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P rojeto

PERGUNTE
E
RESPONDEREMOS
ON-LINE

Apostolado Veritatis Spiendor


com autorizagáo de
Dom Estéváo Tavares Bettencourt, osb
(in memoriam)
APRESENTAQÁO
DA EDIQÁO ON-LINE
Diz Sao Pedro que devemos estar
preparados para dar a razáo da nossa
esperanga a todo aquele que no-la pedir
(1 Pedro 3,15).

Esta necessidade de darmos conta


da nossa esperanga e da nossa fé hoje é
mais premente do que outrora, visto que
somos bombardeados por numerosas
correntes filosóficas e religiosas contrarias á
fé católica. Somos assim incitados a procurar
consolidar nossa crenca católica mediante
um aprofundamento do nosso estudo.

Eis o que neste site Pergunte e


— Responderemos propóe aos seus leitores:
aborda questóes da atualidade
"¡ controvertidas, elucidando-as do ponto de
vista cristáo a fim de que as dúvidas se
t dissipem e a vivencia católica se fortaleca no
Brasil e no mundo. Queira Deus abengoar
este trabalho assim como a equipe de
Veritatis Splendor que se encarrega do
respectivo site.

Rio de Janeiro, 30 de julho de 2003.

Pe. Esteváo Bettencourt, OSB

NOTA DO APOSTOLADO VERITATIS SPLENDOR

Celebramos convenio com d. Esteváo Bettencourt e


passamos a disponibilizar nesta área, o excelente e sempre atual
conteúdo da revista teológico - filosófica "Pergunte e
Responderemos", que conta com mais de 40 anos de publicacáo.

A d. Esteváo Bettencourt agradecemos a confiaga depositada


em nosso trabalho, bem como pela generosidade e zelo pastoral
assim demonstrados.
Ano xli Setembro 2000 460
Um Deus que castiga...

Comunicacáo com os mortos por


meios eletrónicos

Alucinacáo

Ainda o aborto

"Historia das Inquisicoes: Portugal, Espanha e


Italia, Séculos XV-XIX"

Poder Regio e Inquisicáo em Portugal

A Inquisicáo no Brasil

"Descomplicando a Fé", por Helio Amorim

Preservativo: de dois males o menor?

Carta ao Ministro José Serra


PERGUNTE E RESPONDEREMOS SETEMBRO2000
Publicado Mensal N°460

Diretor Responsável SUMARIO


Estéváo Bettencourt OSB Um Deus que castiga 385
Autor e Redator de toda a materia
A mais recente novidade:
publicada neste periódico
Comunicacáo com os mortos por

Diretor-Administrador: meios eletrónicos 386


D. Hildebrando P. Martins OSB Que é?
Alucinacáo 3gi
Administracáo e Oistribuicáo:
Candente debate:
Edicóes "Lumen Christi"
Ainda o aborto 396
Rúa Dom Gerardo, 40 - 5° andar - sala 501
Tel.: (0XX21) 291-7122 Sempre em voga:
Fax (0XX21) 263-5679 "Historia das Inquisicóes: Portugal,
Espanha e Italia, Sáculos XV-XIX" 407
Endereco para Correspondencia: Procurando nos Bastidores:
Ed. "Lumen Christi" Poder Regio e Inquisicáo
Caixa Postal 2666 em Portugal 413
CEP 20001-970 - Rio de Janeiro - RJ
Continuando a Historia:
A Inquisicáo no Brasil 420
Visite o MOSTEIRO DE SAO BENTO
e "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" Esvaziando a fé:
na INTERNET: http://www.osb.org.br "Descomplicando a Fé", por
e-mail: lumen.christi@osb.org.br Helio Amorim 423

Preservativo: de dois males o menor? ... 429


Carta ao Ministro José Serra 431

COM APROVAgÁO ECLESIÁSTICA

NO PRÓXIMO NÚMERO:

O terceiro Segredo de Fátima. - Oracáo: Dificuldades e Pistas de Solucáo. - Debate


sobre o Preservativo. - Aborto: urna Opcáo perigosa. - "Católicas pelo Direito de Decidir".
- Divorciados Recasados e Eucaristía. - Oaska: que é? - "A mais poderosa voz que
jamáis se ouviu...". - Ainda Pió XII.

(PARA RENOVACÁO OU NOVA ASSINATURA: R$ 35,00).


(NÚMERO AVULSO R$ 3,50).

O pagamento poderá ser á sua escolha:

1. Enviar em Carta, cheque nominal ao MOSTEIRO DE SAO BENTO/RJ.

2. Depósito em qualquer agencia do BANCO DO BRASIL, para agencia 0435-9 Rio na


C/C 31.304-1 do Mosteiro de S. Bento/RJ, enviando em seguida por carta ou fax,
comprovante do depósito, para nosso controle.

3. Em qualquer agencia dos Correios, VALE POSTAL, enderecado as EDICÓES "LUMEN


CHRISTI" Caixa Postal 2666 / 20001-970 Rio de Janeiro-RJ

Obs.: Correspondencia para: Edicóes "Lumen Christi"


Caixa Postal 2666
20001-970 Rio de Janeiro - RJ >
UM DEUS QUE CASTIGA ...

Nao é raro ouvir falar de um Deus que castiga,... e castiga nao somente
neste mundo, mas tambóm após a morte, para sempre. Isto apavora, e pare
ce ter fundamento na própria Biblia (cf., por exemplo, Mt 18,34s).
Ora quem reflete sobre tal modo de pensar, verifica que se trata de um
antropomorfismo. O homem tende a atribuir ao Criador os procedimentos da
criatura: o Senhor seria um Pai Bonacháo ou um Banqueiro a ser cativado ou
um Juiz inexorável. A própria Escritura, falando a linguagem dos homens para
os homens, adota esse expressionismo, quando diz que "Deus se arrepen-
deu" (Gn 6, 6) ou que "despertou como... um valente embriagado pelo vinho"
(SI 78, 65) ou ainda que "ouviu e ficou enfurecido" (SI 78, 59)...

Na verdade, porém, nao é Deus quem castiga, mas é o homem quem


castiga a si mesmo, tomando-se o seu próprio carrasco. Com outras palavras:
é o homem quem define a sua sorte postuma, lavrando a própria sentenca.
Nao se imagine que, após a morte, o homem comparece diante de um tribu
nal, em que Deus figura como juiz a ouvir o anjo da guarda, de um lado, e o
demonio, do outro lado, a fim de proferir a sentenca do julgamento, julgamen-
to que a criatura ignora qual deverá ser e, por isto, pede clemencia ao juiz
severo. Jesús mesmo diz: "Quem nao eré, já está julgado" - o que significa:
"Quem, consciente e voluntariamente, deixa de atender ao convite de Deus,
porque o despreza", já julgou a si mesmo ou já definiu a sua sentenca. Após a
morte, tal pessoa nao será julgada por Deus; Ele respeitará a opeáo da criatu
ra, que terá resistido aos apelos da graca, e Ihe dará a ver o sentido da sua
vida na Térra; iluminá-la-á para que perceba com toda a clareza o significado
de seus feitos. É essa iluminacáo que se chama "juizo particular", ocorrente
logo após a morte do individuo; este reconhecerá o que terá sido a sua vida
terrestre. Assim pode-se dizer que é durante toda a sua passagem pela Térra
que o homem se julga; vai semeando, momento por momento, as sementes
cujos frutos colherá logo após a morte; a vida na Térra decide inexoravelmente
a vida futura; quem sinceramente procurou a Deus neste mundo, levantándo
se teimosamente depois de cada eventual queda, encontrará Deus no Além,
ao passo que quem procurou, consciente e voluntariamente, seus ídolos (d¡-
nheiro, prazer, gloria...), encontrará o vazio no Além. Esta vida é bem urna
sementeira: "quem semeia com parcimónia, com parcimónia também colhe
rá, e quem semeia com largueza, com largueza também colherá" (2Cor 9, 6).
Em outros termos ainda: a Escritura diz que "o amor é forte como a
morte" (Ct 8, 6), o que quer dizer: o amor, quando genuino, nao se contenta
com meias-medidas, mas abraca as medidas extremas; o amor de Deus,
portante, foi até a morte de cruz e nao se retira da criatura, mesmo quando
esta o renega. Com efeito; Deus nao subtrai á criatura o amor que Ihe deu
quando a tirou do nada, e, porque nao o subtrai, dá ocasiáo a que o ser huma
no ressinta a ¡mensa tristeza de nao haver correspondido a esse amor, que
continuará sempre a sustentar a sua criatura.
E.B.

385
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS"

Ano XLI - N2 460 - Setembro de 2000

A mais recente novidade:

COMUNICAQÁO COM OS MORTOS


POR MEIOS ELETRÓNICOS

Em síntese: A revista ISTO É dá noticia de que urna nova catego


ría de transcomunicadores se vale de meios eletrónicos para comunicar
se com os moños; cita alguns casos que parecen) comprovar tal afirma-
gáo. - Na verdade, nao existem meios (eletrónicos ou nao) de nos comu-
nicarmos com os morios. A explicacáo a ser dada para tais fenómenos
parte do inconsciente dos transcomunicadores queprojetam sons em aluci-
nagáo auditiva; o fenómeno é meramente subjetivo, nada possuindo de
transcendental. Esta elucidagao é corroborada pelo fato de que os
transcomunicadores alegam que os mortos estáo em outro mundo co-
mendo, dormindo, trabalhando, viajando, como se o além fosse urna nova
edigáo do aquém melhorada e aumentada... Ora, nenhum astrónomo ou
astronauta, recorrendo ás mais modernas sondas espaciáis, jamáis de-
tectou tal mundo suspenso no espago, onde os espfritos dos falecidos
comem, dormem, trabalham e viajam...

A revista ISTO É, em sua edicáo de 24/5/2000, pp. 84-90, publicou


urna reportagem intitulada "Muito além do jardim", em que refere urna
nova tática de pretensa comunicacáo com os mortos; seria realizada atra-
vés de meios eletrónicos, como diz urna das mánchetes do artigo:

"Com um PC e um radio de ondas curtas, varias pessoas gravam


conversas com parentes mortos, analisadas por peritos, que nao negam
sua veracidade. As vozes atraem o interesse da ciencia".

A seguir, transcreveremos parte da reportagem, á qual seráo acres-


centados alguns comentarios inspirados pela ciencia do inconsciente e a
parapsicología.

386
COMUNICACÁO COM OS MORTOS POR MEIOS ELETRÓNICOS 3

1. Os Fenómenos

"Eles conversam com parentes e amigos mortos por meto de equi-


pamentos eletrónicos. Diferente da chamada mediunidade (característi
ca que distingue os que afirmam que tém contato com os mortos), prati-
cada por espiritas, esse novo tipo de fenómeno permite urna análise pe
los instrumentos da ciencia.

A motivagáo das primeiras tentativas de contato nao fot a curiosi-


dade, mas a saudade e a dor da separagáo de alguém que morreu. Mais
de 70% dos experimentadores, segundo Sónia Rinaldi, comegaram a se
interessar pelo assunto após a perda de pessoas queridas. Com a
transcomunicagáo instrumental, nome dado ao fenómeno, todos obtém
conforto e alivio ao saber que aquetas pessoas estáo bem. 'A prova con
creta de que eles (os mortos) vivem, sentem e falam transforma a dor em
esperanga', diz Sónia em seu livro Contatos ¡nterdlmenslonais, langa-
do recentemente pela editora Pensamento. Um CD com dezena de vozes
paranormais acompanha a obra...

Para a minoría dos experimentadores, como é o caso da própria


Sónia, nao foi a dor o principal motivo que os aproximou da
transcomunicagáo. Foi a simples curiosidade ou, entáo, o interesse cien
tífico. De acordó com os relatos de gravagóes feitas por Sónia e outros
associados da ANT, a vida Lá, como a denominam, nao é muito diferente
do que nos conhecemos aqui. 'Pelo que eles nos contam, vocé continua
comendo, dormindo, trabalhando e até viajando, mas tudo em outra di-
mensáo', conta Sónia...

Nao é nada fácil conversar com os mortos pela técnica usada por
esses transcomunicadores, como admite a própria Sónia. 'Temos de en
viar um determinado ruido aos comunicantes para que eles possam talar
conosco', explica. Esse ruido pode ser o de urna torneira aberta, técnica
utilizada em outros países, radios tora de sintonía ou até mesmo a 'boina
humana' - gravagáo ininteligível de varias vozes que falam ao mesmo
tempo. 'Os comunicantes procuram modular esse som, ou seja, organi
zar esse turbilhao eletrónico para talar o que querem', conta ela.

Quando comegou a fazer experimentos, em 1988, Sónia Rinaldi


utilizava um gravador comum e um radio de ondas curtas mal-sintoniza
do. A primeira coisa que ouviu foi seu nome. Hoje, diz conversar com
parentes e amigos que já se foram. O gravador foi substituido por um
computador equipado com processador Pentium de 233 MHz e um
software feito especialmente para gravar os sons. É preciso ter muita
paciencia para ouvir as vozes. Primeiro, gravam-se algumas perguntas.
As respostas nao sao ¡mediatas.

387
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 460/2000

Mas é inegável que o fenómeno impressiona, em especial as cha


madas 'vozes reversas', algo que difícilmente poderla ser forjado. Isto é,
algumas mensagens só podem ser escutadas quando a gravagáo é ouvi-
da de tras para a frente, um artificio que conta com a ajuda do computa
dor. A flautista Rosemeire Cassiano da Silva, em urna tentativa de se
comunicar com seu irmáo Beto, gravou: 'Deixe urna mensagem para nos,
por favor'. A suposta resposta, quando ouvida no sentido reverso, sur-
preende: ouve-se claramente urna voz feminina com sotaque portugués,
bastante melódica. Ela diz: 'Vosso irmáo manda avisar que ama vocé'.
Normalmente, o que se ouve quando um registro sonoro é tocado no
sentido reverso é um emaranhado de sons sem sentido. Especialistas
em fonética dizem ser praticamente impossfvel a formagáo de frases in-
teiras no modo reverso. Ás vezes, tem-se a impressáo de ter escutado
alguma sílaba ou até mesmo urna palavra conhecida. Mas nao passa
disso. Outra assfdua experimentadora é Danieiie, filha de Rosemeire com
o investigador de policía Marcelo Manso, executado por ladróes em ¡u-
nho do ano passado com tres tiros na cabega. No primeiro contato grava
do, ouve-se urna voz feminina que diz: 'Papai está talando'. Só a partir de
outubro é que ela comegou a ouvira vozdopai. 'Gosto de vocé', dizia ele.
'Me conforta muito saber que posso falar com ele', diz Danieiie. Há, no
entanto, casos espantosos de pessoas que afirmam ter sido contatadas
por telefone celular, bip e secretaria eletrónica" (pp. 85-87).

Pergunta-se agora:

2. Que dizer?

Seráo feitos dois reparos.

2.1. índole fantasiosa


Chama a atencáo do leitor a índole fantasiosa dos relatos apresen-
tados pelos transcomunicadores: os falecidos no além "continuariam co-
mendo, dormindo, trabalhando, viajando, tudo em outra dimensáo", afir
ma Sónia Rinaldi. Ora os falecidos sao espíritos desencarnados confor
me os espiritas ou sao almas espirituais separadas do respectivo corpo,
segundo a linguagem católica. Por conseguinte nao tém corpo para co
mer e dormir nem tém boca para falar. Na verdade, a morte separa a
alma do corpo; este se torna cadáver e é sepultado: a alma persiste sem
corpo até a ressurreicáo da carne, que se dará no fim dos tempos. Nao
há dúvida, a alma no além é consciente; colhe os frutos do que semeou
na térra, mas nao come, nem dorme, nem trabalha, nem viaja.

A vida no além seria urna nova edicáo da existencia no aquém


melhorada e ampliada ("em nova dimensáo"). Ora nenhum astrónomo ou
astronauta jamáis detectou tal mundo suspenso no ar, com suas casas,

388
COMUNICACÁO COM OS MORTOS POR MEIOS ELETRÓNICOS 5

seus escritorios e veículos para viajar... Existe no ser humano uma ten
dencia natural a imaginar o além á semelhanca do mundo presente, ao
qual a pessoa está habituada. Todavía deve-se dizer que tal mundo é
ficticio. Em linguagem crista afirma Sao Paulo: "O que o olho nao viu, o
que o ouvido nao ouviu, o que o coracáo jamáis percebeu, eis o que
Deus preparou para aqueles que O amam" (1Cor 2, 9).

2.2. Projecáo do Inconsciente

A explicacáo a ser dada para os fenómenos apontados parte do


inconsciente dos transcomunicadores. Como diz a reportagem, grande
parte destes é movida pela saudade ou pelo anseio de receber alguma
comunicacáo do além. Isto predispde a conceber imaginosamente a res
pectiva mensagem. Mesmo aqueles que praticam a transcomunicacáo
por curiosidade podem estar sugestionados no sentido de que se pode
falar com os falecidos.

O recurso a meios eletrónicos ó inútil, visto que no além nao há


aparelhos receptores. Também nada significa a producáo de sons espe
ciáis para interpelar os falecidos, como seriam o ruido de uma torneira
aberta ou coisa semelhante. Os espíritos dos falecidos nao tém ouvidos
como os nossos para captar sons.

