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4 a 7 de novembro de 2008
PERFIL DE
UM GESTOR
*
CULTURAL
Apoio
Fundação ArcelorMittal Brasil Equipe DUO Informação e Cultura
UNA 1º Seminário
VIVO
Ariel Lucas Silva
Daniel Patrick
Apoio Cultural Diego Ribeiro
Rádio Inconfidência Elaine Vignolli
Rede Minas Eliane Lopes Gomes
Lei Estadual de Incentivo à Cultura Luciana Naves
Governo do Estado de Minas Gerais Marcelo Lages Murta
Lei Federal de Incentivo à Cultura Nádia Matos
Ministério da Cultura Yasmini Costa
SUMÁRIO
Tão importante quanto os profissionais que vieram expor suas reflexões colocadas
em debate foi a participação efetiva de 294 inscritos de 12 estados brasileiros.
Este Iº Seminário recebeu, ao todo, 694 inscrições de 20 estados e mais de 100
municípios, das cinco regiões brasileiras. Esses são números significativos que
nos permitem afirmar que, atualmente, o campo da gestão cultural tem um espa-
ço fundamental de reflexão sobre a área da cultura, no âmbito do setor público,
da iniciativa privada e das organizações da sociedade civil. Tal perspectiva aponta
uma realidade que é o reconhecimento da gestão cultural como um campo de
trabalho imprescindível para o processo de profissionalização do setor cultural
como um todo.
Apoio Cultural
A ArcelorMittal Brasil é uma das principais siderúrgicas da América Latina, com
presença destacada nos setores de aços longos e planos ao carbono. Constituída
em dezembro de 2005, reúne três das mais competitivas empresas siderúrgicas
do País - ArcelorMittal Aços Longos (incluindo a Acindar da Argentina e a Arcelor-
Mittal Costa Rica), ArcelorMittal Tubarão e ArcelorMittal Vega.
A adoção dessa política traz novas diretrizes para o investimento no setor, alinha-
das aos valores da Agenda 21 de Cultura, com foco na Formação de Públicos e
Acessibilidade, Formação Artística e Formação de Gestores e Técnicos. Trata-se
de uma visão contemporânea de inserção cultural, alinhada com uma preocu-
pação com os valores de identidade, diversidade, acessibilidade, qualidade de
gestão e sustentabilidade, com resultados de médio e longo prazos.
Para atuar com essa nova forma de trabalho e fortalecer uma gestão comparti-
lhada com os diversos profissionais envolvidos na coordenação dos programas
culturais, a Fundação criou o Comitê de Cultura, com representantes de áreas
estratégicas da ArcelorMittal para seleção e análise de projetos.
Foi com grande satisfação que assistimos à maneira como o seminário provocou
o debate sobre a formação profissional e sobre a diversidade de campos de atua-
ção do gestor cultural, condições necessárias à expansão e profissionalização do
setor no país. Dividir experiências com representantes de diversas nacionalidades
também é aprimorar a gestão da cultura em todo o mundo de uma maneira única,
evitando assim o aumento da assimetria de regiões economicamente mais ricas
em relação às demais.
ABERTURA ALFONS
que eu gostaria de falar porque tem
uma fonética parecida com a da minha
língua materna que não é o espanhol,
MARTINELL
é o catalão. Eu vou me expressar em
espanhol e fazer uma apresentação da
forma mais clara possível.*
DESENVOLVIMENTO
hoje é uma combinação de várias coi-
sas que eu tenho pensado ultimamen-
te e basicamente é uma provocação.
Eu a chamei de “Três desafios do de-
E FOMENTO
apresentação dela e é fantástica.
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Em 1940, nos tempos do Sérgio Buar- Então vamos tentar imaginar o que ceu tanto assim, mas o que aconteceu Os neoliberais são tremendamente po-
que de Holanda, das Raízes do Brasil, quer dizer isso: chineses, japoneses, com seus pobres? Eles mudaram de bres no receituário, eles falam: invis-
desses 40 milhões de habitantes, 32 mi- coreanos, sírios, libaneses, italianos, endereço, eles não estão mais lá no tam nas pessoas, invistam em saúde,
lhões viviam no campo e apenas oito es- mineiros, baianos, pernambucanos, “cafundó do seridó” e vieram ser seus educação, e deixam os mercados fun-
tavam na cidade. Olha o que aconteceu gente dos quatro cantos do mundo vizinhos, não é? Tornaram-se bandos cionarem livremente. Então vamos ti-
nesses 40 anos, olha como triplicou a que veio “fazer a América” em São metropolitanos. Mudou a natureza do rar essas intervenções todas e é como
população brasileira! Desses 80 milhões Paulo, em um processo totalmente negócio, não é? Mas continuam sendo se os mercados fossem obras do “pa-
de brasileiros a mais que “apareceram”, caótico, absolutamente impossível de pobres. Então você não pode só falar pai do céu”, que é só deixá-los funcio-
74 foram para a cidade, 74 dos 80 mi- se organizar, com uma desigualdade de crescimento, você tem que falar de nar que eles funcionam direito.
lhões vieram para a cidade. Então foi devastadora, uma desigualdade de outras coisas, você tem que falar, por
uma mudança radical, a nossa cabeça oportunidade devastadora, mas uma exemplo, de desigualdade. Se você não A gente sabe que mercado é uma
se formou nesse momento. A identidade imensa capacidade de mobilidade so- falar de desigualdade, o que adianta? construção bacana, quando funciona
brasileira que a gente tem hoje se cons- cial. Havia caixinhas mágicas como o o mercado é uma coisa legal, não é?
truiu ao longo dessas datas. O Brasil se SENAI, que pegava pé rapado de um A segunda coisa é que não faz sentido Eu sou fã de mercado, mercado quan-
transformou em um país, primeiramen- pau de arara, semi-alfabetizado, e em dar ênfase só às coisas materiais, às do funciona é uma maravilha. Defi-
te, não-pobre. Em segundo lugar, essen- dois anos transformava aquele cara maquinas, aos equipamentos, às coi- nição de mercado: um lugar em que
cialmente urbano e razoavelmente mo- num operário de ponta, numa indús- sas. Você tem que dar atenção para as as pessoas se encontram para fazer
derno, ao longo dessas décadas em que tria de ponta ali no ABC. Em dois anos pessoas, para o capital humano, para trocas de forma espontânea. Quando
primava o modelo de desenvolvimento o cara saía lá do mato no interior do a saúde, a educação, a relação entre funciona é ótimo. Agora, a maior par-
crescimentista. nordeste, um interior onde não tinha as pessoas, o capital social. Tudo isso te dos mercados, se você deixar fun-
nada, e virava um operário de ponta, aqui é neoliberal. Falar de desigualda- cionar, não funciona ou, pelo menos,
O crescimento demográfico, que era sem passar pela escola, uma mobi- de, falar de capital humano, de saúde, não funciona direito. Alguém de vocês
extraordinário, tornou-se insignificante lidade extraordinária que aconteceu. de educação é falar de temas que as empresta para uma pessoa que não
se comparado ao progresso material. Havia uma promessa, o que eu quero pessoas acham que são de direita. Só conhece? Então, há muita gente que
Esse foi o Milagre Econômico do início dizer é que há no subconsciente cole- para ver como o tema é confuso, outra vocês não conhecem que precisa de di-
dos anos 1970. Nós mudamos enorme- tivo um modelo como esse, uma idéia coisa que eles diziam, pelo menos que nheiro, especialmente os mais pobres.
mente e nos demos muito bem durante de que existe um Estado Nacional ca- eles avisavam lá pelo meio dos anos Você é capaz de dar dinheiro para uma
esse período desenvolvimentista. Nós paz de prover a oportunidade de mobi- 1960, é que esse modelo crescimen- pessoa que você não conhece, mas
tivemos um progresso material que, na lidade para todos, mais cedo ou mais tista, além de ser autoritário, era in- você não vai emprestar, não é? Então
verdade, nenhum outro lugar do planeta tarde. Muito bem, esse modelo explo- trinsecamente concentrador de renda. o mercado de crédito é um mercado
e em nenhum outro momento do tempo diu, esse modelo foi para o espaço, e Concentrador de renda por quê? Por- tipicamente imperfeito, há um monte
até aquele momento - hoje se pode falar teve conseqüências - eu brinco aqui que há um juiz ladrão, o Estado, que de assimetrias, sendo que quem mais
alguma coisa da China -, na história da que bem que os neoliberais tinham é um árbitro do conflito que decide precisa acaba ficando de fora, acaba
humanidade, tinha experimentado uma avisado que isso ia acontecer, não é? É deliberadamente quem ganha e quem sendo meio pobre.
