça do nada, é uma constante na vida do homem, marcando profundamente
o seu caminhar no mundo. Mas acontece que se a ideia de excepcionalidade do ser
humano não anula a da sua perenidade, o inverso é também verdadeiro. A vida humana
é marcada pela finitude, mas também pela infinitude.

É a crença na possibilidade de evolução do homem que dá sentido ao projecto


educativo, e é a responsabilidade de caminhar nesse sentido, superando toda a
insegurança, que justifica o seu estatuto ético.(...). Recorrendo a palavras de Edgar
Morin, diremos que a abertura, brecha sobre o insondável e o nada, ferida original do
nosso espírito e da nossa vida, também é a boca sequiosa e esfomeada pela qual o nosso
espírito e a nossa vida desejam, respiram, se dessedentam, comem, beijam (1975,p.213).
A insegurança e a incerteza são pois constitutivas dos nossos modos de viver. Como
também o são a esperança, o desejo e a utopia. (...).

Evidenciamos mais uma vez a ideia de uma preocupação humanista ligada à


problemática educativa. A educação é humanista por natureza e por condição.2

Todavia, uma análise mais subtil põe à vista que o educador é para si mesmo o seu
primeiro próximo. A experiência levinasiana do «face a face», do «olhos nos olhos», é
aquela que ele tem permanente e intrinsecamente consigo mesmo. Cada qual começa
por ser responsável por si mesmo. E quanto mais êxito tiver nessa auto-responsabilidade
mais apto fica a ser responsável pelo outro. Por outro lado, quanto mais alta for a
efectivação da sua responsabilidade pelo outro mais o próprio é responsável por si. De
qualquer modo, o próprio é o primeiro outro de e para si mesmo. Cuidar de si,
eticamente, é já cuidar eticamente do outro. Aplicada esta doutrina ao educador, vê-se
que a sua própria pessoa ética não é dissociável da pessoa ética do educando nem do
trabalho educativo propriamente dito. Não é possível, a esta luz, separar o processo de
aperfeiçoamento do educando do do educador. Aquilo a que se chama formação
continua de professores pode ser apenas - e é-o no pensamento da maioria dos que
falam nela - a visão degradada dum processo de formação bem mais exigente e
complexo: o da formação integral como pessoa do educador. Assim, a formação
continua faz parte dum processo ético radical, que tudo inclui. É que as exigências que o
outro - o educando - faz ao educador são exigências que este tem de fazer a si próprio: o
apelo profundo do educando ao educador é, em todos os instantes, ético, como será
psicológico ou psicoterapêutico.

O interesse imenso de Emmanuel Levinas com o encontro face-a-face foi inicialmente


concebido como fundacional. Como obra de (auto)identificação. é possível ao eu
identificar o mundo como exterioridade que pode ser assimilada e transformada, numa
palavra, anexada a si, iniciando o processo de redução ao Mesmo, como totalização.
Além disso, o recolhimento "em casa' é solidário da descoberta da particularidade e
dependência do eu em relação ao todo, aos indivíduos com necessidades educativas ou
afectivas, a todo o Outro, desencadeando um movimento de sentido inverso à involução.
E também uma postura primitiva, traduzida na imposição dos seus próprios parâmetros
à realidade exterior. Deste modo, à posse imediata da fruição, onde aquilo que é fruído
não se distingue do próprio acto de fruição e aquele que frui é, também, fruído, sucede-
se a posse à distância, pela separação entre o objecto a fruir e o acto de fruição. A casa
é, justamente, a instância que transforma o acto-objecto da fruição em objecto para ser
fruído, num tempo indeterminado, sendo a possibilidade de projectar um futuro e de
conceber uma actividade teleológica que conduza à sua concretização consequências de
uma subjectividade habitante do mundo.

Por conseguinte, "toda a liberdade da habitação deriva do tempo que resta sempre ao
habitante. O incomensurável, isto é, o incompreensível formato do meio deixa tempo. A
distância em relação ao elemento a que o eu está entregue só o ameaça na sua morada,
no futuro"3. Por outras palavras, o futuro insondável que pairava sobre o instante de
fruição, tio presente como ela, passa a conceber-se como futuro, isto é, como algo que
ainda não é (presente) e contra o qual o eu pode mobilizar a sua energia para transmutar
o "definitivo" em "não-definitivo". Isto é sempre o objecto de estudo no tempo infindo
do acto educativo. Ora, o trabalho exprime, precisamente, o tempo que adia o perigo do
elemento, dominando-o, até transformar por completo a sua natureza insondável em
pura indeterminação, mero receptáculo de toda a determinação possível. A paciência
que devemos mover para iluminar e proporcionar aos outros o ser mesmo que
desabrocha em cada atitude e crescimento do conhecimento ou da compreensão.

