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CENTRO DE EDUCAÇÃO
Resumo
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INTRODUÇÃO
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Nesta etapa da vida, a fase pré-escolar, as crianças mantêm laços afetivos muito
fortes de apego à família e é justamente nesse período em que são “forçadas” a darem boas
vindas a uma nova realidade em suas vidas. Muitas vezes, a reação de recusa a permanecer
no espaço escolar não está contextualizada no âmbito da democracia familiar, pois a
criança nesse momento da vida, é passiva ao entendimento de que ali se inicia sua jornada
frente às ideologias capitalistas e às exigências sociais.
Decidimos desenvolver este trabalho partindo da escola porque é um ambiente
socializador no qual as crianças têm contato a partir do momento que constroem sua auto-
idealização e passam anos formando sua personalidade. Por reconhecermos que a escola
não é a única responsável pelo desenvolvimento da autonomia das crianças, destacamos o
papel da família e ainda, outros meios que fazem parte da vida da criança nesta fase.
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
É sabido que os seres humanos não são criaturas feitas para viver isoladas e sim
conviver com outros da mesma espécie, até para facilitar o desempenho de muitas
atividade necessárias à vida de toda sociedade e para haver uma melhor construção e
disseminação do saber. Apesar da necessidade de relações sociais, os indivíduos divergem
entre si, cada um com sua própria leitura de mundo, com suas próprias idéias,
pensamentos e concepções. Isto advém do processo de formação da personalidade, é
quando a criança desenvolve aquele aspecto do ‘eu’ que nos dá a sensação de
pertencermos a grupos, que faz com que nos sintamos ao mesmo tempo iguais a todos os
outros indivíduos do grupo e diferentes de todos eles. Erikson (1976) chamou este
sentimento de sentimento de integridade do ‘eu’ ou sentimento de identidade pessoal.
A sociedade também passou por um processo de formação quando a concepção de
autonomia surgiu com mais ênfase na passagem para o antropocentrismo, pois o homem
percebeu que com a utilização de alta tecnologia poderia colocar a natureza a seu serviço e
livrar-se da labuta que o escravizava. Com a modernização da sociedade tendo crescente
processo de industrialização, o homem passou a ter maiores possibilidades de conciliar a
liberdade individual com o bem-estar social.
Entretanto, a possibilidade política contradizia tal perspectiva humana, pois
continuava a monopolizar, controlar e explorar a maioria dos indivíduos, concentrando
riquezas nas mãos de poucos, o que é característico do capitalismo. À educação restou um
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desafio, o de considerar a realidade como ela é e suas limitações, para a partir dessa
reflexão apresentar o que a atual sociedade impede o homem de ser e com isso poder
favorecer a autonomia, a liberdade e a emancipação do indivíduo. Apesar da educação ser
um instrumento de manutenção das concepções políticas de domínio, é na escola que se
tem maior abertura para um processo de transformação do modo de ser do homem e de
suas condições de existência.
Quando as relações existentes, entre a criança e a sociedade, dão-se de forma
positiva, essa terá “desenvolvido a capacidade para confiar em si mesma e nos seus
provedores internos, sentir-se-á um indivíduo íntegro e autônomo, digno de amar e ser
amado, bem como com possibilidades de realização plena de suas capacidades no
desempenho de tarefas” (RAPPAPORT, 1981, p. 73).
Desde bebês, os seres humanos estão gradativamente desenvolvendo uma
compreensão de seus sentimentos, desejos e quereres. A mãe ou a cuidadora é responsável
por oferecer toda estimulação sensorial, além de ser a pessoa que irá cuidar da criança, e
discriminar, a partir de sinais emitidos pela criança, quais as necessidades básicas que está
sentindo. Será também a mãe quem ajudará a criança “a discriminar suas sensações
internas e a desenvolver maneiras novas e cada vez mais amadurecidas de comunicá-las e
conseqüentemente de satisfazê-las” (RAPPAPORT, 1981, p. 48).
