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O
s narradores esportivos vas parecem às vezes coisas milagro-
Alexandre Medeiros
costumam afirmar, com um sas, mas podem ser freqüentemente Scienco Materiais Pedagógicos e
certo tom de ironia, que explicados pelas leis da Física de modo Experimentais, Recife, PE
dentro de cada torcedor mora um conveniente e racional. Explicações ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

técnico de futebol que opina indevida- simples emergem através do estabele-


mente sobre assuntos nos quais ele não cimento de modelos simplificadores da
é um especialista. Este “discurso da realidade demonstrando como a Física
competência” parece conferir aos refe- pode ser útil na análise dos fenômenos
ridos narradores um direito inaliená- esportivos. Tais explicações parecem
vel de exprimir-se sobre tais assuntos exercer um efeito bastante motivador
de modo praticamente inquestionável. na aprendizagem da Física [4]. Isso tem
Ao falarem de esportes esses mesmos levado, desde a década de 70, à incor-
narradores e comentaristas tentam poração da Física dos esportes como
emprestar aos seus discursos um certo um elemento curricular em várias
tom de certeza calcado muitas vezes experiências educacionais pelo mundo
em afirmações pretensamente cientí- [1, 11, 19]. Um grande número de
ficas. Poderíamos, assim, de modo aná- conceitos físicos pode ser discutido de
logo, afirmar que no coração de cada um modo agradável em tais experiên-
narrador e de cada comentarista cias pedagógicas envolvendo as mais
esportivo mora um cientista, um físico diversas atividades esportivas. Mesmo
para ser mais preciso, que professa, esportes não tão conhecidos, como o
entretanto, uma Física um tanto sur- rapel, por exemplo, permitem lidar com
realista. É sobre o surrealismo desta conceitos os mais variados, tais como:
‘Física alternativa’, sobre os equívo- atrito, movimento retilíneo uniforme,
cos nos quais ela se fundamenta, que aceleração e decomposição de forças,
lançamos aqui um energia potencial
breve olhar analítico. Os narradores dizem que gravitacional e ener-
Não pretendemos, cada torcedor é um técnico. gia cinética [16]. A
nem de longe, Por nossa vez, podemos dizer conexão da Física
abarcar todo o que cada narrador é (quase) com os esportes,
universo de pré-con- um físico... assim como o
ceitos emitidos nem desenvolvimento de
toda a variedade de equívocos técnicas especiais de análise instru-
usualmente veiculados. Pretendemos, mental em tais cursos (como, por
apenas, fundados em alguns exemplos exemplo, a utilização de plataformas Este trabalho analisa algumas das muitas
coletados, através de gravações em fita de força e fotografias estroboscópicas), distorções conceituais em Física apresentadas
magnética de algumas transmissões tem contribuído para melhorar a por narradores e comentaristas esportivos
em suas transmissões no rádio e na TV. A
esportivas, exemplificar a visão extre- própria performance dos atletas [7, 20]. análise de tais distorções permite construir
mamente distorcida da Física comu- Entretanto, como observam Gomes e um panorama que parece caracterizar um
nicada em tais eventos. Partelli [12], apesar de quase todos os certo tipo de Física alternativa usada comu-
De início, é preciso salientar que, resultados discutidos em uma Física mente nas transmissões esportivas. Tal pa-
norama revela o freqüente uso inadequado
de fato, a conexão entre a Física e os dos esportes serem já coisas conhecidas de conceitos físicos e a crença em certos pre-
esportes é bastante íntima. Fenôme- e muito básicas da Física aplicada aos ceitos que substituem as leis de Newton e os
nos ocorridos em competições esporti- seres vivos, eles são ainda muito pouco princípios de conservação.

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difundidos entre os físicos e os ti-la com a importância de uma equi- Newton: F∆t = m∆v; ou seja, encolhen-
professores de Física em geral. O que vocada “lei da Física”. Pela forma como do os braços ao receber o impacto, o
dizer, portanto, sobre o conhecimento foi expressa, não se trata, portanto, de goleiro aumenta o tempo de contato
dos mesmos fenômenos por comuni- uma simples afirmação do senso de suas mãos com a bola e assim reduz
dades como a de narradores e comen- comum; mas, sim, de algo enraizado o valor da força F. Neste sentido, o
taristas esportivos? Já em 1974, no imaginário e expresso irrefleti- comentarista aproxima-se um pouco
Salmela, em um estudo avançado sobre damente com ares de um preceito ci- mais da explicação física correta ao
ginástica, havia constatado a existên- entífico. É difícil avaliar o poder de observar que braços longos parecem ser
cia de um certo número de concepções convencimento que uma afirmação um interessante atributo para os go-
alternativas sobre Biomecânica entre deste porte pode exercer, leiros. Eles, efetivamente, contraem
atletas e treinadores. Não temos, entre- inadvertidamente, intuitivamente os
tanto, conhecimento de estudos seme- nas mentes ainda Diz o locutor: “É uma lei braços aumentando
lhantes entre profissionais da mídia em formação dos básica da Física: sem força, assim o valor de ∆t.
