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RECIFE - PE
2008
ANDRÉ STEFFENS MORAES
RECIFE – PE
2008
Moraes, André Steffens
Pecuária e conservação do Pantanal: análise econômica de
alternativas sustentáveis – o dilema entre benefícios privados e
sociais / André Steffens Moraes. – Recife: O Autor, 2008.
265 folhas: fig., tab. e quadro.
Às instituições que viabilizaram este trabalho: EMBRAPA, UFPE, CNPq, CAPES e CSU (EUA).
Aos professores e colegas do PIMES, pela convivência.
Ao amigo Robson Sereno, por ter sido o melhor conselheiro acadêmico que alguém poderia ter.
Ao amigo e colega Andrew Seidl, pela boa parceria nestes anos todos, e pela co-orientação.
À minha família: pais, irmãos, sogros e cunhadas, que sempre e tanto me ajudam.
À minha esposa e filhas, pelo amor e incentivo.
Ao meu orientador, Prof. Yony Sampaio, pelo apoio e confiança.
RESUMO
Extensive cattle’s ranching has been the dominant economic activity for the past two centuries in
the Pantanal. There are low indexes of productivity and the production system is adapted to the
regional environmental characteristics of droughts and floods. Since the early seventies ranchers
have cleared land and planted pastures in order to increase the annual cattle carrying capacity of
the land. Clearing the land in order to plant pastures is causing negative impacts in the ecosystem
and drawn the attention of society to subjects related to its conservation. It was designated National
Heritage and Reserve of the Biosphere due to its unique biological wealth and diversity of
landscapes and environments. An important motivation to accomplish this project was the
possibility from offering to the pantaneiros’ ranchers some alternatives that could enable them to
improve the land profitability without damaging the ecosystem as dramatically as the deforestation.
Several investigative steps were carried out in order to fully understand how cattle ranching acts
within the natural resources management of the Pantanal. Firstly, some farms’ profitability with
and without cultivated pastures were determined (concerning net revenue), based on primary data
of the regional cattle ranching production systems. Secondly, alternatives to improve land
profitability were analyzed through the introduction of more efficient livestock management
practices’ as well as new productive activities, complementary to cattle ranching. Finally, there
was an attempt to estimate the total economic value of the Pantanal ecosystem, by means of
extensive bibliographical revision, in order to compare it with different land use values. Such
comparison shows that the social costs of deforestation are higher than the expected potential
benefits, although on the private level, deforestation provides economic gain. Or in other words,
that for the rancher the implantation of pastures is income-generating and it is even more income-
generating with improved livestock management practices’ and complementary activities. This
raises a conflict between private and social benefits. The balance between the gains and losses,
private and social, works as an indicator to understand and guide programs directed toward the
conservations of the region and to guide future research efforts. The suggested strategy with
highest probability of success to reach the conservation objectives is to base such programs on
incentives rather than on restrictive and authoritarian measures as the different stakeholders should
be involved in crafting political solutions.
Key words: Pantanal; cattle ranching; cost-benefit analysis; total economic value; conservation.
LISTA DE FIGURAS
Figura 3.2. Curvas de oferta e demanda para um serviço essencial do ecossistema................ 129
LISTA DE GRÁFICOS
LISTA DE QUADROS
Quadro 2.1. Características das relações entre agentes da cadeia produtiva de carne
orgânica brasileira.................................................................................................................... 60
Tabela 1.1. Municípios com área no Pantanal, área e participação relativa dos municípios
na composição fisiográfica do Pantanal brasileiro................................................................... 27
Tabela 2.3. Evolução dos índices zootécnicos médios na pecuária extensiva de corte
resultantes da introdução de tecnologias em diferentes propriedades do Pantanal.................. 39
Tabela 2.9. Custos e receitas para implantação de 100 colméias de abelhas africanizadas no
Pantanal.................................................................................................................................... 53
Tabela 2.10. Características das fazendas que fazem parte do projeto de pecuária orgânica
no Pantanal............................................................................................................................... 65
Tabela 2.12. Municípios brasileiros que fazem ou não parte de Pólo de Ecoturismo e que
incentivam ou não o turismo ecológico, 2002.......................................................................... 70
Tabela 2.15. Total de turistas que visitaram o Pantanal para lazer (média de 2004-
2006)......................................................................................................................................... 80
Tabela 2.17. Valores dos parâmetros nos diferentes cenários e resultados da análise de
custo-benefício de empreendimento ecoturístico em fazenda do Pantanal.............................. 85
Tabela 2.18. Espécies madeireiras do Pantanal com valor comercial potencial, prevalência
média, lucro esperado médio da extração, taxa anual de extração biologicamente
sustentável e lucro anual da extração sustentável da extração, por espécie e por
fitofisionomia........................................................................................................................... 92
Tabela 2.19. Levantamento de estudos do valor econômico líquido dos produtos florestais
não madeireiros........................................................................................................................ 102
Tabela 2.21. Valor dos serviços anuais do ecossistema estimados para o Pantanal da
Nhecolândia.............................................................................................................................. 112
Tabela 2.22. Cenários de agregação para o Pantanal de Mato Grosso do Sul resultantes do
uso do método de valoração contingente.................................................................................. 115
Tabela 3.6. Valores econômicos medianos de áreas úmidas por tipo de área úmida............... 141
Tabela 3.7. Valores econômicos medianos de áreas úmidas por função ambiental................. 142
Tabela 3.8. Valor econômico total global de áreas úmidas por continente e tipo de área
úmida........................................................................................................................................ 142
Tabela 4.1. Fontes dos dados utilizados para analisar melhorias nas práticas de manejo do
rebanho do Pantanal................................................................................................................. 149
Tabela 4.2. Fontes dos dados utilizados para analisar atividades complementares à pecuária
do Pantanal............................................................................................................................... 151
Tabela 4.3. Fontes dos dados utilizados para analisar o valor econômico total do
Pantanal.................................................................................................................................... 154
Tabela 5.1. Localização das fazendas amostradas por município, área média e participação
da área dos municípios na composição fisiográfica do Pantanal brasileiro............................. 161
Tabela 5.2. Localização das fazendas por sub-região e área fisiográfica das sub-regiões no
Pantanal, com seus municípios componentes........................................................................... 162
Tabela 5.3. Área total, média e mediana amostrada e das unidades de vegetação................... 163
Tabela 5.4. Área total média, área média potencialmente sujeita a enchentes e área média
produtiva nos períodos de cheia e seca do Pantanal, para fazendas com e sem pastagem
cultivada................................................................................................................................... 164
Tabela 5.5. Área potencialmente sujeita a enchente nas fazendas amostradas........................ 165
Tabela 5.8 Área total e média de pastagem cultivada, número total de fazendas que
implantaram cada espécie de pastagem, total de operações de implantação e total de anos
de implantação, 1964-1997...................................................................................................... 168
Tabela 5.9 Área de pastagens cultivadas implantadas por espécie e por década, número de
operações de implantação realizadas e número de fazendas envolvidas.................................. 169
Tabela 5.10. Total de fazendas que utilizam os métodos de limpeza de pastagens de forma
combinada e isolada................................................................................................................. 172
Tabela 5.11. Lotação média utilizada nas pastagens e custo de implantação.......................... 173
Tabela 5.12. Área total média, área média potencialmente sujeita a enchentes e área média
produtiva nos períodos de cheia e seca do Pantanal, para fazendas consideradas com e sem
pastagem cultivada................................................................................................................... 174
Tabela 5.13. Total de fazendas que realizam as diferentes fases de produção......................... 175
Tabela 5.16. Quantidade de trabalhos de gado realizados pelas fazendas do Pantanal............ 177
Tabela 5.18. Categorias animais movimentadas em função do alagamento das terras, para
fazendas com e sem pastagem cultivada.................................................................................. 178
Tabela 5.19. Destino dos animais movimentados devido ao período de cheia........................ 178
Tabela 5.21. Idade média de bezerros à desmama para fazendas com e sem pastagem
cultivada................................................................................................................................... 182
Tabela 5.23. Idade à primeira cria para fazendas com e sem pastagem cultivada................... 185
Tabela 5.25. Duração da estação de monta para fazendas com e sem pastagem
cultivada................................................................................................................................... 186
Tabela 5.33. Uso de assistência técnica pelas fazendas e origem do serviço........................... 192
Tabela 5.34. Informações sobre assistência técnica em fazendas com e sem pasto cultivado. 192
Tabela 5.36. Custo anual (1997) com serviços de manutenção e reparos................................ 195
Tabela 5.38. Custo anual (1997) com aluguel de máquinas e equipamentos e arrendamento
de terras.................................................................................................................................... 196
Tabela 5.39. Custo anual (1997) com pagamento de juros, bancos, taxas e impostos............. 197
Tabela 5.40. Custo anual (1997) com despesas para compra e venda de gado........................ 197
Tabela 5.45. Receitas anuais (1997) de transferência de animais para outras fazendas........... 202
Tabela 5.49. Total de fazendas com receitas líquidas/ha positivas e negativas, para
fazendas com e sem pastagem cultivada.................................................................................. 205
Tabela 5.56. Total de fazendas com receitas líquidas positivas e negativas na situação
tradicional e após modificações na relação touro:vaca............................................................ 211
Tabela 5.59. Ganhos médios decorrentes da utilização de sal mineral adequado ao Pantanal
em relação ao sistema tradicional............................................................................................. 212
1. INTRODUÇÃO.................................................................................................................... 19
1.2. Objetivos........................................................................................................................ 23
1.3. O Pantanal...................................................................................................................... 23
3.1. Análise de Custo-Benefício Social: Lucro Privado Versus Ganho Social.................... 117
4. METODOLOGIA................................................................................................................ 143
5. RESULTADOS.................................................................................................................... 160
6. DISCUSSÃO......................................................................................................................... 223
ANEXOS................................................................................................................................... 254
INTRODUÇÃO
1
Refere-se ao total do rebanho bovino dos municípios com área no Pantanal. Informação sobre o efetivo do
rebanho bovino exclusivo da área fisiográfica do Pantanal, obtida pela separação das fazendas situadas
dentro e fora do Pantanal, só está disponível para os anos de 1975, 1980 e 1985. Em 1985 o rebanho bovino
do Pantanal estava ao redor de 3,0 milhões de cabeça. Ver nota da Tabela 4.2, na próxima Seção, para mais
informações.
20
opção economicamente desejável e, portanto, a expansão da pecuária parece ser responsável pelo
maior ritmo de desmatamento no Pantanal. Além disso, no Pantanal os produtores rurais podem
usar até 80% de suas propriedades, exceto quando suas terras ficam em áreas de preservação
permanente.
As áreas úmidas estão entre os ambientes mais produtivos do mundo, exercendo funções
ecológicas fundamentais, tais como proteção de solos e ciclagem de nutrientes, manutenção e
regulação dos fluxos da água e contribuição para a estabilidade climática local e regional. Assim,
faz sentido a preocupação de diversas instituições, públicas e privadas, nacionais e internacionais,
com a conservação do Pantanal. Essa preocupação é refletida em diversos planos, programas e
projetos de pesquisa e de financiamento e em várias políticas ambientais especificamente
destinadas à região (Andrade e Iadanza, 1997; 2002; Tocantins et al., 2006). Para conciliar a
conservação do Pantanal e o uso econômico de seus recursos naturais é necessário definir
estratégias que garantam o uso sustentável de seus recursos e a manutenção da diversidade
biológica e dos processos ecológicos que regulam o ecossistema.
Por outro lado, qualquer política de conservação no Pantanal certamente irá envolver os
pecuaristas, já que cerca de 90% das terras do Pantanal são de propriedade dessa classe produtiva
(Silva et al., 2001). Se não forem oferecidas alternativas para os produtores pantaneiros, em termos
de aumento da produtividade da pecuária (com tecnologias de baixo impacto ambiental) e/ou em
termos de novas alternativas de exploração dos recursos naturais, a probabilidade de que as
características naturais da região continuem sendo degradadas é alta. Desta forma, o Pantanal
enfrenta atualmente o dilema entre a proteção ambiental e a necessidade de aumentar a eficiência
da produção de alimentos. Nesse dilema, o comportamento dos fazendeiros do Pantanal é vital, e
qualquer decisão política deve levar isso em conta.
21
Assim, apesar do grande potencial de aproveitamento, seus recursos naturais têm sido
pouco explorados. A análise dos impactos de empreendimentos alternativos de baixo impacto
ambiental (apicultura, carne orgânica, hotéis-fazenda, ecoturismo), assim como dos impactos de
mudanças nas atuais práticas de manejo do rebanho (formulação mineral apropriada, desmama
antecipada e vermifugação estratégica de bezerros, redução do intervalo entre partos, uso de monta
controlada e outros), pode fornecer soluções que atendam simultaneamente aos objetivos de
preservação da diversidade genética da flora e fauna do Pantanal e de aumento na produtividade da
pecuária.
A análise de custo-benefício é uma ferramenta útil tanto para tratar dos impactos de
mudanças nas atuais técnicas de manejo do rebanho, quanto dos impactos de empreendimentos
alternativos no Pantanal. Entretanto, não é adequado utilizar conceitos puramente econômicos na
valoração de seus recursos naturais. A análise também deve valorar os benefícios ambientais das
áreas florestadas (e mais amplamente, do próprio Pantanal) e que não se refletem nos preços de
mercado, já que as áreas úmidas exercem importantes funções ecológicas. Assim, uma avaliação
rigorosa dos custos e benefícios sociais deve incluir os aspectos ecológicos. Tratar o impacto
ambiental do desmatamento para introdução de pastagens como uma variável econômica relevante
é parte indissociável da análise de custo-benefício.
22
A curto prazo, entretanto, interessa ao fazendeiro – detentor das terras – o máximo lucro, já
que o mesmo está inserido no mercado e opera dentro da ótica privada do mercado. Dessa forma,
combinar análise tradicional de custos de produção com análise de custo-benefício social
proporciona uma abordagem útil para explorar os incentivos privados para a conservação dos
recursos naturais da região. E certamente o uso de instrumentos econômicos na gestão ambiental
irá contribuir para reduzir alguns dos fatores indutores do desmatamento e para alterar a tendência
corrente de desmatar para introduzir pastagens no Pantanal.
Em suma, modelo de pecuária extensiva adotado no Pantanal criou, ainda que não
intencionalmente, um equilíbrio entre o gado e a natureza. Somado a isso, outros fatores
colaboraram para manter o Pantanal praticamente intacto e tão rico em recursos naturais: a baixa
taxa de ocupação humana, o grande tamanho das propriedades, a dificuldade de acesso por estradas
e a pouca atividade de caça e pesca em função da grande oferta de carne bovina. Assim, foi a
pecuária, limitada e ao mesmo tempo auxiliada, pelos ciclos de inundação, que ditou o ritmo de
ocupação do Pantanal. Por seu papel fundamental na economia, por sua tradição e, principalmente,
por sua associação com a proteção dos sistemas naturais, a pecuária do Pantanal deve ser avaliada
como uma atividade capaz de assegurar a sustentabilidade de todo o sistema ecológico ao longo do
tempo, garantindo níveis aceitáveis de produtividade biológica e econômica com conservação
ambiental.
23
1.2. Objetivos
2. Determinar que cursos alternativos de ação estão disponíveis para os fazendeiros com relação à
criação extensiva: análise prospectiva de tecnologias já testadas pela pesquisa agropecuária e ainda
não (integralmente) adotadas, como período de monta controlada, uso de sal mineral apropriado à
região, redução da relação touro:vaca e descarte técnico de touros e vacas de cria.
1.3. O Pantanal
Com 138.183 km2 o Pantanal brasileiro, situado na região Centro-Oeste do Brasil, na Bacia
Hidrográfica do Alto Paraguai (Figura 1.1 e 1.2), entre as latitudes 15° 30' e 22° 30' sul e
longitudes 54° 45' e 58° 30' oeste, é conhecido como a maior área úmida do mundo (Silva e
Abdon, 1998). Definido como uma planície contínua de inundação, o Pantanal Mato-Grossense foi
instituído Patrimônio Nacional, Reserva Mundial da Biosfera e Patrimônio Natural da Humanidade
24
(Brasil, 1988; UNESCO, 2000; WWF-Brasil, 2004) devido a sua condição de área úmida única no
mundo em termos de riqueza biológica e diversidade de ambientes e paisagens. É o local com
maior concentração de fauna das Américas e têm vegetação característica de quatros grandes
biomas: Mata Atlântica, Cerrados, Floresta Amazônia e Chaco. O Pantanal é o lar de mais de 650
espécies de aves, 260 espécies de peixes, 80 espécies de mamíferos, 50 espécies de répteis e mais
de 2.000 plantas identificadas (Wade et al., 1994). O regime hidrológico, com variações anuais
(sazonalidade) e plurianuais de cheia e seca, é um dos responsáveis por toda essa diversidade e
determina uma grande interdependência das plantas e animais ao ciclo das águas. O ciclo das águas
rege a vida e a economia pantaneiras.
por poucos dias. A umidade relativa média anual é de 82%, oscilando de 75% a 86%, com valores
acima de 80% de dezembro a julho e, nos meses restantes, girando em torno de 75% (Moraes et al.,
2001). Sua localização em plena faixa tropical, a cerca de 1.500 km a oeste da faixa atlântica,
propicia a ocorrência das maiores amplitudes de temperaturas anuais do território brasileiro
(Schwenk e da Silva, 2001).
A maior parte da água que cobre o Pantanal periodicamente vem de grandes rios, como o
Paraguai – o principal canal de drenagem do sistema –, e de seus afluentes como os rios Cuiabá,
São Lourenço, Taquari, Negro e Miranda na margem esquerda, e Jauru, Cabaçal e Sepotuba na
margem direita (Figura 1.2). Na margem direita encontram-se ainda extensas lagoas conectadas
diretamente ao rio Paraguai, entre as quais a Uberaba, Gaíva, Mandioré, Vermelha e Cáceres, todas
com superfície entre 30 km2 e 150 km2, mesmo na estiagem, podendo chegar a várias centenas de
km2 durante as cheias (Collischonn et al., 2005). Mas, nem toda a água do Pantanal está nos rios.
Na sub-região da Nhecolândia, por exemplo, encontra-se um magnífico sistema com milhares de
lagoas conhecidas como baías (água doce) e salinas (água salobra), que se interligam na cheia e
podem desaparecer na seca, famosas pela beleza das paisagens que criam. A drenagem no Pantanal
é constituída, ainda, por pequenos cursos de água (córregos), por linhas de drenagem sem canal
bem desenvolvido (vazantes) por córregos temporários (corixos), por lagos e lagoas (baías), e por
meandros abandonados (Carvalho, 1986).
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Municípios do MT MS rre
MS Sub-regiões % Rio Co
1 - Barão do Melgaço 14
2 - Cáceres MT Piquiri i
MS MT uar
3 - Itiquira
MS
Cáceres 9,01 Taq
4 - Lambari D'Oeste Poconé 11,63 Taquari
Ri o
10
5 - Nsa. Sra. do Livramento 11 o
6 - Poconé Barão de Melgaço 13,15 Ri
7 - Sto. Antonio do Leverger 16 Paraguai 5,90
12 Paiaguás 19,60 Negro
Municípios do MS
8 - Aquidauana Nhecolândia 19,48 Rio
9 - Bodoquena Rio Rio
8 Mapa de Localização
ua c o
10 - Corumbá Mapa de Localização Abobral 2,05 M Ri
o
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11 - Coxim nd
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Aquidauana 3,62 a
da
12 - Ladário
13 - Miranda Miranda 3,17
ai
9
agu
14 - Sonora
Nabileque 9,61
Par
15 - Porto Murtinho
16 - Rio Verde de MT 15 Porto Murtinho 2,78
o
did
Área da bacia: 361.666 km2
r
2
Pe
Área do Pantanal: 138.183 km2 Área da bacia: 361.666 km
Rio
2
Área do Pantanal: 138.183 km io
53º00' W Rio R 22º00' S
Apa 53º00' W
Área Área no
Área no Pantanal
Total Planalto
Estados e Municípios Km2 Km2 Km2 % %
A B C C/D 1 C/A
Mato Grosso do Sul 126.511 37.193 89.318 64,64 70,6
Aquidauana 16.865 3.936 12.929 9,36 76,7
Bodoquena 2.546 2.500 46 0,03 1,8
Corumbá 64.677 2.858 61.819 44,74 95,6
Coxim 6.483 4.351 2.132 1,54 32,9
Ladário 377 311 66 0,05 17,5
Miranda 5.527 3.421 2.106 1,52 38,1
Sonora 4.317 3.598 719 0,52 16,7
Porto Murtinho 17.456 12.739 4.717 3,41 27,0
Rio Verde de Mato Grosso 8.263 3.479 4.784 3,46 57,9
Mato Grosso 80.035 31.170 48.865 35,36 61,0
Barão de Melgaço 10.865 83 10.782 7,80 99,2
Cáceres 25.154 11.051 14.103 10,21 56,1
Itiquira 8.482 6.751 1.731 1,25 20,4
Lambari D’Oeste 1.711 1.439 272 0.2 15,9
Nossa Sra. do Livramento 5.134 4.019 1.115 0,81 21,7
Poconé 17.406 3.434 13.972 10,11 80,3
Santo Antonio do Leverger 11.283 4.393 6.89 4,99 61,1
Total 206.546 68.363 138.183 100,00 66,9
Fonte: Adaptado de Silva et al. (2001).
1
D = 138.183 km2 = área total do Pantanal no Brasil.
no Pantanal, que podem demorar até seis meses para sair do território brasileiro, isto é, passarem da
parte superior do rio Paraguai (em Cáceres) para a inferior (na foz do rio Apa) (Carvalho, 1986;
Andrade e Iadanza, 1997). Esse efeito regulador das enchentes, retardando o fluxo das águas, tem
importância vital no funcionamento do ecossistema e para as atividades humanas que se
desenvolvem nesse espaço. Durante as cheias, as águas de inundação veiculam material erodido,
vindo, principalmente, das bacias agricultadas dos afluentes do norte, e espalham sedimentos no
Pantanal, incluindo grande quantidade de matéria orgânica. Esse movimento das águas é muitas
vezes dividido em enchimento, cheia, vazante e seca, para facilitar o desempenho e organização
das atividades humanas. Portanto, é a má drenagem – e não tanto a quantidade de chuvas que cai
na região – a principal causadora das cheias e alagamentos. Como os leitos dos rios não conseguem
escoar as águas, suas margens transbordam inundando a planície em várias direções. Uma vez que
os principais rios que drenam a planície possuem, sem exceção, suas nascentes fora do Pantanal,
28
fica evidente a importância de se considerar o que acontece nas áreas adjacentes para o seu
equilíbrio (Andrade e Iadanza, 1997). A faixa de bordadura, um trecho marginal externo à planície,
não inundável e de limites pouco definidos, pode funcionar como uma faixa de retenção de
material erodido (funcionando como um cinturão de proteção que retém detritos e resíduos), e
também é relevante neste contexto (Rieder et al., 2001)
(Mourão et al., 2006). Algumas espécies que praticamente desapareceram de outros ambientes
brasileiros podem ser facilmente encontradas no Pantanal, como a arara azul e a ariranha. Em
certas épocas a concentração de animais é notável, como nos famosos ninhais, onde algumas
poucas árvores reúnem centenas de aves, que as escolhem para fazer seus ninhos.
REVISÃO BIBLIOGRÁFICA:
PECUÁRIA, ATIVIDADES COMPLEMENTARES E VALORES DO PANTANAL
A pecuária bovina de corte tem sido a atividade econômica dominante no Pantanal há mais
de dois séculos, movimentando cerca de US$ 60 milhões por ano (Abreu e Lopes, 2001). O sistema
de produção é extensivo, com os animais recebendo poucos cuidados e sendo mantidos quase que
exclusivamente de pastagens nativas de baixa qualidade e com marcada sazonalidade. É
desenvolvida em grandes propriedades (7,7% com área igual ou superior a 10.800 ha,
correspondendo a 68% da área total) e apresenta baixos índices de produtividade: idade à primeira
cria aos quatro anos, intervalo entre partos de 22 meses, taxa de natalidade de 56% e de desmama
de 42%; os nascimentos de bezerros ocorrem ao longo de todo o ano, pois não há um período de
monta definido, e os bezerros são desmamados com dez a doze meses de idade (Tabela 2.1). A raça
predominante é a Nelore (Cadavid Garcia, 1986; Almeida et al., 1996; Moraes et al., 2001; Abreu
et al., 2001; Silva et al., 2001).
Estatísticas agropecuárias específicas para a planície pantaneira são escassas, pois os dados
oficiais normalmente são apresentados em bases geopolíticas (microrregiões, municípios, distritos).
A desagregação ou separação de dados para considerar exclusivamente a informação referente ao
Pantanal é trabalhosa e demorada, às vezes inviável. Mas a grande variação na participação relativa
da área de Pantanal na área total de cada município (Tabela 1.1) dá uma boa idéia do quanto é
importante fazer isso. Silva et al. (2001) realizaram este trabalho com os dados dos Censos
Agropecuários dos anos de 1975, 1980 e 1985, separando os estabelecimentos agropecuários
localizados no Pantanal e no planalto, com base nos setores censitários, consolidando os resultados
por municípios e por sub-regiões. Os dados desse período mostram que o número de propriedades
no Pantanal variou entre 4.100 e 4.470 propriedades, a população residente, entre 26.500 e 27.800
habitantes, e o efetivo do rebanho bovino, entre 3,0 e 3,4 milhões de cabeças (Tabela 2.2). A
Tabela 2.2 também mostra a evolução do número de tratores e das áreas de matas, pastagens
nativas e pastagens cultivadas. Para comparação, o total do efetivo do rebanho bovino dos
municípios com área no Pantanal foi de 4,4 milhões de cabeças nos anos de 1975 e 1980, e de 4,6
milhões de cabeças em 1985, de modo que os dados desagregados apresentados na Tabela 2.2
representaram 77,8%, 75,4% e 65,0% desses valores, respectivamente.
ÁREA
No DE ESTABELECIMENTOS PESSOAL OCUPADO EFETIVO BOVINO
SUB- (ha)
REGIÕES
1975 1980 1985 1975 1980 1985 1975 1980 1985 1975 1980 1985
1. Cáceres 608 797 332 557.330 1.111.072 572.101 3.014 5.601 1.820 111.193 197.964 58.885
% 13,6 17,9 8,1 4,9 9,3 4,8 11,0 21,1 6,6 3,2 6,3 2,0
2. Poconé 1.073 791 1.352 1.084.339 1.109.198 1.812.650 6.101 3.933 8.575 267.113 338.707 415.116
% 24,0 17,8 33,0 9,6 9,2 15,3 22,4 14,8 30,9 7,8 10,8 13,8
3. Barão de 1.244 1.553 1.098 1.305.411 1.499.842 1.426.810 6.042 6.871 5.688 239.766 279.672 298.652
Melgaço % 27,9 35,0 26,8 11,6 12,5 12,1 22,1 25,9 20,5 7,0 8,9 9,9
4. Paraguai 185 90 63 658.330 325.938 340.598 970 489 432 174.449 43.360 15.425
% 4,1 2,0 1,5 5,8 2,7 2,9 3,6 1,8 1,5 5,1 1,4 0,5
5. Nhecolândia 317 348 392 2.587.661 2.611.290 2.597.480 3.244 2.811 3.267 1.035.932 790.530 819.868
% 7,1 7,8 9,6 23,0 21,8 22,0 11,9 10,6 11,8 30,3 25,2 27,2
6. Paiaguás 514 415 448 2.546.028 2.515.073 2.726.247 3.656 3.000 3.991 780.087 714.503 720.275
% 11,5 9,3 10,9 22,6 21,0 23,0 13,4 11,3 14,4 22,8 22,8 23,9
7. Abobral 33 31 32 248.605 222.435 246.724 313 188 248 108.087 46.531 48.365
% 0,7 0,7 0,8 2,2 1,9 2,1 1,1 0,7 0,9 3,2 1,5 1,6
8. Aquidauana 43 56 50 454.777 519.219 461.722 903 754 861 187.559 200.773 183.090
% 1,0 1,3 1,2 4,0 4,3 3,9 3,3 2,8 3,1 5,5 6,4 6,1
9. Miranda 23 28 42 458.971 539.102 551.711 378 722 831 101.739 184.887 175.245
% 0,5 0,6 1,0 4,1 4,5 4,7 1,4 2,7 3,0 3,0 5,9 5,8
10. Nabileque 205 188 108 960.113 1.114.156 679.638 1.477 1.109 808 309.430 211.567 132.442
% 4,6 4,2 2,6 8,5 9,3 5,7 5,4 4,2 2,9 9,0 6,7 4,4
11. Porto 221 145 177 408.116 426.296 414.028 1.189 1.007 1.237 106.155 129.255 145.855
Murtinho % 4,9 3,3 4,3 3,6 3,6 3,5 4,4 3,8 4,5 3,1 4,1 4,8
TOTAL 4.466 4.442 4.094 11.269.734 11.993.621 11.829.709 27.287 26.485 27.758 3.421.510 3.137.749 3.013.218
Fonte: Silva et al. (2001).
Nota: Os dados desta tabela referem-se exclusivamente à área fisiográfica do Pantanal. Silva et al. (2001), utilizando dados dos Censos Agropecuários do IBGE de 1975, 1980 e 1985,
separaram os estabelecimentos agropecuários situados no Pantanal e no planalto em cada município, utilizando mapas dos setores censitários do IBGE e mapas municipais. Para os
setores censitários com áreas em ambas as feições foi feita verificação através de trabalhos de campo. Os resultados foram apresentados para o total da área de estudo, para o Pantanal e
para o planalto, por sub-região e por município. O total do efetivo do rebanho bovino apresentado nesta tabela representou aproximadamente 77,8%, 75,4% e 65,0% do rebanho
considerando a área total de cada município (Pantanal e planalto), respectivamente, para os anos de 1975, 1980 e 1985.
34
Tabela 2.2 – Distribuição e evolução de alguns aspectos agropecuários nas sub-regiões do Pantanal (conclusão).
TOTAL 791 1.066 1.324 1.731.884 1.821.786 2.133.710 7.707.530 7.694.099 6.649.415 629.523 671.488 940.819
Fonte: Silva et al. (2001).
Nota: Os dados desta tabela referem-se exclusivamente à área fisiográfica do Pantanal. Silva et al. (2001), utilizando dados dos Censos Agropecuários do IBGE de 1975, 1980 e 1985,
separaram os estabelecimentos agropecuários situados no Pantanal e no planalto em cada município, utilizando mapas dos setores censitários do IBGE e mapas municipais. Para os
setores censitários com áreas em ambas as feições foi feita verificação através de trabalhos de campo. Os resultados foram apresentados para o total da área de estudo, para o Pantanal e
para o planalto, por sub-região e por município.
loliiforme) e grama do carandazal (Panicum laxum). Algumas plantas de outras famílias são
componentes eventuais da dieta, principalmente na cheia. Em períodos críticos o gado consome
rebrota de capim-carona (Elyonurus muticus), após queima (Pott, 1988). As pastagens têm uma
dinâmica que acompanha o ciclo das águas, com espécies que avançam ou recuam no gradiente
topográfico, conforme o nível freático. Várias espécies surgem na estação chuvosa e desaparecem
na estação seca, ocorrendo o contrário com outras espécies (Pott, 1982).
Segundo Pott et al. (1989) ocorrem no Pantanal dois períodos críticos de restrição
alimentar para o gado: do auge ao final da cheia (fevereiro a maio) e do meio ao final da seca
(agosto e setembro). Como a intensidade e duração das cheias dependem, em parte, da quantidade
e distribuição das chuvas durante o ano, a importância do comportamento das chuvas para a
produção pecuária fica evidente. Muito embora o Pantanal seja alagável mais devido à topografia
do que a pluviosidade, as chuvas influenciam os regimes de cheia e seca, condicionando a maior ou
menor disponibilidade de pastagens (Soriano e Galdino, 2002). Em anos de cheia, as áreas mais
baixas, que possuem pastagens de melhor qualidade, ficam cobertas pela água, ocorrendo redução
das áreas disponíveis para pastejo, prejudicando a pecuária. As partes mais elevadas, livres da
inundação, apresentam forrageiras de média a baixa qualidade ou áreas florestadas com baixa
disponibilidade de forrageiras. De maneira geral o período de seca favorece o uso das pastagens
(embora seja na seca que tende ocorrer superpastejo), pois o recuo das águas aumenta as áreas de
pastejo, disponibilizando pastagens de melhor qualidade (Pott, 1982; Santos et al., 2007).
fixa. Quando não for possível manter uma taxa de lotação variável entre os anos, o ideal é que se
mantenha uma taxa de lotação leve. As pastagens cultivadas podem ser utilizadas de forma
estratégica para as categorias animais mais sensíveis (fêmeas de recria e de primeira cria e
tourinhos), a fim de minimizar o efeito da sazonalidade anual das pastagens nativas sobre o
desempenho dos animais.
A partir dos anos 1970 várias espécies de pastagens cultivadas foram plantadas (grama-tio-
pedro, capim colonião, capim pangola, algumas braquiárias, grama bermuda, grama castelo, etc.) e
sua adaptação ao alagamento ou encharcamento foi testada pelos órgãos de pesquisa (Pott, 1982).
Atualmente (2007) as pastagens cultivadas estão em franca expansão, principalmente as
braquiárias.
A real capacidade de suporte do Pantanal ainda está por ser determinada. Para
propriedades com áreas médias superiores a 4 mil ha, as taxas médias de lotação encontradas por
Cadavid Garcia (1986) na sub-região da Nhecolândia foram de 3,5 ha/cabeça, e na sub-região dos
Paiaguás, de 3,3 ha/cabeça. Nos censos agropecuários avaliados por Silva et al. (2001), as taxas
médias de lotação para o Pantanal foram de 3,3 ha/cabeça em 1975, de 3,8 ha/cabeça em 1980 e de
3,9 ha/cabeça em 1985, mostrando, portanto, reduções contínuas de densidade no tempo. Moraes
(1999) estimou taxas de lotação em unidade animal por unidade de área (UA/ha) para as diversas
sub-regiões do Pantanal, encontrando médias de 0,23 UA/ha para 1975 e 0,20 UA/ha para 1980 e
1985. Santos et al. (2001) observaram que os bovinos utilizam especialmente sítios de pastejo
localizados em áreas de campo limpo e baixadas (bordas de baías permanentes, baías temporárias,
baixadas e vazantes), e, portanto, a proporção dessas unidades de paisagens em uma dada área deve
ser considerada na determinação da capacidade de suporte e na distribuição dos animais.
A época de cheia é o período mais critico para a pecuária, uma vez que na seca as áreas
baixas oferecem as espécies mais procuradas pelo gado. Por isso é mais importante buscar
alternativas de manejo para a época da cheia. Em função da sazonalidade das águas, as principais
alternativas de manejo do rebanho são: (1) manter o menor tamanho de rebanho ditado pela
capacidade de suporte “natural” da terra durante a estação das chuvas (cheias); (2) manter o maior
tamanho de rebanho possível e comprar alimento (ração ou forragem); (3) manter o maior tamanho
do rebanho possível na estação seca e vender os animais para reduzir o rebanho a níveis
sustentáveis no início da estação das chuvas; (4) transferir os animais em excesso no início da
estação das chuvas para outras propriedades, em partes mais altas do Pantanal ou no planalto,
próprias ou arrendadas. As estratégias (3) e (4) são uma solução imediata para quando a cheia
chega de repente. Mas o ideal é que o fazendeiro se prepare para as cheias, vedando algumas áreas
de pastagens que não inundem, vendendo animais de descarte, etc. Se a taxa de lotação utilizada no
37
período seco for mantida na época de cheia, certamente os animais perderão peso e as pastagens
podem se degradar a tal ponto, que mesmo com vedação posterior, só vão se recuperar muitos anos
depois (Santos et al., 2007)
Os dois trabalhos de gado3 anuais são realizados em função do ciclo reprodutivo das vacas
de cria, bastante influenciado pelas condições das enchentes anuais e plurianuais, razão pela qual
também há uma época de concentração da concepção e da parição de bezerros, embora nasçam
bezerros o ano todo. O nascimento tende a se concentrar entre julho e outubro, inferindo-se que a
concepção ocorra entre outubro e janeiro (Almeida et al., 1994). Por esta razão, tradicionalmente o
rebanho é manejado em maio/junho e novembro/dezembro. Assim, no trabalho de gado do mês de
maio são desmamados a maioria dos bezerros nascidos no ano anterior. Nesta época as vacas estão
desgastadas fisiologicamente devido à lactação. Como haverá outra fase de restrição alimentar do
meio para o final da seca (agosto e setembro), há necessidade de desmamar o máximo de bezerros
nesta época. O trabalho de gado de maio também é caracterizado pelo baixo número de touros que
estão com o rebanho de cria, e que dificilmente vêm ao curral, pela dificuldade de retirá-los das
enormes invernadas. No trabalho de gado de dezembro, o número de bezerros a serem
desmamados é menor, pois só são desmamados aqueles que nasceram fora da época de
concentração de nascimentos (novembro a fevereiro). Em compensação, há grande número de
bezerros novos, paridos principalmente de julho a outubro. Nesta época os touros estão em maior
número no rebanho de cria, pois as vacas ainda estão manifestando cio (Almeida et al., 1994).
3
Trabalho de gado compreende a busca e condução dos animais do rebanho das invernadas até o mangueiro,
para a realização das diversas atividades de manejo como vacinação, desmama, marcação, descarte,
castração, etc. Geralmente são realizados de um a dois trabalhos de gado por ano no Pantanal, mas depende
da sub-região.
38
d) A everminação estratégica (Sereno et al., 1996) e na desmama (Catto, 1997) reduz a mortalidade
de bezerros, e após a desmama, nas novilhas de reposição, melhora seu desenvolvimento.
e) A substituição gradual de touros “ponta de boiada” por touros geneticamente avaliados e
introduzidos no rebanho de cria em épocas e condições corretas (Rosa e Melo, 1995; Rosa, 1997)
proporciona progresso genético.
f) A utilização de uma relação touro:vaca mais eficiente (Sereno et al., 1998) reduz custos na
atividade de cria.
g) A identificação e acompanhamento de desempenho produtivo ao longo da vida das vacas de
cria, e uma estratégia de descarte das fêmeas improdutivas e das vacas velhas, também melhora o
desempenho do rebanho (Almeida et al., 1996; Abreu et al., 1997; Abreu et al., 2000).
Tabela 2.3 – Evolução dos índices zootécnicos médios na pecuária extensiva de corte
resultantes da introdução de tecnologias em diferentes propriedades do Pantanal.
Uma questão interessante é constatar que muitas das tecnologias disponíveis para uso pelo
produtor nem sempre são adotadas. Algumas dessas tecnologias, que compartilham princípios
econômicos e ambientais e que podem ser facilmente utilizadas pela sua simplicidade, serão
analisadas a seguir, tendo como foco principal o aspecto econômico.