Numa escola de educação infantil ou creche quem tem essa função de estimular a
criança em seu desenvolvimento é a educadora, geralmente constituída pela professora,
por isso é tão importante que esta respeite as crianças dando espaço a seus sentimentos,
idéias e opiniões, pois assim dará oportunidade de desenvolverem autoconfiança, respeito
por si mesmas e pelos outros, além de estar favorecendo a formação de mentes ativas,
criativas e indagadoras.
Na idade pré-escolar (fase pré-operacional) o relacionamento social vai incluir
além dos pais, outros adultos, como professores da escola maternal e outras crianças,
sendo os pais ainda as figuras centrais da afetividade. Por isso, deve-se estimular a
autonomia da criança tanto na escola como em casa, aproveitando ser esta uma fase de
autodescoberta em relação às necessidades básicas em que se pode estimular a
independência das crianças na realização das atividades de rotina, tal como comer sozinho,
se vestir e tomar banho (RAPPAPORT, 1981).
Para Piaget (1977) a criança constrói além de conhecimento, inteligência e
personalidade, valores sociais e morais. Segundo Rappaport, o objetivo do
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desenvolvimento da inteligência é a socialização do pensamento. Essa socialização do
pensamento é “sair de um pensamento fechado em si, confuso e desorganizado [...], para
um estilo de pensar e de entender a realidade [...] que seja comum a todos os indivíduos de
uma dada cultura” (RAPPAPORT, 1981, p. 49). Para que essa construção do pensamento
seja respeitada, a educação construtivista tem como primeiro princípio a cultivação de uma
atmosfera sócio-moral baseada em respeito mútuo e contínuo de uns com os outros.
As salas de aula onde há respeito mútuo contrastam-se com outras com respeito
unidirecional, isto provém do tipo de moralidade que se relaciona com o tipo de
relacionamento existente nas salas de aula. Assim, enquanto que uma relação de respeito
mútuo promove o desenvolvimento da autonomia das crianças, relacionamentos baseados
apenas no respeito unidirecional parecem retardar este desenvolvimento.
Na fase em que o ser humano ainda é um bebê ocorrem as primeiras relações com
o mundo exterior, através dos seus cuidadores, com os quais constituirá a criança um
sentimento de confiança básica ou de desconfiança básica. A partir das experiências
afetivas vividas, essa criança pode ou não ter, ao longo de sua vida, maiores possibilidades
de gratificação pessoal, pode ser mais autônoma ou mais dependente, isto pode ser
causado tanto pela família, quanto pela escola como foi citado no parágrafo anterior. De
acordo com Piaget, “as escolas realmente influenciam o desenvolvimento moral, quer
tenham essa intenção ou não” (apud DEVRIES; ZAN, 1999, p.28).
O respeito pela criança é fundamental para o desenvolvimento da autonomia de
acordo com DeVries e Zan (1999). Para elas, existem três modos de praticar respeito pelas
crianças, o primeiro é envolvê-las na elaboração das regras da sala; o segundo é usar
alternativas cooperativas para a disciplina e o terceiro é promover a resolução de conflitos
entre elas. Estes três pontos apresentam alternativas para o desenvolvimento da autonomia
o que é o objeto de estudo do presente trabalho.
Este estudo está fundamentado na teoria cognitivo-construtivista, mais
especificamente nos estudos a respeito do desenvolvimento moral da criança. Esta teoria
difere-se dos pensamentos behavioristas e do enfoque psicanalítico por defender que a
estrutura moral está ligada ao desenvolvimento das estruturas do pensamento. Seus
principais representantes são Piaget (1977) e Kolberg (1976, apud BEE, 1984). Estes
estudiosos dão maior atenção ao raciocínio moral e sua estrutura, à construção e aquisição
de valores, aos tipos de regras e como estas mudam no curso do desenvolvimento. Eles
têm estudos que apresentam o desenvolvimento psicológico da criança e estes nos dão
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uma luz sobre nosso objeto que foi citado anteriormente. Para Piaget (1977), o
desenvolvimento psíquico é similar ao crescimento biológico, pois acredita que ambos
seguem para um equilíbrio. Em suas pesquisas, Piaget analisou três aspectos do
desenvolvimento moral: regras morais, julgamento moral e a noção de justiça. Já Kohlberg
acredita existir princípios universais básicos que fundamentam os valores morais. Ele tem
o princípio da justiça como a essência da moralidade. Para ele a maturidade moral dá-se
por volta dos vinte anos e muitas pessoas não alcançam os estágios mais avançados (apud
CAMINO; LUNA, 2004). No próximo tópico iremos explorar tais teorias.