A própria reportagem de ISTO É refere os depoimentos negativos


de dentistas aos quais foram expostas as mensagens de
transcomunicacáo. Eis, por exemplo, o que é dito a respeito da escritora
paulista Hilda Hilst, transcomunicadora que vive numa fazenda a onze
quilómetros de Campiñas em companhia de oitenta caes:

"Hilda foi chamada de maluca pelos amigos. Em especial, pelos


amigos físicos. A pedido de ISTO É, eia descreve sua experiencia com a
gravagáo das vozes do Além:

'Ninguém levava a serio e as vezes chegavam a ser hostis. Levei


as fitas para meu amigo Braulio Pedroso, no Rio de Janeiro. Ele convidou
uma amiga física para ouvir. Mas apenas me gozaram, riram muito e eu
sai aborrecida. Newton Bernardes, em Campiñas, brincava comigo di-
zendo que eu mandava alguém subir na figueira para irradiar as interfe
rencias.

O Newton me levou até o César Lattes. Quando expliquei o fenó


meno, ele apenas respondeu: 'A senhora tem uma voz muito grossa pro
meugosto...'

Ninguém levava a serio nem acreditava, como até hoje ninguém


acredita.

389
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 460/2000

Por serem físicos ligados á Unicamp (Universidade Estadual de


Campiñas), cheguei a propor que o experimento fosse realizado dentro
de urna Gaiola de Faraday (aparelho semelhante a urna gaiola que ¡sola
qualquer objeto colocado em seu interior dos sinais eletromagnéticos
externos), como ¡á vinha ocorrendo no Exterior, pois esse procedimento
anula a possibilidade de interferencias de ondas de radio, telefones, sa
télites, televisao e outras.

Nao conseguí. Nenhum deles se interessou" (pp. 88s).

A Parapsicología explica os fatos atrás relatados como sendo fe


nómenos de alucinacáo auditiva provocados pelo sugestionamento: a
saudade e a curiosidade podem mover o ser humano a projetar inconsci
entemente, e de boa fé, aquilo que a pessoa imagina e deseja ouvir ou
ver. Os artificios eletrónicos só servem para catalisar a sugestáo e dar-
Ihe um pseudo-aparato científico, que pode impressionar, mas que é des
tituido de qualquer significado objetivo.

Eis por que em nosso próximo artigo abordaremos a temática da


alucinacáo.

Belas e Grandes Oracóes, pelo Pe. Nadir José Brun. - Ed. Ave-
Maña, Sao Paulo 2000, 100 x 180 mm, 248 pp.

O Pe. Nadir, pároco da igreja de Nossa Senhora do Brasil, em Sao


Paulo (SP), brinda o público com mais um de seus livros de interesse
pastoral. Desta vez, publica urna coletánea de belas oragdes, que devem
alimentar a piedade dos fiéis católicos. O autor mesmo apresenta a sua
obra no Posfácio nos seguintes termos:

"Para este devocionario selecionamos apenas oragóes cristas ex


tra-bíblicas, produzidas e vividas por cristáos de grande piedade e sabe-
doria. Duas fazem excegáo, embora sejam como as cristas de vertente
monoteísta, urna judaica (As dezoito Béncáos) e outra mugulmana (Os
Atributos de Deus no Isláo).

Datamos a época dos autores. Mas nao seguimos a ordem crono


lógica, demasiado formal para o coragáo. Antepomos as oragdes meno
res e pospomos as maiores, mesclando louvores a Jesús, ao Espirito
Santo, a Trindade...

A prece é multo comprida? Nao seja por isso; parta-a e reparta-a


em pedacinhos. A oragáo fica reduzida a urna jaculatoria ou prece curta
que vocé irá repetindo enquanto achar gosto" (p. 243).

A obra é valiosa; precisamos de apoiopara a vida de oragáo. Eis ai


um ótimo espécimen. Nossa gratidáo ao autor!

390
Queé

ALUCINAQÁO?

Em síntese: Os demonios e espfritos desencarnados nao tém cor-


po nem boca para falar; por conseguirte as vozes consoladoras ou ater
radoras nao vém da parte deles, como julgam muitas pessoas angustia
das, e tanto mais angustiadas quanto mais procuram comunicarse com
os bons e afastar os "espíritos maus". O demonio existe, sim, mas nao é
o autor de todos os fenómenos extraordinarios que ocorrem ao homem.
As vozes atribuidas aos demonios e espíritos desencarnados sao por-
tanto fenómenos meramente subjetivos ou alucinagóes.

Alucinagáo é a percepgao do que nao existe; é urna falsa percep


gao. Está associada ao estado de ánimo do individuo ou ao consumo de
drogas. O cansago, o tedio, a exaustáo física e psíquica podem produzir
alucinagóes visuais, auditivas, olfativas, gustativas e tácteis, de acordó
com as preocupagóes ou aspiragóes do individuo. Há alucinagóes cons
cientes e outras semiconscientes. A pessoa que nao tem nogáo de estar
vendo o irreal, já se acha predisposta a um estado patológico.

Há pessoas que dizem ouvir vozes do além, que as atormentam ou


consolam. Julgam tratar-se de demonios ou de espíritos desencarnados
que acompanham ou infestam a vida dos mortais na ter.a. E pedem so
corro! Mandaram celebrar Missas, fizeram novenas, trezenas... para se
livrar de tais agressóes, mas nada conseguiram; ao contrario, quanto
mais rezaram, tanto mais se sentem perseguidas. Daí a pergunta: que
será? Como explicar o fato?

Proporemos ao quesito urna resposta negativa, á qual se seguirá


outra, de índole positiva.

1. A Resposta Negativa

As vozes que atormentam, nao podem provir de espíritos desen


carnados nem de demonios, pois estes nao tém corpo nem boca para
falar: nao podem articular sons. Tais vozes, como diremos a seguir, sao
projecóes subjetivas do inconsciente da pessoa "ouvinte"; nada tém de
transubjetivo. - Se, porém, a pessoa eré que se trata de maus espíritos e
pede a Deus que a livre dos mesmos, ela se estará mais e mais persu-
adindo de que é infestada por maus espíritos e estará mais sujeita a
projetar ou imaginar tais vozes a Ihe falar. O que tal pessoa deve pedir a
Deus, é paz, saúde, bom ánimo, nao, porém, a expulsáo de espíritos
maus (que nao sao a causa do fenómeno).

391
"PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 460/2000

Verdade é que na vida de Santa Joana d'Arc e de outros Santos se


diz que ouviram vozes do além. Notemos, porém: eram vozes
reconfortado ras e amigas, nao hostis. Deus pode, em casos muito espe
ciáis, permitir que alguém faca a experiencia subjetiva de vozes frater-
nais, a fim de estimular e levar a pessoa em foco a prática do bem. Isto,
porém, é raro. O fenómeno há de ser cuidadosamente examinado, para
que nao se confunda expressao do psiquismo humano com intervencáo
do além.

Positivamente falando, os casos analisados sao os de alucinacáo


auditiva. Vejamos, pois, o que se entende por alucinacáo.

2. Alucinacáo: que é?

2.1. Significado e modalidades

Alucinacáo é urna percepcáo sem objeto ou meramente subjetiva.


É urna falsa percepcáo ou aínda é urna projecáo da fantasía, que repre
senta como existente o que nao existe.

A pessoa alucinada pode estar fortemente convencida de que está


realmente percebendo como existente o que nao existe, ou o que é ape
nas fruto da sua imaginacáo.

Se a alucinacáo desenvolve um enredo prolongado, chama-se de


lirio.

Todos os sentidos podem ser sujeitos de alucinacáo: existem aluci-


nacóes visuais, auditivas, olfativas, gustativas e tácteis... As alucinacoes
podem ser simples, como rumores, assovios, vozes aterradoras ou
consoladoras, toque de sirene, barulho de carros que passam, de gente
que desfila...

O conteúdo das alucinacoes depende muito do estado de ánimo


do individuo, ou seja, liga-se ás idéias, aos desejos, ás preocupacoes da
pessoa alucinada; por isto tanto podem servir para o reconforto como
para o apavoramento.

Quando a alucinacáo é provocada por substancias tóxicas, é pos-


sfvel identificar o tóxico através do tipo de alucinacáo, pois o álcool, a
cocaína, a morfina, a mescalina produzem imagens específicas, que re-
velam o tipo do tóxico originante.

Eis um exemplo de alucinacáo provocada pelo opio:

Um fumante de opio imaginou estar dormindo; de repente ter-se-á


acordado. Apalpando em torno de si na escuridáo da noite, sentiu algo
de frió e duro; era um cadáver. Sem se amedrontar, tomou o morto em
seus bragos e o levou para o quarto vizinho; fechou a porta, trancou-a á

392
ALUCINAgÁO?

chave e voltou a deitar-se em sua cama. Mal havia adormecido, ouviu um


rumor que o despertou. A porta se abriu e o cadáver tornou a entrar no
quarto, cambaleando como se por tras da carne Ihe faltasse a ossatura.
Dirigiu-se para a cama do parceiro deitado e, sem dizer palavra, se esten-
deu com todo o seu peso sobre o infeliz vidente; este sentiu passar pelo
seu rosto a barba e os cábelos do morto como também o seu hálito cada
vérico. Ver F. Salis-Seewis, Visión) e allucinazioni. Preto 1892, p. 111.

Este é um exemplo de alucinacáo visual e táctil.

2.2. Alucinacóes conscientes e inconscientes

Nao é raro que a pessoa alucinada se torne consciente da incon


sistencia de sua percepcáo ou, ao menos, duvide daquilo que ela percebe.

Silvio Pellico (1789-1854) foi um patriota italiano que passou dez


anos (1820-1830) num cárcere da fortaleza austríaca de Spielberg; so-
freu horrivelmente, como ele mesmo descreve na obra Le Mié Prigioni
(1832). Desgastado pelo cansaco e o tedio, teve também alucinacóes
conscientes, que relata nos seguintes termos:

"Parecia-me, embora estivesse acordado, que ora ouvia gemidos


no meu cárcere, ora ouvia risadas coñudas. Desde a infancia, nunca acre-
ditei em bruxas e duendes, mas na prísáo aqueles gemidos e aquetas
risadas me apavoraram; eu nao sabia como os explicar, de modo que eu
era levado a perguntar se nao estava sendo infestado por potencias ma
lignas desconhecidas. Muitas vezes acendi, tremendo, a lamparina e gri-
tei indagando se nao havia alguém debaixo da cama a cagoar de mim.

Sentado á mesa de leitura, parecia-me que alguém me estava pu-


xando pela roupa ou que estavam empuñando um livro de modo a fazé-
lo cair no chao ou aínda parecia-me que um individuo atrás de mim esta
va soprando no fogo da lamparina para apagá-lo. Entáo eu me levantava
e pulava, olhava em torno de mim, circulava desconfiado pelo recinto e
perguntava a mim mesmo se eu tinha enlouquecido ou se estava com a
mente lúcida" (Le Míe Prigioni, Torino SEI 1943, pp. 132s).

É de notar que Silvio Pellico nao estava adormecido no caso, mas


em vigilia sofría veemente alucinacáo devida ao desgaste físico e psíqui
co.

Interessantes sao também as alucinacóes de espelho, que po-


dem ser reconhecidas como tais pelos videntes. Em tal caso, o alucinado
vé a si mesmo como se fosse outra pessoa. Alias, já o filósofo Aristóteles
(t 322 a.C.) referia o episodio de um homem que, ao sair a passeio, via
diante de si a sua própria imagem. Eis dois outros episodios dignos de
nota:

393
10 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 460/2000

O poeta alemáo Johann Wolfgang von Goethe (1749-1832) refere


que, enquanto certa vez andava a cávalo levando na cabega tristes pen-
samentos, teve a visáo de outro cavaleiro que Ihe vinha ao encontró e,
coisa impossível, aquele estranho era ele mesmo. Entáo Goethe sacudiu
a cabega para dissipar tal imagem, mas ¡mediatamente viu que essa
mesma imagem, em vez de desaparecer, se Ihe aproximava mais ainda.
- Ao contar o fato mais tarde, Goethe reconheceu que nao se tratava de
algo posto fora dele, visto pelos olhos do seu corpo, mas sim de urna
imagem mental; cf. Aus meinem Leben. Dichtung und Wahrheit, 1808.

Coisa semelhante aconteceu a Guy de Maupassant (1850-1893),


romancista francés. Era genial, mas tinha momentos de patología men
tal. Um dia, quando se achava sentado á mesa de trabalho, num quarto
silencioso em que nao havia pessoa estranha, Maupassant ouviu a porta
abrir-se e virou-se para ela angustiado. Qual nao foi a sua surpresa ao
ver a copia dele mesmo! Esse personagem sentou-se diante de
Maupassant e Ihe ditou, a quanto parece, tudo o que ele devia dizer. Cf.
A. Munthe, citado por J. Lhermitte, Les hallucinations. Clinique et
Physio-pathologie, 1951.

Ainda outros episodios desse tipo se encontram na literatura res


pectiva.

Verdade é que muitas vezes as pessoas alucinadas nao se dáo


conta ¡mediatamente da inconsistencia de suas percepcóes; difícilmente
acreditam em quem Ihes chama a atencáo para as conclusdes da mo
derna ciencia parapsicológica. Associando as idéias, fazemos agora men-
cáo de

2.3. Alucinacóes coletivas

Em períodos de intenso sofrimento ou de exaltacáo de ánimos em


grupos fanáticos, podem ocorrer alucinacóes cole'tivas ou epidemias
alucinatórias. Exemplo típico é o seguinte:

Certa vez, numa nave inglesa um marujo víu urna prancha de ma-
deira flutuar sobre as aguas do mar. Imaginou logo que fosse o fantasma
de um companheiro morto e jogado ao mar havia poucos días. Pós-se
entáo a descrever com vivacidade o que vira, de modo que os colegas de
tripulacáo acudiram para ver o fantasma descrito. Eis, porém, que, quan
do se aproximaram da tábua flutuante, perderam qualquer ilusáo a res-
peito, pois perceberam que nada de extraordinario havia ai.

Pode-se crer que na Idade Media quando os homens viam bruxas


ou "mulheres infestadas pelo demonio", havia alucinacáo coletiva.

Após a segunda guerra mundial (1939-1945), violenta como foi,


deixando enormes danos materiais e moráis, foram freqüentes os casos

394
ALUCINAgÁO? 11

de alucinagáo coletiva. As pessoas traumatizadas viam coisas alvissa-


reiras, que respondiam aos seus anseios; melhor dizendo:... projetavam,
como se estivessem vendo, mensagens de consolo e reconstrucáo...
Tornou-se famoso o caso de Marta de Bolsena (Italia), que dizia ter vi-
sóes de Nossa Senhora em determinada gruta; as suas narrativas eri
co ntraram crédito em cerca de trinta pessoas, que julgavam, também
elas, ter visóes e, quando o imaginavam, entravam em éxtase; esse éx-
tase podía ocorrer quando caminhavam pelas estradas; entao iam, como
se fossem sonámbulas, para a gruta das aparicoes. O seu semblante
ficava tenso, apavorado; nao pronunciavam frases completas, mas ex-
clamagóes. Agitavam-se violentamente, batendo com o rosto por térra,
sacudiam os bragos, emitiam sons estranhos... O fenómeno foi observa
do por psicólogos e profissionais especializados, que chegaram á sus-
peita de que os fatos eram, ao menos em parte, dirigidos e comandados
como peca teatral. Como quer que seja, a sugestáo ou a persuasáo
subjetiva de que havia aparicóes era capaz de provocar toda urna ence-
nacáo e profundos transtornos psicológicos ñas pessoas afetadas.
Estas observagóes estáo longe de significar que todas as narrati
vas de aparicáo sejam falsas; apenas contribuem para recomendar cau
tela e prudencia diante de casos portentosos.

Os especialistas, em seu diagnóstico e sua experiencia, acreditam


que as alucinagóes permanentes e resistentes a qualquer terapia ou
psicoterapia sao síntomas de estado mental doentio. Com efeito, as pes
soas sadias, cedo ou tarde, se dáo conta do caráter subjetivo das suas
alucinagóes. Quem nao se torna consciente disto, vive num estado de
delirio continuo e anormal. A causa desse estado pode ser urna doenca
nervosa, como a histeria, a epilepsia, a encefalite crónica, o uso de dro
gas e o recurso a narcóticos.

Também se observa que as alucinagóes provém muitas vezes de


forte sugestionamento ou de grande expectativa, que deixa os ánimos
excitados; essa expectativa gera a imagem ou o som que a pessoa espe
ra. Urna pessoa alucinada pode contagiar outras, dando origem a aluci
nagáo coletiva.

Estes dados de psicología e parapsicología sao úteis para a expli-


cagáo dos fenómenos espiritas de materializagáo dos espíritos, apari-
góes de defuntos, visáo extracorpórea (alma "que sai do corpo" e tudo vé
"lá de cima"), etc.

CARO(A) LEITOR(A),

CONHECA MELHOR SUA FÉ: INSCREVA-SE NOS CURSOS POR


CORRESPONDENCIA DA ESCOLA «MATER ECCLESIAE». INFORMA
LES PELO TELEFAX 0XX21 -242-4552.