revolução como essa, dessas quatro dé- uma brincadeira porque vivem falando perde. Ele intervém em tudo, então
cadas. E as locomotivas desse proces- mal de neoliberal. Quando se discute quem ganha sempre são os mais for- Mas vamos ver o que aconteceu no
so, tanto do ponto de vista demográfico neste país, falar “neoliberal” é pior do tes. Passou-se a idéia de que se está nosso país com a implosão do mode-
quanto do ponto de vista material, eco- que xingar a mãe: acabou a discussão, concentrando renda, de que aquilo lo crescimentista. Nós passamos uma
nômico, foram as metrópoles brasilei- desqualificou o adversário, partiu para não é um resultado indesejado do mo- geração com o freio de mão puxado.
ras, as principais metrópoles brasileiras. a estupidez, não tem mais conversa. delo, aquilo é intrínseco ao modelo. Nós crescemos, durante 40 anos, 7%
As metrópoles, tanto em termos demo- Mas os neoliberais têm alguma coisa Aquilo não é um efeito colateral, aqui- ao ano. E nós passamos a crescer 2 ou
gráficos quanto em termos econômicos, interessante, em que às vezes a gente lo faz parte da natureza do bicho. Não 2.2% ao ano, em média, ao longo de
cresceram mais do que o conjunto bra- não presta atenção. se consegue corrigir aquilo, é implícito 25 anos, de 1980 a 2005. Mas o pior é
sileiro, foram elas que empurraram a naquela brincadeira. Além disso tudo, que a freada foi, sobretudo, das princi-
locomotiva pra frente. Para vocês terem O que os neoliberais diziam dos cresci- com essas intervenções generalizadas pais locomotivas do processo anterior,
uma idéia, São Paulo, a região metropo- mentistas? Primeiro: que crescer não em todos os mercados, acabam sendo das principais metrópoles. São Paulo,
litana de São Paulo, de 1940 a 1980, basta. De que adianta crescer se você provocadas distorções de tal tipo no que crescia 4,5% demograficamente
aliás, de 1920 a 1980, durante 60 anos, não reduz a pobreza? No caso brasilei- âmbito microeconômico que algum no período anterior, passou a crescer
cresceu 4,5% ao ano em termos demo- ro era tão maluco que o país cresceu, dia acabam explodindo, acabam vi- 2%; que crescia 10% economicamen-
gráficos. Economicamente, cresceu 10% cresceu, cresceu e foi reduzida a pro- rando uma “meleca astronômica” em te no período anterior ao ano, passou
ao ano durante 60 anos. É coisa para porção de pobres, mas não se reduziu termos macroeconômicos. Vai virar in- a crescer 1,5%, durante 25 anos. O
deixar qualquer chinês no chinelo! O Rio o número de pobres. Então o pessoal flação, vai virar déficit público, vai virar Rio crescia 3% demograficamente e
de Janeiro, que ficou para trás, que foi chega e fala: escuta só, mas para que dívida externa, não é? Eles cantaram passou a crescer 1%, mas, economi-
devagar durante 60 anos, cresceu 3,3% você quer crescer tanto se não é para isso, eles cantaram que isso ia acon- camente, de 7% passou para 0,57%. O
demograficamente e cresceu 7% ao ano reduzir o número de pobres? Você tecer e aconteceu na virada da década que aconteceu é que as nossas metró-
economicamente, durante 60 anos. cresceu como ninguém nunca cres- de 1970 para 80. poles cresceram menos ainda do que o
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país, e o pior, demograficamente, não dade, em termos de desigualdade en- burros n’água, não conseguiram repe- é que fica o nosso sonho civilizatório
é? As nossas metrópoles continuaram tre tipicamente o município periférico tir as condições que seus pais tiveram do século XX? Como é que fica? A re-
crescendo mais do que o país, embora e o município central de uma região no passado de ingressar no mercado volução do Sérgio, faltou dizer aqui,
tenham reduzido o ritmo de crescimen- metropolitana, vale para Rio, vale para de trabalho; não conseguiram entrar tem um componente cultural muito
to demográfico. O nosso país está cada São Paulo, vale para Belo Horizonte, no mundo da modernidade da mesma importante, quer dizer, ele diz que a ur-
vez mais metropolitano, é isso que eu vale para Curitiba, vale para Recife, forma que os pais tinham consegui- banização é a revolução não só porque
estou querendo dizer. Nós temos 40% etc. e tal. do entrar. Então, isso gera um imen- tem uma coisa estatística, mas porque
da nossa população, 42% para ser pre- so mal-estar que gera conseqüências seria a maneira de subverter a marca
ciso, que está nas regiões metropoli- Você tem um século de diferença de para o conjunto do país. patrimonialista que sempre caracteri-
tanas. Essas regiões metropolitanas desenvolvimento humano, isso quer zou o relacionamento entre o público
são importantes porque, além de nós dizer que, para o município periférico Eu vou falar duas palavras sobre as e o privado em nosso país. E patrimo-
sermos muitos nas regiões metropoli- alcançar as condições que o município perspectivas que nós temos. Eu sei nialismo é essa coisa aí de você, tipica-
tanas, é aqui que estão os formadores central da região metropolitana tem que o Goldman Sachs hoje está meio mente crescimentista, criar dificulda-
de opinião, é aqui que está a mídia, é em termos de renda, de saúde e de ridicularizado, seja porque não é mais des para vender facilidades, de você
aqui que se constrói o imaginário cole- educação, deveria levar, no ritmo atu- um banco de investimentos, é um ter uma política “para os amigos tudo
tivo nacional, é aqui que a gente cons- al, um século - um século! Dentro de banco comercial e quase foi engolido, e para os inimigos a lei”, não é? Tipi-
trói a representação de nós mesmos e um município central de uma região precisou de ajuda estatal e, pior ainda, camente é isso. Então para você sub-
nós estamos há uma geração - não é metropolitana você tem um outro sé- agora nós temos um banco brasileiro verter a urbanização seria um proces-
há uma década -, nós estamos há uma culo entre o pior e o melhor bairro, você maior do que o Goldman Sachs. Então, so. Como é que fica isso, hein? Como
geração encolhendo em termos de PIB tem dois lados de uma mesma rua realmente o Goldman Sachs está de- é que a gente pode pensar isso num
per capita. Depois de toda a mobilida- separados por oito décadas de desen- sacreditado, mas, segundo eles, essa mundo onde nosso papel vai ser produ-
de que houve ao longo de 60 anos, nós, volvimento humano. Aqui mesmo em coisa que andou meio na moda e todo zir frango, boi, soja e congêneres?
há 25 anos, num processo de tornar as BH, entre a Serra e favela da Serra, ou mundo andou falando: o Brasil é bric,
nossas metrópoles flácidas - flácidas no Rio, entre Gávea e Rocinha, ou em super chique! Essa expressão você já Acho que temos uma tarefa aí que se
porque nós estamos com um cresci- São Paulo, entre Morumbi e Paraisópo- deve ter ouvido e também que esses impõe: a de reinventar as metrópoles.