Muito em função das grandes áreas das fazendas do Pantanal e das poucas subdivisões
internas, e por serem os animais pouco manejados e criados sem separação em categorias, os touros
permanecem durante todo o ano com as matrizes, tradicionalmente na proporção de 1:10, embora
na seca haja uma separação natural do rebanho (Cadavid Garcia, 1986; Tullio, 1986). Na monta
anual sem controle (monta natural), a permanência do touro no rebanho durante o ano todo tem
várias conseqüências negativas para a eficiência do sistema: distribuição dos nascimentos por
vários meses, menor controle produtivo, reprodutivo e sanitário dos animais e variações na
40
fertilidade (Valle et al., 1998; Abreu et al., 2003). A fertilidade é o componente de maior impacto
econômico em um sistema de produção de gado de corte na fase de cria e por isso o manejo
reprodutivo é fundamental no desempenho do rebanho. A implantação de estações de monta
permite organizar os eventos reprodutivos, e dessa forma, um maior controle sobre o rebanho.
Quando se consegue um maior controle reprodutivo também se consegue maior controle e
eficiência no desempenho da mão-de-obra, na reposição das matrizes e dos touros reprodutores, na
reprodução, parição e descarte das matrizes (concentrando os nascimentos (e a desmama) em
períodos definidos), no desempenho dos touros reprodutores, na profilaxia sanitária, no preço de
venda dos animais (devido à uniformidade dos lotes), etc. (Abreu et al., 2003)
Por suas várias conseqüências positivas sobre o rebanho e também porque o custo de sua
implementação é praticamente zero, a adoção de um período de monta é um dos primeiros passos
para aumentar a eficiência no sistema de cria de bovinos de corte. Os impactos produtivos e
econômicos da implantação de um período de monta foram avaliados por Abreu et al. (2003) em
sistemas de produção de cria do Brasil central, utilizando modelos de simulação bioeconômicos,
pois é impraticável realizar esta análise, de forma seqüencial e cumulativa, em uma fazenda real4.
Dentre os vários efeitos, foram selecionados: redução da taxa de mortalidade de bezerros (de 10%
para 4%); redução na relação touro:vaca (de 1:25 para 1:33); aumento da taxa de natalidade das
vacas (de 65% para 75%); e redução na mão-de-obra permanente de vaqueiros. O aumento
percentual do valor presente líquido anual (6 anos e desconto de 10%) e da margem bruta anual por
hectare em relação ao cenário sem estabelecimento do período de monta, decorrente da introdução
progressiva dessas quatro práticas ao final de seis anos de simulações, foi estimado em 7,65 e
4
O ponto de partida foi uma fazenda tradicional de cria do Brasil central, com idade a primeira cria aos 36
meses, relação touro:vaca de 1:25, taxa de natalidade de 65% e idade de descarte das vacas aos 12 anos, o
que está mais próximo de uma fazenda “melhorada” do Pantanal (ver Tabela 3.3).
41
7,68%; 12,92 e 13,85%; 25,36 e 26,26%; e 30,39 e 31,33%, respectivamente (Tabela 2.4).
Observa-se, assim, que a implementação do período de monta proporcionou melhoria substancial
na economicidade e na eficiência biológica do sistema, com o aumento da taxa de natalidade tendo
o maior impacto positivo. Os efeitos acumulados da implantação do período de monta aumentaram
a margem bruta anual da atividade em 31% (Abreu et al., 2003).
Tabela 2.4 – Indicadores econômicos da pecuária de corte no Brasil Central (US$) e aumento
médio dos indicadores econômicos em relação à situação tradicional (%).
Cenários A B C D E
Valores em US$
VPL 175.639 189.083 198.332 220.185 229.022
MB/ha 29,86 32,16 34,00 37,71 39,22
RL média 36.893 39.769 41.582 46.250 48.095
RL média/ha 30,24 32,60 34,08 37,91 39,42
Aumento sobre a situação tradicional (%)
VPL - 7,65 12,92 25,36 30,39
MB/ha - 7,68 13,85 26,26 31,33
RL média/ha - 7,80 12,71 25,36 30,36
Fonte: Compilado de Abreu et al. (2003).
Legenda:
VPL = valor presente líquido; MB = margem bruta; RL = receita líquida.
A = Situação tradicional, sem período de monta.
B = Com período de monta e diminuição da mortalidade de bezerros.
C = B + diminuição da relação touro : vaca.
D = C + aumento na taxa de natalidade das vacas.
E = D + redução da mão-de-obra permanente.
Cotação média do dólar em 2002 = R$ 2,92.
Sereno et al. (2000; 2002) projetaram esses resultados, para avaliar o impacto econômico
da redução da proporção touro:vaca no sistema de criação extensivo do Pantanal. Tomando como
43
base uma população bovina de 3,8 milhões de cabeças, das quais 42% seriam fêmeas em idade de
reprodução (Cadavid Garcia, 1985), e utilizando a monta natural tradicional do Pantanal (1:10), e o
preço do touro em US$ 520 (um valor propositadamente baixo), esses autores estimaram que a
redução da proporção touro:vaca de 1:10 para 1:25 resultaria em uma economia da ordem de U$$
9,95 milhões/ano, e de 1:10 para 1:40, em US$ 12,45 milhões/ano, decorrente da redução na
aquisição anual de reprodutores (de 31.900 touros no sistema tradicional, para 12.770 e 7.980 nos
outros dois sistemas, respectivamente).
Sistemas de Manejo
Custos e Reduções nos Custos (relações touro:vaca)
(por bezerro nascido)
1:10 1:25 1:40
Custo total (5 anos) (US$) 94.800 37.920 23.700
Redução no custo total (US$) 0 56.880 71.100
Custo anual (US$) 18.960 7.584 4.740
Redução no custo anual (US$) 0 11.376 14.220
Custo/bezerro/ano (US$) (40% natalidade) 47,4 18,96 11,85
Redução no custo/bezerro (US$) 0 28,44 35,55
Custo total relativo ao tradicional 1:10 (%) 100 40 25
Redução no custo total/bezerro (%) 0 60 75
Fonte: Adaptado de Sereno et al. (2000; 2002).
Observa-se uma redução do custo por bezerro desmamado de US$ 28,44 (ou 29% por
bezerro, já que o preço médio do bezerro na época era de US$ 100) quando se evolui da proporção
1:10 para 1:25, e de US$ 35,55 (36% por bezerro) quando se evolui de 1:10 para 1:40. Em outras
palavras, uma redução nos custos de produção de 60% e 75%, respectivamente.
44
Média
Especificação 1992 1993 1994 Total
anual
Retorno líquido anual (US$) -9.927 -10.199 24.297 4.171 1.390
Retorno sobre o investimento (US$) 1:0,69 1:0,65 1:1,79 1:1,05 1:1,05
Retorno do capital por hectare (US$) -1,11 -1,14 2,72 0,47 0,16
Aumento da taxa de prenhez (%) 8,5 9,7 29,6 - 15,9
Diminuição da taxa de mortalidade (%) 16,4 16,5 11,7 - 14,9
Fonte: Seidl et al. (1998).
somente uma época do ano) apresenta as maiores receitas líquidas. A utilização das formulações
minerais adequadas para o Pantanal possui potencial para aumentar a taxa de desmama em até 10%
(Moraes et al., 2001). No Pantanal há uma alta percentagem de vacas inférteis (entre 17% e 27%),
que mesmo não produzindo, consomem suplemento mineral, afetando a rentabilidade da pecuária
(Afonso et al., 2001).
Afonso et al. (2001) avaliaram o efeito da suplementação mineral sobre vacas de cria em
fazenda da sub-região da Nhecolândia, durante quatro ciclos reprodutivos (1994 a 1999), em
pastagem nativa. Três grupos de 75 animais foram submetidos a três tratamentos, recebendo:
suplemento mineral completo durante o ano todo, sal comum durante o ano todo, e suplemento
mineral completo nos períodos de chuvas (época de maior oferta de pasto) e sal comum nos
períodos de seca (em geral, de agosto a novembro no Pantanal). O sal foi fornecido “ad libitum” e
o consumo medido periodicamente. As matrizes foram pesadas no início do experimento, antes do
parto, após o parto e na desmama, e os bezerros, na semana do nascimento e na desmama, sendo
esses pesos comparados estatisticamente entre tratamentos. As taxas de natalidade, mortalidade e
desmama de bezerros também foram comparadas estatisticamente entre os tratamentos. A análise
econômica foi baseada em orçamentação parcial, calculando-se custos e receitas adicionais em
relação ao tratamento controle (sal comum), considerando um rebanho de 1.000 matrizes. Os
resultados econômicos estão apresentados na Tabela 2.7.
Observa-se que é mais econômico utilizar o sal mineral somente no período chuvoso.
Embora a receita bruta do tratamento que utiliza sal mineral o ano todo seja mais elevada, os custos
associados ao frete e ao próprio suplemento (que tem maior consumo), fazem com que a receita
líquida do tratamento estratégico seja maior. O custo do suplemento e o preço do bezerro influem
muito na rentabilidade do suplemento mineral. Por exemplo, um aumento de 20% no custo do
suplemento e uma redução de 20% no preço do bezerro, reduz a rentabilidade do tratamento que
usa sal mineral o ano todo para R$ 0,65 e a do tratamento que usa sal mineral somente nos
períodos de chuva, para R$ 1,17.
A. Apicultura
A China é o maior produtor mundial de mel natural5, responsável por pouco mais de 20%
da produção, que foi de 1,4 milhão de toneladas em 2005, seguida da Turquia, Argentina e Estados
Unidos (com aproximadamente 6% da produção, cada um). Em 2005 o maior exportador foi a
Argentina (exportando 80% da sua produção, o que gerou quase US$ 130 milhões), seguido da
China, cujas exportações renderam US$ 87 milhões no mesmo ano. A Alemanha, os Estados
Unidos e o Reino Unido são os maiores importadores de mel natural. O mercado mundial de mel é
dominado por apenas 15 países, que produzem quase 70% do total mundial, mas há muitos países
produtores (Buainain e Batalha, 2007).
5
O mercado do mel caracteriza-se por dois produtos bem diferenciados: o mel de mesa consumido in natura
(mel natural ou simplesmente mel) e o mel industrial utilizado para fabricação de biscoitos, cosméticos, etc.
47
A produção de mel natural no Brasil expandiu-se ao longo da década de 1990, mas foi só a
partir de 2001, devido à crise dos dois grandes fornecedores (Argentina e China, com queda de
quase 20% nas exportações), que o mel brasileiro emergiu no mercado mundial. Entre 2001 e
2004, o Brasil avançou da condição de pequeno exportador para um dos líderes do mercado
mundial, com suas exportações passando de 2,8 milhões de dólares (2,5 mil toneladas) para 42,3
milhões de dólares (21 mil toneladas), respectivamente. Nesse período o preço médio do mel
brasileiro vendido ao exterior passou de US$1,13/Kg para US$ 2,02/kg (com o máximo de US$
2,36/kg em 2003). A partir de 2005, com a volta da Argentina e da China ao mercado
internacional, a demanda e o preço do mel brasileiro registram queda, proporcional à elevação dos
anos anteriores: o volume exportado ficou abaixo de 15 mil toneladas e o preço recuou para US$
1,60/kg; como conseqüência, o valor das exportações caiu para US$ 23,4 milhões em 2006. Assim,
com a regularização do mercado internacional a partir do fim de 2004, o preço internacional do mel
parece estar voltando aos patamares históricos, ao redor de US$ 1,00/kg, inferiores àqueles que
estimularam e viabilizaram a entrada do Brasil no mercado (Böhlke e Mauch Palmeira, 2006;
SEBRAE, 2006; Buainain e Batalha, 2007).
O Brasil tem condições de retomar o mercado externo conquistado nos últimos anos, pois o
mel brasileiro já foi reconhecido como de alta qualidade, superior a de seus concorrentes. Por
exemplo, enquanto concorrentes como a Argentina exportam mel exclusivamente para “blend”,
usado em misturas com melados de cereais ou açúcar pela indústria de alimentos, o Brasil
consegue exportar mel in natura. Mas para isso tem que sanar vários problemas da cadeia
produtiva, entre os quais, a baixa produtividade, a falta de inovação, a baixa escala de produção e o
baixo nível organizacional. A Câmara Setorial da Apicultura (criada em fevereiro de 2006) e a
estruturação do Programa Brasileiro de Avaliação da Conformidade para o Setor Apícola (a partir
de maio de 2007) são iniciativas nessa direção. Este programa pretende estabelecer mecanismos e
48
Cresc.
Região 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005
%
Brasil 19.751 21.865 22.220 24.029 30.022 32.290 33.750 70,9
Norte 185 302 318 371 510 519 653 253,0
% 0,9 1,4 1,4 1,5 1,7 1,6 1,9
Nordeste 2.795 3.748 3.800 5.560 7.968 10.401 10.911 290,4
% 14,2 17,1 17,1 23,1 26,5 32,2 32,3
Sudeste 4.291 4.514 4.686 5.137 5.335 5.187 5.272 22,9
% 21,7 20,6 21,1 21,4 17,8 16,1 15,6
Sul 11.870 12.670 12.746 12.277 15.357 15.266 15.816 33,2
% 60,1 57,9 57,4 51,1 51,2 47,3 46,9
C. Oeste 610 632 671 684 852 917 1.097 79,8
% 3,1 2,9 3,0 2,8 2,8 2,8 3,3
Fonte: Buainain e Batalha (2007).
na faixa de 1.500 a 2.500 colméias, que contrata toda a mão-de-obra de que necessita (acima de
2.500 colméias as eventuais vantagens da elevação de escala são reduzidas e um único proprietário
não consegue administrar). Todos esses produtores mantêm atividades paralelas, seja como
principal ou como complementar à apicultura, embora os grandes possam ser mais especializados
(Vilela, 1999; Reis, 2003; Buainain e Batalha, 2007). Cerca de 80% dos apicultores são pequenos e
praticam a apicultura fixa, e os 20% restantes são considerados profissionais e praticam a
apicultura migratória. Na apicultura migratória a produção é constante, com cinco a seis coletas
anuais, e um produtor pode movimentar 2 mil a 3 mil colméias por ano (Castro, 2006). Sommer
(2002) estima que existam 300.000 apicultores no Brasil.
Embora varie muito de acordo com a região, a produtividade média anual no Brasil é
baixa, entre 15 e 18 kg/colméia/ano, enquanto que nos Estados Unidos, México e Argentina, por
exemplo, está entre 30 e 38 kg/colméia/ano e na China, entre 50 e 100 kg/colméia/ano (SEBRAE,
2006). No Nordeste, segundo Buainain e Batalha (2007), a produtividade da apicultura fixa está
em torno de 50 kg/colméia/ano, e a da apicultura migratória, característica da região, pode alcançar
até 100 kg/colméia/ano.
O consumo doméstico de mel também é muito baixo diante dos padrões mundiais: 300
g/pessoa/ano, enquanto que nos Estados Unidos, Alemanha e Canadá está entre 900 e 950
g/pessoa/ano, e em outros países é ainda superior (SEBRAE, 2006). Segundo Buainain e Batalha
(2007), o consumo médio no Brasil é de 200 g/pessoa/ano, sendo maior entre as classes média e
alta (entre 250 e 300 g/pessoa/ano), variando de cerca de 150 g/pessoa/ano no Nordeste a 400
g/pessoa/ano na região Sul. Já Castro (2006), afirma que o consumo médio é de 130 g/pessoa/ano.
Percebe-se, pois, que é difícil mensurar o mercado interno de mel. O baixo consumo tem sido
atribuído ao elevado preço pago pelo consumidor e a baixa divulgação do produto.
norte-americano, a US$ 2,4/kg, na época, 60% acima do preço no mercado interno (SEBRAE,
2006).
O atendimento aos pré-requisitos para certificação está acima das possibilidades da maioria
dos produtores. Entretanto, não é difícil atender os procedimentos necessários para obter a
certificação como orgânico seja na produção, seja na manipulação, processamento ou estocagem. O
maior problema é que grande parte do mel natural produzido no Brasil é vendido a granel, como
commodity e ao preço de commodity, sendo fracionado e vendido no exterior pelo preço de produto
diferenciado e de elevada qualidade (Buainain e Batalha, 2007).
Apicultura no Pantanal
Inventário preliminar da flora apícola do Pantanal de Mato Grosso do Sul (Pott e Pott,
1986) registrou 162 plantas apícolas. As espécies freqüentes mais procuradas por abelhas são um
arbusto, assa-peixe (Vernonia scabra), duas árvores, cumbaru (Dipteryx alata) e tarumeiro (Vitex
cymosa), e duas ervas, hortelãzinha (Hyptis lappacea) e “vick” (Bacopa sp). São citadas, ainda,
como de grande visitação pelas abelhas, pelo menos mais 10 espécies. Um calendário apícola floral
(mensal), elaborado com base nesse levantamento, indica que há floração durante o ano todo, e
que, portanto, a região é muito propícia à apicultura. No Pantanal de Mato Grosso as espécies mais
comuns, com grande concentração de néctar, são assa-peixe (Vernonia lineares), cambará
(Lantana camara), hortelã-do-campo (Hyptis crenata) e lírio do campo (Alstroemeria cunea) (Lira,
2006).
Embora ocorram floradas durante o ano todo, de janeiro a março não é um período bom
para colheita de mel silvestre no Pantanal. Estes meses correspondem à época mais chuvosa, que
reduz a oferta de flores das espécies herbáceas, e coincide com o período de pouca floração de
árvores e arbustos (o excesso de chuvas reduz a produção de mel, segundo Crane (1983)). Há
variação de ano para ano na disponibilidade de flores, embora as plantas aquáticas não dependam
das chuvas para florescer e têm flores quase o ano todo. Assim, a periodicidade de ocorrência de
51
Estima-se que existam aproximadamente 1.000 apicultores no Mato Grosso do Sul, na sua
quase totalidade pequenos produtores (98%), com produtividade média anual de 15 kg/colméia
(apicultura fixa), e produzindo cerca de 80% da produção total, que alcançou 450 toneladas em
2005. Apicultores com boas técnicas de manejo conseguem obter de 30 a 50 kg/colméia/ano. A
apicultura migratória, realizada por poucos apicultores, tem produção média de 80 kg/colméia/ano
(Reis, 2003). No Mato Grosso as associações de apicultores registram aproximadamente 170
associados e a produtividade no Pantanal deste estado é de 50 kg/colméia/ano (Lira, 2006). A
produção média do Mato Grosso do Sul, no período de 1999 a 2005, foi de 355 toneladas,
representando 46% do total da região Centro-Oeste (780 toneladas). No Mato Grosso a produção
média no mesmo período foi de 240 toneladas ou 30% do total, embora em 2005 tenha alcançado
52
375 toneladas. O crescimento da produção nesses dois estados nesse período foi de 61% e 86%,
respectivamente, e no Centro-Oeste, de 80% (Buainain e Batalha, 2007). Apesar desse
crescimento, a produção desses estados não atende sequer a demanda interna. As estimativas para o
Pantanal são de que em 2002 havia de 30 a 40 apicultores, com 1.500 colméias, produzindo
anualmente entre 20 e 25 toneladas de mel, com produtividade média de 20 kg/colméia/ano (Reis,
2003). O Pantanal, portanto, não tem destaque na produção estadual.
Recentemente a apicultura mundial passou por uma crise, gerada pela expansão de ácaros e
outras doenças (ainda não completamente erradicadas), cujo controle só foi conseguido pelo uso de
defensivos, que normalmente deixam resíduos nos produtos apícolas. Por outro lado, a supressão
da vegetação nativa em várias partes do mundo, tem feito com que o mel e outros produtos
apícolas venham sendo produzidos, cada vez mais, pelo aproveitamento de culturas florestais e
agrícolas, de modo que a produção a partir de floradas silvestres está cada vez mais escassa. Esta
não é a situação no Pantanal, uma região praticamente livre de inseticidas e onde a apicultura se
desenvolve a partir de floradas silvestres. Além disso, não tem um inverno que limite a produção
(Reis e Comastri Filho, 2003).
Todos esses fatores indicam que a região tem um grande potencial para a apicultura. O mel
produzido no Pantanal tem excelente qualidade, aroma e sabor agradável, é oriundo das mais
diversas floradas silvestres e isento de qualquer contaminante químico, podendo ser produzido em
larga escala. A falta de conhecimento sobre a flora apícola e sobre comportamento das abelhas
africanizadas na região, assim como de técnicas de manejo das colméias adequadas e a pouca
organização do mercado, constituem as maiores limitações para o desenvolvimento da apicultura
no Pantanal (APACAME, 2002; Reis e Comastri Filho, 2003).
O grande interesse pela apicultura no Pantanal fez com que alguns pecuaristas iniciassem a
atividade em suas fazendas, no passado recente. Entretanto, pela falta de orientações técnicas sobre
a criação racional de abelhas nas condições locais, entre outros fatores, alguns empreendimentos
não obtiveram sucesso. Por essa razão, Reis e Barros (2006) realizaram um estudo em uma fazenda
do Pantanal da sub-região do Abobral, comparando os retornos econômicos da apicultura como
atividade complementar à bovinocultura de corte. O objetivo foi contribuir para a tomada de
decisões de produtores rurais pantaneiros que eventualmente pretendam desenvolver essa atividade
em suas propriedades. O estudo considerou a apicultura fixa (sem deslocamento das colméias) de
abelhas africanizadas (Apis mellifera), com colméias de pequeno a médio porte (100 colméias), e
produtividade média (25 kg/colméia/ano no primeiro ano e 35 kg/colméia/ano no segundo ano), e
simulou uma situação com e sem aquisição da fazenda. Os resultados estão apresentados na Tabela
2.9.
Tabela 2.9 – Custos e receitas (US$) para implantação de 100 colméias de abelhas
africanizadas no Pantanal.
Ano 1 Ano 2
Especificação
(US$) (US$)
Aquisições (capital investido) 1 10.586 119.308
Mão-de-obra 2 398 452
Transporte 333 333
Imposto direto sobre a comercialização 420 633
Imposto territorial rural (ITR) 61 60
Recolhimento do INSS sobre a produção 151 228
Manutenção de construções e benfeitorias 3 656 613
Manutenção de máquinas e equipamentos 3 475 416
Arrendamento de pasto apícola 4 448 482
Depreciação 3.649 3.623
Custo operacional total 6.590 6.841
Remuneração do capital 5 723 732
Custo total 7.313 7.572
Produção kg de mel/ano 2.375 3.325
Receita bruta 5.558 7.781
Receita líquida -1.756 208
Receita líquida por hectare -1,65 0,20
Fonte: Reis e Barros (2006).
1
Colônias de abelhas africanizadas e materiais apícolas; o valor do ano 2 é o valor do
patrimônio, incluindo a fazenda.
2
Mão-de-obra inclui pró-labore.
3
Custo anual de manutenção das benfeitorias (casas, cercas, poços, etc.) e máquinas e
equipamentos existentes na propriedade (trator, carreta, motor gerador, etc.).
4
O arrendamento de “pasto apícola” é o pagamento pelo uso das áreas ocupadas com apiários
quando os apicultores não são proprietários da terra. No Pantanal Sul, pagava-se (2004) o valor
(em reais) correspondente a 2 kg de mel/ano/colméia instalada (Reis e Barros, 2006).
5
Remuneração do capital investido (6% a.a.) e do capital de giro (metade do produto do custo
operacional efetivo por 6%).
54
B. Pecuária Orgânica
Segundo dados do IBGE, o rebanho bovino brasileiro atingiu cerca de 207 milhões de
cabeças em 2006, dos quais cerca de 80% são bovinos de corte. Esses números divergem conforme
a fonte e a metodologia de coleta de dados, em até 15%. De qualquer forma, o Brasil é atualmente
o maior produtor e exportador de carne bovina do mundo, exportando para mais de 100 países,
com receita estimada em US$ 3,52 bilhões no ano de 2006, referente ao embarque de 2,2 milhões
de toneladas (quase 25% da produção). Nos últimos dez anos (1997-2006) a produção de carne
cresceu 5,5% ao ano, passando de 5,8 milhões de toneladas para cerca de 9 milhões de toneladas,
respectivamente. Aproximadamente 80% da produção de carne bovina é destinada ao mercado
interno, com o consumo per capita estimado em 37 kg/ano em 2006. A raça Nelore representa 80%
do rebanho nacional (IBGE, 2006; ABIEC, 2007; CEPEA, 2007). A área ocupada por pastagens no
Brasil em 2005 foi de cerca de 260 milhões de hectares, dos quais 56% correspondem a pastagens
nativas (ao redor 145 milhões de ha) (ANUALPEC, 2005). Atualmente o país aposta no mercado
externo através do projeto Brazilian Beef, uma ação conjunta de órgãos do governo e entidades
representativas da cadeia produtiva da pecuária de corte brasileira. Este projeto pretende
demonstrar a qualidade e a segurança da carne brasileira, evidenciando o sistema natural de criação
55
a pasto, a eficácia dos programas de controle sanitário e a excelência dos frigoríficos de abate
(ABIEC, 2007).
preço é explicado porque os produtos vendidos tendem a ser cortes selecionados, de preço médio
mais alto (Clause, 2006). Na Europa essa tendência está fazendo com que o mercado de orgânicos
já não mais seja visto como um nicho de mercado (Biofach, 2007).
As mudanças nos conceitos de qualidade e segurança alimentar são motivadas por muitos
fatores. Por exemplo, várias doenças estão relacionadas ao tipo de alimentação adotado por uma
população, e as infecções alimentares costumam provocar altas taxas de mortalidade. Mais
recentemente, diversas ocorrências relacionadas aos alimentos e à saúde humana, principalmente
nos países desenvolvidos (mal da vaca louca, gripe aviária e comercialização de organismos
geneticamente modificados), têm acentuado essas mudanças (Ramos, 2006a).
Em geral o custo final dos produtos orgânicos é maior do que o dos produtos
convencionais. Entre as razões apontadas estão as diversas exigências da produção orgânica
(legais, trabalhistas, ambientais) e os requerimentos específicos das certificadoras, normalmente
mais onerosos de serem atendidos que nos sistemas convencionais. Também é crescente o número
de consumidores que considera que devem ser adicionados aos custos dos sistemas de produção
convencionais, os valores indiretamente cobrados da sociedade e não contabilizados como custos
(contaminação ambiental, perda de produtividade do solo, uso inadequado da água, assoreamento
de rios e perda de biodiversidade, entre outros). Como esses são efeitos que a produção orgânica
pretende evitar ou reduzir sensivelmente, muitos consumidores estão dispostos a pagar um
diferencial de preço (ou prêmio) pelos produtos orgânicos. Além da garantia de que o produto é
proveniente de um sistema de produção que causa os menores impactos ambientais negativos
possíveis, com a certificação, o consumidor tem, ainda, a certeza de adquirir um produto isento de
qualquer tipo de contaminação química. Devido a esses fatores os consumidores estão dispostos a
pagar preços mais altos para remunerar os produtores que também demonstram preocupação social
e com o meio ambiente (Reis, 2003). Entretanto, para WWF-Brasil (2005), no que se refere à
exportação de carne de boi orgânica, este prêmio é ilusório, pois só são comercializados como
orgânicos poucos cortes nobres de traseiro, o que dilui o prêmio no restante da carcaça, chegando a
no máximo 7%.
2006, criou a Cooperativa de Produtores Orgânicos da Região do Pantanal (Cooperbio), que atua
como seu braço comercial. A cooperativa compra o animal do produtor e terceiriza o abate e
processamento, com o produto final (já desossado e embalado) saindo com a marca da cooperativa
que representa os produtores. Atualmente (2007) a cooperativa está constituída por 20 pecuaristas,
em sua maioria da sub-região da Nhecolândia, totalizando uma área de 240 mil hectares e com um
rebanho de aproximadamente 50 mil cabeças (WWF, 2005; 2007). A Cooperbio foi criada porque
a experiência da ABPO em comercializar seus produtos diretamente com o mercado consumidor
não foi inteiramente positiva, principalmente devido a problemas no padrão do produto ofertado.
Os critérios técnicos adotados (idade do animal, peso, espessura de gordura, etc.) não foram
suficientes para padronizar o produto final e para atender ao mercado consumidor. Como o padrão
tecnológico não foi adequadamente definido, o produto não se consolidou no mercado, apesar do
marketing realizado (Ramos, 2006b).
A ASPRANOR tem atuação mais ampla, abrangendo, além da pecuária bovina de corte, a
pecuária de leite, ovinos, suínos e aves. Ao operacionalizar seu objetivo de desenvolver uma rede
de carne orgânica, todos os elos da cadeia produtiva foram considerados (produção, distribuição e
comercialização), incluindo a criação de critérios técnicos em relação ao padrão do animal a ser
fornecido para o mercado. Em 2006 contava com 16 associados e uma área de pastagens estimada
em 30 mil hectares. A iniciativa atraiu interesse dos grupos Carrefour e Friboi, que atualmente
participam da produção. O frigorífico Friboi é responsável pelo abate, processamento e distribuição
de toda carne orgânica produzida pelos associados e a relação com a ASPRANOR tem caráter de
exclusividade. O grupo Friboi lançou uma linha de carnes bovinas orgânicas denominada “organic
beef” e todos os produtos levam a marca criada pela associação, denominada “Boi D’Terra”. Esta
linha comercializa 23 cortes especiais resfriados, inclusive alguns dianteiros, miúdos congelados e
59
A história dessas duas associações, que possuem objetivos finais similares, mas modelos
diferentes acumula uma série de experiências – relacionamentos entre parceiros (agentes da cadeia)
e com os mercados (produção, atacado, varejo e ao consumidor) – que foi estuda por Ramos
(2006a), com base na teoria das convenções6. Foram realizadas entrevistas com os agentes
envolvidos no desenvolvimento das duas associações, para identificar as estratégias adotadas e as
perspectivas de crescimento de cada uma, e uma pesquisa de mercado (consumidor final, venda
direta e redes de varejo), para determinar as percepções dos consumidores e as tendências de
mercado.
A diferença dos modelos entre as duas associações se resume, segundo Ramos (2006a),
principalmente, nas particularidades de cada região e nas estratégias de construção das redes a
partir do perfil das parcerias estabelecidas entre os segmentos de produção, abate, processamento e
distribuição. Outras particularidades são apresentadas no Quadro 2.1.
específicos locais que na realidade não conferem um padrão exigido no mercado consumidor.
Nesse contexto o padrão tecnológico representa uma barreira para a consolidação dos interesses
entre os agentes, pois a possibilidade para definir uma ação coletiva, que alcance novos valores,
respaldados em novos padrões tecnológicos e nas demandas do mercado, fica comprometida.
ABPO ASPRANOR
Característica central: construção da rede em Característica central: construção da rede em
parceria com universidades (UFMS) e órgãos de parceria com o segmento da indústria que participa
pesquisa (Embrapa). diretamente da distribuição e comercialização da
carne (grupo Carrefour e frigorífico Friboi).
Perfil do produtor (pecuaristas do Pantanal do Mato Perfil do produtor (pecuaristas da região de Tangará
Grosso do Sul): proprietário rural com longa da Serra, Mato Grosso): novo proprietário rural (em
tradição (mais de 100 anos). torno de vinte anos).
Modelo de produção pecuário: baseado em sistema Modelo de produção pecuário: vinculado a um
extensivo, com particularidades regionais sistema moderno, com tecnologias atuais e sem
específicas e uma forte influência dos aspectos sofrer influências dos aspectos culturais e regionais
culturais e locais nas suas decisões. para suas decisões.
Não define um parceiro do segmento de abate e Tem parceiros no segmento de abate, processamento
processamento. A rede é organizada por meio de e distribuição: grupo Carrefour e frigorífico Friboi.
uma cooperativa, que terceiriza o abate e o
processamento, e distribui o produto final com sua
marca.
Na relação com os demais agentes da cadeia, tem Beneficia-se do alto nível de capitalização do
baixo nível de capitalização e baixo volume de segmento industrial (motivado pela exportação) e do
vendas. volume (e concentração) de vendas do segmento de
varejo.
Mercado alvo: mercado interno; vendas no pequeno Mercado alvo: mercado interno e externo; no
varejo (lojas, pequenos mercados, restaurantes). mercado interno está presente no grande varejo
(supermercados e hipermercados)
O padrão tecnológico (ou a qualidade do produto) O padrão tecnológico desenvolvido pelos produtores
desenvolvido pelos agentes produtores pantaneiros desta associação confere ao produto o padrão
não confere ao produto o padrão exigido no exigido no mercado.
mercado.
O poder de negociação dos produtores com os O poder de negociação dos produtores com os
demais agentes da cadeia é baixo. Os segmentos de demais agentes da cadeia é alto, pois o produto é
abate e processamento, aliados ao segmento de desenvolvido com um padrão de qualidade que
distribuição, exercem uma dominância sobre o atende as exigências do mercado.
segmento produtivo, que tem menor poder de
negociação na cadeia da carne. Como o produto
desenvolvido não tem o padrão de qualidade exigido
pelo mercado, os produtores não conseguem
aumentar seu poder de negociação.
As possibilidades de desenvolver um padrão O desenvolvimento do padrão tecnológico foi
tecnológico capaz de garantir um padrão de baseado na construção de novos acordos de
qualidade aceito pelo mercado dependem do perfil e comportamento e o perfil do agente dominante está
do comportamento do agente produtor. No Pantanal voltado para o atendimento dos padrões e das
a força da cultura é baseada na resistência às exigências de qualidade do mercado.
demandas externas do mercado e o agente
dominante não acredita na necessidade de uma
melhoria de qualidade no processo de produção e no
produto.
Quadro 2.1 – Características das relações entre agentes da cadeia produtiva de carne orgânica brasileira.
Fonte: Compilado de Ramos (2006a).
61
7
O Estado do Mato Grosso do Sul, através do Instituto do Parque do Pantanal (IPP), desenvolveu um
programa chamado Vitelo Pantaneiro (ou Vitpan), que inicialmente não contemplava a certificação orgânica.
Em 2004 o programa contava com 65 propriedades associadas, com um rebanho estimado em 25.000 fêmeas
em reprodução e ocupava uma área aproximada de 30.000 ha nas regiões dos pantanais da Nhecolândia,
Abobral, Aquidauana e Miranda. O programa foi descontinuado em 2005 por questões administrativas
ligadas ao IPP (Santos et al., 2002c).
62
Os resultados dessas pesquisas de mercado mostram que a demanda de consumo por carne
orgânica é formada a partir dos desejos do consumidor por um alimento mais saudável e seguro; a
associação com benefícios ambientais não ficou evidente. Os principais fatores que limitam o
atendimento à demanda são a falta de oferta e a falta de informação sobre o produto. Essa situação
deve permanecer, já que as redes fornecedoras de carne orgânica não possuem volume de produção
para atender o mercado e o padrão de qualidade e segurança do produto ainda está em
desenvolvimento. O levantamento nos canais de comercialização mostra que o mercado de carne
bovina orgânica tem um perfil competitivo, com diversas marcas e inúmeros cortes diferenciados à
disposição dos consumidores, e que tanto consumidores como os estabelecimentos comerciais,
estão dispostos a pagar um preço maior pela qualidade e segurança da carne orgânica. Entretanto, a
diferença nos preços entre os cortes diferenciados da carne convencional (cortes especiais) e a
carne orgânica não foi significante, de modo que o preço não parece ser um fator inibidor da
compra. Os principais resultados quantitativos encontrados por Ribeiro et al. (2001b) e Caleman et
al. (2005) estão sumarizados no Quadro 2.2.
Cinco das seis propriedades (as fazendas de cria) foram avaliadas economicamente por
Ribeiro et al. (2001), uma vez que pretendiam solicitar recursos financeiros para a implantação do
projeto, sendo uma delas com a certificação já concluída. A sexta fazenda (de terminação, nas
bordas do Pantanal) já estava em processo de certificação com recursos próprios e não foi
analisada. Em termos de ciclo produtivo total, esta seria a fazenda onde os animais seriam
engordados e que daria escala de comercialização ao grupo. A Tabela 2.10 apresenta algumas
características das propriedades que fizeram parte da iniciativa.
8
Valores teóricos, uma vez que não existiam fazendas operando com pecuária de corte orgânica, mas que
estavam sendo verificados na fazenda recém certificada. Segundo CI-Brasil (2003), a transformação do
sistema convencional para o orgânico no Pantanal determina uma queda média de 3% na produtividade no
primeiro ano.
65
de venda de cada categoria animal de cada propriedade foi adicionado um prêmio de 10%, baseado
na oferta real de mercado9, após a certificação das fazendas (a partir do terceiro ano).
Uma análise de sensibilidade, realizada a partir da variação nos custos (-10%, -5%, 5% e
10%) e no prêmio (entre 0% e 25%, a intervalos de 5%) em relação aos resultados do projeto base,
indicou que os resultados são válidos para uma elevação de até 10% nos custos, para todas as
fazendas. Em cada fazenda, o sistema é viável com os prêmios mínimos indicados na Tabela 2.11.
O prêmio de 10% (utilizado como referência na análise em função da oferta real do mercado) torna
o sistema orgânico igualmente rentável em relação ao convencional em quatro das cinco fazendas
analisadas. Entretanto, mesmo viável, a esse prêmio o sistema orgânico não é “atraente” para duas
das quatro fazendas (C e D), embora 10% seja praticamente o dobro do prêmio que iguala o
retorno gerado pelos dois sistemas para as fazendas B e F. O prêmio necessário para viabilizar a
fazenda E é de 21%, bem maior que nas demais fazendas. As autoras salientam que este fato é
9
Para conhecer o mercado interno de carne orgânica foi realizada uma pesquisa de mercado em São Paulo,
em abril de 2001 (Ribeiro et al., 2001).
66
decorrência da pequena escala de produção da fazenda, não sendo uma restrição do sistema
orgânico, mas de qualquer sistema pecuário que for desenvolvido com a mesma escala na
propriedade.
Fazendas
Indicadores
B C D E1 F
Taxa Interna de Retorno (%) 44,44 14,54 11,13 0,40 14,67
Payback (anos) 4 8 9 - 8
Valor Presente Líquido (R$) 227.919 20.792 27.057 -17.835 13.334
Taxa anual de desconto (%) 10 10 10 10 10
Prêmio mínimo viável (%) 4 9,5 9 21 4,5
Receita líquida por ha (R$/ha) 16,3 12,8 12,9 -2,5 4,1
Receita líquida por ha (US$/ha) 6,94 5,45 5,49 -1,06 1,74
Fonte: Ribeiro et al. (2001). Dólar médio em 2001 = R$ 2,30.
1
Projeto inviável.
Por outro lado, embora o prêmio mínimo possa ser alto (normalmente entre 20% e 25%),
verifica-se que o mercado só compra certos cortes, diluindo o prêmio total da carcaça, que em
termos finais é de 7%. Além disso, dificilmente essa remuneração beneficia a todos os elos da
cadeia produtiva (CI-Brasil, 2003; WWF-Brasil, 2005). O envolvimento dos supermercados,
interessados em atrair uma clientela de alta renda que consome produtos orgânicos, também pode
fazer com que o prêmio dos produtos orgânicos se reduza, pois estes comerciantes são capazes de
produzir suas próprias marcas, que tendem a ter preços menores que as marcas dos concorrentes
(Caleman et al., 2005).