Nas escolas, como em todas as instituições restantes, a atenção é prestada somente à


universalidade do dito. O conhecimento que pretendemos dos nossos estudantes ganhar,
existe completamente dentro dos seus limites; as potências-hierarquias tentam tornar o
Dizer invisível atrás da diluição do dito, prometedor para as acções cometidas no
anonimato da descrição do título e do trabalho. O professor negligente, por exemplo,
pode evitar a responsabilidade para estudantes individuais identificando com uma
fábrica os ciclos repetitivos da escola de feição taylorista! Para os estudantes torna-se "
apenas uma outra aula de matemática da manhã de segunda-feira", e transforma-se
então apenas num outro professor de matemática. O que busca os curricula da prova
mostra somente como o sonho educacional "o mais seguro" dos trajectos oblitera o
Dizer com o dito.
Contudo não há nenhum dito sem dizer. No Dizer nós somos vulneráveis aos outros
desconhecidos - a nossa dependência deles, e a responsabilidade para com os outros são
expostas. Quando as palavras do Dito me falham, eu estou exposto como o que Diz. A
língua falha-me recusando significar o outro -- o que eu o quero significar. Neste
aspecto, inconfinável a uma comunicação, as reivindicações de Levinas, são uma
esperança. O Dizer pode também ser revelado atrás do dito, Levinas escreve, " na
resistência ética " oferecida pelo Outro que: " pode opor-me um esforço, isto é, opor à
força que o golpeia não uma força da resistência, mas a extrema imprevisibilidade da
sua reacção " (TI).

2. As ajudas de Alphonso Lingis para explicar um outro aspecto do Dizer recolhe as


suas experiências na sua matriz no leito de morte. Nenhuma palavra pareceu apropriada
- será "seja, Mamã! " - mas contudo sentiu que teve que falar. " Qualquer coisa que
alguém tenta dizer nos sons vácuos e absurdos pela sua própria boca " escreve: o
problema não é simplesmente que você não tem as habilidades no discurso ou que você
não realiza as coisas direitas; dizer porque você não tem nenhuma experiência neste tipo
da situação, mas que a língua própria não tem tais potências. Não há, nas palavras e nas
possibilidades combinatórias da língua, a potência de dizer o que tem que ser dito.
Contudo você tem que estar lá, e você tem que dizer algo." (Lingis, 1994, 108).

Em tais situações, então, não há nenhum dito adequado. Ainda, no imperativo em falar
o que nós sentimos, nós encontramos uma situação em que é o Dizer que importa.
Importa que eu estou lá, falando, compartilhando de uma proximidade e de uma
incerteza com o Outro. Este sozinho, testemunha à saciedade como nós estamos
implicados em cada das outras vidas.

Levinas anota que nós todos estamos carregados em um mundo do Dizer maternal; que
alguém está dizendo que algo nos importa por muito tempo antes que nós possamos
dizer o que está sendo dito. Esta interacção ética vulnerável não ocorre numa relação
trans-espacial à outra de que pode ser compreendido nos termos da geometria euclidiana
- nenhuma compreensão planeada de ser separado do Outro é inata. Antes que nós
possamos conceber tal separação é que nós estamos na proximidade, Levinas afirma. E
é neste muito incerto caminho que a mesma proximidade contudo responsável, em que
nós estamos e nos recolhemos em nossas falhas de articulação. O Dizer expõe a nossa
não-separação do Outro. Desde que eu não posso separar-me de outro, eu não posso
rejeitá-lo como eu posso por exemplo jogar afastado de alguma coisa.
Consequentemente, eu não posso limitar a minha responsabilidade para o outro com
quem eu estou face-a-face. A minha responsabilidade para com eles adere-me além de
meu controle. Eu sou Guardião do meu irmão.

Como Levinas, Noddings reconhece que o importar-se ético deriva de " de se importar
natural " que brilha acima e por se elevar do amor maternal. Escreve: " nós amamos,
não porque nos é requerido amar mas porque o nosso relacionar natural dá nascimento
ao amor. É este amor, este importar-se natural, que faz o possível Ético. Noddings
reconhece também algo como a resistência ética de Levinas na abertura da conversação.
Escreve: o diálogo é aberto-fechado; isto é, num diálogo genuíno, nenhuma parte sabe
da disposição que a vontade é - do seu resultado.