Primeiramente, é importante apresentar o que está sendo chamado de autonomia.
Piaget ressalta que autonomia é uma “atividade disciplinada ou autodisciplinada” (apud
BATTRO, 1978, p. 42). Ainda de acordo com Piaget, a autonomia está entre a anomia e a
heteronomia e igualmente distante das duas, a primeira é própria ao egocentrismo e à
inércia, enquanto a segunda própria à coerção e da atividade forçada (ibid).
Piaget (1977) também explica que heteronomia é um cumprimento de regras feitas
pelos outros sendo aceitas sem questionamento, refere-se a vontade de outra pessoa que
interfere de algum modo na vontade do ‘eu’, já a autonomia segue regras morais do eu,
regras originadas por sentimentos internos da necessidade de como tratar os outros.
Autonomia no olhar psicológico trata-se do “comportamento de um indivíduo que obedece
às leis que ele formulou ou aquelas cujo valor compreendeu e aceitou” (PIÉRON, 1996, p.
54).
É esse mesmo raciocínio que precisa fazer parte da atividade docente buscando
instruir os alunos a refletir sobre o que lhes mandam fazer e a questionar caso não
concordem, procurando uma justificativa cabível para que eles façam o que foi solicitado.
Em cada fase ocorre uma crise psicossocial, que é uma necessidade de ajustamento
pessoal às solicitações do ambiente social, por isso que em cada fase o indivíduo se
questiona o por quê das exigências sociais. Para Piaget, o indivíduo consegue criar, em sua
vida mental, condições especiais de lidar com as solicitações do ambiente externo, físico e
social.
Segundo Bee (1984), a criança desenvolve moralmente a partir do que aprendeu ou
internalizou de seus pais e da sociedade a qual está inserida. Quando a criança está no
primeiro estágio do desenvolvimento moral, sugerido por Piaget (1977), que é referente à
moralidade heterônoma, ela acredita inteiramente que as regras são absolutas, fixas e
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quebrá-las irá trazer, conseqüentemente, a punição, o castigo. Também nessa fase ela julga
a bondade ou maldade baseada nas conseqüências e não na intencionalidade.
Em um outro momento da vida da criança, por volta dos sete anos, ela dá lugar à
moralidade autônoma, também chamada moralidade de reciprocidade, é o inverso do
primeiro estágio, agora as regras são mutáveis e podem ser arbitrárias. Quebrar tais regras
nem sempre leva à punição e o julgamento leva em conta mais a intenção que alguém tem
para fazer uma ação. Nesta fase a criança considera a honestidade e a reciprocidade como
princípios básicos para o relacionamento com os outros.
Lawrence Kohlberg (1976, apud BEE,1984), que foi súdito de Piaget, apesar de
concordar com a teoria de seu instrutor, foi mais além em seus estudos, pois Piaget
acreditava que o desenvolvimento moral ocorria apenas na infância, mas Kohlberg cria
que esse desenvolvimento se dava até a fase adulta e considerou existir mais estágios de
desenvolvimento além da heteronomia e autonomia estudados por seu instrutor. Bee
(1984), apresenta de maneira detalhada as teorias de Piaget e Kohlberg, é interessante ver
a complementação que Kohlberg dá à teoria de Piaget, como que destrinchando as várias
etapas de desenvolvimento que o ser humano passa.