67
C. Ecoturismo
Talvez muito mais do que ecoturismo, o termo adequado aqui fosse turismo rural, já que o
que se está procurando são atividades alternativas e/ou complementares de geração de renda para
os produtores rurais do Pantanal, com as demais características sendo compartilhadas pelos dois
tipos de turismo. Por exemplo, o ecoturismo requer, além da promoção do bem-estar social e
econômico local (geração de emprego e renda), o uso sustentável do patrimônio natural e a
integração das comunidades no processo, com respeito e valorização da sua cultura. O turismo
rural, por sua vez, também preconiza o desenvolvimento de atividades que promovam o patrimônio
cultural e natural das comunidades e a agregação de valor a produtos e serviços, além do
comprometimento com a produção agropecuária. Foi o aspecto do respeito e valorização da cultura
local, muito mais enfatizado no ecoturismo, que nos fez manter aqui o termo ecoturismo. Além
disso, esse aspecto nos induz a um modo particular de ecoturismo no Pantanal, muito mais ligado
ao estilo homestay, em hotéis-fazenda onde a hospitalidade local fica em evidência através do
atendimento e administração familiar, ao invés do ecoturismo mais sofisticado, com infra-estrutura
e serviços profissionais muito mais ligados ao modo de vida urbana.
No período de 1975 a 2000 o turismo no mundo cresceu a uma taxa média de 4,4% ao ano,
enquanto o crescimento médio mundial do PIB foi de 3,5% ao ano. Entre 1950 e 2004 as chegadas
internacionais cresceram em média 6,5% ao ano, alçando 846 milhões de turistas em 2006. Entre
1995 e 2006 a taxa de crescimento mundial no fluxo internacional de turistas foi de 4,1%, mas
cresceu mais entre 2003 e 2004 (9,9%), entre 2004 e 2006 (5,5%) e entre 2005 e 2006 (4,5%). A
atividade é responsável pela geração de 6% a 8% do total de empregos do mundo, segundo a
Organização Mundial do Turismo (OMT), sendo uma das atividades econômicas que demandam o
menor investimento para gerar trabalho. A OMT calcula que o turismo interno tenha um volume
dez vezes maior do que o internacional. A receita cambial do turismo internacional no mundo foi
estimada em US$ 733 bilhões em 2006 (OMT, 2004; Brasil, 2006; WTO, 2007a; 2007b).
turismo empregou quase 1,5 milhão de pessoas, e em 2005, quase 2 milhões, um crescimento de
28% em quatro anos. Entre 2003 e 2005 foram gerados pela atividade turística quase 800 mil
empregos formais e informais (Brasil, 2006). Assim, a atividade turística constitui alternativa capaz
de fomentar o crescimento e o desenvolvimento do país.
Apesar de ser uma atividade ainda emergente no Brasil, o ecoturismo tem demonstrado
vigor e crescimento intenso nos últimos anos (Salvati, 2002). A Empresa Brasileira de Turismo
(EMBRATUR) não tem dados específicos sobre este segmento do turismo e nem uma política
diferenciada para divulgá-lo no exterior. A empresa entende que as belezas naturais e a prática do
turismo sustentável devem integrar a promoção do turismo como um todo e não como um
segmento que mereça atenção diferenciada (Rosa et al., 2004). A opção “ecoturismo” só foi
69
inserida nas pesquisas da EMBRATUR como fator decisório da visita de turistas estrangeiros ao
Brasil nos anos de 2000 e 2001. Nesses anos, o percentual de viagens que tiveram motivação no
ecoturismo foi, respectivamente, de 14% e 13,2% do total de turistas (EMBRATUR, 2002), bem
superior aos índices internacionais, que oscilavam entre 2% e 5% do total de viagens. Para Rosa et
al. (2004) é provável que na pesquisa da EMBRATUR o quesito ecoturismo teria incluído também
qualquer forma de turismo em áreas naturais, que nem sempre pode ser qualificado de sustentável.
Janér (2005) afirma que não existem dados confiáveis demonstrando que as taxas de
crescimento do ecoturismo são maiores do que outros segmentos de turismo (como turismo de
aventura), razão pela qual não é possível confirmar as altas taxas de crescimento que lhe tem sido
atribuídas. Assegura, ainda, que quando se analisam essas taxas com mais cuidado percebe-se que
se referem mais ao crescimento de destinos específicos, que têm atrativos “ecoturísticos” durante
um período especifico. Não obstante, as estimativas da própria autora (Janér, 2005), com base nos
dados levantados pela EMBRATUR e previsões da OMT, mostram que o potencial para
crescimento do ecoturismo no Brasil é grande (ver Tabela 2.13). Mas para Paiva (2001), apesar das
vantagens brasileiras (dimensão territorial, diversidade de ambientes, rico patrimônio cultural,
fauna e flora diversa e abundante), o ecoturismo está longe de alcançar seu potencial no Brasil,
pois a atividade ainda encontra-se desordenada e desarticulada. Janér (2005) também alerta que o
potencial por ela estimado só será realizado mediante administração responsável e investimento
adequado.
Tabela 2.12 – Municípios brasileiros que fazem ou não parte de Pólo de Ecoturismo e que
incentivam ou não o turismo ecológico, 2002.
Município incentiva o Ecoturismo
Total
Não Sim
3.896 1.052
Não Nenhuma esfera de 4.948
Ecoturismo reconhecido
Município governo reconhece o
apenas pelo município
faz parte de ecoturismo
Pólo de 290 319
Ecoturismo
Sim Ecoturismo reconhecido Ecoturismo reconhecido 609
pelos governos federal e pelas três esferas de
estadual governo
Total 4.186 1.371
Fonte: Adaptado de Carvalho et al. (2006).
Janér (2005) estimou o tamanho do mercado para ecoturismo internacional no Brasil com
base no número de turistas dos principais mercados emissores (países selecionados) e nos destinos
visitados no Brasil ligados a atividades de ecoturismo (considerando a interpretação mais elástica
do conceito de ecoturismo). Esta informação está apresentada na Tabela 2.13. A demanda em 2002
71
foi estimada em 130 mil ecoturistas estrangeiros, com um potencial de crescimento de 14% até
2020.
Potencial de
Demanda Atual1 Crescimento
mercado2
Mercados Anual
2002 2020
# % # % % a.a.
EUA 32.000 5 369.000 20 17
Canadá 3.000 5 22.000 20 13
Alemanha 34.000 8 a 15 207.000 25 15
França 21.000 6 a 14 165.000 20 17
Inglaterra 13.000 6 a 12 125.000 25 18
Itália 13.000 4a6 48.000 18 10
Espanha 10.000 7 a 12 30.000 10 9
Japão 3.000 9 53.000 15 18
China nd - 19.000 5 -
Ecoturismo 130.000 1.300.000 14
Total Brasil 3,8 milhões 10,5 milhões 6
Fonte: Adaptado de Janér (2005).
1
Estimado pela EMBRATUR (2002) com base nos destinos visitados no Brasil pelos turistas
de cada país, e nas suas motivações. Os percentuais representam as estimativas do mercado de
ecoturismo em relação ao mercado total de turismo. Para a Alemanha, por exemplo, o mercado
atual de ecoturismo está entre 8% e 15% do mercado de turismo, representando, em média, 34
mil turistas. O potencial de mercado do ecoturismo para a Alemanha foi estimado em 25% do
mercado total, podendo chegar a 207 mil turistas.
2
Previsões da OMT para 2020.
nd = dados não disponíveis.
• Rio de Janeiro e São Paulo concentram mais de 90% da oferta de pacotes para ecoturismo;
• 85% das empresas entrevistadas dominam o conceito clássico de ecoturismo;
• Para 46% das empresas o ecoturismo representou 100% de suas vendas, 46% trabalham
somente com estrangeiros e 23% com estrangeiros e brasileiros;
• 11% dos quase 780 mil clientes brasileiros e 67% dos 78 mil turistas estrangeiros dessas
empresas eram ecoturistas;
• Pacotes individuais representam 26% do total e pacotes para grupos de até 10 pessoas,
42%;
• Os ecoturistas estrangeiros que visitam o Brasil caracterizam-se por possuir uma renda de
média a alta, segundo padrões internacionais, estão concentrados na faixa de 28 a 45 anos,
em sua maioria possuem escolaridade de nível superior e dão preferência para viajar
sozinhos ou em casais;
• Os principais destinos são a Amazônia, o Nordeste, Foz do Iguaçu, Rio de Janeiro e
Fernando de Noronha;
73
a) Turismo no Pantanal
O Pantanal como espaço para o turismo vem assumindo importância desde os fins da
década de 1970, particularmente pela aptidão pesqueira de seus rios (Brasil, 1977c; Garms, 1997).
Ao longo da década de 80, diversos investimentos em infra-estrutura foram realizados e a atividade
foi se estruturando quase que completamente voltada para o turismo de pesca. Esta modalidade foi
o principal atrativo turístico da região até o final dos anos 1990, quando a pesca esportiva entrou
em declínio (Catella, 2006). Atualmente (2007), a atividade turística no Pantanal vem se
desenvolvendo com ênfase em outros segmentos do turismo de natureza, como o ecoturismo, o
turismo rural e o turismo de aventura, além da pesca esportiva.
O turismo foi impulsionado por diversos fatores, mas seu desenvolvimento ocorreu de
forma desorganizada e sem qualquer planejamento e preocupação com os possíveis problemas
sociais e ambientais que poderia vir a causar (Brasil, 1977c). O desempenho do turismo na planície
pantaneira depende de vários fatores. Alguns desses fatores, relacionados à infra-estrutura, impõem
limitações indiretamente: ausência de saneamento básico, insuficiência de abastecimento de água,
falta de tratamento de esgotos e poluição hídrica. Outros atuam diretamente: falta coordenação
entre os planos turísticos nacionais, regionais e locais, ausência de planejamento integrado entre o
governo e o setor privado visando à conservação dos atrativos turísticos, interferência negativa do
turismo nas comunidades locais e nos ecossistemas regionais, etc. (Bordest et al., 1996).
74
O potencial para o turismo no Pantanal é enorme e seu valor turístico pode ser comparado
aos mais valorizados destinos do mundo, devido à abundância e diversidade de vida selvagem,
flora igualmente diversa e abundante, belas paisagens e variedade de ecossistemas, inúmeras
possibilidades em termos de atividades ao ar livre e uma cultura rural única (Campos, 2006).
Atualmente já é bem conhecido como um destino turístico, sendo “vendido” nas grandes cidades
brasileiras e em várias partes do mundo, particularmente para o turismo de natureza (ecoturismo,
turismo de aventura, turismo educacional, científico, rural, etc.). Entretanto, os esforços de
marketing são fragmentados e a qualidade do produto necessita melhorar a fim de torná-lo mais
competitivo com outros destinos no Brasil e internacionalmente. Apesar da grande potencialidade
como fonte de renda aos proprietários rurais (hotéis-fazenda), ainda não possui infra-estrutura
adequada para oferecer um serviço de qualidade. A forma peculiar como o Pantanal é divulgado, a
imagem que se vende dele e sua associação a um lugar paradisíaco, sagrado e primitivo, são
fundamentais para manter a região como um forte destino turístico (Rieder et al., 2001).
Moretti (2001) afirma que a modalidade ecoturismo é usada como proposta para o
desenvolvimento regional, mas contém em sua essência a manutenção do modelo de produção e
consumo da região pantaneira. Ele contesta a idéia do ecoturismo como uma solução para o uso
adequado de ambientes naturais, inclusive para sua conservação. Segundo Moretti (2001), o
ecoturismo é incapaz de cumprir as promessas a ele creditadas, de diminuição da pressão sobre os
recursos pesqueiros, de melhoria das condições de vida locais, do aumento da renda dos
empresários ligados ao setor, inclusive os fazendeiros tradicionais, etc. Embora no discurso as
várias noções de ecoturismo destaquem a melhoria das condições de vida da comunidade local, a
idéia de qualidade de vida é entendida a partir do desejo do turista e não das comunidades locais. E
a valorização da cultura do pantaneiro e do pescador só ocorre enquanto suprirem a necessidade
criada, sendo a cultura vendida como mais um atrativo, e que, como tal, deve ser organizada para
75
atender as expectativas do turista. Em conseqüência ocorre uma encenação da vida tradicional que
já não é mais a própria vida tradicional das pessoas, mas sim um espetáculo que é comprado pelos
ecoturistas. A venda da idéia de disponibilidade constante dos elementos naturais para
contemplação acarreta, inclusive, problemas gerenciais para as empresas de turismo, que precisam
utilizar artifícios para atrair e acostumar os animais selvagens (“fauna carismática”) a comparecer
em local e horários fixos para possibilitar o contato direto com os turistas. Por exemplo, a
construção de açudes em áreas onde a água é um recurso limitante no Pantanal quase sempre atrai
jacarés e capivaras, que ali se instalam permanentemente. A colocação de frutas, fubá e outros
alimentos para atração de pássaros é uma prática freqüente nos hotéis-fazenda do Pantanal. Dessa
forma a natureza é artificializada e seus complexos elementos, simplificados (Moretti, 2001).
Groom et al. (1991) indicam que a previsibilidade dos encontros com os animais é um dos
maiores problemas enfrentados pelas agências de turismo em roteiros envolvendo fauna silvestre,
podendo por si só determinar o sucesso ou o fracasso de uma atividade turística. Para Mourão et al.
(2006) a solução é deixar claro, no momento da venda do produto turístico, as limitações e
incertezas do encontro com espécies pouco freqüentes, lembrando que algumas espécies ocorrem
com maior freqüência em determinados tipos de ambientes, que tem horários de atividades
particulares que devem ser respeitados, etc. O manejo para aumentar localmente espécies de
interesse turístico, provocando mudanças no habitat que favoreçam o adensamento de populações
em locais de interesse turístico, é muitas vezes visto com desaprovação por alguns segmentos da
sociedade, pelas questões éticas subjacentes e pelos possíveis desequilíbrios ecológicos que pode
ocasionar.
A modalidade turística que mobiliza maior número de visitantes e que mais gera divisas
para os municípios do Pantanal, particularmente no Mato Grosso do Sul, é a pesca esportiva ou
recreativa. Esta modalidade de turismo estruturou-se para oferecer transporte, hospedagem,
alimentação e serviços especializados para o pescador esportivo (materiais de pesca, gelo, guias
capacitados, iscas-vivas, etc.), e consolidou-se na região, tornando-se a maior atividade de lazer da
planície pantaneira (Moraes e Seidl, 1998; Moraes e Espinoza, 2001). Entretanto, na maior parte
das vezes essa demanda foi satisfeita de forma improvisada, sem planejamento ambiental e sem
compromisso com os trabalhadores e a cultura regional. Diferentes tipos de alojamentos foram
instalados próximos aos principais rios, desde hotéis-pesqueiros e barcos-hotéis sofisticados, até
campings e ranchos de pesca totalmente destituídos de conforto, que atendem turistas dos mais
diversos padrões de renda. Embora esta estrutura, muitas vezes construída de forma apressada e
76
improvisada, possa atender às necessidades do turismo pesqueiro, nem sempre atende aos
interesses de outras modalidades de turismo, mais interessadas na cultura e na natureza, que
poderiam se desenvolver na região (Brasil, 1997c; Banducci Jr., 2001; Artioli, 2002). A própria
pesca profissional sofreu forte retração a partir dos anos 1980 e perdeu poder de pesca e espaço
político para o turismo de pesca (Catella, 2006). Com o tempo o número crescente de turistas
pescadores na região se constituiu em um forte concorrente, tanto para a pesca profissional quanto
para a pesca artesanal.
A pesca no Pantanal é anualmente proibida por três a quatro meses (novembro a janeiro ou
fevereiro) por causa da piracema (época de reprodução dos peixes), de modo que a infra-estrutura
da pesca esportiva fica inativa neste período, sendo este mais um ponto de estrangulamento do
turismo de pesca. Em levantamento efetuado no Pantanal de Mato Grosso do Sul em 1995, Garms
(1997) mostrou que o setor turístico pesqueiro contava com diferentes tipos de empreendimentos,
num total de 133 estabelecimentos e 40 barcos-hotéis, com uma capacidade total de 5.377 leitos e
10 barcos de passeio para o transporte de até 458 passageiros. Durante a época de piracema quase
toda essa estrutura fica ociosa. A época da piracema coincide com as férias escolares e festas de
fim de ano, o período mais popular para viagens no país. Embora o pensamento convencional nos
diga que quanto melhor a pesca, mais pescadores estarão dispostos a pagar para pescar, estudo de
Moraes e Seidl (1998), baseado em 480 entrevistas, revela que esses pescadores não estão
particularmente interessados na captura de peixes. A principal razão para o pescador esportivo
visitar o Pantanal sul foi o ambiente natural único e não a pesca. Enquanto aspectos diretos da
pesca esportiva (capturar muitos peixes, peixes grandes ou uma variedade de peixes) foram as
razões mais importantes para cerca de 1/3 dos pescadores, 2/3 citaram razões associadas com o
turismo ao ar livre de natureza mais geral. E independente do sucesso na captura, 22% dos
pescadores compraram peixes antes de retornar à sua região de origem. Isso sugere uma substancial
mudança nos tipos de serviços que a indústria da pesca esportiva pode oferecer. Se a indústria for
78
reorientada para proporcionar serviços para turistas voltados à natureza, mesmo se somente na
piracema, é de se esperar substanciais retornos com pouco investimento adicional. Além disso, o
nicho de mercado do turismo orientado para a natureza é o setor da indústria do turismo que mais
cresce no mundo. É necessário que os empresários que possuam investimentos substanciais em
infra-estrutura voltada para a pesca esportiva reconheçam esse nicho de mercado e utilizem a infra-
estrutura existente para a pesca esportiva, para atender a esse segmento (Moraes e Seidl, 1998).
Atrair essa nova clientela ou investir na recuperação dos clientes tradicionais afigura-se
como uma necessidade do setor. Mas para isso é preciso administrar os recursos pesqueiros como
parte de um ecossistema maior, antes do que como um recurso renovável para a pesca esportiva,
deixando de considerar esta indústria como distinta da natureza mais geral da indústria do turismo
na região. Para solucionar os atuais desafios, o setor, mais que incentivos, precisa de um
planejamento criterioso, envolvendo parcerias entre a iniciativa privada e o poder público, que
considere a capacidade de suporte do ambiente, as especificidades sociais das populações locais e
os requerimentos de mercado (adequação da infra-estrutura, treinamento de pessoal, etc.) (Moraes
e Seidl, 1998; Catella, 2006).
c) Ecoturismo no Pantanal
(63%), a flora (61%) e conhecer outros povos e culturas (53%). A pesca foi o quarto motivo mais
citado, com 35% das respostas, e as viagens a negócios receberam 10% das respostas (múltiplas
respostas). Resultados de Moraes e Seidl (1998) em pesquisa com os pescadores esportivos,
indicaram que a razão principal para visitar o Pantanal para 65% dos pescadores não era pegar
peixes, mas antes conhecer um lugar de beleza única e ver sua vida selvagem sem igual. Moraes
(2002) estimou que 11% dos empreendimentos turísticos da Estrada Parque Pantanal (em
Corumbá, MS), tinham como principal atividade o ecoturismo.
As informações sobre a demanda turística pelo Pantanal estão dispersas e não existe
continuidade na coleta desses dados (para comparações a longo prazo) nem estudos recentes que
revelem a qualidade dos serviços e o atendimento das expectativas dos turistas. Para se obter
estimativas é necessário recorrer a diversas fontes (levantamentos da EMBRATUR, estatísticas de
desembarque aéreo, informações sobre as taxas de ocupação dos hotéis, diagnósticos
sócioeconômicos e planos de desenvolvimento estaduais, etc.).
A demanda foi estimada com base em dados dos anos 2004 a 2006 da FIPE (1998; 2002;
2006; 2007), SEPLANCT (2004; 2006), Morente (2004), SEPLAN (2006), EMBRATUR (2006;
2007) e Francisco (2007). A EMBRATUR apresenta estatísticas sobre entrada de turistas
estrangeiros no Brasil, por unidade da federação, por via de acesso, por país de origem, etc., as
quais foram utilizadas nas estimativas. Dos resultados da FIPE (2007) obteve-se o percentual de
turistas estrangeiros que viajam a lazer, sendo excluídos os demais motivos (negócios, saúde,
estudo, etc.). Esses dados foram a base para estabelecer a demanda de estrangeiros. Para a demanda
doméstica foram consideradas a disponibilidade de leitos no Pantanal do Mato Grosso do Sul
(2.866 leitos) (Morente, 2004) e do Mato Grosso (2.585 leitos) (SEPLAN, 2006); a taxa de
ocupação nos hotéis de Mato Grosso do Sul (10-20%) (SEPLANCT, 2006), que também foi usada
para o Mato Grosso; e o tempo médio de estada no Pantanal Sul (3 noites) (Francisco, 2007), que
também foi usado para o Mato Grosso. Ao resultado (hóspedes estimados através dos leitos
disponíveis (número de camas disponíveis x 365), taxa ocupação e média de dias de estada) foi
aplicado um percentual de 27% (SEPLANCT, 2004) para distinguir entre turistas estrangeiros e
domésticos. O resultado está apresentado na Tabela 2.15.
Foi estimado que um total de 41 mil turistas estrangeiros, em média, visitou o Pantanal
motivados pelo lazer. Em 2006, do total de quase 50 mil turistas que cruzaram o Mato Grosso do
Sul via rodoviária, a grande maioria veio de países da América do Sul (89%) e o restante,
aproximadamente 5.300 estrangeiros, vieram dos outros continentes, principalmente da Europa
(4,8%), Oriente Médio (3,8%, crescendo quase 800% em relação a anos anteriores) e América do
Norte (1%) (EMBRATUR, 2006; 2007). Possivelmente muitos desses turistas (de países fora da
80
América do Sul) sejam mochileiros que atravessam da Bolívia e do Peru (Machu Pichu e Lago
Titicaca) para destinos brasileiros (Cataratas do Iguaçu e costa Atlântica). Corumbá é, inclusive,
um local muito conhecido no “circuito de mochileiros”.
Tabela 2.15 – Total de turistas que visitaram o Pantanal para lazer (média de 2004-2006).
Os dados acima também podem ser utilizados para estimar a oferta de acomodações no
Pantanal. Considerando a disponibilidade de leitos no Pantanal Sul (2.866) e Norte (2.585), a oferta
total chega a quase 2 milhões de leitos por ano, dos quais 53% estão no Pantanal sul. Supondo uma
ocupação de 50% a 70% e uma estada de três noites, essas regiões podem receber entre 330 mil e
465 mil turistas por ano.
d) Hotéis-Fazenda no Pantanal
A base do ecoturismo no Pantanal é a estadia em uma das muitas propriedades rurais, que
funcionam ao mesmo tempo como fazendas de pecuária e hotéis-fazendas. Algumas são bastante
sofisticadas (em termos de infra-estrutura, serviços profissionais e turismo responsável), mas a
maioria funciona ao estilo “homestay”, com atendimento e administração familiar, onde a sede da
fazenda foi adaptada para a recepção dos visitantes, e onde se mantém a autêntica hospitalidade
local. As pessoas que procuram esse tipo de hospedagem, em geral, entendem o conforto como
secundário à busca pela autenticidade de uma velha sede colonial, por exemplo (Silva et al.,
1998b). Para o Pantanal sul, estima-se que existam 1.670 leitos nesses hotéis-fazendas (Morente,
2004), o que significa, mantendo as suposições acima de ocupação e estada (50%-70%; 3 noites),
uma capacidade de receber entre 100 mil e 140 mil turistas por ano.
tipo de hotéis-fazenda funciona como um entrave na atração de um nicho de mercado que demanda
maior conforto e qualidade (em termos das acomodações e da experiência turística) e está disposto
a pagar mais por essas condições diferenciadas. A existência de mão-de-obra que fale outras
línguas além do português, ainda é uma deficiência, assim como bons guias especializados em
natureza e na cultura e história da região. E esse tipo de acomodação pouco utiliza as tecnologias e
processos recomendados pelas boas práticas do ecoturismo, tais como sistemas de depósitos de
dejetos, tecnologias eficientes de geração de energia e tratamento de água, etc. Embora muitos
fazendeiros no Pantanal sejam orientados para a conservação, práticas sustentáveis de turismo têm
sido pouco empregadas e necessitam ser mais difundidas.
Muitos hotéis-fazendas, pousadas e eco-lodges podem ser acessadas por via rodoviária o
ano todo, mas outros, devido ao alagamento, ficam isolados durante alguns meses do ano, só
podendo ser atingidos por pequenos aviões. Em muitos desses estabelecimentos com acesso por
estrada o ano todo, este acesso é precário, demandando longo tempo de trânsito, em geral acima de
3-4 horas na parte sul do Pantanal com veículo com tração nas quatros rodas. Esses problemas
logísticos afetam tanto o transporte de materiais e insumos às fazendas e pousadas quanto o
transporte dos próprios turistas, e implicam em maiores custos para todos, empresários de turismo,
pecuaristas e os próprios turistas. Por isso as classes A e B podem ser consideradas o mercado
potencial mais provável para o Pantanal (estimado em 1,1 milhão de pessoas – ver Tabela 2.14),
pois tem condições de renda capazes de cobrir as viagens de longa distância para chegar ao
Pantanal e os translados aéreos internos. Em algumas situações, chegar ao Pantanal pode ser mais
caro do que permanecer nele.
Além dos problemas gerais que afetam o turismo no Pantanal de um modo geral (infra-
estrutura deficiente, falta de capacitação da mão-de-obra, etc.), o ecoturismo tem seus próprios
problemas. Os esforços para promover o ecoturismo no Pantanal não são coordenados entre os
estados nem desenvolvidos em conjunto com os inúmeros agentes envolvidos. Não há estratégias
de marketing diferenciadas para os diferentes produtos, como por exemplo, hotéis-fazenda no
82
estilo “homestay” que atraem turistas que simplesmente querem conhecer um destino especial com
conforto, e as pousadas mais luxuosas que oferecem uma experiência exclusiva para classes de
renda alta. Além disso, essas estratégias devem sempre ter em vista que o foco principal é construir
uma imagem do Pantanal como um destino único, em termos de beleza, vida selvagem, etc.,
explorando adequadamente esses pontos fortes, e promovendo o destino como um todo e não o
produto ou o negócio individual de cada empresário. Sinergias com programas de conservação e
projetos de desenvolvimento sustentado (como produção de carne orgânica, mel orgânico e vitelo
pantaneiro), assim como a forte ligação da população tradicional do Pantanal com a terra e sua
cultura, são oportunidades que precisam ser mais bem exploradas (Tocantins et al., 2006).
Alguns desses problemas (como infra-estrutura básica) já estão sendo tratados por
investimentos públicos e a recente criação do Ministério do Turismo garantiu um orçamento para o
setor de turismo antes fragmentado. Mas os empresários também precisam de financiamento,
principalmente os hotéis-fazenda (ver, abaixo, o estudo de Espindola et al., 2002), para melhor a
qualidade de seus produtos. A burocracia e as altas taxas de juros têm dificultado o acesso desses
empresários ao crédito, muito embora existam linhas específicas para o turismo (Fundo
Constitucional do Centro-Oeste – FCO e FCO-ProNatureza, por exemplo) (Tocantins et al., 2006).
Para o Pantanal, quaisquer programas, projetos e linhas de crédito devem ser integrativos, e mesmo
nos casos em que haja necessidade de um enfoque pontual, não devem prescindir da visão de
conjunto e do todo no qual se insere o Pantanal (Tocantins et al., 2006).
Silva et al. (1998b) argumentam que do ponto de vista da geração de renda complementar
às atividades agropecuárias, o turismo em áreas rurais têm se mostrado uma opção muito restrita.
Primeiro porque a sua possibilidade abarca um universo muito reduzido das propriedades rurais
brasileiras que comportam atrativos naturais singulares, embora este não seja o caso do Pantanal.
Segunda e fundamental razão, porque as rendas geradas pelo ecoturismo em geral pouco
beneficiam as populações dos locais onde essas atividades se desenvolvem, especialmente as
residentes nas zonas rurais, ficando concentrada nos agentes dos centros urbanos que intermediam
essas atividades e em empreendimentos externos como, por exemplo, nos serviços de transporte e
hospedagem.
magnitude dos custos associados à predação. As atitudes dos pecuaristas foram exploradas usando
uma série de declarações sobre o assunto, por meio de entrevistas usando um questionário
estruturado, e as respostas, em termos de concordância às declarações (fortemente negativa,
negativa, incerta, positiva, fortemente positiva), foram registradas em uma escala de cinco pontos
(escala de Likert). As respostas de cada questão foram codificadas de 0 a 4 (fortemente negativa,
negativa, etc.) e os códigos somados para criar um escore combinado de 0 a 24, com os maiores
escores indicando uma atitude geral mais positiva em relação às onças. As relações entre as
atitudes individuais e as variáveis explicativas foram investigadas por meio de análise bivariada e a
combinação de variáveis explicativas que melhor predizem o escore geral de atitudes foi analisada
através de regressão linear múltipla (stepwise).
Um aspecto investigado por Zimmermann et al. (2005) foi a atitude dos pecuaristas em
relação aos benefícios que a onça proporciona através do turismo. Os resultados mostram que 20%
dos 50 fazendeiros entrevistados “concordam fortemente” com a declaração “eu me beneficio
diretamente do turismo”, e 20% “concordam fortemente” com a declaração “o turismo não é
prejudicial ao meu estilo de vida e tradições”. Assim, pode-se considerar que o percentual de
proprietários potencialmente interessados em “converter” suas fazendas para hotéis-fazenda é de
20%.
O desenvolvimento do turismo no Pantanal continua sendo uma faca de dois gumes com
relação ao ambiente natural. Os moradores locais estão crescentemente cientes e orgulhosos do
valor da sua rica herança natural e o governo local investe em infra-estrutura e treinamento para
favorecer o desenvolvimento do turismo. Porém, alguns problemas também crescem: a má
deposição de lixo e dejetos; o comércio de animais silvestres e produtos de vida selvagem; a pesca
extrativa (predatória) por turistas pescadores. A vocação turística do Pantanal está relacionada com
suas características ambientais. Assim, é fundamental que se realizem investimentos que
85
Cenários
Parâmetros
1 (atual) 2 3 4 5 6
Inv. em benfeitorias Não Sim Sim Sim Sim Sim
Compra da fazenda Não Não Não Sim Sim Sim
Taxa de ocupação Mantida Mantida Aument. Mantida Aument. Aument.
Proporção de hóspedes Mantida Mantida Alterada Mantida Alterada Alterada
Inv. em marketing Não Não Sim Não Não Sim
Inv. em capacitação Não Não Sim Não Não Sim
Tarifas Mantidas Mantidas Mantidas Mantidas Reduzidas Mantidas
VPL (US$ mil) 131 -266 0 -2.786 -2.110 -2.189
1
Fluxo anual (US$ mil) (15) 31 0 327 248 257
Fonte: Elaborada a partir de Espindola et al. (2002).
1
Fluxo anual para que o VPL = 0 (para viabilizar o empreendimento).
Tabela 2.17 – Valores dos parâmetros nos diferentes cenários e resultados da análise de custo-
benefício de empreendimento ecoturístico em fazenda do Pantanal.
Cenários
Parâmetros
1 2 3 4 5 6
Taxa de ocupação (%) 41 41 47 41 50 47
Hóspede turista (%) 29 29 35 29 35 35
Hóspede pesquisador (%) 71 71 65 71 65 65
Gasto com marketing 1 0 0 10 0 0 10
Gasto com capacitação 1 0 0 5 0 0 5
Invest. em benfeitorias 2 0 500 500 500 500 500
Gasto médio/turista 3 86 86 86 86 78 86
Gasto médio/pesquisador 3 26 26 26 26 24 26
Taxa de desconto (%) 10 10 10 10 10 10
VPL (US$ mil) (20 anos) 131 - 266 0 - 2.786 - 2.110 - 2.189
Fluxo anual (US$ mil) 4 (15) 31 0 327 248 257
Fonte: Adaptado de Espindola et al. (2002).
1
Em US$ mil/ano.
2
Em US$ mil nos primeiros quatro anos.
3
Em US$/pessoa/dia.
4
Fluxo anual para que VPL = 0.
Nota: Taxa de ocupação para VPL = 0 no cenário 1 (atual) = 38,5%; no cenário 2 = 47,7%. No cenário 3 a taxa de
ocupação que viabiliza o empreendimento também é 47%, mas nesse caso a proporção de hóspedes turistas (que
gastam em média 30% a mais que os hóspedes pesquisadores) aumenta em 20%.
86
A. Produtos Madeireiros
Há uma grande variedade de produtos e subprodutos que tem a madeira como fonte
principal de matéria-prima. Os usos tradicionais da madeira são a produção de celulose, papel,
carvão vegetal, lenha e chapas de fibras. Usos ditos mais nobres da madeira incluem a produção de
móveis e artefatos de decoração e para construção civil. Os usos energéticos tradicionais da
madeira compreendem a produção de carvão vegetal e usos domiciliar, industrial e agrícola. A
FAO classifica o uso e comércio de produtos madeireiros em lenha/carvão, madeira serrada,
madeira em tora, painéis, madeira em polpa e papel e papelão (Macqueen, 2004; FAO, 2007).
Dados da FAO (2007) sugerem que em 2005 cerca de 1,8 bilhão de m3 de madeira foi
extraída das florestas para lenha e conversão em carvão. A produção de lenha (woodfuel) também
teve comportamento semelhante ao do total global de madeiras: cresceu de 1961 a 1989, teve
pequena redução de 1990 a 1994 e voltou a crescer a partir de então, atingindo o valor máximo em
2005. Embora mais da metade do volume total de madeira mundialmente consumida para todas as
finalidades seja consumida na forma de lenha, a participação relativa da lenha sobre o total
reduziu-se gradativamente nos últimos anos, de 54% em 1996 para 51% em 2005. A Ásia responde
por 43% da produção mundial de lenha, a África por aproximadamente 31% e a América do Sul
por 15% (FAO, 2007).
Dois tipos de uso da madeira precisam ser distinguidos: comercial e não comercial.
Considerando que a madeira é comercializada, seu valor econômico, em princípio, deveria ser fácil
de calcular, mas na prática há muitos problemas para determinar este valor: por exemplo, os preços
“ex-forest” de um tronco se referem ao preço recebido pela venda a um processador; os custos de
transporte são altamente variáveis e difíceis de obter; o valor do estoque de madeira (“valor de
stumpage”), dado pelo máximo que um concessionário estaria disposto a pagar pela concessão de
uma área de floresta, também é difícil de encontrar. O valor do comércio mundial de todos os
produtos madeireiros está na ordem de US$ 120 bilhões (SCBD, 2001). A lenha e o carvão
dificilmente são comercializados internacionalmente e por isso não são considerados itens de
comércio. Para todas as categorias de produtos florestais, o comércio global está crescendo mais
rápido do que a produção (Macqueen, 2004).
A madeira é usualmente o produto mais valioso das florestas, de modo que os processos
para sua produção tendem a influenciar todas as outras decisões de manejo das florestas,
particularmente em países em desenvolvimento. Nestes países, a maximização das receitas da
produção de madeira normalmente dirige as decisões de manejo (Lampietti e Dixon, 1995).
89
Pearce et al. (2001) argumentam que o manejo sustentável envolve custos mais altos, por
exemplo, para evitar dano ao estoque de árvores não comerciais. Em um levantamento de práticas
silviculturais sustentáveis, Pearce et al. (2001) concluíram que o manejo sustentável para extração
de madeira é menos lucrativo que a extração não sustentável. Isso ocorre pelo efeito das taxas de
desconto sobre a rentabilidade das práticas sustentáveis: quanto maior a taxa de desconto, menor o
valor de mercado atribuído hoje aos rendimentos futuros, de modo que extrair o máximo no menor
tempo possível, gerará mais renda a curto prazo do que as práticas sustentáveis. O resultado geral é
que o mercado só vai favorecer as práticas sustentáveis se os benefícios não madeireiros das áreas
manejadas (incluindo os serviços ambientais) exceder a perda de lucro relativa à extração
convencional (não sustentável) – o que pode ser possível se o seqüestro de carbono for incluído
entre os benefícios. Gram et al. (2001) também afirmam que os custos associados com as práticas
sustentáveis podem tornar o manejo sustentável não competitivo.
Na mesma linha de argumentação, Rice et al. (2001) mostram que as práticas sustentáveis
não são competitivas com outros regimes de extração e mesmo com outros usos da terra. Segundo
esses autores, praticamente nenhum sistema de extração em florestas nativas tropicais pode ser
considerado sustentável. Os esforços políticos não têm conseguido torná-lo uma opção mais
atrativa porque, ao mesmo tempo em que aumentam sua lucratividade, aumentam também a
lucratividade dos sistemas convencionais. Outros fatores que justificam o pouco uso dos sistemas
sustentáveis são o baixo crescimento das árvores, o modesto aumento nos preços, e as altas taxas
de juros, particularmente no Brasil. Assim os retornos dos sistemas sustentáveis são usualmente
menores do que os sistemas convencionais, e as companhias madeireiras não investem naqueles
sistemas. Mesmo que os sistemas sustentáveis fossem financeiramente viáveis, raramente se
justificam em termos conservacionistas, e mesmo que fossem ambientalmente preferíveis, não
estão entre os métodos mais custo-efetivos para alcançar objetivos de conservação.
Por outro lado, Homma (1993), tratando sobre o extrativismo vegetal na Amazônia,
menciona que se estabeleceu uma síndrome extrativa em nível mundial, em que há uma falsa
suposição considerando os produtos madeireiros como sendo não sustentáveis. Pelo fato de que as
práticas de manejo ideais do ponto de vista biológico nem sempre apresentam viabilidade
90
econômica, a extração de grandes estoques de forma racional e sustentada nem sempre é possível;
assim, a domesticação de muitos produtos extrativos pode ser melhor para a conservação dos
recursos naturais. Além disso, a grande maioria da população rural não tem aspirações pessoais
para dedicar sua vida somente às atividades extrativas. Por essas razões, pode ser temerário
considerar as atividades extrativas como opção para áreas não desmatadas.
Já Macqueen (2004) argumenta que o contexto do manejo florestal brasileiro mudou muito
durante a última década, passando de uma situação onde o padrão dominante eram atividades
florestais ilegais praticadas em áreas de florestas privadas (80% de toda a produção), para um
regime baseado no desmatamento legalizado em áreas de assentamentos agrícolas (75% de toda a
produção), sem qualquer planejamento de longo prazo, o que poderá gerar implicações negativas
nas reservas florestais.
Seidl et al. (2001) basearam suas estimativas de prevalência biológica, biomassa, taxas de
crescimento, custos de produção (inclusive custos de transporte), características dos produtos e
preços recebidos na literatura existente, em observações de três áreas experimentais (30 quadrantes
em cada área) e em entrevistas com proprietários de serrarias, fazendeiros e marceneiros locais.
Cenários sustentáveis bem definidos de corte e colheita foram calculados para cada espécie, com
base em três taxas de crescimento (baixa, média e alta), e considerando: a altura média esperada, o
diâmetro, o número de árvores, a biomassa arbórea, a taxa de reposição, o número de anos para
atingir o tamanho de mercado, os rendimentos brutos, os custos e os lucros previstos por espécie,
por árvore, por hectare e por tipo de fitofisionomia. Geralmente, os retornos estimados foram
menores do que o custo de oportunidade da área ocupada com pastagem. Os autores concluíram
que as principais restrições para a extração economicamente sustentável da madeira no Pantanal
são o isolamento (distância dos mercados), a falta de infra-estrutura (alto custo do transporte do
produto bruto e inexistência de indústrias para beneficiamento da madeira) e a baixa taxa de
crescimento da maioria das espécies arbóreas com potencial comercial em relação ao custo de
oportunidade do capital.
