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Universidade Estadual Paulista

Júlio de Mesquita Filho


Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação
Departamento de Jornalismo

WEBJORNALISMO

por Eduardo Carli de Moraes


Junho de 2007
:: INTRODUÇÃO: WEBJORNALISMO ::

Há pelo menos 10 anos o cenário de produção e consumo de informações


vem sendo radicalmente repensado e redefinido com a difusão das novas
tecnologias informáticas e a disseminação cada vez mais massiva da Internet, num
mundo cada vez mais globalizado e interconectado – não distante da famosa
“aldeia global” preconizada décadas atrás por Marshall McLuhan. É evidente que o
jornalismo não passa incólume por todas as transformações e evoluções
tecnológicas que afetam nossas sociedades e também transforma-se, modifica-se e
se reconstrói em sua tentativa de se adaptar à nova realidade e bem aproveitar os
recursos e potencialidades abertos pelos novos meios de comunicação. “De certa
forma, o conceito de jornalismo encontra-se relacionado com o suporte técnico e
com o meio que permite a difusão das notícias. Daí derivam conceitos como
jornalismo impresso, telejornalismo e radiojornalismo." (MURAD: 1999). Daí ser
possível chamarmos de “webjornalismo” aquela espécie específica de jornalismo
que se relaciona com esse meio de comunicação relativamente novo que é a
Internet, com a ressalva de que não se trata de uma mera migração de um meio
para outro, mas de uma completa renovação do que entedíamos por jornalismo – a
“cara” do jornalismo na Era Digital certamente irá mudar, aliás já está mudando há
muito tempo, e faz-se necessário compreender a essência das transformações pelas
quais ele passa e a nova natureza que ele irá encarnar daqui para frente.

Muitas questões instigantes podem ser levantadas a respeito deste tema,


algumas delas já passíveis de receberem uma resposta parcial, outras que ainda
necessitaremos aguardar o futuro desenrolar das coisas para respondê-las: a World
Wide Web representa uma ameaça ou perigo para as empresas jornalísticas
tradicionais, que estariam de certo modo “com os dias contados”, ou representaria,
pelo contrário, uma importante aliada, que serviria como um meio para que estas
últimas expandam seus negócios e ampliem o raio de seu alcance e a variedade de
meios de que se podem utilizar para atingir seu público?

As “mídias tradicionais” teriam razões para temer que perderão muito


público e muita penetração na sociedade, já que se pode suspeitar que, cada vez
mais, o leitor procurará diretamente em fontes da Web aquilo que procuraa antes
em revistas, jornais e tele-noticiários? De que modo as novas tecnologias irão afetar,
transformar e revolucionar o jornalismo como tracidicionalmente o conhecemos? É
possível que jornais e revistas on-line, surgidos exclusivamente para o ambiente
web e utilizando-se de todos os recursos hipermidiáticos oferecidos por este meio,
acabem por adquirir o status de um sério competitor em relação aos jornais “reais”?

Que tipo de modificação de atitude se pode esperar, ou mesmo já


diagnosticar, no leitor que passa a gradativamente ter uma maior familiaridade e
segurança no oceano digital? Qual a modificação de mentalidade que se operará
sobre os leitores tracionais, acostumados a receberem informação um tanto
“passivamente” (no sentido de não poderem interajir ou criar conteúdos), agora
que se abre o leque de possibilidades para que o “leitor digital” se torne muito mais
participativo? De que modo se modificará o espaço físico das redações e como
imaginar a “redação do futuro”? Há alguma alteração em relação à ética e aos
valores neste momento em que o jornalismo migra para a Web, ou prosseguem
valendo os velhos baluartes sagrados da confiabilidade, credibilidade e isenção?

Neste trabalho procuramos oferecer um quadro geral a respeito de questões e


problemáticas como as supra-citadas. Através deste estudo, propomo-nos a expor
em termos concisos como se deu a inclusão do jornalismo no mundo digital
quando dos primórdios da instalação da Internet no Brasil, como as primeiras
experiências nesse ramo foram feitas, de que modo as empresas já tradicionais
migraram para a Web e como um novo jornalismo exclusivamente voltado para a
rede surgiu. Nos propomos também a analisar em termos teóricos as principais
inovações trazidas pela Internet, ou seja, todas aquelas características – tais como a
virtualidade, o imediatismo, a interatividade e o papel ativo do consumidor de
informação – que diferenciam o chamado webjornalismo das formas tradicionais e
impressas de jornalismo que conhecemos. A fim de oferecer igualmente um quadro
mais geral a respeito das transformações sociais e culturais que são efeitos diretos
ou secundários da massiva inclusão da Internet em nossas sociedades, também
trataremos de questões como a bitzação da informação e a criação de “inteligências
coletivas” - para esse fim, utilizaremos como auxílio o trabalho de renomados
teóricos da cibercultura e da sociedade da informação como Pierre Lévy e Nicholas
Negroponte.

Convêm salientar que esse trabalho não pretende ser um compêndio de


análises a respeito de sites específicos, já que não estava entre os nossos objetivos
fazer uma vasta pesquisa de campo a fim de narrar a quantidade de sites sobre
jornalismo na internet nem muito menos julgar de seu valor ou qualidade, o que
caberia em um outro trabalho de pesquisa, mais vasto. Nossa intenção aqui foi
unicamente pintar um panomara geral sobre o webjornalismo: como ele surgiu e se
desenvolveu, quais são suas caraterísticas marcantes, quais suas potencialidades e
os modos como podem ser aproveitadas, o que podemos esperar dele no futuro e
de que modo o quadro social e cultural está sendo transformado por ele.
:: DEFINIÇÃO DO VIRTUAL E O DECRÉSCIMO DA IMPORTÂNCIA DO
ESPAÇO FÍSICO ::

Para que possamos entender de modo adequado todas as implicações e


consequências sobre o jornalismo das novas tecnologias e meios de comunicação,
convêm fazer uma tentativa de compreender quais as principais inovações trazidas
pela Internet e pela disseminação dos computadores pessoais, entendendo de que
modo essas mutações agem sobre a sociedade e transformam o trânsito, a produção
e o consumo de informação. Neste contexto, é evidente que um dos conceitos mais
importantes dentro dessa nova conjuntura é o de virtualidade – tanto que se tornou
quase um lugar-comum usar como sinônimo de Internet a expressão “espaço
virtual”. Mas o que compreendemos por “virtual”? Trata-se de algo que convêm
esclarecer de modo minucioso, tamanha a importância para a compreensão de
como se realiza o jogo comunicacional no novo espaço comunicativo.

Em termos um tanto abstratos, que depois se tornarão mais claros através de


exemplos mais concretos, o filósofo francês Pierre Lévy, grande estudioso e
entusiasta da Internet, ensina que

“A palavra virtual vem do latim medieval virtualis, derivado por


sua vez de virtus, força, potência. Na filosofia escolástica, é virtual
o que existe em potência e não em ato. O virtual tende a atualizar-
se, sem ter passado no entanto à concretização efetiva ou formal. A
árvore está virtualmente presente na semente. Em termos
rigorosamente filosóficos, o virtual não se opõe ao real mas ao
atual: virtualidade e atualidade são apenas duas maneiras de ser
diferentes.” (LÉVY: 15)

Em outras palavras, diremos que o virtual não é o contrário do real, mas


apenas um real que ainda não se “atualizou”, por assim dizer - um real que existe
em potência, como se estivesse em uma gaveta que aguarda ser aberta, ou como se
repousasse numa “reserva” (pensemos numa espécie de dispensa) aguardando que
o usuário solicite seu “surgimentos”. Conteúdos virtuais obviamente não são
“irreais”, mas muitos deles permanecerão unicamente como conteúdos meramente
potenciais, que o usuário pode não vir a atualizar.