Kohlberg (ibid) procura complementar essas idéias de Piaget a respeito do
desenvolvimento moral, ele classifica em três níveis de desenvolvimento e em cada nível
há dois subestágios. Os dois estágios estudados por Piaget (1977), enquadram-se no nível
um, o da moralidade pré-convencional. Por volta dos dez anos, ocorre uma transição do
nível um para o nível dois (moralidade convencional), isto se dá por causa da mudança de
julgamento que passa de um baseado nas conseqüências e vantagens próprias, para outro
baseado nas regras do grupo a que o indivíduo pertence. A criança compreende que o certo
é o que sua família e/ou grupo que convive pensa ser certo e também o que ela quer que
seja certo.
Por volta dos dezesseis anos começa a se desenvolver o nível três que é o pós-
convencional, este nível vai se aperfeiçoando até a idade adulta, pode ser mais rápido para
uns do que para outros. Nesta fase percebe-se que as leis são necessárias, mas não são
fixas e que devem ser mudadas caso atinjam moralmente algum tipo de pessoa, para os
adolescentes as leis devem refletir valores individuais.
No próximo parágrafo destacaremos melhor a autonomia na escola fazendo uma
reflexão a respeito da abordagem deste aspecto moral em sala de aula.
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Dos 18 aos 30 meses começam a ser construídos nas crianças fundamentos da
autonomia, isto porque elas sentem que estão começando a controlar a expulsão e retenção
de materiais orgânicos provenientes de seu próprio corpo. Rappaport afirma que existe, em
nossa cultura, a necessidade de um controle precoce que deverá ser obtido a partir de
treinos rigorosos. A expectativa é de que as crianças tenham comportamentos regulares e
previsíveis, de maneira programada, mas o bebê age conforme o ‘treinamento’ por querer
se autoafirmar e mostrar que é capaz de realizar atividades sozinho para saber se será
amado mesmo agindo autonomamente.
Se a criança não notar estímulo e segurança por parte dos pais, o que seria
autonomia pode se transformar em vergonha e dúvida. Portanto, na escola de educação
infantil é necessário haver um incentivo às atividades em que as crianças possam ter
liberdade para criar, para escolher, para fazerem sozinhas, isto ajudará a desenvolver até
aquelas crianças que, por algum motivo, não são tão incentivadas em casa, não percebem o
interesse dos pais para aquilo que ela já consegue fazer sozinha.
Segundo Freire (1996), o professor é responsável pelo bom desenvolvimento dos
alunos, portanto ele não pode considerar a autonomia do aluno como algo que ele pode ou
não conceder quando quiser, porque se agir assim está transgredindo um imperativo ético.
O professor que não respeita a curiosidade do aluno, seus gostos, que minimiza as
crianças, que regula as atitudes dos alunos no menor sinal de rebeldia e também não impõe
limites, este transgride os princípios éticos fundamentais de nossa existência, o que
significa romper com a decência. Qualquer tipo de discriminação é imoral, inaceitável, por
isso é importante estar atento para que as crianças não tenham esse direito à autonomia
desrespeitado. Se o professor realmente deseja trabalhar adequadamente respeitará a
autonomia e a identidade do educando fazendo uso de uma prática coerente em sala de
aula.
No Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (RCNEI) estão
apresentados conteúdos apropriados para este período educativo, dentre eles alguns
merecem destaque por fazerem menção a aspectos e ações importantes para o
desenvolvimento da autonomia em crianças na faixa etária de quatro a seis anos.
São estes,
iniciativa para resolver pequenos problemas do cotidiano, pedindo ajuda se
necessário; participação em situações de brincadeira nas quais as crianças escolham
os parceiros, os objetos, os temas, o espaço e as personagens; valorização do diálogo
como uma forma de lidar com os conflitos; participação em situações que envolvam a
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combinação de algumas regras de convivência em grupo e aquelas referentes ao uso
dos materiais e do espaço, quando isso for pertinente ( BRASIL, RCNEI, 1998, p. 36,
37).