mento demográfico maior do que o lis, são oito décadas. Você sabe o que quatro países - Brasil, Rússia, Índia E, para reinventar as metrópoles, a en-
crescimento econômico -, não estamos quer dizer oito décadas de desenvolvi- e China - em 2050 vão pesar mais crenca não é, nesse caso, em nível ma-
sendo capazes de dar a elas robustez. mento humano? Quer dizer o seguinte: do que o G6 pesa hoje na economia croeconômico. Estamos acostumados
Mas não é só um problema econômico você cruza a rua e você ganha ou perde mundial. Isso quer dizer o seguinte: o a pensar as coisas macroeconomica-
que isso gera. Com as suas conseqü- 13 anos e meio de experiência de vida Brasil vai virar potência, em meados mente, as grandes questões, a dívida
ências em termos de desemprego, em ao nascer. A renda é multiplicada ou deste século, segundo a visão do Gol- externa, a inflação. Agora nós temos
termos de informalidade, em termos dividida por 17, a taxa de desemprego dman Sachs. Mas assim podemos ser um problema que se resolve através
de mobilidade social - essa questão da por nove, a escolaridade por quatro e a quinta maior economia do mundo, das taxas de juros. O problema não é
imobilidade social é brutal, eu não vou por aí vai. Se você tem muita mobilida- é o que eles dizem... Estou dando nú- o Henrique Meirelles, gente! Não é ele
ter tempo de me aprofundar em cima de, você pode até suportar uma coisa meros para essa brincadeira, mas é que vai resolver, não é o consenso de
disso. Mas eu falei que naqueles 60 dessas, mas se você não tem mobili- bacana ver o que nós vamos produzir. Washington, não é lá. É no nível das
anos, por exemplo, em São Paulo ou dade nenhuma, se aquele status quo Nós vamos produzir alimentos, vamos cidades, das metrópoles, e o desafio
no Rio de Janeiro, a mobilidade era está dado, isso é pólvora, isso se torna alimentar 40% da população mundial aí é de sermos capazes de moldar es-
extraordinária. A pessoa chegava e, de extremamente explosivo. É o que acon- com grãos, proteínas animais. Nós va- tratégias de longo prazo. Porque, se
repente, ela não conseguia imediata- teceu nas nossas regiões metropolita- mos produzir um monte de matéria- não tivermos a capacidade de pensar
mente um emprego, uma casa, colo- nas, acompanhado de uma imensa prima, biocombustíveis, é claro, e va- no longo prazo, nós nunca seremos ca-
car seu filho na escola. Mas olhava o frustração de expectativa daquilo que mos ter fantásticas reservas naturais pazes de enfrentar aqueles que são os
exemplo do vizinho e via que alguma a Maria Rita Kehl, uma psicanalista de água, de água doce, de fauna e de nossos verdadeiros problemas, nem de
coisa poderia acontecer com ela em paulista, chama de ressentimento. flora. No cenário do Goldman Sachs, a aproveitar aquelas que são as nossas
algum futuro nem tão distante. Então Ressentimento surgido de mágoa, ou indústria vai para a China, os serviços verdadeiras oportunidades. Eu vou fa-
ela tinha uma esperança que era dada seja, mágoa por uma promessa não vão ser divididos entre Índia e China, e lar um pouquinho disso mais à frente.
por essa mobilidade. A desigualdade cumprida: a promessa da modernida- o petróleo vai ser especialmente russo
era extrema, mas, como se tinha uma de pela qual os caras abandonaram e talvez sobre alguma coisa aqui pra Quando estou falando de problemas,
imensa mobilidade, acreditava-se que tudo, deixaram tudo para trás, vieram gente com essa coisa de petróleo. estou falando, por exemplo, da despo-
o dia seguinte ia ser melhor, valia a para cá, para as grandes regiões me- luição da Baía de Guanabara ou da Re-
pena esperar por uma oportunidade, ti- tropolitanas, apostaram suas fichas Pergunta: como é que ficamos nós na presa de Guarapiranga ou da Lagoa da
nha-se essa impressão. E há situações num futuro melhor. Fizeram sacrifícios, cidade? Vamos produzir mel, vamos Pampulha. Eu estou falando de coisas
que se perpetuaram, porque nesses 25 construíram suas casinhas e botaram produzir soja, o que nós vamos fazer como criar um ambiente de negócios
anos não se reduziu a desigualdade na seus filhos na escola e os filhos estu- quando a gente for potência lá na fren- para o setor informal; eu estou falando
região metropolitana, pelo contrário. daram. Mas, na hora de entrarem no te? Como é que fica a nossa revolução de você enfrentar de frente a questão
Falar minimamente sobre a desigual- mercado de trabalho, deram com os do Sérgio Buarque de Holanda? Como da favelização; estou pensando estra-
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tégias concretas de redução do desem- periferia, da baixada fluminense, que é são crescimentistas. Se a gente não dos seus pais, dos seus vizinhos; estou
prego metropolitano. Para coisas desse tudo mesmo subúrbio, é igual, é idên- for capaz de mudar um pouquinho es- falando do seu governo, estou falando
tipo você tem que ser capaz de pensar tico. É o mesmo problema, aquilo ali é sas coisas, a gente vai continuar sendo da empresa que oferece os produtos
em estratégias que sejam locais. Pri- território desindustrializado, desvoca- refém desse tipo de mentalidade, não que você consome, do seu empregador;
meiramente porque uma política que cionado, cemitério industrial, semiárido é? Então, o que a gente bota no lugar? confiança entre os países, o que for. Há
vale - eu não vou voltar nisso - para São econômico. Pegar aquilo ali tudo: você É incrível, mas as coisas chegam a um vários níveis aí, quanto mais, melhor.
Paulo possivelmente não vale pra BH, está falando de mais ou menos seis debate, a um certo nível, mas não são Isso tem a ver com transparência, evi-
não é? E que sejam de longo prazo, milhões de pessoas que ninguém olha assimiladas e às vezes não são suficien- dentemente.
porque você não consegue despoluir a pra elas. Todo mundo olha o Rio lá para temente abraçadas.
Baía de Guanabara num mandato de a zona sul, mas há ali seis milhões de E, finalmente, a última liberdade, que é
um prefeito. Você não faz isso, nem pessoas que estão encostadas, elas fo- E há um monte de novos paradigmas a proteção social. Porque todos nós so-
que ele seja reeleito. Barcelona, que ram pra lá não para ver o Pão de Açú- do desenvolvimento que aparecem por mos humanos e como seres humanos
é uma cidade criativa - daqui a pouco car, não para ir à praia de Ipanema, não aí que eu não vou ter tempo de falar nós somos fracos, sujeitos a baques
vamos falar de cidades criativas, pos- para trabalhar na Globo, ali no Jardim demais sobre eles. Mas vou enunciar nas nossas vidas. Doenças, acidentes,
sivelmente -, resolveu reinventar o seu Botânico, não para estudar na PUC. Os dois: o primeiro é sobre as liberdades. depressões, gravidez, velhice, e nesses
subúrbio depois de ter feito os Jogos caras foram para lá trabalhar na indús- Vou tentar ser bem rápido - eu pos- momentos de desamparo em que a
Olímpicos. Não tem nada a ver com os tria. A indústria se mandou e nunca so falar semanas sobre esse livro do gente não é capaz de prover para nos-
Jogos Olímpicos, isso foi depois, em mais vai voltar e as pessoas continuam Amartya Sem – mas, para o Sem, de- so próprio bem-estar, é bom que a gen-
1995. Olhou para o seu subúrbio e fa- ali. Você vai levar no mínimo 20, 30 anos senvolvimento é um processo contínuo te arrume um colinho, quem quer que
lou: isso não dá para ficar assim. para enfrentar esse problema. Isso tem de ampliação das liberdades a que os seja que dê aquele colinho. O ponto do
que ser dito, tem que ser falado e tem indivíduos têm direito, e ele cita cinco Sem é que cada uma dessas liberdades
Barcelona, vocês sabem, trinta anos que ser enfrentado. Barcelona não está tipos de liberdade: as liberdades polí- é um fim em si mesmo. Você não pode
atrás, com a morte do Franco, era uma enfrentando? São 30 anos. Nós vamos ticas, que são as liberdades de ir e de abrir mão de uma em nome da outra.
cidade decadente do Mediterrâneo, precisar dos mesmos prazos. Como é vir, de se organizar, de se associar, de Não existe uma hierarquia possível en-
com muito desemprego, marginalida- que a gente faz política para 30 anos exprimir sua própria opinião; as liber- tre essas cinco liberdades. E o segundo
de, muita droga, muita gangue, e hoje em uma democracia? Como é que se dades sociais, que são fáceis de enten- ponto importante é que, quanto mais
é uma cidade pop, uma cidade super, dá isso? A gente não tem esse hábito. A der. Saúde, por exemplo, quanto mais e de uma, mais da outra. Elas são instru-
super vanguardista em mil coisas. De- gente começa a achar que essas ques- melhor você viver em termos de saúde mentais. Elas se alimentam umas das
pois, com a Ana Carla e no próprio de- tões são insolúveis e aí não pensa mais evidentemente melhor pra você, melho- outras. Então, quanto mais educação
bate a gente pode falar sobre isso. Mas nelas, a gente se acanha. Mas esses ra sua qualidade de vida, e a educação. você tiver, por exemplo, maior a sua ca-
Barcelona se reinventou e muitas ou- são os grandes problemas que a gen- Aí há mais controvérsias. Pode-se dizer: pacidade de se organizar politicamente,
tras cidades também se reinventaram. te tem, são os problemas que acabam quanto mais eu estudo, mais minhocas de ir atrás de suas demandas efetivas,
Em 1995 elas olharam para o subúr- interferindo num monte de coisas. E a na cabeça me dão. Não é necessaria- de você entender melhor os sinais de
bio que era um subúrbio tão horrível pergunta é: quem vai implementar essa mente bom. Mas, de maneira geral, é como os mercados estão funcionando
quanto todos os subúrbios de todas as estratégia? Além de como, não é? Bom, uma melhor capacidade de compre- e assim por diante.