É óbvio que todo o processo de informatização e de virtualização, inserindo-


se nos processos produtivos e passando a fazer parte do cotidiano das empresas
dos mais variados ramos, acaba gerando transformaçãos irreversíveis e radicais na
organização empresarial. Há inclusive o surgimento de empresas inteiramente
virtuais, que prescindem de um espaço físico bem delimitado para funcionarem
pelo fato de poderem agir no “espaço virtual”. Pierre Lévy tem clara consciência
das modificações radicais que vem ocorrendo nas empresas tradicionais à medida
que elas vão tentando se adaptar ao “novo mundo” criado pela Internet:

“A organização clássica reúne seus empregados no mesmo prédio


ou num conjunto de departamentos. Cada empregado ocupa um
posto de trabalho precisamente situado e seu livro de ponto
especifica os horários de trabalho. Uma empresa virtual, em troca,
serve-se principalmente do teletrabalho; tende a substituir a
presença física de seus empregados nos mesmos locais pela
participação numa rede de comunicação eletrônica e pelo uso de
recursos e programas que favoreçam a cooperação. Assim, a
virtualização da empresa consiste sobretudo em fazer das
coordenadas espaço-temporais do trabalho um problema sempre
repensado e não uma solução estável. O centro de gravidade da
organização não é mais um conjunto de departamentos, de postos
de trabalho e livros de ponto, mas um processo de coordenação
que redistriui sempre diferentemente as coordenadas espaço-
temporais da coletividade de trabalho e de cada um de seus
membros em função de diversas exigências.” (LÉVY: p. 18)

No trecho supra-citado, fala-se num processo que afeta as empresas em geral,


mas é evidente que podemos dizer o mesmo a respeito das empresas
especificamente jornalísticas, as quais também vão sendo afetadas e transformadas
por essa nova realidade. Quando pensamos na progressiva “virtualização” das
empresas jornalísticas notamos muito desse processo que Levy descreve, sendo que
a “redação” lotada de empregados e localizada muito especificamente num certo
prédio físico vai se transformando em um outro tipo de cenário. Atualmente, será
difícil encontrarmos uma única empresa jornalística de médio ou grande porte que
produza todo o seu material dentro de uma espaço físico bem delimitado: a
redação.

Surgiu a possibilidade clara de que os profissionais trabalhem de um modo


muito mais “esparso” e “espalhado”, comunicando-se através de faxes, telefones
celulares, video-conferências, e-mails, salas de chat, fóruns do Orkut, entre variadas
outras opções de contato à distância. Os textos de um jornal e revista não precisam
mais, necessariamente, ser produzidos sempre no mesmo espaço físico, por
profissionais que compartilham o mesmo ambiente de trabalho. Muitas vezes, os
jornalistas, contribuidores e freelancers estão espalhados por vários estados ou
mesmo países e, auxiliados pela internet e pela velocidade dos meios de
comunicação, conseguem trocar mensagens e realizar o trabalho conjunto mesmo
estando literalmente separados no “espaço” por centenas de quilômetros. A cara do
jornalismo certamente vai se transformando. “A empresa virtual não pode mais ser
situada precisamente”, pondera Lévy. “Seus elementos são nômades, dispersos, e a
pertinência de sua posição geográfica decresceu muito.” (LÉVY: p. 19)

Por exemplo: na revista eletrônica de cultura e arte Rabisco


(http://www.rabisco.com.br), da qual o autor do presente trabalho é contribuidor,
nota-se que há no staff pessoas de estados extremamente variados. E não se trata de
uma exceção à regra: em outras revistas eletrônicas semelhantes, é extremamente
raro que os jornalistas e contribuidores estejam próximos uns dos outros no espaço
ou mesmo que exista qualquer coisa parecida como uma “redação”. Uma análise
dos staff do Speculum (http://www.speculum.art.br) ou do Scream And Yell
(http://www.screamyell.com.br) serve para atestar a evidência de que, cada vez
mais, uma revista ou jornal na internet tem uma probabilidade imensamente mais
alta de ser composta por membros dispersos geograficamente, ao invés de
profissionais ligados ao mesmo espaço físico.

:: TEXTO E HIPERTEXTO,
HIPERTEXTO E HIPERMÍDIA ::

A noção de hipertexto, paralalemante à de virtualidade, é outra que perpassa


como um fio condutor praticamente todas as discussões que se faz sobre a Internet
e o futuro do jornalismo na Web. Sem dúvida alguma, como Pierre Lévy nos
mostra, as duas noções se implicam mutuamente: o hipertexto é justamente um
texto impregnado de virtualidade, e a virtualidade é aquilo que fornece ao hipertexto
sua maior distinção em relação ao texto “tradicional”. Muito se comenta sobre as
enormes consequências do chamado hipertexto, cuja “definição bastante
simplificada” nos fornece Beth Saad. Segundo ela, hipertexto é:

“ - uma escrita não sequencial em que o leitor controla as


correlações;

- é uma forma narrativa que não se concretiza até o momento em


que o leitor a produza, por uma série de escolhas feitas a partir de
seus desejos e interesses;

- é uma forma narrativa que obriga jornalistas e demais


profissionais da comunicação produtores de conteúdos
informativos digitais a terem um senso muito claro de quem é o
seu público, e uma compreensão teórica do que sejam expectativas
de usuários, estratégias de busca e armazenamento de informação.
“ (SAAD: 2003, p. 77)

É muito simples entender a essência desta transformação operada sobre o


texto tradicional, como o conhecemos, no já célebro formato do “hipertexto”. É só
pensar que quando compramos um livro ou um jornal, o texto que temos em mãos
não possui de fato uma grande carga de “virtualidade”, no sentido que Lévy
entende a palavra: trata-se de um texto “acabado”, pronto, esgotado.

“O leitor de um livro ou de um artigo no papel se confronta com


um objeto físico sobre o qual uma certa versão do texto está
integralmente manifesta. Certamente ele pode anotar nas margens,
fotocopiar, recortar, colar, proceder a montagens, mas o texto
inicial está lá, preto no branco, já realizado integralmente”,
pondera Lévy.

Já no caso de um hipertexto, nos confrontamos com um tipo de texto que não está
inteiramente manifesto e “feito”, que permite conexões, expansões e ligações.

“ Na leitura em tela, essa presença extensiva e preliminar à leitura


desaparece. (...) A tela apresenta-se então como uma pequena
janela a partir da qual o leitor explora uma reserva potencial.”
(LÉVY: 39)

De modo que essa reserva potencial é um dos fatores mais cruciais que
diferencia um hipertexto jornalístico de um mero texto. As diferenças existentes
entre ler um texto “normal” e um “hipertexto” são muitas, principalmente porque
a potencialidade e a virtualidade estão muito mais presentes no hipertexto, sendo
que este permite um maior aprofundamento no assunto, uma conexão rápida com
outros conteúdos semelhantes, um mergulho mais radical em informações
pormenorizadas (mesmo que às vezes conflitantes e contraditórias).

“...hierarquizar e selecionar áreas de sentido, tecer ligações entre


essas zonas, conectar o texto a outros documentos, arrimá-lo a toda
uma memória que forma como que o fundo sobre o qual ele se
destaca e ao qual remete, são outras tantas funções do hipertexto
informático.” (LÉVY: 37)

Talvez por isso possamos dizer que quando estamos frente a um hipertexto,
em nossa tela de computador, não estamos meramente frente a um texto único, mas
sim frente a algo parecido com um depositório de muitos textos, alguns dos quais o
leitor selecionará para ler, outros que rejeitará e deixará em seu estado de mero
material de reserva. “Um hipertexto é uma matriz de textos potenciais...” (LÉVY: p. 40),
como comenta muito pertinentemente Pierre Lévy. Poderia ser dito igualmente que
um hipertexto é uma espécie de texto inicial que oferece, em seu interior, muitos
outros textos potenciais. Lévy enxerga nisso, inclusive, uma espécie de retorno de
uma certa conjuntura que caracterizava a comunicação oral, como ele explica no
trecho a seguir:

“...o texto contemporâneo, alimentando correspondências on line e


conferências eletrônicas, correndo em redes, fluido,
desterritorializado, mergulhado no meio oceânico do ciberespaço,
esse texto dinâmico reconstitui, mas de outro modo e numa escala
infinitamente superior, a copresença da mensagem e de seu
contexto vivo que caracteriza a comunicação oral.” (LÉVY: 39)

Mas é claro que as transformações trazidas pela Internet como novo meio de
comunicação extrapolam e muito esta mera inovação que chamamos “hipertexto” -
tanto que muitos preferem expandir esse conceito um tanto limitado (e talvez até
mesmo condenado a se tornar obsoleto, apesar de seu surgimento tão recente!) e
falam já em termos de “hipermídia”, um conceito muito mais complexo, vasto e
abrangente dentro do qual o hipertexto se enquadraria como uma mera categoria
entre tantas outras. Beth Saad destaca que

“com a web surge o conceito de hipermídia, reunindo na tela de


um computador conectado em rede mundial recursos de
hipertexto, imagens, animação e voz, tudo isso numa amigável
interface gráfica” (SAAD: 44).