esportiva. nossos jovens afi- não há movimento...” O fato, também
O estudo aqui apresentado tenta cionados pelas observado pelo co-
dar conta de parte do que aparece costu- corridas automobi- ...e Newton que role em seu mentarista, de que
meiramente a respeito dos fenômenos lísticas. caixão... os goleiros se colo-
físicos no imaginário de locutores e Substitutos para a 2a lei de New- cam à frente de suas metas e de que se
comentaristas nas transmissões ton são também encontrados entre as abaixam no momento de tentarem
esportivas e que poderíamos, de início, máximas presentes nas transmissões pegar um chute mais forte é igual-
caracterizar como uma ‘mecânica de esportivas. Em outra circunstância, um mente procedente. Os goleiros tentam,
equívocos’. Por uma questão ética, narrador afirmou do alto de sua vasta deste modo, utilizar os músculos da
omitimos propositalmente os nomes experiência futebolística: Para segurar coxa para saltarem para trás, se neces-
dos personagens envolvidos, mencio- chutes fortes, o goleiro tem que pegar bem sário, caso o impacto com a bola seja
nando-os genericamente de modo a encaixado. Por isso, além de ágil, ele precisa muito violento. Este comportamento
não poderem ser facilmente identifi- ser também bastante forte. Seu colega intuitivo do goleiro, que corresponde a
cados. comentarista acrescentou, ainda, que: uma tentativa extrema de aumentar
O Brasil nunca teve bons goleiros. Talvez ainda mais o valor de ∆t, significa um
O surrealismo de uma o Gilmar! Mas mesmo o Gilmar não se uso intuitivo adicional da 2a lei de
mecânica de equívocos comparava aos grandes goleiros argentinos Newton. Entretanto, apesar de parecer
As afirmações comentadas a seguir ou europeus. O Lev Yashin, o Aranha estar na direção certa para obter uma
abrangem um amplo leque de con- Negra, da União Soviética, segurava boa explicação física para o fenômeno,
teúdos no tocante à Mecânica. Tome- qualquer tiro, de média ou longa o nosso comentarista não vê nenhuma
mos, por exemplo, o seguinte comen- distância. Eu não sei como ele fazia, mas lei presidindo um tal ato; antes, recorre
tário de um radialista em meio a uma ele parecia ter cola nas mãos. Era bem à crença de que o goleiro possui um
transmissão de corrida de automóveis: alto e jogava em frente ao gol e quase certo tipo de “cola” mágica nas mãos
Que infelicidade! Justo na última curva o sempre abaixado e com os braços esticados que o faz reter a bola. A segunda lei de
motor fumaçou! E aí companheiro, não tem para a frente. Essas duas afirmações Newton é substituída, deste modo, por
prá ninguém. É uma lei básica da Física: sobre as habilidades dos goleiros em algo simplesmente “pegajoso”.
sem força, não há movimento. Observe- segurarem chutes muito fortes deixam Também a terceira lei de Newton
se o tom professoral em que tal afirma- transparecer a compreensão ingênua sofre e encontra seus substitutos nas
ção está contida. O narrador não se que esses profissionais da crônica es- transmissões esportivas. Tomemos a
contenta em co- portiva têm do papel seguinte afirmativa de um locutor:
mentar a impossibi- Os fenômenos físicos, no da 2a lei de Newton. ‘Matar no peito’ com categoria é sempre
lidade do corredor imaginário de locutores e Note-se que o narra- uma jogada muito difícil de realizar. O
prosseguir na com- comentaristas nas dor acima mencio- jogador precisa estufar o peito e fazer na
petição. Ele enuncia transmissões esportivas, nado faz alusão à bola uma força exatamente igual à que a
em alto e bom tom poderiam ser caracterizados idéia de que para bola faz nele. Qualquer errinho, para mais
uma “lei” de sua como uma ‘mecânica de pegar chutes fortes é ou para menos, a bola salta fora. Ob-
Física alternativa: equívocos’ preciso “encaixar” serve-se como tal afirmação contraria
sem força, não há bem a bola. Entre- a 3a lei de Newton. O locutor parece
movimento, em flagrante desrespeito à tanto, isso é justamente o oposto da- admitir intuitivamente que a força
primeira lei de Newton. Que ele pense quilo que um bom goleiro deve tentar exercida pela bola no peito do jogador
assim, de acordo com o senso comum, fazer. Se o chute for muito violento, o é igual (em módulo) e oposta àquela
seria compreensível. Ele, entretanto, goleiro precisará, antes de tudo, amor- que o peito do jogador faz na bola,
não apenas enuncia sua concepção tecê-lo. E um tal amortecimento se apenas no caso em que a jogada é bem
alternativa sobre o movimento dos dará, precisamente, com o recurso, sucedida; talvez, guiado por uma
corpos, mas cuida, também, de traves- ainda que inconsciente, da 2a lei de concepção igualmente equivocada de

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que tais forças deveriam se anular para
que a jogada fosse bem executada. Isto,
entretanto, é um absurdo, uma vez que
ação e reação atuam em corpos
distintos e por isso jamais podem
anular uma à outra. De qualquer
modo, o nosso locutor parece imaginar
que é possível que tais forças sejam
diferentes. Para ele, apenas o bom
jogador obedece à 3a lei de Newton.