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As atividades que estimulem a ajuda mútua é de grande importância nesta fase,
porque cada criança possui competências distintas, isto proporciona trocas que permitem
às crianças vivenciarem a diferença de saberes. É importante que seja incentivado o
trabalho em grupo para a realização de atividades do cotidiano da sala de aula, como
organizar os brinquedos em seus devidos lugares, preparar o espaço para as refeições. Isto
permite que conversem sobre o que fazem e confrontem seus pontos de vista, assim as
crianças perceberão que suas opiniões são umas dentre outras demais e então possam
integrar suas idéias.
A rotina deve ser algo valorizado por docentes e instituição, pois quando as
crianças sabem da seqüência dos acontecimentos diários em sala de aula, poderão agir
com mais independência. Esse é outro aspecto fundamental para o desenvolvimento da
autonomia, então é necessário que na sala estejam expostas tabelas apresentando as
atividades diárias a serem realizadas utilizando desenhos e escrita (BRASIL, RCNEI,
1998).
Com uma visão panorâmica por essas teorias e definições, citadas anteriormente,
pode-se compreender que o desenvolvimento do ser humano é algo contínuo e permanente
até a fase adulta, quando as pessoas estão com seus valores e opiniões bem formados,
prontos para analisar os acontecimentos que as cercam e consertar seus erros. Mas para
formar adultos autônomos, com valores morais corretos, é imprescindível um trabalho na
educação infantil voltado para a construção desses comportamentos morais e com
independência, a criança não desenvolverá estes princípios corretamente se não for bem
preparada e acompanhada, estimulada e apoiada. Em seguida apresentaremos a
metodologia utilizada para formalizar este trabalho de pesquisa.
METODOLOGIA
Esta pesquisa foi realizada em uma escola da Rede Particular da Cidade do Recife,
de pequeno porte, cuja clientela é de classe média. Essa instituição dispõe de uma turma
de Educação Infantil, oferecida nos turnos matutino e vespertino, regidas pela mesma
educadora. Nossas observações foram realizadas no horário da tarde. Além da educadora,
a escola conta com a colaboração de uma auxiliar da Educação Infantil, seis funcionários e
a diretora. No intuito de adquirir informações que dêem suporte à construção de um
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conhecimento concreto, foi adotada uma metodologia fundamentada na abordagem
qualitativa.
A recepção das pesquisadoras foi feita pela diretora que se mostrou simpática e
acessível. Desde o primeiro momento explicitamos a nossa pretensão em analisar o
cotidiano da sala de Educação Infantil. Fomos apresentadas à educadora que
disponibilizou sua sala para as observações. Aproximadamente cinco minutos após
estarmos na sala, fomos apresentadas às crianças como estudantes da UFPE e que
passaríamos alguns dias juntos. Durante as observações as pesquisadoras faziam
anotações, quando necessário. As pesquisadoras tentaram, ao máximo, não interferir na
rotina da sala de aula, mantendo-se apenas como observadoras.
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andamento.
RESULTADOS
OBSERVAÇÕES
1. Os combinados
Quando as aulas começaram, era necessário manter um controle da turma, como por
exemplo, para beber água e ir ao banheiro, então combinamos que seria necessário pedir
permissão para sair e dizer o que iriam fazer, isto (...) para não virar bagunça de todos quererem
ir ao mesmo tempo.
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a organização dos alunos em sala, por tratar-se de uma turma mista na faixa etária de 2-5
anos. Nos dias observados foram presenciados momentos de discussão e resgate dos
combinados no grupo, de acordo com a necessidade do momento. Em diálogo com as
crianças, foi percebido que tais combinados pareciam estar internalizados e que as regras
estabelecidas faziam parte do dia-a-dia da classe. Em um dos dias observados, foi
presenciado o comentário da professora para a turma a respeito de um dos combinados
estabelecidos, onde expressava que ninguém deveria levar brinquedos de casa para a
escola. Uma das crianças expressa, em diálogo conosco, tal combinado dentre outros:
(...) para ir ao banheiro durante a aula pode ir sozinho, mas tem que avisar que vai; não
pode gritar para não atrapalhar os coleginhas; não pode bater no outro; não pode trazer
brinquedo de casa(...) porque se quebrasse a culpa seria de quem trouxe o brinquedo, então para
evitar confusão era melhor não trazer (observação de 26 / 06 / 06).