Mas como definir mais precisamente o conceito de hipermídia? Uma das


definições consideradas mais adequadas e completas é a de Bob Cotton & Richard
Oliver, em Understanding Hypermedia 2000 (London: Phaidon Press, 1997), p. 5:

“...hipermídia é uma mídia com suporte em computador, que


disponibiliza texto, imagem, som, animação e vídeo, numa
variedade de combinações. É um meio de “acesso randômico”
onde começo, meio e fim não possuem uma configuração física,
possibilitando que informações sejam vinculadas a redes de
conexões que podem ser exploradas de muitas maneiras,
completamente diferentes. É um meio interativo, onde as
diferenças entre usuários e criadores tornam-se fluidas. É um meio
digital que pode ser distribuído tanto em disco como em redes de
comunicação como a internet. É também um meio que contém o
potencial de transformar os diferentes aspectos de nossa vida,
aprendizado e entretenimento.” (COTTON: 1997)

Já Nicholas Negroponte oferece outra vívida descrição:

“Hipermídia é uma extensão do hipertexto, um termo para


narrativas altamente interconectadas ou informações linkadas. (...)
Em um livro impressos, sentenças, parágrafos, páginas e capítulos
seguem-se uns aos outros numa ordem determinada não somente
pelo autor mas também pelo construto físico e sequencial do livro
em si mesmo. Embora um livro possa ser acessado aleatoriamente
e nossos olhos possam passear casualmente, é afinal de contas algo
fixado e confinado nas três dimensões físicas.

No mundo digital, este não é o caso. O espaço da informação não é


de jeito nenhum limitado por 3 dimensões.A expressão de uma
idéia ou cadeia de pensamento pode incluir uma rede
multidimensional de apontadores para subsequentes elaborações
e argumentações, as quais podem ser evocadas ou ignoradas. A
estrutura do texto deve ser imaginado como um complexo modelo
molecular. Nacos de informações podem ser reordenados,
sentenças expandidas, e palavram podem ganhar definições no
mesmo instante. Estas linkagens podem ser embutidas ou pelo
autor na hora da publicação ou depois, pelo leitor.

Pense na hipermídia como uma coleção de mensagens elásticas


que podem se expandir ou se contrair de acordo com as ações do
leitor.” (NEGROPONTE: 1995, p. 69)

::: PRIMÓRDIOS DA INTERNET NO BRASIL E AS PRIMEIRAS


INCURSÕES DO JORNALISMO NACIONAL NO
CIBERESPAÇO ::

Tendo em mente essas inovações possibilitadas pelo desenvolvimento das


tecnologias digitais e as potencialidades imensas que surgem no horizonte do
jornalismo nesta era dominada pelo hipertexto e pela hipermídia, iremos agora
fazer uma breve incursão histórica, descrevendo de que maneira a Internet
começou a se desenvolver no Brasil e como surgiram os primeiros experimentos do
jornalismo neste novo ambiente tecnológico.

Quando pesquisamos a respeitos dos primóridos da internet do Brasil, é


impressionante constatar o quanto um fenômeno tão recente já se tornou tão
difundido e já causou tantas transformações no cenário da informação e da cultura
em geral – um fenômeno que é evidentemente algo mais global do que meramente
nacional. É só pensar que a revolução informática e, posteriormente, o começo do
desenvolvimento e difusão da Internet no Brasil é um fenômeno que data dos anos
80 e 90.
Mas a “revolução” não começou tão recentemente quantos alguns imaginam,
já que a invasão dos computadores pessoais nas redações e a introdução de
aparelhos como faxes, BBS (Bulletin Board System) e ferramentos para tele-
conferências já começaram a mudar radicalmente a cara das redações dos grandes
jornais e revistas dezenas de anos atrás. Segundo Beth Saad,

“Estas inovações traziam a idéia de que o processo de comunicação


dominante – a comunicação de massa unidirecional – passaria a
conviver, por conta das novas tecnologias, com outras formas mais
individualizadas e específicas de relação entre receptores e
mensagens.” (SAAD: 21)

Um resgate histórico pode ser esclarecedor nesse momento, narrando de


modo sucinto como se deu o desenvolvimento da Internet e do webjornalismo no
país. Para este fim, podemos mais uma vez recorrer à Beth Saad, que descreve com
detalhes como se deram os primeiros passos do jornalismo brasileiro na rede
mundial de computadores, que culminaria com a criação dos primeiros grandes
“portais” jornalísticos nacionais – capitaneados por grandes empresas como Estado
de S. Paulo e pelo Grupo Folha.

“No Brasil, se considerarmos a tecnologia digital em seu sentido


estrito, retornamos à década de 1980, com a introdução do
computador nas redações. E, considerando as chamadas
tecnologias digitais de informação, utilizadas para a captação,
produção e distribuição de conteúdos informativos, chegamos a
1992, com os primeiros serviços de informação financeira criados
pela Agência Estado, do Grupo O Estado de S. Paulo, e
distribuídos através de onda broadcast (de rádio); e, em 1996, com
a criação das primeiras experiências de conteúdo na World Wide
Web (utilizando o protocolo de transmissão TCP/IP) pela própria
Agência Estado e do jornal Folha de S. Paulo com o lançamento do
Universo Online (UOL).” (SAAD: 166)

É portanto somente a partir de meados da década de 90 que se pode


efetivamente constatar que a Internet passa a penetrar, de início com muita lentidão
e “modéstia”, na vida dos brasileiros. Nâo custa lembrar que antes de 1995
praticamente ninguém havia ouvido falar nesta tal de Internet, muito menos
utilizado aquilo que viria a se tornar a rede mundial de computadores, sendo que
essa grande novidade tecnológica, ainda em seu estado de gestação e de parto,
ficava extremamente restrita às universidades e aos especialistas em informática,
considerando-se que se exigiam conhecimentos específicos muito complexos e
detalhados para que fosse possível navegar na rede. Sem falar que muito tempo
decorreu até que fossem surgindo os provedores de acesso à Internet, já que no
início da Web no Brasil a única empresa autorizada a prover este acesso era a
Embratel.

Como aponta Beth Saad, quando descreve em minúcias o cenário nacional


antes da chegada da “era dos bits”, a Internet só começou a realmente se
desenvolver com vigor no país a partir da segunda metade dos anos 90,
considerando-se que

“Até o final de 1995, internet no Brasil traduzia-se em


universidade, acesso restrito e complicado, conhecimento de
comandos Unix para utilização mínima da rede. Na época, um
mundo restrito a pesquisadores que 'enviavam um Bit Net'
quando queriam se comunicar com outros grupos de pesquisa no
exterior, também alojados em universidades. Ter acesso a dados de
outras instituições era o mesmo que uma operação de guerra,
sendo necessário acessar primeiramente o computador central da
instituição, com todas as devidas permissões, em seguida passava-
se por uma série de servidores internos, lentamente, até a conexão
e acesso ao conteúdo desejado. Uso de Pcs, interfaces gráficas para
acesso e visualização de conteúdos e protocolo de comunicação
TCP/IP, que permitia o uso de linhas telefônicas comuns para
envio de dados, eram procedimentos muito distantes do dia-a-dia
não acadêmico. Para aficionados em computação, que possuíam as
primeiras versões dos computadores domésticos – o pioneiro XT -,
já existiam os Bulletin Board System (BBS), permitindo a
comunicação entre computadores através de ondas de rádio.
Sistemas que foram gradativamente se tornando mais potentes e
com o consequente uso comercial.” (SAAD: 2003, p. 167)

Se os primeiros estágios da Internet no Brasil foram ultrapassados nos anos


de 1996 e 1997, os anos seguintes representariam um período de intenso
crescimento e desenvolvimento, sendo que