395
Candente debate:

AÍNDA O ABORTO

Em síntese: O tema "aborto" foi novamente agitado por ocasiáo


dos casos de anencefalia recentemente ocorrídos. A Moral católica - e,
com ela, a razáo natural e o bom senso - repudiam talprática como sen
do auténtico homicidio; além do qué, fere a índole naturalmente materna
da muiher. Apontam-se outrossim abusos devidos a comercializagao dos
fetos extraídos do útero da gestante. - O artigo abaixo apresenta urna
visáo que tenta.ser panorámica, do debate em foco.

A temática do aborto foi novamente debatida com veeméncia por


ocasiáo dos casos de criancas anencéfalas ocorrídos em maio e junho
pp. Foi mais urna vez colocada a questáo do aborto eugénico como tam-
bém foi considerada a condicáo da muiher que em seu seio traz urna
crianza fadada a perecer pouco depois de nascer. A Moral católica - e,
com ela, o bom senso e a razáo natural - sao contrarios a todo tipo de
aborto, pois este é sempre um homicidio ou a violacáo do direito á vida
que toca a qualquer ser humano. Deixe a gestante que seu filho nasca e,
caso sobreviva, entregue-o a quem dele possa cuidar; assim poupará a
si mesma o trauma de haver assassinado o seu próprio filho.

Ñas páginas subseqüentes procuraremos oferecer urna visáo pa


norámica dos pros e contras do debate relativo ao aborto.

1.0 cerne da questáo

Pode-se dizer que o ponto crucial de todo o debate consiste em


saber quando comega a vida humana no seio materno.

A tal questáo durante séculos foi dada a resposta baseada na anti-


ga biología: a vida intelectiva, propriamente humana só comecaria 40
días após a concepcáo no caso dos individuos masculinos e 80 dias após,
no caso dos individuos femininos. Por conseguinte, antes dos términos
assinalados seria lícito matar o feto, pois nao se estaría tirando a vida de
um ser humano. Alias, é assim que até hoje muítos argumentam.

Todavía, dados os progressos da Genética, já nao se pode susten


tar a tese antiga: os estudiosos afirmam que a vida humana, com todo o
seu potencial típico, tem inicio no ato de fecundado do óvulo pelo
espermatozoide; o feto, por menor que seja (alguns diriam:... do tama-
nho de urna cabeca de alfinete) nao é parte da máe, mas é um individuo

396
AÍNDA O ABORTO 13

que tudo tem para ser considerado auténtico ser humano. Diga-o o Prof.
Jeróme Lejeune, que foi o pioneiro das pesquisas modernas:

"Desde que os 23 cromossomos do pai se juntam aos 23


cromossomos da máe, está coletada toda a informagáo genética neces-
sária e suficiente para exprimir todas as características ¡natas do novo
individuo. Isto se dá á semelhanga de urna minicassete introduzida num
gravador: sabe-se que produz urna sinfonía. Assim também o novo ser
comeca a se exprimir logo que foi concebido... Os cromossomos sao as
tábuas da lei da vida: quando sao reunidos no novo individuo (a votagáo
da lei é figura da fecundagáo do óvulo pelo espermatozoide), eles des-
crevem inteiramente a Constituigáo dessa nova pessoa...

Aceitar o fato de que, após a fecundagáo, um novo individuo come-


gou a existir }á nao é questáo de gosto ou de opiniao. A natureza do ser
humano, desde a concepgáo até a velhice, nao é urna hipótese metafísica,
mas sim urna evidencia experimental" (Trecho de Relatório apresentado
á Comissáo Senatorial norte-americana em 23 de abril de 1981).

Ver outros testemunhos do Dr. Jéróme Lejeune no Apéndice deste


artigo, p. 406.

Por conseguinte, se o feto é auténtico ser humano, tem direito á


vida e nao pode ser tratado como coisa. Embora ainda desconhecido,
merece respeito como o adulto atetado por grave doenca merece respei-
to e dedicacáo.

Apesar da evidencia assim estabelecida, há quem pretenda propor


o aborto (verdadeiro homicidio) em casos "excepcionais", que passamos
a considerar.

2. Casos "excepcionais"

Consideraremos os quadros seguintes:

2.1. Estupro

A gravidez resultante de estupro é indesejada; por conseguinte


maltrata a máe como também maltrata o filho, que nascerá como crianca
rejeitada e, por isto, traumatizada. Daí procurarem muitos legitimar o aborto
em casos de estupro.

A propósito observe-se:

É realmente lamentável que a mulher seja violentada, mas nao se


corrige um mal mediante outro mal ou mediante um homicidio. A crianca
inocente nao tem a obrigacáo de pagar com a própria vida o crime come
tido por alguém que geralmente fica impune. Em tais casos é para dese-
jar que a mulher estuprada deixe nascer a crianza e a dé a quem a possa

397
14 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 460/2000

educar. Assim permitirá ao pequenino que viva e se preservará de novo


trauma - o de ter matado o próprio filho.

Pondera o Dr. Joáo Evangelista dos Santos Alves, via e-mail:

"Dizem:'(...) no Brasil, desde 1940, o Código Penal permite inter-


romper a gravidez se for o resultado de estupro (...)'. Ora, essa afirmativa
é incorreta. A legislagáo brasileira é, em letra e espirito, radicalmente
contraria a prática do aborto. A Constítuigáo garante 'aos brasileiros e
aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito á vida' (art.
5g). Eninguém ignora que há vida no ventre materno desde a concepgao; 'é
condigno basilar, momento inicial e parte integrante do processo global e
unitario da existencia humana'. O Código Civil (art. 43) 'póe a salvo desde a
concepgao os direitos do nascituro', sem excegáo. Também os artigos 458 e
462 do C. Civil e o Código de Processo Civil em seus artigos 877 e 878 se
esmeram nos cuidados deprotegáo ao nascituro. Inclusive, o próprio Código
Penal profbe o aboñamento provocado, incluindo-o entre os crímes contra a
pessoa: Parte Especial- Título I: Dos crímes contra a pessoa - Capítulo I:
Dos crímes contra a vida (arts. 124 a 128); portanto, equiparando-o tacita-
mente ao homicidio. O artigo 128 apenas isenta de punigáo nos dois casos
previstos', ¡sentar de punigáo nao significa permitir e muito menos críar faci
lidades para que o crime seja cometido. O C. P. também isenta de punigáo o
filho que furta bens do pai e vice-versa (art. 181), mas nem por isso pode-se
dizer que permite ou que se deva facilitar a infragáo. ¿sabido que as leis
nao sao apenas punitivas, pois, quando retamente formuladas, constitu-
em, pela sua expressáo educativa, importante fatorpara a formagáo mo
ral do povo. A legislagáo e os recursos específicos devem ser colocados
a servigo da maternidade e da vida, protegendo-se a máe e o filho".

2.2. Perigo de vida da gestante

Há quem proponha a legitímalo do aborto, caso a máe corra pe


rigo de vida.

Deve-se responder que a Medicina existe para salvar vidas, e nao


para matar.

Em conseqüéncia o dever de todo médico é aplicar-se á tentativa


de salvar tanto a vida da gestante quanto a da crianca, comecando pela
que mais necessitar de ser atendida. Nao há dúvida, a máe é pessoa
conhecida, portadora de encargos e responsabilidades, ao passo que a
crianca nao nascida aínda é "um ilustre desconhecido". Como quer que
seja, a vida da crianca merece pleno respeito como também a do aidéti-
co, a do canceroso, a do doente mental...

1 O Código Penal isenta de punigáo quem aborta por causa de estupro ou de grave
perigo de vida porque estas duas situagóes, por si mesmas, já sao penalizantes ou
punitivas (N.dR.)

398
AÍNDA O ABORTO 15

Vé-se, pois, que é improprio ou contraditório falar de "aborto


terapéutico". Toda terapia visa a beneficiar a vida e nao a promover a
morte. Ademáis a Medicina contemporánea tem recursos para salvar a
vida de mae e filho em numerosos casos outrora tidos como insolúveis.
Alias, consta que todo médico professa o juramento de Hipócrates, o pai
da Ética médica:
"Jamáis receitarei remedio mortal a quem quer que seja, aínda que
me pega, nem hei de sugerir isto como conselho. Nao aplicarei pessário
numa mulherpara provocar aborto".

O médico árabe jura nos seguintes termos:

"Nao darei as minhas pacientes medicamento algum que envene


ne, nem que me pegam. Nao as aconselharei neste sentido, nem as aju-
darei a abortar".

É, pois, um contra-senso pleitear modalidade de Medicina que tire


a vida, em vez de tentar salvá-la.

Via e-mail, a Redacáo de PR recebeu as seguintes comunicac.5es


da Associacáo Nacional Pro-Vida e Pró-Família de Brasilia:

"Há sessenta anos, quando entrou em vigor o Código Penal, exis


tia a situagáo de risco de vida da máe gestante por falta de conhecimen-
tos científicos.

O aborto nunca foi terapéutico. Se o aborto, em tempos idos, era usa


do a pretexto de terapia, devia-se a falta de conhecimentos médicos. Numa
aula inaugural o Dr. Joao Batista de OHveira e Costa Júnior aos alunos de
Direito da USP em 1965 (intitulada "Por que aínda o aborto terapéutico?)
disse que o aborto 'nao é o único meio, ao contrarío, é o pior meto, ou
melhor, nao é meló algum para se salvar a vida da gestante', urna vez
que ele apresenta mais perigos do que a continuagáo da gravidez. Tal afír-
magáo é comprovada por estatfsticas por ele apresentadas, já naquela época.

Hoje, com o desenvolvimento da ciencia médica, nao mais existe


aqueta situagáo. Médicos das diversas especialidades atestam que a
manutengáo desse dispositivo no Código Penal é um reconhecimento de
atraso na medicina brasileira. Já há alguns anos, em urna petigáo enca-
minhada ao Ministerio da Justiga, médicos de varias especialidades soli-
citaram a retirada do dispositivo do Código Penal que nao penaliza o
aborto nos casos de risco de vida da gestante (Art. 128,1).

No caso de anencefalia, caso sempre discutido, a crianga va! cor


rer, é certo. Mas que direito temos de abreviar-lhe a vida?

Argumentase que a mulher nao pode ser obrigada a carregar um


feto inviável e que para ela é um sacrificio. Outros até dizem que a mulher

399
16 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 460/2000

grávida de anencéfato carrega um cadáver em seu útero. Bem, nao é


cadáver porque há vida, e, se fosse cadáver, opróprio organismo se en-
carregaria de expulsá-lo. Sem nenhuma dúvida, é grande dorpara urna
futura máe saber que seu filho é anencéfalo. Mas pior sofrimento é a
síndrome pós-aborto que ela carrega por toda a vida. A mulher que se
submete a um aborto, além do risco para sua saúde, que é maior que o
de um parto, tem problemaspsicológicos, queaatormentamportoda a vida".

2.3. Malformagáo do feto

Principalmente em caso de anencéfalos se propugna a realizacáo


do aborto, o qual, de resto, seria legal em qualquer caso de deficiencia
física do feto. Para o justificar, alega-se que o ser humano deficiente
físico é um infeliz; por isto é melhor tirar-lhe a vida do que o deixar nascer.

Em resposta, dizemos que a ninguém é lícito dispor da vida alheia


e julgar se alguém tem ou nao tem o direito de viver. O fato de alguém ser
deficiente nao habilita ninguém a matá-lo. Há pessoas deficientes que se
tornaram grandes vultos em seu tempo, porque, em vez de ser encami-
nhadas para a morte, foram estimuladas a assumir sua vida e procurar
desenvolver as suas potencialidades; tenham-se em vista o caso de Helen
Keller, surda, muda e cega, mas famosa por sua cultura universitaria, os
de Marie Heurtin, Marta Obrecht, Ana María Poyet... As pessoas podem
ser altamente beneficiadas por urna sociedade que cultue a vida e a fa-
voreca, em vez de promover a cultura da morte.

É de notar que estas reflexóes nao sao inspiradas exclusivamente


pela fé religiosa, mas decorrem estritamente do bom senso e de urna
consideracáo corajosa e magnánima dos desafios da vida.

Vía internet, comenta o Dr. Joáo Evangelista dos Santos Alves:

"O GLOBO, no dia 23.12.97, página 6. Segáo 'Tema em Discussáo


- Nossa Opiniáo', opinando sobre o que denominou aborto legal e sua
realizagao em hospitais públicos, fez a seguinte colocagáo indevida: 'A
convicgao religiosa merece o mais profundo respeito. Mas nao se pode
esquecer também que o Estado é leigo e que há muitas religióes diferen
tes no Brasil'. Ora, nao é necessário recorrerá religiaopara se condenar
o homicidio, a tortura, o roubo, etc., visto tratarse de problemas de or-
dem natural. Assim também a prática do aborto, pois consiste em brutal
desrespeito ao direito humano fundamental - o direito á vida - cuja viola-
gáo atinge todos os outros direitos. Obviamente, o direito á vida é atributo
de todos os seres humanos: materialistas, espiritualistas, católicos, protes
tantes, espiritas, agnósticos e ateus, velhos, jovens, criangas, recém-natos
e nascituros desde a concepgáo; pobres e ricos, brancos e negros, etc. Por-
tanto, qualquer atentado contra a vida humana inocente constituí falta con-
denável, quer seja praticado por pessoa religiosa, quer por ateu convicto".

400
AÍNDA O ABORTO 17

2.4. Contencáo demográfica

Muítos se baseiam em predicóes sinistras de explosáo demográfica


e super-populacáopara defender o aborto como instrumento de conten-
cáo demográfica. E o que propuseram varios participantes das Confe
rencias Mundiais sobre a Populacáo realizadas no Cairo (1994) e em
Pequim (1995).

A propósito deve-se observar que os prognósticos do malthu-


sianismo e do neomalthusianismo estáo superados. O Setor de Popula-
cao da Organizacáo das Nacóes Unidas tem alertado para dois grandes
males que ameacam a sociedade contemporánea: o declínio da natali-
dade e o envelhecimento dos povos. Com efeito; a contencao sistemáti
ca dos nascimentos em muitos países e os progressos da Medicina tém
levado a inquietante estado de coisas: aumenta o número de pessoas
idosas, que já nao trabalham, e diminuí o número de jovens que traba-
Iham para sustentar a si e aos seus compatriotas. Tém sido considera
dos em particular oito países: Franca, Alemanha, Italia, Japáo, República
da Coréia do Sul, a Federacáo Russa, o Reino Unido e os Estados Uni
dos. Um recente relatório da ONU dá a ver que 61 países nao tém crian-
cas suficientes para preencher as lacunas deixadas pelos anciáos que
falecem. Para suprir a falta de trabalhadores em países industrializados,
requer-se a imigracáo de homens e mulheres de outras regioes: o Japáo,
por exemplo, precisará de milhóes de ¡migrantes a fim de ocupar as va
gas deixadas pela falta de trabalhadores locáis; segundo os mesmos
cálculos, a Uniáo Européia precisará de ainda maior número de ¡migrantes.

Escreve o Dr. José Maria Rodrigues Ramos, Doutor em Economía


pela USP e professor universitario:

"Entretanto, o futuro populacional do Brasil parece ser pouco co-


nhecido ou divulgado pela opiniáo pública. De acordó com os dados vei-
culados pelo Instituto Brasileiro de Geografía e Estatfstica (IBGE), as ta-
xas de crescimento populacional no Brasil (1,2%) sao semelhantes ás
dos países europeus com menor crescimento populacional. A reposigáo
das geragoes exige urna taxa de 2,1%. Em termos práticos, essas taxas
representam urna inversáo da pirámide populacional, um declínio da po-
pulagáo. Se este fenómeno já preocupa a Europa, o Brasil ainda nao
acordou para esta grave questáo demográfica, social e económica".
(Interprensa n3 36, junho de 2000).

Para resolver o problema assim colocado, há quem julgue também


que se deveria retardar a idade de aposentadoria e aumentar a carga de
impostos pagos pelos trabalhadores a fim de atender aos anciáos ¡nativos.

Tais arrazoados pretendem evidenciar que o aborto nao é solucáo


para os impasses suscitados por saúde, honra e demografía no mundo
de hoje.

401
18 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 460/2000

Outro aspecto da temática merece atengáo.

3. Vulnerada ela mesma

O aborto fere nao apenas a crianga, mas também a própria máe.


Com efeito; a mulher traz em si especial sensibilidade para a vida; o
senso de maternidade Ihe é congénito, de modo que o fato de matar um
filho a traumatiza profundamente; durante anos ela guarda na memoria a
hediondez do ato - o que muito a maltrata. A respeito há interessante
artigo da Dra. Mary Simón, psicóloga da Clínica Ginecológica Universita
ria de Würzburg (Alemanha) publicado na revista Deutsche Tagespost
de 04/07/1992, artigo do qual váo extraídos alguns tópicos:

«Ás vezes preténdese justificar o aborto como a única safda para


situagóes angustiantes que urna gravidez indesejada pode trazer. No
entanto, a pior angustia vem depois do aborto. Com efeito, é mais fácil
tirar a crianga do útero da máe do que fazé-la desaparecer do seu pensa-
mento, inclusive em países de cultura nao crista como o Japáo (onde o
aborto livre é legal há quase cinqüenta anos); estudos de grande amplitu-
de mostram que 73% das mulheres japonesas que praticaram o aborto
se sentiam angustiadas pelo que haviam feito. Em geral, tres tipos de
fenómenos psíquicos costumam ocorrernas mulheres que fazem aborto:

a) Sentimentos de remorso e culpa (60% das mulheres, indepen-


dentemente de terem ou nao religiáo);

b) Oscilagóes de ánimo e depressáo (30 a 40%);

c) Choro aparentemente ¡motivado, medo e pesadelos (35%)».