2. Relação professora-aluno
(...) Neste dia C. havia trazido uma garrafinha com suco e que ao abrir e colocar o suco
no copo, quase que derruba o suco por toda a mesa, mas mesmo assim se serviu sozinha. A
professora, de longe, observava o esforço que C. fazia (observação de 26 / 06 / 06).
Em outro momento, foi observado que uma criança de 3 anos vestia sua roupa após
ir ao banheiro sozinha. Por tratar-se de uma necessidade fisiológica de todo ser humano, ir
ao banheiro, a ênfase é dada à naturalidade com que a situação foi desenvolvida,
principalmente quando relacionada à idade da criança. Como se pode observar, a seguir,
no trecho:
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(...) uma das alunas menores indo ao banheiro, (...) após usar o sanitário levantou-se e
com grande dificuldade foi vestindo a roupa e andando ao mesmo tempo, como se não quisesse
perder tempo para aproveitar o recreio, apesar da dificuldade conseguiu arrumar-se sozinha. A
professora parecia atenta, pronta a ajudar, se necessário (observação de 21 / 06 / 06).
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3. Hábitos diários
Após a distribuição das tarefas de casa, as crianças ao colocarem suas tarefas nas pastas
também entregam as do dia anterior para a auxiliar, depois guardam as pastas em suas mochilas.
Tudo é feito com muita tranqüilidade (...) (observação de 16 / 08 / 06).
Em diálogo com a professora, é explicado sob qual motivo isto foi estabelecido:
Decidimos entregar as tarefas para que eles mesmos guardassem e organizassem em suas
pastas, porque antes perdíamos muito tempo da aula guardando estas tarefas pasta por pasta e
agora está melhor por agilizar nosso trabalho, com isto ganhamos tempo (observação de 14 / 08 /
06).
Chegou ao bebedouro ficou de pontas de pé para pegar um copo, ao puxar um copo, outro
caiu no chão. Ele pegou o copo que caiu e tentou colocar de volta ao recipiente no qual estava,
mas não conseguiu por conta da altura (ele era baixinho), então decidiu colocar em cima da
mesinha que estava o vasilhame de água. Então colocou água para beber, sem dificuldades, pois a
altura propiciava a todos se servirem da água sozinhos. Depois procurou com os olhos o lixeiro,
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tentou abri-lo pelo pedal, mas não conseguiu. O lixeiro parecia estar quebrado. Então procurou
outro, foi lá e tentou abrir com o pé novamente não conseguindo levantou a tampa com a mão e
jogou o copo, ao jogá-lo, este caiu fora do lixeiro, foi lá pegou o copo do chão e acertou
dentro do lixeiro (observação de 26 / 06 / 06).
(...) ao terminar de tomar seu mingau, Sérgio não deixou a mamadeira em qualquer lugar.
Procurou com os olhos a auxiliar, como viu que ela estava do outro lado da sala levantou, foi até
ela e entregou-lhe nas mãos a mamadeira (observação de 21 / 06 / 06).
4. Atividades escolares
Foi observado que quando solicitada em sala de aula para o auxílio de uma
atividade a professora orienta os alunos de uma maneira para que através da
reflexão possam chegar à resposta, ao invés de dar “tudo pronto”. Ela estimula o
raciocínio enfatizando a crença na capacidade de cada um. O trecho a seguir, explicita o
fato de forma clara, de acordo com a prática adotada durante uma atividade no quadro:
(...) quando eles ficavam perguntando qual letra seria a próxima, a professora dizia que
eles não tentassem adivinhar e sim pensassem, sugeria que eles voltassem na leitura até descobrir
qual letra viria depois da que tinha escrito. (observação de 14 / 08 / 06)
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Um dos alunos ficou em dúvida quanto ao número que vem após o número 5, então a
professora o orienta para que reiniciasse a contagem para descobrir qual seria este numeral,
após a contagem aluno disse: ‘é seis’ e a professora pediu que escrevesse (...) (observação de 15 /
08 / 06).