Um outro locutor grita ao micro-
fone: A bola bateu na trave e voltou com
mais força ainda. A força foi tanta que
pegou na nuca do goleiro e o deixou desa-
cordado. Também, aqui, temos uma
desobediência à 3a lei de Newton. O
choque da bola com a trave fez, se-
gundo nosso narrador esportivo, com
que a bola ganhasse momento linear e
desta forma transferisse tal momento
linear para a cabeça do goleiro exercen-
do, assim, uma força ainda maior que
aquela porventura comunicada pelo pé
do atacante. Não apenas nenhum Chute forte em uma partida de Hóquei: o peso da bola é sempre o mesmo.
amortecimento, ou qualquer tipo de
perda energética foi considerado em tal passa efetivamente a girar para trás. que o efeito de um impacto a ser
choque; pior: o narrador imaginou um Outro equívoco comum é a con- causado por uma bola com tal veloci-
surpreendente aumento no momento fusão conceitual entre o peso de um dade (200 km/h) seria muito forte.
linear da bola ao se chocar com o tra- corpo e o seu momento linear. Tome- Estas confusões ficam mais evidentes
vessão. mos, como exemplo, a seguinte afir- em uma outra frase de um locutor
Não apenas as leis de Newton e os mação de um locutor esportivo durante durante um jogo recente do campeo-
princípios de conservação sofrem nas recente jogo de Hóquei na TV: No nato alemão: A bola está muito pesada e
afirmações de nossos locutores esporti- Hóquei sobre patins a bola chutada tem com isso ela pega muita velocidade.
vos. Tomemos, por exemplo, a seguinte muito peso. Num chute forte, ela vem com Equívoco ainda maior pode ser encon-
afirmativa em meio a uma corrida um impacto de 200 kg. Certamente, não trado, entretanto, na seguinte frase de
automobilística: O novo controle de tra- faz sentido dizer que a bolinha vem um outro comentarista: O chute do
ção permite um freio mais eficiente. A ro- com muito peso, pois o peso da mes- Nelinho era muito perigoso, principal-
da, ao ser freada, gira para trás como as ma é constante, dado que não há mente de longe, pois a bola tinha mais
rodas das diligências dos filmes de bang- variação na aceleração da gravidade. tempo de pegar embalagem no ar. Neste
bang. O nosso narrador não parece ter Em segundo lugar, a Física de um caso, temos algo realmente inusitado:
a menor idéia do que esteja ocorrendo; impacto não é descrita simplesmente a idéia de que o momento linear au-
não percebe que o que ocorre é um des- por uma massa (200 kg); mas, sim, por menta durante o percurso da bola no
casamento entre a uma transferência ar. Não bastasse não estar em alerta
freqüência de giro da O locutor grita ao microfone: de energia cinética e para o amortecimento causado pelo ar,
roda em relação a “A bola bateu na trave e de momento linear. o comentarista ainda imagina um im-
freqüência de expo- voltou com mais força ainda!” De um modo provável aumento de velocidade (algum
sição do filme e, por semelhante, duran- vento misterioso?). No tocante aos cho-
decorrência, em re- ...porque deve ser natural te uma partida de ques, algumas afirmações são corretas,
lação ao tempo de das bolas o desejo de tênis recente, um ainda que expressas de maneira não
percepção do olho desobedecer à 3a lei de comentarista afir- muito clara: O ‘bicudo’ é um chute feio,
humano (de Newton... mou: A bola do Guga geralmente vai sem direção, mas quando
aproximadamente está muito pesada. Ele pega ‘na veia’ não tem pra ninguém. A
1/16 s). A roda, de fato, parece atrasar- tem sacado a 200 km/h. Novamente, o idéia aqui implícita e correta é a de que
se e isso pode ser bem acompanhado narrador confundiu as idéias de em um choque frontal ocorre uma
por um estroboscópio, demonstrando momento linear e energia cinética com transferência máxima de momento lin-
o descasamento na freqüência de rota- o peso do corpo. Sua intenção de dizer ear. Outros locutores parecem estar
ção. Em vez disso, o nosso locutor pre- que a bola fica mais pesada parece ser atentos para os efeitos de dissipação,
fere imaginar que a roda ao ser freada simplesmente a de passar a idéia de confundindo, entretanto, os conceitos

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envolvidos: Ele chutou com muita força mentado o “braço de alavanca”, a dis- pesado. Estes mesmos pesquisadores
e à queima roupa. O goleiro não teve culpa tância em torno da qual a ponta da mostram que estudos empíricos reve-
no gol; a bola praticamente não teve raquete executará um giro. Sendo o lam que mesmo levando-se em conta
tempo de gastar a força. Neste caso, fica seu pé (como no caso exemplificado) os efeitos de um salto no momento do
evidente que o narrador imagina que a o centro da referida rotação da raquete, saque, salto este que ocasiona uma
força exercida pelo pé do atacante no a velocidade (ν = ωr) da extremidade maior transferência de momento linear
momento do chute fica impressa na da raquete será maior que no caso no no instante que os pés tornam a tocar
bola, gastando-se paulatinamente. É qual o jogador o solo, a força de
uma concepção que muito se asse- apenas gira o braço. Segundo o narrador, “Guga reação vertical co-
melha à idéia medieval de impetus. Entretanto, o fato de transfere bem o peso do corpo municada pelo solo é
Outro equívoco interessante é a ver o movimento do para frente e solta a paralela” de aproximadamente
convicção existente entre os narrado- jogador, todo estica- 1,33 vezes o peso
res esportivos de que o peso é algo que do, girando como ...a despeito do peso ser uma corporal do tenista.