Para se defender do seu complexo de culpa, diz a Dra. Mary Simón


que as mulheres desenvolvem tres tipos de mecanismo psicológico: re-
pressáo, projecáo e confrontagáo.

Repressáo ... A Dra. Simón explica que 61% das mulheres que
entrevistou, evitam pensar no aborto e reprimem este pensamento de-
senvolvendo entáo síntomas de origem psíquica, que seriam
somatizagóes: dores de cabeca, vertigens, tontu ras e cólicas abdomi-
nais. Em 70% das mulheres surgem pensamentos de como seriam as
coisas se a crianga abortada vivesse agora, e 52% délas se incomodam
ao verem mulheres grávidas, porque Ihes recordam seus próprios filhos
abortados.

Projecáo ... As mulheres projetam para outros a responsabilidade


do próprio aborto. Em geral, sao mulheres instáveis psíquicamente, mas,
sobretudo, dependentes económicamente do pai da crianga. Cedem á
pressáo do marido, do parceiro ou mesmo do ambiente, e abortam. Esta-
tísticas recentes comprovam que, só nos Estados Unidos, 50% dos ca-

402
AÍNDA O ABORTO 19

sais que fizeram aborto se separaram após o mesmo. Muitas mulheres


também acusam os médicos de nao as ter informado suficientemente
sobre as possfveis conseqüéncias do aborto. No total, 45% voltariam atrás
se pudessem, pois consideraram sua anterior decisáo de abortar prejudi
cial e equivocada.

Confronto ... O terceiro e menor grupo de mulheres entrevistadas


pela Dra. Mary Simón tenta recuperar seu equilibrio psíquico, enfrentan
do conscientemente o fato do aborto, e conversam francamente com pes-
soas de sua confianga, mas nunca com o médico que realizou o aborto.
Reconhecem-se arrependidas e sentem o trauma do crime cometido.

Estas averiguacdes sugerem ao Dr. L. Clemente da S. Pereira Rolim,


da Escola Paulista de Medicina, as seguintes observacoes:

"Aqueles que defendem ou indicam o aborto, tém consciéncia do


que realmente estáo causando a mulher? No mundo inteiro, como conse-
qüéncia do grande número de abortos que se praticam, está aparecendo
um exército de mulheres com graves neuroses pós-aborto. Como médi
co, sinto-me no dever de alertar as mulheres que pensam em abortar
(principalmente as adolescentes) e também a todos os colegas que aten-
dem a essas pacientes, lembrandopalavrasda Dra. Mary Simón: 'O aborto
nao somente aniquila urna vida humana nao nascida, mas também arruina
a psique da mulher'".

Outra faceta da problemática se impóe á nossa consideracáo.

4. Comercializacáo de Bebés

É notorio que, se muitos dos fetos extraídos do seio materno sao


lancados no incinerador após atrozes tormentos, outros sao comer
cializados ou vendidos a fábricas de cosméticos e sabonetes. É o que
atesta, entre outros, o livro de dois jornalistas ingleses - Michael Lichtfield
e Susan Kentish - traduzido para o portugués por Edicóes Paulinas com
o título "Bebés para queimar". Os dois autores, munidos de gravador e
simulando ser casados entre si ou namorados, foram ter a diversas Clíni
cas de aborto e varios médicos na Inglaterra, a fim de pedir
aconselhamento, pois "suspeitavam estar Susan grávida" - o que Ihes
causaría grande transtorno, já que estavam com viagem de ferias progra
mada. Puderam entáo perceber a trama existente a fim de orientar os
clientes de tais casas para a prática do aborto; embora Susan nao esti-
vesse grávida, o laudo resultante do exame de urina era geralmente "Grá
vida"; este mesmo laudo ocorreu quando urna vez Michael ofereceu sua
urina para exame! Mais: puderam os jornalistas averiguar que mais de
um médico vendía as enancas extraídas do seio materno a fábricas de
cosméticos e sabonetes, visto que a gordura natural é a mais recomen
dada para a confeceáo de tais artigos!

403
20 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 460/2000

Certas clínicas da Inglaterra tém agentes no estrangelro, que fa-


zem a publicidade comercial de suas "vantagens"; aborto em fim de se
mana com todas as garantías e comodidades desejáveis! Alias também
nos Estados Unidos da América e na Holanda Michael e Susan averigua-
ram procedimentos semelhantes aos da Inglaterra.

Eis um trecho do diálogo travado entre os dois jornalistas e o Dr. N.


N.:

"Vejam, tenho alguns bebés muito grandes. É uma pena jogá-los


no incinerador, quando se poderla fazer uso muito melhor deles. Realiza
mos muitos abortos tardios. Somos especialistas nisto. Fago aborto que
os outros médicos nunca faríam. Fago-os com sete meses, sem hesitar. A
lei diz vinte e oito semanas. É o limite legal. Porém, é impossfvel determi
nar a fase em que foi feito o aborto. Se a máe está pronta para correr o
risco, eu estou pronto para fazer o aborto.

Muitos dos bebés que tiro, já estáo totalmente formados e vivem


aínda um pouco, antes de serem eliminados. Uma manha havia quatro
deles, um ao lado do outro, chorando como desesperados. Nao tive tem-
po de matá-los ali na hora, porque tinha muito que fazer. Era uma pena
jogá-los fora no incinerador, porque eles tinham muita gordura animal
que poderla ser comercializada.

Naquele ponto, se tivessem sido colocados numa incubadora, po-


deríam sobreviver, mas na minha clínica eu náopossuo essa especie de
facilidades. O nosso negocio épór fim a vidas e nao as ajudara comegar.

As pessoas que moram ñas vizinhangas da minha clínica, tém-se


queixado do cheiro de carne humana queimada. O cheiro sai do
incinerador. Nao é propriamente um cheiro agradável. Dizem que cheira
como um campo de exterminio nazista durante a última guerra. Nao sei
como eles podem saber o cheiro de um campo de exterminio nazista,
mas nao quero discutir o tato. Portanto, estou sempre procurando manei-
ra de me livrar dos fetos sem precisar de queimá-los.

Encaminhá-los para a pesquisa científica nao é rentável. Tratase


de ver se vale a pena... e desfazer-se deles sem violar a lei" (pp. 150-
154).

Da Inglaterra vem aínda a seguinte noticia:

"O Dr. Lawrence Lawn, do Departamento de Medicina Experimen


tal da Universidade de Cambridge, fez experiencias com bebé vivo, nas-
cido em aborto legalizado. Alguns módicos ingleses tém defendido a todo
custo suas experiencias com bebés abortados vivos, depois de uma forte
onda de protestos na Inglaterra, quando um membro do Parlamento re-
velou a imprensa que clínicas particulares de aborto estavam vendendo

404
AÍNDA O ABORTO 21

bebés abortados vivos, para fins de experiencia" (J. C. Wilde e Sra. O


Aborto, Ed. Paulinas 1980).

5. A Posicáo da Igreja Católica

Nos recentes debates públicos sobre o aborto tem-se dito que a


Igreja nao tem autoridade para o condenar, pois ela o terá permitido des
de os primeiros tempos até o século XIX. - Tal afirmacáo é surpreenden-
te, pois carece de todo fundamento. A propósito observe-se:

1) A Igreja nao se opóe ao aborto em nome da fé apenas, mas sim,


e básicamente, em nome da lei natural, que, no íntimo de todo homem,
proclama: "Nao matar o inocente". A Igreja fala em nome do bom senso
humano para o bem da humanidade.

Sao constantes através dos séculos os pronunciamentos da Igreja


contra o aborto. Foram unánimes, mesmo quando se duvidava do mo
mento da animacáo ou da hominizacáo do feto: qualquer que fosse a
teoría científica a respeito, o aborto sempre foi tido como ilícito, por ser
extincáo de um ser humano em formacáo. - Eis alguns testemunhos muito
significativos:

Em 90-100 a Didaqué ou o primeiro Catecismo dizia: "Nao mata


rás... nao cometerás adulterio. Nao matarás crianca por aborto nem cri-
anca já nascida" (2, 2).

"O caminho da morte é... dos assassinos de criangas" (5, a).

Na segunda metade do século Illa epístola a Diogneto observava:


"Os cristáos casam-se como todos os homens; como todos, procri-
am, mas nao rejeitam os filhos" (V 6).

Os Concilios sucessivamente repetiram a condenacáo do aborto:


assim o de Elvira (Espanha) em 313 aproximadamente, o de Lérida em
524, o de Trulos ou Constantinopla em 629, o de Worms em 869...

Fazendo eco á constante Tradicáo, o atual Código de Direito


Canónico reza o seguinte:

"Canon 1398. Quem provoca o aborto, seguindo-se o efeito, incorre


em excomunháo latee seníentlae (pelo tato mesmo de cometer o delito)".

Por conseguinte, nao resta dúvida de que a posicáo da Igreja sem


pre foi contraria ao morticinio de enancas no seio materno. Muito mais
útil ao mundo de hoje seria, em vez de promover a matanca dos inocen
tes, procurar promover a assisténcia á gestante que nao tem condicoes
materiais ou psicológicas de educar seu filho; esforcem-se os governantes
por possibilitar á mulher grávida levar a gestacáo ató o fim, dar á luz a

405
22 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 460/2000

crianca e finalmente entregá-la a casáis ou a instituic5es que assumam a


educa9áo da enanca. Seria para desejar que o dinheiro aplicado ao intui
to de matar criancas fosse investido em fundagóes de amparo á materni-
dade e de cultivo da vida e nao da morte!

APÉNDICE
Eis outras declaragóes do Prof. Dr. Jéróme Lejeune, geneticista de
fama mundial, falecido na qualidade de Presidente da Pontificia Acade
mia Pró-Vida1, fundada por Joáo Paulo II:

"Se um óvulo fecundado nao é por si só um ser humano, ele nao


poderá tornarse um, pois nada é acrescentado a ele".
"Pensó pessoalmente que diante de um feto que corre um risco,
nao há outra solugáo senáo deixá-lo correr esse risco. Porque, se se
mata, transformase o risco de 50% em 100% e nao se poderá salvar em
caso nenhum. Um feto é um paciente, e a medicina é feita para curar...
Toda discussáo técnica, moral ou jurídica é supérflua: ¿preciso simples-
mente escolher entre a medicina que cura e a medicina que mata".
"A sociedade nao deve Mar contra a doenga, suprimindo o doen-
te".

"Um único criterio mede a qualidade de urna civilizagáo: o respeito


que ela prodigaliza aos mais fracos de seus membros. Urna sociedade
que esquece isso, está ameagada de destruigáo. A civilizagáo está, mui-
to exatamente, no fornecer aos homens o que a natureza nao Ihes deu.
Quando urna sociedade nao admite os deserdados, ela dá as costas á
civilizagáo".

"Logo que os 23 cromossomos paternos trazidos pelo esperma


tozoide e os 23 cromossomos maternos trazidos pelo óvulo se unem,
toda informagáo necessária e suficiente para a constituigáo genética do
novo ser humano se encontra reunida".
"O fato de que a crianga se desenvolve em seguida durante nove
meses no seio de sua máe, em nada modifica sua condigno humana".

"Assim que é concebido, um homem é um homem".


"Nao quero repetir o obvio, mas na verdade, a vida comega na fe-
cundagáo. Quando os 23 cromossomos masculinos se encontram com
os 23 cromossomos femininos, todos os dados genéticos que definem o
novo ser humano já estáo presentes. A fecundagáo é o marco da vida".

1 O Prof. Dr. Jetóme Lejeune era também membro da Academia de Medicina da


Franca, membro da Academia Pontificia das Ciencias e da Amerícan Academy of
Arts and Sciences.

406
Sempre em voga:

"HISTORIA DAS INQUISIQÓES:


PORTUGAL, ESPANHA E ITALIA;
SÉCULOS XV-XIX"
por Francisco Bethencourt

Em síntese: O historiador portugués Francisco Bethencourt escre-


veu minuciosa obra que analisa os Regimentos, o funcionamento, o ritual
e os símbolos da Inquisigáo em Portugal, na Espanha e na Italia. Quem a
le, mal se dá conta da realidade subjacente a Inquisigáo da península
ibérica: foi fortemente manipulada pelo poder regio, que solicitou á Santa
Sé a instalagáo do tribunal inquisitorial a fim de unificar a populagao da
península, livrando-a da presenga de judeus nao convertidos ao Cristia
nismo e mugulmanos. Principalmente a Inquisigáo Espanhola foi dirigida
pelos monarcas a ponto mesmo de entrar em confuto com a autoridade
de Roma; ficou sendo chamada "Inquisigáo Regia"e nao "Inquisigáo Ecle
siástica".

O historiador portugués Francisco Bethencourt publicou vasto es-


tudo intitulado "Historia das Inquisigóes: Portugal, Espanha e Italia, Sé-
culos XV-XIX"1. A obra é de alta erudigáo: supoe minuciosa pesquisa em
fontes variadas, constituindo um rico documentarlo. Todavía nao p5e em
relevo suficiente o fato de que, embora fosse oficialmente eclesiástica, a
Inquisigáo Ibérica foi intensamente orientada pelos reis de Espanha e
Portugal, que intencionavam, mediante tal órgao (de inspiragáo religio
sa), atender a interesses políticos e unificar a populagáo de seus territo
rios, eliminando judeus nao convertidos e muculmanos. A Inquisigáo ti-
nha em vista os cripto-judeus ou os israelitas que, tendo recebido o
Batismo, conservavam usos do judaismo numa atitude religiosa ambigua.

O livro de Bethencourt pode ¡mpressionar o leitor, pois descreve


minuciosamente o procedimento da Inquisigáo, com ritos e costumes que
hoje causam espanto ao estudioso. Trata-se de comportamentos que,
em hipótese nenhuma, poderiam ser repetidos nos dias atuais, mas que,
na respectiva época (em regime de Cristandade), quando toda a popula-
gao, desde o reí até o servo, era católica, nao causavam especie; ao
contrario, impunham-se a consciéncia dos cristáos como um dever; zelar

1 Companhia das Letras, Sao Paulo 2000, 160 x 23Smm, 530 pp.

407
24 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 460/2000

pela ¡ntegridade da fé era algo de impreterível e estritamente obrigatório.


Nao se deveriam, pois, julgar os procedimentos da Inquisicáo com as
categorías atuais, mas, para evitar julgamento injusto, faz-se mister re
troceder até a época dos tatos narrados.

As páginas subseqüentes tentaráo por em relevo os aspectos me


nos conhecidos da Inquisicáo na Espanha, ficando para o artigo seguinte
algo da historia da Inquisicáo em Portugal.

1. Origem da Inquisicáo Espanhola

Os reis Fernando e Isabel, visando á plena unificacáo de seus do


minios, tinham consciéncia de que existia urna instituicáo eclesiástica -
a Inquisicáo - oriunda na Idade Media com o fim de reprimir um perigo
religioso e civil dos séculos XI/XII {a heresia catara ou albigense); a este
perigo pareciam assemelhar-se as atividades dos marranos (judeus) e
mouriscos (árabes) na Espanha do século XV.

A Inquisicáo Medieval nunca fora muito ativa na península ibérica;


achava-se ai mais ou menos adormecida na segunda metade do séc.
XV... Aconteceu, porém, que durante a Semana Santa de 1478 foi deseo-
berta em Sevilha urna conspiracáo de marranos, a qual muito exasperou
o público. Entáo lembrou-se o rei Fernando de pedir ao Papa, reavivasse
na Espanha a antiga Inquisicáo, e a reavivasse sobre novas bases, mais
promissoras para o reino, confiando sua orientacáo ao monarca espa-
nhol.

Sixto IV, assim solicitado, resolveu finalmente atender ao pedido de


Fernando {ao qual, depois de hesitar algum tempo, se associara Isabel).
Enviou, pois, aos reis da Espanha o Breve de 1o de novembro de 1478,
pelo qual "conferia plenos poderes a Fernando e Isabel para nomearem
dois ou tres Inquisidores, arcebispos, bispos ou outros dignitários eclesi
ásticos, recomendáveis por sua prudencia e suas virtudes, sacerdotes
seculares ou regulares, de quarenta anos de idade ao menos, e de cos-
tumes irrepreensíveis, mestres ou bacharéis em Teología, doutores ou
licenciados em Direito Canónico, os quais deveriam passar de maneira
satisfatória por um exame especial. Tais Inquisidores ficariam encarrega-
dos de proceder contra os judeus batizados reincidentes no judaismo e
contra todos os demais culpados de apostasia. O Papa delegava a esses
oficiáis eclesiásticos a jurisdicáo necessária para instaurar os processos
dos acusados conforme o Direito e o costume; além disto, autorizava os
soberanos espanhóis a destituir tais Inquisidores e nomear outros em
seu lugar, caso isto fosse oportuno" (L. Pastor, Histoire des Papes IV 370).