cidades metropolitanas do ocidente: vou deixar de lado. ender o mundo, de discernir, de fazer
aquela coisa de fábrica, galpão, aque- escolhas. Então é uma coisa que é boa Bem, e como é que fica o dinheiro nis-
les prédios feios, aqueles conjuntos O segundo desafio na ordem cultural também. Liberdade econômica é liber- so tudo, no paradigma das liberdades
habitacionais horrorosos e, bem, o que na minha cabeça é botar alguma outra dade de acesso a mercado, mercado de do Sem? Ele dá uma bela sacaneada
é que você vai fazer com aquilo? Eles coisa no lugar do crescimentismo. Se a trabalho, mercado de crédito, mercado nos liberais, nessa brincadeira. Porque
inventaram uma estratégia de desen- gente não souber enunciar o novo, se a de bens. É evidente que é melhor você os liberais não falam de liberdade? Os
volvimento para aquilo mirando o quê? gente não souber anunciar esse novo, tomar um vinho chileno do que um vi- liberais falam de liberdade, mas os li-
2025? Tá, 2025. Fizeram uma estraté- se a gente não souber trabalhar esse nho de São Roque, com todo respeito. berais falam de liberdade como meio.
gia em 1995 para 2025. novo, a gente vai continuar sendo refém Não sei se as pessoas aqui gostam de Como meio para se ter mais eficiência
dessa coisa velha, a gente vai continuar vinho de São Roque, mas só de você po- e eficácia, para você conseguir produ-
Barcelona, junto com a sua região vendo esses crescimentistas fazendo der ter acesso a um vinho importado é zir mais, para você produzir mais di-
metropolitana, era do tamanho do su- pose de bacana e dizendo que eles são uma coisa que melhora o seu leque de nheiro, uma coisa quantitativa. Então,
búrbio do município do Rio de Janeiro. os caras, que estão querendo mudar. O opções. Mercado de bens, de serviços e a liberdade é usada como meio pra
Voltando para o Chico Buarque, agora cara desenvolvimentista, o que ele vai de produtos - também é uma coisa im- você atingir uma coisa quantitativa-
estou sempre na família Buarque de fazer para mudar o mundo? Vai reduzir portante você ter mercado que funcio- mente melhor. Para o Sem, é o contrá-
Holanda, voltando para o Chico, tem o a taxa de juros, vai dar um crédito subsi- ne, não é? A questão da confiança eu rio. O Sem não nega a importância do
último CD dele, “Subúrbios”. O subúr- diado para uma grande multinacional, e estou chamando de “questão da trans- dinheiro, dinheiro é importante, é claro
bio do Chico vai de Olaria ao Meriti, ele aí ele é bonzinho, ele tem sensibilidade parência”. Quanto mais você confia no que é importante. Mas o dinheiro não é
vai de Bonsucesso a Nova Iguaçu, ele social. Não é isso que a gente vê, não outro, em todos os níveis, melhor para um fim em si mesmo. O dinheiro é um
mistura bairros do município do Rio, é isso. Os progressistas do nosso país, você. Eu estou falando do seu parceiro meio para correr atrás das liberdades
município central, com municípios da os caras que têm sensibilidade social afetivo, estou falando dos seus filhos, e não é o único meio, há outros meios
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que são possíveis. Então, ele inverte de coisa e, aí, é preciso que as ações tipo de mercado interessa aos bancos. Finalmente, o meu terceiro desafio
a mão, ele faz exatamente a inversão sejam sustentáveis e, aqui nesse caso, Você vem aqui (mostra o folder do ban- aqui é a questão de ampliar as várias
inclusive em relação ao porquê de a também no longo prazo. Eu vou falar co) e tem um monte de ações do Banco informações e para isso eu vou voltar
questão utilitarista estar atrás do back um pouquinho mais sobre isso. Há vá- Real em microcrédito. Mas se coloque no Amartya Sem. Vou brincar com vo-
up mental dos crescimentistas tam- rios outros paradigmas sobre os quais no lugar de um banqueiro. Você prefere cês com a Teoria da Justiça do Amar-
bém, não é? Ele dá uma sacaneada eu poderia falar aqui também. emprestar para uma pessoa que tem tya Sem a partir de uma parábola que
em todo mundo que veio antes desse uma conta de energia elétrica regular ou ele conta no capítulo 6 do livro dele,
ponto de vista, ele dá uma volta por Hoje em dia até a felicidade está na para quem tem um “gato”? Hein? Para “Desenvolvimento como Liberdade”. A
cima bastante interessante. moda quando a gente fala em desen- quem tem um “gato”? Para quem tem história é a de uma mulher chamada
volvimento econômico! Mas esse não uma conta, não é? Para alguém que foi Ana Purna. É uma parábola. Ana Purna
Há um outro paradigma que está sen- chega a ser um tema novo, embora capacitado ou alguém que não foi capa- é uma mulher com um profundo senti-
do muito badalado por aí que é o da novo na literatura sobre o desenvolvi- citado? Se coloque no lugar do cara da mento de justiça em toda escolha que
sustentabilidade. Eu estou vendo aqui mento. Esses novos paradigmas tra- Cemig, do dirigente da Cemig. Você pre- ela faz na vida ela quer fazer o bem.
no plural: as sustentabilidades. Porque zem novas questões. Ninguém nega, fere regularizar o “gato” de alguém que Ela está interessada em promover o
a idéia que está muito na moda, está hoje em dia, que a questão do preço tenha uma conta bancária ou de alguém bem diante de uma escolha muito sim-
todo mundo falando, eu até trouxe aqui relativo é uma coisa importante, quer que não tenha uma conta bancária? De ples, que é contratar uma pessoa para
- não estou fazendo propaganda de dizer, fazer os mercados funcionarem alguém que tenha uma conta bancária, fazer um serviço na casa dela: limpar
ninguém, não. Talvez seja o mais bem é uma coisa legal. Não tem muita in- correto? De alguém que foi capacitado um quintal. É uma tarefa simples, mas
feitinho deles, está super na moda um tervenção do Estado, a não ser em ou de alguém que não foi capacitado? não é divisível. Ela não pode dividir essa
banco - o banco Real ABNAmro acabou setores que sejam claramente não Isso quer dizer que o cara do banco vai tarefa entre duas ou três pessoas, têm
de lançar aqui - e não é pra fazer pro- concorrenciais para evitar práticas começar a distribuir energia elétrica ou que escolher uma só. Então, vamos lá.
paganda porque eu estou lendo, está monopolistas. Fazer os preços funcio- capacitar alguém? Isso quer dizer que o Apresentam-se três pessoas que estão
muito bem feito, é um primor de coisa, narem, ter mercados que funcionem cara da Cemig vai começar a emprestar totalmente aptas para fazer o mesmo
papel reciclado, bonitinho, está botan- direito é uma coisa legal, mas não é dinheiro? Isso quer dizer que os dois têm serviço, pelo mesmo preço, pelo mes-
do na mesma publicação o balanço o suficiente. Você precisa construir os que conversar. Eles têm que começar a mo tempo, com a mesma qualidade.