pode ser transferido. Este equívoco um todo em torno força que aponta para o centro Ainda relacio-
aparece, freqüentemente, associado à da ponta do seu pé, do planeta, não possuindo nados aos saques no
incompreensão da idéia de torque. Em é descrito pelo lo- componente que possa alterar tênis encontramos
um jogo de tênis recente, o narrador cutor como se o a componente horizontal da afirmações como A
afirmou, por exemplo: Guga transfere mesmo houvesse velocidade da bola... Serena Williams saca
bem o peso do corpo para frente e solta a transferido o seu muito forte para os
paralela. Certamente isto é um absur- peso para a bola, o que evidentemente padrões femininos. O segredo do seu sa-
do, pois o peso é a força com que a não poderia jamais acontecer. Isto faz que parece estar na combinação exata de
Terra atrai um certo corpo e, portanto, com que tenistas mais altos possam força e rapidez com que executa o movi-
aponta sempre para o centro deste pla- fazer a ponta de suas raquetes atingirem mento. Um bom saque precisa ser forte e
neta. Guga não poderia jamais trans- maiores velocidades que outros tenis- de rápida execução. Mais uma vez, en-
ferir o seu próprio peso para frente; isso tas mais baixos, transferindo, assim, contramos, aqui, um equívoco sobre a
não faz nenhum sentido. O que o uma maior quantidade de movimento Biomecânica da situação. Certamente,
narrador, poderia dizer é que Guga fle- (p = mv) à bola. Tal fato não tem esca- saques praticamente indefensáveis são
xiona todo o seu corpo para frente e pado da observação mais cuidadosa cada vez mais freqüentes no jogo de
não apenas o braço, transferindo, as- daqueles que acompanham o tênis há tênis atual. Naturalmente, isto motiva
sim, uma maior energia cinética e muito tempo, mesmo sem serem o interesse em estudar o saque, pois se
um maior momento linear à bola. físicos. Tome-se, por exemplo, o perti- constitui em um elemento técnico
Note-se, ainda, que em uma tal cir- nente comentário sobre a evolução da altamente determinante do rendimen-
cunstância o aumento deveu-se, prin- potência dos saques dos tenistas feita to do praticante, já que o jogador possui
cipalmente, ao jogador haver au- por Carneiro [6], constante no site total controle durante a execução desta
PlayTenis, sobre a importância do sa- habilidade fechada, onde o ambiente
que: cada dia vemos aumentar a impor- varia muito pouco [3, 10, 17]. Apesar
tância do saque no circuito profissional de desta vantagem, entretanto, a execu-
tênis. Com o aumento da envergadura dos ção do saque é de difícil domínio, já
tenistas, onde um jogador com 1,80 m que, como revelam estes pesquisadores,
(Agassi) é considerado baixinho, a potên- o braço que lança a bola deve ser
cia do saque tem decidido muitos e muitos levantado lentamente com a finalidade
jogos. de colocar a bola no ponto ideal de
Às vezes as concepções alternati- contato, enquanto o braço que segura
vas exibidas pelos narradores estão a raquete deve balançar em um padrão
ligadas a questões biomecânicas mais complexo para golpear a bola, combi-
complexas, como por exemplo a afir- nando potência e coordenação. Não
mação de que O saque do Ivanisevic é somente os braços descrevem padrões
muito forte. Isso lhe causa problemas nos de movimento e ritmos diferentes; eles
joelhos devido à sobrecarga causada pela também devem sincronizar-se aos
potência do seu saque. Entretanto, como movimentos dos membros inferiores e
revelam estudos de biomecânica, po- do tronco [10, 22].
de-se perceber que a sobrecarga que o Ainda do tênis, retiramos o se-
corpo do atleta suporta durante qual- guinte diálogo envolvendo conceitos
quer fase do saque é relativamente em Física:
Saque violento do Guga: a flexão de todo o baixa [24]. Na mesma linha encontra- Narrador: Roland Garros é uma
seu corpo para frente, e não apenas do mos equívocos como O problema do quadra lenta, por ser de saibro. Isso é uma
braço, transfere uma maior energia cinética saque com um salto para cima é que ao se vantagem para o Guga que não se adapta
e um maior momento linear à bola chocar com o solo o atleta vem muito mais bem a quadras rápidas como Wimbledon.

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Comentarista: Isso é um tanto pro- Como esclarece Cross [9], há dois no saibro do que na grama. Isso faz
blemático! Se você prestar atenção, verá modos de se definir uma quadra quanto com que haja, no topspin, um aumen-
que o tenista desliza mais rapidamente à velocidade: pode-se falar em relação to no ângulo de repique da bola. Entre-
no saibro que na grama. Para mim, as à velocidade que a bola pode atingir tanto, a fina camada de areia colocada
quadras de saibro é que deveriam ser no choque com o solo ou em relação à sobre o saibro faz com que os jogadores
denominadas de quadras rápidas. velocidade que o jogador desliza sobre deslizem mais facilmente que na
Narrador: Mas essa é uma conven- a quadra. E é neste aspecto de desliza- grama, movendo-se mais rapidamente
ção, creio que universal. mento que entra o papel da areia que é de um lado para o outro da quadra.