Nota-se bem que, conforme este edito, a Inquisicáo só estenderia


sua acáo a cristáos batizados, nao a judeus que jamáis houvessem per-
tencido á Igreja; a instituicáo era, pois, concebida como órgáo promotor

408
"HISTORIA DAS INQUISigÓES: PORTUGAL,
ESPANHA E ITALIA - SÉCULOS XV-XIX" 25

de disciplina entre os filhos da Igreja, nao como instrumento de intoleran


cia em relacáo ás crencas náo-cristás.

2. Procedimentos da Inquisicáo

Apoiados na licenca pontificia, os reis da Espanha aos 17 de se-


tembro de 1480 nomearam Inquisidores, com sede em Sevilha, os dois
dominicamos Miguel Morillo e Juan Martins, dando-lhes como assesso-
res dois sacerdotes seculares. Os monarcas promulgaram também um
compendio de "Instrucóes", enviado a todos os tribunais da Espanha,
constituindo como que um código da Inquisicáo, a qual assim se tornava
urna especie de órgáo do Estado civil.

Os Inquisidores entraram logo em acáo, procedendo geralmente


com grande energía. Parecía que a Inquisicáo estava a servico nao da
Religiáo propriamente, mas dos soberanos espanhóis, os quais procura-
vam atingir criminosos mesmo de categoría meramente política.

Em breve, porém, fízeram-se ouvir em Roma queixas diversas contra


a severidade dos Inquisidores. Sixto IV entáo escreveu sucessivas car
tas aos monarcas da Espanha, mostrando-lhes profundo descontenta
mente por quanto acontecía em seu reino e baíxando instrucoes de mo-
deracáo para os jufzes tanto civís como eclesiásticos.

Merece especial destaque neste particular o Breve de 2 de agosto


de 1482, que o Papa, depois de promulgar certas regras coibítívas do
poder dos Inquisidores, concluía com as seguintes palavras:

"Visto que somente a caridade nos torna semelhantes a Deus...,


rogamos e exortamos o Rei e a Rainha, pelo amor de Nosso Senhor
Jesús Cristo, a fim de que imitem Aquele de quem é característico ter
sempre compaixáo e perdáo. Queiram, portanto, mostrarse indulgentes
para com os seus súditos da cidade e da diocese de Sevilha que confes-
sam o erro e imploram a misericordia!"

Contudo, apesar das freqüentes admoestacóes pontificias, a


Inquisicáo Espanhola ia-se tornando mais e mais um órgáo poderoso de
influencia e atividade do monarca nacional. Para comprovar ¡sto, basta
lembrar o seguinte: a Inquisicáo no territorio espanhol ficou sendo institu
to permanente durante tres séculos a fio. Nisto diferia bem da Inquisicáo
Medieval, a qual foi sempre intermitente, tendo em vista determinados erras
oriundos em tal e tal localidade. A manutencáo permanente de um tribunal
inquisitorio impunha avultadas despesas, que somente o Estado podía to
mar a seu cargo; foi o que se deu na Espanha: os reis atribuíam a si todas as
rendas materiais da Inquisicáo (impostos, multas, bens confiscados) e pa-
gavam as respectivas despesas; conseqüentemente alguns historiadores,
referindo-se á Inquisicáo Espanhola, denominaram-na "Inquisicáo Regia"!

409
26 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 460/2000

3. Emancipada de Roma

A fim de completar o quadro até aqui tragado, passemos a mais um


pormenor característico do mesmo.

Os reis Fernando e Isabel visavam a corroborar a Inquisicáo, eman


cipando-a do controle mesmo de Roma... Conceberam entáo a idéia de
dar á instituicáo um chefe único e plenipotenciario - o Inquisidor-Mor -, o
qual julgaria na Espanha mesma os apelos dirigidos a Roma. Para este
cargo, propuseram á Santa Sé um religioso dominicano, Tomás de
Torquemada ("a Turrecremata", em latim), o qual em outubro de 1483 foi
realmente nomeado Inquisidor-Mor para todos os territorios de Fernando e
Isabel. Procedendo á nomeacáo, escrevia o Papa Sixto IV a Torquemada:
"Os nossos carfssimos filhos em Cristo, o rei e a rainha de Castela
e Leáo, nos suplicaram para que te designássemos como Inquisidor do
mal da heresia nos seus reinos de Aragáo e Valenca, assim como no
principado de Catalunha" (Bullar. Ord. Praedicatorum III622).
O gesto de Sixto IV só se pode explicar por boa fé e confianca. O
ato era, na verdade, pouco prudente...

Com efeito; a concessáo benignamente feita aos monarcas seria


pretexto para novos e novos avancos destes: os sucessores de
Torquemada no cargo de Inquisidor-Mor já nao foram nomeados pelo
Papa, mas pelos soberanos espanhóis (de acordó com criterios nem sem-
pre louváveis). Para Torquemada e sucessores, foi obtido da Santa Sé o
direito de nomearem os Inquisidores regionais, subordinados ao
Inquisidor-Mor.

Mais aínda: Fernando e Isabel criaram o chamado "Conselho Re


gio da Inquisicáo", comissáo de consultores nomeados pelo poder civil e
destinados como que a controlar os processos da Inquisicáo; gozavam
de voto deliberativo em questóes de Direito civil, e de voto consultivo em
temas de Direito Canónico.

Urna das expressóes mais típicas da autonomía arrogante do San


to Oficio espanhol é o famoso processo que os Inquisidores moveram
contra o arcebispo primaz da Espanha, Bartolomeu Carranza, de Toledo.
Sem descer aos pormenores do acontecí mentó, notaremos aqui apenas
que durante dezoito anos continuos a Inquisicáo Espanhola perseguiu o
venerável prelado, opondo-se a legados papáis, ao Concilio Ecuménico
de Trento e ao próprio Papa, em meados do séc. XVI.
Frisando ainda um particular, lembraremos que o rei Carlos III (1759-
1788) constituiu outra figura significativa do absolutismo regio. Colocou-
se peremptoriamente entre a Santa Sé e a Inquisicáo, proibindo a esta
que executasse alguma ordem de Roma sem licenca previa do Conselho

410
"HISTORIA DAS INQUISigÓES: PORTUGAL,
ESPANHA E ITALIA - SÉCULOS XV-XIX" 27

de Castela, aínda que se tratasse apenas de proscricáo de livros. O


Inquisidor-Mor, tendo acolhido um processo sem permissáo do rei, foi
logo banido para localidade situada a doze horas de Madrid; só conse-
guiu voltar após apresentar desculpas ao rei, que as aceitou, declarando:

"O Inquisidor Geral pediu-me perdáo, e eu Iho concedo; aceito agora


os agradecimentos do tribunal; protegé-lo-ei sempre, mas nao se esque-
ga desta ameaga de minha cólera voltada contra qualquer tentativa de
desobediencia" (cf. Desdevises du Dezart, L'Espagne de I'Anden
Réglme. La Société 101s).

A historia atesta outrossim como a Santa Sé repetidamente decre-


tou medidas que visavam a defender os acusados frente á dureza do
poder regio e do povo. A Igreja em tais casos distanciava-se nitidamente
da Inquisicáo Regia, embora esta continuasse a ser tida como tribunal
eclesiástico.

Assim aos 2 de dezembro de 1530, Clemente Vil conferiu aos


Inquisidores a faculdade de absolver sacramentalmente os delitos de
heresias e apostasias; destarte o sacerdote poderia tentar subtrair do
processo público e da infamia da Inquisicáo qualquer acusado que esti-
vesse animado de sinceras disposicóes para o bem. Aos 15 de junho de
1531, o mesmo Papa Clemente Vil mandava aos Inquisidores tomassem
a defesa dos mouriscos que, acabrunhados de impostos pelos respecti
vos senhores e patróes, poderiam conceber odio contra o Cristianismo.
Aos 2 de agosto de 1546, Paulo III declarava os mouriscos de Granada
aptos para todos os cargos civis e todas as dignidades eclesiásticas. Aos
18 de Janeiro de 1556, Paulo IV autorizava os sacerdotes a absolver em
confissáo sacramental os mouriscos.

Compreende-se que a Inquisicáo Espanhola, mais e mais desvirtu


ada pelos interesses as vezes mesquinhos dos soberanos temporais,
nao podia deixar de cair em declínio. Foi o que se deu realmente nos
séculos XVIII e XIX. Em conseqüéncia de urna revolucáo, o Imperador
Napoleáo I interveio no governo da nacáo, aboliu a Inquisicáo Espanhola
por decreto de 4 de dezembro de 1808. O rei Fernando Vil, porém, res-
taurou-a em 1814, a fim de punir alguns de seus súditos que haviam
colaborado com o regime de Napoleáo. Finalmente, quando o povo se
emancipou do absolutismo de Fernando Vil, restabelecendo o regime
liberal no país, um dos primeiros atos das Cortes de Cádiz foi a extincáo
definitiva da Inquisicáo em 1820. A medida era, sem dúvida, mais do que
oportuna, pois punha termo a urna situacáo humilhante para a Sta. Igreja.

4. Tomás de Torquemada

Tomás de Torquemada nasceu em Valladolid (ou, segundo outros,


em Torquemada) no ano de 1420. Fez-se Religioso dominicano, exer-

411
28 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 460/2000

cendo por 22 anos o cargo de Prior do convento de Santa-Cruz em


Segóvia. Já aos 11 de fevereiro de 1482 foi designado por Sixto IV para
moderar o zelo dos Inquisidores espanhóis. No ano seguinte o mesmo
Pontífice o nomeou Primeiro Inquisidor de todos os territorios de Fernando
e Isabel.

Extremamente austero para consigo mesmo, o frade dominicano


usou de semelhante severidade nos seus procedimentos judiciários. D¡-
vidiua Espanha em quatro setores inquisitoriais, que tinham como sedes
respectivas as cidades de Sevilha, Córdova, Jaén e Villa (Ciudad) Real.
Em 1484 redigiu, para uso dos Inquisidores, urna "Instrucáo", opúsculo
que propunha normas para os processos inquisitoriais, inspirando-se em
trámites já usuais na Idade Media; esse libelo foi completado por dois
outros do mesmo autor, que vieram a lume respectivamente em 1490 e 1498.

O rigor de Torquemada foi levado ao conhecimento da Sé de Roma;


o Papa Alexandre VI, como dizem algumas fontes históricas, pensou en-
táo em destitui-lo de suas funcóes; só nao o terá feito por deferencia á
corte da Espanha. O fato é que o Pontífice houve por bem diminuir os
poderes de Torquemada, colocando a seu lado quatro assessores muni
dos de iguais faculdades (Breve de 23 de junho de 1494).

Quanto ao número de vítimas ocasionadas pelas sentencas de


Torquemada, as cifras referidas pelos cronistas sao táo pouco coerentes
entre si que nada se pode afirmar de preciso sobre o assunto.

Tomás de Torquemada ficou sendo, para muitos, a personificacáo


da intolerancia religiosa, homem de máos sanguinolentas... Os historia
dores modernos, porém, reconhecem exagero nessa maneira de
conceituá-lo; levando em conta o caráter pessoal de Torquemada, jul-
gam que este Religioso foi movido por sincero amor á verdadeira fé, cuja
integridade Ihe parecía comprometida pelos falsos cristáos; daí o zelo
extraordinario com que procedeu. A reta intengáo de Torquemada ter-se-
á traduzido de maneira pouco feliz.

De resto, o seguinte episodio contribuí para desvendar outro trago,


menos conhecido, do frade dominicano: em dada ocasiáo, foi levada ao
Conselho Regio da Inquisicáo a proposta de se impor aos muculmanos
ou a conversáo ao Cristianismo ou o exilio. Torquemada opós-se a essa
medida, pois quería conservar o clássico principio de que a conversáo ao
Cristianismo nao pode ser extorquida pela violencia; por conseguinte, a
Inquisicáo deveria restringir sua a?áo aos cristáos apóstatas; estes, e
somente estes, em virtude do seu Batismo, tinham um compromisso com
a Igreja Católica. Como se vé, Torquemada, no fervor mesmo do seu
zelo, nao perdeu o bom senso neste ponto. Exerceu suas funcoes até a
morte, aos 16/09/1498.

412
Procurando nos Bastidores:

PODER REGIO E INQUISIQÁO EM PORTUGAL

Em síntese: O Instituto Histórico e Geográfico do Brasil publicou


os Regimentos da Inquisigáo em Portugal (vigentes também no Brasil)
datados de 1552, 1613, 1640 e 1774 (este assinado pelo Marqués do
Pombal). Sao acompanhados de urna Introdugáo redigidapela Prof* Sónia
Aparecida de Siqueira, que póe em evidencia o fato de que a Inquisigáo
nunca foi urna instituigáo meramente eclesiástica, mas, em virtude da lei
do padroado, foi mais e mais dirigida pela Coroa de Portugal em vista de
seus interesses políticos. A Santa Sé teve de se opor mais de urna vez
aos processos da Inquisigáo, a fim de tutelar os crístáos-novos e outros
cidadáos julgados pelo Tribunal.

A Inquisicao está sempre em foco. É motivo de acusagóes á Igreja,


muitas vezes mal fundamentadas ou repetidas como chavóes, sem que
o público tenha acesso aos documentos básicos que nortearam a
Inquisigáo. Poucas pessoas tém contato direto com os arquivos e as fon-
tes escritas do movimento inquisitorial.

Eis que o Instituto Histórico e Geográfico do Brasil (IHGB) publicou


no número 392 (ano 157) da sua revista, correspondente a julho/setem-
bro 1996 (pp. 495-1020) os Regimentos do Santo Oficio da Inquisigáo do
Reino de Portugal datados de 1552, 1613, 1640, 1774 (este assinado
pelo Marqués de Pombal), além de um Regimentó sem data. Tal edigáo
esteve aos cuidados da Prof3 Sónia Aparecida de Siqueira, sócia-corres-
pondente do IHGB em Sao Paulo, que escreveu longa Introducáo a tais
documentos. Como nota o Prof. Arno Wehling, presidente do IHGB em
1996, a Dr8 Sónia Aparecida "localizou a Inquisigáo e seus sucessivos
regimentos nos diferentes momentos históricos, sublinhando, inclusive,
a progressiva expansáo do poder real sobre a instituigáo, culminando no
regime sectarista" (p. 495).

Como se sabe, a Inquisigáo nunca (nem na Idade Media) foi um


Tribunal meramente eclesiástico. Isto era inconcebívei outrora, dado que
o Estado era oficialmente cristáo e, por isto, se julgava responsável pelos
interesses da fé crista; a tal título intervinha ele em questóes de foro
religioso, por vezes ditando normas á Igreja. Tal realidade se acentuou
na pensínsula ibérica (Espanha e Portugal) a partir do século XVI, em

413
30 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 460/2000

virtude dos privilegios do padroado. Com efeito, já que os reis de Espanha


e Portugal eram descobridores de novas térras, as quais levavam a fé
católica, a Santa Sé Ihes concedeu poderes especiáis para organizarem
a vida da Igreja ñas regioes recém-descobertas; daf a grande ingerencia
nos assuntos religiosos, a título de colaboracáo com a Igreja,... colabo-
ragáo que redundou, aos poucos, em sufocacáo da autoridade eclesiás
tica em favor dos interesses da Coroa.

Ñas páginas subseqüentes, apresentaremos as origens da


Inquisicáo em Portugal e alguns tragos da explanagáo da Prof3 Sónia
Aparecida, que póem em relevo a intervencáo sempre mais prepotente
dos monarcas em assuntos inquisitoriais.

1. Origens da Inquisicáo Portuguesa

O rei D. Joáo III de Portugal (1521-57) desejava que o Papa esta-


belecesse a Inquisicáo em seu reino, tendo em vista especialmente a
eliminagáo dos judeus nao plenamente convertidos ao Cristianismo. -
Durante 27 anos, S. Majestade e a Santa Sé se defrontaram, visto que o
rei pedia poderes, em materia religiosa, que o Papa nao Ihe quería con
ceder: assim, conforme o monarca, o Inquisidor-mor seria escolhido pelo
rei, assim como os outros Inquisidores (subordinados), podendo estes
últimos ser nao apenas clérigos, mas também juristas leigos, que passa-
riam a ter a mesma jurisdicáo que os eclesiásticos. Mais: conforme o
desejo do rei, os Inquisidores estariam ácima dos Bispos e dos Superio
res das Ordens Religiosas, de modo que poderiam processar e condenar
eclesiásticos sem consultar os respectivos prelados; os Bispos ficariam
impedidos de intervir em qualquer causa que os Inquisidores chamas-
sem a si. Ainda: os Inquisidores poderiam impor excomunhóes reserva
das á Santa Sé e levantar as que eram impostas pelos Bispos. Como se
vé, o rei quería desta maneira obter o controle total sobre os Bispos e a
Igreja em Portugal.

Finalmente aos 17/12/1531 o Papa Clemente Vil concedeu a


Inquisicáo em Portugal, mas em termos que contrariavam as solicitacoes
de D. Joáo III: em vez de outorgar ao rei poderes para nomear os
Inquisidores, o Papa nomeou diretamente um Comissário da Sé Apostó
lica e Inquisidor no reino de Portugal e nos seus dominios. Esse Co
missário poderia nomear outros Inquisidores, mas a sua autoridade nao
estava ácima da dos Bispos, que poderiam também, por seu lado, inves
tigar as heresias.