“A partir de então, com um momento de auge – o chamado boom


da internet brasileira – entre 1998 e meados de 2000, assistimos a
uma movimentação sem precedentes na composição do segmento
de informação jornalística. Lançamentos bombásticos, criação de
novas marcas, ascensão de concorrentes sem tradição jornalística,
troca-troca de profissionais entre empresas pontocom, salários
astronômicos e campanhas publicitárias audaciosas foram o ponto
alto desse momento. E, quase que concomitantemente e num ritmo
próprio, assistimos aos grandes conglomerados de mídia do país –
Abril, Folha, Estado e Globo – lançarem suas operações digitais
em diferentes momentos, com alguma preocupação quanto à
perenidade, sobrevivência, consolidação, tecnologia e futuro.
Todos, também com alguma percepção de que a essência da World
Wide Web é o conteúdo e, portanto, que empresas informativas
seriam o ponto focal e mais sensível desse novo mundo pautado
pela informação digital.” (SAAD: 167)

Mas nem tudo se desenrolou de modo tão positivo assim, já que


concomitantemente a esse boom da internet ocorrido entre 1998 e 2000,
aproximadamente, também ocorreu um período de crise no mercado de mídia, sem
falar na grande insegurança que se produzia em relação à Internet, que muitos
ainda enxergavam com muito temor:

“Esse mesmo período também produziu um dos mais estrondosos


retrocessos do mercado de mídia no Brasil, acompanhando a
tendência mundial. Assistimos ao fechamento, à dissolução, venda
ou fusão das empresas puramente pontocom, demissões em massa,
suspensão de serviços digitais, evasão de capital e dos investidores
de risco, retorno de profissionais de comunicação aos seus velhos e
seguros abrigos das chamadas mídias tradicionais, uma re-
ordenação dos patamares salariais, a retração do mercado
publicitário, e uma grade dúvida: seria a web um novo mercado
mediático rentável e independente, ou apenas mais um sofisticado
canal de distribuição de informações para um público específico,
elitizado e apressado?” (SAAD: 2003, p. 165-66)

De modo que o webjornalismo ainda demoraria um bom tempo para de fato


começar a existir com o surgimento dos primeiros websites criados pelas empresas
jornalísticas. As dificuldades não diziam respeito somente à mudança de uma
mídia impressa para uma digital, ou de átomos para bits, mas também diziam
respeito à metamorfose que se exigia do público para que ele fosse capaz de obter
acesso à nova informação, já que

“A disseminação de conteúdos jornalísticos de caráter geral por


meios digitais requeria uma transformação não só no
comportamento do leitor, mas especialmente em seu grau de
alfabetização tecnológica e em seu padrão econômico, social e
educacional.” (SAAD: 169)

De pouco adiantava que uma empresa criasse um website vinculando


conteúdos jornalísticos se a imensa maioria do público não conseguia acesso à
Internet ou, se conseguia, mal conseguia manejar os softwares para corretamente
aproveitar o que tinha em mãos. Deste modo, foi inicialmente com passos tímidos
que o jornalismo nacional começou a penetrar na Web e a experimentar seus
poderes neste novo cenário, sendo que, obviamente, os primeiros estágios foram
vencidos principalmente por empresas que já tinham uma boa base e potencial
para investimentos de risco neste novo ramo econômico, sendo que, nos
primórdios da Internet, quando ainda vigorava uma enorme desconfiança em
relação a esse novo meio,

“Saiu na frente quem tinha posicionamento estratégico de


pioneirismo e infra-estrutura empresarial para enfrentar um novo
desafio de mercado que poderia, conforme a tônica de discussões
entre os publishers, literalmente matar sua galinha de ovos de
ouro. A web jornalística brasileira inicia-se sob a ameaça de morte
do meio impresso.” (SAAD: 2003, p. 169)

::: DIFICULDADES MIGRATÓRIAS ::


Como acabamos de mostrar, a princípio se verificou, nos primórdios da
Internet no Brasil, uma certa desconfiança em relação ao novo meio e uma certa
incapacidade de lidar adequadamente com o que ele oferecia, de modo que a
migração do meio impresso para o digital não se deu sem certas dificuldades:

“Com o aparecimento da internet verificou-se uma rápida


migração dos mass media existentes para o novo meio sem que, no
entanto, se tenha verificado qualquer alteração na linguagem. O
chamado "jornalismo online" não é mais do que uma simples
transposição dos velhos jornalismos escrito, radiofônico e
televisivo para um novo meio. Mas o jornalismo na web pode ser
muito mais do que o actual jornalismo online. Com base na
convergência entre texto, som e imagem em movimento, o
webjornalismo pode explorar todas as potencialidades que a
Internet oferece, oferecendo um produto completamente novo: a
webnotícia.” (CANAVILHAS: 2007)

Pode-se dizer que o autor exagera ao afirmar categoricamente que os mass


media migraram para o novo meio sem que se tenha verificado nenhuma alteração
de linguagem, pois obviamente foram feitas experimentações e inovações visando
uma adaptação criativa e orgânica à Internet, sendo que os websites de jornais,
revistas, rádios e cadeias de Televisão obviamente não eram meras “cópias” do
conteúdo e da linguagem do meio “mãe”, mas tinha informações exclusivas,
diferentes possibilidades de informação, uma maior interação entre vários
elementos díspares, entre outas ciosas. O autor provavelmente se refere ao
momento inicial de desenvolvimento da Internet, quando os órgãos da imprensa
que se aventuraram a criar os primeiros websites na rede costumam simplesmente
reproduzir o conteúdo do jornal impresso, como aponta Canavilhas no trecho seguinte:
“Marshall McLuhan afirmava que o conteúdo de qualquer
medium é sempre o antigo médium que foi substituído. A internet
não foi excepção. Devido a questões técnicas (baixa velocidade na
rede e interfaces textuais), a internet começou por distribuir os
conteúdos do meio substituído - o jornal. Só mais tarde a rádio e a
televisão aderiram ao novo meio, mas também nestes casos se
limitaram a transpor para a internet os conteúdos já
disponibilizados no seu suporte natural. (...) E apesar do
inquestionável interesse da difusão destes conteúdos à escala
global, é um completo desperdício tentar reduzir o novo meio a
um simples canal de distribuição dos conteúdos já existentes.”
(CANAVILHAS: 2007)

Já nota-se aí a óbvia tomada de consciência de que a Internet é um meio


poderoso demais, que abre possibilidades extremamente fecundas, para que seja
utilizada meramente com um instrumento de difusão em maior escala (global,
aliás) de conteúdos pre-existentes e já pré-publicados em outros meios de
comunicação, exigindo, pelo contrário, um conteúdo inédito, próprio a este meio,
que respeite e aproveite todas as suas potencialidades.

“Se, para o jornalista, a introdução de diferentes elementos


multimédia altera todo o processo de produção noticiosa, para o
leitor é a forma de ler que muda radicalmente. Perante um
obstáculo evidente, o hábito de uma prática de uma leitura linear,
o jornalista tem de encontrar a melhor forma de levar o leitor a
quebrar as regras de recepção que lhe foram impostas pelos meios
existentes.” (CANAVILHAS: 2007)
:: IMPRESSO E DIGITAL: MODIFICAÇÕES E RESSONÂNCIAS ::

Falar sobre o jornalismo e as novas formas que ele irá encarnar na chamada
Era Digital não é assunto de pouca importância, considerado que o setor de
informação e comunicação, dentro do qual o jornalismo se enquadra,

“é o mais impactado pelas novas tecnologias, já que informação é,


ao mesmo tempo, sua matéria-prima, seu principal produto e sua
base de sustentação. E informação e seu transporte eram o cerne
das novas tecnologias de informação, sendo a web o carro-chefe.”
(SAAD: 23)

Porém, convêm destacar que dificilmente poderíamos falar numa radical


transformação de valores nessa passagem do jornalismo de um ambiente impresso
para um ambiente digital, já que, segundo notam muitos estudiosos, os mesmos
valores que norteavam os modos tradicionais de jornalismo – tais como a
credibilidade, a isenção, o comportamento ético, a informação “limpa” de
interesses ideológicos, políticos ou religiosos, etc. – continuam valendo tanto
quanto antes. A mudança de meio não implica uma total reestruturação de valores,
mas sim um aumento no escopo de possibilidades e potencialidades que o
jornalismo pode explorar neste novo meio “hipermidiático” que é a Internet.