Levinas e Noddings ambos tentam discutir sobre uma incorporação suave do encontro
ético radical do cuidado dentro de um projecto ético maior, provavelmente ecológico.
Perdem o seu empiricismo no ponto em que se movem do natural, empírico,
importando-se. No caso de Levinas, isto ocorre na sua tentativa de reconstruir uma
racionalidade do face-a-face. Para Noddings, entretanto, a diferença vem com as
tentativas de ver os outros como uma pessoa com a sua subjectividade e com possuir o
seu ego. Isto põe-na outra vez em probabilidades de acordo com Levinas. A sua
diferença face a Levinas, entretanto, trá-la mais perto das escritas de Derrida. Isto faz
deste exemplo uma exigência para uma ética aporética da hesitação que possa expandir
a nossa compreensão em se importar com a educação e com o Outro.

Para entender a especificidade dos valores éticos na educação temos de recorrer ao


qualificativo de bom como nos ensina Patrício ( 1993: 155 ss.) Quando dizemos de
alguém que é bom, apontamos desse modo para a sua dimensão ética global. Escreveu
José Luís Aranguren, a este respeito: «A palavra que, imediatamente, faz parte do
vocabulário moral usual não é o substantivo o bem, mas o adjectivo». Escreveu
Aristóteles: «Toda a arte e toda a investigação científica, bem como toda a acção e
escolha parecem tender para algum bem (...). Relativamente à nossa vida, o
conhecimento desse bem é coisa de suma importância e, tendo-o presente como os
arqueiros têm o alvo, acertaremos melhor onde convém» (Aristóteles, Ética
Nicomaqueia, Livro 1, 1 e 2).

Os investigadores não adoptam uma visão unitária da aprendizagem. Não admitem a


existência de um único processo orientador de todas as formas possíveis de
aprendizagem. Por isso, ao longo dos tempos, têm desenvolvido, teorias explicativas
dos diversos processos de aprendizagem. Têm-se preocupado também com os efeitos e
condicionantes da aprendizagem, com o aprendiz propriamente dito e com as relações
entre todos estes aspectos e os contextos em que ela ocorre.

Tais teorias são muitas e diversas. No entanto, são susceptíveis de classificação ou


categorização em função dos princípios que lhes são comuns. E no plano dos princípios
debatemo-nos ainda com a ética que pressupõe a existência e a compreensão multiforme
do outro. Embora consciente da complexidade do problema e da enorme variedade de
usos linguísticos dos dois grupos de termos, vemos vantagens, do ponto de vista
pedagógico, em fazer alguma distinção entre ética e moral, O vocábulo ética deve ser
reservado para o reino dos valores éticos, incluindo os princípios, as categorias e as
normas, O vocábulo moral deve ser reservado para o comportamento concreto e a
vivência que os homens têm dos valores éticos enquanto sistemas de informação.

3. Para Meyrowitz quanto menor for o número destes sistemas de informação também
menores serão as diferenças entre os distintos grupos sociais. A identidade do grupo,
quando só existiam os media impressos, distinguia-se pela partilha da mesma
informação e de igual acesso a ela entre os seus diversos elementos. Cada grupo criava
restrições à integração de mais elementos se eles não pudessem de algum modo aceder
ao tipo de informação que lhes é comum. A comunicação impressa não protagoniza a
igualdade de acesso à informação visto dirigir-se a um determinado público capaz de
descodificar com facilidade o que lhe é mostrado. Em contradição com a realidade
vigente nos media impressos, os media electrónicos fornecem uma informação que não
é discriminatória ou redutora, pois está ao alcance de qualquer um, sem requerer uma
descodificação complexa. É esta acessibilidade que torna mais fácil e desejável a
integração social. Contudo o reverso também pode existir. Ao mostrar informações
sobre tudo e todos sem restrições, corre-se o risco de surgirem conflitos oriundos de
tomadas de partido sobre determinado assunto e, como consequência, a desagregação
social. A noção de grupo como bloco inacessível e inabalável perde crédito e retira-lhe
o poder de controlar exclusivamente o desenrolar das suas actividades.

Meyrowitz realça, neste contexto, a famosa frase "The whole world is watching", para
mostrar que os efeitos dos conteúdos da informação electrónica marcam profundamente
o seu impacto frente aos princípios morais e políticos estabelecidos. Os benefícios que
daí advêm consubstanciam-se no facto de que o conhecimento sobre os outros pode
desmistificar rivalidades existentes e conduzir a uma empatia pelo outro grupo em
exposição. Este conhecimento generalizado da realidade pode levar a uma autoavaliação
dos potenciais alvos de assunto, alterando os seus procedimentos anormais e
autocorrigindo os seus erros. A identidade de grupo também se reflecte na relação entre
o posicionamento físico e o acesso à informação. Para muitos grupos sociais o contacto
com a informação está dependente da sua localização física. No caso dos prisioneiros,
um dos casos apontados por Meyrowitz, enquanto pertencentes à sociedade
exclusivamente impressa estavam naturalmente interditos ao acesso à informação sobre
o mundo para além dos muros do huis-clos. O seu isolamento devia-se ao facto de
estarem vinculados a espaços particulares.