financeiro, econômico, ambiental e mercados, não é? É uma coisa nova fazer alguma coisa em conjunto. Então são totalmente indistinguíveis
social; está triple way, beleza. Está su- pensar que os mercados não funcio- desse ponto de vista. Ela olha para os
perbem avaliado, mas não basta esse nam sozinhos. Vamos tentar fazer com Quando eu digo que o “triple bottom line” três e diz: olha eu vou escolher esse
“fazer o dever de casa” em termos de que os mercados funcionem. (tripé da sustentabilidade que leva em primeiro aqui, sabe por quê? É o Dino,
responsabilidade social, empresarial, conta o econômico, o humano e o am- ele é o mais pobre dos três. O que tem
de você pedir para as empresas adota- Vou dar um único exemplo: microcrédi- biental) é uma coisa limitada, é que está de mais justo do que eu escolher uma
rem posturas que sejam responsáveis to. Há dez anos as pessoas, eu ouvi isso faltando sair da camisa de força corpo- pessoa pobre, porque assim, com o di-
em relação aos seus clientes, seus muito, as pessoas não chamavam de rativa, está precisando falar com o vizi- nheirinho que eu vou dar para ele, ele
stakeholders e serem transparentes microcrédito, eles chamavam de “Ban- nho, está precisando interagir num jogo vai ser menos pobre. Ele vai poder sa-
em relação a isso. Tudo isso é bacana, co do Povo”. Agora caiu em desuso essa mais coletivo. Até hoje as barreiras são tisfazer algumas necessidades a mais
necessário, é legal. Eu não tenho nada história de “Banco do Povo”. Ninguém muito ensimesmadas. As empresas, os que ele não está conseguindo satisfa-
contra isso, acho que não dá nem pra fala mais de Banco do Povo, mas falava atores, os governos também são muito zer. Uma coisa justa, não é? Mas aí, ela
ser, mas o problema é que os nossos “eu sou a favor do Banco do Povo porque ensimesmados. A questão do informal é olha um pouquinho mais e vê o segun-
desafios vão além disso. Para que es- eu sou contra o setor financeiro”. Eu já um novo tema, a questão da regulação. do, o tal do Bichano. Ele não é tão pobre
sas coisas sejam eficazes é preciso que ouvi essa besteira um monte de vezes e Por exemplo, ontem houve revisão tari- quanto o Dino, mas é mais infeliz. Ele é
uma empresa como essa e os outros demorou muito para “cair a ficha” que fária lá na Anaeel, em Brasília. Temos da nossa classe média, urbana, metro-
se envolvam num jogo maior. Porque não é isso, que o que você quer é fazer novas tarifas de energia elétrica. Como politana, é aquele cara que está acos-
não é a partir de uma coleção de ini- com que o mercado financeiro funcione é que funciona isso? Como é que funcio- tumado a tomar vinho chileno e agora
ciativas isoladas que você vai resolver para os pobres, chegue até os pobres. na botar preço em uma utility, em um está voltando a tomar vinho de São
o problema. Nós temos que participar Você quer que o pobre tenha acesso a bem público que é distribuído por uma Roque. Ele é empobrecido, ele é triste,
de um jogo coletivo mais amplo e, aí, uma conta corrente, a um talão de che- empresa privada? Como é que funciona está deprimido e, aí ela se diz: - mas,
tem uma quarta dimensão. Eu acho ques, a um cartão de crédito, a uma pou- esse negócio de botar um preço que seja pôxa, se eu der uma grana para esse
que é importante nessas brincadeiras pança, a um plano de previdência, a um justo e que faça com que a empresa cara, ele vai ficar mais feliz. O que exis-
incluir, nas questões da sustentabilida- seguro. Eu sou contra o mercado, então seja sustentável? Isso é um tema novo e te de mais nobre do que você produzir
de, a sustentabilidade política. Nesse vou fazer um negócio para o povo agora. é desafiante do ponto de vista do desen- a felicidade do sujeito, você contribuir
caso, também, quer dizer, não adianta Então, como é que você desenha isso? volvimento em questão. A questão da para a felicidade desse mundo? Aí co-
você ser sustentável econômica, social O banco sozinho não chega lá, é preciso democracia não é só política, mas tam- meça a ficar com minhoca na cabeça.
e ambientalmente, se vem uma coisa desenhar ações conjuntas. Aí começa bém social e econômica. Tem um monte Mas ela fica mais ainda quando olha
por fora que desmancha tudo. É ou não a trabalhar essa coisa: como é que um aí de novos temas, de novas questões com mais atenção para a terceira pes-
é? De alguma maneira você tem que banco pode interagir com outros para interessantes a serem pensadas em ter- soa, que é uma mulher, a Rogene. Ela
dar alguma sustentação a esse tipo desenvolver esse tipo de mercado? Esse mos de desenvolvimento. não é tão pobre quanto o primeiro nem
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tão infeliz quanto o segundo, mas ela é pouquinho sobre isso. Experiências subúrbio do Chico Buarque, que vai de das sedes das maiores redes de televi-
doente e, sendo doente, tem dores crô- que são interessantes a partir de Bo- Olaria para Nova Iguaçu. Mas o proble- são - públicas e privadas - e dos quatro
nicas, que não atrapalham em nada o gotá: temos aqui um representante da ma é o mesmo, não é? Redesenhando maiores jornais do país; das principais
serviço dela, mas que perturbam a vida Colômbia que foi ombudsman do jornal novas governanças, novas formas de empresas de telecomunicações; dos
dela. Dor é dor e ela se diz: - pôxa vida, “El Tiempo”, que costurou essa experi- governar os processos. maiores bancos privados; das maiores
se eu tivesse a capacidade de contratar ência de Bogotá. Vamos ver que é ba- empresas de energia – Petrobras, Ele-
essa mulher, ela compraria remédios sicamente uma iniciativa da sociedade Eu vou fazer aqui uma proposta muito trobrás, Furnas e Nuclebras, Light, Ele-
e ficaria com a capacidade de aliviar a civil no sentido de monitorar continu- rápida, para deixar a provocação, que tropaulo; 90% da produção nacional
sua dor. O que existe de mais nobre do amente indicadores de qualidade de é a seguinte: nós estávamos diante de de petróleo, 100% da produção nacio-
que poder aliviar a dor? Pergunta para vida e de cobrar dos poderes públicos um desafio de pensar o futuro do Rio nal de energia nuclear...
a platéia: com quem vocês ficam? Com - e de quem de direito - providências no de Janeiro e, aí, um dos atores que es-
qual dos três? Dino, Bichano ou Roge- sentido de ser eficiente, eficaz na pro- tava discutindo com a gente, um sujei- Bom, dá pra encarar a tal da globaliza-
ne? A pobreza, a infelicidade ou a dor? dução daquelas iniciativas. Isso tem se to que é presidente de uma empresa ção assim, num território como esse?