Os resultados de Seidl et al. (2001) indicam que uma boa infra-estrutura aumenta a
distância de transporte economicamente viável em até seis vezes. Assim, dependendo da qualidade
da rodovia, pode ser economicamente viável o transporte de árvores do interior do Pantanal para
distâncias de até 700 km para a maioria das espécies, e de até 1.800 km para as espécies mais
valorizadas. Mas não há uma boa infra-estrutura rodoviária na região. Há uma única rodovia
pavimentada na região, e mesmo assim, nos limites extremos do Pantanal, circundando-o pelo sul,
leste e norte. Dentro do Pantanal praticamente não há estradas, apenas trilhas, muitas só acessíveis
na estação seca, de modo que o transporte fluvial é a única alternativa na estação das águas. Desse
modo, a maioria das fazendas está fora da zona economicamente possível para o comércio de
madeira com a atual infra-estrutura. A infra-estrutura de transportes é uma das restrições mais
freqüentemente citadas para todos os tipos de atividade econômica dentro do Pantanal. Além disso,
melhorar a infra-estrutura de transportes no interior do Pantanal pode ter conseqüências negativas
para o ecossistema e para a vida silvestre, por exemplo.
Seidl et al. (1998b) estimaram o retorno anual das pastagens cultivadas na pecuária do
Pantanal em R$ 200,00/ha. Os retornos sustentáveis estimados da extração de madeira encontrados
por Seidl et al. (2001) geralmente foram menores do que o custo de oportunidade das pastagens
cultivadas: apenas quatro das 13 espécies estudadas tem retornos superiores, uma em área de
cerradão e quatro em áreas de mata. Assim, a extração de espécies madeireiras não é competitiva
com a pecuária, pois apresenta menores retornos esperados aos fazendeiros, sendo compatível com
a pecuária somente como uma renda suplementar em áreas de mata e cerradão. Se as únicas
alternativas econômicas de uma dada área de terra forem a extração sustentável de madeira e a
pecuária, então as áreas florestadas provavelmente serão convertidas em pastagens.
94
O aumento da demanda internacional por ferro e aço tem feito crescer a pressão pelo
desmatamento, para fornecimento de carvão vegetal, causando grande consumo de matas nativas
brasileiras (Agência EFE, 2005; Pinto, 2007). No Brasil, muitas siderúrgicas empregam o carvão
vegetal como agente redutor na conversão de minério em ferro e aço. Para a produção de uma
tonelada de ferro-gusa são necessários 875 kg de carvão vegetal, que por sua vez, requer a
utilização de pelo menos 2.600 kg de madeira seca, implicando no desmatamento de uma área de
pelo menos 600 m2 se a lenha se originar de matas nativas (Monteiro et al., 2006). Em 2006 o
Brasil produziu 35,1 milhões de metros cúbicos de carvão vegetal, sendo que 50% foram de
florestas nativas. Os maiores produtores são os Estados de Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará
e Espírito Santo. A atual produção de carvão no Mato Grosso do Sul é de cerca de 2 milhões de
metros cúbicos, dos quais 1,3 milhão de metros cúbicos consumidos por Minas Gerais (Hess,
2007). O carvão vegetal também é contrabandeado do Paraguai e da Bolívia, representando riscos
de conflitos com esses países vizinhos (Agência EFE, 2005; Sampaio, 2007).
Em 2004, devido à alta dos preços de ferro-gusa (US$ 235,00 a tonelada em dezembro de
2004), a demanda e os preços do carvão vegetal elevaram-se de forma expressiva. Os preços do
carvão vegetal tiveram uma elevação de 460%, passando de US$ 51,00 a tonelada em janeiro para
US$ 121,00 a tonelada em dezembro. A demanda por carvão vegetal cresceu tanto que as
siderúrgicas não conseguiram comprovar junto ao IBAMA a procedência de mais de 5,4 milhões
de m3 de madeira em 2003 e mais de 2,7 milhões de m3 em 2004, mesmo tendo recorrido a
artifícios para mascarar sua origem (Monteiro et al., 2006). Por isso a produção de carvão vegetal
destinada ao abastecimento das siderúrgicas tem sido considerada um sistema relevante nas
mudanças no espaço amazônico, através do desmatamento. Além disso, tal sistema não pode ser
95
Até agora (2007) essas siderúrgicas não revelaram de onde exatamente virá o carvão
vegetal que necessitarão para alcançar suas metas industriais. A MMX firmou um Termo de
Compromisso e Conduta com o Ministério Público Estadual de que não comprará carvão oriundo
do Pantanal, mas está em seu EIA-RIMA (Estudo e Relatório de Impacto Ambiental) que fará
parcerias com fazendas em diversas regiões do Estado, incluindo regiões pertencentes ao Pantanal.
Do total de 225 mil toneladas/ano de carvão vegetal necessários para atender suas metas, a MMX
vai produzir apenas 10%, em reflorestamentos de eucaliptos, que garante não serão feitos no
Pantanal, nem em suas bordas (Oliveira, 2006; Pinheiro, 2006; Hess, 2007). Já a Sideruna informa
em seu Relatório de Impacto Ambiental que a demanda por carvão vegetal, que consumirá 261.800
96
Mas não existe, no Brasil, nenhuma lei que impeça o uso de matas nativas para a produção
de carvão vegetal. Pelo Código Florestal Brasileiro retirar a madeira não é ilegal, desde que o
fornecedor tenha licença para desmatar, que não derrube árvores de áreas protegidas ou acima do
limite de 20% (área que cada propriedade deve preservar) (Corrêa e Oliveira, 2005; Vieira, 2005).
Quanto às siderúrgicas, cabe ao IBAMA verificar se elas estão cumprindo o que determina a
legislação: compensar os desmatamentos com reflorestamento, replantando a mesma quantidade de
árvores retiradas para a extração do carvão vegetal, verificar se as carvoarias são cadastradas e se
há autorização para o transporte da madeira (Miranda e Mathias, 2005; Copetti, 2006).
A imprensa tem noticiado bastante a questão das carvoarias no Pantanal. Segundo Corrêa e
Oliveira (2005), Miranda e Mathias (2005), Vieira (2005) e Tubino (2007), as carvoarias avançam
no Pantanal do Mato Grosso do Sul, em municípios como Miranda, Porto Murtinho, Aquidauana e
Anastácio, devido à escassez da matéria-prima nas zonas tradicionais – Ribas do Rio Pardo (ex-
capital do carvão), Água Clara e Três Lagoas, todas a leste do Pantanal. Os proprietários rurais do
Pantanal estariam contratando carvoeiros para desmatar áreas para a formação de pastagens. Nessa
97
Até julho de 2005 não havia no Mato Grosso do Sul uma legislação que regulamentasse as
atividades das carvoarias; era apenas necessário um cadastro no IBAMA. Em julho de 2005 a
SEMA baixou uma resolução para regularizar as carvoarias e instituiu um programa de
licenciamento ambiental mais rígido, mas muitas carvoarias estavam tendo dificuldades para se
licenciar (Corrêa e Oliveira, 2005). Segundo Tubino (2007), no Mato Grosso funciona um mercado
que vende carvão de mata nativa, com notas de carvão de área reflorestada ou plantada.
Em Corumbá, Miranda e Aquidauana tem sido encontrados fornos no meio das matas,
próximos a baías (lagoas) e aos rios Miranda e Aquidauana e em áreas de morro (Corrêa e Oliveira,
2005; Vieira, 2005). Corrêa e Oliveira (2005) relatam que uma única carvoaria, próxima de
Aquidauana e localizada em área de Pantanal, possuía 246 fornos, empregava 106 pessoas e
produzia 3.000 m3 de madeira (suficientes para carregar 30 carretas). Durante dois anos, parte da
98
produção veio de áreas desmatadas (1.700 ha) de uma das fazendas da região. A produção vai para
siderúrgicas de Mato Grosso do Sul e Minas Gerais. Em 2005, uma tonelada de carvão custava R$
45,00 e segundo Tubino (2007) não aumentou muito desde então, porque a oferta é muito grande.
Godoy e Lubowski (1992) e Godoy et al. (1993) fizeram uma revisão de vários estudos
que estimaram o valor econômico dos PFNM, com o objetivo de identificar as diferenças
metodológicas e os erros responsáveis pela grande variação nos valores encontrados na literatura.
Eles discutem os principais problemas encontrados e sugerem diretrizes para realizar tais estudos,
de modo a garantir maior confiança nos resultados e permitir uma comparação entre os mesmos.
Lampietti e Dixon (1995) compararam os resultados de estudos em países desenvolvidos e em
desenvolvimento. A revisão feita por Pearce (1998) teve como objetivo principal verificar se o
valor dos PFNM justifica, em termos econômicos, a conservação de florestas. Esses últimos
autores dividem os valores dos PFNM em valores extrativos, não extrativos e de preservação. Mais
recentemente, Neumann e Hirsch (2000), SCBD (2001) e Gram (2001) também revisaram vários
estudos, com os primeiros autores tratando principalmente dos PFNM comercializáveis (produtos
para o mercado). As considerações de Godoy e Lubowski (1992) e Godoy et al. (1993) foram
referendadas nestas novas revisões de literatura e acrescidas de outras reflexões importantes.
a) Incompatibilidade dos resultados. Os valores líquidos por hectare variam amplamente: entre
US$ 1,00/ha/ano e US$ 420,00/ha/ano. Mesmo quando os estudos tratam do mesmo bem e são
realizados no mesmo tempo e lugar, as avaliações produzem resultados diferentes. Essas diferenças
de resultado são explicadas principalmente:
100
b) Tendência a examinar principalmente flora, com poucos estudos sobre a fauna extraída e quase
nenhum sobre o valor econômico combinado de plantas e animais (Godoy e Lubowski, 1992;
Godoy et al., 1993).
c) Poucos estudos discutem a sustentabilidade das práticas extrativas, de modo que muitas vezes o
que está sendo comparado pode bem ser opções não sustentáveis de uso da terra (Godoy e
Lubowski, 1992; Godoy et al., 1993; SCBD, 2001). Além disso, estimar o valor econômico dos
PFNM em um ponto do tempo também deixa sem resposta a questão da sustentabilidade da
atividade (Godoy e Lubowski, 1992; Godoy et al., 1993).
d) Há uma multiplicidade de custos nas atividades de extração e comercialização dos PFNM, tais
como os custos de coleta (trabalho), de materiais usados na coleta e processamento, e de transporte,
que raramente têm sido totalmente quantificados nos estudos, e que podem ser elevados (Godoy e
Lubowski, 1992; Godoy et al., 1993; Neumann e Hirsch, 2000). Também tem sido
sistematicamente desconsideradas as perdas pós-colheita (SCBD, 2001).
101
e) Os estudos em geral não definem se os valores em questão se referem aos estoques de bens e
serviços (a quantidade na floresta, ou inventário), ao seu fluxo potencial se explorados
eficazmente, ou ao seu fluxo atual (a quantidade usada pelas pessoas) (Godoy e Lubowski, 1992;
Godoy et al., 1993; SCBD, 2001).
f) Poucos estudos mediram as proporções em que os PFNM vão para o uso e para o mercado, uma
distinção importante, já que devem ser valorados de forma diferente (Godoy e Lubowski, 1992;
Godoy et al., 1993).
g) Alguns estudos informam rendas e outros rendas líquidas (exclusive o trabalho e outros custos),
de modo que também neste aspecto os estudos variam (SCBD, 2001).
h) Os estudos de valoração baseados na renda atual recebida indicam que a extração e venda de
PFNM são muito significantes em regiões tropicais aos níveis domiciliar, de comunidade e
nacional (Neumann e Hirsch, 2000), mas nem todos os autores concordam com isso (Gram, 2001).
i) Atribuir preços aos PFNM na ausência de um mercado pode ser muito especulativo (Neumann e
Hirsch, 2000). O fato de que os preços vão cair em um mundo hipotético em que toda a floresta foi
explorada para extrair os PFNM, tem sido ignorado na maioria dos estudos (SCBD, 2001).
A Tabela 2.19 sumariza os resultados dos principais estudos realizados com relação aos
PFNM e a Tabela 2.20, os resultados de estudos realizados para caça em países desenvolvidos.
O que fica claro dos estudos revisados é que, enquanto há um crescente entendimento e
aceitação da importância econômica dos PFNM, especialmente para os pobres, não é fácil chegar a
conclusões gerais e fazer comparações entre os estudos devido à utilização de diferentes métodos e
procedimentos de valoração (Neumann e Hirsch, 2000; SCBD, 2001; Gram, 2001). Além disso, as
diretrizes apresentadas por autores como Godoy e Lubowski (1992) e Godoy et al. (1993) para
realizar tais estudos, não tem sido seguidas, de modo que os resultados continuam variando
amplamente (para uma exceção, ver Gram et al., 2001). Assim, o conhecimento atual sobre a
importância dos PFNM parece estar baseado em alicerces dúbios.
102
Tabela 2.19 – Levantamento de estudos do valor econômico líquido dos produtos florestais
não madeireiros (US$/ha/ano) (continua).
Valor líquido
Local Produtos e Comentários Fonte
(US$/ha/ano)
Vários países 0,30 – 3,20 Fauna somente. Bennett e Robinson
(2000)
Venezuela 0,75 Captura experimental de jacaré Thorbjamarson (1991)
(caiman).
Parque Nacional 1,06 Valor presente líquido dos Ruitenbeek (1988) e
Korup, Camarões benefícios brutos perdidos da caça Infield (1988)
($2,70) a uma taxa de desconto de
5%; área = 126.000 ha; caça
considerada não sustentável
Sinharaja, Sri Lanka 2,00 Fauna (caça) Batagoda (1997)
Santuário 3,00 0,02 elefantes domesticados/ha a Sukumar (1989)
Mudumalal, US$ 1.500/elefante. Exclui custos da
Sul da Índia domesticação e treinamento; taxa de
desconto de 10%.
Floresta Ituri, Zaire 0,50 – 3,18 318 kg de caça/km2 em floresta Wilkie (1989), Wilkie
primária ou 50 kg/km2 em floresta e Currant (1991)
em clímax a US$ 1/kg. Estimativa
livre de custos.
Mantândia, 4,00 Fauna e flora. Kramer et al. (1995)
Madagascar
Amazônia, Brasil 4,80 Retorno bruto/ha/ano para flora Schwartzman (1989)
somente.
Turquia 5,00 Fauna e flora. Bann (1998)
Tabela 2.19 – Levantamento de estudos do valor econômico líquido dos produtos florestais
não madeireiros (US$/ha/ano) (conclusão).
Valor líquido
Local Produtos e Comentários Fonte
(US$/ha/ano)
Iquitos, Peru 20,00 Valor potencial de seis espécies de Pinedo-Vazquez,
frutas e látex. Zarin e Jipp (1992)
Planície alagável, 21,00 Flora; implementos e artefatos Bojö (1993)
Zimbábue (artesanato) de madeira.
Iquitos, Peru 16,00 – 22,00 Parcialmente baseado em anotações Padoch e de Jong
da comunidade; flora somente. (1989)
Vietnam 27,00 – 55,00 Flora: bambu, plantas medicinais, Mai et al. (1999)
lenha, forragem, junco, alimentícias.
Nepal 33,00 – 115,00 Forragem. Houghton e
Mendelsohn (1996)
Belize 36,00 – 166,00 Plantas medicinais; taxa de desconto Balick e Mendelsohn
de 5%. (1992)
Hantana, Sri Lanka 50,00 50 famílias aleatoriamente Abeygunawardena e
escolhidas e entrevistadas em três Wickramasinghe
vilarejos; abordagem usada: (1991)
valoração contingente e custo de
oportunidade; a estimativa exclui os
custos de extração; flora somente.
Kalimantan, 53,00 O valor presente líquido do junco Godoy e Feaw (1989)
Indonésia cultivado é US$ 52/ha/ano durante
25 anos, com uma taxa real de
desconto de 10%.
Amazônia, Brasil 59,00 Inclui amêndoas, carvão e farinha de Anderson, May e
palma de babaçu; não fica claro se é Balick (1991)
valor líquido ou bruto.
Amazônia, 77,00 – 180,00 Flora (várias parcelas). Grimes et al. (1994)
Equador
Ilhas Combu, Rio 79,00 $3.171/ano/família; média de 5 Anderson e Ioris
Guamá, Brasil famílias em 1984-1988. Estima o (1992)
valor bruto e só inclui cacau semi-
selvagem, açaí e borracha. Assume
que uma família trabalhe 40 ha de
floresta.
Tamilnadu, 80,00 Lenha e carvão. Appasamy (1993)
Índia
Brasil 97,00 Valor da castanha de caju somente Mori (1992)
($/ha); preços: do coletor = $97; do
exportador = $176; varejo = $1059.
Pará, Brasil 110,00 Valor após desbaste seletivo dos Anderson (1990b)
competidores e poda da palmeira
açaí.
Veracruz, México 116,00 Flora, excluindo madeira e café. Alcorn (1989)
Amazônia, Equador 120,00 Valores da vida selvagem em 500 Paucar e Gardner
km2. (1981)
Índia 117,00 – 144,00 Benefícios brutos; inclui frutas, Chopra (1993)
ervas e plantas medicinais.
Jenaro Herrera, 167,00 Camu-camu selvagem somente; não Peters (1989)
Peru está claro se é valor líquido ou bruto.
Sinharaja, 186,00 Flora. Valor potencial. Batagoda (1997)
Sri Lanka
Sinharaja, Sri Lanka 377,00 Árvores, trepadeiras e herbáceas. Batagoda (1997)
Estoque dos bens.
Iquitos, Peru 420,00 Valores do inventário em 1 ha; flora Peters, Gentry e
somente. Mendelsohn (1989)
Fonte: Adaptado de Godoy e Lubowski (1992), Godoy et al. (1993) e SCBD (2001).
104
Por outro lado, argumentos anteriores de que o valor dos PFNM (mais extração sustentável
de madeira) poderia exceder aqueles da conversão de florestas para outros usos, tais como o de
Peters et al. (1989), têm sido desacreditados devido a problemas metodológicos nesses estudos
(Gram et al., 2001) e por resultados de pesquisas mais recentes (SCBD, 2001). Pearce (1998)
mostra que os valores de muitos PFNM têm sido exagerados na literatura, e que tais valores só
podem justificar a conservação de florestas em um número limitado de casos. Homma (1993)
também considera que as atividades extrativas não podem ser consideradas como opção para
conservar áreas florestadas.
O impacto potencial dos PFNM comercializados também precisa ser melhor entendido,
pois as comunidades para as quais esses produtos parecem ser mais importantes, freqüentemente
não têm o conhecimento, nem o capital ou o direito legal que lhes permitam explorar
comercialmente esses produtos quando aparecem oportunidades de mercado. Outros atores sociais,
que detém o conhecimento, as redes comerciais e as concessões dos produtos, é que geralmente se
apropriam da maior parte dos benefícios da comercialização dos PFNM (Neumann e Hirsch, 2000).
Assim, a tese que propõe a exploração de PFNM comercializáveis como uma solução para a
pobreza e a conservação das florestas (“rainforest crunch thesis”), tem sido colocada à prova, pois
de fato quem se beneficia nem sempre são as comunidades mais pobres que fazem uso das florestas
(Dove, 1993).
105
Com base na revisão que realizaram em 24 estudos, Godoy et al. (1993) sugerem um valor
médio para os PFNM de cerca de US$ 50,00/ha/ano, mesmo valor sugerido por Pearce (1998),
enquanto que Lampietti e Dixon (1995) sugerem um valor de cerca de US$ 70,00/ha/ano. Tais
valores provavelmente não são competitivos com muitos valores de conversão da terra para outros
usos. A extrapolação desse valor “de base” para toda a floresta, como já ficou claro na revisão
acima, pode constituir um sério erro. Certamente há situações em que valores maiores serão
obtidos, assim como em muitos casos tais valores poderão exagerar as receitas líquidas.
Normalmente, valores mais altos estão relacionados aos produtos facilmente acessíveis, enquanto
valores mais baixos, com produtos relativamente inacessíveis, devido aos custos de acesso,
extração e transporte (SCBD, 2001).
Rieder et al. (2001) afirmam que os locais anteriormente acessíveis para extração de
PFNM (flora e fauna) perto das cidades que margeiam o Pantanal perderam progressivamente suas
riquezas. Schwenk e da Silva (2001) também argumentam que em determinados ambientes do
Pantanal muitos recursos naturais de uso cotidiano (em particular a vegetação) estão esgotados ou
em via de esgotamento pela pressão de uso. Schwenk e da Silva (2001) observam que em certos
locais do Pantanal onde a extração de PFNM é relevante, como em comunidades de origem
indígena mais ou menos isoladas (mas já aculturadas), muitas espécies consideradas de grande uso
ou valor econômico, estão desaparecendo pela pressão de extração. Em comparação com áreas
próximas com menor intensidade de uso, essas áreas têm menor número de indivíduos e menor
quantidade de espécies.
106
Entretanto, a literatura (Olsen, 1997; Homma, 1993) tem mostrado que a extinção
econômica (quando os custos de coleta excedem o valor dos benefícios) impede a extinção
botânica. Se o custo marginal de oferecer um PFNM particular sobe abruptamente com o passar do
tempo, se espera uma variedade de reações possíveis antes que a depleção do recurso ou a extinção
ocorram. Como Homma (1993) mostra, se os retornos da coleta de uma espécie permanecem
competitivos durante certo tempo e a disponibilidade diminui significativamente, a espécie fica
sujeita à domesticação e/ou cultivo, à substituição através de produtos semelhantes, ou à
substituição através de sintéticos industriais. Homma (1993) afirma que a domesticação de muitos
produtos extrativos pode evitar a pressão de extração, significando melhor conservação desses
recursos naturais. Mas para Neumann e Hirsch (2000), as possibilidades de domesticação variam
muito entre os diferentes PFNM.
Amorozo (2002) acredita que as mudanças nos padrões de uso local dos ambientes naturais
do norte do Pantanal irão, a médio prazo, acarretar uma diminuição na disponibilidade de plantas
nativas para fins medicinais, diminuindo seu uso na maioria das comunidades rurais. Para
Amorozo (2002), os fatores que contribuem para que haja perda de espécies de valor terapêutico e
de informações sobre elas no norte do Pantanal são: a destruição de habitats, para formação de
pastagens ou uso urbano; a inacessibilidade devido à apropriação e cercamento das terras por
estranhos às comunidades; o maior acesso a cuidados institucionalizados de saúde (novas opções
de cuidados com a saúde); e a modernização, que provoca desvalorização da cultura local e reforça
a tendência à perda ou abandono de práticas tradicionais. Esta autora sugere que à medida que as
comunidades tradicionais vão se expondo mais à sociedade nacional, o conhecimento acerca do
uso de plantas medicinais sofre um acréscimo, por aporte externo (maior contato e conhecimento
sobre espécies exóticas). Mas que quando este processo se aprofunda, as comunidades tendem a
restringir o uso às espécies cultivadas e invasoras cosmopolitas, por fatores decorrentes de
mudanças sócioeconômicas.
subprodutos (couro, óleos, penas e ovos, por exemplo), e com a possível exceção da capivara,
todas têm, também, mercado nacional e internacional. A capivara é comprada viva a duas vezes o
preço da arroba do boi. Criações extensivas conjuntas de capivaras e bovinos atestam uma
produtividade mínima de carne (kg/ha/ano) seis vezes maior para as capivaras (Paula e Silva Neto,
2006). Um exemplo de sucesso é a Cooperativa dos Criadores de Jacarés do Pantanal, em Cáceres
(MT), que cria 35 mil jacarés e tem um frigorífico com capacidade de abate de 100 animais/dia
(SEBRAE-MT, 2006).
Entretanto, a renda potencial dos produtos florestais nem sempre pode ser facilmente
apropriada. Tipicamente, os mercados locais de tais produtos comercializam baixos volumes e são
facilmente sujeitos a condições de excesso de oferta. Os custos de transporte normalmente são altos
e a renda econômica gerada muitas vezes vai para fora da região de produção (Seidl et al., 2001).
Além disso, a maior parte da população rural não tem aspirações pessoais para se dedicar somente
às atividades extrativas (Homma, 1993). E o argumento comum de preservar pelo potencial para
descoberta de novos produtos farmacêuticos provavelmente não dá motivação suficiente por si
mesmo para que os pantaneiros conservem o habitat. Além disso, as habilidades requeridas para
desenvolver mercados nacionais e internacionais e estabelecer canais de comercialização, assim
como o conhecimento dos mercados, são escassas no Pantanal, de modo que explorar novos
mercados (e mesmo mercados nacionais e internacionais existentes) provavelmente irá requerer
investimento significativo. Há, ainda, barreiras regulatórias que persistem, e um histórico de caça
ilegal mal visto pela opinião pública e prejudicial à eficiência dessas alternativas (Gowdy, 1997).
Finalmente, mesmo quando fluxos de caixa são gerados através da criação de mercados, nem todo
o valor econômico pode ser apropriado e pode haver impactos culturais e ambientais não
pretendidos (SCBD, 2001). Assim, muitos dos usos identificados no Pantanal são principalmente
hipotéticos.
Gram et. al (2001) mostram, com base na experiência das florestas tropicais amazônicas,
que é uma estratégia arriscada concentrar os esforços de desenvolvimento em um ou poucos
produtos comerciais. Segundo esses autores, a história dos produtos comerciais extraídos das
florestas tropicais latino-americanas mostra um padrão de aumento e queda, com a extração e
comercialização em larga escala seguida por um colapso devido a sobre-exploração ou competição
de produtos sintéticos ou plantações.
Outros fatores, específicos do Pantanal, também sugerem que o valor econômico por
hectare dos PFNM no Pantanal é baixo. Por exemplo, a grande maioria da população que vive no
interior do Pantanal é constituída por trabalhadores que cuidam do gado, assalariados (com o
salário freqüentemente incluindo outras formas de pagamento, como alimentação, moradia e
108
participação na produção – ver Seção 5.1.1.J), e, portanto, menos dependentes dos recursos da
floresta. Assim, os PFNM tendem a ser pouco importantes em termos de participação percentual na
renda das famílias pantaneiras, com a possível exceção da pesca para populações ribeirinhas, pois
os peões não costumam pescar. Como a densidade populacional dentro do Pantanal é baixa (menor
que 1 hab/km2, segundo o IBGE (2005))10, o valor agregado por hectare também tende a ser
pequeno. Certamente o emprego de plantas nativas, principalmente com fins medicinais (e
veterinários), ainda é parte importante do cotidiano de muitas comunidades pantaneiras, mas
muitos medicamentos industriais estão disponíveis às famílias rurais diretamente nas fazendas, pois
os proprietários mantêm “estoques” de uma variedade de produtos não produzidos nas fazendas (os
chamados armazéns das fazendas). Outra atividade extrativa que provavelmente também vai
continuar sendo importante no cotidiano dos peões é a caça ao porco monteiro.
A pesca é uma possível exceção (podendo ser importante tanto em termos de renda quanto
de subsistência), mas está restrita às populações e comunidades que vivem próximas aos rios e
outros corpos de água, pois é fato notório que os peões quase não comem peixe e, portanto, pouco
pescam. A literatura revisada indica baixos valores por hectare para a extração da fauna em geral,
embora com poucos estudos específicos para a pesca (ver Tabela 2.19). Gram et al. (2001),
entretanto, em um estudo sobre a importância econômica da fauna (caça e pesca) e flora (PFNM e
madeireiros) em populações ribeirinhas de planícies de inundação da Amazônia Peruana,
encontraram que os produtos para subsistência, especialmente a pesca, compõe uma grande parte
da economia local: cerca de 62% do valor total dos produtos extrativos por família.
Catella (2001) estimou o desembarque médio anual total de pescado na Bacia do Alto
Paraguai em Mato Grosso do Sul, no período de 1994 a 1999, em 1.415 toneladas, sendo ¼ da
produção (330 toneladas) capturada pelos pescadores profissionais artesanais e ¾ (1.086 toneladas)
10
Silva et al. (2001) calcularam a densidade demográfica da área fisiográfica do Pantanal nos anos de 1975,
1980 e 1985 em aproximadamente 0,2 hab/km2. Em 2007, Mato Grosso era o terceiro estado brasileiro com
menor densidade demográfica (3,2 hab/km2), e Mato Grosso do Sul, o oitavo (6,4 hab/km2) (IBGE, 2007b).
109
D. Ecoturismo
Doan (2000) estudou os impactos que o ecoturismo tem sobre comunidades locais, a
economia e o meio ambiente em 62 locais do mundo onde se pratica ecoturismo, usando escala
multidimensional e testes de Critério de Pontuação Proporcional. O objetivo foi identificar os
principais fatores que afetam a sustentabilidade e o sucesso de projetos de ecoturismo. Os critérios
incluíram: apoio financeiro para conservação (sim/não/acima de um percentual); emprego para os
residentes (0%-100%); atitudes locais para conservação (negativa, positiva, ambivalente); atitudes
locais em relação ao turismo; desintegração cultural (pequena, total, sobre a tradição, sobre a
hospitalidade, etc.); status ecológico da área; e status de proteção da área. A grande vantagem da
metodologia é que ela é capaz de sintetizar diferentes tipos de dados (análises de custo-benefício,
valoração contingente, estudos de disposição a pagar, levantamentos de atitudes, e investigações
biológicas) em uma forma facilmente compreensível. Além disso, a metodologia permite
comparação com outros projetos de ecoturismo e pode ser aplicada sob condições variadas e em
períodos de tempo seqüenciais. O autor mostra que os projetos de ecoturismo podem se beneficiar
do uso daqueles critérios para medir quantitativamente seu status em termos de serem instrumentos
para o desenvolvimento sustentável.
Turismo rural, arqueológico (Peixoto e Boeira, 1996) e ecoturismo (Bordest et al., 1996;
Coutinho et al., 1997; Gowdy 1997; Geist 1994) podem servir como incentivos econômicos para a
conservação do Pantanal. O beneficio econômico total da proteção da vida selvagem nos parques
nacionais dos Estados Unidos foi estimado por Geist (1994) em mais de US$ 70 bilhões. Costanza
et al. (1997) estimaram um valor de US$ 574/ha/ano para as atividades recreativas em áreas
110
úmidas da terra e US$ 491/ha/ano em planícies alagáveis. Moraes e Seidl (1998) calcularam que os
46.000 pescadores esportivos que visitaram o Pantanal sul em 1995 gastaram US$ 36 milhões.
Além disso, a razão principal para as viagens desses pescadores não era pegar peixes grandes,
muitos peixes ou peixes raros ou exóticos; o principal fator motivador foi experimentar o ambiente
natural sem igual do Pantanal, incluindo a observação da vida selvagem. Isso indica um grande
potencial para o turismo voltado à natureza, incluindo ecoturismo. Mas o desenvolvimento do
ecoturismo no Pantanal sofre dos mesmos fatores limitantes potenciais do turismo mais geral (falta
de planejamento, fraca infra-estrutura de comunicação, falta de tratamento de água e esgoto
sanitário, mão-de-obra pouco treinada, etc.) (Bordest et al., 1996).
O valor da pesca esportiva no Pantanal brasileiro foi medido por Shrestha et al. (2002)
usando o método do custo de viagem. Um dos objetivos foi fornecer argumentos econômicos para
o processo de valoração, ao captar valores de não-mercado dos serviços do ecossistema Pantanal.
O estudo mostra que o bem-estar social total (medido pelo excedente do consumidor) devido à
pesca esportiva no Pantanal brasileiro varia de US$ 35,10 a US$ 56,40 milhões (em dólares de
1994). Foram estimados modelos de demanda por viagens de pesca esportiva usando uma
variedade de especificações: linear, não linear, Poisson, Poisson truncado, binomial negativo e
binomial negativo truncado. Os modelos com melhor performance foram os modelos de mínimos
quadrados não lineares, Poisson truncado e binomial negativo truncado. No geral, os sinais e a
significância dos coeficientes estimados foram consistentes com a teoria econômica e com estudos
de recreação anteriores. Com base na performance dos modelos, foram derivadas estimativas do
excedente do consumidor. Os pescadores esportivos registraram um alto prêmio de preço pela
oportunidade de pescar no Pantanal, variando de US$ 86,35 a US$ 138,91 por dia, em média. Esse
excedente é muito mais alto que as estimativas médias encontradas em estudos anteriores. Por
exemplo, em estudo realizado nos Estados Unidos, Loomis et al. (1999) calcularam o valor da
pesca recreativa em US$ 32,83 por dia por pessoa (em dólares de 1996), usando meta-análise.
Entre vários estudos de pesca esportiva feitos em outros países que não os Estados Unidos,
Shrestha e Loomis (2001) registram que Kerr (1996), na Nova Zelândia, estimou um valor entre
US$ 34,45 a US$ 69,97 por dia por pescador (em dólares de 1986). O valor mais alto do excedente
do consumidor encontrado no Pantanal está influenciado por valores de não-uso que os pescadores
experimentam por estarem em um lugar único como o Pantanal; e é consistente com o maior valor
da recreação ao ar livre (24%) encontrado em ecossistemas selecionados do mundo, quando
comparados com os excedentes médios do consumidor calculados para os Estados Unidos
(Shrestha e Loomis, 2001).
111
O valor total anual dos bens e serviços do ecossistema para o Pantanal brasileiro (sub-
região da Nhecolândia) estimado por Seidl e Moraes (2000) foi de cerca de US$ 15,64 bilhões ou
US$ 5 milhões por residente, aproximadamente a metade do valor calculado por Costanza et al.
(1997). Essa diferença foi atribuída ao maior conhecimento da heterogeneidade biofísica regional,
principalmente mais seca, que não puderam ser captadas pela escala global dos cálculos de
Costanza et al. (1997). Estes autores consideraram uma paisagem homogênea de áreas alagadas,
presumivelmente continuamente inundadas, enquanto que Seidl e Moraes (2000) consideraram
uma estação seca de aproximadamente oito meses na Nhecolândia. Embora os dados locais tenham
diminuído a contribuição total do Pantanal para os serviços globais do ecossistema para
aproximadamente a metade, a magnitude dos valores é surpreendente para uma região onde as
pessoas em geral são muito pobres (salário mínimo menor que US$ 100) e onde o valor de troca
das terras com pastagens variam entre US$ 100 e US$ 300 por hectare.
A contribuição relativa dos diferentes serviços para o valor total estimado é apresentada na
Tabela 2.21. Os serviços de oferta de água e controle de distúrbios contribuem com cerca de 2/3 do
valor total anual estimado por hectare, aproximadamente US$ 2.000 e US$ 1.750, respectivamente.
Tratamento de dejetos, valor cultural e regulação de água contribuem cada um com valores
substanciais, entre 6% e 9% do total (aproximadamente US$ 500, US$ 425 e US$ 380
respectivamente). Ciclagem de nutrientes, recreação e habitat dão uma contribuição menor ao valor
total anual (entre 1,5% e 3%), com os demais serviços (nove categorias) respondendo pelos quase
6% restantes.
112
Tabela 2.21 – Valor dos serviços anuais do ecossistema estimados para o Pantanal da Nhecolândia.
Kling (1993) sugere que os valores de opção provavelmente são pequenos em comparação
com os valores de uso, porque tais valores podem ser considerados como uma medida de aversão
ao risco, isto é, uma aversão a não ter disponível o bem ou serviço em questão no futuro. Esta
autora, com base em estudos de demanda por recreação, sugere que os valores de opção estão entre
3% e 4% do valor de uso. Já Chopra (1993) estima o valor de opção com sendo 16% do valor de
uso, se a taxa de preferência temporal pura (6%) for considerada como a taxa de desconto. O valor
de opção (assim como o valor de existência) se relaciona principalmente ao valor que os
ecossistemas têm no contexto global e se tornam significantes quando a degradação acelerada
começa a destruir os recursos que esses ecossistemas possuem.
Não foram encontrados estudos empíricos que objetivassem calcular ou obter o valor de
opção para o Pantanal na literatura revisada.
dada pela quantia que as empresas, pessoas e instituições doam para manter o Pantanal conservado
para o futuro (RPPNs, Gordon and Betty Moore Foundation para a CI-Brasil adquirir a Fazenda
Rio Negro, etc.).
Horton et al. (2002) testaram a aplicação do método de valoração contingente para bens
distantes de importância global, avaliando a disposição a pagar de ingleses e italianos (não
usuários) para implementação de programas de conservação (áreas protegidas) na Amazônia
brasileira. O enfoque principal da pesquisa foi a riqueza de biodiversidade na região a ser protegida
e os serviços do ecossistema oferecidos por tal área. A disposição média a pagar por família por
ano para custear a implementação de um programa de proteção que cobrisse 5% da Amazônia
brasileira foi de US$ 45,60 e para cobrir 20%, de US$ 59,28, para os dois países juntos. Agregando
entre as famílias, um fundo anual para conservar 5% da Amazônia com áreas protegidas poderia
render US$ 912 milhões em cada país. Embora os respondentes tenham mostrado um alto grau de
incerteza no processo de decisão dos lances devido ao bem ser tão pouco conhecido e distante
(trazendo questionamentos sobre a validade e confiabilidade dos resultados), as respostas foram
não aleatórias e sistematicamente relacionadas às características sócioeconômicas e às variáveis
comportamentais. Assim, os autores postulam que iniciativas visando transferências financeiras
internacionais de países ricos para apoiar a proteção de áreas ameaçadas de importância global
poderiam ter amplo apoio nesses países.
O método de valoração contingente foi aplicado ao Pantanal por Moran e Moraes (2002)
para estimar o valor de uso e de existência que visitantes da parte sul do Pantanal atribuem à
conservação desse ecossistema. O estudo teve o propósito de explorar a adequação do método para
captar o valor econômico total do Pantanal. Foram usadas várias formas de eliciação dos valores de
disposição a pagar e processos econométricos de estimação. O cenário focalizou valores de não-
uso relativos a um ecossistema sadio e poluição da água (danos potenciais ao ecossistema
decorrentes de atividades agrícolas e mineração: assoreamento dos rios, lançamento de mercúrio
pelo garimpo do ouro, etc.). Por ser um estudo pioneiro, em âmbito nacional, e porque até o
momento parece ser o único trabalho de valoração contingente realizado com certo rigor para um
ecossistema brasileiro dessa abrangência (Seroa da Motta, 1998), o estudo será considerado com
mais detalhe a seguir.
Diferentes formas de eliciação dos valores de disposição a pagar foram utilizadas: lances
livres, dicotômica simples e dicotômica dupla (referendo com acompanhamento). Na pesquisa de
lances livres, foram usados dois veículos de pagamento, a licença anual de pesca e o lacre (um
pagamento obrigatório que permite ao pescador levar o peixe para fora da região). Os valores de
disposição obtidos na pesquisa aberta foram usados para definir os intervalos de lances para a
115
Tabela 2.22 – Cenários de agregação para o Pantanal de Mato Grosso do Sul resultantes do uso do
método de valoração contingente (disposição média anual a pagar em milhares de dólares).