Em outra transmissão, ouvimos, colocada propositadamente sobre as Neste sentido, portanto, a quadra de
mais ou menos, o seguinte comentá- quadras de saibro para reduzir o coefi- saibro é, de fato, mais rápida que a de
rio do narrador: ciente de atrito entre os sapatos dos grama. Tudo, portanto, é uma questão
A quadra de saibro está coberta por tenistas e a superfície, fazendo com do critério a ser adotado na concei-
uma areia fina. Os organizadores deve- que ele deslize mais facilmente sem tuação da rapidez de uma quadra.
riam ter limpado a quadra antes do jogo. escorregar. A areia atua como um Relacionada com este mesmo fa-
Embora coletados em ocasiões dis- lubrificante para as quadras de saibro. to, ouvimos certa vez a seguinte obser-
tintas, esses dois comentários dizem O coeficiente de atrito no saibro é da vação de um narrador: Geralmente os
respeito a uma mesma situação: a con- ordem de 0,8, enquanto para a grama jogadores que se adaptam bem ao saibro
ceituação do que vem a ser uma é da ordem de apenas 0,5. Como con- são mais leves e sacam sem tanta força
quadra rápida e uma quadra lenta. No seqüência de apresentar um maior quanto aqueles que jogam bem na grama.
primeiro diálogo, o comentarista e o coeficiente de atrito, o saibro retarda a A questão está, certamente, mal
narrador discordam sobre o fato das componente horizontal da velocidade colocada. De fato, usualmente, o sa-
quadras de saibro serem ditas lentas da bola quando a mesma se choca com que no saibro é mais lento que na gra-
ou rápidas. O narrador diz ser esta con- o solo. Neste sentido, a quadra de ma, mas isso não se deve à possível
ceituação uma convenção. Na verdade, saibro é, de fato, mais lenta. Além fragilidade ou à força dos jogadores.
trata-se de uma questão de critério a disso, o coeficiente de restituição nos Trata-se, antes, de uma questão tática
ser adotado na referida conceituação. choques entre a bola e o solo é maior adotada pelos tenistas, de um modo

Entenda as quadras de tênis ton, empurra a bola para trás, mudan- mv→h mv→h
Precisamos atentar para o fato de do sua trajetória para um ângulo mais
mv→v
que o papel das forças de atrito en- próximo da horizontal. A forca exerci- mv→v
tre a bola e a quadra é muito impor- da pelo solo causa, assim, uma redu-
tante! Assim, apesar do coeficiente de ção na velocidade da bola e no seu mo-
restituição entre a bola e o solo ser mento linear, fazendo-a saltar menos
maior no saibro, é nesse piso que os do que se não houvesse o efeito back-
(a)
impactos apresentam menor potência. spin. Como o coeficiente de atrito é
Nas rebatidas mais simples, a bola maior no saibro, esse piso faz com que backspin
de tênis bate obliqüamente com o so- o momento linear da bola sofra maior
lo, não tendo velocidade de rotação, redução do que na grama, onde o coe- trajetória
sem spin
tendo apenas sua translação. Consi- ficiente de atrito é menor!
derando um choque quase elástico No topspin a bola é forçada a girar
como no saibro para frente, e os efei- trajetória
(mais “duro” que No jogo entre profissionais, tos acontecem ao com spin
não é apenas o coeficiente de força exercida pelo força exercida pela
a grama), a bola contrário: a bola ga- solo sobre a bola bola sobre o solo
sofre uma peque- restituição que conta; as nha velocidade adi- (b)
na perda de mo- forças de atrito também são cional justamente
mento linear. As- muito importantes porque recebe do so-
sim, ao batermos lo uma reação para topspin
“de chapa” na bola, é razoável que frente ao empurrá-lo para trás, afas- trajetória
ela tenha maior velocidade conforme tando-se da horizontal ao tocar o solo. com spin
trajetória
batemos com mais força. Contudo, A conclusão é que o jogador profis- sem spin
os jogadores profissionais tocam a sional abre mão da força em favor do
bola de raspão, acrescentando um “jeito”, e o jogo na quadra de saibro é
efeito de giro (spin) à bola, na ten- mais lento à medida em que a bola é
tativa de tornar a recepção para o sacada e rebatida com menor força mas força exercida pela força exercida pelo
bola sobre o solo solo sobre a bola
adversário mais difícil. com muito mais spin do que na grama.
(c)
No backspin a bola recebe um gol- O jogo fica mais plástico e mesmo mais
pe que a faz girar para trás, empur- “surpreendente”, já que a bola acaba a) Colisão ideal sem spin
rando o solo para frente quando ela assumindo trajetórias diferentes da- b) Colisão com backspin
quica. O solo, pela terceira lei de New- quelas que o senso comum indicaria. c) Colisão com topspin

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geral. Como a bola no saibro repica com
menor velocidade, mas em ângulos
mais acentuados, os tenistas aprovei-
tam este efeito para colocar uma
rotação extra na mesma (veja o quadro
da página anterior). Deste modo, os
jogos no saibro têm menor potência nos
saques, mas maiores efeitos de spin.