O que é mais importante combater? multiplicado aqui. Em São Paulo existe que distribui energia elétrica - a Light Eu acho que dá. Eu não vejo por que
Levanta a mão quem fica com o Dino? um movimento fantástico hoje em dia - o José Luiz Alquéres, virou e falou: ter medo de encarar a globalização no
Tem aí, razoável. Quem fica com Bicha- que é o “Ação São Paulo”; no Rio tem “Você quer pensar o futuro do Rio de mundo. Para fazer o quê? Primeiro, eu
no? Menos. Quem fica com Rogene? o “Rio como Vamos?” e há outros que Janeiro? Você não pode pensar o futu- acho que dá pra encarar o século XXI
Pelo menos acho que mais da metade estão acontecendo por aí. ro do Rio de Janeiro completamente com esse território, para ser capital
não fica com o Dino, né? Agora a per- desconectado do futuro de São Paulo. mundial da energia e da sustentabili-
gunta: e se eu tivesse parado de contar Bom, vou resumir, então, os princi- Em alguma medida, no século XXI, Rio dade. Não é conversa para boi dormir,
essa história aqui? Se eu tivesse fala- pais desafios que eu estou colocando de Janeiro e São Paulo têm que pensar não é discurso ufanista. Eu quero sa-
do só que ela escolheu o Dino porque aqui: reinventar as metrópoles, abra- conjuntamente”. ber que outro lugar no mundo tem as
o Dino é mais pobre? Vocês todos acei- çar novos paradigmas e alargar bases fontes de energia que nós temos nesse
tariam essa desculpa, não aceitariam? informacionais. E eu queria falar um Então vamos lá: criamos, ele e eu, pedaço de chão, dos biocombustíveis
Não é um ótimo pretexto? Agora vocês pouquinho do que isso tem como im- a MBras” - depois eu explico porque ao petróleo, passando pela energia nu-
que, quando eu fiz a pergunta, votaram plicações, basicamente, eu não vou ter MBras. clear, pela hidrelétrica, pela eólica. Os
no Bichano ou na Rogene, vocês perce- tempo de desenvolver demais, mas são centros de pesquisas que nós temos, os
bem que se eu tivesse parado aqui, nes- novas formas de pensar e de produzir No mapa da MBras no Brasil podemos players que nós temos, como bancos
sa informação, vocês teriam feito uma o “público”. Estamos diante do desafio ver uma megalópole brasileira. São de fomento, como grandes empresas
escolha que agora vocês consideram in- de falar do fim do monopólio. Nós te- 232 municípios que ficam entre Cam- e coisas desse tipo. E não venha me
justa? Porque agora vocês sabem que mos que encarar a questão do fim do pos e Campinas, passando por Juiz de dizer que, qualquer que seja o mundo
tem uma pessoa que sofre, que tem monopólio estatal. Nós temos ainda Fora, em Minas Gerais. São 0,97% do que vai se desenhar amanhã, energia
uma pessoa que é infeliz, não é? uma cabeça que é muito centrada no território nacional, 23% da população e sustentabilidade não sejam coisas
protagonismo do Estado Nacional, que brasileira, 35% do PIB. A MBras está importantes. Nós temos a Floresta da
Eu estou dizendo o seguinte: para vo- é uma herança do nosso back up cres- em três estados, com taxa de orga- Tijuca, nós temos a Mata Atlântica,
cês fazerem escolhas que possam ser cimentista, não é? Nós temos hoje que nização de 96%, uma densidade de- nos temos a Itatiaia. Em sustentabili-
consideradas justas é preciso que vo- encarar o fato de que desenvolvimento mográfica altíssima, de mais de 500 dade nós também somos porretas! Te-
cês tenham acesso a uma base infor- passa pela multiplicidade de protago- habitantes por km². Tem como prin- mos belezas e temos ainda a marca da
macional ampla. Quanto mais ampla a nismos. São diferentes níveis de gover- cipais ativos sociais e culturais: uma “Rio 92”. Outra coisa que eu acho que
base informacional, maior a capacida- no, da sociedade civil organizada ao alta presença de médicos; uma taxa é importantíssima é resgatarmos uma
de de vocês mesmos fazerem escolhas setor privado. É preciso cultivar a con- de analfabetismo baixa; 303 estabe- idéia de vanguarda. Nós abdicamos da
que considerem justas ou se a base in- vergência dos esforços entre esses ato- lecimentos de ensino superior; 670 idéia de vanguarda, nós nos apeque-
formacional for restrita, vocês podem res, quer dizer, romper as barreiras cor- mil universitários; 25 mil PHDs; 515 namos. As nossas metrópoles ficaram
ser levados a fazer escolhas injustas porativas, isolacionistas, que em todos bibliotecas públicas; 270 museus; 291 para trás, mas as nossas metrópoles,
e, aí, tem milhões de repercussões em os níveis, na sociedade civil, no poder cinemas; quase 400 teatros. Outros até 1980, é que puxavam esse país
termos do que isso significa: em ter- público, na iniciativa privada, compro- ativos: 1.200 km de litoral; quase 50 para frente, não só economicamente
mos de comunicação, em termos de metem os resultados dessas iniciati- parques naturais, dos quais cinco são e culturalmente. Apequenar as nossas
imprensa. Como eu não vou ter tempo vas que existem por aí. A gente tem nacionais; 24% dos aeroportos e meta- metrópoles é nos apequenarmos dian-
de desenvolver isso agora, eu só estou que sair da lógica do projeto, como diz de dos passageiros aéreos brasileiros; te do mundo. Nós precisamos resgatar
levantando a bola. A questão é: quem a Marta Porto, para passarmos para ló- nove portos - os maiores; 90% dos tu- uma idéia de modernismo, não sei se
produz, sistematiza e dissemina essas gicas de processos e, para isso, é pre- ristas estrangeiros; mais de quatro mil modernismo ou pós-modernismo - cha-
informações? É o governo? Vamos dei- ciso redesenhar, através de uma série hotéis; 37 mil restaurantes; quase 100 mem do jeito que quiserem -, mas que
xar isso na mão do governo? Temos de parcerias público-privadas, os terri- shopping centers; quase seis mil agên- seja ousada, que tenha capacidade de
experiências que estão começando a tórios. Isso vale para o local, um local cias bancárias; indústria aeronáutica, inovar, que tenha capacidade de pro-
pipocar por aí, nas nossas cidades. Eu que rompe as fronteiras geográficas, indústria automobilística, indústria por, que tenha capacidade de andar e
estava falando agora de manhã um burocráticas, administrativas, como o espacial; uma agência espacial; 100% de olhar para frente e de propor coisas
50 • Pensando a gestão cultural a partir dos desafios do desenvolvimento brasileiro 1º Seminário Internacional de Gestão Cultural • 51
novas. Nós estamos muito acanhados.
Eu acho que isso daí tem vocação para
ser metropolitano, e digo mais, mega-
lopolitano.
52 • Pensando a gestão cultural a partir dos desafios do desenvolvimento brasileiro 1º Seminário Internacional de Gestão Cultural • 53
PALESTRA
Bom-dia a todos. Em primeiro lugar,
agradeço imensamente pelo convite,
mas tenho que dizer que eu tenho um
vínculo emocional enorme com a DUO.
ANA
gente começou a discutir um pouco
a questão da economia da cultura e
fui convidada a dar aula nos cursos
a distância da DUO, em economia da
56 • Pensando a gestão cultural a partir dos desafios do desenvolvimento brasileiro 1º Seminário Internacional de Gestão Cultural • 57
bélico. Ao longo da Segunda Guerra, a cipação enorme na economia. Então, dessa região. Uma empresa britânica brasileira. Não só o biquíni brasileiro,
França tinha se endividado para com o aquilo que não é de fato palpável, as registrou o nome Kikoy, como vocês a moda praia, mas a moda Brasil. A
Estados Unidos porque precisava conti- idéias, os pensamentos, as inovações, podem ver no site da empresa, www.ki- moda é claramente muito ancorada
nuar ativa no conflito e comprar o que os conteúdos simbólicos, os valores, koy.com. Isso claramente causou uma na nossa identidade cultural, nas nos-
não estava sendo produzido interna- as imagens, as marcas, por um lado, grande celeuma no registros de nomes sas várias identidades culturais. O que
mente. Finda a guerra, Mister Byrnes, parecem estar muito próximos do nos- e marcas registradas, direitos de pro- é interessante nessa discussão, que
representando os Estados Unidos, che- so presente e das nossas discussões priedade intelectual de um modo geral. acaba sendo bastante recente no Bra-
gou ao seu colega francês, Monsieur econômicas e empresariais, inclusive. Porque, caso efetivamente a empresa sil, é essa conciliação do valor intangí-
Bloom, e cobrou a dívida. Bem, diante conseguisse direito exclusivo sobre o vel da cultura com o que a gente cos-
da situação absolutamente combalida No quadro que apresenta uma relação nome Kikoy, aquelas populações que tuma considerar como regras claras
das contas francesas, era complica- das marcas mais valiosas do mundo, centenariamente vinham produzindo o de valoração de uma marca, de um
do pagar uma dívida, sendo um país para o ano de 2008, feita pela empre- Kikoy, ao comercializá-lo deveriam pa- negócio. Ainda é um trabalho muito in-
que ainda iniciava um processo de re- sa Interbrands, especialista no tema, gar direitos para a empresa britânica cipiente, enquanto a gente vê que há
construção. Os Estados Unidos fizeram vemos, em ordem decrescente: Coca- que, provavelmente, não sabe o que é pelo menos 60 anos (vide acordo de
uma proposta tida como absolutamen- Cola, IBM, Microsoft, GE, Nokia, Toyo- a tradição do Kikoy, mas o comercia- Bloom-Byrnes) essa discussão existe
te irrecusável à França, dizendo: eu lhe ta, Intel, McDonald’s, Disney - e aqui eu liza. Assim como foi feito com a ten- no mundo. Ou seja, precisamos entrar
concedo anistia de parte da dívida, paro na Disney - Disney em nono lugar tativa de registro do nome cupuaçu e rapidinho nesse trem, porque ele está
mais um novo empréstimo bancário a em 2007, em nono lugar em 2008, na de vários outros da biodiversidade e da cada vez mais acelerado.