Os termos desta Bula ou concessáo nunca foram aplicados em


Portugal. O Inquisidor nomeado, Frei Diogo da Silva, era o confessor do
rei; nao aceitou o cargo, talvez por pressáo do monarca. Apesar disto,

414
PODER REGIO E INQUISICÁO EM PORTUGAL

em meio a grande agitagáo popular, comecaram a funcionar tribunais


inquisitoriais em algumas dioceses anárquicamente. Em conseqüéncia,
o Papa suspendeu a Inquisicáo e, alegando que o reí o engañara (escon-
dendo-lhe a conversáo toreada de judeus no reinado de D. Manoel, 1495-
1521), ordenou a anistia aos judeus e a restituigáo dos bens confiscados
(Bula de 07/04/1535).

As razóes sobre as quais se baseavam tais decisóes de Clemente


Vil, sao assaz significativas: a conversáo dos judeus infiéis deve ser pro
piciada mediante a persuasáo e a docura, das quais Cristo deu o exem-
plo, respeitando sempre o livre arbitrio humano; a conversáo violenta ou
extorquida dos judeus sob o reinado de D. Manoel era tida como facanha
que nao se deveria reproduzir. A Santa Sé assim procurava defender e
proteger os cristáos-novos, vítimas do poder regio.

O Papa Clemente Vil, que resistirá a D. Joáo III, morreu em 1534,


tendo por sucessor Paulo III. O rei voltou a insistir junto ao Pontífice para
conseguir o tipo de tribunal de Inquisicáo que atendía aos interesses da
Coroa. Nao o obteve propriamente, mas por Bula de 23/05/1536 Paulo III
restabeleceu a Inquisicáo em Portugal, nomeando tres Inquisidores e
autorizando o rei a nomear outro; além disto, o Pontífice mandava que,
durante tres anos, os nomes das testemunhas de acusagáo nao fossem
acobertados por segredo e durante dez anos os bens dos condenados
nao fossem confiscados; os Bispos teriam as mesmas faculdades que os
Inquisidores na pesquisa das heresias. Por intermedio de seu Nuncio em
Lisboa, o Papa reservava a si o direito de fiscalizar o cumprimento da
Bula, de examinar os processos quando bem o entendesse e de decidir
em última instancia.

É a partir desta Bula (23/05/1536) que se pode considerar


estabelecida a Inquisicáo em Portugal.

O rei, que nao se dava por satisfeito com as disposigóes da Santa


Sé, comecou a burlá-las. Quis, antes do mais, subtrair a Inquisicáo á
vigilancia do Pontífice e, para tanto, suscitou incidentes numerosos a
ponto de obrigar a partir o Nuncio Capodiferro, que tinha poderes para
suspender o tribunal, caso nao fossem respeitadas as cláusulas de pro-
tecáo aos cristáos-novos. Além disto, nomeou Inquisidor o Infante D.
Henrique, seu irmáo, entáo arcebispo de Braga, que, com seus 27 anos,
nao tinha idade legal para exercer tais funcoes. Enfim aproveitava ou
provocava ocasides ou pretextos para fazer que o público cresse na má
fé dos judeus convertidos (cristáos-novos): assim apareceu um cartaz
ñas portas da catedral e de outras igrejas de Lisboa, anunciando a che-
gada próxima do Messias ...; um alfaiate de Setúbal apresentou-se ao
público como Messias - o que nao foi levado a serio pela populacáo, mas

415
32 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 460/2000

bastou para que os agentes do reí fizessem grandes represalias e tentas-


sem convencer Roma dos perigos do judaismo em Portugal.

Apesar da má vontade do reí, o Papa fazia questáo de manter sob


seu controle o Santo Oficio em Portugal. Reforjando normas anteriores,
o Pontífice emitiu nova Bula em 12/10/1539, que proibia aduzir testemu-
nhas secretas e concedía outras garantías aos acusados, entre as quais
o direito de apelacáo para o Papa; determinava outrossim que os
emolumentos dos Inquisidores nao fossem pagos mediante os.bens dos
prisioneiros.

Também esta Bula nao foi observada em Portugal. O Papa entáo


resolveu suspender a Inquísicáo pelo Breve de 22/09/1544; tomou a pre-
caugio de fazer publicar de surpresa em Lisboa este documento, levado
secretamente para lá por um novo Nuncio. O reí, profundamente golpea
do, jogou a sua última cartada; requereu ao Papa que revogasse a sus-
pensáo e restaurasse a Inquisicáo sem qualquer límitacáo, e acrescenta-
va a ameaca:

"Se Vossa Santidade nao prover nisso, como é obrigado e dele se


espera, nao poderei deixarde remediá-lo confiando em que nao somente
do que suceder Vossa Santidade me haveráporsem culpa, mas também
os príncipes e os fiéis cristáos que o souberem, conhecerao que disso
nao sou causa nem ocasiáo".

Tais palavras continham a ameaca de desobediencia formal ao Papa


e de cisáo na Igreja. D. Joáo III seguiu o conselho que Ihe fora dado
pelos seus dois enviados á Santa Sé em 1535: negasse obediencia ao
Papa, imitando o exemplo do reí Henrique VIII da Inglaterra. Entre a obe
diencia ao Papa, como fiel católico, e a rebeldía declarada que Ihe permi-
tisse instituir um tribunal, que era no fundo um instrumento da política
regia, o rei de Portugal estava disposto a seguir a segunda vía.

O Pontífice via-se naquele momento (1544/45) premido por outras


graves preocupacóes, como a convocacio e a preparacáo do Concilio
de Trento, sobre o qual o Imperador Carlos V e outros monarcas tinham
seus interesses. Em conseqüéncia, acabou por aceitar os pontos princi
páis da solicitacáo de D. Joáo III: por Bula de 16/07/1547, nomeou
Inquisidor-Geral o Cardeal Infante D. Henrique e retirou aos Nuncios em
Lisboa a autoridade para intervirem nos assuntos de algada da Inquisigáo;
esta seguiría seus trámites próprios, diversos dos habituáis nos proces-
sos comuns. Ao mesmo tempo, porém, o Papa mitigava suas disposi-
cóes: promulgou um Breve que suspendía o confisco de bens por dez
anos; outro Breve suspendía por um ano a entrega de condenados ao
braco secular (ou a aplicacáo da pena de morte). Em outro Breve aínda o

416
PODER REGIO E INQUISIgÁO EM PORTUGAL 33

Papa fazia recomendacóes tendentes a moderar os previsíveis excessos


da Inquisicáo e a permitir a partida dos cristáos-novos para o estrangeiro.
Pouco antes de morrer ou aos 08/01/1549, Paulo III editou novo Breve,
que abolia o segredo das testemunhas - Breve este que provavelmente
nunca foi aplicado em Portugal.

2. Inquisidor sempre mais regalista

Eis algumas passagens muito significativas da Introducáo redigida


pela Profa Sónia Aparecida:

2.1. Cristáos novos1

"Urgía acalmar a inquietacáo causada pela presenca dos cristáos-


novos, inimigos em potencial pelo seu supranacionalísmo. O combate ás
minorías dissidentes era um programa inadiável. Os neocristáos podiam
ser portadores do fermento herético por suas crencas residuais e por
seus íntimos contatos com luteranos e judeus. E mais. Com a frutificacáo
das descobertas, da exploracáo do mundo colonial que se montava, com
o comercio ultramarino, com a urbanizacáo progressiva, os cristáos-no
vos ganhavam forca económica e tendiam a uma solidariedade que Ihes
acrescia o poder de acáo no meio social. O trono sentiu a ameaga que
representariam se nao fossem bons cristáos. Reagiu. A Inquisicáo foi
criada e estendeu-se sobre cristáos-novos, cristáos-velhos, povo, hierar-
quias" (pp. 502s).

"Certas determinacóes de Roma avocando a si, diretamente, ou


por meio de seus Nuncios, jurisdicáo sobre os cristáos-novos revelam
que existia ainda uma certa indefinicáo da hierarquia judicial, bem como
o propósito pontificio de reservar para a Curia a jurísdicáo superior. Em
1533, a Bula de Clemente Vil Sempiterno Regí revogou todos os pode
res que haviam sido outorgados a Freí Diogo da Silva, Inquisidor-mor de
Portugal, chamando a si todas as causas dos cristáos-novos, mouros e
heréticos. Em 1534, um Breve de Paulo III dirigido a D. Joáo III mandava
que os Inquisidores suspendessem os processos contra pessoas suspei-
tas de heresia. Em 1535, uma Carta Pontificia determinava que os Nuncios
de Portugal pudessem conhecer as apelacóes dos cristáos-novos.

No mesmo ano, escrevia Paulo III ao rei sobre os cristáos-novos, e


aos cristáos-novos; interferindo diretamente na definicáo do processo,
concedía que pudessem tomar por procuradores e defensores quaisquer
pessoas que quisessem.

1 Os cristáos-novos eram judeus recém-batizados, nem sempre convictos e since


ros.

417
34 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 460/2000

As Bulas de perdáo geral que paralisavam a agáo do Tribunal vi-


nham de Roma, diluindo, de tempos em tempos, a autoridade dos
Inquisidores. Confirmando o primeiro perdáo concedido por Clemente
Vil, concedía Paulo III um segundo em 1535 e, em 1547, pela Bula Illlus
qui misericors, concedía um terceiro. Ao depois, outros indultos gerais
foram sendo concedidos, e, quando o próprio rei os negociava com os
cristáos-novos, tinha de pleiteá-los junto á Curia Romana, como aconte-
ceu com Felipe III em 1605.

Alias, as ¡ntromissoes da Curia ñas atividades da Inquisicáo conti-


nuaram, decrescentes sem dúvida, mas constantes pelo tempo afora,
dada a natureza de sua justiga. De 1678 a 1681, o Santo Oficio chegou a
ser suspenso em Portugal por decisáo do Pontífice, o que indica que,
apesar da amplificagáo do absolutismo, os tribunais continuavam a care
cer da aquiescencia de Roma para atuar" (pp. 506s).

2.2. A figura do Inquisidor

"Capaz, idóneo, de boa consciéncia, devia ser o Inquisidor: requisi


tos que garantiriam a aplicacáo da justiga com equanimidade. Pedia-se
também constancia..." (p. 526).

"O juízo coletivo sobre a Inquisicáo dependería do comportamento


de seus oficiáis, de sua capacidade de corrigir as próprias imperfeicóes,
de ¡molar impulsos e interesses em prol do bom nome do Tribunal. A
verdade é que, na prática, ou por causa da vigilancia social, ou do contro
le institucional, ou, talvez, da fusáo dos ideáis individuáis com os do San
to Oficio, nao temos noticia de escándalos ou abusos dos agentes
inquisitoriais. Geralmente, as excecóes apenas confirmariam a regra. Al-
guns Inquisidores, por suas virtudes ou pelo sacrificio, chegaram a ser
elevados aos altares".

Em nota (74) diz a autora:

"Nao pertenceram ao Santo Oficio portugués, mas foram santifi


cados os Inquisidores S. Raimundo Penafort, S. Toríbio Mongrovejo,
S. Pedro de Verona, mártir, S. Pió V, S. Domingos de Gusmáo, S.
Pedro de Arbués, S. Joáo Capistrano. Beatificados foram Pedro
Castronovo, legado cisterciense, Raimundo, arcediago de Toledo,
Bernardo, seu capeláo. Inquisidores também, dois clérigos, Fortanerio
e Ademaro, nuncios do Santo Oficio de Tolosa, martirizados pelos
albigenses, Conrado de Marburg, mártir, pároco e Inquisidor da Ale-
manha, e o confessor de Sta.Isabel da Hungría, Joáo de Salermo. O
Inquisidor da Frísia e Holanda no século XVI, Guilherme Lindano, foi
considerado Venerável" (p. 527).

418
PODER REGIO E INQUISigÁO EM PORTUGAL 35

2.3. A Inquisicáo Pombalina

«A idéia de separacáo de um Estado só político e de urna Igreja só


religiosa germina nessa época1. Pretende-se uma nova política religiosa
que usa a tolerancia como seu instrumento. Impunha-se conexáo com o
Absolutismo, aínda entáo vivo como idéia política. Limitar o poder
jurisdicional da Igreja e difundir o espirito laico.

Em meio a esse clima das reformas pretendidas, a questáo religio


sa punha em relevo o Santo Oficio, tradicional defensor da ortodoxia das
crencas, fiel zelador da unidade das consciéncias. Nao se pensa em ex-
tingui-lo, mas, sim, em reformá-lo, adequando-o aos novos tempos. Ur
gía a elaboracáo de um novo Regimentó que tornasse a Inquisicáo mais
inofensiva e pusesse o Tribunal realmente ñas máos da Coroa.

Esse novo Regimentó foi mandado executar pelo Cardeal da Cu


ntía. No seu Preámbulo, justifica-se a sua necessidade na medida em
que as leis que geriam o Santo Oficio teriam sido, ao longo dos séculos,
distorcidas pelos jesuítas, interessados em dar ao Papa o supremo po
der sobre a Inquisicáo. Desde o governo do Cardeal Infante D. Henrique
- dominado, diz o Cardeal da Cunha, pelo seu confessor, o jesuíta Leáo
Henriques -, até o Reinado de D. Joáo V, foi o Tribunal escapando ao
poder do rei. Teria chegado ao máximo a influencia da Companhia, sob o
Inquisidor D. Pedro de Castilho, que tornou a legislacáo mais jesuítica do
que regia» (p. 562).

«Os tempos eram diversos. O Estado se configurava de outra ma-


neira, definindo diferentes funcóes. Cioso de seu poder, recusava-se a
partilhá-lo com quaisquer ¡nstituicóes ou estamentos. Impunha-se a ne
cessidade de limitar o poder jurisdicional da Igreja. Assim o Regimentó
de 1774 visou o fortalecimento do poder da Coroa, invocando o direito do
Reino. Instalava-se o regalismo absolutista como ideal de uniáo crista na
ordem civil» (p. 563).

É importante conhecer os dados históricos dos quais as páginas


deste artigo referem apenas alguns poucos traeos. Contribuem para re-
por a verdade em foco, mostrando as causas latentes da Inquisicáo em
Portugal (como também na Espanha). Os estudiosos nao podem deixar
de exprimir sua gratidáo ao Instituto Histórico e Geográfico do Brasil pela
publicacáo do trabalho da ProP Sónia Aparecida de Siqueira e dos Regi-
mentos da Inquisicáo Portuguesa (que vigoraram também no Brasil colo
nial).

1 Sáculo XVIII.

419
Continuando a historia:

A INQUISIQÁO NO BRASIL

Em síntese: No Brasil nunca houve tribunal do Santo Oficio ou da


Inquisigáo. O país achava-se sob a competencia do tribunal de Lisboa.
Durante o século XVI, a Inquisigáo agiu discretamente. Sao conhecidos
tres processos e urna visita do Santo Oficio, sem graves conseqüéncias.
Misturavam-se, as vezes, fatos reais de índole religiosa ou político-social
com faltas graves aparentes ou supostas ou tendencias perniciosas no
campo religioso e social. A Inquisigáo no Brasil foi extinta em 1774 quan-
do o Santo Oficio foi oficialmente transformado em tribunal regio, sem
autonomía ou completamente dependente da Coroa.
* * *

A Inquisigáo de Portugal contava tres distritos: Évora, Coimbra e


Lisboa, tendo este a jurisdigáo sobre o Brasil.

Seja brevemente examinado o seu funcionamento no Brasil.

1. Século XVI

Como a Inquisigáo no Brasil estivesse sob a jurisdigáo do Tribunal


de Lisboa, nao houve na colonia, em nenhuma época, um tribunal pró-
prio. Assim sendo, os processos eram levados para a Corte. No Brasil,
os Inquisidores eram os Bispos. Mas, visto o grande número de novos
convertidos, foi nomeado Inquisidor Apostólico D. Antonio Barreiros. Seus
poderes limitavam-se aos cristáos-novos; era-lhe recomendado usar de
prudencia, moderagáo e respeito. A agáo do Santo Oficio foi discreta,
sendo conhecidos tres processos e urna visita do Inquisidor de Portugal.

1.1. Os Processos

a) Processo de Pero de Campo Tourinho, donatario da capitanía


de Porto Seguro, acusado de opor-se ao clero e ao Papa, e de desres-
peitar as leis da Igreja. O processo iniciou-se no Brasil (1546) e terminou
em Lisboa (1547). Nao se sabe a conclusáo. Supóe-se que o acusado
tenha sido absolvido.

b) Processo de Joáo de Boles (Jean Cointha, seigneur des


Boulez), francés que viera com Villegaignon. Em 1557 comegou a difun
dir doutrinas calvinistas e luteranas em Sao Paulo e depois na Bahía. O
processo, iniciado no Brasil (1560), foi levado a Portugal, tendo Joáo de

420
A INQUISIgÁO NO BRASIL 37

Boles lá chegado em 1563. Retratou-se, mas pouco depois comecou


novamente a difundir suas idéias, sendo entáo desterrado para as indi
as, onde foi condenado á morte, em 1572, como relapso e herege.

c) Processo do Pe. Antonio de Gouveia. Oriundo dos Acores, foi


ordenado sacerdote em Portugal. Em 1555 entrou na Companhia de Je
sús, sendo déla despedido tempos depois. Deu-se a necromancia e, por
isto, foi acusado no Tribunal da Inquisicáo. Preso, fugiu em 1564.
Recapturado, foi degredado para os Acores. Tendo novamente fúgido,
foi descoberto de 1567 e desterrado para Pernambuco. Aqui conseguiu
uso de ordens, mas, continuando as atividades "mágicas", foi preso e
enviado ao Santo Oficio de Lisboa, embarcando em 1571. Em 1575 seu
processo continuava, mas a partir desta data nada mais se sabe dele.