Embora salientando os problemas teóricos e práticos que surgem quando este método é
aplicado a um ecossistema complexo como o Pantanal, os resultados mostram que há um
considerável valor de não-mercado ligado ao ambiente desta região. O estudo seguiu protocolo de
valoração contingente e parece ser consistente com o que a teoria da demanda pode dizer sobre
relações de quantidade e preço. Usando o critério proposto por Kanninen (1995) para avaliar os
erros e a variância do estimador, o modelo tem boa performance, apesar de um vetor de lances
pouco ortodoxo, e as médias estimadas podem ser propostas com confiança. Entre as dificuldades
encontradas estão a natureza do cenário apresentado aos respondentes, a seleção apropriada da
amostra e a subseqüente agregação das respostas de disposição a pagar, e o tratamento estatístico
dos dados de escolha discreta. As conclusões do estudo salientam a limitação cognitiva dos
métodos de preferência expressa quando tratando com mudanças ambientais altamente incertas e a
ausência de testes objetivos daquilo que os respondentes valoram (para testar exatamente o que os
respondentes estavam valorando).
CAPITULO 3
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA:
ANÁLISE DE CUSTO-BENEFÍCIO E VALORAÇÃO DO MEIO AMBIENTE
Muitas das mudanças políticas no mundo real criam conflitos de interesse. Por exemplo, se
uma floresta que é usada como uma área recreativa é desmatada, os proprietários da floresta irão
ganhar, enquanto que os visitantes da área ou aqueles preocupados com a sobrevivência de
espécies ameaçadas, irão perder. Apesar disso, uma decisão deve ser tomada: se a floresta deve ou
não ser cortada. O tomador de decisão deve, implícita ou explicitamente, transformar todos os
valores para uma única "dimensão" para compará-los (análise social). Somente então ele pode
decidir se ou não o valor da madeira excede o valor da floresta preservada. A forma econômica de
realizar esta transformação é tentar expressar todas as mudanças na utilidade em termos
monetários. Esta é a essência da análise de custo-benefício social. Uma vez que todos os custos e
benefícios tenham sido expressos em unidades monetárias, a lucratividade social pode ser
estabelecida (Per-Olov, 1993). Assim, a análise social de custo-benefício visa atribuir um valor
social a todos os efeitos de um determinado projeto, investimento ou política. Os efeitos negativos
são tratados como custos e os positivos, como benefícios, e tudo é expresso em uma medida
comum, geralmente, em termos monetários. A análise de custo-benefício é a técnica econômica
mais utilizada para a determinação de prioridades na avaliação de políticas públicas (Seroa da
Motta, 1998).
políticas ambientais são intrinsecamente corretas, é muito difícil evitar alguma forma de análise de
custo-benefício de uma política social (Hackett, 2001).
Como alguns bens e serviços públicos não são transacionados no mercado – e, portanto,
não há preços para revelar seu valor – deve-se usar uma forma de análise de custo-benefício em
que os valores sociais dos bens e serviços reflitam variações de bem-estar das pessoas e não
somente seus respectivos valores de mercado. Por exemplo, as áreas alagáveis usualmente são
consideradas de pouco valor e freqüentemente são drenadas para usos agrícolas. Mas os
ecossistemas dessas áreas desempenham muitas funções vitais: ciclagem de nutrientes, formação
do solo, controle do regime hidrológico, habitat para a fauna. Os economistas desenvolveram
vários métodos para estimar o valor monetário dessas funções e recursos ambientais, isto é,
determinar seu valor monetário em relação a outros bens e serviços da economia (Seroa da Motta,
1998; Hackett, 2001). Tais métodos, entretanto, apresentam limitações metodológicas,
particularmente aquelas relacionadas à determinação das taxas de desconto no tempo, à agregação
dos valores individuais, à internalização de incertezas e à amplitude das mudanças de equilíbrio
geral (Seroa da Motta et al., 1996).
O uso das regras de decisão da análise de custo-benefício tem sido muito criticado no
contexto de bens e serviços ambientais. As críticas incluem o problema de determinar a taxa social
de desconto, a dificuldade em considerar toda a complexidade dos ecossistemas, as limitações
metodológicas na mensuração dos valores monetários associados a benefícios ambientais
(incluindo os valores de existência e a identificação completa de todas as conseqüências), assim
como as criticas filosóficas da abordagem utilitária do bem-estar (Berrens et al., 1998).
119
Para Gen (2004), que fez uma meta-análise dos principais métodos de valoração ambiental,
a raiz do problema de aplicar a análise de custo-benefício em políticas que afetam o ambiente, está
em medir os custos e benefícios ambientais. Os valores monetários desses bens e serviços são
difíceis de medir porque muitos deles não são diretamente transacionados no mercado (não tem
preço de mercado); por causa das externalidades ambientais de muitas políticas públicas; e devido
às características de bens públicos ou ao menos de propriedade comum de muitos bens e serviços
ambientais (não excludentes e não rivais no consumo)11. Dessa forma, medidas precisas e acuradas
dos custos e benefícios de alternativas políticas seriam controversas. Este problema existe para
todos os tipos de bens e serviços ambientais não diretamente comercializados no mercado
(qualidade da água de rios e lagos, saúde dos ecossistemas, a existência de espécies ameaçadas,
etc.). Tais problemas também existem nos casos de avaliação de danos a recursos naturais ou de
desastres ambientais (e.g., o caso Exxon Valdez).
O uso desses métodos para medir os valores dos bens e serviços ambientais também foi
popularizado por sua utilidade em estudos de transferência de benefícios, entendida como
transferência de valores, especialmente valores ambientais, de uma situação para outra
(Desvousges et al., 1998; Gen, 2004). O método de transferência de benefícios usa os resultados de
estudos de valoração já realizados e implementados para seus propósitos e contextos específicos,
para avaliar escolhas políticas em outros contextos (Brookshire e Neill, 1992). Valores de uso
recreativo são relativamente fáceis de transferir. Por exemplo, os benefícios da pesca esportiva em
uma determinada região podem ser estimados pelo uso das medidas de valor de algum estudo de
pesca esportiva realizado em outra região (King et al., s.d.). A transferência de valores envolve
ajustamentos decorrentes das diferenças entre os estudos, e a literatura (Desvousges, et al., 1998) já
11
Não exclusão = uma vez que o bem ou serviço é oferecido, seus benefícios não podem ser limitados
somente aos consumidores que pagam por ele. Não-rival no consumo = o uso do bem ou serviço por um
consumidor não limita sua disponibilidade para outros. Além disso, muitos desses bens também têm a
característica de não permitir que o consumidor individual especifique seu nível de consumo (os
consumidores não podem, por exemplo, selecionar a qualidade do ar ao redor de suas casas ou ter muito
controle sobre ele).
120
determinou os procedimentos básicos para fazer esses ajustamentos nos valores. A aplicação do
método da transferência de benefícios envolve os seguintes passos: (King et al., s.d.; Gen, 2004):
Segundo Bergland et al. (1995), existem três estratégias para a realização de estudos de
transferência de benefícios: (a) transferência de valores unitários médios, que consiste na simples
transferência de medidas de bem-estar de um estudo para um novo contexto, sem quaisquer
ajustamentos; (b) transferência de valores unitários ajustados, onde o valor médio obtido no estudo
básico é ajustado às características do estudo em curso; e (c) transferência de funções de valor
econômico (ex. função geradora de visitas, função de preços hedônicos e outras). Rosenberger e
Phipps (2001) revisaram vários estudos para testar o desempenho relativo da transferência direta de
121
valor e da função de transferência de valor Segundo esses autores, as seguintes hipóteses são
importantes quando se usa uma função valor para transferir valores:
Existe um consenso de que o uso das funções de transferência de valor via meta-análise
tem um melhor desempenho que outras abordagens (Brander et al., 2006). Nesse caso, em geral se
empregam funções de transferência de valor estimadas através de uma meta-regressão. Entre as
vantagens, citam-se: é usada informação de um maior número de estudos; diferenças
metodológicas entre os estudos de valoração originais podem ser controladas; as variáveis
explicativas podem ser ajustadas para representar o novo local, isto é, diferenças nas características
físicas e sócioeconômicas entre os locais podem ser modeladas e controladas. Alguns estudos de
valoração de áreas alagáveis usando meta-análise e meta-regressões (função valor) serão revisados
na Seção 3.2.6.
A transferência de benefícios é muito usada quando é muito caro e/ou há pouco tempo
disponível para conduzir um estudo original de valoração, e é necessária alguma medida dos
benefícios (King et al., s.d.). Essa economia de tempo e dinheiro é a principal vantagem do
método, já que os estudos de valoração costumam ser muito caros e consomem muito tempo na
preparação e implementação. Além disso, o método é consistente com a teoria econômica, organiza
as relações subjacentes entre as variáveis (dando lógica à extrapolação dos valores) e pode ser
usado como uma ferramenta para determinar se estudos mais detalhados devem ser conduzidos. A
utilidade do método ultrapassou sua intenção original, como atesta o desenvolvimento e publicação
de vários bancos de dados especialmente elaborados para a transferência de benefícios, e que
registram os estudos de valoração realizados, suas conclusões e suas características demográficas e
metodológicas, e que podem ser usados por pesquisadores interessados em realizar estudos de
transferência de benefícios (Gen, 2004; Brander et al., 2006).
Mas algumas limitações dessas ferramentas são reconhecidas por este grupo. Freeman
(2003) concorda que a ética utilitária da economia do bem-estar está centrada no bem-estar
humano e que muitos valores ecocêntricos não podem ser adequadamente quantificados pela
123
análise de custo-benefício. Também reconhece que há outros critérios válidos para julgar políticas
ambientais que não a eficiência econômica, que os métodos de valoração precisam ser
aperfeiçoados e que são vulneráveis à manipulações (os contextos políticos nos quais as análises de
custo-benefício são realizadas podem influenciar seus resultados). Mesmo assim, tais proponentes
notam que medir os valores de bens e serviços ambientais tem ajudado de forma real em decisões
de política ambiental (p.ex., o caso do Exxon Valdez) (Gen, 2004).
(2004), esta última conclusão também foi encontrada em estudos de Giraud et al. (1999) e de
Johnston e Swallow (1999).
Neste trabalho é adotada visão coincidente com a dos proponentes, isto é, considera-se
válido medir o valor econômico dos bens e serviços ambientais e aplicar a análise de custo-
benefício às questões ambientais. Assim, utilizam-se resultados de estudos de valoração econômica
dos recursos naturais do Pantanal em nossas análises.
3.2.1. Introdução
s.d.). As medidas conceitualmente corretas para estimar benefícios econômicos são a propensão
individual a pagar e a propensão individual a aceitar compensação, como medidas do excedente do
consumidor (Pearce e Turner, 1990; Loomis e White, 1996). Tradicionalmente a estimação dos
benefícios é baseada na disposição a pagar. Mas em certos casos (como no de espécies ameaçadas),
a medida apropriada dos benefícios da preservação é a propensão a aceitar compensação (Bishop,
1978).
[...] [existem] três relações básicas de valor subjacentes à política e à ética adotadas na
sociedade: valores expressos via preferências individuais; valores de preferências
públicas, que encontram sua expressão via normas sociais; e valores funcionais do
ecossistema físico. Alguns analistas argumentam que as medidas de valor econômico
são específicas ao contexto em que os valores são atribuídos e podem, portanto, ser
inapropriadas como a única medida de valor para a alocação dos recursos públicos.
Ideologias ecocêntricas buscam basear a política em normas sociais que os indivíduos
aceitam como membros de uma comunidade (preferências públicas) e que são
operacionalizadas via legislação "social". A ecologia profunda advoga a colocação da
ênfase primária em uma distinção entre valor instrumental (expresso pelos valores
mantidos pelos humanos) e valor intrínseco, não relacionado às preferências. Eles
colocam atenção particular no argumento de que as funções e potenciais dos próprios
ecossistemas são uma rica fonte de valor intrínseco. [Onde valor intrínseco é
equivalente ao valor de existência dos economistas].
Os valores funcionais do ecossistema físico que Pearce e Turner (1990) referem no texto
acima decorrem dos processos físicos, químicos biológicos, ou dos atributos que contribuem para a
auto-manutenção de um ecossistema (como a proteção do solo, a estabilidade climática, a oferta de
habitat para vida selvagem ou a retenção de nutrientes). Já os serviços do ecossistema são os
resultados benéficos, para o ambiente natural ou para as pessoas, que resultam dessas funções do
ecossistema (como o controle da erosão, a oferta de água limpa ou as belezas cênicas). A fim de
que um ecossistema ofereça serviços aos humanos, é necessária alguma interação com os humanos,
ou pelo menos alguma apreciação pelos humanos. Assim, as funções do ecossistema são neutras de
valor, enquanto que seus serviços têm valor para a sociedade (Pearce e Turner, 1990; King et al.,
s.d.). Algumas das principais funções do ecossistema, bem como dos bens e serviços dela
decorrentes, são apresentadas na Tabela 3.2.
Pearce e Turner (1990) consideram que os ecossistemas têm três funções econômicas: (a) a
de proporcionar insumos para o sistema produtivo; (b) a de transformar dejetos das atividades
humanas e os converter em produtos não perigosos ou ecologicamente úteis, conhecida como
capacidade assimilativa do ambiente; e (c) a de oferecer utilidade diretamente na forma de prazer
estético e conforto espiritual. Essas três funções econômicas podem ser consideradas como
componentes de uma função geral dos ambientes naturais: a função de suporte à vida.
126
BENS E
FUNÇÕES DO ECOSSISTEMA EXEMPLOS
SERVIÇOS
1. Regulação de Regulação da composição química Balanço do CO2/O2, O3 para proteção
gás da atmosfera. contra raios UVB, e níveis de SOx.
2. Regulação do Regulação da temperatura global, Regulação dos gases do efeito estufa,
clima precipitação e outros processos produção de dimetilsulfeto que afeta a
biologicamente mediados a nível formação de nuvens.
global ou local.
3. Regulação de Capacitância, tamponamento e Proteção contra tormentas, controle de
distúrbios integridade da resposta do inundações, recuperação de secas e
ecossistema a flutuações ambientais. outros aspectos da resposta dos habitats
à variabilidade ambiental, controlada
principalmente pela estrutura vegetal.
4. Regulação de Regulação dos fluxos hidrológicos. Oferta de água para usos agrícola
água (irrigação) industrial (fábricas) ou para
transporte.
5. Oferta de água Armazenamento e retenção de água. Oferta de água por bacias hidrográficas,
reservatórios e aqüíferos.
6. Controle de Retenção de solos no ecossistema. Prevenção da perda de solo pelo vento,
erosão e retenção escorrimento superficial e outros
de sedimentos processo de remoção, armazenagem de
areia em lagos e áreas úmidas.
7. Formação de Processos de formação de solos. Decomposição de rochas e acumulação
solos de material orgânico.
Fixação de nitrogênio, fósforo, potássio
8. Ciclagem de Armazenagem, ciclagem interna,
e outros elementos ou ciclos de
nutrientes processamento e aquisição de
nutrientes.
nutrientes.
9. Tratamento de Recuperação de nutrientes móveis e Tratamento de resíduos, controle de
dejetos remoção ou quebra de nutrientes e poluição, detoxificação.
componentes xênicos em excesso
10. Polinização Movimento de gametas florais. Suporte a polinizadores para a
reprodução das populações de plantas.
11. Controle Regulação trofo-dinâmica das Controle das espécies de presas por
biológico populações. predadores-chave, redução da herbivoria
por predadores do topo da cadeia.
12. Refúgio Habitat para populações residentes e Berçários, habitats para espécies
migratórias. migratórias e locais, habitats para
espécies capturadas localmente ou
durante os períodos de inverno.
13. Produção de A porção da produção primária bruta Produção de pescado, caça, grãos,
alimentos extraída como alimento. sementes e frutas através da pesca, caça,
coleta e agricultura de subsistência.
14. Matérias A porção da produção primária bruta Produção de madeira, lenha ou
primas extraída como matéria prima. forragem.
Valores de não-uso derivam dos benefícios que o ambiente oferece e que não envolvem
uso em qualquer forma, direta ou indiretamente. É o valor intrínseco ou de existência, que reside
nos recursos ambientais independente de qualquer relação com os seres humanos. É o valor ou a
satisfação de saber que uma espécie ou habitat particular existe, mesmo se as pessoas nunca
planejam usá-lo, e cuja extinção ou destruição implica em uma sensação de perda (de Groot, 2006;
SCBD, 2001). Os valores de não-uso revelam a natureza multifacetada das motivações para
conservação, i.e., através de preocupações com as gerações futuras, com os “direitos” de outros
seres sencientes, etc. O valor de legado (aquele que a geração atual recebe por saber que a
preservação hoje garante a “oferta” desses bens às gerações futuras e poderão ser usados por elas) é
às vezes considerado como um valor de não-uso, mas trata-se essencialmente de um valor de uso
(valor de opção), embora pelas gerações futuras (Pearce e Turner, 1990).
Muitas outras classificações são utilizadas. Por exemplo, para caracterizar melhor os
recursos florestais Lampietti e Dixon (1995) usam três categorias: valor extrativo (ou consuntivo),
valor não extrativo (ou não consuntivo) e valor de preservação (que agruparia os valores de opção
e de existência).
valor econômico total (VET) se tornou uma abordagem amplamente usada para avaliar o valor
utilitário dos ecossistemas (de Groot, 2006). Note-se, entretanto, que a maioria dos métodos de
valoração não pretende medir o valor econômico total, mas apenas parte dele (Gen, 2004; Pearce e
Warford, 1993).
A Figura 3.1 mostra as curvas de oferta (custo marginal) e demanda (benefício marginal)
para um bem ou serviço típico comercializado no mercado. A área pbqc, preço de mercado p vezes
a quantidade q, é o valor de mercado. O custo de produção é a área debaixo da curva de oferta, cbq.
A área entre o preço de mercado e a curva de oferta, pbc, é o excedente do produtor ou renda
líquida. A área entre a curva de demanda e o preço de mercado, abp, é o excedente do consumidor
ou a quantia de bem-estar que o consumidor recebe sobre o preço pago no mercado. O valor
econômico total do recurso é a soma dos excedentes do produtor e consumidor (excluindo o custo
de produção), ou a área abc na figura (Costanza et al., 1997).
A Figura 3.1 se refere a um bem substituível feito pelos humanos. Como muitos serviços
do ecossistema só são substituíveis até certo ponto, suas curvas de demanda provavelmente se
parecem mais com a da Figura 3.2. Quando a quantidade disponível se aproxima de zero ou de
129
algum nível mínimo necessário do serviço, a demanda se aproxima do infinito, assim como o
excedente do consumidor e, por conseguinte, o valor econômico total também tende ao infinito.
Além disso, como os serviços do ecossistema não podem se aumentados ou diminuídos por ações
do sistema econômico, suas curvas de oferta são quase verticais, como mostrado na Figura 3.2.
impostos, monopólios, etc.) e também porque muitos valores não se refletem diretamente nos
preços de mercado, é necessário usar técnicas específicas de valoração, que como foi visto (Seção
3.1), têm suscitado amplo debate sobre sua validade (Barbier et al., 1996). Assim, as várias
percepções e definições de valor e valoração só podem ser captados pelos métodos de valoração
econômica até certo ponto, mas não são completamente captados por tais técnicas (de Groot,
2006). Além disso, cada método apresenta limitações em sua cobertura de valores, a qual, em geral
está associada ao grau de sofisticação metodológica e de dados exigida, as hipóteses sobre o
comportamento do consumidor e aos efeitos do uso do ambiente sobre os recursos e em outros
setores da economia. A adoção de cada método dependerá do objetivo da valoração, das hipóteses
assumidas, da disponibilidade de dados e do conhecimento da dinâmica ecológica daquilo que está
sendo valorado (Seroa da Motta, 1998). Também foi visto (Seção 3.2.1) que há muitos argumentos
convincentes que afirmam que a disposição a pagar (ou a aceitar compensação) não é o único
critério que serve de base para tomar decisões com respeito ao uso do ambiente (Barbier et al.,
1996).
É difícil definir de forma abrangente o que são áreas úmidas (ou áreas alagáveis,
humedales ou wetlands), pois abarcam uma grande variedade de ambientes, de manguezais a
pântanos, de lagos a estuários, zonas marinhas, etc. Sua característica mais importante é que ficam
inundadas durante pelo menos uma parte de cada ano (em geral um período grande), e suas terras,
plantas e animais são distintos de suas vizinhanças aquáticas e terrestres. Por compartilharem
características de sistemas terrestres e aquáticos, são notavelmente produtivas.
As áreas úmidas são reconhecidamente importantes pela diversidade biológica que contêm
e pelas funções ecológicas que oferecem, estando entre os ecossistemas mais produtivos da Terra
(Barbier et al., 1996; SCBD, 2001). Proporcionam um conjunto complexo de bens e serviços cujos
benefícios têm substancial valor econômico, estimado em US$ 14 trilhões anualmente (de Groot et
al., 2006). Mas esse reconhecimento é recente; até poucos anos atrás essas áreas eram vistas como
áreas que deveriam ser “melhoradas”, isto é, convertidas para outros usos. Apesar desse
reconhecimento, ainda permanece o debate sobre se algumas dessas áreas estão sendo usadas em
seu máximo valor econômico e em que medida deve-se usar recursos privados e públicos para sua
conservação ou restauração (Woodward e Wui, 2001). Por outro lado, nem sempre as conexões
entre a qualidade das áreas úmidas e os serviços que elas oferecem (benefícios) têm sido
reconhecidas por quem toma decisões sobre essas áreas, razão pela qual muitas continuam sendo
degradadas, convertidas ou destruídas (Barbier et al., 1996; de Groot et al., 2006). E devido a seus
132
(Nas colunas, o método mais usado no qual o cálculo foi baseado está indicado com +++, o segundo mais
usado com ++, etc.; círculos abertos indicam que o método não foi usado no estudo de Costanza et al.
(1997), mas poderia ter sido aplicado àquele serviço).
Funções do Ecossistema
Valor1,2 PM 3 CE CS FR CV PH VC VG
e Serviços Associados
Serviços de Regulação 4
1. Regulação de gás 265 +++ o o o o
2. Regulação do clima 223 +++ o o o o o
3. Regul. de distúrbios 7.240 +++ ++ o o + o
4. Regulação de água 5.445 + ++ o +++ o o o
5. Oferta de água 7.600 +++ o ++ o o o o o
6. Retenção de solo 245 +++ ++ o o o o
9. Tratamento de dejetos 6.696 o +++ o o ++ o
10. Polinização 25 o + +++ ++ o o
11. Controle biológico 78 + o +++ ++ o o
Serviços de Suporte
12. Refúgio 1.523 +++ o o o ++ o
12. Criação (berçários) 195 +++ o o o o o o
7. Formação de solos 10 +++ o o o o
8. Ciclagem de nutrientes 21.100 o +++ o o o
Serviços de Produção
13. Alimentos 2.761 +++ o ++ + o
14. Matérias primas 1.014 +++ o ++ + o
15. Recursos genéticos +++ o ++ o o
112
15. Medicinais +++ o o ++ o o
15. Ornamentais 145 +++ o ++ o o o
Serviços Culturais
17. Estéticos 1.760 o o +++ o o
16. Recreação e turismo 6.000 +++ o ++ ++ + +++
17. Cultural e artístico o o o o +++ o
17. Espiritual e histórico 25 o o +++ o
17. Ciência e educação +++ o o o o
Fonte: Adaptado de de Groot et al. (2002).
1
Os valores em dólares foram baseados em Costanza et al. (1997) e aplicados a diferentes ecossistemas (p. ex.,
tratamento de dejetos é ofertado principalmente por áreas úmidas costeiras e benefícios recreativos são, quando
medidos por hectare, maiores nos recifes de coral). Esses valores monetários são exemplos para propósitos
ilustrativos somente: os valores atuais irão variar de local para local, dependendo das condições ecológicas,
biogeográficas e sócioeconômicas.
2
Valor monetário máximo em US$/ha/ano (o trabalho original apresenta os valores mínimos e máximos).
3
Baseado no valor adicionado (i.e., preço de mercado menos custos de trabalho e capital, cerca de 80%).
4
A numeração das funções e serviços tem correspondência com a numeração nas Tabelas 2.21 (p.111) e 3.2
(p.125).
Legenda: PM = preço de mercado; CE = custos evitados; CS = custos de substituição; FR = fator renda;
CV = custo de viagem; PH = preços hedônicos; VC = valoração contingente; VG = valoração em grupo.
134
múltiplos serviços e valores, há muitos grupos sociais diferentes envolvidos em seu uso,
freqüentemente conduzindo a conflitos de interesses e a uma sobre-exploração de alguns serviços
(por exemplo, pescarias ou disposição de dejetos) às custas de outros (por exemplo, conservação de
biodiversidade e controle de inundação) (de Groot et al., 2006).
Para tomar melhores decisões sobre o uso e manejo das áreas úmidas, a importância ou o
valor total desses serviços deve ser estabelecida. Finlayson et al. (2005) concluíram que uma das
principais causas da perda e degradação de áreas úmidas é a falta de informação completa sobre o
valor total dos serviços desse ecossistema pelos tomadores de decisão quando decidindo pela
conversão ou não. Isso conduziu a decisões em favor da conversão apesar de os estudos de
valoração repetidamente demonstrarem que o valor natural das áreas úmidas (não convertidas) é
freqüentemente muito maior do que o valor quando convertidas, particularmente quando a
conversão beneficia poucos beneficiários em detrimento de muitos (de Groot et al., 2006).
Também é preciso lembrar que nem sempre essas funções podem co-existir: ecoturismo
não combina com exploração sustentável de madeira e a conservação impede a conversão para
outros usos (SCBD, 2001). Essa incompatibilidade intrínseca entre os muitos usos das áreas
úmidas tem feito com que muitas funções ecológicas sejam subvaloradas e pode resultar em usos
inapropriados dessas áreas. Em geral a conversão de áreas úmidas tende a gerar produtos
comercializáveis, enquanto que mantê-las em seu estado natural (ou manejá-las com este fim)
resulta na conservação de bens e serviços que não são comercializados. Como tais atividades
normalmente geram receitas públicas (impostos, taxas, etc.), quem toma decisões políticas
normalmente também respalda a conversão das áreas úmidas para usos “comerciais”. Por isso
muitos setores da sociedade acreditam ser mais proveitoso converter tais áreas para usos
comerciais. Em resumo, a subvaloração dos recursos e funções das áreas úmidas é uma das
principias causas do seu mau aproveitamento. A valoração econômica pode oferecer aos decisores
a informação sobre os custos e benefícios de usos alternativos, que do contrário não seriam
considerados nas decisões sobre a conversão (Barbier et al., 1996).
Apesar dos argumentos de que é impossível ou inútil valorar os ecossistemas e de que não
se pode colocar valor em coisas “intangíveis” como a vida humana e os benefícios ambientais,
estéticos, ou ecológicos, a verdade é que as pessoas fazem isso diariamente. Da mesma forma,
embora os argumentos morais coloquem o problema da valoração e da decisão em um conjunto
diferente de dimensões e em uma linguagem diferente do discurso, eles certamente não são
mutuamente exclusivos a argumentos econômicos. Assim, embora a valoração dos ecossistemas
seja difícil e cheia de incertezas, as decisões que a sociedade toma sobre os ecossistemas implicam
135
valorações (embora não necessariamente em termos monetários), e desde que a sociedade é forçada
a fazer escolhas, está fazendo valoração (Costanza et al., 1997).
Os estudos de valoração de áreas úmidas são notavelmente diversos em termos dos valores
obtidos, áreas avaliadas, e características dos estudos. Assim, faz pouco sentido apresentar valores
de estudos de caso que não são de interesse direto para nossos objetivos. De todo modo, a titulo de
exemplo, a Tabela 3.5 apresenta estudos de caso de áreas úmidas nas quais foram medidos valores
econômicos em diferentes continentes. Esses valores econômicos devem ser visto como ordens de
magnitude, não representando necessariamente valores absolutos, pois dependem de fatores
contextuais da área úmida (densidade de população, níveis de renda, etc.) e do próprio estudo
(método de valoração aplicado, restrições orçamentárias e de tempo, etc.), e podem estar baseados
na utilização total da área ou não. Por exemplo, o turismo em certas áreas úmidas pode estar
subexplorado, e, portanto, não refletido em seu valor econômico. Embora possa parecer que
algumas áreas úmidas tenham baixo valor econômico em comparação com outras (por exemplo, o
Pantanal e a bacia do rio Charles), pode ser que áreas tais como o Pantanal tenham enormes valores
ecológicos e socioculturais, pois o valor econômico é somente uma fração do valor total.
Poucos estudos de valoração de áreas úmidas usam meta-análise, e nem todos são
realmente abrangentes. Brouwer et al. (1997) restringem sua amostra aos estudos de valoração
contingente e calculam disposições a pagar por habitante, e não por hectare, como muitos estudos.
Woodward e Wui (2001) estudam somente áreas úmidas temperadas, mas ampliam o leque de
métodos investigados. Brander et al. (2006) fazem uma revisão mais completa, incluindo áreas
úmidas tropicais, vários métodos de valoração e funções ecológicas (inclusive biodiversidade) e
mais países; além disso, consideram a informação sócioeconômica pertinente e a localização
geográfica (as áreas são georreferenciadas), normalmente não considerados nas meta-análises.
Brander et al. (2006), analisaram 190 estudos de valoração de áreas úmidas, em cinco
continentes, com o objetivo de realizar uma meta-análise da literatura de valoração dessas áreas.
Os valores encontrados foram categorizados pelo tipo de área úmida, tamanho, funções ecológicas
que elas desempenham e métodos de valoração. Variáveis sócioeconômicas, como renda e
população, freqüentemente omitidas nessas análises, também foram incluídas e georreferenciadas,
137
O banco de dados utilizado por Brander et al. (2006) contém informações de 25 países de
cinco continentes. A distribuição espacial das áreas úmidas consideradas reflete sobretudo a prática
da valoração e não a distribuição geográfica em si, contendo principalmente áreas da América do
Norte, Sudeste Asiático e Europa. Quanto ao tamanho, a amostra contém principalmente áreas
úmidas de tamanho médio a grande. O tamanho está relacionado ao grau com que economias de
escala podem ser estimadas com confiança. Woodward e Wui (2001) concluíram que quando há
uma grande amplitude de tamanhos de áreas úmidas, ocorrem retornos constantes de escala.
As funções mais valoradas nessas áreas úmidas foram (entre parênteses o número de
observações): oferta de habitat (67), caça esportiva (50), oferta de amenidades (48), pesca esportiva
(36), matérias primas (32), qualidade de água (27), controle de alagamento (26), oferta de água
(18), lenha (18) e biodiversidade (13). A maioria dos estudos valora só uma função particular de
uma dada área úmida; um número significante de estudos valora duas ou mais funções; e poucos
tentam estimar o valor econômico total (i.e. todas as funções importantes). Isso também foi
encontrado por Woodward e Wui (2001), que inclusive testaram a hipótese de que aumentos no
número de serviços considerados em um exercício de valoração tenderia a aumentar o valor
estimado de uma área úmida, não encontrando relação estatisticamente significante.
Uma grande variedade de métodos tem sido usada para valorar as áreas úmidas. O método
mais usado na literatura revisada por Brander et al. (2006) foi o preço de mercado (91 estudos),
com a valoração contingente também sendo muito usada (38 estudos). Outros métodos empregados
são o custo de substituição (28), o fator de renda líquida (22), a função de produção (19), o custo
138
de viagem (19), o custo de oportunidade (11) e o método dos preços hedônicos (5). A hipótese de
que o próprio método seja uma fonte de erro (há evidência na literatura que estudos de valoração
contingente tendem a produzir maiores valores que qualquer outro método) foi testada pelos
autores e por Woodward e Wui (2001), com resultados contraditórios.
Para permitir comparação entre os estudos, Brander et al. (2006) padronizaram os valores
encontrados na literatura, para valores por hectare por ano, em dólares americanos de 1995,
conforme sugerido por Woodward e Wui (2001). Expressar os valores das áreas úmidas em termos
de hectare dá a impressão que cada hectare é igualmente produtivo, i.e., que aquela área úmida
exibe retornos constantes de escala, ou equivalentemente, que o valor marginal é igual ao valor
médio. Brander et al. (2006) adotam esta hipótese porque não foi possível converter valores
marginais para valores médios ou vice-versa. (Os valores marginais são úteis porque permitem
somar funções e obter um valor para as múltiplas funções de uma área úmida). Para Woodward e
Wui (2001), a intuição econômica sugere que o valor marginal de cada hectare tende a declinar
quando a área cresce, mas por outro lado, dada a interdependência funcional dos processos
ecológicos, se esperaria que grandes áreas úmidas oferecessem um conjunto mais rico e mais
valioso de serviços. Como vantagem, o uso de um valor em dólar anual por unidade de área pode
facilitar a utilização dos resultados em estudos de transferência de valor.
O valor médio anual encontrado por Brander et al. (2006) para uma área úmida foi de cerca
de US$ 2.800 por hectare. O valor mediano, entretanto, foi de US$ 150, indicando que a
distribuição dos valores tem uma tendência aos valores mais altos. Os valores médio e mediano
para cada região, tipo de área úmida, função da área úmida e método de estimação variam
consideravelmente, com os valores médios sendo mais altos na Europa, América do Norte e
Australásia, e depois na África, Ásia, e América do Sul. O valor médio mais alto (US$ 9
mil/ha/ano) foi das áreas úmidas do tipo sedimento sem vegetação, enquanto que os manguezais
têm o valor médio mais baixo (US$ 400/ha/ano). A variação nos valores medianos é bem menor,
sugerindo que os diferentes tipos de áreas úmidas têm valores semelhantes. Dentre as funções das
áreas úmidas, o valor médio mais alto ficou para a função biodiversidade (US$ 17.000/ha/ano), e
os valores mais baixos para coleta de lenha (US$ 73/ha/ano) e outras matérias primas (US$
300/ha/ano). As estimativas mais altas de valor foram produzidas pelo método de valoração
contingente, secundado pelos métodos do custo de substituição e dos preços hedônicos, enquanto
que as estimativas mais baixas resultaram dos métodos do custo de oportunidade e da função de
produção. Segundo os autores, essas diferenças decorrem das diferentes funções valoradas pelos
diferentes métodos e das diferentes medidas de bem-estar que cada método estima. Já Woodward e
Wui (2001) observaram que os métodos dos preços hedônicos e do custo de substituição produzem
valores mais altos do que o método de valoração contingente.
139
A meta-regressão utilizada por Brander et al. (2006) para obter efeitos marginais
considerou um modelo semi-log em que as variáveis explicativas consistiram das características do
estudo (método de valoração, valor marginal), das características físicas e geográficas das áreas
úmidas (tipo de área úmida, funções, tamanho, localização, etc.) e das características
sócioeconômicas (renda per capita e densidade de população). A variável dependente foi um vetor
de valores por hectare por ano em dólares de 1995. Neste modelo os coeficientes medem a
mudança relativa na variável dependente para uma dada mudança absoluta no valor da variável
explicativa. Significa que, se uma área úmida tem uma dada função (por exemplo, controle de
inundação) e o coeficiente resultante do modelo foi de 0,14 para esta função, então, ceteris paribus,
o valor desta área úmida será 14% mais alto que a média quando comparado com o valor de uma
outra área onde esta função não está presente. Os coeficientes das variáveis explicativas, expressos
como logaritmos (PIB per capita, densidade de população e tipo de área úmida), são interpretados
como elasticidades. Quase metade da variação no valor das áreas úmidas foi explicado pela
variação nas variáveis explicativas utilizadas no modelo (R2 ajustado = 0,45) (Brander et al., 2006).
Schuyt e Brander (2004) fizeram estudo muito semelhante ao de Brander et al. (2006),
utilizando o banco de dados de valores econômicos de áreas úmidas desenvolvido pelo Instituto de
Estudos Ambientais (IVM), da Holanda. Usando estimativas de 89 estudos de caso, os autores
extrapolaram o valor econômico para outras áreas úmidas (com base em um inventário de 3.800
áreas úmidas mantido pelo CCRU Global Wetland Database), e estimaram o valor econômico
global das áreas úmidas do mundo em 3,4 bilhões por ano. Os autores apresentam a área total de
cada região por tipo de área úmida representada, ao invés do número de observações, de modo que
não se pode inferir quais são os tipos de áreas úmidas mais estudados. Em termos de área os
sedimentos não vegetados representaram 61% das diferentes áreas úmidas, os manguezais, 16%, e
as planícies de inundação, 13%. As regiões mais representadas, em termos de área, foram a
América do Norte (31%), América Latina (22%), Australásia (15%) e Ásia (15%).
A Tabela 3.6 apresenta os valores medianos por tipo de área úmida. As diferenças nos
valores por hectare entre os tipos de áreas úmidas são parcialmente explicadas por diferenças nas
funções valoradas em cada tipo de área úmida: os sedimentos não vegetados possuem funções que
tem alto valor econômico, enquanto manguezais são valorados principalmente pela oferta de
madeira e lenha. Diferenças no nível de renda também podem explicar o baixo valor dos
manguezais, pois muitos estudos foram realizados na Ásia.
Tabela 3.6 – Valores econômicos medianos de áreas úmidas por tipo de área úmida.
Valor econômico
Tipo de Área Úmida mediano
(US$/ha/ano, 2000)
Sedimentos não vegetados 374
Água doce florestada 206
Marinhas e salobras 165
Água doce 145
Manguezais 120
Fonte: Schuyt e Brander (2004).
A Tabela 3.7 apresenta os valores medianos por função ambiental, e não foi feita distinção
por localização ou tipo de área úmida, apesar de que muitas funções são características de
determinado tipo de área úmida em uma região específica. Por exemplo, a pesca esportiva é uma
função dominante nas áreas úmidas da Europa e dos Estados Unidos. Os resultados seguem o
padrão já encontrado na literatura (materiais, madeira e lenha tendendo a ter os menores valores,
etc.).
142
Tabela 3.7 – Valores econômicos medianos de áreas úmidas por função ambiental.
Valor econômico
Função da Área Úmida mediano
(US$/ha/ano, 2000)
Controle de alagamento 464
Pesca esportiva 374
Amenidades / Recreação 492
Qualidade de água 288
Biodiversidade 214
Habitat / Criação 201
Caça esportiva 123
Oferta de água 45
Materiais 45
Lenha 14
Fonte: Schuyt e Brander (2004).
A Tabela 3.8 apresenta os valores globais das áreas úmidas, agregados por tipo de área
úmida e por continente. O maior valor encontrado para a Ásia é decorrente das maiores densidades
populacionais e da relativa escassez de áreas úmidas no continente. Os menores valores
encontrados na América Latina são explicados pelas razões opostas: baixas densidades de
população em geral e maior abundância de áreas úmidas na região. O alto valor das áreas úmidas
do tipo sedimentos não vegetados (US$ 2,8 bilhões por ano) foi explicado pela maior área (61%)
deste tipo de área úmida no banco de dados utilizado. Os valores encontrados foram considerados
conservadores pelos autores, principalmente porque muitas funções não foram incluídas (pois não
há estudos de valoração sobre elas), e porque a área total amostrada foi muito menor do que a área
total estimada de áreas úmidas do globo.
Tabela 3.8 – Valor econômico total global de áreas úmidas por continente e tipo de área úmida
(milhares de US$ por ano, 2000).