Estaríamos portanto frente a um modo radicalmente novo de jornalismo, que


tornaria inúteis todos os conhecimentos adquiridos nos tempos de jornalismo
impresso, que exigiria a completa reestruturação dos cursos universitários voltados
à formação de comunicadores sociais? Estaríamos vendo nascer uma “raça”
completamente nova de jornalismo, completamente desvinculado de sua anterior
encarnação impressa? Os especialistas insistem que não – como acabamos de
comentar, os valores que norteiam a prática jornalística permaneciam intactos nesta
migração do impresso para o virtual, e portanto não se trata de dizer, como garante
Beth Saad, que o novo jornalismo que se torna possível nessa nova conjuntura
dispensaria o conhecimento das ferramentas e da prática do jornalismo tradicional.
Muito pelo contrário. Segundo a mesma autora,

“apenas quem domina o conjunto de tarefas que geram


informações, conteúdos ou mensagens, ou seja, quem domina a
práxis do jornalismo tradicional e seus diferentes gêneros, é que
teria em mãos os instrumentos, as habilidades e as competências
para trabalhar nesse novo formato informativo.” (SAAD: 2003)

Ainda sobre a questão das diferenças entre o jornalismo impresso e o


webjornalismo, podemos nos perguntar a respeito da duração dos órgãos e se é de
fato verdadeira a suposição de que a efemeridade é uma característica marcante
dos empreendimentos de jornalismo na Web. Será que os jornais on-line estariam
condenados a uma vida curta como tantos outros sites da Internet, que muitas
vezes acabam tendo uma duração bastante efêmera, ou conseguirão se constituir
como fornecedores de conteúdo com anos e anos de tradição nas costas, respeitados
e cheios de crediblidade? Beth Saad, a respeito dessa questão, pondera que de fato
a realidade da Internet é de uma mutabilidade muito mais veloz, mas que velhos
valores permanecem essencialmente imutáveis:

“o ritmo constante e em ondas de vida e morte dos


empreendimentos 'pontocom' dá como lição para analistas e
pesquisadores que os tradicionais provedores de conteúdo se
mantêm sobreviventes a despeito das turbulências”, mas que para
isso precisam sobretudo mantêr-se em um alto nível de
“reconhecimento, audiência e credibilidade”, o que,
evidentemente, são “os mesmos valores da velha e conhecida
mídia” (SAAD: 2003, pg. 79).

Mas é evidente que exige-se das empresas uma grande agilidade em termos
de acolhimento de novidades tecnológicas e modificação de estratégias no
ambiente digital, já que

“Com a era internet inaugura-se o tempo de inovações


tecnológicas com ciclos de vida muito rápidos. Essa situação exige,
pelo menos conceitualmente, uma agilidade correspondente da
empresa que assume o papel inovador, pois o essencial para
manter a sua competividade num mercado volátil é possuir fôlego
financeiro e equipes multidisciplinares que acompanhem e
sustentem as transformações.” (SAAD: 2003, p. 169)

Do mesmo modo que não podemos constatar (nem desejar) nenhuma radical
transformação nos valores éticos que permeiam o jornalismo em sua encarnação
sob a forma digital, também podemos dizer que, mesmo com todas as
transformações impostas ao jornalismo com a chegada das novas tecnologias, certas
funções tradicionais dentro da profissão não se tornaram, de modo algum,
ultrapassadas ou obsoletas. Uma destas funções é a do editor, que permanece sendo
uma figura de relevância crucial dentro de uma publicação voltada para a Web.
Isso porque

“ainda hoje as expectativas do consumidor da internet se


aproximam daquelas do consumidor da mídia tradicional – há
necessidade de um editor, seja homem ou máquina, para reduzir a
complexidade e expor a essência da informação disponível.”
(SAAD: 2003, pg. 10)
Podemos até dizer que o papel do editor, longe de ter se tornado
desnecessário, se tornou ainda mais importante e crucial num meio como a
Internet, em que a quantidade imensa de informação e de material bruto
frequentemente pode causar no usuário a sensação de estar pedido num oceano de
bits, sites, textos e opções, sendo bastante relevante a função dum editor que
cuidadaria do ofício de selecionar e enfatizar aquilo que julga ser o mais essencial,
servindo como uma espécie de guia através do imenso oceano digital.

:: DO UNIDIRECIONAL AO BIDIRECIONAL ::

Esse é um ponto crucial a ser destacado se quisermos compreender a


principal das “revoluções” causadas pela entrada do jornalismo na era da Internet:
o fato da transformação do processo comunicativo unidirecional num processo
muito mais “bidirecional”. Alguns chegam mesmo a ousar a conclusão, como faz
Beth Saad, que “passamos por uma completa transformação do paradigma
comunicacional” (SAAD: 2003, pg. 57). Esta autora destaca que o jornalismo na
Web

“coloca produtor e receptor da informação no mesmo patamar;


possibilita diálogos interpessoais e intergrupais sem a intervenção
do produtor da informação; com potencial de uso não apenas de
distribuição e captação de informações, mas também de
gerenciador de dados e criador de sentido para grupos de usuários
de qualquer porte.” (SAAD: 2003)

Uma das mais radicais transformações diz respeito ao papel do receptor das
informações. Tradicionalmente, o leitor de um jornal ou de uma revista permanecia
como uma espécie de receptor passivo de informações prontas, entregues a ele
pelas empresas jornalísticas de sua escolha, sendo que seu espaço para interação,
sugestão e comentários era muito restrito – sem falar que ele não contribuía em
nada com a confecção das matérias e com o fornecimento de conteúdo. Com a
Internet toda essa realidade muda e os receptores de informação deixam de ser
passivos e passam a ter a possibilidade de uma verdadeira interatividade com os
produtores da informações, podendo inclusive se tornarem contribuidores e
produtores de conteúdo.

De acordo com Chuck Martin, na obra The Digital Estate,

“a internet é um meio diferenciado porque ela não permite apenas


aos consumidores literalmente mergulharem e surfarem através de
infinitos mares informativos, mas confere poder ao usuário para
ele mesmo inserir suas informações na rede. E mais importante, o
conceito de usuário criador de conteúdo e de contextualizações é
totalmente consistente ao conceito da própria web. É um meio que
existe para conectar pessoas. Então, por que não dar a essas
pessoas bons motivos para estarem conectadas?” (MARTIN: 1996)
Canavilhas é outro que destaca bem o papel preponderante da interatividade
no jornalismo on-line:

“A máxima "nós escrevemos, vocês lêem" pertence ao passado.


Numa sociedade com acesso a múltiplas fontes de informação e
com crescente espírito crítico, a possibilidade de interacção directa
com o produtor de notícias ou opiniões é um forte trunfo a
explorar pelo webjornalismo. Num jornal tradicional o leitor que
discorda de uma determinada idéia veiculada pelo jornalista
limita-se a enviar uma carta para o jornal e a aguardar a sua
publicação numa edição seguinte, tendo habitualmente que
invocar a Lei de Imprensa para o conseguir. Por vezes a carta só é
publicada dias depois e perde completamente a actualidade.
Outras vezes o jornalista não responde, ou fá-lo de forma a
encerrar a discussão, fechando a porta a réplicas. No webjornal a
relação pode ser imediata. A própria natureza do meio permite
que o webleitor interaja no imediato. Para que tal seja possível o
jornalista deve assinar a peça com o seu endereço electrónico.
Dependendo do tema, as notícias devem incluir um "faça o seu
comentário"de forma a poder funcionar como um fórum. No
webjornalismo a notícia deve ser encarada como o princípio de
algo e não um fim em si própria.” (CANAVILHAS: 2007)

Negroponte também destaca que um jornal permite “leituras” um tanto mais


diversificadas do que um programa de televisão, uma vez que cada pessoa constrói
seu próprio “percurso”, selecionando as editorias que mais lhe interessam e tendo
sua atenção capturada por diferentes notícias e matérias.