1.2. A primeira visitacáo do Santo Oficio

De 1591 a 1595 deu-se a primeira visitacáo do Santo Oficio ao


Brasil. A causa próxima foi a passagem da Colonia ao dominio espanhol
em 1580. Como o rei da Espanha possuísse idéias mais rígidas quanto
aos cristáos-novos, julgou necessária urna visita do Santo Oficio.

O Visitador nomeado, Heitor Furtado de Mendonca, chegou á Bahía


em julho de 1591. Poucos dias depois publicou o "Edito da Graca", perí
odo de trinta dias (de 28/7 a 27/8) em que haveria "muita moderacáo e
misericordia" aos que fossem acusados ou se viessem acusar. Houve
muitas denuncias, versando sobre suspeitas de heresia, de judaismo,
escravizacáo dos indígenas, bigamia etc. Em 1594 o Visitador passou a
Pernambuco onde, após um período de "Graca", iniciou as audiencias,
seguindo até o ano de 1595, quando retornou a Lisboa.

A par de algum erro ou imprevidéncia, nao parece ter sido severo,


usando, em muitos casos, de moderacáo.

2. Século XVII

Data deste século a segunda visita do Santo Oficio. Esta ocorreu


entre setembro de 1618 e Janeiro de 1619, sendo Inquisidor D. Marcos
Teixeira. Os motivos devem prender-se á preocupacáo da Coroa Espa-
nhola com os cristáos-novos, temendo que pudessem aliar-se aos holan
deses, que naquele tempo pressionavam o Reino Unido. A colonia, de
fato, tornara-se lugar de refugio e de degredo para os novos convertidos,
que aqui se achavam em grande número.

O Pe. Antonio Vieira, nessa época, defendeu a tolerancia para com


os cristáos-novos, idéia que se generalizou e continuou viva mesmo após
a restauracáo, em 1640.

421
38 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 460/2000

3. Século XVIII

Surgindo as minas de ouro, para as quais ia grande número de


estrangeiros de todos os Credos, a política de tolerancia vigente no sécu
lo anterior comecou a mudar. Intensificou-se a acáo da Inquisicao no
Brasil.

No reinado de D. José I (1750-77), a Inquisicáo decaiu, chegando


praticamente a anular-se. Dois fatores contribuiram para a sua queda,
ambos ligados a personalidade do Marqués de Pombal. Primeiramente,
o Primeiro-ministro considerou-a contraria aos interesses da Corte, em-
bora anos antes (1761) a tivesse utilizado contra o Pe. Gabriel Malagrida,
por ter este, na ocasiáo do terremoto de Lisboa (1755), acusado de erros
moráis os membros da Corte. Além disto, em virtude de um desentendi-
mento entre Pombal e o Santo Oficio em Portugal, chegou o rei D. José I
a procurar minorar a agáo do Tribunal.

Assim é que em 1773 foram baixadas leis que acabaram com a


distincáo entre cristáos-novos e outros cristáos, e que proibiam qualquer
discriminacáo por ascendencia judaica.

Em 1774 o Santo Oficio foi transformado num tribunal regio, sem


autonomía, completamente dependente da Coroa, o que significou na
prática a sua desativacáo.

"Nao obstante as falhas que se podem apontar contra todo e qual


quer sistema repressivo, nao é lícito nem honesto ver na atuagáo da
Inquisigáo ou Santo Oficio somente a face negativa. Houve também vanta-
gensparaafé eosbonscostumes, evitándose tolerancia em demasía
com desvantagens para a pureza da fé ou com tropelos dos mandamen-
tos divinos, visto que a Inquisigao nao empregava somente a repressáo,
mas também a persuasáo para corrigir desvíos na fé ou nos costumes.
Ademáis, para muita gente que se deixa levar maispelo temor que pelo
amor, pormuitas causas que nao é o caso de abordar, toda agáo coerci
tiva, quando psicológicamente bem orientada, pode ter seus reflexos po
sitivos. Alias, o Santo Oficio era, antes do mais, um tribunal eclesiástico
que tinha em mente mover o culpado a reconhecer seu pecado, detésta
lo e prometer emenda. Só em casos de pertinacia agia com penas que
variavam segundo a gravidade do delito e a renuncia ao perdáo. No Bra
sil, felizmente, durante o século XVI, nao temos a lamentar a pena capital
entre os nascidos na térra, mesmo quando encaminhados ao tribunal de
Lisboa" (fíUBERT, Arlindo. A Igreja no Brasil. Orígem e desenvolvl-
mento (Século XVI), vol. 1. Santa María, Pallottí, 1981, p. 284).

422
Esvaziando a fé...

"DESCOMPLICANDO A FE"
por Helio Amorim

Em síntese: O casal responsável pelo livro ocupou cargos de rele


vo nos Movimentos de Casáis e de Leigos da Igreja Católica. Apresenta
uma revisáo dos artigos da fé, no intuito de "descomplicar" - o que redun
da em esvaziamento das verdades da fé em pro! de uma mensagem
humanizadora; o Reino de Deus seria a plena humanizagáo, a tal ponto
que o livro nega o valor salvffico da morte de Cristo; importariam apenas
a Encarnagáo (humanizagáo períeita) e a Ressurreigáo de Jesús. Além
do mais, os autores criticam varios pontos da doutrina da Igreja relativos
á sexualidade, aos sacramentos, á Escatologia... A obra vem a ser um
falso catecismo redigido em linguagem crítica e detnolidora.

A obra "Descomplicando a fé" tem por autor o Sr. Helio Amorim em


colaboracáo com a sra. Selma Amorim1. É prefaciada por Frei Clodovis
Boff, teólogo que tem erudicáo suficiente para reconhecer os graves er-
ros em que incorre o autor, mas que se detém em repetidos elogios ao livro.

A quarta capa do livro indica o propósito da obra:

"Este livro pretende ajudar a compreender a esséncia da fé dos


cristáos, que ao longo dos sécuios se foi complicando por uma profusáo
de eruditas interpretagóes de textos bíblicos extremamente simples. Nes-
ses dois milenios, sucederam-se ¡números Concilios Ecuménicos que
produziram farta doutrina, proclamando dogmas e condenagóes, influen
ciados naturalmente pelas culturas de cada época. Toda essa produgáo
foi sendo incorporada á Tradigáo da Igreja como verdades imutáveis, já
que admitir equívocos parecería reconhecer a falibilidade do Magisterio.
O resultado é a dificuldade atual que sentem os cristáos, especialmente
os país, para transmitir aos outros e aosprópríos filhos a esséncia da sua
fé, despida de tantos mitos e adornos meramente culturáis que a obscu-
recem e complicam desnecessaríamente".

Estes dizeres sao ousados. O autor atribuí a si mesmo uma autori


dad e maior que a de vinte e um Concilios Ecuménicos e reconhecidos
mestres da Tradicáo. Com uma penada superficial pretende derrubar o
passado e ser o redator de um Credo cujo fio condutor é a palavra

1 Paulus Editora (Sao Paulo) e Edigóes IBRAF(Belo Horizonte), 140x210mm, 126pp.

423
40 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 460/2000

"humanizacáo", a qual ocorre em quase cada página do livro, e, as ve-


zes, repetidamente na mesma página.

Examinaremos, a seguir, o conteúdo do livro.

1. Humaniza9áo

"Humanizacáo" é o fio condutor da catequese proposta por Helio


Amorim:

"A humanizagáo é prometida em sua plenitude depois da morte e


ressurreigáo, mas já se antecipará na historia humana como manifesta-
gáo do Reino de Deus, sempre que homens e mulheres passem de con-
digóes menos humanas a condigóes mais humanas de vida. A
humanizagáo das estruturas da sociedade será sempre sinal do Reino
presente entre os homens" (p. 30).

Nao há dúvida, o Evangelho prega a justica social, mas promete


aos fiéis discípulos de Cristo mais do que urna reta ordem social.

Jesús, que veio anunciar a humanizacáo aos homens do seu tem-


po, foi vítima da sanha dos mesmos. Ele ignorava o desfecho de sua vida
na Cruz. Comenta Amorim:

"Esse desfecho cruel nao era condigáopara a nossa saivagáo. Fomos


salvos nao pela morte, mas pela encarnagáo e ressurreigáo de Jesús. Nao
fomos libertados pelo sacrificio da cruz, mas pela Vitoria de Jesús sobre a
morte, estendida a todos os homens e mulheres de todos os tempos...

A cruz foi um acídente esperado como probabilidade, mas nao in-


dispensável para a saivagáo" (pp. 31s).

Nao se compreende que o autor de um compendio da fé diga tal


coisa. Basta lembrar em contrario as palavras de Sao Paulo:

"Quanto a mim, nao acontega gloriar-me senáo na Cruz de nosso


Senhor Jesús Cristo, por quem o mundo está crucificado para mim e eu
para o mundo" (Gl 6, 14).

A Paixao de Cristo é a recapitulado da obra do primeiro Adáo:


assim como o primeiro homem foi até a morte por des-amor ou desobe
diencia, o segundo Adáo foi voluntariamente até a morte (e morte de
Cruz, a fim de transfigurar o sofrimento de todos os homens) por amor ou
por obediencia ao Pai. Jesús Cristo assim iniciou nova fase da historia
humana, trocando por um sinal positivo o sinal negativo da dor e da mor
te dos homens. Este artigo é de importancia capital para a fé católica.

2. Pecado original

No tocante ao pecado original, o autor nao leva em consideracáo


os dados bfblicos, que ele tem na conta de nao históricos (pp. 14s); em

424
"DESCOMPLICANDO A FÉ" 41

conseqüéncia esvazia a narracáo da queda dos primeiros pais elevados


previamente ao estado de justica original:

"Ao longo da historia dos homens, muitos aderiram ao projeto de


Deus e outros muitos o rejeitaram. Estes quiseram ser como Deus e pro-
por o seu próprio projeto para o Mundo. Pretenderam conhecer o Bem e
o Mal, prescindindo da sabedoria e do projeto amoroso do Senhor. Este
uso equivocado da liberdade ede escolha é a origem de todos os males
que atingem a humanidade. É chamado de pecado-original, ou seja,
aquele que está na origem de todos os mecanismos desumanizadores
que se váo estabelecendo ñas relacoes entre os homens" (p. 11). Verp. 16.

Na verdade, nao é sabio jogar fora com urna penada quanto se


disse e definiu sobre o pecado original no decorrer de dezesseis séculos
ou desde a controversia pelagiana.

Conseqüentemente o autor tem seu conceito próprio de Batismo,


como se verá a seguir.

3. Sacramentos

O autor, ao tratar do Batismo, esquece as proposites de Sao


Paulo em Rm 6 (participado na morte e ressurreicáo de Cristo) e formu
la a seguinte concepcáo:

"Dir-se-á que o Batismo preservará a crianga do pecado original,


nao como urna mancha na alma herdada de personagens míticos, mas
do risco sempre latente de desobediencia ao projeto de Deus. A graga
que dá eficacia ao Batismo, sacramento comunitario, é oferecida por Deus
á comunidade dos cristáos, especialmente aos pais e padrinhos, para
que consigam ser fiéis ao compromisso por todos eles assumido" (p. 107).

O autor nao leva em conta o conceito de renascer da agua e do


Espirito expresso pelo Senhor Jesús em Jo 3, 5 nem o revestir-se de
Cristo formulado por Sao Paulo em Gl 3, 27.

No tocante ao sacramento da Reconcilíacáo, está dito sem o mí


nimo fundamento:

"Já se aceita que um encontró de reconciliagáo com Deus e o seu


projeto também se pode dar no íntimo da consciéncia e do coracao de
cada crístáo, num ato de reconhecimento das próprias limitagóes e de
ilimitada confianga no amor gratuito de Deus. O pedido de reconciliagáo
com Deus através do sacerdote se mantém como oportunidade de
aconselhamento, de esclarecimento de dúvidas e ajuda á tomada de de-
cisóes mais corajosas" (p. 108).

O sacramento da Penitencia continua sendo a via normal para a


reconciliagáo com Deus após pecado grave, na base dos dizeres de Je
sús em Jo 20, 21-23.

425
42 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 460/2000

Quanto á Eucaristía, sao ambiguas as palavras do autor:

"Na celebragáo deste sacramento central da vida do Povo de Deus,


Cristo se faz presente nao no pao e no vinho, mas no pao e vinho parti-
lhados"(p. 108).

Deve-se dizer que, independentemente da partilha, Cristo está pre


sente sob as aparéncias do pao e do vinho consagrados. Verdade é que a
Eucaristía produz comunháo com Cristo e exige comunháo com os irmaos.

4. Escatologia

Eis o que se lé á p. 85:

"A separagáo entre o corpo e a alma, como duas realidades distin


tas e superpostas, heranga do neoplatonismo, ¡á nao é a base da doutri-
na católica".

A bem da verdade, deve-se dizer que corpo e alma sao duas subs
tancias distintas urna da outra, mas destinadas pelo Criador para formar
um composto psicossomático em que a alma faz as vezes de principio de
vida da materia. A morte é a separacáo de corpo e alma, por estar o
corpo desgastado pela molestia ou pela idade. A alma separada do cor
po é, por sua própria natureza, ¡mortal; após a morte do composto, colhe
os frutos do que semeou na térra, aguardando a ressurreicáo da carne,
que se dará no fim dos tempos. O Evangelho patrocina a distingáo de
corpo e alma quando diz:

"Nao temáis os que matam o corpo, mas nao podem matar a alma.
Temei antes Aquele que pode destruirá alma e o corpo na geena (Mt 10,28).

A nocáo de alma separada do corpo e de ressurreicáo no final dos


tempos é professada pbr Jesús em Jo 6, 54:

"Quem come a minha carne e bebe o meu sangue, tem a vida eter
na, eeuo ressuscitarei no último dia". Ver Jo 6, 45; 1Cor 15, 23; 1Ts 4,
16s;2Cor5, 1-5.

Com referencia ao purgatorio, está dito que seria "urna especie


de inferno temporario para purgacáo dos pecados, de que hoje raramen
te se fala" (p. 85).

Seria para desejar que o Dr. Helio Amorim, engenheiro civil, co-
nhecesse um pouco melhor as verdades da fé e a Teología para poder
dissertar a respeito délas com mais fundamentacáo. No decorrer do seu
livro, o autor nao raro cria caricaturas e as escarnece como se fossem a
doutrina da Igreja. O purgatorio postumo é um estado de alma, em que a
alma repudia radicalmente o pecado cujas raízes ela nao conseguiu ar
rancar por completo durante a sua vida terrestre; nao se fala aí de fogo

426
"DESCOMPLICANDO A FÉ" 43

nem de demonios que atormentem. É lamentável verificar que H. Amorim


crítica e zombeteia artigos de fé que ele nao entende devidamente, fa-
zendo-se de teólogo abalizado.

5. Sexualidade

O autor enfatiza a vida conjugal a tal ponto de julgar ser o celibato


uma "vocacáo rara" e castradora (p. 24). O próprio Jesús é envolvido
nessa onda: "Nao se pode afirmar que Jesús se manteria solteiro por
toda a vida, se a morte nao o surpreendesse táo cedo" (p. 32).

Conseqüentemente o autor critica a doutrina da continencia perió


dica para evitar gravidez indesejada (p. 24).

Outras observacóes poderiam ainda ser feitas, pondo em relevo a


inconsistencia dos arrazoados do autor. Estas sejam suficientes para
evidenciar que sua obra nao é cartilha de fé.

6. Reflexáo final

O cristáo que tem fé, eré na Palavra de Deus Pai que nos foi reve
lada por Cristo e confiada á Igreja para que a transmita fielmente sob a
assisténcia do Espirito Santo. A Igreja é inseparável de Cristo, pois nao é
uma simples assembléia de homens e mulheres, mas é o Corpo de Cris
to vivificado pelo Espirito Santo. Foi a Igreja, entregue por Cristo ao
pastoreio de Pedro (cf. Jo 21,15-17), quem recebeu, por primeiro, a Pa
lavra do Evangelho; a Igreja bercou, aprofundou e escreveu essa Pala
vra pela máo dos Evangelistas, de tal modo que a Palavra escrita só
pode ser aceita e entendida por efeito da autoridade da Igreja Católica,
como sabiamente afirma S. Agostinho:

"Quanto a mim, na verdade, eu nao creria no Evangelho se nao me


induzisse a isto a autoridade da Igreja Católica" (Contra a Carta Maniquéia
5,6).