METODOLOGIA
Os demais dados utilizados são dados secundários, obtidos dos trabalhos revisados acima
(Capítulo 2), em sua quase totalidade realizados para o Pantanal. Em alguns casos, como o de
PFNM (produtos florestais não madeireiros), bastante usados na literatura mundial e bastante
estudados, não há estimativas para o Pantanal, e foram utilizados resultados médios de outras
regiões (transferência de benefícios). Por esta razão foi feita uma revisão bibliográfica detalhada,
procurando justificar e mostrar a importância deste ou daquele produto ou serviço no Pantanal, ou
sua pouca importância, etc., e sempre que possível, partindo de uma avaliação global e
gradativamente avançando para uma avaliação nacional e finalmente, detalhando para o Pantanal.
Todos os resultados foram padronizados para uma base comum, em dólares americanos por hectare
por ano, a preços constantes de 2007 (corrigidos pela inflação). As Tabelas 4.1, 4.2 e 4.3
apresentam as fontes de informação utilizadas e alguns detalhes da metodologia de cada trabalho
consultado. Informação mais completa sobre a metodologia encontra-se nas seções
correspondentes (Seções 4.1.2, 4.1.3 e 4.2).
O grau de estruturação das respostas depende de quanto se conhece sobre a variável que
cada questão focaliza e do tipo de medidas que se dispõem. De modo geral, se recomenda
estruturar o quanto possível cada questão. A forma mais simples de mensuração é diferenciar as
respostas em categorias nominais, que podem ser contadas em freqüências e percentuais de
respostas, como por exemplo: possui / não possui invernada maternidade, tem / não tem energia
elétrica na fazenda, a principal fase de produção é a cria / recria / engorda, etc. Também são usuais
as escalas ordinais, em que se classificam as respostas de uma dada variável (como por exemplo,
alta, média e baixa probabilidade de ocorrência de um evento) e as escalas de intervalo, onde
intervalos numéricos iguais em uma escala correspondem a diferentes estados de uma variável (por
exemplo, em uma escala ordinal de 5 pontos o número 1 corresponde a “discordo totalmente” e o
número 5, a “concordo totalmente”) (Duarte e Barros, 2005).
As perguntas devem ser elaboradas levando em conta três princípios básicos: clareza
(devem ser claras, concisas e unívocas), coerência (devem corresponder à intenção da pergunta) e
neutralidade (não devem induzir a uma dada resposta). Independente do tipo de mensuração
(escalas nominais, ordinais ou de intervalo), a formulação de uma questão deve obedecer a
algumas recomendações e a um conjunto de regras básicas (Payne, 1980; Converse e Presser,
1986; Muñoz, 2003; Duarte e Barros, 2005; Lakatos e Marconi, 2005), entre elas: deve ser
formulada de modo simples, de preferência com termos em linguagem comum, deve ser específica
e referir-se a um único conceito ou dimensão de julgamento, e o argumento da pergunta deve
esclarecer se o respondente pode escolher mais de uma alternativa. Da mesma forma as alternativas
de resposta: devem ser mutuamente exclusivas e exaustivas (todas as possibilidades devem estar
incluídas ou pelo menos todas as que melhor correspondem à situação que se quer avaliar), a
questão central deve estar clara e o nível de agregação deve ser semelhante entre as alternativas.
145
O questionário foi estruturado em duas partes, uma geral sobre a atividade pecuária, com
cinco seções e com perguntas semi-estruturadas, e outra financeira, com três seções e em forma de
tabelas, para serem preenchidas com os valores e quantidades das despesas e receitas. Uma terceira
146
parte, no formato aberto, abriu espaço para comentários, sugestões, críticas e observações. A parte
geral foi estruturada com 41 perguntas e 197 variáveis, e a parte financeira, com três tabelas e 95
variáveis. No total, o questionário continha 12 páginas.
O contexto geral da pecuária foi caracterizado através de cinco seções: (a) identificação do
respondente; (b) identificação da propriedade; (c) caracterização da propriedade; (d) aspectos
gerais do rebanho, tipo de produção, manejo e comercialização; (e) administração e mão-de-obra.
A informação financeira foi dividida em três seções: (a) despesas no ano de 1997 (mão-de-obra
permanente e temporária, serviços de manutenção e reparos, aquisição de insumos, aluguéis, etc.);
(b) receitas no ano de 1997 (vendas de animais, transferências de animais para outras fazendas,
arrendamento de terras, aluguel de pasto e máquinas, serviços prestados a terceiros, etc.); e (c)
investimentos (formação de pastagens, construção de cercas, compra de animais, etc.).
Os questionários foram enviados em marco de 1998, via correio, juntamente com uma
carta de apresentação em que se explicavam os objetivos da pesquisa, o papel essencial da
colaboração solicitada e onde se garantia explicitamente o anonimato dos respondentes e das
respostas individuais (só a informação agregada seria divulgada). A carta de apresentação informou
ainda o tempo para preenchimento (entre 25 e 30 minutos) e os nomes e telefones dos
pesquisadores responsáveis pela pesquisa, solicitando que os respondentes telefonassem em caso
de quaisquer dúvidas. Junto com o questionário foi um envelope endereçado e pré-selado (pré-
pago) para devolução dos questionários preenchidos. Todos os documentos estavam em papel
timbrado da Embrapa Pantanal.
147
12
As principais razões são o tamanho do questionário (ou o tempo para preenchimento), a identidade do
remetente (se empresa pública, universidade ou firma privada), a época do ano em que o questionário é
enviado (se na época da colheita ou comercialização), a necessidade de consultar registros formais do
produtor e se há ou não compensação pela resposta e a forma e valor dessa compensação (Pennings et al.,
2002).
148
atual. A melhor alternativa será aquela que apresentar maiores benefícios líquidos. A orçamentação
parcial é um procedimento rápido, porém eficaz da análise de custo-benefício. Em nosso estudo,
essas modificações são as diferentes alternativas de manejo (período de monta controlada, redução
na proporção touro:vaca, etc.) que podem ser introduzidas nas propriedades, e as diferentes
atividades complementares à pecuária (apicultura, pecuária orgânica e ecoturismo) que podem ser
escolhidas pelas fazendas. Adota-se, portanto, a ótica da estática comparativa, que consiste
justamente em comparar situações antes e depois de alguma mudança em um determinado sistema.
Os dados utilizados foram obtidos de Abreu et al. (2003) (Tabela 2.4, p.40). Esses autores
analisaram o resultado da implantação de um período de monta na região Centro-Oeste,
considerando cumulativamente quatro conseqüências positivas do uso deste manejo: redução da
mortalidade de bezerros, redução da relação touro:vaca, aumento na taxa de natalidade e redução
da mão-de-obra permanente. As diferenças percentuais nas receitas líquidas por hectare entre cada
um desses tratamentos em relação à situação tradicional, foram aplicadas às receitas líquidas
obtidas no levantamento que foi feito da pecuária no Pantanal (resultados econômicos de receitas
líquidas obtidas dos questionários). As fazendas de nosso levantamento que já utilizam estação de
monta não foram incluídas.
Os dados utilizados foram obtidos de Sereno et al. (2000; 2002) (Tabela 2.5, p.42), que
registram o percentual de redução no custo total por bezerro nascido decorrente de mudanças na
proporção touro:vaca de 1:10 (tradicional) para 1:25 e 1:40, em fazendas do Pantanal. Esses
percentuais foram aplicados aos custos de produção obtidos no levantamento da pecuária no
Pantanal.
149
Tabela 4.1 – Fontes dos dados utilizados para analisar melhorias nas práticas de manejo
do rebanho do Pantanal.
Alternativas de
Fonte Comentários
Manejo
Simulação bioeconômica da evolução de um rebanho de
fazenda típica da região Centro-Oeste do Brasil, no qual
Implantação de quatro efeitos positivos da implantação de um período de
Abreu et al.,
período de monta monta são considerados cumulativamente. Utilizamos as
2003
controlada diferenças percentuais nas receitas líquidas por hectare
entre cada um dos quatro tratamentos e a situação
tradicional.
Estudos realizados em fazendas do Pantanal (1994-1995).
Foi calculada a redução no custo total por bezerro nascido
Sereno et al.,
decorrente de reduções na proporção touro:vaca de 1:10
Redução da 2000;
(tradicional) para 1:25 e 1:40. Utilizamos o percentual de
relação touro:vaca Sereno et al.,
redução dos custos de passar da relação touro:vaca de 1:10
2002
para a de 1:25, e de 1:25 para 1:40, para recalcular as
receitas líquidas das fazendas de nossa amostra.
Os resultados zootécnicos de um conjunto de práticas de
manejo introduzidas em fazendas da sub-região dos
Descarte técnico Almeida et al.,
Paiaguás entre 1991 e 1995 por Almeida et al. (1996),
de reprodutores e 1996; Seidl et al.,
foram analisados economicamente por Seidl et al. (1998).
uso do sal mineral 1998
Utilizamos o acréscimo nas receitas líquidas por hectare
decorrente da adoção do conjunto de tecnologias.
O uso de sal mineral apropriado ao Pantanal aumenta o
desempenho reprodutivo de vacas de cria mantidas em
pastagens nativas, resultando em aumentos na receita
líquida, quando comparado com o uso de outras
Uso de sal mineral Afonso et al.,
formulações de sal mineral ou do sal comum. Utilizamos o
adequado à região 2001
percentual de aumento de receitas e recalculamos as
receitas líquidas das fazendas que não utilizam sal mineral
em nossa amostra. Estudo realizado na sub-região da
Nhecolândia entre 1994 e 1999.
Fonte: Pesquisa direta.
A. Apicultura
Tabela 4.2 – Fontes dos dados utilizados para analisar atividades complementares
à pecuária do Pantanal.
Atividades
Fonte Comentários
Complementares
Estudo realizado em fazenda do Pantanal do Abobral em
2004-2005. Foram calculados vários indicadores
econômicos da apicultura como atividade complementar
Apicultura Reis e Barros, 2006 à pecuária de corte. Alguns componentes dos custos de
produção foram modificados (ver texto) para atender aos
objetivos do nosso estudo. A receita líquida por hectare
resultante foi usada em nossa análise.
Os custos e receitas de um sistema de produção de carne
bovina orgânica foram comparados com os retornos do
sistema tradicional, em quatro fazendas do Pantanal, para
um período de 10 anos, com taxa de desconto de 10%.
Pecuária orgânica Ribeiro et al., 2001 Foi considerado um prêmio de 10% para a carne
orgânica, a partir do terceiro ano de implantação do
projeto (tempo para certificação das fazendas).
Utilizamos a receita líquida média por hectare dessas
quatro fazendas.
Estudo de caso de fazenda do Pantanal sul que vinha
desenvolvendo a atividade de ecoturismo em
Espindola et al., complemento à pecuária desde 1989. Foram analisados
Ecoturismo
2002 diferentes cenários alternativos para um período de 20
(hotéis-fazenda)
anos, utilizando taxa de desconto de 10%. A receita
líquida do cenário de maior valor presente líquido foi
considerada em nossa análise.
Fonte: Pesquisa direta.
13
Reis (comunicação pessoal, 7 de dezembro de 2007).
152
B. Pecuária Orgânica
C. Ecoturismo
O valor econômico total (VET) de um recurso natural é a soma de seus valores diretos,
indiretos, de opção e de existência. Embora o VET englobe valores que podem se sobrepor, a
super-estimativa resultante da agregação de todos os tipos de valores, na maioria dos casos, não é
muito severa (Torras, 2000). Os valores utilizados foram obtidos de outros estudos, a maioria
realizados para o Pantanal, conforme consta na revisão de bibliografia (Capítulo 2). Em alguns
poucos casos, os valores são de outros ecossistemas, e foram utilizados pela falta de estudos
correspondentes para o Pantanal. Os resultados são apresentados em valores por hectare por ano.
Calcular valores por hectare para o Pantanal implica que toda a vasta extensão da região tem uma
“qualidade” uniforme, uma simplificação que se tornou necessária pela limitação de dados
disponíveis.
No caso do Pantanal, os valores relacionados ao uso direto dos recursos incluem, por
exemplo, madeira comercial, lenha, matérias-primas (resinas, látex e tinturas) e alimentos (frutas,
nozes, caça e pesca). O turismo e o ecoturismo também constituem valor de uso direto, embora não
extrativo.
A. Produtos Madeireiros
Tabela 4.3 – Fontes dos dados utilizados para analisar o valor econômico total do Pantanal.
Valores do Pantanal Fonte Comentários
Valor de uso direto
Foi calculado o valor madeireiro de 13 espécies de áreas
de mata, cerrado e cerradão do Pantanal. Cenários
sustentáveis de corte foram estimados com base em três
taxas de crescimento. Os dados biológicos (prevalência,
biomassa, taxas de crescimento) foram baseados em
Produtos
Seidl et al., 2001 observações de três áreas experimentais e na literatura; os
madeireiros
dados econômicos (custos de produção, características dos
produtos e preços recebidos) foram baseados em
entrevistas com proprietários de serrarias, fazendeiros e
marceneiros locais e na literatura. Utilizamos a receita
líquida potencial média que se pode obter de um hectare.
Valor médio por hectare/ano sugerido por Godoy, et al.
Godoy et al., 1993; (1993) com base na revisão que realizaram em 24 estudos;
PFNM Lampietti e Dixon, por Lampietti e Dixon (1995) com base na revisão de 20
1995; Pearce, 1998 estudos; e por Pearce (1998) com base nas revisões acima
e em mais seis estudos.
Uso do método do custo de viagem no Pantanal sul. Total
Moraes e Seidl, de gastos diretos realizados pelos pescadores esportivos
1998 em 1994. Valor por hectare obtido pela divisão dos gastos
agregados pela área do Pantanal.
Uso do método do custo de viagem para calcular o bem-
Ecoturismo
estar total (medido pelo excedente do consumidor)
associado à pesca esportiva no Pantanal sul. Foram usadas
Shrestha et al., 2006 cinco especificações para os modelos de demanda. Valor
por hectare obtido pela divisão do excedente agregado do
consumidor dos três modelos de melhor ajuste pela área
do Pantanal.
Valor de uso indireto
A contribuição relativa de 17 diferentes serviços do
ecossistema para o valor total do Pantanal foi estimada a
Serviços do Seidl e Moraes,
partir de valores globais médios calculados por Costanza
ecossistema 2000
et al. (1997) para esses serviços. O valor por hectare de
cada serviço foi agregado e considerado em nosso estudo.
Valor de opção
Valor de opção estimado em 16% do valor de uso se a taxa
social de desconto for de 6% (para um período de 30
Chopra, 1993
anos); com taxa social de desconto de 12% o valor de
opção é de 3% do valor de uso.
Valor de opção Com base em uma avaliação da magnitude dos valores de
opção relativos aos excedentes esperados do consumidor,
Kling, 1993 e usando dados simulados e estimativas reais de estudos
de demanda por recreação, sugere que os valores de opção
estão entre 3% e 4% do valor de uso.
Valor de existência
Estudo realizado para as florestas da Índia. O valor de
Chopra, 1993 existência foi considerado como sendo 91% do valor de
opção e do valor de uso.
Método de valoração contingente aplicado à pescadores
esportivos do Pantanal sul. Disposição a pagar para manter
a qualidade do ambiente em relação a danos potenciais ao
Valor de existência
ecossistema. Dois veículos de pagamento foram testados e
Moran e Moraes,
três formas de eliciação de valores: lances-livres, escolha
2002
dicotômica simples e escolha dicotômica dupla. Diferentes
métodos econométricos foram usados na estimativa da
disposição a pagar. Utilizamos a estimativa mais
conservadora, baseada no formato dicotômico duplo.
Fonte: Pesquisa direta.
155
Os lucros estimados dependem dos custos de transporte, pagos pelas serrarias, e a maioria
das fazendas está fora da zona economicamente possível para o comércio de madeira com a atual
infra-estrutura rodoviária. Além disso, os retornos estimados foram, em geral, menores do que o
custo de oportunidade da área ocupada com pastagem cultivada. Apenas quatro das 13 espécies
estudadas tem retornos superiores, uma em área de cerradão e quatro em áreas de mata. Os autores
concluíram que as principais restrições para a extração economicamente sustentável da madeira no
Pantanal são a distância aos mercados, a falta de infra-estrutura rodoviária (alto custo do transporte
do produto bruto) e de beneficiamento da madeira e a baixa taxa de crescimento anual da maioria
das espécies arbóreas com potencial comercial (entre 2,5% e 5,1%, dependendo da espécie).
Mudanças nesses fatores, particularmente na infra-estrutura rodoviária, viabilizam
economicamente a exploração da maioria das espécies. Por isso, foram considerados em nossa
análise os valores potenciais que um fazendeiro poderia obter de um hectare de mata, cerrado e
cerradão por ano.
Não foram encontradas estimativas para o valor da lenha extraída no Pantanal. Assume-se
que esse valor está incluído na função oferta de matérias-primas do ecossistema, i.e., como valor de
uso indireto. A literatura indica que a coleta de lenha está entre os menores valores das áreas
úmidas (ver Seção 3.2.6, p.134 e Tabela 3.7, p.141), embora alguns estudos mostrem que o valor
da lenha e do carvão pode ser bastante significante em alguns países, em termos da renda familiar.
A revisão bibliográfica (ver Seção 2.2.1.C, p.97) mostrou que o valor por hectare dos
PFNM tende a ser baixo e que não há informações sobre o valor econômico desses produtos para o
Pantanal. Em virtude da falta de informação, foi adotada a média (em US$/ha/ano) dos valores
médios sugeridos por Godoy et al. (1993), por Lampietti e Dixon (1995) e por Pearce (1998).
D. Ecoturismo
Esses valores foram convertidos para valores por hectare/ano, já que são conhecidas a área do
estudo e o tamanho da população pertinente, e utilizados como uma proxy para o valor do
ecoturismo, principalmente porque a razão principal para as visitas não foi a pesca e sim o
ambiente natural do Pantanal (ver Seção 2.2.1.D, p.108).
Uma aproximação do valor de opção pode ser obtida calculando-o como uma proporção da
soma dos valores de uso. Kling (1993) sugere que os valores de opção estão entre 3% e 4% do
valor de uso; Chopra (1993) estabelece o valor de opção entre 3% e 16% do valor de uso,
dependendo da taxa social de desconto (12% e 6%, respectivamente). Seguindo essas autoras,
calculamos o valor de opção somando os valores de uso direto e de uso indireto e multiplicando o
total por 3% e 16%, os extremos sugeridos acima.
O método de valoração contingente foi aplicado ao Pantanal por Moran e Moraes (2002)
para estimar o valor de existência que visitantes da parte sul do Pantanal atribuem à preservação
157
desse ecossistema (Tabela 2.22, p.114). O estudo teve o propósito de explorar a adequação do
método para captar o valor econômico total do Pantanal e seguiu o protocolo da valoração
contingente. O cenário focalizou valores de não-uso relativos à qualidade do ecossistema em
relação a danos potenciais devido à poluição da água. Foram usadas várias formas de eliciação dos
valores de disposição a pagar (lances livres, escolha dicotômica simples e referendo com
acompanhamento) e processos econométricos de estimação. O modelo de escolha dicotômica
prediz corretamente 79% das respostas, com a variável “lance” sendo altamente significativa, e por
isso este resultado foi utilizado em nossa análise. O valor agregado (em US$ milhões/ano) foi
convertido a valores por hectare/ano.
Quando uma área do Pantanal é desmatada, degradada ou convertida para outros usos (p.
ex., para introdução de pastagens cultivadas), se perdem valores importantes, às vezes
irreversivelmente. Assim, os custos desta opção de uso devem incluir, além dos custos diretos da
conversão (por exemplo, limpeza e queima), os custos dos demais valores perdidos devido à
conversão. Esses custos incluem o valor das funções ambientais perdidas (como proteção de bacias
hidrográficas, manutenção de micro-clima e biodiversidade) e o valor dos recursos naturais
perdidos (como madeira, produtos não madeireiros e vida selvagem).
Por outro lado, a opção de preservação, além dos custos diretos de preservação (por
exemplo, fiscalização), também envolve a perda de benefícios adicionais, que são os custos
sacrificados associados à não exploração de seus recursos naturais (por exemplo, as receitas da
exploração de madeira, do turismo e da produção de carne).
A decisão de que opção de uso da terra buscar para uma determinada área do Pantanal só
pode ser tomada se todos os custos e benefícios associados com cada opção de uso forem avaliados
corretamente. Só assim se garante que uma decisão racional será tomada. A inclusão desses custos
e benefícios não necessariamente implica que a preservação será a melhor opção econômica, pois
se os usos alternativos produzirem maiores retornos líquidos, então a conversão fica garantida.
A análise de custo-benefício (ACB) oferece uma metodologia para comparar opções
alternativas de uso do Pantanal, e é o método mais comum de avaliação de projetos econômicos e
158
de políticas públicas. A ACB é uma ferramenta de decisão que julga projetos, políticas ou ações
pela comparação entre seus custos e benefícios. Se um projeto ou política mostra benefício líquido,
é considerado eficiente e pode ser aprovado ou a política implementada, e diferentes projetos e
políticas podem ser ordenados de acordo com o tamanho de seus benefícios líquidos.
[B - C] > 0 (1)
onde:
Para que a ACB seja analiticamente válida, deve comparar um determinado projeto ou
política ao resultado mais provável na ausência do projeto ou política. Assim, os custos de
oportunidade de empreender uma determinada ação também devem ser considerados. Os custos de
oportunidade são os benefícios da próxima melhor alternativa. Se a próxima melhor alternativa for
a opção B, então o custo de oportunidade de escolher a opção A é o beneficio líquido da opção B.
Para que A seja a opção preferida, seus benefícios líquidos (BLA) devem exceder os benefícios
líquidos de B (BLB):
possibilidade de fazer um melhor uso da riqueza de recursos naturais da região, será explorada
através de atividades complementares à pecuária, pela inclusão das receitas líquidas dessas
atividades na análise.
onde:
RESULTADOS
A Tabela 5.1 apresenta o número de fazendas amostradas por município. Do total de 120
fazendas, 95 (79%) localizam-se no Mato Grosso do Sul e 25 (21%) no Mato Grosso. Corumbá é o
município mais bem representado, com 41 fazendas (34%), seguido por Aquidauana (15 fazendas),
Coxim e Rio Verde de Mato Grosso (ambos com 12 fazendas) e Porto Murtinho (11 fazendas). No
Mato Grosso, Poconé (9 fazendas) e Itiquira (7 fazendas) são os municípios com o maior número
de fazendas. Não há fazendas representando os municípios de Sonora (MS) e Lambari D’Oeste
(MT). No Mato Grosso do Sul os municípios com maior área de Pantanal tendem a ser mais bem
representados (Corumbá, Aquidauana, Rio Verde de Mato Grosso), mas isto não é evidente no
Mato Grosso.
Tabela 5.1 – Localização das fazendas amostradas por município, área média (ha) e participação
da área dos municípios (km2) na composição fisiográfica do Pantanal brasileiro.
• Do total de 120 questionários respondidos, 87% foram preenchidos pelos proprietários das
fazendas.
• As propriedades são administradas pelas famílias em 77,5% dos casos, sendo 55%
diretamente pelos proprietários.
• A maioria (83%) dos 120 proprietários não reside nas fazendas.
• O número de visitas à fazenda varia amplamente, de uma vez por ano a todos os dias:
o Média de 36 visitas/ano.
o Cerca de um quarto dos proprietários vai à fazenda menos de uma vez por mês.
o Quase 20% dos proprietários visitam a fazenda uma vez por mês (12 visitas/ano).
• A média de anos de posse da fazenda pelo proprietário foi de 20 anos.
• O tempo em que a fazenda está na família foi de 38 anos, em média.
• Proprietários com posse da fazenda entre 10 e 20 anos representam 35% do total, enquanto
que 18% situam-se como proprietários no intervalo entre 20 e 30 anos.
162
• Fazendas que estão de posse das famílias por mais de 60 anos representam quase 15% do
total e com 100 e mais anos, cerca de 5%.
• O meio de transporte mais utilizado para ir e vir às fazendas é o terrestre, usado por cerca
de 74% das fazendas.
• Os transportes aéreo e fluvial são utilizados como meio de transporte exclusivo por 5,1% e
2,5% das fazendas, respectivamente.
• As fazendas amostradas ficam entre 10 km e 360 km da cidade mais próxima, com
mediana de 100 km, moda de 150 km e média de 108 km.
Tabela 5.2 – Localização das fazendas por sub-região e área fisiográfica das sub-regiões no
Pantanal, com seus municípios componentes.
C. Unidades de Vegetação
A Tabela 5.3 resume os dados sobre as unidades de vegetação. As duas últimas linhas
mostram o número e o percentual de fazendas que forneceram informação sobre cada uma das
unidades de vegetação. Por exemplo, com relação à pastagem cultivada, quase 82% das fazendas
(ou 98 do total de 120 propriedades) informou alguma área de pastagem cultivada, independente do
163
tamanho desta área. A maioria das fazendas também possui áreas de campo (75,8%), cerrado
(65,8%) e mata (60,8%) e pouco menos da metade (46%) registrou áreas de cordilheira. Embora a
maioria das fazendas tenha pastagem cultivada, em termos médios as maiores áreas são de campo
(3.648 ha), cerrado (1.949 ha) e outras áreas (1.414 ha). As áreas de campo representam as áreas de
pasto nativo, assim como a maior parte das áreas de cerrado.
Tabela 5.3 – Área total, média e mediana amostrada e das unidades de vegetação.
A Tabela 5.4 apresenta informações sobre a área média potencialmente sujeita a enchentes
e a área produtiva média das fazendas nos períodos de cheia (usualmente de abril ou maio até
julho) e seca (aqui considerado o restante dos sete a oito meses do ano, mas rigorosamente a seca
se estende de agosto a outubro) para fazendas com e sem pastagem cultivada. A área útil para
produzir é a área capaz de ser utilizada pelo gado para pasto (área para pastejo); implica que o
restante da área é improdutiva para a pecuária, embora possa ter utilidade para outros usos, não
especificados. Mas não implica que o restante seja área alagada, embora possa ter relação: por
exemplo, se a área útil para produzir no período de cheia for de 100%, certamente a propriedade
não alaga. Já a área sujeita a enchentes é a área máxima potencialmente sujeita a enchente em cada
propriedade. Não significa que a área resultante seja a área efetivamente alagada no ano da
pesquisa.
A área média sujeita a enchentes foi de 3.777 ha (dp = 4.243; n = 99) ou 47,2% da área
total média. A amplitude de área sujeita a enchentes foi de 60 ha a 18.000 ha. Em média, a área útil
para produzir no período de seca foi de 5.926 ha ou 79,2% da área total (dp = 6.491; n = 111),
enquanto que no período de cheia, foi de 3.750 ha ou 49,8% da área total média (dp = 4.420; n =
164
105). A mediana indica que no período seco metade das fazendas tem 80% e mais de sua área total
capaz de ser utilizada na produção, enquanto que no restante das fazendas a área útil para produzir
é inferior a 80% da área total. Na cheia esse percentual cai para 50%: metade das fazendas tem área
produtiva menor que 50% de sua área total e metade têm área produtiva maior que 50%. As
fazendas com pastagem cultivada têm área média sujeita a enchentes menor que as fazendas sem
pastagens cultivadas (41% versus 69%), e maior área útil para produzir, tanto na seca quanto na
cheia, mas particularmente na cheia (53% versus 35%).
Tabela 5.4 – Área total média, área média potencialmente sujeita a enchentes e área média
produtiva nos períodos de cheia e seca do Pantanal,
para fazendas com e sem pastagem cultivada.1
Embora a cheia possa trazer sérios problemas de produtividade, a falta de água no período
seco também pode ser problemática. Do total de 120 propriedades, 58 (48%) tem problemas de
falta de água no período seco e 62 (52%) não tem.
O período de alagamento tem duração de dois a oito meses (Tabela 5.6), com média de 4,8
meses (dp = 1,4), podendo começar entre novembro e maio e terminar entre janeiro e outubro,
165
dependendo da sub-região, se bem que os extremos sejam pouco comuns. Em geral as cheias
começam em dezembro ou janeiro e se estendem até março, abril, maio ou junho.
Tabela 5.5 – Área potencialmente sujeita a enchente nas fazendas amostradas do Pantanal.
Em quase 2/3 das fazendas o alagamento dura entre quatro e seis meses (Tabela 5.6). A
maior freqüência é a duração de cinco meses (29 fazendas ou aproximadamente 29%), sendo
também freqüentes as durações de quatro meses (com 24 fazendas) e seis meses (21 fazendas).
Duração de oito meses só foi registrada por uma fazenda (sub-região do Paiaguás). Os períodos
citados como de maior freqüência de alagamento foram de dezembro a março, abril ou maio e de
janeiro a março, abril ou maio.
E. Infra-estrutura
1) Energia elétrica
A maior parte das propriedades (79 ou 67%; n = 118) não tem energia elétrica originada de
linha de transmissão, recorrendo a geradores.
2) Número de retiros
A maior parte das fazendas (56%) tem retiros14. O número de retiros variou de um a cinco
por fazenda, mas em geral as fazendas têm um ou dois retiros: 33 fazendas têm um retiro (59%) e
14 fazendas, dois retiros (25%) - ou 84% do total; somente uma fazenda tem 5 retiros e apenas
duas tem 4 retiros, e essas fazendas tem pelo menos 15.000 ha de área total. Do total de 100
fazendas, 44 responderam que não possuem retiros.
3) Número de currais
Todas as fazendas (n = 118) possuem pelo menos um curral, e o número de currais variou
de 1 a 6 por fazenda. A maioria das fazendas tem um ou dois currais: 62 fazendas (52,5%) têm um
curral e 36 fazendas (30,5%) tem dois, ou um total de 83%. A maioria desses currais tem brete
(110 fazendas), tronco (81 fazendas) ou ambos (58 fazendas); 19 fazendas responderam que não
tem troncos nos currais e 2 fazendas, que não tem brete.
4) Tipos de Invernada
No total, 112 fazendas responderam sobre o número de invernadas e o tipo de pasto nessas
invernadas (nativo ou cultivado). Invernadas com pasto cultivado existem em 94 fazendas, e em 23
14
Retiro é uma parte afastada da sede da fazenda – 15 a 20 km – localizado em local estratégico dentro das
grandes propriedades pantaneiras. São conseqüência das fazendas serem muito extensas, e necessários para
um melhor controle e manejo dos animais que se encontram naquela porção da propriedade. Possuem certa
independência em relação à sede, com instalações próprias para manejo do gado (curral, etc.) e administração
(casas de peões, galpões, tratores, etc.). Em geral são habitados de forma permanente.
167
F. Pastagens Cultivadas
A Tabela 5.8 mostra a área e a participação percentual das principais gramíneas que
compõem as pastagens cultivadas no Pantanal. Observa-se que as diferentes espécies de braquiárias
ocupam aproximadamente 76% da área total de pastagens cultivadas, dos quais 50% correspondem
a Brachiaria humidicola. O capim Colonião é a segunda espécie de gramínea em termos
15
Esses valores consideram exclusivamente a resposta dada no questionário sobre a existência de pasto
cultivado (sim/não) e o número de invernadas, independente da área. Em alguns casos, a área com pasto
cultivado é tão pequena que a invernada pode ser considerada mais um piquete do que propriamente uma
invernada, mas o fator determinante foi a resposta dada pelo respondente.
168
quantitativos, com quase 17% do total. Em ordem decrescente aparecem Brachiaria brizantha cv.
Marandu (15,4%) e Brachiaria decumbens (9,5%). As demais gramíneas participam
individualmente com menos de 2% do total. As três gramíneas com maior participação
(Humidicola, Colonião e Marandu) perfazem um total de quase 83% das pastagens cultivadas.
Embora a Humidicola tenha maior participação, a gramínea com a maior área média é o capim
Colonião, dado o relativamente pequeno número de fazendas com este pasto (17 fazendas). A
Setária também tem uma área média superior a da Humidicola (1.030 ha), mas porque apenas duas
fazendas possuem essa gramínea. A implantação de algumas gramíneas deu-se ao longo de vários
anos no período analisado (29 anos), como Humidicola, Decumbens e Brizanta, enquanto que
outras gramíneas foram implantadas em poucos anos, como a Dictioneura e a Setária e o Jaraguá.
Uma fazenda pode implantar pequenas áreas de pasto ao longo dos anos, implicando em maior
número de operações de implantação (limpeza, roçada, destoca, etc.), ou implantar áreas maiores
em poucos anos, como no caso da Dictioneura, onde o total de 1.505 ha foi implantado por três
fazendas, em apenas três operações realizadas em dois dos 29 anos cobertos pelos dados.
Tabela 5.8 – Área total e média de pastagem cultivada, número total de fazendas que implantaram
cada espécie de pastagem, total de operações de implantação e
total de anos de implantação, 1964-1997.
aceitação, mas isso não ocorreu com os capins Vencedor e Andropogon. O que se verifica na
Tabela 5.8, é que dessas gramíneas, somente o Marandu tem alguma expressão no Pantanal. A
Brachiaria humidicola tem se expandido no Pantanal principalmente por sua reconhecida
adaptação natural aos solos úmidos dominantes na região.
A Tabela 5.9 apresenta a área das diferentes pastagens implantadas nas décadas de 1970,
1980 e 1990 (até 1997), o número de operações realizadas para implantar as pastagens e as
fazendas envolvidas nessas operações. Os cálculos foram feitos em uma base anual, e isso é
refletido na descrição de alguns resultados, embora a tabela só apresente dados decenais. Observe-
se que só uma fazenda implantou pastagem cultivada antes de 1970 (50 ha de capim Tanzânia em
1964) e que em 1971 não houve operações de implantação de pastagens.
Tabela 5.9 – Área de pastagens cultivadas implantadas por espécie e por década, número de
operações de implantação realizadas e número de fazendas envolvidas.
Área Total
Pastagens
1970 1980 1990 s. d. Total Média Anos Faz.
Andropogon ha 904 10 914 102 9 10
# 16 1 17
Brizanta ha 5.008 11.784 2.161 18.953 1.185 16 45
# 24 48 5 77
Decumbens ha 2.447 2.559 4.840 1.800 11.646 582 20 29
# 8 18 15 3 44
Dictioneura ha 1.505 1.505 753 2 3
# 3 3
Humidicola ha 4.460 18.181 36.796 2.625 62.062 2.821 22 72
# 5 40 82 7 134
Colonião ha 2.970 11.025 2.000 4.679 20.674 1.378 15 17
# 2 19 3 3 27
Tanzânia ha 40 794 500 1.384 126 11 9
# 1 13 2 17
Jaraguá ha 1.500 82 230 1.812 362 5 5
# 2 1 2 5
Setaria ha 2.000 60 2.060 515 4 2
# 3 1 4
Outras ha 150 245 411 1.357 2.163 240 9 9
# 1 4 3 3 11
Total ha 11.527 39.140 59.324 13.132 123.173 4.106 30 98
% 9 32 48 11 100
Operações # 18 110 186 24 338 11 30 98
% 5 33 55 7 100 - - -
Fazendas # 16 79 138 14 - - 30 98
Fonte: Pesquisa direta.
s.d. = sem data; # = número de operações de implantação de pastagens. Média = é a média anual.
Notas: 50 ha de capim Tanzânia implantados em 1964 foram incluídos no total da gramínea; 1964 foi
considerado no total de anos (para efeitos dos cálculos das médias anuais), mas não os anos de 1965 a 1969;
“sem data” foi considerado como um ano para efeito de cálculos, de modo que o total de anos considerado é
de 30 anos. O total de operações pode ser maior do que o de fazendas (98), pois uma mesma fazenda pode
implantar diferentes gramíneas em um mesmo ano. Na década de 1990 o total de fazendas também é maior
que 98, pois uma mesma fazenda pode ter implantado pastagens em vários anos.
170
Brizanta: a partir de 1984 houve operações em todos os anos, embora a implantação desta
gramínea tenha iniciado em 1980; foram realizadas 77 operações em 16 dos 30 anos em estudo,
envolvendo 45 fazendas, que implantaram em média 1.185 ha por ano e um total de 18.953 ha; a
evolução da área e do número de operações ao longo dos anos não mostra tendência definida.
Decumbens: é uma das gramíneas de introdução mais antiga - 1970; as 29 fazendas que
implantaram esta pastagem realizaram 44 operações ao longo das três décadas, tendo sido
implantado um total de 11.646 ha, a uma média de 582 ha por ano. O número de operações foi
maior na década de 1980, mas nos anos 1990 foi implantada uma maior área; as operações da
década de 1970 ocorreram em apenas quatro dos dez anos.
Humidicola: o primeiro registro é de 1975, mas área mais relevante começou a partir de
1977, tendo sido implantada em todos os anos subseqüentes, exceto em 1981; em três dos 22 anos
em que houve operações foram implantadas mais de 5.000 ha desta gramínea, com o máximo em
1992, com 11.026 ha; foram realizadas 134 operações (das quais 82 na década de 1990), por 72
fazendas, que implantaram um total de 62.062 ha de humidicola, a uma média de 2.821 ha por ano.
Colonião: pouco mais da metade (53%) dos 20.674 ha com esta gramínea e
aproximadamente 70% das 27 operações foram realizadas na década de 1980, embora não haja
informação sobre o ano de implantação para uma percentagem relativamente alta do total: 23% ou
4.679 ha; nas décadas de 1970 e 1990 só houve operações em dois anos, com 14% e 10% do total,
respectivamente; como não há operações a partir de 1993, pode-se presumir que o uso desta
gramínea no Pantanal está sendo descontinuado.
Tanzânia: é a única gramínea com registro anterior a década de 1970 (50 ha em 1964),
embora não haja registro na década de 1970 e apenas uma ocorrência na década de 1980 (40 ha em
1988); por isso, a maior parte das 17 operações realizadas pelas 9 fazendas que implantaram este
pasto foram realizadas nos anos 1990, assim como quase 60% da área, particularmente nos anos de
1996 e 1997, com cerca de 23% e 30% da área com a gramínea, respectivamente; não há
informação quanto ao ano para cerca de 36% da área total.
171
Jaraguá: esta gramínea tem sido implantada irregularmente ao longo dos anos, com a
primeira operação (de um total de cinco) sendo realizada em 1974, e a última em 1997.
Setaria: aproximadamente 97% dos 2.060 ha desta gramínea foram implantados em três
anos da década de 1980 e os 3% restantes em 1992, num total de quatro operações realizadas por
duas fazendas.
Os principais métodos utilizados no Pantanal para limpeza das pastagens, tanto cultivadas
quanto nativas são a queima (uso controlado do fogo), a veda (ou descanso da pastagem), a
limpeza manual (com enxada, foice, etc.), a limpeza mecânica (feita com máquinas) e a limpeza
química (com herbicidas), empregados isoladamente ou combinados entre si.
172
Observa-se na Tabela 5.10 que na limpeza dos pastos nativos a queima e a veda estão entre
os métodos mais empregados, isoladamente ou combinados, sendo relativamente bastante
empregados de forma isolada, principalmente a queima. Nestes pastos a limpeza mecânica é mais
empregada que a limpeza manual quando se considera o uso combinado, mas não quando se
considera o uso isolado; a limpeza química é pouco empregada, e nunca isoladamente.
Com relação aos pastos cultivados, os métodos de limpeza são empregados principalmente
de forma combinada, com a queima e a limpeza química tendo pouca importância, tanto em
combinação quanto isoladamente, particularmente a queima. Nestes pastos a limpeza mecânica é a
mais empregada, em combinação ou isoladamente; a seguir, em ordem de importância, vem a veda
(combinada) e a limpeza manual.