A professora distribuiu nas mesas lápis de cor e um desenho numa folha e ofício para que
pintassem. (...) Em cerca de cinco minutos, Sérgio entregou-lhe o desenho. Onde ela falou: ‘Que
lindo! Parabéns!’ Assim foi com o desenho de todos os alunos (observação de 21 / 06 / 06).
Foi verificada uma prática durante a realização das atividades de classe que até
então desconhecíamos, que era o fato das borrachas ficarem apenas com a professora.
Assim, quando as crianças erravam solicitavam à professora uma borracha para apagar a
tarefa. Este fato pareceu contraditório á prática observada da professora que tanto parece
incentivar a autonomia das crianças. O relato, a seguir, expressa um comentário da
professora a respeito do uso da borracha:
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Consideramos que o comentário da professora chama atenção para uma atitude que
teve por objetivo favorecer o desenvolvimento de atividades na sala, entretanto, podemos
questionar se mais interessante não seria conversar com as crianças e combinar com elas
sobre este uso da borracha, como tem sido feito em relação a diversos outros aspectos já
citados.
5. Clima de cooperação
(...) sentou uma coleginha em seu colo e ambas se abraçavam e arrumavam o cabelo da
outra.
Também foi possível observar que apesar das dificuldades que lhes eram
próprias em decorrência da faixa etária que pertenciam, os maiores se preocupavam em
ajudar os menores, o que demonstra serem crianças proativas e com um certo grau de
independência em relação aos que necessitavam de auxílio. Exemplos:
(...) havia a preocupação dos maiores com os menores para que estes não se
machucassem, ajudavam na hora do lanche abrindo o refrigerante do outro (observação de 14 /
08 / 06).
Um menino novato estava com uns pedaços de plástico jogando para o alto e juntando
depois para jogar novamente. Então uma menina se aproximou e pegou um pedaço de plástico
para ajudá-lo a apanhar, mas ele começou a chorar; rapidamente ela entregou o pedaço de
plástico para ele e disse: ‘Não chora, não! Olha aqui (observação de 16 / 08 / 06).
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intervenção dos adultos. De acordo com cada situação a professora assume uma postura de
advertência-los para que não façam inimizades entre si e nem maltratem seus colegas. Em
extratos, apresentados abaixo, é possível verificar alguns destes momentos:
(...) algumas meninas fizeram uma roda para brincar de ciranda, Camila viu e levantou
para brincar também na roda. (...) uma das meninas colocou a mão em seu peito e a afastou
dizendo: ‘Sai que você não sabe!’ E permaneceu brincando. (...) Camila voltou à mesa e
continuou lanchando. A menina que antes tinha dito que ela não brincaria na roda (...) olhou para
ela e disse: ‘Camila vem cá, me dá um abraço’. As meninas se abraçaram e se beijaram no rosto
(observação de 26 / 06 / 06).
(...) duas crianças brigavam, a menina bateu no rosto do menino e este reclamou para a
professora, esta por sua vez quis saber o por quê da briga, perguntou aos alunos: ‘Eu quero
brigas aqui na sala? Quero que batam no outro?’, responderam que não. (...) A professora
perguntou porque ela não queria que eles brigassem e responderam porque eram coleginhas,
amiguinhos. Perguntou se amigos devem bater um no outro, responderam que não (...)
(observação de 16 / 08 / 06).