juros interessantes e uma ajuda finan- lista das marcas mais valiosas do mun- gastronomia brasileiras, por empresas
ceira pagável ao longo de 35 anos, sob do! Vejamos um pouco do que está por de fora. Então a gente tem uma infini- Um outro exemplo, prático, é o restau-
uma única condição: você, França, de- trás da Disney. Vocês podem ter ouvido dade de “cupuaçus culturais” mundo rante D.O.M., em São Paulo. Caríssi-
verá franquear todas as salas de cine- falar de uma tal de Mickey Mouse Act afora. O Kikoy é um exemplo claro. Em mo, interessantíssimo, badaladíssimo,
ma do seu país, durante três semanas que, na verdade, foi um apelido que se abril deste ano, depois de dois anos o único restaurante brasileiro na lista
por mês, para os filmes que eu decidir deu a uma medida legal tomada nos de controvérsia internacional, o direito dos 50 melhores restaurantes do guia
que poderão ser passados ali. Quando Estados Unidos. Em 1928, o Mickey não foi concedido. San Pellegrino, tem como cardápio
a gente pára e fala: - nossa, mas que Mouse foi criado, vem ao mundo e uma mescla de receitas internacionais
coisa, como é que eles conseguiram conquista corações. Na época, o tem- Agora, já que estamos falando de va- com ingredientes brasileiros. Eu tenho
trocar tanto dinheiro por salas de cine- po de proteção de criações era de 56 lores intangíveis, agregados, da cultu- para mim que esse, de fato, acaba sen-
ma? -, vemos claramente que a situa- anos, após os quais caíam em domí- ra, como conseguimos mensurá-lo? A do um dos grandes alavancadores de
ção era muito mais complexa e enre- nio público. Por meio de prorrogações São Paulo Fashion Week, em 10 anos, sucesso desse negócio que é o D.O.M.
dada de variáveis. sucessivas desse prazo, claramente tornou-se a quinta semana de moda Feitos os devidos reconhecimentos ao
por intermédio da empresa que esta- mais badalada, conhecida e economi- talento de Alex Atala e equipe, fettucci-
A primeira delas, para vocês terem va interessada, que era a corporação camente interessante do mundo, atrás ne de pupunha com manteiga de coral
uma idéia: estima-se que hoje mais de Disney, esse prazo foi estendido até 70 de Paris, Londres, Nova York e Milão e camarão é algo que não dá pra co-
80% das salas de cinema do mundo anos. Em 1998, Mickey Mouse deve- e com um conceito totalmente distin- mer em Roma, não é? Risoto de grãos
estejam nas mãos dos conglomerados. ria ter caído em domínio público. Que to. Para vocês terem uma idéia, nas e castanhas brasileiras também em
Uma questão importante também é a maravilha! Todo mundo agora pode co- outras semanas de moda do mundo, Taiwan a gente não encontra; robalo
gente começar a fazer o paralelismo locar o Mickey Mouse em livros, pode os estilistas pagam para participar. com tucupi e tapioca, muito menos.
entre o que tem o valor e o que tem fazer o Mickey Mouse aparecer em Na São Paulo Fashion Week eles têm Então, acho que a gente precisa come-
o preço, e o que, efetivamente, estava filmes, pode fazer referências várias serviços sem custo. E quem banca a çar a dar um pouco mais de preço ao
sendo negociado com a abertura das ao Mickey Mouse, sem ter de pagar SPFW são patrocinadores. Por quê? que tem valor também, não é? Não só
salas de cinema. A bilheteria? Os sub- direitos à Disney. O que aconteceu? Porque eles não queriam dar a supre- curtir as coisas como se elas fossem
produtos que são vendidos ali? Não, Foi proposto esse novo ato - que foi macia à participação de ninguém. Eles separadas, o bolso da alma. Como é
claramente estava sendo negociado o apelidado, portanto, de Mickey Mouse queriam balancear um pouco, dando que a gente consegue unir a mente,
que vai dentro dos filmes. Um estilo de Act - estendendo a proteção do Mickey margem à participação também dos o coração e o bolso e não ser inocen-
vida “aspiracional”: eu quero a geladei- Mouse para 95 anos. Quem nasceu novos talentos, que costumam não ter te útil nessa história? Fazendo uma
ra do filme da fulana, eu quero o carro com 56 anos de proteção agora já tem condições para pagar pelas semanas simplificação enorme de uma grande
do filme do beltrano, quando tirar fé- 95, o que levou o Mickey Mouse a es- de moda. Então é um outro modelo de complexidade, é a isso que se propõe
rias eu vou para lá, eu quero ser ele, tar coberto, em termos de direitos, até negócios, é uma plataforma de servi- a economia da cultura. Daí o interesse
eu quero esse estilo de vida. Isso, cla- 2023. Então, de novo, nada é por aca- ços completamente distinta. Pois bem, do tema, eu acredito, para quem mexe
ramente, é o que estava em negocia- so. O que a gente precisa é entender a a SPFW fez um levantamento junto ao com gestão cultural, favorecendo esse
ção e que, de certo modo, conseguiu historinha por trás da grande história. nosso Banco Central e descobriu que entendimento das várias dimensões
cumprir a sua função no seu momen- um quilo de algodão exportado pelo da cultura.
to e acabou se perpetuando ao longo Vejamos uma contrapartida disso, Brasil gera um dólar; um quilo de con-
das décadas seguintes, como a gente com a história do Kikoy, esse pareô, fecção, camiseta, calça jeans simples, Estamos falando de duas dimensões
acompanha claramente. E, aí, a gente vestimenta tradicional na costa africa- enfim, de confecção básica, gera 20 paralelas: a dimensão dos valores e a
chega a uma questão interessante, que na, em especial no Quênia. Algo como dólares; e um quilo de moda gera de dimensão dos preços. E como essas
é perceber como esse valor agregado se fosse a nossa caipirinha é o que o 70 a 80 dólares! Ora, a moda brasi- duas dimensões acabam conversan-
ao intangível acaba tendo uma parti- Kikoy representa para a indumentária leira, via de regra, espelha a cultura do, quais pontes se estabelecem entre
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elas? Quando a gente fala de oferta que eu gosto, pelo qual eu me pauto na A gente entende o papel de transfor- blusa, um DVD... Mas dificilmente um
ou produção ou, antes disso, criação, discussão de cultura, é o de expansão mação da leitura, como capacidade de livro. Afinal, queremos dar algo baca-
também está falando de educação e de liberdade de escolhas, do Prêmio reflexão, de síntese, de análise, de críti- na... Há um problema no modo como
de treinamento, do ponto de vista de Nobel de Economia, o indiano Amartya ca, além, claramente, do conteúdo que encaramos a leitura que corre o risco
capacitação cultural. Como os nossos Sem. Quando a gente fala de liberdade está sendo transmitido, como informa- de ser um preconceito social com re-
talentos, hoje, estão sendo capacita- de escolhas e transpõe esse conceito ção pura. E para a gente fazer esse link lação à leitura e a todo o seu potencial
dos ou não e que reconhecimento a ao cultural, que eu acho que seria uma entre público, privado e sociedade ci- de transformação.
gente dá aos talentos que já existem, outra categoria que eventualmente vil, é preciso também pensar como as
para retomar a história que vimos na o Sem gostasse de adotar, será que empresas, como as corporações estão Chegamos assim à questão da distri-
revolução industrial, com a citação de a gente está falando de desenvolvi- entendendo esses problemas que, até buição dos equipamentos culturais.