Os métodos de limpeza das pastagens cultivadas são utilizados para combater pelo menos
50 diferentes espécies de plantas invasoras das pastagens. O assa-peixe é a principal planta
invasora das pastagens cultivadas, sendo citado por 39 das 71 fazendas que responderam sobre o
assunto. Outras plantas bastante citadas são o fedegoso, a aromita, a guanxuma e a malva.
A lotação média das diferentes pastagens é apresentada na Tabela 5.11, e foi de 2,4
cabeças/ha para Tanzânia, de aproximadamente 2,0 cabeças/ha para Brizanta, Decumbens e
173
Humidicola, em torno de 1,5 cabeças/ha para Colonião e Jaraguá e de 1,1 cabeça/ha para
Andropogon.
Nas próximas seções, salvo quando indicado, as fazendas com área total de pastagem
cultivada menor que 50 ha e/ou com percentual de pasto cultivado menor que 5% em relação à área
total, serão consideradas como sendo propriedades sem pastagem cultivada. Do total da amostra,
98 fazendas possuem alguma área de pastagem cultivada; com base no critério acima, este número
se reduz para 72 fazendas. A área total média de pastagem cultivada da amostra passa de 1.257 ha
(Tabela 5.8, p.167) para 1.650 ha, em decorrência dessa modificação, e o número total de fazendas
sem pastagens cultivadas altera-se de 22 para 48 fazendas. A maioria das 26 fazendas agora
consideradas “fazendas sem pasto cultivado”, só possui piquetes com pastagem cultivada,
justificando a alteração para efeito de análise. Os resultados gerais apresentados acima não se
alteram com essa modificação. Dos resultados anteriores, talvez apenas os da Tabela 5.4 (p.163)
mereçam destaque, pois embora a tendência geral permaneça, a área média sujeita a enchentes
diminui com a mudança, enquanto a área média útil para produzir na cheia aumenta, para os dois
174
tipos de fazendas (com e sem pastagem cultivada). Essas alterações estão apresentadas na Tabela
5.12.
Tabela 5.12 – Área total média, área média potencialmente sujeita a enchentes e área média
produtiva nos períodos de cheia e seca do Pantanal1, para fazendas
consideradas com e sem pastagem cultivada 2.
G. Rebanho Bovino
A raça predominante é a Nelore, criada por 102 (86%) das 118 fazendas que responderam
a esta questão. As demais fazendas criam o Nelore com outra raça ou raças, exceto duas delas, que
ao invés do Nelore criam as raças Brangus e Tucura (bovino pantaneiro).
Existem três fases de produção distintas na pecuária de corte, a cria, a recria e a engorda,
que podem ser combinadas resultando em seis alternativas de produção (especialização): cria, cria-
recria, cria-recria-engorda, recria, recria-engorda e engorda. A fase produtiva dominante é a cria,
conforme mostra a Tabela 5.13, realizada por quase 47% das 120 fazendas. As outras duas opções
com elevada participação de fazendas sempre envolvem a cria: são a cria-recria, com 22,5% das
fazendas e o ciclo completo, de cria-recria-engorda, com 20% das fazendas. Assim, essas três
alternativas produtivas concentram quase 90% dos casos. As fazendas com pastagem cultivada
tendem a realizar mais o ciclo completo (25%) e as fases de recria-engorda (8%) e engorda (6%),
do que as fazendas sem pastagem cultivada (13%; 0%; e 2%, respectivamente).
175
Total de Fazendas
Principal Fase Com pasto Sem pasto
Total
de Produção cultivado cultivado
# % # % # %
C 28 39 28 58 56 47
CR 16 22 11 23 27 22
CRE 18 25 6 13 24 20
R 0 0 2 4 2 2
RE 6 8 0 0 6 5
E 4 6 1 2 5 4
Total 72 100 48 100 120 100
Fonte: Pesquisa direta.
Legenda: C = cria; R = recria; E = engorda.
A maior parte das fazendas separa o rebanho em três categorias, sendo também muito
comum a separação em duas, quatro e oito categorias. Neste último caso, todas as categorias do
rebanho são separadas. Separar o rebanho em apenas uma categoria significa, na verdade, separar
176
uma das categorias do restante do rebanho. (Algumas das respostas (15 no total) foram que o
rebanho é separado em cria, recria e engorda (e combinações), que foram consideradas como uma,
duas ou três categorias na Tabela 5.14. Isto é, a cria foi considerada uma categoria, sem tentativa
de desmembrar em touros, vacas de crias e bezerros/as, e o mesmo para as demais fases produtivas.
Nesses casos, a fazenda possui invernadas de cria, ou de recria, etc.).
A Tabela 5.15 mostra a composição média do rebanho bovino obtida no presente estudo e
a compara com a informação da literatura, obtida em levantamento via questionário realizado nas
sub-regiões da Nhecolândia e do Paiaguás por Cadavid Garcia (1986) em 1983. Observa-se uma
redução no número de touros, vacas de cria, novilhas de 2-3 anos e bois de mais de três anos. No
caso dos touros esta redução foi de quase 30% (o que pode indicar uma melhora na relação
touro:vaca) e para os bois de mais de três anos, de cerca de 17% (indicando talvez uma redução na
fase de engorda). Nas demais categorias a variação foi positiva, particularmente nas duas
categorias de novilhos (embora a análise seja prejudica por não haver informação separando as
idades dos novilhos no estudo anterior) e nos bezerros (quase 14%).
3) Trabalhos de gado
A maioria das fazendas do Pantanal (46%; n = 92) realiza dois trabalhos de gado por ano
(Tabela 5.16), principalmente nos meses de maio e novembro (15%), julho e dezembro (10%) ou
junho e dezembro (7%). Aproximadamente 21% das fazendas realizam três trabalhos de gado por
ano e 14%, quatro trabalhos. Cerca de 11% das fazendas realiza apenas um trabalho de gado por
ano, principalmente em maio, dezembro e junho ou julho. Considerados individualmente, os meses
de dezembro, maio, novembro e junho, nesta ordem, são os meses em que mais se desenvolve
trabalhos de gado no Pantanal.
De um total de 112 fazendas, cerca de metade (57 fazendas ou 51%) faz movimentação do
rebanho devido exclusivamente ao alagamento (Tabela 5.17). Das fazendas sem pastagem
cultivada, 60% movimenta o rebanho devido ao alagamento, ao passo que das fazendas com
pastagem cultivada, apenas 44% o fazem (Tabela 5.17). As principais categorias animais
movimentadas nesta época (cheia) estão apresentadas na Tabela 5.18, onde se observa que 46%
fazendas que deram informação transportam todos os animais e 10% transportam só as vacas de
cria. O destino desses animais são áreas mais altas, não alagáveis, dentro ou fora do Pantanal,
podendo ou não ser na própria propriedade (mesmo quando fora do Pantanal), e em mais de uma
propriedade, ou ainda, para venda (Tabela 5.19) 16.
16
Informação dada voluntariamente nos questionários mostra que pelo menos 15% das 26 fazendas que
movimentam os animais dentro do Pantanal, o fazem na mesma propriedade.
178
Tabela 5.17 – Total de fazendas que realizam movimentação do rebanho devido ao alagamento,
para fazendas com e sem pastagem cultivada.
Fazendas
Categorias Animais
Com pasto Sem pasto Total
Movimentadas
cultivado (#) cultivado (#) # %
Todos os animais 7 13 20 46
Vacas de cria 2 2 4 9
Novilhas e bois + 3 anos 2 1 3 7
Vacas e bezerros 2 0 2 5
Touros 2 0 2 5
Cria 0 2 2 5
Bois + 3 anos 1 1 2 5
Outras 4 4 8 18
Total 20 23 43 100
Fonte: Pesquisa direta.
Fazendas
Destino dos Animais
# %
Parte alta, dentro do Pantanal 26 46,4
Parte alta, fora do Pantanal 11 19,6
Parte alta, dentro do Pantanal, ou para venda 6 10,7
Parte alta, dentro e fora do Pantanal, ou para venda 4 7,1
Parte alta, fora do Pantanal, ou para venda 3 5,4
Outros, não especificados 3 5,4
Venda 2 3,6
Parte alta, dentro e fora do Pantanal 1 1,8
Total 56 100,0
Dentro do Pantanal 32 57,1
Fora do Pantanal 14 25,0
Venda 15 26,8
Fonte: Pesquisa direta.
179
A movimentação do rebanho dentro do Pantanal (com e sem a opção de venda) é feita por
57% das fazendas, enquanto que a movimentação para fora do Pantanal, por 25% delas (Tabela
5.19). Das fazendas que não realizam venda devido ao alagamento, aproximadamente 46%
movimentam o rebanho internamente e 20% para fora do Pantanal. A opção de vender os animais
na época do alagamento ao invés de movimentá-los, é uma opção considerada por 23% das
fazendas, enquanto que a venda como alternativa preferencial corresponde a 3,6%, ou um total de
quase 27%.
Todas as fazendas fornecem sal ao rebanho, seja o sal comum (18% das fazendas), o
mineral (50%), uma mistura dos dois (18%), ou ambos (14%) em diferentes épocas do ano, sendo
fornecido a todos os animais, sem exceção. O sal é fornecido à vontade (uma ou duas vezes por
semana) por 78% das fazendas, sem freqüência definida (19%) ou somente na época seca (3%). O
sal comum e o mineral são misturados na proporção de 1:1 em 60% dos casos. O sal é fornecido
em cochos comuns (existentes em 90% das fazendas) ou cobertos (presentes em 28% das fazendas)
O Gráfico 5.2 mostra que na maioria das fazendas os bezerros nascem em um intervalo de
tempo que dura três meses, mas podendo variar de um até sete meses. (O ideal é concentrar o
nascimento dos bezerros o máximo possível). Cerca de 60% das fazendas concentram o
nascimento dos bezerros entre um e três meses (Gráfico 5.2), e as 40% restantes, entre quatro e sete
meses. A duração média do período de nascimento de bezerros foi de 3,4 meses, sendo maior para
as fazendas com pasto cultivado (3,8 meses), do que para as fazendas sem pastagens artificiais (2,8
meses).
180
Fazendas Duração
Período de Nascimento
# (meses)
Agosto a outubro 9 3
Julho a outubro 7 4
Agosto e setembro 6 2
Setembro 6 1
Setembro e outubro 6 2
Setembro a novembro 6 3
Junho a dezembro 5 7
Maio a julho 4 3
Junho a setembro 4 4
Subtotal 53 -
Total 98 -
Fonte: Pesquisa direta.
1
Os períodos não apresentados são com três respostas e menos.
25
22.3
20
17.4 17.7
15 13.1
10.1
10 8.5
5.1
5 4.0
1.5
0 0 0.3
0
JAN FEV MAR ABR MAI JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ
30
24
25 22
Número de fazend
20 17
15 13
10 8 7 7
0
1 2 3 4 5 6 7
Duração (meses)
Do total de 106 fazendas, 26,5% tem taxa de natalidade de bezerros entre 61% e 70%
(Gráfico 5.3). Outros dois intervalos com número relativamente alto de fazendas são entre 41% e
50%, com cerca de 23% das fazendas e entre 51 a 60%, com aproximadamente 19% das fazendas.
Fazendas com taxas de natalidade superior a 80% representam apenas 9,4% do total e somente uma
fazenda tem taxa superior a 90%. Um total de 32% das fazendas tem taxas de natalidade de
bezerros inferiores a 50%. A taxa média de natalidade foi de 61,5% (dp = 14,9), com mediana de
60% e moda de 50%. A taxa média de natalidade das fazendas com pastagem cultivada foi de
64,5% (n = 62) e a das fazendas sem pastagem cultivada, de 57,3% (n = 44).
30
26.5
25 22.6
18.9
Fazendas %
20
15 13.2
10 8.5
6.6
5 2.8
0
%
25 a 30 31 a 40 41 a 50 51 a 60
61 a 70 71 a 80 81 a 90
Na maioria das fazendas (aproximadamente 60%) os bezerros são desmamados entre sete e
dez meses de idade, notadamente aos 8 meses (22%) e aos 10 meses (16%) (Gráfico 5.4). As
desmamas aos sete e oito meses perfazem cerca de 39% das fazendas, e entre 10 e 12 meses,
aproximadamente 14% das fazendas. Raramente a desmama ocorre a idade superior a um ano.
Algumas fazendas (3%) desmamam os bezerros até os seis meses de idade. A idade média de
desmama calculada para o total da amostra foi de 8,8 meses.
A Tabela 5.21 mostra que as fazendas com pastagem cultivada desmamam bezerros em
idades menores do que as fazendas que só possuem pasto nativo. O percentual acumulado de
fazendas que desmamam bezerros até os oito meses de idade é maior para as fazendas com
182
pastagem cultivada (63,7%) do que para as fazendas sem pasto cultivado (28,6%), ocorrendo o
contrário a partir desta idade de desmama. Em termos de percentuais simples, as fazendas com
pasto cultivado têm sempre valores maiores do que as fazendas sem pasto cultivado até os oito
meses (exceto para a desmama de 5 a 6 meses), enquanto que para a desmama acima dos oito
meses de idade ocorre o contrário. A média calculada da idade média à desmama para fazendas
com pastagem cultivada foi de 8,5 meses, e para as fazendas sem pastagem cultivada, de 9,4 meses.
25
21.6
20
15.7
15 13.7
%
9.8
10 8.8
7.8
6.9
4.9
5 3.9
2.9
2.0
1.0 1.0
0
Meses
5a6 6 6a8 7 7e8 8 8 a 12
9 9 a 12 10 10 a 12 11 e 12 12 a 15
Tabela 5.21 – Idade média de bezerros à desmama para fazendas com e sem pastagem cultivada1.
Fazendas que desmamam até 50% dos bezerros nascidos representam 25% do total de 72
fazendas, das quais 5,6% têm taxas de desmama entre 20% e 40% (Gráfico 5.5). Fazendas com
taxa de desmama superior a 80% representam 1/3 do total (24 fazendas), e em quase 20% das
fazendas essa taxa é superior a 90%. Cinco fazendas desmamam 100% dos bezerros. Em metade
das fazendas a taxa de desmama é inferior a 70%.
Das 72 fazendas com informação, 43 tem pasto cultivado e nestas a taxa média de
desmama foi de 75,8%, enquanto que nas 29 fazendas sem pastagem cultivada, a média foi de
64,3%. A taxa média de desmama para o total da amostra foi de 71,2%.
25
19.4 19.4
20
16.7 16.7
Fazendas, %
15 13.9
10 8.3
5 2.8
1.4 1.4
0
%
11 a 20 21 a 30 31 a 40 41 a 50 51 a 60
61 a 70 71 a 80 81 a 90 91 a 100
Embora a literatura registre a idade à primeira cria no Pantanal aos 48 meses (Almeida,
1997), nossos resultados mostram que isso ocorre em apenas cerca de 15% das fazendas, ou no
máximo (considerando o percentual do intervalo de 36 a 48 meses) em 22,5% das fazendas
(Tabela 5.22). O que se observa na Tabela 5.22 é que em quase 70% das fazendas as novilhas
iniciam sua vida útil reprodutiva até os 36 meses de idade. No restante das fazendas (31%) a idade
à primeira ocorre entre os três e quatros anos. A maior freqüência de respostas (45%) foi para a
184
idade de 36 meses, indicando, portanto, que a vida útil reprodutiva da novilha inicia, em geral, a
partir dos três anos. A média para o Pantanal foi de 37 meses (dp = 5,9).
Na Tabela 5.23 são apresentados os resultados da idade à primeira cria para fazendas com
e sem pastagem cultivada. As fazendas com pastagens cultivadas tendem a ter suas novilhas
entrando na vida útil reprodutiva em idade inferior à das novilhas das fazendas sem pasto
cultivado. Por exemplo, na coluna de freqüência acumulada observa-se que a idade à primeira cria
ocorre entre 24 e 36 meses para cerca de 74% das fazendas com pastagem cultivada, enquanto que
para as fazendas sem pastagem cultivada este percentual é de 62%. E novilhas tendo sua primeira
cria aos 48 meses de idade ocorrem em 10% das fazendas com pasto cultivado, mas em 20% das
fazendas sem pastagem cultivada.
5) Estação de monta
Cerca de 55% das fazendas utilizam estação de monta (Tabela 5.24), que pode durar de
três a nove meses, mas as maiores freqüências são cinco e seis meses (31% e 19% das fazendas,
respectivamente), que representam 50% do total. Em 25% das fazendas a duração da estação de
monta é inferior a cinco meses e nas 25% restantes, superior a seis meses. A duração média foi de
5,6 meses. Os períodos de estação de monta mais freqüentemente citados foram de setembro a
janeiro (12% das fazendas), de agosto a dezembro (10%) e de setembro a fevereiro (7%).
185
Tabela 5.23 – Idade à primeira cria para fazendas com e sem pastagem cultivada1.
Duração Fazendas
da monta
(meses) # %
3 5 8,2
4 9 15,5
5 18 31,0
6 11 19,0
7 6 10,4
8 8 13,8
9 1 1,7
Subtotal 58 100,0
12 48 45,3
Total 106 -
Fonte: Pesquisa direta.
6) Taxas de mortalidade
Tabela 5.25 – Duração da estação de monta para fazendas com e sem pastagem cultivada1.
Total de Fazendas
Taxa de
Animais Animais
Mortalidade Bezerros
1-3 anos Adultos
%
# % # % # %
0a<1 2 2 21 23 32 35
1a5 64 64 66 72 57 62
6 a 10 25 25 4 4 3 3
11 a 20 6 6 1 1 0 0
21 a 35 3 3 0 0 0 0
Total 100 100 92 100 92 100
Fonte: Pesquisa direta.
187
Ao contrário dos que acontece com os bezerros, a proporção de fazendas com animais com
mortalidade zero ou próxima de zero é alta, de 23% para os animais de 1 a 3 anos e de 35% para os
animais adultos. Em aproximadamente 71% das fazendas a taxa de mortalidade de animais de 1 a 3
anos é de até 2%; para os animais adultos, as fazendas com mortalidade neste intervalo (< 1 a 2%)
representam 78% do total. Acima de 5% a mortalidade é muito baixa: apenas 5% das fazendas
registram mortalidade superior para os animais de até três anos e somente 3% delas para o caso dos
animais adultos.
Para o Pantanal, a taxa média de mortalidade de bezerros foi de 6,2%, enquanto que para
os animais de 1 a 3 anos e adultos, foi de 2,1% e 1,7%, respectivamente. Nas fazendas com
pastagem cultivada as taxas médias de mortalidade de bezerros, de animais de 1 a 3 anos e de
animais adultos foram, respectivamente, de 5,7%, 2,1% e 1,4%, enquanto que para as fazendas sem
pastagem cultivada esses valores foram de 6,9%, 2,0% e 2,0% (Gráfico 5.6).
8
6.9
7
6 5.7
5
%4
3
2.1 2.0 2.0
2 1.4
1
0
Fazendas com pasto cultivado Fazendas sem pasto cultivado
Aproximadamente 88% das fazendas descartam as vacas com idades entre 8 e 12 anos,
com as maiores freqüências sendo 10 anos (35%) e 12 anos (21%) (Tabela 5.27). Nesse mesmo
intervalo de idade – 8 a 12 anos – cerca de 75% das fazendas descartam os touros, com as maiores
freqüências sendo 10 anos (28%) e 8 anos (21%). A idade média de descarte de vacas foi de 10,3
anos, e a de touros, de 9 anos. Enquanto as vacas raramente são descartadas com menos de oito
anos (cerca de 4% das fazendas descartam vacas entre cinco e sete anos), a proporção de fazendas
que descartam touros com menos de oito anos é de 21% das fazendas, pois algumas delas
188
descartam touros com menos de cinco anos de idade (entre cinco e sete anos de idade ocorre
descarte de touros em 15% das fazendas). O contrário verifica-se com descartes acima dos 12 anos:
cerca de 8% das fazendas descartam vacas acima dessa idade, enquanto que para os touros esse
percentual é de 4%.
Total de Fazendas
Idade de descarte
Vacas Touros
Anos Meses # % # %
3,5 a 7 42 a 84 4 3,9 15 21,1
8 96 12 11,6 22 21,2
9 108 11 10,7 7 6,7
10 120 36 34,9 29 27,9
11 132 10 9,7 7 6,7
12 144 22 21,4 13 12,5
13 a 15 156 8 7,8 4 3,9
Total - 103 100,0 104 100,0
Média - 10,3 - 9,0 -
Fonte: Pesquisa direta.
A taxa de reposição de touros variou de 2% a 30% ao ano, com uma média de 14,4%, o
que significa renovar todo o plantel de touros a cada sete anos, aproximadamente (Tabela 5.28).
Em cerca de 40% das fazendas a taxa é de 10% - ou renovação total do plantel a cada 10 anos - e
em aproximadamente 23% das fazendas a taxa é de 20% - uma renovação do plantel a cada cinco
anos.
Tempo
Reposição Total de Fazendas para repor
de touros o plantel
%
# % Anos
2a5 7 10,8 20 a 50
6 a 101 27 41,5 10 a 17
11 a 15 7 10,8 7a9
16 a 202 17 26,1 5a6
21 a 25 2 3,1 4a5
26 a 30 5 7,7 3a4
Total 65 100,0 -
Fonte: Pesquisa direta.
1
26 das 27 fazendas tem taxa de 10%.
2
15 das 17 fazendas tem taxa de 20%.
189
As fazendas com pastagem cultivada descartam as vacas com idade média de 10,1 anos, e
os touros, com idade média de 8,6 anos; para as fazendas sem pastagem cultivada esses valores
são, respectivamente, 10,7 e 9,6 anos. A taxa de reposição de touros nas fazendas com pastagem
cultivada foi de 12,7% e nas fazendas sem pastagem cultivada, de 17,6%; a taxa média do total da
amostra foi de 14,4%. As fazendas com pastagem cultivada têm idade média de descarte de vacas e
touros, assim como taxa média de reposição de touros, abaixo das médias regionais, enquanto que
nas fazendas sem pastagem cultivada esses valores estão acima da média.
A relação touro:vaca variou de 1 touro para 9 noves vacas (1:9) até 1:40, com quase 60%
das fazendas no intervalo entre 1:16 a 1:25 (Tabela 5.29). As relações touro:vaca mais
freqüentemente usadas foram 1:20, com 22,5% das fazendas, 1:25, com 21% das fazendas e 1:15,
com 12% das fazendas, ou 55% do total de propriedades. Somente 6 fazendas utilizam uma relação
touro:vaca superior a 1:30 e apenas uma fazenda uma relação inferior a 1:10. A média regional foi
de 1 touro para 18 vacas. A relação touro:vaca nas fazendas com pasto cultivado foi de 1:20 em
média (n = 65) e para as fazendas sem pasto cultivado, de 1:17 (n = 42).
Aproximadamente metade dos fazendeiros utiliza outras terras para produzir (55 fazendas;
n = 112) e metade não utiliza (57 fazendas) (Tabela 5.30). Essas terras são próprias em 70% dos
casos e usadas exclusivamente para pecuária: 18% as utilizam para pecuária em pasto nativo, 47%
190
para pecuária em pasto cultivado e 35% para pecuária tanto em pastos nativos quanto cultivados (n
= 51 fazendas). Os pastos nativos são usados principalmente para a cria e a recria (86%),
notadamente a cria-recria (39%) e a recria (27%). Já os pastos nativos dessas terras são utilizados
principalmente com as finalidades de recria e engorda (69%).
Utilização de outras
propriedades
Sim Não Total
55 57 112
49% 51% 100%
Finalidade
Pecuária = 100%
Em pasto Em Em pasto
cultivado Ambos Nativo
24 18 9
47% 35% 18%
Fonte: Pesquisa direta.
J. Administração e Mão-de-Obra
A maioria das fazendas (67%) tem de 2 a 4 peões, com média de 4 e moda de 3 peões
(Tabela 5.31). Relativamente poucas fazendas têm mais de 10 peões, e nenhuma mais de 15. O
salário médio dos peões e do capataz foi, respectivamente, de R$ 188,69 e R$ 358,22 (referente ao
ano de 1997, quando o salário mínimo rural era de R$ 156,80). Os peões têm – como é costume
dizer na região – “o salário livre de despesas”, o que significa que a alimentação e a moradia estão
incluídas no salário recebido. Já os capatazes têm diversas outras formas de pagamento, além do
salário livre de despesas, às vezes combinadas: percentual sobre os bezerros desmamados (em
dinheiro ou não, em geral no final do ano); quantidade pré-determinada de bezerros ao final do
ano; percentual sobre os bezerros vendidos; autorização para criar animais na fazenda; salário
extra, comissão ou gratificação no final do ano (em espécie ou em número de novilhas, por
exemplo); gratificação por ano de serviço; pagamento por serviços como inseminação ou doma de
cavalos; percentual sobre o leite; etc.
dos trabalhos de gado por 56% das fazendas (para vacinação, castração, etc.), para aceiros (10%),
limpeza de pasto e manutenção de cercas (5%), e outros serviços não especificados (29%).
Número de Fazendas
peões # %
1 11 9,6
2 22 19,3
3 26 22,8
4 19 16,7
5 9 7,9
6 a 10 20 17,5
11 a 15 7 6,2
Total 114 100,0
Fonte: Pesquisa direta.
Tabela 5.32 – Informações sobre mão-de-obra em fazendas com e sem pastagem cultivada.
Mão-de-obra
Com pastagem Sem pastagem Total
Especificação
cultivada cultivada Faz.
Permanente Média # Média # #
Nº. de peões 4,5 68 4,1 46 114
Salário peões (R$) 196,00 67 177,56 46 113
Salário capataz (R$) 364,11 63 348,45 38 101
Temporária Média # Média # #
Quantidade/ano 6,5 38 3,7 29 67
Salário/dia 9,29 41 8,35 33 74
Utilização # % # % #
Utiliza 53 81,5 36 80,0 89
Não utiliza 12 18,5 9 20,0 21
Total 65 100,0 45 100,0 110
Fonte: Pesquisa direta.
A Tabela 5.32 compara as fazendas com e sem pastagem cultivada em termos da mão-de-
obra permanente e temporária. As fazendas com pastagem cultivada pagam salários maiores para
peões e capatazes, empregam mais peões, em média, e contratam mais empregados temporários,
pagando a estes salários maiores do que as fazendas sem pastagem cultivada. Mas o percentual de
fazendas que costuma contratar mão-de-obra temporária é equivalente em ambos os tipos de
fazenda, de cerca de 80% do total. A quantidade média de empregados temporários contratados por
192
ano pelas fazendas com pastagem cultivada (6,5 por ano) é maior do que o número médio de peões
(4,5) nessas fazendas, enquanto que nas fazendas sem pastagem cultivada ocorre o contrário.
Aproximadamente 36% das fazendas não utilizam qualquer tipo de assistência técnica,
cerca de 30% utilizam eventualmente, e 34% fazem uso desse serviço. Esse serviço é
principalmente privado (58% das fazendas) e da própria fazenda (21%) (Tabela 5.33). As fazendas
com pastagem cultivada utilizam mais os serviços de assistência técnica do que as fazendas sem
pastagem cultivada, tanto rotineiramente quanto eventualmente (Tabela 5.34). A assistência técnica
Utilização de Fazendas
Assistência Técnica # %
Utiliza 40 34
Não utiliza 42 36
Eventualmente 35 30
Total 117 100
Origem # %
Pública 6 9
Privada 39 58
Da própria fazenda 14 21
Outras 8 12
Total 67 100,0
Fonte: Pesquisa direta.
Tabela 5.34 – Informações sobre assistência técnica em fazendas com e sem pastagem cultivada.
Assistência Técnica
Com pastagem Sem pastagem Total
Especificação
cultivada cultivada Faz.
Utilização # % # % #
Utiliza 27 38,6 13 27,7 40
Não utiliza 21 30,0 21 44,6 42
Eventualmente 22 31,4 13 27,7 35
Total 70 100,0 47 100,0 117
Origem # % # % #
Pública 4 9,5 2 8,0 6
Privada 23 54,8 16 64,0 39
Da própria fazenda 9 21,4 5 20,0 14
Combinações 6 14,3 2 8,0 8
Total 42 100,0 25 100,0 67
Fonte: Pesquisa direta.
193
K. Custos
As Tabelas 5.35 a 5.41 apresentam, respectivamente, (a) os custos com mão-de-obra, (b)
manutenção e reparos, (c) aquisição de insumos, (d) aluguéis e arrendamentos, (e) despesas
bancárias e impostos, (f) despesas com compra e venda de gado e (g) despesas com serviços de
terceiros. Os valores apresentados nessas tabelas são as médias, em reais (a preços correntes de
1997) e em percentagem sobre cada rubrica, para as fazendas com e sem pastagem cultivada e para
o total da amostra. Por apresentarem valores médios, os valores totais das tabelas não são obtidos
pela soma dos valores das linhas e colunas. Os custos totais estão consolidados na Tabela 5.42,
com valores em reais (a preços correntes de 1997) e em percentagem sobre o custo total. A Tabela
5.43 atualiza os valores da Tabela 5.42 para 2007, usando o índice geral de preços, disponibilidade
interna (IGP-DI), elaborado pela Fundação Getúlio Vargas, e os converte para dólares de 2007,
usando o dólar médio deste ano (1 US$ = R$ 1,95). Estas tabelas apresentam, ainda, uma coluna
central com as diferenças percentuais entre os custos das fazendas com e sem pastagem cultivada
(indicando, quando os percentuais são positivos, que os valores monetários médios das fazendas
com pastagem cultivada são maiores, e quando negativos, o contrário).
Observam-se nessas tabelas que as fazendas com pastagem cultivada têm os maiores
valores médios de custos em todas as rubricas, em relação às fazendas sem pastagem cultivada,
exceto para serviços de terceiros, onde a situação se inverte. As maiores diferenças entre os dois
tipos de fazendas estão nas despesas agrupadas como “juros e impostos” (Tabela 5.39, p.196) e
como “aluguéis e arrendamentos” (Tabela 5.38, p.195), cujas médias são cerca de 150% maiores
nas fazendas com pastagem cultivada. Nas despesas com manutenção e reparos (Tabela 5.36) as
médias são 123% maiores, e nos gastos com insumos (Tabela 5.37), de aproximadamente o dobro.
As despesas com compra e venda de gado (Tabela 5.40, p.196) têm médias quase 80% maiores nas
fazendas com pastagem cultivada, e as despesas com mão-de-obra (Tabela 5.35), quase 42%
maiores. Por outro lado, a média de gastos com serviços de terceiros nas fazendas com pastagem
cultivada é cerca de 20% menor (Tabela 5.41, p.197). O resultado líquido dessas diferenças é que
194
nas fazendas com pastagem cultivada a média do custo operacional total (Tabelas 5.42 e 5.43,
p.198-199) é o dobro da média das fazendas sem pastagem cultivada.
A alimentação do gado é o item de maior participação nas despesas com insumos das
fazendas com pastagem cultivada (47%), particularmente o sal mineral (38%), enquanto que nas
fazendas sem pastagem cultivada os combustíveis têm maior participação (34%) (Tabela 5.37).
195
Nestas fazendas os custos estão distribuídos mais uniformemente: combustíveis, 34%; alimentação
para o gado, 30%; e medicamentos para o gado, 26%. As despesas com sementes e mudas são
similares nos dois tipos de fazenda (ao redor de 10%). A média do gasto total com insumos nas
fazendas com pastagem cultivada (R$ 26.771,00) é o dobro da média das fazendas sem pastagem
cultivada (R$ 13.458,00), com o sal mineral e as rações tendo médias em torno de 4,2 e 3,8 vezes
maiores (317% e 278%), respectivamente. O gasto com combustíveis para aviões é a única despesa
cuja média é inferior à média das fazendas sem pastagem cultivada (cerca de 40%).
Tabela 5.38 – Custo anual (1997) com aluguel de máquinas e equipamentos e arrendamento de
terras (médias em reais e percentagem sobre os aluguéis).
A Tabela 5.39 mostra que os juros e as despesas bancárias são os itens com maior
participação no total desta rubrica, com quase 50% em cada tipo de fazenda. Os impostos também
têm participação elevada, mas menor nas fazendas com pastagem cultivada (36%). Embora tendo
menor participação na distribuição desses custos nos dois tipos de fazendas, as despesas com taxas
das fazendas com pastagem cultivada têm médias quase 2,5 vezes maiores (R$ 3.731,00 versus R$
1.525,00).
197
Tabela 5.39 – Custo anual (1997) com pagamento de juros, bancos, taxas e impostos
(médias em reais e percentagem sobre as despesas).
As despesas com transporte de gado representam quase 90% do total de despesas com
compra e venda de gado das fazendas sem pastagem cultivada (Tabela 5.40), enquanto que nas
fazendas com pastagem cultivada este percentual é de 53%. As médias de despesas com compra e
venda de gado entre as fazendas com e sem pastagem apresentam grande variação (ver coluna
C/S). Esta rubrica representa, grosso modo, apenas cerca de 3% do custo operacional total das
fazendas (Tabela 5.43, p.199).
Tabela 5.40 – Custo anual (1997) com despesas para compra e venda de gado
(médias em reais e percentagem sobre as despesas).
O custo anual com serviços de terceiros está apresentado na Tabela 5.41. Este é o único
item dos custos em que o total de despesas das fazendas sem pastagem cultivada tem valores totais
médios maiores (20%) do que o das fazendas com pastagem cultivada. Mesmo assim, com relação
198
ao frete de insumos, a média das despesas das fazendas com pastagem cultivadas é 75% maior. Os
serviços contábeis representam a maior parte dos custos desta rubrica nos dois tipos de fazenda
(55% para as fazendas com pastagem cultivada e 62% para as fazendas sem pastagem cultivada).
A Tabela 5.42 consolida os resultados das tabelas de custos acima, mas apresenta os
percentuais em relação ao custo total. A mão-de-obra permanente é o item de maior participação
relativa no custo total, respondendo por cerca de ¼ do total no caso das fazendas sem pastagens
cultivadas e por cerca de 1/6 no caso das fazendas com pastagem cultivada. Combustíveis e
lubrificantes (8,6%), alimentação (7,6%) e medicamentos (6,7%) para o gado, e manutenção de
pastagens nativas (6,4%) são os itens subseqüentes com maior participação relativa no custo total
das fazendas sem pastagem cultivada. Para as fazendas com pastagem cultivada, outros itens
bastante representativos, além da mão-de-obra permanente, são alimentação para o gado (12,6%),
manutenção de pastagens (11,9%) e de benfeitorias (6,5%), combustíveis e lubrificantes (6,5%) e
despesas bancárias (6,2%).
Na Tabela 5.43 somente os totais de cada rubrica são apresentados e os valores foram
atualizados e convertidos para dólares de 2007. As despesas com mão-de-obra, manutenção e
reparos, e insumos, representam cerca de 80% do total de despesas, tanto das fazendas com
pastagem cultivada quanto das fazendas sem pastagem cultivada. Nas fazendas sem pastagem
cultivada a mão-de-obra é a rubrica de maior participação no custo total (28%), seguida pelos
custos com manutenção e reparos (27%) e pelos insumos (25%). Nas fazendas com pastagem
cultivada a maior participação relativa é dos custos com manutenção e reparos (32%), seguida dos
insumos (27%) e da mão-de-obra (21%). As rubricas com menor participação no custo total são as
199
despesas com aluguéis, com compra e venda de gado e com serviços de terceiros. Os juros e
impostos têm participação intermediária (9% e 12%).
Em % sobre o custo
Valores médios em reais C/S 1 total
Custos
(%)
Com Sem Total Com Sem Total
Mão-de-obra permanente 17.774 13.574 16.012 30,94 18,09 25,62 20,17
Mão-de-obra temporária 3.004 1.905 2.583 57,65 2,88 2,38 2,73
Total de mão-de-obra 21.034 14.831 18.431 41,83 20,97 28,00 22,90
Manutenção de benfeitorias 11.128 5.763 9.177 93,08 6,54 5,67 6,30
Manutenção de cercas 4.649 3.397 4.165 36,87 3,59 4,85 3,90
Manutenção de pastagens 16.834 6.545 13.515 157,19 11,87 6,44 10,45
Manutenção de máq. e motores 6.025 3.216 5.038 87,35 4,85 4,12 4,65
Manutenção de veículos 6.645 2.720 5.235 144,35 4,57 3,08 4,18
Manutenção de aeronaves 8.700 8.671 8.682 0,33 0,58 2,99 1,18
Total de manut. e reparos 32.100 14.382 24.665 123,20 32,00 27,15 30,66
Medicamentos 5.108 2.905 4.213 75,83 4,88 6,73 5,27
Alimentação (sal + ração) 12.763 3.070 8.820 315,71 12,61 7,65 11,49
Sementes e mudas 6.460 4.066 5.776 58,85 2,71 2,40 2,63
Combustíveis e lubrificantes 7.014 5.075 6.252 92,54 6,50 8,62 6,94
Total de insumos 26.771 13.458 21.184 98,93 26,70 25,40 26,33
Aluguel máq. e equipamentos 10.919 4.925 9.421 121,71 2,01 0,80 1,68
Arrendamento terras 6.248 3.947 5.097 58,29 0,38 0,63 0,45
Total de aluguéis 11.144 4.436 8.705 151,23 2,39 1,43 2,13
Juros, bancos, impostos 14.476 9.220 12.993 57,00 6,22 4,07 5,62
Taxas 3.731 1.525 3.101 144,69 1,72 0,74 1,45
Impostos (ITR, ICM, etc.) 5.676 2.801 4.500 102,60 4,52 4,05 4,40
Total de juros e impostos 15.044 5.961 11.351 152,36 12,46 8,86 11,47
Transporte de gado p/ venda 2.684 3.07 2.871 -12,56 0,66 1,85 0,99
Transporte de gado comprado 2.764 1.988 2.443 39,08 0,72 0,96 0,79
Outras despesas c/ gado 5.786 1.326 4.299 336,32 1,24 0,37 1,00
Total compra/venda de gado 5.895 3.299 4.719 78,67 2,62 3,18 2,78
Fretes de insumos 2.306 1.315 1.877 75,43 0,60 0,69 0,63
Escritório contábil e advocatício 2.603 3.031 2.992 -14,12 1,67 4,25 2,39
Assistência técnica 1.910 3.221 2.285 -40,71 0,59 1,04 0,71
Total de serviços de terceiros 3.735 4.655 4.094 -19,77 2,86 5,98 3,73
Custo operacional total 105.501 52.977 83.460 99,14 100,00 100,00 100,00
Total de fazendas 2 65 47 112 - 58 41 100
Fonte: Pesquisa direta.
1
Diferença percentual entre os custos das fazendas com e sem pastagem cultivada.
2
Número de fazendas que consolidaram o valor total.
Com = média das fazendas com pastagem cultivada. Sem = média das fazendas sem pastagem cultivada.
Total = total de fazendas da amostra.
200
A média do custo operacional total das fazendas com pastagem cultivada, a preços
constantes de 2007, foi de US$ 135.691, aproximadamente o dobro da média das fazendas sem
pastagem cultivada, que foi de US$ 68.137 (Tabela 5.43).