(...) três crianças ficaram juntas em círculo conversando, quando uma das três começou a
pisar em algumas pecinhas que se encontravam no chão da sala. As outras duas também
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começaram a pisar onde algumas pecinhas quebraram (...), quando percebeu as três crianças que
quebravam as pecinhas no chão. Ao notar o acontecimento a professora perguntou: ‘o que é isso,
heim?’ As crianças rapidamente sentaram-se na cadeira. A professora conversou com as
crianças sobre aquele tipo de ação (observação de 21 / 06 / 06)
ANÁLISE DA ENTREVISTA
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família-escola. Na entrevista a professora relata um fato em que ela precisou conversar
com um dos alunos porque sua mãe o havia desencorajado chamando-o de burro:
“Precisei falar com ele dizendo que era capaz, que todos nós temos dificuldades em fazer
algumas coisas, mas mesmo assim não significa que somos burros, todos somos capazes (...)”.
(...) muitas crianças já vêm de casa sabendo usar o vaso sanitário, beber água sozinhas,
lanchar sozinhas também, nós aqui na escola apenas reforçamos estas atividades através de
brincadeiras, da divisão de tarefas entre eles.
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CONSIDERAÇÔES FINAIS
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decisão para que as próprias crianças apagassem suas falhas e conversasse com elas sobre
questões relativas a este aspecto (O que apagar? Por que apagar? etc). Parece que a
professora faz isto ou para observar mais de perto onde os alunos estão errando ou apenas
para agilizar seu trabalho sem pensar muito nos alunos.
Situações como estas (por exemplo, a da borracha) diferenciam-se do pensamento
de DeVries e Zan (1999) onde afirmam que deve existir o respeito pela criança e crer em
sua capacidade de decisão, fatores fundamentais para desenvolver a autonomia. Paulo
Freire (1996) complementa este argumento quando considera que o professor é
responsável pelo bom desenvolvimento dos alunos, não podendo considerar a autonomia
do aluno como algo que ele pode ou não conceder.
Um aspecto que ainda deve ser comentado refere-se à incoerência entre as atitudes
da professora e de sua auxiliar. Enquanto a professora parece educar para o
desenvolvimento da independência dos alunos, a auxiliar parece estar direcionando suas
atividades em busca de evitar qualquer interferência no desenvolvimento das aulas. Parece
ser necessário que a escola retome a discussão sobre o desenvolvimento da autonomia
infantil em seu interior e estabeleça esse debate com todos os seus funcionários.
Um outro aspecto analisado consiste na necessidade de maior articulação da escola
com a família. A professora expressa que gostaria que os pais dos alunos participassem
com mais ênfase da vida escolar de seus filhos e os estimulassem para a realização de
atividades sozinhos. Tal consideração mostra que vários são os responsáveis para
desenvolver a autonomia nas crianças e um deles é a família. Bee (1984), considera que a
criança desenvolve-se moralmente a partir do que aprendeu e internalizou de seus pais e
da sociedade na qual está inserida.
Um ponto que não foi verificado ao longo de nossa coleta de dados diz respeito à
continuidade do processo formativo de cada criança nas séries seguintes sob a forma de
registro formal. Ao ser questionada sobre esse assunto, a educadora nos informa que há
um contato constante entre as professoras e que costumam ‘trocar idéias’ e informações
sobre os alunos em reuniões ou então nos horários de intervalo, entretanto não parece
haver um registro escrito que resgate e retrate o desenvolvimento dos alunos durante o
ano.
Por fim, a relação estabelecida pela professora entre suas concepções e o
desenvolvimento de suas práticas parece preservar uma relação de correspondência. De
um modo geral, consideramos que o exercício de sua prática docente evidencia a
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dedicação desta para com o processo de desenvolvimento da autonomia das crianças
abrindo espaços para que estas desempenhem a autoria dos seus atos. Assim como a
professora observada, nós devemos ter consciência da importância da autonomia na vida
das crianças, portanto é necessário refletirmos a respeito de nossa prática docente assim
como o fez Paulo Freire quando escreveu: “Saber que devo respeito à autonomia e à
identidade do educando exige de mim uma prática em tudo coerente com este saber”
(FREIRE, 1996, p. 61).
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
PIÉRON, Henri. Dicionário de Psicologia. São Paulo: Globo, 1996, 10ª ed, p. 54.
PEAGET, Jean. O Julgamento moral na criança. São Paulo: Mestre Jou, 1977.
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