O ampliar da acção dos media electrónicos e a facilidade de obter os seus emissores,


permitem a sua existência em qualquer espaço e em qualquer altura, possibilitando a
partilha de informações e interacções com os outros. Assim sendo, os media
electrónicos vão retirando aos espaços físicos as características específicas que
tradicionalmente lhes eram conferidas. Os elementos de socialização tradicionais
também perdem a exclusividade das suas funções. A aquisição de conhecimentos é
actualmente multidireccionada e já não pode mais ser premeditada ou pré-calculada. Na
era dos media impressos reduzia-se o seu processo de socialização à escola, amigos e
família sendo fácil ter uma percepção correcta da realidade que a criança conhecia. Com
o difundir do sistema de informação electrónica uma criança chega a ter contacto com
todo o tipo de realidades, às vezes superiores à dos adultos já que tem maior
disponibilidade para tal. ( Vd. Joshua Meyrowitz, 1984. Cap. III).

A ambiguidade da ideologia californiana (L'Idéologie californienne de Richard


BARBROOK et Andy CAMERON, 2000 ) é um cúmulo de visões contraditórias do
futuro digital. O desenvolvimento dos hipermédia é uma composição-chave do próximo
estado do capitalismo. A introdução dos media, da informática e das tecnologias de
telecomunicações nos escritórios e nas fábricas, na sociedade em geral representa na
verdade o fecho de um ciclo dum longo processo de desenvolvimento da força de
trabalho e a sua implicação directa nos processos de produção. Não seria senão por
razões económicas de competição, que todas as grandes economias industriais se verão
constrangidas a religar as suas populações afim de obter benefícios dos ganhos de
produtividade do trabalho digital. O que não se sabe ainda é o impacto social e cultural
desta mutação furiosa que permite produzir e transferir quantidades quase ilimitadas de
informação a uma escala universal. Poderíamos ainda supor que estes hipermedia
realizariam as utopias do problema aberto com o fim das ideologias? Enquanto
manifesto exemplar de uma fé híbrida, a ideologia californiana resolve imediatamente
este enigma fornecendo a crença duma visão holista e não excluindo parcialidades.

Dum lado, a pureza anti-corporativa da nova-esquerda que é preservada pelos


advogados da «comunidade virtual». Mesmo um guru como Howard Rheingold sustenta
que os valores dos baby-boomers da contra cultura estão em vias de desenhar o
desenvolvimento de novas tecnologias da informação. Como consequência, os activistas
comunitários poderão utilizar os hipermédia para substituir o capitalismo corporativo e
o governo abstracticizado e impessoal por uma «economia da dádiva» que se deseja
«high-tech». Segundo Rheingold, os membros da «classe virtual» são sempre a
vanguarda da luta pela liberalização social. Não obstante a implicação comercial e
política destravada na construção da «auto-estrada da informação», a agora electrónica
triunfará inevitavelmente dos seus inimigos corporativos e burocráticos.

Doutro lado os outros ideólogos da Costa Oeste Estadunidense desposaram a ideologia


do laissez-faire do seu amigo conservador de antanho. A Revista Wired - a Bíblia
mensal da "Classe virtual" - reproduziu, sem qualquer reticência as visões de Newt
Gingrich o líder republicano de extrema-direita da Câmara dos representantes, e as de
Toffler, que são os seus conselheiros mais próximos. Fechando os seus olhos sobre as
políticas de restrição serviços sociais, a revista manifesta-se fascinada pelo seu
entusiasmo pelas possibilidades libertárias abertas pelas novas tecnologias da
informação, sustentando uma convergência dos media, da informática e das
telecomunicações que serão transformadas pelo progresso tecnológico dum «monopólio
natural» para um outro em que a competitividade é a regra.