Em % sobre o custo
Valores médios em US$ C/S 2 total
Custos
(%)
Com Sem Total Com Sem Total
Mão-de-obra 27.053 19.075 23.705 41,8 20,97 28,00 22,90
Manutenção e reparos 41.286 18.498 31.723 123,2 32,00 27,15 30,66
Insumos 34.432 17.309 27.246 98,9 26,70 25,40 26,33
Aluguéis e arrendamentos 14.333 5.705 11.196 151,2 2,39 1,43 2,13
Juros e impostos 19.349 7.667 14.600 152,4 12,46 8,86 11,47
Compra e venda de gado 7.581 4.243 6.070 78,7 2,62 3,18 2,78
Serviços de terceiros 4.803 5.987 5.265 -19,8 2,86 5,98 3,73
Custo operacional total 135.691 68.137 107.343 99,1 100,00 100,00 100,00
Total de fazendas 3 65 47 112 - 58 42 100
Total de fazendas da amostra 72 48 120 - 60 40 100
Fonte: Pesquisa direta.
1
Valores em reais de 1997 atualizados para 2007 pelo IGP-DI e convertidos para dólares (1 US$ = R$ 1,95
em 2007).
2
Diferença percentual entre os custos das fazendas com e sem pastagem cultivada.
3
Número de fazendas que consolidaram o valor total.
Com = média das fazendas com pastagem cultivada. Sem = média das fazendas sem pastagem cultivada.
Total = total de fazendas da amostra.
L. Receitas
A maior parte das receitas de vendas de animais é proveniente da venda de bois de mais de
três anos, vacas de cria e bezerros, tanto para as fazendas com pastagens cultivadas quanto para as
fazendas sem pastagens cultivadas (Tabela 5.44). As vendas de bois representam 48% do total das
receitas de vendas de animais para as fazendas com pastagem cultivada e 40% do total para as
fazendas sem pastagem cultivada. A média de receitas de venda de animais para as fazendas com
pastagem cultivada é cerca de 80% maior do que a média dessas receitas para as fazendas sem
pastagem cultivada (coluna C/S).
202
Tabela 5.45 – Receitas anuais (1997) de transferência de animais para outras fazendas
(médias em reais e percentagem sobre as transferências).
Em % sobre as
Categorias Valores médios em reais C/S 1 transferências
Animais (%)
Com Sem Total Com Sem Total
Touros 7.411 6.233 7.149 18,89 1,69 0,82 1,40
Vacas de cria 58.786 39.915 53.394 47,28 19,20 10,51 16,32
Bezerros/as 72.769 61.323 69.499 18,67 23,76 16,15 21,24
Novilhas 1-2 anos 43.743 26.987 36.562 62,09 5,71 5,33 5,59
Novilhas 2-3 anos 26.134 52.171 33.573 -49,91 4,27 6,87 5,13
Novilhos 1-2 anos 116.425 28.177 77.204 313,19 19,01 7,42 15,17
Novilhos 2-3 anos 151.817 53.322 92.720 184,72 19,83 21,07 20,24
Bois + 3 anos 39.981 120.822 75.911 -66,91 6,53 31,82 14,91
Total transfer. 170.132 168.739 169.668 0,83 100,00 100,00 100,00
Total de fazendas 2 18 9 27 - 67 33 100
Fonte: Pesquisa direta.
1
Diferença percentual entre as receitas das fazendas com e sem pastagem cultivada.
2
Número de fazendas que consolidaram o valor total.
Com = média das fazendas com pastagem cultivada. Sem = média das fazendas sem pastagem
cultivada. Total = total de fazendas da amostra.
As vendas de bois de mais de três anos e de vacas de cria são os itens que individualmente
tem maior participação relativa na receita total para os dois tipos de fazendas (Tabela 5.46). A
participação das vendas de vacas de cria é similar nos dois tipos de fazendas, de aproximadamente
13%; a participação dos bois, entretanto, tem maior peso nas fazendas com pastagem cultivada
(32% da receita total) do que nas fazendas sem pastagem cultivada (24%). A transferência de bois
de mais de três anos no caso das fazendas sem pastagem cultivada, também tem participação
203
elevada (12%); em seguida está a venda de bezerros, nos dois tipos de fazenda, com cerca de 8%
do total.
Aproximadamente 2/3 da receita total das fazendas com pastagem cultivada é proveniente
da venda de animais, 28% da transferência de animais para outras fazendas e 5% são receitas
diversas (Tabela 5.47). Para as fazendas sem pastagem cultivada o padrão é o mesmo, com as
receitas de venda de animais sendo de 60% do total, as receitas de transferência de 37% do total e
as receitas diversas de 3% do total.
Em % sobre a receita
Categorias Valores médios em reais C/S 1 total
Animais (%)
Com Sem Total Com Sem Total
Touros 2.574 5.627 4.440 -54,26 0,17 1,50 0,53
Vacas de cria 40.450 21.949 32.990 84,29 13,82 13,34 13,70
Bezerros/as 36.633 21.624 30.410 69,41 8,12 8,94 8,34
Novilhas 1-2 anos 15.473 10.447 13.798 48,11 2,29 2,03 2,22
Novilhas 2-3 anos 34.747 54.969 39.414 -36,79 3,21 4,01 3,43
Novilhos 1-2 anos 24.591 25.771 25.063 -4,58 2,73 5,01 3,35
Novilhos 2-3 anos 39.833 21.774 35.963 82,93 4,05 1,59 3,37
Bois + 3 anos 96.574 97.573 96.791 -1,02 32,11 23,72 29,80
Animais vendidos 141.944 79.053 117.366 79,56 66,50 60,14 64,74
Touros 7.411 6.233 7.149 8,89 0,48 0,30 0,44
Vacas de cria 58.786 39.915 53.394 47,28 5,43 3,88 5,00
Bezerros/as 72.769 61.323 69.499 18,67 6,72 5,95 6,51
Novilhas 1-2 anos 43.743 26.987 36.562 62,09 1,62 1,97 1,71
Novilhas 2-3 anos 26.134 52.171 33.573 -49,91 1,20 2,54 1,57
Novilhos 1-2 anos 116.425 28.177 77.204 313,19 5,38 2,74 4,65
Novilhos 2-3 anos 151.817 53.322 92.720 184,72 5,61 7,78 6,21
Bois + 3 anos 39.981 120.822 75.911 -66,91 1,85 11,75 4,57
Animais transferidos 170.132 168.739 169.668 0,83 28,29 36,91 30,66
Receitas diversas 47.138 17.354 36.165 171,63 5,21 2,95 4,60
Receita total 189.448 124,544 162.211 52,11 100,00 100,00 100,00
Total de fazendas 2 58 38 96 - 60 40 100
Fonte: Pesquisa direta.
1
Diferença percentual entre as receitas das fazendas com e sem pastagem cultivada.
2
Número de fazendas que consolidaram o valor total.
Com = média das fazendas com pastagem cultivada. Sem = média das fazendas sem pastagem
cultivada. Total = total de fazendas da amostra
A média da receita total das fazendas com pastagem cultivada, a preços constantes de
2007, foi de quase US$ 245.000, cerca de uma vez e meia a média das fazendas sem pastagem
cultivada, que foi de aproximadamente US$ 160.000 (Tabela 5.47).
204
Em % sobre a receita
Valores médios em US$ C/S 2 total
Receitas
(%)
Com Sem Total Com Sem Total
Vendas de gado 182.562 101.674 150.951 79,56 66,50 60,14 64,74
Transferências de gado 218.816 217.025 218.219 0,83 28,28 36,91 30,66
Receitas diversas 3 60.627 22.319 46.514 171,63 5,22 2,95 4,60
Receita total 243.660 160.183 208.629 52,11 100,00 100,00 100,00
Total de fazendas 4 65 47 112 - 58 42 100
Fonte: Pesquisa direta.
1
Valores em reais de 1997 atualizados para 2007 pelo IGP-DI e convertidos para dólares (1 US$ = R$
1,95 em 2007).
2
Diferença percentual entre as receitas das fazendas com e sem pastagem cultivada.
3
Receitas diversas = aluguel de pasto, aluguel de máquinas, serviços prestados a terceiros,
financiamentos recebidos, aportes financeiros, vendas do imobilizado e outras receitas.
4
Número de fazendas que consolidaram o valor total.
Com = média das fazendas com pastagem cultivada. Sem = média das fazendas sem pastagem cultivada.
Total = total de fazendas da amostra.
As médias de receitas líquidas por hectare/ano para as fazendas com e sem pastagem
cultivada, e para o total de fazendas, foram, respectivamente, de US$ 28,2, US$ 12,5 e US$ 21,6 (a
preços constantes de 2007) (Tabela 5.48). As fazendas com pastagem cultivada têm média 2,25
vezes maior que a média das fazendas sem pastagem cultivada (uma diferença de US$ 15,6/ha/ano,
ou US$ 28,2 - US$ 12,6), e em relação ao total de fazendas do Pantanal, uma média 30% superior
(US$ 28,2 - US$ 21,6 = US$ 6,6).
Tabela 5.48 – Receitas líquidas por hectare/ano do sistema tradicional de pecuária do Pantanal
para fazendas com e sem pastagem cultivada (US$/ha/ano a preços de 2007).
Receitas Líquidas/ha
Com Sem
Total
Pastagem Pastagem
28,16 12,51 21,59
Fonte: Pesquisa direta.
Do total de 112 fazendas utilizadas na análise econômica, 20% (22 fazendas) apresentou
rentabilidade negativa (Tabela 5.49), e 80% (90 fazendas), rentabilidade positiva. Grosso modo,
esses percentuais se mantém entre as fazendas com e sem pastagem cultivada: 18% e 82%, e 21% e
79%, respectivamente. Das 22 fazendas com rentabilidade negativa, 55% são fazendas com
205
pastagem cultivada (12 fazendas); e das 90 fazendas com rentabilidade positiva, cerca de 60% (53
fazendas) são fazendas com pastagem cultivada.
Receita Líquida
Com Sem Total
(US$/ha/ano)
RL/ha > 0 48 33 80
> 150 1 0 <1
100 a 149 4 1 5
50 a 99 11 2 13
1 a 49 32 30 62
RL/ha < 0 10 10 20
0 a -10 5 7 12
-10 a -56 5 3 8
Total 100 100 100
# 112 112 112
1
Os percentuais foram arredondados para o inteiro.
Com = média das fazendas com pastagem cultivada.
Sem = média das fazendas sem pastagem cultivada.
Total = média do total de fazendas da amostra.
206
Para as fazendas com pastagem cultivada a receita líquida variou entre US$ -46/ha/ano e
US$ 250/ha/ano, e para as fazendas sem pastagem cultivada, entre US$ -56/ha/ano e US$
113/ha/ano. Entretanto, os valores extremos dos intervalos são “outliers”, exceto US$ 113/ha. O
restante dos valores negativos alcança no máximo US$ -16/ha/ano para os dois tipos de fazenda, e
os valores que antecedem os máximos positivos são US$ 85/ha/ano para as fazendas sem pastagem
cultivada e US$ 132/ha/ano para as fazendas com pastagem cultivada.
Para comparação, dados da FNP Consultoria & Comércio (ANUALPEC, 1995; 1997;
2001) mostram que a rentabilidade da pecuária brasileira, considerando os níveis tecnológicos
baixo e médio e as diversas fases de produção (cria, recria, cria-recria, etc.), tem variado entre US$
-27/ha/ano e US$ 248/ha/ano (a dólares de 2007). Segundo a Scot Consultoria (Nogueira, 2007),
uma fazenda com baixo nível tecnológico, com 12 mil hectares de área útil para o gado, em pasto
207
nativo, com lotação de 0,68 UA/ha (similar à do Pantanal) tem hoje (2007) uma renda líquida/ha de
R$ 48,49 (US$ 24,87/ha). Se houver um aporte crescente de tecnologia, essa fazenda pode alcançar
uma rentabilidade/ha de R$ 231,90 (US$ 118,92/ha), mantendo-se o mesmo desfrute (27,5%).
Quando se considera a inflação pelo IGP-DI, o valor do boi gordo era 2,5 vezes maior que
o atual: em 2007 a cotação da arroba do boi gordo ficou 65% abaixo dos valores médios pagos
entre os anos de 1971 a 1990. Se o boi valia 2,5 vezes mais há 25 anos, para manter a mesma renda
por unidade de área o pecuarista hoje precisa trabalhar com produtividade, no mínimo, equivalente
a essa perda de valor. Isso generaliza uma situação onde, evidentemente, cada caso deve ser
analisado com base em suas próprias particularidades, mas dá uma idéia do quanto o preço do boi
gordo (corrigido pelo IGP-DI) tem recuado ao longo dos anos.
Tabela 5.52 – Síntese dos resultados: médias de receitas e custos (em dólares de 2007)1,
área total média (ha), área média com pastagens cultivadas (ha)
e total de fazendas amostradas.
Valores médios
Especificação
Com Sem Total
Receita líquida, US$/ha/ano 28,16 12,51 21,59
Receita total, US$ 243.660 160.183 208.629
Custo operacional total, US$ 135.691 68.137 107.343
Receita líquida, US$ 107.969 92.047 101.286
Área total média, ha 7.617 7.944 7.748
Área média com pastagens, ha 1.650 0 1.257
Total de fazendas 2 65 47 112
Total de fazendas da amostra 72 48 120
Fonte: Pesquisa direta.
1
Valores monetários em reais de 1997 atualizados para 2007 pelo IGP-DI e
convertidos para dólares (1 US$ = R$ 1,95 em 2007).
2
Número de fazendas que consolidaram o valor total da receita líquida.
Com = média das fazendas com pastagem cultivada.
Sem = média das fazendas sem pastagem cultivada.
Total = média do total de fazendas da amostra.
As receitas líquidas médias (em US$/ha/ano) das diferentes práticas de manejo utilizadas
em nossa análise estão sumarizadas na Tabela 5.53. Os resultados da introdução das melhorias no
sistema tradicional estão sumarizados nas Tabelas 5.54 a 5.59. A Tabela 5.60 (p.212) sintetiza os
resultados desta Seção.
208
Tabela 5.53 – Resultados econômicos de melhorias nas práticas de manejo do rebanho do Pantanal
encontrados na literatura revisada e utilizados em nossa análise.
cálculos, aumentando o total de fazendas consideradas de 45% para 87%. Os resultados estão
apresentados nas colunas “período de monta preconizado tecnicamente”.
Praticamente não há variação nas diferenças das médias entre os tratamentos (de B para E)
das fazendas com e sem pastagem cultivada, que são cerca de 2,2 vezes maiores nas primeiras em
todos os tratamentos. O mesmo ocorre em relação ao total de fazendas, com as médias em todos os
tratamentos sendo 30% superiores nas fazendas com pastagem cultivada. Quando se consideram os
dados resultantes do que se preconiza como ideal para o período de monta (segunda parte da
Tabela 5.54), a diferença entre as fazendas com e sem pastagem cultivada varia entre os
tratamentos, sendo 2,0 vezes superior no tratamento E e 2,2 vezes superior no tratamento B, nas
fazendas com pastagem cultivada. Em relação ao total, no tratamento E as fazendas com pastagem
cultivada tem receitas líquidas médias/ha 17% superiores, enquanto que no tratamento B, esse
percentual é de 27%.
Uma vez que foram utilizados percentuais de aumento de receita líquida/ha para avaliar a
introdução do período de monta, e dado que o aumento máximo foi de 30,36% (tratamento E), essa
210
melhoria no sistema de produção não vai tornar lucrativas fazendas deficitárias, i.e., o sinal da
receita líquida/ha não irá mudar. O que ocorre é uma redução do prejuízo e um aumento nos
ganhos, gradativamente, à medida que se consideram os diferentes efeitos decorrentes desta prática
(tratamentos B, C, D e E). A alteração em relação ao sistema tradicional, portanto, se traduz no
percentual de fazendas que ocupam uma dada faixa de rendimento. Uma quantidade maior de
fazendas passa a ocupar faixas mais altas de receitas líquidas/ha à medida que se avança nos
tratamentos. Por exemplo, o percentual de fazendas com receitas líquidas entre US$ 100/ha e US$
150/ha aumenta 40% entre os tratamentos B e E, ao mesmo tempo em que o percentual de fazendas
com receitas líquidas entre US$ -20/ha e US$ -10/ha diminui 25%.
Tabela 5.55 – Ganhos médios decorrentes de reduções na relação touro:vaca no sistema tradicional
de pecuária do Pantanal (em US$/ha/ano a preços de 2007).
Como foi visto (Tabela 5.49, p.204) a rentabilidade de 20% do total de fazendas foi
negativa. Com as alterações na relação touro:vaca, este percentual reduz-se para 3,6% (Tabela
5.56). Das 22 fazendas com rentabilidade negativa, 18 passam a ter rentabilidade positiva, ou 82%
do total. A fazenda com menor receita líquida passa a ter um prejuízo de US$ 11/ha/ano, em
comparação com um prejuízo de US$ 56/ha/ano na situação tradicional. Ao mesmo tempo, o total
de fazendas com receita líquida positiva cresce de 90 para 108 fazendas, ou de 80% para 96,4%
211
(Tabela 5.56). Para as fazendas com pastagem cultivada esse crescimento foi de 82% para 97% e
para as fazendas sem pastagem cultivada, de 79% para 96%.
Tabela 5.56 – Total de fazendas com receitas líquidas positivas e negativas na situação tradicional
e após modificações na relação touro:vaca.
A Tabela 5.57 apresenta as diferenças em termos das mudanças nos percentuais dos
intervalos de renda líquida. O que se observa, de forma geral, é que as fazendas “avançam” dos
intervalos negativos para o intervalo de US$ 1 a US$ 49/ha e do intervalo de US$ 50/ha a US$
99/ha para os dois intervalos superiores.
Os resultados do uso de sal mineral adequado ao Pantanal, assim como no caso do período
de monta, não alteram o sinal das receitas líquidas, pois a avaliação é feita em termos de
percentuais de aumento de receita líquida/ha. Além disso, a diferença nos ganhos de receitas entre
os dois tratamentos é pequena, 17,7% (sal mineral o ano todo) e 18,5% (uso estratégico), e isso está
refletido nos resultados, conforme mostra a Tabela 5.59.
Tabela 5.59 – Ganhos médios decorrentes da utilização de sal mineral adequado ao Pantanal em
relação ao sistema tradicional (em US$/ha/ano a preços de 2007).
Quando se usa sal mineral apropriado ao Pantanal há um aumento nas receitas líquidas em
relação ao sistema tradicional de 21% nas fazendas com pastagem cultivada e de 24% nas fazendas
sem pastagem cultivada, para o tratamento estratégico. Os valores são similares para o tratamento
que usa sal o ano todo. A média das receitas líquidas/ha das fazendas com pastagem cultivada é 2,2
vezes superior à média das fazendas sem pastagens cultivadas e 30% superior à média do total, nos
dois tratamentos, estratégico e não estratégico.
A Tabela 5.60 sumariza os resultados dos ganhos decorrentes das diferentes alternativas de
manejo analisadas.
A. Apicultura
Em relação às fazendas sem pastagem cultivada, as receitas líquidas/ha das fazendas com
pastagem cultivada podem ser até 2,2 vezes maiores (situações A e B), quase o dobro (situação C)
e 86% superiores (situação D). Em relação às médias do total das fazendas, as receitas líquidas/ha
das fazendas com pastagem cultivada podem ser entre 24% e 30% maiores.
B. Pecuária Orgânica
C. Ecoturismo (Hotéis-Fazenda)
O valor do ganho médio/ha que se espera de uma fazenda que transforma sua sede em
hotel-fazenda e passa a desenvolver as duas atividades – pecuária e ecoturismo – simultaneamente,
é de US$ 4,59/ha. Esse aumento nas receitas líquidas das fazendas do sistema tradicional de
pecuária do Pantanal produz os resultados apresentados na Tabela 5.64.
Em relação ao sistema tradicional, o aumento nas receitas líquidas foi de 16% nas fazendas
com pastagem cultivada e de 37% nas fazendas sem pastagem cultivada; para o total das fazendas,
o aumento foi de 21%. A média das receitas líquidas/ha das fazendas com pastagem cultivada é
quase o dobro (91%) da média das fazendas sem pastagens cultivadas, e 53% maior do que a média
do total de fazendas. No total, 8% das fazendas passam a ter rentabilidade positiva.
A Tabela 5.65 sumariza os resultados dos ganhos decorrentes das diferentes atividades
complementares.
O valor econômico total (VET) de um recurso natural é a soma de seus valores de uso, de
opção e de existência. Como já salientado, alguns valores podem se sobrepor, mas na maioria dos
casos, a super-estimativa resultante da agregação de todos os tipos de valores, não será muito
severa (Torras, 2000). A Tabela 5.66 apresenta os valores utilizados.
Tabela 5.66 – Valores de uso direto, indireto, de opção e de existência encontrados na literatura
revisada para o Pantanal e utilizados em nossa análise.
A maioria dos estudos se refere ao Pantanal, exceto para o caso dos produtos florestais não
madeireiros – PFNM (o valor anual por hectare foi a média das estimativas dos estudos
correspondentes) e para o valor de opção (calculado somando os valores de uso direto e de uso
indireto e multiplicando o total por um valor arbitrário de 0,16 (Chopra, 1993) ou 0,03 (Kling,
1993)).
O VET anual para um hectare representativo do Pantanal está sumarizado na Tabela 5.67,
que apresenta quatro diferentes alternativas de cálculo (colunas A, B, C e D), em função dos
estudos revisados considerados na Tabela 5.66. Na coluna A os valores utilizados (a preços de
2007) são os máximos (US$ 18,77/ha/ano para o ecoturismo, 16% para o valor de opção e 91%
para o valor de existência), enquanto na coluna D os valores são os mínimos (US$ 7,85/ha/ano para
o ecoturismo, 3% para o valor de opção e US$ 6,49/ha/ano para o valor de existência); o valor de
uso indireto não variou entre as diferentes alternativas de cálculo.
Em US$/ha/ano
Valores do Pantanal
A B C D
Valor de uso direto 260 260 249 249
Valor de uso indireto 7.628 7.628 7.628 7.628
Valor de opção 1.262 1.262 236 236
Valor de existência 8.327 6,49 7.383 6,49
Valor Econômico Total 17.477 9.158 15.496 8.120
Em porcentagem
Valor de uso direto 1,5 2,8 1,6 3,1
Valor de uso indireto 43,6 83,3 49,2 93,9
Valor de opção 7,2 13,8 1,5 2,9
Valor de existência 47,6 0,1 47,6 0,1
Valor Econômico Total 100,0 100,0 100,0 100,0
Fonte: Pesquisa direta.
Os valores máximos (A e C) consideram o valor de existência como sendo 91% da soma do
valor de uso com o valor de opção; os valores mínimos (B e D) consideram o valor de
existência como sendo $ 6,49/ha/ano.
Em A e B o valor de opção foi calculado como sendo 16% do valor de uso.
Em C e D o valor de opção foi calculado como sendo 3% do valor de uso.
A diferença entre A e B e entre C e D está somente no valor de existência.
As diferenças no valor de uso direto se devem aos diferentes valores de ecoturismo utilizados
nos cálculos.
1.262/ha/ano) e 1,5% ao valor de uso direto (US$ 260/ha/ano). Observa-se que quando o valor de
existência é pouco expressivo (i.e., quando ele tão pequeno quanto US$ 6,49/ha/ano, colunas B e
D), o valor de uso indireto representa a quase totalidade do VET. Isso é particularmente verdadeiro
quando o valor de opção é calculado como 3% do valor de uso, situação em que o valor de uso
indireto alcança quase 94% do VET (coluna D). Uma vez que o valor de uso direto tem menor
relevância no VET (de 1,5% a 3,1%), o valor de opção só assume maior participação quando é
calculado como sendo 16% do valor de uso; nesse caso, corresponde a 14% do VET, no máximo
(coluna B). Nos demais casos (colunas C e D), a participação do valor de opção no VET é similar à
do valor de uso direto.
A partir das estimativas dos valores dos diferentes usos da terra obtidos nas seções
precedentes, é possível realizar uma análise de custo-benefício do desmatamento (sob a ótica da
estática comparativa). Como os benefícios ambientais possuem abrangências diferentes, os valores
econômicos de um hectare de Pantanal foram classificados em benefícios privados locais,
benefícios públicos locais e benefícios globais. Esta classificação é útil porque cada tipo de
benefício pode ser visto como correspondendo a diferentes beneficiários: o pecuarista, o governo
(ou a nação brasileira) e o planejador social mundial, todos, por hipótese, buscando maximizar a
utilidade do uso da terra do Pantanal. Esta classificação também é útil para dar uma idéia do tipo de
transferência de benefícios que potencialmente pode ocorrer. O resultado está apresentado na
Tabela 5.68.
Na Tabela 5.68 o item de maior valor é o valor de existência, com os demais valores não
sendo competitivos com este valor. No nível global, os maiores itens são os valores de opção e de
existência. Quando o valor de existência é uma parte importante do valor econômico total, isso
220
indica que o ativo sendo valorado é único e/ou que as pessoas estão familiarizadas com seus
atributos. O Pantanal é reconhecidamente um hotspot internacional, sendo esperado que lhe seja
atribuído um alto valor de existência. Portanto, a singularidade tende a ser associada com alto valor
de não-uso. Quando se consideram as estimativas por seus valores mínimos (terceira coluna da
Tabela 5.68), na qual o valor de existência praticamente não é considerado, os maiores benefícios
advêm da regulação de distúrbios e da oferta de água, e no nível global, do valor de opção e dos
serviços de recreação. Nesse caso, os benefícios externos do Pantanal alcançam US$ 744/ha/ano.
Valor Valor
Benefícios
Máximo Mínimo
Benefícios privados locais 273 262
Produtos madeireiros 117,26 117,26
PFNM 124,28 124,28
Ecoturismo 18,77 7,85
Pecuária em pasto nativo 12,51 12,51
Benefícios públicos locais 7.127 7.127
Regulação de distúrbios 2.282,11 2.282,11
Regulação de água 494,79 494,79
Oferta de água 2.582,42 2.582,42
Controle de erosão 82,82 82,82
Formação de solo 29,23 29,23
Ciclagem de nutrientes 241,72 241,72
Tratamento de dejetos 659,67 659,67
Polinização 16,02 16,02
Controle biológico 14,75 14,75
Produção de alimentos 69,76 69,76
Matérias primas 98,03 98,03
Cultural 555,28 555,28
Benefícios globais 10.090 744
Regulação de gás 87,96 87,96
Regulação do clima 58,47 58,47
Habitat/refúgio 138,29 138,29
Recursos genéticos 10,75 10,75
Recreação 205,56 205,56
Valor de opção 1.262.07 236,64
Valor de existência 8.327,51 6,49
Total Anual por ha 17.490 8.133
Fonte: Pesquisa direta.
A diferença entre as estimativas máximas e mínimas evidencia que quando alguns dos
benefícios não são considerados (como, no caso, o valor de existência), este fato leva a uma
221
Para o pecuarista, dado que não há outras alternativas de uso agrícola das terras do
Pantanal (silvicultura, culturas anuais ou perenes, etc.), que a extração sustentável de madeira e de
PFNM, por razões já tratadas (Seção 2.2.1, p.85), estão descartadas, e que as receitas do
ecoturismo vão principalmente para outros agentes, a única opção real é a pecuária.
Benefícios do desmatamento 28
Implantação de pastagens cultivadas 28
Fonte: Pesquisa direta.
222
Mas é ilusório acreditar que a comunidade internacional ou os países ricos irão pagar a
“conta ambiental” do desmatamento do Pantanal. O que se configura como factível são estratégias
de mercado, tais como o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, que venham a minimizar os
impactos do desmatamento. Além disso, transferir somas muito grandes pode não ser uma tarefa
fácil, sendo necessário definir, por exemplo, que canais serão usados para transferir capitais e que
atividades individuais necessitam de apoio, especificamente.
À medida que o desmatamento aumenta, uma maior parte do valor potencial das áreas
florestadas vai sendo perdido, de modo que os custos de oportunidade tendem a aumentar quando o
desmatamento aumentar. Isso é verdade tanto para os benefícios globais quanto para os benefícios
locais. Além disso, o valor atribuído à qualidade ambiental também tende a aumentar quando as
economias crescem e a renda das pessoas aumenta, aumentando ainda mais os custos. Assim, os
custos do desmatamento irão crescer no tempo. Ao nível atual de desmatamento, as transferências
necessárias para induzir a preservação alcançam os valores acima estimados, os quais,
provavelmente, serão maiores no futuro.
CAPÍTULO 6
DISCUSSÃO
Nossos resultados indicam que é viável criar gado no Pantanal, embora a rentabilidade
possa ser baixa para a maioria das fazendas, e altamente variável, em função de diferentes
características de cada propriedade17. Os resultados também mostram que é economicamente
atrativo desmatar para introduzir pastagem cultivada, pois as fazendas com pastagem cultivada têm
uma rentabilidade média/ha cerca de 2,25 vezes maior. E embora não tenha sido detalhado nos
resultados, isto é válido tanto para pequenas quanto para grandes propriedades. Assim, os
desmatamentos proporcionam ganhos econômicos, às vezes significativos, e portanto, fazem todo
sentido do ponto de vista privado.
Os resultados também mostram que esses benefícios privados têm elevados custos sociais,
pois o valor do Pantanal, em termos dos bens e serviços que ele potencialmente pode oferecer à
comunidade, é alto. A perda desses bens e serviços ambientais decorrentes do desmatamento para
introdução de pastagens é, na melhor das hipóteses, de US$ 8.120/ha. Comparado ao máximo
rendimento/ha que pode ser obtido das práticas alternativas analisadas, de US$ 140/ha (na hipótese
de que os resultados sejam aditivos; ver Tabela 5.60, p.212), ou das atividades complementares
consideradas, de US$ 100/ha (Tabela 5.65, p.215), fica evidente o quanto este custo econômico é
significante. Assim, o ganho econômico privado da atividade que provoca o desmatamento no
Pantanal não justifica socialmente as perdas ambientais envolvidas. O custo-benefício do
desmatamento não favorece o desmatamento. A introdução de pastagens cultivadas pode até
recuperar a pecuária, mas condena o Pantanal.
Assim, para o Pantanal, progresso seria manter o sistema de criação extensivo, preservando
a região como uma fonte de bens e serviços ambientais, enquanto que para o pecuarista interessa
mais a intensificação tecnológica, via pasto cultivado, capaz de aumentar a produtividade do
rebanho e a lucratividade da sua atividade. Como as terras são de propriedade privada e os direitos
de posse estão assegurados, os benefícios externos da preservação não são levados em conta pelo
proprietário (o pecuarista), que toma decisões em função da ótica do mercado.
17
Localização, área total alagável e duração do alagamento, principal fase de produção, tecnologia e práticas
de manejo empregadas, entre outros.
224
Por outro lado, melhorar a rentabilidade das áreas florestadas deve aumentar a
probabilidade de seu manejo continuado como área florestada, mantendo, assim, a diversidade
biológica. Isso abre caminho para que se investiguem alternativas econômicas geradoras de renda
para essas áreas. Inúmeras atividades extrativas e não extrativas tem potencial de gerar renda aos
pecuaristas do Pantanal: produtos madeireiros e não madeireiros, plantas medicinais, criação de
animais silvestres, ecoturismo, etc., embora sua transformação em fluxos reais de renda nem
sempre esteja garantida.
As áreas florestadas não são as únicas fisionomias que podem ser convertidas em pastagem
cultivada. Essas áreas tem tido preferência por se localizarem nas porções mais altas do terreno
(cordilheiras), menos sujeitas a inundações. Como praticamente todos os tipos de fisionomias
(cerradão, cerrado, campo-cerrado, caronal, etc., ver Figura 1.3, p.28) podem ser convertidos a
pastos cultivados, é possível explorar algumas alternativas de menor impacto ambiental com base
nessa forte substitutibilidade dos pastos cultivados. Se todas as áreas têm valor similar em termos
de pasto cultivado, podem-se criar incentivos para que os fazendeiros implantem as pastagens
cultivadas em áreas de pastagens nativas, ou mesmo em áreas esparsamente florestadas, mantendo
intactas as áreas densamente florestadas das cordilheiras. Tal incentivo, ao mesmo tempo em que
mantém habitat estratégico (cordilheiras, que funcionam como corredores da fauna), aumenta a
probabilidade de retornos de atividades não relacionadas à pecuária nas áreas florestadas.
226
Portanto, a questão básica de política pública para o Pantanal é saber como intervir no
processo de expansão das áreas de pastagem cultivada objetivando conter os desmatamentos.
Uma vez que a maior parte das terras do Pantanal é de propriedade de pecuaristas e suas
decisões têm um papel dominante nos usos da terra, para obter sucesso nos esforços de
conservação é importante contar com o apoio tácito dessa classe produtiva. Políticas restritivas e
regulatórias, baseadas em regulamentos, onde a participação social e a ação comunitária não são
consideradas, provavelmente não serão eficazes. As grandes distâncias e o isolamento da região
tornam difícil ou muito caro garantir o cumprimento de regulamentos. E obrigar o cumprimento da
lei abre caminho para diversas formas de corrupção, favorecimentos, etc. Assim, uma estratégia
voluntária, baseada em incentivos, pode ser a maneira mais efetiva para alcançar os objetivos de
conservação.
Mas há outras partes interessadas relevantes, além dos pecuaristas, muitas vezes com
objetivos opostos a estes, que devem ser consideradas na formulação de políticas de conservação
apropriadas para o Pantanal. Assim, é fundamental identificar quem são os eventuais ganhadores e
os perdedores caso essas políticas sejam implementadas. Dependendo do bem ou serviço, o
benefício ou custo pode ir para diferentes partes da população. É necessário identificar cada parte e
entender como essas partes são afetadas. Isso facilita o entendimento de como os benefícios e
custos se distribuem entre as partes e permite determinar se eles podem ser realocados de uma
forma que aumente os benefícios líquidos totais. Para fins de análise, essas partes interessadas
(beneficiários ou perdedores) podem ser divididas em pelo menos três categorias: partes diretas,
227
indiretas e difusas ou, equivalentemente, residentes proprietários, residentes não proprietários e não
residentes.
Os proprietários de terra são as partes interessadas diretas: eles têm direito legal sobre a
terra e sobre a base de recursos naturais e são eles os principais responsáveis pelas decisões que
afetam o manejo e a administração dessas terras. Portanto, sofrem diretamente as conseqüências
positivas e negativas dessas decisões, são os mais afetados por políticas voltadas à região e os que
mais têm a ganhar ou a perder da diversidade biológica.
As partes interessadas que não têm autoridade ou direito sobre a base de recursos naturais,
mas suportam os benefícios ou perdas decorrentes da administração e manejo desses recursos, são
as partes indiretas. São os pescadores, os prestadores de serviços em geral (donos de hotéis,
restaurantes, agências de turismo), os cidadãos comuns e a maioria dos residentes não proprietários
de terras na Bacia do Alto Paraguai. Apesar de não terem direitos sobre os recursos, podem
assegurar direitos votando em políticas que afetam as partes interessadas diretas. Na medida em
que políticas nacionais influenciam a oferta de recursos naturais do Pantanal, outros cidadãos
brasileiros podem ser considerados como parte interessada indireta.
As partes interessadas difusas são os indivíduos que atribuem valor ao Pantanal, mas não
tem, nem reivindicam, qualquer direito legal sobre sua administração e que também não tem
potencial para obter benefícios pecuniários do seu bom ou mal estado de conservação. São pessoas
que exibem valores de não-uso positivos pelos recursos naturais do Pantanal. Indivíduos que vivem
em outros países e que contribuem com organizações não-governamentais que trabalham em prol
da conservação do Pantanal, são um exemplo de parte interessada difusa.
Uma vez que nossos resultados se aplicam tanto a grandes quanto a pequenos
proprietários, de uma perspectiva política pode ser mais eficiente centrar esforços nos grandes
proprietários, já que a magnitude de seus desmatamentos provavelmente será muito maior. Dessa
forma uma maior área pode ser afetada pela mudança no comportamento de menos agentes.
(ranching), não ameaça a integridade das populações, podendo ser, além de uma opção de renda
aos fazendeiros, uma estratégia de conservação desses animais. O ecoturismo, como já discutido,
oferece incentivos econômicos para conservar as áreas florestadas como habitat para vida silvestre
e a flora da região. Embora não comparável aos benefícios econômicos que a conservação da flora
e da fauna tem gerado em outros países, alguns agentes locais (operadoras de turismo, prestadores
de serviços e mesmo alguns pecuaristas), já estão obtendo retorno com o ecoturismo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
privados versus benefícios sociais requer a compensação, pelos beneficiários difusos, das perdas
dos beneficiários diretos, os pecuaristas.
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ANEXO A – QUESTIONÁRIO
255
CONFIDENCIAL
1. IDENTIFICAÇÃO DO RESPONDENTE:
1) Condição do respondente:
1. ( ) Proprietário
2. ( ) Arrendatário
3. ( ) Administrador
4. ( ) Outra _____________________________
2. O proprietário reside na fazenda?
1. ( ) Sim
2. ( ) Não. ⇒ Quantas vezes por ano vai à fazenda? ___________________
⇒ Quem administra a propriedade? _______________________
2. IDENTIFICAÇÃO DA PROPRIEDADE:
3. CARACTERIZAÇÃO DA PROPRIEDADE:
(**) Por favor, cada vez que houver uma pergunta sobre categorias do rebanho, use os códigos
apresentados no Anexo 1.
257
5. ADMINISTRAÇÃO E MÃO-DE-OBRA
6. DESPESAS E RECEITAS
6.1. DESPESAS NO ANO DE 1997
ESPECIFICAÇÃO UNIDADE QUANT. VALOR TOTAL
EM R$, EM 1997
A. MÃO-DE-OBRA PERMANENTE - - -
Salários do capataz - -
Salários de peões - -
B. MÃO-DE-OBRA TEMPORÁRIA - - -
Gastos com diaristas, etc. - -
D. AQUISIÇÃO DE INSUMOS - - -
Vacinas -
Vermífugos -
Outros medicamentos -
Sal mineral sacos
Sal comum sacos
Rações kg
Sementes e mudas -
Combustíveis litros
Lubrificantes litros
Combustíveis para aeronave litros
E. ALUGUÉIS - - -
Aluguel de máquinas e equipamentos - - -
Arrendamento de terras - -
263
G. OUTRAS DESPESAS - - -
Transporte do gado para venda - -
Transporte do gado comprado
Outras despesas com compra de gado (comissões) - -
Fretes e insumos - -
Escritório contábil - -
Honorários advocatícios
Assistência técnica
264
6.3. INVESTIMENTOS
ESPECIFICAÇÃO UNIDADE QUANT. VALOR TOTAL
EM R$, EM 1997
Formação de pastagem (desmata, destoca, hectares
enleiramento, sementes, cercas e manutenção)
Outros investimentos - -
7. OBSERVAÇÕES:
O Senhor pode comentar a respeito do questionário, se está bom ou ruim, se está muito longo; se
pensa que a pesquisa é válida e importante ou não; sugerir perguntas que faltaram; etc.
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
______________________________________________________________________________
ANEXO 1
CÓDIGO CATEGORIA
1 Todos os animais
2 Animais adultos
3 Reprodutores (touros)
4 Vacas de cria
5 Bezerros (as) de ano
6 Novilhas 1-2 anos (novilhas sobreano)
7 Novilhas 2-3 anos (novilhas sobre2anos)
8 Novilhos 1-2 anos (garrote sobreano)
9 Novilhos 2-3 anos (garrote sobre2anos)
10 Bois de mais de 3 anos
OU:
11 Cria
12 Recria
13 Engorda