“A transmissão televisiva é um exemplo de um meio de


comunicação no qual toda a inteligência está no ponto de origem.
O transmissor determina tudo e o receptor apenas recebe o que é
oferecido. (...) Um jornal também é produzido com toda a
inteligência no transmissor. Mas o meio físico do papel de formato
largo oferece uma espécie de alívio para a 'monotonia' da
informação, uma vez que ela pode ser consumida de modos
diferentes, por diferentes pessoas, em diferentes tempos. Nós
viajamos e perambulamos pelas páginas, guiados pelas manchetes
e pelas fotos, cada um de nós tratado de modo bastante diverso os
mesmos 'bits' que são entregues a centenas de milhares de
pessoas. Os bits são os mesmos, mas a experiência de leitura é
diferente.” (NEGROPONTE: 1995, p. 20)

:: IMEDIATISMO e
TRANSFORMAÇÕES NA LEI DA OFERTA E DA DEMANDA ::

Outra característica do jornalismo direcionado à Web que é importante


destacar consiste no potencial que ele tem para um imediatismo inigualado e
inigualável por qualquer outra mídia impressa – websites estão noticiando
praticamente em tempo real acontecimentos que os jornais tradicionais só poderão
noticiar em suas edições do dia seguinte e que as revistas semanais de informação
demorarão ainda mais a retratar. Sem falar que a repercussão dos conteúdos
jornalísticos vinculados na Internet é muito mais rápida e imediata, uma vez que o
autor da matéria pode instantaneamente começar a receber e-mails de seus leitores
e sua notícia pode ser comentada segundos após sua publicação.

“O imediatismo com que as informações podem ser transmitidas


(e comentadas em e-mails e salas de bate-papo) faz com que o
telejornal noturno e o jornal impresso do dia seguinte, por
exemplo, tragam no mínimo um pequeno “atraso” com relação aos
seus conteúdos e ao grau de informação já absorvida por seus
leitores” (SAAD: 2003).

Chegará o dia, talvez, em que o leitor, ao pegar o jornal às sete da manhã,


passará os olhos sobre as notícias e dirá para si mesmo: “mas eu já fiquei sabendo
disso tudo na Internet ontem de noite!”? É bastante possível, e talvez alguns de nós
já tenham passado por uma experiência parecida, tendo nos colocado a questionar
qual será o futuro dos órgãos de jornalismo impresso tendo como concorrentes os
grandes websites com sua imensa capacidade para a transmissão imediata de
conteúdos. Alguns especialistas chegam a arriscar certas profecias sobre o futuro
do jornalismo. Katherine Fulton, em seu artigo “News Isn't Always Journalism”,
comenta que

“o jornalismo se tornará uma parte cada vez mais reduzida de um


sistema global de mídia e comunicação em expansão contínua. Tal
sistema, por sua vez, se transformará na infosfera na qual iremos
viver, nos divertir e trabalhar. 'Mídia' será onde buscaremos
notícias, entretenimento, conhecimento e dinheiro. O que
normalmente era considerado separado e distinto – os elementos
de conjuntos denominados jornal, redes de tevê ou educação
universitária – estará vinculado e entranhado na textura de nossas
vidas.” (FULTON: 2001)

Além do incrível imediatismo com que as informações podem ser


transmitidas pela Web, outro ponto que convêm enfatizar é uma certa modificação
no modo como consumimos estas informações, já que a tradicional relação de
oferta e demanda parece ter sido bastante modificada quando atentamos para os
procedimentos das empresas jornalísticas na Internet em relação às empresas
tradicionais. A estudiosa Margarethe Steinberger, em artigo para São Paulo em
Perspectiva: Comunicação e Informação, nos ajuda a entender esse fenômeno ao
comentar que

“dentro de uma concepção liberal o jornalismo é visto como uma


atividade produtora de informação em um sistema de compra e
venda de informações regulado pelo mercado. Isso se dá de tal
forma que as empresas informativas produzem proporcionalmente
ao que o público consegue consumir. A superprodução de
informação, nessa perspectiva, não pode existir. O que há é uma
adequação permanente da oferta aos parâmetros da (suposta)
demanda.” (STEINBERGER: 1998)

Por isso se fala numa suposta “inversão de forças” que estaria ocorrendo
entre oferta e demanda como uma consequência inelutável das novas tecnologias:
as empresas jornalísticas no mundo digital não mais “produzem
proporcionalmente ao que o público consegue consumir”, já que na Internet há a
possibilidade de que uma oferta maior que a demanda, por assim dizer, ou seja,
uma “superprodução de informação” que não será inteiramente aproveitada por
cada um dos usuários, mas que ficará livre para ser explorada livremente. Não
custa lembrar que a Web não sofre tanto com a “limitação espacial” que aflige os
jornais e revistas, que têm espaços específicos e limites de páginas e de caracteres
que não podem ser ultrapassados, o que constitui uma dificuldade para passarem
seus conteúdos – enquanto que “a quantidade de informações na World Wide Web
é ilimitada” (SAAD: 2003).

Uma vez que o leitor digital, ao invés de ser um mero receptor passivo de
informações prontas e limitadas, como era enquanto leitor de jornais e revistas
tradicionais, ele transforma-se em alguém que participa muito mais ativamente do
processo de constituição e construção da “informação”: seleciona os caminhos por
onde irá passear pelas veredas digitais, tem seu percurso particular de acordo com
os links que escolherá clicar e abrir, poderá contribuir ele mesmo com novo
conteúdo...

“Vemos o papel do usuário, ou do leitor digital, cada vez mais


ativo e interferenet nos conteúdos, nas suas escolhas e na
composição de uma diversidade de fontes informativas que
possam satisfazer seus desejos. Assim, o controle do fluxo de
produção de informações paira no éter do ciberespaço, e a postura
de 'fábrica dos desejos'', inerente à concepção liberal, já não tem o
controle total do lado da oferta, pendendo muito mais para a
demanda.” (SAAD: 2003)

De modo que o leitor digital adquire um “novo status” em relação ao leitor


tradicional de jornais impressos, já que o hipertexto acaba conferindo-lhe papel ativo,
do mesmo modo que muda o status do produtor de informação, que passa a ter
que lidar não somente com o fornecimento da informação que esperam dele, mas
também com a capacidade de disponibilizar uma grande quantidade de conteúdos
e com modo de gerar grande interatividade com seus receptores.

Segundo Janet Murray

“...quando os leitores são considerados muito mais como


colaboradores do que consumidores, as tarefas de reportar e editar
passam da simples transmissão de conteúdos para a função de
desenvolvimento e concepção de um quadro informacional. Sob
essa perspectiva, o reportar, narrar e editar deverão centrar forças
na criação de uma estrutura narrativa que facilite a navegação do
usuário por uma diversidade de recursos informativos. Tais
recursos incluem, por exemplo, dados não editados ou
aproveitados, documentos e relatórios e outros materiais que
ajudem o usuário a construir sua própria leitura da realidade
muito mais do que simplesmente ler a representação dessa
realidade dada pelo jornalista.” (MURRAY: 1997)

::: ERROS E ACERTOS DOS


WEBSITES JORNALÍSTICOS ::

Quando analisa o trabalho atualmente realizado pelos sites informativos nacionais


e internacionais, Beth Saad diagnostica certos erros comuns a muitos deles quanto à
utilização (mau-feita ou simplesmente insuficiente...) da hipermídia. A autora
destaca que

“o que vemos ainda hoje em sites informativos ativos na web é


uma predominância de: muito peso no texto, formatado
visualmente numa perspectiva de verticalidade em colunas
herdade dos meios impressos; (...) confusão entre quantidade de
informações ou notícias (...) em detrimento da qualidade; um
distanciamento de preocupações como criação de linguagem,
novas narrativas ou até mesmo a remota possibilidade de criação
de um novo gênero jornalístico; pouca compreensão do real uso da
contextualização, criando uma tendência ao que alguns autores
chamam de linkalism, ou a síndrome da hiperlinkagem...” (SAAD:
2003, pg. 72)

Talvez esses sejam problemas de um meio ainda em desenvolvimento, que


dá os seus primeiros passos e que irá progressivamente se tornando mais específico
e se distinguindo cada vez mais dos meios que o precederam. Como aponta Beth
Saad, o webjornalismo ainda permanece aferrado uma visão que lhe foi legada pelo
jornalismo impresso – predominância do texto e da apresentação “vertical” da
informação, por exemplo.

Quanto aos links, a discussão é calorosa quanto aos efeitos benéficos ou


maléficos dos mesmos no interior de uma mátéria jornalística. Seria preferível um
texto “limpo”, sem conexões diretas com outros conteúdos, que contivesse somente
em seu final uma lista de outros sites para o leitor que quisesse se aprofundar no
assunto? Essa parece ser a opinião de alguns estudiosos, que consideram que o
exagero de links acaba por “dispersar, confundir e vincular o conteúdo informativo
ao aspecto comercial e publicitário” (Saad: 2003, p.73).

