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Abstract
A imperceptível fuga de luz envolta numa calma respingada (verso cinco), aparece,
antes de tudo, no ritmo, à medida que os versos se tornam mais e mais
fragmentados pelas pausas. Porque, embora o padrão iâmbico do poema se
mantenha com precisão quase matemática no sempre crescente número de pausas,
diminuindo o ritmo: verso 2 travessão; verso 4 travessão; verso 6 virgula; verso 8
travessão; verso 9 travessão; verso 10 travessão; verso 11 vírgula e travessão;
verso 12 vírgula e travessão. Esse rallentando, realçando o silêncio que acompanha
os estágios da mudança alcança seu clímax em “gone” (ido) e nos lembra o efeito de
uma música que vai morrendo aos poucos.
Mas outra interpretação parece igualmente válida quanto a essa oscilação do ritmo:
considerando que a luz do verão em seu processo de fuga e a luz do outono que se
esboça no ao entardecer, a luz da manhã associada ao verão cada vez mais reluta
em brilhar e é esta relutância que se expressa no ritmo quebrado dos versos 11 e
12. A ênfase retórica recorta a regularidade métrica, pois o verso 11 ficaria muito
mais expressivo, se, além das pausas, o padrão iâmbico fosse lido “uma graça
cortês e dolorosa” (um iambo seguido de um anapeste), para então atingir seu
desfecho no verso 12.
Destarte, depois de uma última pausa no começo do verso 13, como se o silêncio
reverberasse e lentamente se fundisse na luz do verão, o ritmo outra vez corrobora o
tema da luz fugidia como um coda reassumindo uma regularidade que não é mais
perturbada até o final. O ritmo poderia ser levemente acelerado no último verso se o
padrão iâmbico tivesse, uma vez mais, objetivos retóricos, tais como um pírrico
seguido de um iambo e outro pírrico realçando, pela remoção de duas tônicas, a
luminosidade da fuga e, simultaneamente, a própria fuga, pela aceleração do ritmo.
Mais uma vez, são apenas sugestões apontando onde a tensão pode levar ao
significado porque, como se vê, o peso do verso recai na palavra que é o destino
final da luz fugidia: “dentro da beleza”.
Isso nos conduz apenas à discussão dos “climáticos” versos 11 e 12, nos quais a
diminuição do ritmo alcança sua maior ênfase, confirmada pela tensão entre as
tônicas retórica e métrica. Se a latinidade de foreign (foras = out of doors) já faz a
luz da mulher estar em outro lugar, em outro país, com a sugestão de não brilhar
peculiar, mas de modo estranhamente – um hospede forasteiro, e não uma
presença familiar – esta idéia alcança seu clímax na símile que segue. A latinidade
de courteous (cohors = enclosure) e grace (gratus=pleasing) em relação ao
“Hospede que deveria partir – todos termos anglo-saxões, apontando para esta
“familiar” cortesia – o comportamento devido numa corte então está undermined pela
realidade esmagadora do nórdico antigo harrowing (angustiante), atuando como um
harrow para destruir as raízes latina de courteous grace, e revelando assim a
falsidade da perfidy do hóspede, que, sob uma fachada de cortesia, na realidade
quer mesmo é ir embora.
O oximoro que combina harrowing grace portanto nos lembra que a grace ( o
amor e a boa vontade de deus para com o homem) recai sobre o poeta através da
luz que permanece no outono, angustiante, dolorosa, opressora; por outro lado, nos
lembra também a “peça” que a luz nos prega, pois a perfídia de sua graça (como
comportamento agradável, charme) em ficar revela-se em angustiante
(esmagadora). Assim, a luz brilhando nessa manhã incomum é igualada, até
metaforizada na contraditória e enganadora graça de um hospede condescendente;
e essa traição, que é traição mesmo, e não somente aparenta (ou sente, como na
outra versão), parece ser perdoada pelo poeta, quando o hóspede – a luz do verão –
se retira imperceptivelmente. A interpretação de Paul Ferlazzo para a símile na
verdade não demonstra a revelação chocante dessa traição em harrowing grace, já
que ele se concentra mais no hóspede se tornando cada vez mais esquivo e
impaciente, enquanto seu comportamento continua cortês, do que no verdadeiro
tema, a metáfora. Como mostra o paralelismo, o estranho brilho da manhã (luz) é a
graça angustiada do hóspede, pois ambos querem partir.
Assim, é no imperceptível processo da luz do verão indo embora que esse poema se
concentra. Realçada pelo silencio que acompanha esse processo – como se o
silencio fosse uma pomposa cerimônia, abrangendo grandes eventos como um
prelúdio para a revelação – a luz do verão gradualmente se transforma em ocaso e
entardecer, o “instante suspenso”; essa imagem e nostalgia é colocada em contraste
com a pura e paradisíaca luz da manhã, que caracteriza a luz da primavera. E a asa
e o mastro/quilha (o primeiro símbolo de vôo, libertação da matéria e relacionado ao
movimento do ar, e o segundo é símbolo de viagem e de espiritualização); mesmo
se não é usado pela luz em sua fuga, esses termos lembram da airiness e do
movimento da viagem da luz; e a beleza visual das asas e do mastro nos prepara
para o reino inefável da Beleza, para o qual a beleza fugiu. Como o verso sugere, o
verão é nosso, mas a luz é sua (da beleza), e é por isso que o verão pode escapar
imperceptivelmente, confirmando a inefabilidade do substantivo Beleza (do latim
bell(us)) itat) como um conceito ou ideal de beleza conotando prazer estético, que
está sempre além do nosso alcance.
ED certa vez disse a Higginson que a mudança das estações “ferem quase como a
Musica – mudando quando mais nos agradam”. Acho que o mesmo se poderia dizer
dos seus profundos sentimentos em relação à luz neste poema: ela não apenas
seqüestrou a luz e se apoderou de sua essência nesse imperceptível processo de
partida no fim do verão. Através de sua maestria em adotar palavras com propósitos
expressivos e depois redefini-las, ela também foi capaz de redefinir para nós o
significado da luz.