Eles sacrificam a velocidade do saque
no saibro, que tem uma média de
160 km/h, comparados aos 185 km/
h na grama, em troca dos efeitos
obtidos na rotação da bola e suas decor-
rentes e surpreendentes mudanças de
curso também devidas ao efeito
Magnus. A força de Magnus é uma
conseqüência do princípio de Bernoulli
e é a principal responsável, por exem- A folha seca de Didi: o efeito Magnus sempre foi o responsável pela incrível façanha do
brasileiro.
plo, pelos surpreendentes desvios so-
fridos pelas bolas em cobranças de falta
em partidas de futebol. Não é im- efeito Magnus foge ao escopo do profissional de Física. O narrador não
pressionante que este complexo efeito presente trabalho, mas pode ser percebe que um aerofólio é justamente
seja tão pouco compreendido e tão encontrado em várias referências [2, uma asa invertida e que o seu efeito
deturpado nas transmissões esportivas. 5, 13, 14, 15, 18]. não seria, jamais, o de fazer um carro
Em uma ocasião, por exemplo, ouvi- De toda forma, equívocos na aná- decolar. Ao contrário, o aerofólio
mos o seguinte diálogo: lise de situações envolvendo o efeito provoca o surgimento de forças de
Narrador: Ninguém cobrava falta Magnus e o princípio de Bernoulli, es- compressão descendentes sobre a es-
igual ao Didi. A sua ‘folha seca’ enga- tão entre os mais frequentes nas trans- trutura do carro que aumentam a for-
nava qualquer goleiro. A bola ia em uma missões esportivas. Em uma certa ça de atrito pelo aumento da força nor-
linha reta e de repente mudava de dire- ocasião, um conhecido comentarista mal. O carro torna-se, na verdade,
ção. da TV afirmou: Tem jogadores que mais estável, mais “preso ao chão”.
Comentarista: O Didi curvava o pé possuem um certo magnetismo com a bola. Com o aerofólio o carro fica mais pe-
na hora do chute e a bola pegava essa Eles prendem a bola facilmente aos pés, sado e tem maior aderência. Neste caso,
curva e ia no ângulo, cobrindo a barreira. mesmo em alta velocidade. O Rivelino ia o nosso narrador chegou mais perto
O narrador e o comentarista estão além. Ele tinha o famoso ‘drible do da visão de que com o aerofólio o carro
bastante equivocados. Em primeiro elástico’, que ele jogava a bola para frente adquire maior estabilidade; mas, não
lugar, não é verdade que a bola siga e a atraía de volta. Em uma tal compreendeu que esse aumento de
em linha reta e curve “de repente”. Este afirmativa, as composições vetoriais estabilidade provém da pressão aero-
equívoco assemelha-se aos desenhos entre a translação e a rotação da bola dinâmica exercida sobre o aerofólio. De
de movimentos de projéteis contidos aparecem substituídas por uma forma ingênua, ele imagina que o peso
nos estudos renascentistas de Tartaglia. misteriosa “atra- do carro tenha aumen-
De fato, o Didi raspava a bola lateral- ção magnética”. “Os aerofólios traseiros foram tado. De modo seme-
mente com a parte externa do pé, ao Há, entretanto, proibidos porque apesar de lhante, em outra oca-
mesmo tempo em que a impulsionava muitas outras tornarem o carro mais sião, o mesmo narrador
para frente. Essa combinação de “jóias” da Física aerodinâmico, faziam com afirmou em alto e bom
movimentos de rotação e translação surrealista dos que ele ficasse muito instável tom para os seus teles-
da bola fazia com que pontos simétri- narradores e co- devido ao efeito asa” pectadores: A aderência
cos na mesma em relação ao centro de mentaristas ao solo perto dos 300 km/h
massa adquirissem distintas composi- esportivos rela- É verdade que o aerofólio é fica muito prejudicada,
ções vetoriais de velocidade (rotação + cionadas ao as- uma asa... invertida! E isso pois a essa velocidade o
translação). Era essa diferença lateral sunto. Dentre proporciona estabilidade aos carro fica mais leve e
das velocidades que causava uma elas, destaca- carros durante as corridas... qualquer erro pode ser
diferença de pressão no ar devido ao mos, ainda, as fatal. Trata-se do mes-
princípio de Bernoulli, gerando o seguintes: mo equívoco, acima comentado, mas
chamado “efeito Magnus”, fazendo Os aerofólios traseiros foram proibi- em um outro contexto.