Mas estarão as empresas informativas preparadas para lidar com as


modificações no modo de informar e no tipo de participação do público receptor?
Beth Saad sugere que esse novo cenário ainda está “em gestação” e que há uma
urgente necessidade, por parte das empresas, de se adaptarem o mais rápido
possível à nova realidade através de inovações tais como “reutilizar sua própria
produção de informação” (pensemos, por exemplo, num jornal que reutiliza em seu
website o material que utilizou em sua versão impressa, com modificações ou não),
“guardar o que antes se jogava fora” (pensemos na enorme capacidade de
armazenamento de informação que o mundo da Web permite, possibilitando, por
exemplo, que uma revista torne disponível a seu público em seu “arquivo digital”
suas edições anteriores, que antes eram “jogadas fora”, por assim dizer), “a
potencializar com recursos tecnológicos o que antes era estático (pensemos na
possibilidade, por exemplo, de transpor uma matéria, que em sua versão impressa
tinha apenas texto e fotos, para a Internet, potencializando-a com recursos de
vídeo, de música ou de rádio), “compreeender a informação enquanto um conjunto
re-organizável de dados, imagens e voz”. (SAAD: 2003)

As possibilidades são inúmeras. Se, no jornal impresso, o leitor pode somente


ler a declaração de uma certa personalidade, na Internet pode ouvi-lo diretamente.
Com o avanço da velocidade na transmissão de dados, que tem tornado cada vez
mais velozes os índices de transmissão de brodcasting, logo se tornará possível
assistir na íntegra o vídeo sonoro de alguém entrevistado por algum jornal,
enquanto que o leitor da versão impressa ficará preso ao velho mundo bi-
dimensional de texto e imagens estáticas.

::: REVOLUÇÃO CORPORATIVA ::

Há quem insista que a Internet causou uma revolução completa nas


empresas informativas e “quebrou completamente a cadeia de valores das
empresas informativas”. Isso é destacado pela empresa de consultoria Forrester
Reserach Inc., que, em relatório de 2000, destacou as modificações radicais trazidas
pelas novas tecnologias digitais, redutíveis a quatro principais:

“os consumidores não pagarão por qualquer conteúdo acessado


via internet; os anunciantes cada vez mais estarão em busca de
modelos de pagamento de espaço publicitário baseados na
performance do site; a audiência será cada vez mais fragmentada e
não de massa; a tecnologia facilita o surgimento de criadores de
conteúdo individuais, livres de custos e das pesadas estruturas dos
'dinossauros da mídia'”. (SAAD: 2003, p. 97)

De fato, gigantescas empresas do ramo da informação têm começado a sentir


o impacto causado pela “concorrência” com criadores de conteúdo individuais.
Hoje em dia, uma informação veiculada pela CNN on-line ou por algum grande
portal informacional pode ser desmentido ou refutado por imagens, textos, vídeos
ou quaisquer outras informações veiculadas por pequenos jornais on-line
independentes ou mesmo por blogs jornalísticos. Na ocasião da Segunda Guerra do
Iraque, tornou-se célebre a polêmica entre o que diziam os blogs investigativos (e
frequentemente anti-americanos) e a cobertura proposta pelas grandes empresas
jornalísticas presentes na Internet.

Segundo Philip Evans & Thomas Wurster

“liberados da economia das coisas, os jornalistas poderão enviar


seu conteúdo por e-mail diretamente para os leitores. Estes, por
sua vez, poderão combinar e comparar conteúdos de um número
ilimitado de fontes. Também poderão acessar notícias
diariamente, ou quantas vezes quiserem no dia, de diferentes
serviços noticiosos. Poderão ter à escolha críticas de filmes,
sugestões de viagem e receitas diretamente das editoras e dos
melhores gatrônomos. Articulistas famosos, chargistas ou o
Instituto Nacional de Meteorologia poderão enviar seus conteúdos
diretamente a seus assinantes.” (EVANS: 2000)

:: A BITZAÇÃO DA INFORMAÇÃO
E A REDEFINIÇÃO DA MÍDIA DE MASSA ::

Nicholas Negroponte chama a atenção para uma mudança fundamental,


irreversível e veloz que estamos assistindo nas últimas décadas: o que podemos
chamar de “bitzação” da informação, para usar um neologismo. Este termo serve
para dar uma idéia do principal fator do processo, que é a mudança de informação
baseada em átomos para informação baseada em bits.

“O movimento metódico de música gravada através de pedaços de


plástico, assim como o lento manuseio humano da maior parte da
informação na forma de livros, revistas, jornais e videocassetes,
está prestes a se tornar um trâfego instantâneo e pouco custoso de
dados eletrônicos que viajam à velocidade da luz. Desta forma, a
informação pode se tornar universalmente acessível. (...) A
mudança de átomos para bits é irrevocável e impossível de parar.”
(NEGROPONTE: 4)

O que significa, claro, que grande parte das empresas tradicionais vê-se
diante de uma dilema tendo que “migrar”, por assim dizer, de um ambiente
analógico para um digital, de um universo onde o importante eram os átomos para
outro onde impera o reinado do bit, muitas delas tendo dificuldades para
transformarem adequadamente seus conteúdos do modo analógico para o digital,
outras não conseguindo ao certo como prestar no mundo da Internet os serviços do
mesmo modo e com a mesma eficácia que conseguiam no mundo “concreto”, por
assim dizer.

Muitas empresas, notando essa rápida transformação dos bits em átomos,


decidiram, para usar uma expressão muito feliz de Arthur Sulzberger Jr, “sair do
negócio de espalhar tinta sobre árvores mortas e partir para a distribuição digital”.
Segundo ele,

“uma das tarefas mais difíceis que vieram com a internet: os


jornais devem equilibrar as suas forças tanto no meio analógico
quanto no meio digital e perceberem que os dois mercados
possuem consumidores com expectativas diferentes. O desafio é
certamente complexo, mas os publishers ainda devem manter suas
unidades independentes de new media e as duas áreas devem
interagir constantemente.” (SULZBERGER: 2001)

Não serão poucas as empresas tradicionais que acabarão por sucumbir ou ter
muito de seu poderio e influência enfraquecidos casam não consigam embarcar de
fato na rodovia digital, enquanto empresas antes de pequeno ou médio porte agora
têm diante de si a possibilidade de um crescimento rápido, caso consigam adaptar-
se melhor e com mais criatividade ao universo da Web.

“A super-avenida da informação centra-se no movimento global


de bits sem-peso à velocidade da luz. Enquanto uma indústria
após outro olha-se no espelho e pergunta-se sobre seu futuro num
mundo digital, este futuro é dirigido quase 100 por centro pela
habilidade dos produtos e serviços desta empresa de serem
transformados ou recodificados para a forma digital.”
(NEGROPONTE: 1995, p. 12)

Atualmente, é claro que grande parte do procedimento de produção de um


jornal ou de uma revista é completamente mediado por componentes digitais, de
modo que se torna um tanto problemática uma caracterização dicotômica que fosse
distinguir entre empresas jornalísticas “analógicas”, de um lado, e “digitais”, de
outro. Pois, como bem nota Nicholas Negroponte, quando nós consideramos
qualquer empresa jornalística moderna, notamos que a produção das notícias
ocorre inteira mediada pelo computador, pela informática ou por outros recursos
tecnológicos de suporte digital.

“O texto é preparado num computador; as estórias são


frequentemente enviadas para dentro da redação, pelos repórteres,
por e-mail (ou fax). As figuras são digitalizadas e frequentemente
são transmitidas pelo fio também. O layout das páginas de um
jornal moderno é feito com sistemas de design via computador, os
quais preparam os dados para transmissão para filme ou direta
gravação em placas. Isso equivale a dizer que o processo inteiro de
concepção e construção de um jornal é digital, do começo ao fim,
até o último degrau, quando um bocado de tinta é lançado sobre
árvores mortas. Esse é o degrau onde os bits se tomam átomos”
(NEGROPONTE: 1995).

A descrição vívida de Negroponte demonstra bem o quando, mesmo nos


órgãos da chamada mídia impressa, os bits tomaram o lugar dos átomos e
“dominam” grande parte do processo de “gestação” e criação do jornal ou revista.