4. Difícil é encerrar a ética da comunicação e a cataláxia dos valores da educação e da


sociedade dentro dum sistema ou inscrevê-la numa corrente que limitaria toda a
constante de novidade e leitura, que o rigor lhe faz recusar as justificações artificiais. É
pois manifesta a sua familiaridade das formas do pensar múltiplo, e da sua memória de
experiência e do modo de pensar, que a ela se ligam e tributam ao pensamento de
Levinas como ao de Meyrowitz uma construção própria, não redutora, dimensão que é
feita dum conjunto de dados filosóficos e re-avaliadores da cultura, que se integram no
pensamento. Outros fundamentos para-lá dos ontológicos, isto é éticos, que inspiram e
dão alento íntimo à alma humana, testemunho duma Tradição do Impensado. Destino
excepcional de homens, duma experiência incomum, que vivem de comum na
totalidade das suas existências, a exigência das categorias do pensamento ocidental, a
todos os níveis: na concepção do Estado, da economia, da cultura, da escolarização, da
arte, da classe social, da profissão (Vd. E. Levinas, 1976, p. 227 ).

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de Ciências Sociais. 6, 75-89.

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TOFFLER, A. (1984) - A Terceira Vaga. Lisboa: Livros do Brasil.


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1 O questionamento que Ferry coloca é o seguinte: surgiu recentemente, segundo uma


designação consagrada, um conceito de ecologia «profunda» que defende a plena
integração dos mundos animal, vegetal e mineral na esfera do direito. Esta concepção
encontrou na Europa partidários de destaque - o já referido Hans Jonas entre eles - e
surge com especial fulgor sobretudo com Michel Serres e com o seu Le Contrat Naturel
(1990), com o que havia recebido o prémio Medicis. Ora a questão que condensa a
problemática que Ferry expôs na obra antes referida é a seguinte: «até onde» se pode
alargar a esfera dos direitos com que a ecologia se identifica? E «quem é» o sujeito
desses direitos? Mas vejamos, é pois pelo confronto com a perspectiva de Michel Serres
que surge a controvérsia entre Ferry e tal concepção, por Serres designada como
«ecologia profunda». É que em acordo com esta nova temática ecológica, acusa Ferry
que se pretende que o contracto social, a base da democracia ocidental, ceda «lugar a
um "contracto natural", em cujo âmbito o universo inteiro se tornaria sujeito de direito:
já não é o homem, considerado como centro do mundo, que se deve, prioritariamente,
proteger de si próprio, mas sim o cosmos enquanto tal que deve ser defendido contra os
homens». O que Ferry procura sobretudo mostrar é que, com uma ordem ecológica
regulada pelas ambições de uma «deep ecology» se desenvolvem outros pressupostos
que convém destacar (urgentemente!): é que há nela uma crítica radical e violenta em
relação a toda a tradição ocidental, num anti-humanismo imposto pelo valor da
natureza, tudo em eficaz combinação com uma cega hostilidade à técnica. Ou seja,
Ferry dá conta de como a atenção às consequências directas e indirectas da técnica pode
ceder espaço a um fundamentalismo romântico contra a mesma técnica. Com Serres e a
«deep ecology», afirma Ferry, desenhara-se um novo ideal que na sua composição
misturara elementos de ordem utópica com outros procedentes da mais cândida
nostalgia por uma certa forma de ser «antimoderno», em permanente atrito com a
contemporaneidade. Por outras palavras, «o ideal da ecologia profunda seria um mundo
onde as épocas perdidas e os horizontes longínquos teriam precedência sobre o presente.
Não é pois por acaso que ela hesita entre os motivos românticos da revolução
conservadora e os "progressistas" da revolução anticapitalista.»

Para a presente reflexão, o trabalho de Ferry tem como aspecto de especial interesse
algumas das interrogações de fundo que coloca. E nomeadamente a primeira: saber
como é que a natureza pode ser um sujeito de direito uma vez que, manifestamente, ela
não é um agente capaz da reciprocidade que sempre exige a ordem jurídica. O
fundamentalismo ecológico passa ao lado do (incontornável) facto de que «é sempre
para os homens que o direito existe, é para eles que a árvore ou a baleia se podem tornar
objectos de uma forma de respeito, reconhecida pelas legislações, não o inverso». Ferry
acusa ainda o recurso no debate actual a algum vitalismo exagerado e generalizado, que
torna depois possível ou plausível afirmações como a de que «a biosfera dá vida tanto
ao vírus da sida como ao bebé foca, à peste e à cólera como à floresta e ao ribeiro. Mas
a questão que de imediato ocorre também é igualmente clara e evidente: «poderá, com
seriedade, dizer-se que o HIV é sujeito de direito ao mesmo título que o homem?» in
Ética e ecologia: perspectivas para uma discussão na actualidade, Gil A. Baptista
Ferreira; Universidade da Beira Interior (texto online www.ubi.pt )

2 Baptista, Isabel, Ética e Educação, estatuto ético da relação educativa, Tese de


Mestrado, Porto. U. Portucalense, 1998, p.59
3 Levinas, TI, p.140.

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