com que a mesma executasse uma dos porque apesar de tornarem o carro Ainda relacionado com o princípio
curva ao redor da barreira. A afirma- mais aerodinâmico, faziam com que ele de Bernoulli, ouvimos na abertura de
ção, por outro lado, de que a bola pegava ficasse muito instável devido ao ‘efeito um jogo de futebol comemorativo do
a curva do pé do Didi é completamente asa’. Dia do Trabalho: O helicóptero agora já
absurda. Um detalhamento maior do O equívoco aqui é evidente para o se aproxima do estádio. Vamos esperar que

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esta maravilha tecnológica que voa sem seja desprovida de sentido, ela, certa- Também nas transmissões de atle-
asas lance do alto a bola do espetáculo. mente, não é a única explicação pos- tismo pudemos perceber alguns equí-
Neste caso, o narrador exprime uma sível. Uma observação atenta dos vocos. Em meio à disputa das Olimpía-
crença que parece ser compartilhada arremessos do gigante do Lakers pode das, um comentarista chamou a aten-
por um número grande de pessoas: a nos revelar que parte relevante do pro- ção do telespectador para o fato de que
de que o helicóptero não tem asas, ou blema está no ângulo de arremesso novos recordes de curta e longa distân-
seja, a não compreensão do papel muito pequeno, quase rasante. O nar- cia nas corridas têm sido estabelecidos
exercido por sua enorme asa rotativa rador parece não atentar para o fato nos últimos anos em função da maior
que é vista, talvez, como sendo de que não apenas a força empregada estatura dos atletas. Entretanto, como
simplesmente uma hélice propulsora. no arremesso determina o sucesso do alertam, de modo pertinente, Gomes e
Outro ponto comum nas narrações alcance obtido [21]. Parteli [12], isso não parece ter qualquer
esportivas é a crença na existência de Do futebol vem outro interessante fundamento científico. A velocidade
uma certa “força do vácuo”, como, por exemplo de equívoco em uma narra- máxima nas corridas não é determi-
exemplo, na seguinte afirmação, em ção esportiva, desta vez ligado à nada pela altura do corredor. Estes pes-
meio a uma corrida: Os retardatários questão do equilíbrio. Em meio a um quisadores chegam a lembrar que boa
ao serem ultrapassados tentam usar a debate na TV, um comentarista afir- parte dos recordistas de corridas são
‘força do vácuo’ dos líderes para acompa- mou o seguinte: O Garrincha driblava indivíduos de baixa estatura.
nhá-los por alguns segundos. Na verdade, rápido e na carreira. Ele balançava o corpo Nada, entretanto, parece superar
o arrasto provocado pelo carro da frente e puxava a bola rapidamente para o lado; as corridas de Fórmula 1, Fórmula Indy
cria uma zona de descompressão na quase sempre o lado direito. E fazia isso e outras do gênero, como fonte de
sua parte traseira, mas é a pressão sem abrir os braços para não dar pista ao equívocos sobre a Física das situações
maior na parte de trás do carro marcador para onde e quando ele ia sair. analisadas. E ressalte-se, ainda, que
ultrapassado que cria um gradiente de Certamente isto é um absurdo, mesmo pelo fato de tais corridas serem reves-
pressões impulsionando-o efetivamen- para um fenômeno como foi o Garrin- tidas de todo um sofisticado aparato
te, durante um curto espaço de tempo cha. Talvez traído pela memória, o tecnológico, as explicações pseudo-
para frente. A idéia da existência, comentarista tenha exagerado nos científicas parecem ainda mais con-
entretanto, de uma “força do vácuo” detalhes do drible de seu Mané. Ele, de vidativas em tais circunstâncias. To-
parece estar em consonância com o fato, driblava muito rapidamente e memos, por exemplo, o seguinte diá-
senso comum e com a crença aristo- quase sempre para a direita. E a rapi- logo em meio a uma corrida de
télica de que a natureza teria “horror dez com que executava este movimen- caminhões na TV:
ao vácuo”. to era uma das chaves do seu sucesso. Narrador: Se um caminhão e um
A questão dos projéteis aparece em Entretanto, ele sempre abria os braços Fórmula 1 entrassem juntos em uma cur-
vários esportes nas narrações espor- ao driblar (ver figura). Seus dribles va, o caminhão, certamente, sairia com
tivas. No basquete, por exemplo, as- desconcertantes eram bem longos e uma maior velocidade.
sistimos ao seguinte trecho: O Shaquile ele usava os braços com maestria para Comentarista: Claro, tendo mais peso
O’Neil erra muitos lances livres porque equilibrar o corpo no exato momento ele tende a adquirir mais velocidade.
coloca muita força na bola. Embora uma em que puxava a bola lateralmente. Tal afirmação está completamente
tal explicação para o insucesso nos Sem essa compensação de torques, ele equivocada. Narrador e comentarista
arremessos livres do grande pivô não fatalmente iria ao chão, fato que acon- parecem acreditar na relação entre o
tecia, freqüentemente, com os seus peso e a velocidade. Entretanto, o peso
marcadores, não tão hábeis na execu- não importa em uma tal situação. Se
ção de tão rápido bailado. o caminhão e o carro executam a
Um outro fato interessante presen- mesma curva com a mesma veloci-
te nas transmissões esportivas reside dade, a mesma relação entre a força e
na crença na possibilidade de certos a massa tem que ser observada. Deste
atletas desafiarem momentaneamente modo, é necessário uma força maior
a lei da gravidade, levitando. Em uma para fazer o caminhão executar a
transmissão de basquete o locutor foi curva. Esta força é devida ao atrito
enfático ao afirmar que O Michael Jor- entre os pneus e a pista que é propor-
dan é realmente um jogador excepcional. cional ao peso (em um plano horizon-
Ele se diferencia dos demais jogadores, pois tal). Assim, a massa tem o seu efeito
consegue parar no ar por uma fração de cancelado na relação mencionada en-
segundo e isso lhe permite encestar com tre a força e a massa do veículo [8].