“Agora imagine que o último degrau (ou fase) não ocorra em uma
gráfica de impressão, mas sim que os bits sejam entregues a você,
leitor, como bits. Você pode preferir imprimi-los em sua casa para
que possa aproveitar todas as conveniências de uma HARD COPY
(para a qual o uso de papel re-utilizável é recomendado, para que
todos nós não necessitemos de uma enorme pilha de papel em
branco a ser impresso). Ou talvez você prefira fazer o download
deste bits direto para o interior do seu laptot, palmtop, ou até
mesmo, algum dia, para o seu “receptor” perfeitamente flexível,
totalmente colorido e de alta-resolução, à prova d'água (que
acontece de se parecer exatamente com uma folha de papel e
cheirar como uma, também, se isso lhe agrada).” (NEGROPONTE:
1995, p. 56)

Claro que o autor, neste trecho, faz uma pequena brincadeira com suas
profecias ao imaginar o futuro da informação e do consumo do jornalismo. Mas
não deixa de ser algo plausível que imaginemos que realmente surgirão, cada vez
mais, diferentes aparelhos, dos mais diversos formatos e estilos, alguns parecendo
livros ou revistas, que serão uma espécie de PC em miniatura, conectados à
internet, e que estarão programados para fazer download de bits de certas
empresas – as editoras do novo mundo digital... - e exibi-las na tela de um modo
que poderá, é claro, sinergizar texto, foto, vídeo, aúdio e muito mais. Não é
completamente absurdo imaginar um tempo, num futuro não muito distante, em
que comprar jornais ou revistas feitos de papel seja algo obsoleto, um costume para
entrar nos livros de história como uma curiosidade de tempos idos, e que a
humanidade do futuro vá lidar com a informação sempre através de uma interface
gráfica que transmuda bits em mensagens visuais.

“A mídia de massa será redefinida por sistemas para a transmissão


e o recebimento de informação e entretenimento personalizado. As
escolas irão se transformar para se tornar mais como museus ou
playgrounds para que as crianças reunam idéias e socializem com
crianças ao redor do mundo. O planeta digital vai parecer a cabeça
de um alfinete. Enquanto vamos progressivamente nos
interconectando uns aos outros, muitos dos valores de uma nação-
estado cederão lugar para aqueles de tanto maiores quanto
menores comunidades eletrôncias. Nós iremos sociabilizar em
“redondezas digitais” (digital neighborhoods) nas quais o espaço
física será irrelevante e o tempo irá jogar um papel diverso.”
(NEGROPONTE: 1995, p. 6-7)

::: O FIM DO ESCRITO? ::

Uma suspeita que alguns podem ter diz respeito à possibilidade do “fim do
escrito”, ou ao menos das forças tradicionais do texto escrito e impresso que
conhecemos... Com a fusão de várias mídias em uma só, nesta salada de frutas da
Internet em que se mistura texto, imagens, vídeos, sons, animações e anúncios,
estará condenada ao nada a forma tradicional de apresentação de um texto? Ou
será isso ser apocalíptico demais? Pierre Lévy filosofa:

“A multiplicação das telas anuncia o fim do escrito, como dão a


entender certos profetas da desgraça? Essa idéia é muito
provavelmente errônea. Certamente o texto digitalizado, fluido,
reconfigurável à vontade, que se organiza de um modo não linear,
que circula no interior de redes locais ou mundiais das quais cada
participante é um autor e um editor potencial, esse texto
diferencia-se do impresso clássico.

Mas convém não confundir o texto nem com o modo de difusão


unilateral que é a imprensa, nem com o suporte estático que é o
papel, nem com uma estrutura linear e fechada das mensagens. A
cultura do texto, com o que ela implica de diferido na expressão,
de distância crítica na interpretação e de remissões cerradas no
interior de um universo semântico de intertextualidade é, ao
contrário, levada a um imenso desenvolvimento no novo espaço de
comunicação das redes digitais. Longe de aniquilar o texto, a
virtualização parece fazê-lo coincidir com sua essência
subitamente desvelada. Como se a virtualização contemporânea
realizasse o devir do texto. Enfim, como se saíssemos de uma era
pré-histórica e a aventura do texto começasse realmente. Como se
acabássemos de inventar a escrita.” (50)

As relações entre produtores e consumidores se modificam de modo também


radical, já que
“o ciberespaço abre de fato um mercado novo, só que se trata
menos de uma onda de consumo por vir que da emergência de um
espaço de transação qualitativamente diferente, no qual os papéis
respectivos dos consumidores, dos produtores e dos intermediários
se transformam profundamente.” (62)

Como se sabe, Pierre Lévy via com muito otimismo a perspectiva da criação de
uma certa “inteligência coletiva” através do desenvolvimento das tecnologias de
informática e comunicação, de certo modo prolongando as boas profecias que fazia
o também otimista Marshall McLuhan. Segundo Lévy,

“o desenvolvimento da comunicação assistida por computador e


das redes digitais planetárias aparece como a realização de um
projeto mais ou menos bem formulado, o da constituição
deliberada de novas formas de inteligência coletiva, mais
flexíveis, mais democráticas, fundadas na reciprocidade e o
respeito das singularidades. Neste sentido, poder-se-ia definir a
inteligência coletiva como uma inteligência distribuída em toda
parte, continuamente valorizada e sinergizada em tempo real.”
(LÉVY: 96)

Pode ser que um otimismo tão grande se preste ao escárnio de alguns, mas
poucos negariam o fato de que a Internet permite a criação de conteúdos através de
várias mãos e vários cérebros, dispersos no espaço e separados no tempo, de modo
que tem todo sentido do mundo falar em uma “inteligência coletiva”, distribuída
em toda parte, que produz (e não pára nunca de produzir) novos conteúdos.
Pensemos em qualquer website jornalístico exclusivamente virtual e no modo como
há a possibilidade de que as matérias ali veiculadas tenham sido produzidas nos
mais diversos estados da nação, ou mesmo no exterior, juntando-se ali naquele
espaço da Web.

“Tanto quanto a pesquisa utilitária de informação, é essa sensação


vertiginosa de mergulhar no cérebro comum e dele participar que
explica o entusiasmo pela Internet. Navegar no ciberespaço
equivale a passear um olhar consciente sobre a interioridade
caótica, o ronronar incansável, as banais futilidades e as
fulgurações planetárias da inteligência coletiva. O acesso ao
processo intelectual do todo informa o de cada parte, indivíduo ou
grupo, e alimenta em troca o do conjunto. Passa-se então da
inteligência coletiva ao coletivo inteligente.

Apesar de numerosos aspectos negativos, e em particular o risco de


deixar no acostamento da auto-estrada uma parte desqualificada
da humanidade, o ciberespaço manifesta propriedades novas, que
fazem dele um precioso instrumento de coordenação não
hierárquica, de sinmergização rápida das inteligências, de troca de
conhecimentos, de navegação nos saberes e de autocriação
deliberada de coletivos inteligentes.” (117)

:: CONSIDERAÇÕES FINAIS ::

A chegada massiva dos computadores pessoais e da Internet em nossas


sociedades e vidas pessoais transformou radicalmente o cenário coletivo e
individual, tendo causado consequências irreversíveis no ramo da informação, um
dos mais afetados pelas novas tecnologias e meios de comunicação. Observamos a
veloz transformação e reestrututração das empresas responsáveis pela produção de
conteúdos jornalísticos em sua tentativa de adaptação à nova realidade – sendo que
o jornalismo vem mudando de cara, por assim dizer, mas sem perder suas
características marcantes nem seus valores tradicionais. Como mostramos neste
trabalho, o webjornalismo é uma invenção relativamente recente, já que só a partir
de meados dos anos 90 é que os primeiros experimentos sérios neste ramo foram
realizados pela Agência Estado e pelo Grupo Folha, entre outras empresas, e após
muitos erros e percalçoso jornalismo da Web foi mudando e evoluindo a fim de
aproveitar de modo otimizado todo o campo de possibildiades aberto a ele. As
características principais que definem esta nova era – o grande imediatismo, o
papel fundamental da virtualidade, o decréscimo da relevância do espaço físico, a
desterritorialização da informação, a transformação de átomos em bits, a
interatividade e o papel mais ativo do receptor... - tornam o webjornalismo um
campo repleto de potencialidades interessantes a serem desvendadas e exploradas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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