A Palavra oral, que é anterior á escrita e a credencia, continua a


ressoar na Igreja e é auténticamente proferida pelo magisterio da Igreja,
ao qual Cristo prometeu sua assisténcia infalível (cf. Le 22, 31 s; Jo 14,
26: 16, 13-15). A Palavra revelada vai sendo desdobrada e aplicada a
cada época, a fim de estruturar a vida dos homens, por esse magisterio
acompanhado pelo Senhor Jesús. Por ¡sto nao se pode admitir que um
fiel católico (ainda que fosse um teólogo profissional) atribua a si o direito
de se sobrepor a "¡números (=21) Concilios Ecuménicos" ou Concilios
gerais, alegando que "complicaram a fé, revestindo-a de mitos e adornos
meramente culturáis". A descomplica$áo assim proposta redunda em
pretensa humanizacáo da fé ou satisfacáo dos anseios naturais do ho-
mem, removida a imagem da Cruz de Cristo.

427
44 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 460/2000

O autor dessa descomplicagáo teve certamente as melhores inten-


cóes, mas nao conseguiu prestar as novas geracóes o servido almejado.
O Espirito Santo, ponderando o seu zelo de pai de familia e dirigente
cristáo, o levará a rever suas posicóes em vista de um trabalho catequético
genuinamente proficuo!

Cura da Dor mais profunda, porMatthewLinn, Sheila Linn e Dennis


Linn. Tradugáo do inglés por Jacira Simaika. - Editora Verus, Campiñas
2000, 140x210mm, 190 pp.

Os tres autores sao psicólogos católicos, que trabalham em Universi


dades e Hospitais. Tém por objetivo aliviar a dor mais profunda que, segun
do dizem, é a que decorre daperda de um ente querido. Para tanto, ensinam
a orar pelos mortos, mas nem sempre de acordó com a doutrina da Igreja.

Em seu capítulo VI os autores ensinam que certas deficiencias do


comportamento de urna pessoa viva na Térra sao hereditarias; os ante-
passados sofriam de tais deficiencias e as transmitiram. Em conseqüén-
cia, compete, dizem, a geragáo presente "desligar":

"A razáo pela qual as 'agoes condenáveis' de nossos antepassa-


dospodem continuar a nos atetar até a sétima geragáo... é que tendemos
a repetir qualquer coisa que nao perdoamos. Se nossos país foram ex-
cessivamente possessivos ou negligentes, eles e seus antepassados que
os educaram, precisam de ser compreendidos, perdoados e justificados;
caso contrario, nossa reagáo a seus erros precisará do perdáo de nossos
filhos ou mesmo de sete geragóes de filhos". Que fazer entáo? " Talvez
vocé ache necessário perdoar a Jesús (por exemplo, pela familia em que
ele o colocou, por permitir a morte de um determinado familiar, etc.). Des
ligue os familiares mortos, dando e recebendo perdáo pelos padróes fa
miliares destrutivos" (p. 69).

Estes dizeres sugerem duas observagóes: 1) É blasfemo pretender


"perdoar a Jesús" como se Jesús tivesse cometido algum erro; 2) Nao há
como desligar os falecidos de mau comportamento dos mesmos quando
vivos na Térra; quem deixa este mundo, nao pode ser desligado nem
absolvido no além. O purgatorio nao implica absolvigáo de culpas, mas a
penetragao do amorjá existente na alma da pessoa falecida até "o fundo
dessa alma", de modo a extirpar as raizes do pecado que nela tenham
permanecido ao deixar este mundo.

Os autores afirmam que Deus tanto ama o pecador que Ele perdoa
antes que o pecador se arrependa; falsamente pretendem fundamentar
isto na parábola do filho pródigo; ver p. 56. - Na verdade, Deus ama o
pecador nao arrependido, mas nao Ihe impóe o seu amor; o filho pródigo
primeiramente disse "Pequei...", depois foi abragado.
Continua na p. 430

428
PRESERVATIVO: DE DOIS MALES O MENOR?

A liberacáo do preservativo, aínda que somente em casos especi


áis, deve ter conseqüéncias infelizes para a nossa sociedade. Com efei-
to; poderá significar que nao há obstáculo ao relacionamento sexual li-
vre, desde que os parceiros tomem as devidas cautelas para evitar gravi
dez indesejada. Disto seguir-se-á maior número de jovens precocemen-
te grávidas, que ou praticaráo o aborto ou seráo máes solteiras. A expe
riencia norte-americana revela que tal tipo de liberdade causa fastio e
provoca a réplica de jovens abstemios, que apregoam a castidade nao
tanto por motivos religiosos como por desdém á experiencia negativa. -
Há, porém, quem recorra a um principio de Moral que ensina: "entre dois
males escolha o menor". Aplicado ao caso em questáo, o principio quer
dizer: quem está entre o mal da transmissáo da AIDS (por nao usar pre
servativo) e o mal do preservativo, escolha este último, que parece ser o
mal menor. A propósito deve-se ponderar o seguinte: o principio vale
quando nao há alternativa entre dois males e a pessoa é obrigada a agir,
acontece, porém, que, no caso do relacionamento sexual, há sempre
urna terceira opcáo: a abstinencia... Esta, porém, pode parecer fora de
cogitacáo, já que a onda erotizante da sociedade difícilmente concebe a
continencia sexual. O pansexualismo que afeta muitos lares e muitas
escolas dá a crer a muitos jovens e adultos que a abstinencia sexual faz
mal á saúde ffsica ou psíquica, quando na verdade conceituados repre
sentantes da sociedade brasileira dáo seu depoimento favorável á casti
dade nao por motivos religiosos, mas por efeito do bom senso e da expe
riencia contraria; tenha-se em vista O GLOBO, Caderno da Familia, de
30/04 pp., págs. 1 e 2. Ademáis é de notar que o slogan Safe Sex (Sexo
Seguro) é falso; está médicamente comprovado que os preservativos sao
falhos. Pesquisa realizada por Richard Smith, especialista americano na
transmissáo da AIDS, apresenta seis grandes falhas do preservativo, entre
as quais menciona a deterioracáo do látex, ocasionada pelas condicdes
de transporte e armazenagem. Aínda que os preservativos cheguem em
perfeítas condicóes aos usuarios, estes ainda nao estariam seguros. O
tamanho do virus do HIV da AIDS é 450 vezes menor que o esperma
tozoide. Estes pequeños virus podem passar entre os poros do látex táo
fácilmente em um bom preservativo como em um defeituoso; ver Richard
Smith, The Condom: Is it really safe sex? Public Education Comitee,
Seattle, EUA. Julgam bons observadores que o interesse de firmas co
merciáis favorece o falso chaváo e explora a impericia dos incautos, que

429
46 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 460/2000

sao danificados ás custas de interesses espurios. Em suma, diante da


problemática em foco, só há urna via de solucáo satisfatória: o reescalo-
namento dos valores, de modo que se conceba o sexo, sem dúvida, como
um valor, valor, porém, que está integrado no conjunto de urna persona-
lidade que nao é irracional e cega, mas é capaz de formular um ideal de
vida inteligente e enobrecedor, ideal em que os impulsos instintivos se
harmonizem com os ditames da razáo humana, naturalmente aberta á
Transcendencia.

(Texto publicado no jornal O GLOBO aos 19/06/00, p. 6)

Continuagáo da p. 428:

Á p. 95 os autores parecem admitir o Batismo de urna crianga após


a sua morte:

"Se os pais e a comunidade crista podem ajudar a optarpelo batismo


de urna crianga antes da sua morte, por que os pais e a comunidade crista
nao podem ajudar a optar pelo batismo de urna crianga após a sua morte?".

Na verdade, os sacramentos sao para os peregrinos na Térra, nao


para quem já foi chamado por Deus. O Senhor pode conceder a sua
graga e a salvagáo independentemente do Batismo de agua. As oragoes
pelos defuntos tém por objetivo pedir a Deus que corrobore o amor de
quem morreu voltado para Deus, mas aínda portador de resquicios de
pecados já perdoados na vida presente.

Muito interessante é quanto dizem os autores a respeito da oragáo


pelos mortos praticada por confissóes religiosas nao católicas. Eis o que
se lé á p. 34:

"Ao responderá um escritor que havia atacado varias práticas como


corrupgáo do século II, John Wesley, fundador do Metodismo, observou:
'Essa oragáo pelos mortos para que Deus em breve complete o número
de seus eleitos e apresse seu reino, e a ungáo dos doentes com óleo,
vocé nao irá de modo algum provarcom facilidade que sejam corruptelas"
(John Wesley, Works, ed. 1830, IX55eX9)".

O Apéndice B do livro (pp. 160-164) aprésenla testemunhos de


outras crengas religiosas (anglicana, presbiteriana, judaica) que oram
pelos mortos.

Em suma, a obra insiste enfáticamente sobre o amor misericordioso


de Deus - o que é válido -, mas parece nao levar em conta suficiente que
Deus nao obliga criatura alguma a corresponderá esse amor. "Deus, que te
criou sem ti, nao te salva sem ti" (S. Agostinho). Além disto, os autores suge-
rem que, após a morte da pessoa, possa haver remissáo dos pecados.

430
CARTA AO MINISTRO JOSÉ SERRA

O Pe. Luís Carlos Lodi da Cruz, Presidente do Comité Pro Vida de


Anápolis (GO), redigiu a carta abaixo, sugerindo aos leitores que a copi-
em e enviem ao Sr. Ministro da Saúde, Dr. José Serra.

Assunto: Norma Técnica "Prevencáo e Tratamento dos Agravos


Resultantes da Violencia Sexual contra Mulheres e Adolescentes"

Excelentíssimo Senhor José Serra


DD. Ministro da Saúde da República Federativa do Brasil

Ministerio da Saúde
Esplanada dos Ministerios, Bloco G, 5o andar
Edificio Sede
70058-900 - Brasilia - DF
Tel: (61)223-7340
Fax: (61) 315-2879
E-mail: info@saude.aov.br

Admiro que V. Exa., no cargo de Ministro da Saúde, tenha emitido


urna Norma Técnica instruindo os hospitais do SUS a fazer aborto em
changas de até cinco meses de vida concebidas em um estupro.

Será isso um direito da mulher? De qual mulher? Pois, das crian-


cas abortadas, aproximadamente 50% sao do sexo feminino. Será um
direito da mulher grande sobre a mulher pequeña? Da mulher forte sobre
a mulher fraca? Da mulher poderosa sobre a mulher indefesa?

Compreendo que o estupro é um crime hediondo e que a vítima


requer o máximo de carinho por parte do Estado e da Igreja. Porém, nao
será o aborto ainda mais hediondo? Se o estuprador for preso, sofrerá no
máximo 10 anos de prisáo. E isso, só depois de um julgamento, e com
ampio direito de defesa! E a enanca? Pode ser sumariamente condena
da á morte?

Nao me diga que o aborto é facultativo, e que a mulher pode nao


abortar, se quiser. Pois no século XIX a escravidáo também era facultati
va e os brancos poderiam nao ter escravos se quisessem. Protesto con
tra a escravidáo, ainda que facultativa. Com maior razáo protesto contra
o aborto, ainda que facultativo! Pois a escravidáo é um crime contra a
liberdade, ao passo que o aborto ó um crime contra a VIDA!

431
48 "PERGUNTE E RESPONDEREMOS" 460/2000

Nao me diga também que a administrado da "pílula do dia seguin-


te" á vítima de estupro, recomendada pela Norma, evitaría a gravidez,
sem haver necessidade de se recorrer ao aborto. Pois tal pílula, assim
como todo chamado "contraceptivo pós-coital", é na verdade um
microabortivo, e nao há como negar esta verdade.

Responda-me, Senhor Ministro: por que a Norma só sugere o en-


caminhamento da crianca para adocáo se ela tiver mais de cinco meses
de vida? Os nascituros mais novos nao merecem ser adotados? Só aos
cinco meses eles assumem o "status" de seres humanos?

Nao me diga também que V. Exa. está apenas "cumprindo a lei".


Nao apenas porque nao há no Brasil lei alguma permitindo o aborto em
caso de estupro, mas também porque, ainda se houvesse, V. Exa. nao
estaría autorizado a cumpri-la. Os nazistas, ao eliminar os defeituosos,
alegavam estar cumprindo a lei. Será que por isso estavam desculpa
dos? Se houvesse urna lei autorizando o estupro, V. Exa. estaría disposto
a "cumpri-la"?

Solicito a V. Exa., que teve a sorte de ter nascido, que revogue


¡mediatamente tal Norma Técnica.

(Local, data e assinatura)

Estéváo Bettencourt O.S.B.

A Porta Santa da Basílica de Sao Pedro no Vaticano, pelo Car-


deal Virgilio Noé. - ATS Italia Editríce e Librería Editrice Vaticana 1999,
140 x 210 mm, 110 pp.

O Cardeal Virgilio Noé é o Presidente da Fábrica de Sao Pedro no


Vaticano. Escreveu bela obra sobre a famosa Porta Santa, que é abena
pelo Papa no comego de cada ano jubilar e fechada pelo mesmo por
ocasiáo do respectivo encerramento. O livro em foco é de grande valor
histórico e artístico. Comega apresentando o simbolismo da Porta: signi
fica o comego de urna caminhada ou a entrada em algo bem definido, ou
seja ainda, o propósito de renovada conversáo que todo fiel católico é
chamado a realizar por ocasiáo do ano jubilar. Na verdade, a celebragáo
do Jubileu tem origem bíblica: o Levftico 25, 8-18 manda que todo quin-
quagésimo ano seja período de recomego e renovagáo; tal prática foi
assumida pela Igreja a partir de 1300 e aos poucos amiudada até chegar
a ser, como hoje, celebrada de 25 em 25 anos. Após este preludio sobre
o sentido da Porta Santa, o autor descreve em pormenores cada um dos
dezesseis quadros que ornamentam a Porta, reproduzindo belas ilustra-
góes, que valorízam grandemente a obra, dando ao leitor preciosas li-
góes de arte e historia. - Á venda na Livraria Lumen Christl, editora
desta revista.

432
Edicoes "Lumen Christi"

irS3 AB EXCELSIS é um CD de música sacra interpretada por D. Félix Ferrá, osb,


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Barbosa, OSB ao som dos sinos, do órgáo e das vozes de seus monges em canto gregoriano.
Quatrocentos anos de trabalho e louvor em 20 minutos, frutos da paz e paciencia beneditina.
Roteiro e locucáo: Dom Marcos Barbosa, OSB.
Producáo: Mosteiro de S. Bento do Rio de Janeiro

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- CRENgAS, RELIGIÓES & SEITAS: QUEM SAO? Um livro indispensável para a familia
católica. (Coletánea de artigos publicados na revista "O Mensageiro de Santo Antonio")
28 edicao. 165 págs. 1997 R$ 7,00.
- CATÓLICOS PERGUNTAM. Coletánea de artigos publicados na secáo de cartas da
revista "O Mensageiro de Santo Antonio". 1997. 165 págs R$ 7,00.

- PÁGINAS DIFÍCEIS DO EVANGELHO. (O livro oferece-nos um subsidio seguro para


esclarecer as dúvidas mais freqüentes que se levantam ao leitor de boa vontade, trazen-
do-nos criterios claros e levando-nos a compreender que todas as paiavras de Cristo sao
de aplicacáo perene e universal), 2a edicáo. 1993, 47 págs RS 7,00.

- COLETÁNEA - Tomo I - Obra organizada por Dom Emanuel de Almeida, OSB e Dom
Mafias de Medeiros, OSB. Publicacáo da Escola Teológica da Congregacáo Beneditina
do Brasil. Esta obra foi feita em homenagem a Dom Estéváo. Além do esboco bio-
bibliográfico de Dom Estéváo, encontram-se artigos de amigos e admiradores de Dom
Estéváo. Sao professores da Escola Teológica, do Pontificio Ateneu de Santo Anselmo
em Roma, que ministraram varios cursos nesta e outros que o estimam. Sumario: His
toria, Bíblica, Histórico-Dogmática, Dogmática, Canónica, Litúrgica, Pedagógica, Litera
ria e Noticias Biográficas. 1990. 315 págs R$ 14,50.
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fiéis católicos e irmáos separados tém mostrado a necessidade de um repertorio de textos
bíblicos brevemente comentados para facilitar a abordagem de temas controvertidos...
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MARMION
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(1858-1923)

Um dos graneles mestres

espiritwais do século XX será

beatificado em Roma dia 3 de

setembrode2000

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Editados há varios anos pelo Mosteiro de Singeverga de Portugal (Edigóes Ora


et Labora) e distribuidos no Brasil pelas Edigóes Lumen Christi

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• Jesús Cristo nos seus misterios, 3a edicto (1958), 540 pp R$ 35,00.
• Jesús Cristo ideal do monge (1962), 680 pp R$ 35,00.

A doutrina espiritual de Dom Columba Marmion, contida nesses tres volumes,


nao é outra coisa senáo o cristocentrismo teológico e místico de Sao Paulo, reproposto
de forma existencial as almas desejosas de viver em profundidade as realidades da
graga santificante.

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Caixa Postal 2666
CEP 20001-970 Rio de Janeiro - RJ
Tel.: (0XX21) 291-7122 Fax: (0XX21) 263-5679
E-mail: lumen.christi@osb.org.br

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