mais precisão. Também no futebol esta Em outra ocasião, um equívoco
crença parece presente: Hoje em dia já semelhante foi constatado. O narra-
não temos grandes cabeceadores. Mesmo dor, referindo-se a uma curva fecha-
Drible desconcertante de Garrincha: traído o Jardel não se compara com o Dario. O da, afirmou que Em uma curva fechada,
pela memória, o comentarista se esquece Dario era melhor que os outros porque ele um caminhão e um Fórmula 1 têm com-
que Mané abria os braços para se equilibrar parava no ar por um breve instante de portamentos muito diferentes. Enquanto,
no momento do drible. tempo, no momento de cabecear. ao tentar fazer a curva, o caminhão

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desliza para fora da pista, o Fórmula 1 esportivas dizem respeito a fenômenos é de se questionar o que poderia ser
faz a curva facilmente. Em resposta, o relacionados ao calor, à óptica e à ele- feito para, ao menos, suavizar este tipo
comentarista concorda com o narra- tricidade. O espaço do presente tra- de influência na formação científica
dor, afirmando que Certamente, pois o balho, entretanto, não permite que nos dos nossos jovens. Não temos a res-
carro é mais leve, menor e mais rápido. alonguemos em suas análises, ficando posta para uma tal indagação, mas
Ele, deste modo, é mais apropriado para os mesmos para serem alvos de estu- assumimos a importância de que tais
fazer curvas fechadas. Em curvas mais dos e comentários em um outro texto. equívocos sejam discutidos com os
abertas, o caminhão e o carro de corrida Para complementar nossa coleção alunos em sala de aula. Acreditamos,
conseguem executar a curva, mas em cur- de “ensinamentos surrealistas” de Físi- deste modo, que o presente estudo pos-
vas fechadas apenas o carro consegue, por ca contidos nas transmissões espor- sa servir de alerta para a existência do
ser mais leve e mais rápido. Como pode tivas, vale a pena citar uma jóia rara referido problema e para que outras pes-
ser percebido, o mesmo tipo de equí- bem recente. Na final da ultima Copa quisas sejam realizadas com o intuito
voco anterior repete-se, em um con- América, durante o jogo Brasil x Ar- de investigar em maior amplitude esta
texto um pouco diferente. Imaginemos gentina, o comentarista observou para questão que se apresenta como de
que o carro e o caminhão estejam com o locutor: hoje à noite, no Fantástico, grande relevância educacional pelo
a mesma velocidade, e admitamos físicos da USP vão explicar os saltos da impacto que pode exercer.
ainda que o coeficiente de atrito entre Daiane dos Santos. Imediatamente o Uma tal relevância educacional
os pneus de ambos os veículos e o chão locutor acrescentou de forma eloqüente pode ser aquilatada pelo potencial moti-
seja o mesmo. Como vimos no caso e professoral: Eles vão tentar explicar, vador que as menções às transmissões
anterior, a relação entre a força e a pois saltos são coisas artísticas; saltos não esportivas e aos seus personagens pare-
massa (aceleração) será a mesma para tem nada a ver com a Física. Uma cem exercer sobre parcela relevante da
que ambos façam a curva. Entretanto, observação realmente… fantástica! nossa juventude. Neste sentido, uma
o caminhão tem uma maior tendência análise das concepções alternativas,
a virar na curva, pois o seu centro de Conclusões sobre certos conteúdos da Física, apre-
massa é mais alto. O que importa, O panorama geral que pode ser sentadas por tais personagens, pode
neste caso, é a relação entre a altura auferido do presente estudo sobre a servir como um complemento em
do centro de massa e a largura da base, visão de Física contida nas transmis- abordagens educacionais mais ecléticas.
ou seja, a distância entre as rodas sões esportivas não parece dos mais Aliada a outras metodologias de ensino
esquerda e direita. Esta relação é maior animadores. Certamente tal panorama que incluam, por exemplo, experimen-
no caso do caminhão que, deste modo, não descreve rigorosamente aquilo que tos, informações históricas, dramati-
tem uma menor estabilidade nas cur- pensam os profissionais da mídia sobre zações, tecnologia educacional e tantas
vas fechadas [8]. Portanto, embora o o assunto, mas fornece, assim mesmo, outras coisas mais, a discussão das con-
caminhão tenha, realmente, maior uma visão calcada no registro e na aná- cepções sobre os fenômenos físicos
dificuldade que o carro para fazer as lise de algumas opiniões emitidas por presentes no imaginário dos profis-
curvas mais fechadas, este fato nada alguns influentes narradores e comen- sionais da mídia desportiva, parece-nos
tem a ver com a explicação esboçada taristas. De todo modo, entretanto, apresentar-se como um complemento
pelo narrador e complementada pelo ainda que a título apenas ilustrativo, dotado de um grande potencial de moti-
comentarista. o cenário dele decorrente parece preo- vação que merece, portanto, ser con-
Muitos outros equívocos registra- cupante. Sendo a mídia esportiva um venientemente explorado em nossas
dos em nosso estudo nas transmissões poderoso veículo formador de opinão, salas de aula.

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