Ruskin? Quando a gente fala de mer- mento mesmo? De que liberdades de então, eram considerados problemas Eu não vou tomar a liberdade de falar
cado, difusão, circulação, será que escolhas a gente está falando num sociais. Como os problemas sociais do tema que a Cris Lins, do IBGE, com
está falando de fato de uma democra- contexto desses? Como complicação também são problemas culturais e certeza vai decifrar para vocês. Mas
cia de difusão num mundo que tem extra, há dois pilares de sustentação: problemas econômicos. talvez vocês já tenham visto a Pes-
mais de 80% das salas de cinema nas a identidade e a diversidade. Como é quisa de Informações Básicas Muni-
mãos dos conglomerados, em especial que a gente lida com esses pilares de Um levantamento que ocorreu como cipais – MUNIC/2006, publicada pelo
de Hollywood? Onde mais de 70% do identidade e diversidade cultural? parte dessa mesma pesquisa, de IBGE, que mostra, dentre várias outras
comércio mundial de música está nas 2007, em que se perguntava a empre- coisas interessantes, a concentração
mãos de quatro empresas? E quando Para vocês terem uma visualização sários dos Estados Unidos quais eram de equipamentos culturais no Brasil.
a gente fala de demanda, de consumo, do que o André tão bem explicou há as qualificações mais importantes que Vemos que, é claro, há algumas dis-
de fruição cultural, de participação, pouco, o mapa de distribuição do co- eles buscavam em mão-de-obra e as tinções regionais. Mas não são as dis-
será que também está considerando eficiente de Gini, de 2005, expressa o deficiências que eles encontravam, fo- tinções como a gente costuma pensar,
com a devida atenção o hábito e o in- grau de desigualdade de renda. De um ram apontadas: compreensão escrita, achando que os estados do Sudeste,
teresse? Como as pessoas participam extremo ao outro, entre os países com língua inglesa, escrever em inglês, ma- em especial Rio e São Paulo, formam
hoje culturalmente? A gente sempre maior igualdade de distribuição de ren- temática, conhecimentos de línguas uma realidade completamente distin-
fala do público, o público de teatro, da e os de maior desigualdade, onde estrangeiras, nessa ordem de impor- ta da do resto do Brasil. Há biblioteca
cadê o “não-público”? Por que o “não- nós estamos? Onde essa desigualdade tância. Infelizmente isso não é um pro- pública em quase 90% dos municípios
público” não vira público? O que esse efetivamente é extrema. Entre um ex- blema exclusivo deles, também é um brasileiros – ou seja, há mais de 500
“não-público” quer que não está sendo tremo e outro há vários tons e matizes. problema nosso. municípios brasileiros que não sabem
oferecido? Ou será que não é nem o E quando a gente começa a perceber o que é uma biblioteca pública. Mu-
que não está sendo oferecido, mas ele a força das indústrias culturais para Outra pesquisa aborda a pergunta: seus não batem aí os 20%, e o cine-
não vai porque o teatro fica longe de ditar um modo de vida e padrões de “Ler é algo que lhe dá prazer?”. A gen- ma, que é o lanterninha da história,
casa ou porque não tem transporte pú- consumo – quero o corte de cabelo da te tinha aí por faixa etária uma respos- existe em cerca de 8% dos municípios
blico ou porque ele sai do teatro e está atriz do filme, quero a blusa que esta- ta de, veja bem, quase metade. Então brasileiros. O Brasil tem 5.564 municí-
tarde demais e tem medo de ser assal- va na novela de ontem, etc., quando a a gente tem 60% dos nossos jovens pios, o que significa que mais de 5.000
tado no meio da rua? O que faz com gente entra nesse fluxo de se deixar dizendo: sim, ler é algo que me dá municípios brasileiros não têm sala de
que as pessoas de fato não tenham a levar pelo que os outros querem que prazer. Portanto, para 40%, ler não é cinema. Vários tiveram o bendito cine-
tão propalada democracia de acesso? a gente consuma culturalmente, esse algo que dá prazer. Então por que vou ma da praça. Mas, hoje, por todos os
modelo, esse estilo de vida passa a ser ler? Ler é chato, eu não quero ler. Essa problemas que a gente tem de distri-
A gente tem que pensar nessas equa- visto como próprio, não copiado. E o resposta sinaliza um problema maior. buição, de desbalanço de forças de
ções todas de uma forma muito con- trabalho de propagação desse modelo Excluindo as livrarias, bibliotecas e ou- mercado, esse mercado acaba não
catenada, porque o que ocorre hoje no vem sendo muito urdido há décadas, tros espaços nos quais a gente possa sendo tão espontâneo e não tanto de
Brasil é funil às avessas. Há uma enor- em especial pelos Estados Unidos. ler, o acervo que eu tenho em casa, os trocas, mas muito mais de imposição
me produção cultural, mas um garga- livros que eu tenho no meu quarto, na do que eu quero que você consuma,
lo enorme de distribuição e acaba-se Um estudo chamado “Ler ou não Ler” estante da sala e afins, a gente perce- concretizando-se inclusive na distribui-
tendo uma demanda que, por falta de (To Read or Not to Read), que foi de- be que 1% da população brasileira tem ção do nosso querer cultural.
hábito ou interesse, é ainda menor. Só senvolvido pelo National Endowment 22% dos livros; 7% tem 58% dos livros,
que essa demanda deveria estar su- for the Art, dos Estados Unidos, em até que metade da população tem pra- Esse quadro é grave, mas eu acho que
prindo a onda seguinte de produção. 2007, apresenta os gastos domicilia- ticamente todos os livros presentes o quadro mais grave ainda é o que ex-
Entramos em um ciclo vicioso, em que res per capita dos estadunidenses com nas casas brasileiras. O mais triste é plicita a existência de política munici-
a produção se condensa, a distribuição livros. De 34 dólares, em 85, ele aca- que, segundo a pesquisa, 14% da po- pal de cultura. A pergunta era: “O seu
não ocorre e, portanto, as pessoas não bou caindo para talvez 27 dólares na pulação alfabetizada não tem nenhum município tem política municipal de
têm acesso, não conhecem, não de- passagem de 2004 para 2005, por aí. livro em casa, nenhum livro dado, ne- cultura?” E o gestor público encarre-
mandam e, aí, a produção acaba fican- É claro que parte disso é atribuível ao nhum livro comprado. Nenhum livro em gado da pasta cultural e, na ausência
do combalida no próximo ciclo. consumo de livro digital, mas eu não casa! Há, além de todos os problemas dele, quem de direito apontado pelo
calculo que seja o grande fator da de- de dificuldade de acesso, preço, etc., prefeito, disse que não em 42,1% dos
Isso tudo é muito interessante, mas te- gringolada dessa curva. E, de novo, as uma desvalorização social do livro. Por municípios. Então, como a gente pode
mos que fazer um gancho com a ques- questões não são isoladas, não é? exemplo, é aniversário do melhor ami- pleitear capacitação, distribuição, cine-
tão do desenvolvimento. O conceito de go, o que surge como presente? Uma ma, mais verba para a cultura? Quan-
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do houver mais verba para a cultura, tos de Cultura um programa bárbaro, taurantes e afins; um teatro em obras, melhoria de infra-estrutura. Na primei-
onde será aplicada essa verba? Como mas só os pontos de cultura não serão ainda na véspera da primeira edição. ra edição, as meninas viraram guardas
eu aplico a verba que eu tenho hoje? suficientes. Como é que a gente traz o As meninas, enfim duas visionárias ma- de trânsito, enfim, tudo. Aliás, Fortale-
Não estou dizendo que eu seja contra a que já está aí, como é que a gente traz ravilhosas, a Raquel Gadelha e a Maru za virou subúrbio de Guaramiranga.
idéia de a gente receber mais dinheiro, a lan house a bordo dessa discussão? E Mamede, perceberam, porém, que ha- Pois, quando termina o festival em
mas, antes de receber mais dinheiro, daí, como, de novo, para toda ação tem via na cidade o imaginário de outras Guaramiranga, eles vão para Fortaleza
é preciso saber por que é importante uma reação, a gente tem várias iniciati- épocas - Raquel de Queiroz fala de Gua- e fazem apresentações de quinta - se-
ter mais dinheiro. Para fazer o quê? E vas como essa dizendo assim: descar- ramiranga -, as famílias abastadas de guindo a quarta-feira de cinzas - a do-
o que está sendo feito com o dinheiro regue nossa música na Internet, fique à Fortaleza, quando o calor era inclemen- mingo, o que garante maior visibilida-
de hoje? E daí a questão vai para as vá- vontade. Se você achar que compensa, te, refugiavam-se em Guaramiranga e, de de público para os patrocinadores
rias regiões, de novo. A gente tem cla- paga o que achar que vale. De novo, a por conta disso, havia no imaginário e para a mídia. Um estudo de impacto
ramente algumas distinções entre as tentativa da conciliação entre valor e coletivo os ecos dos saraus, tertúlias e econômico feito pela organização do
regiões, mas nenhuma delas tem um preço. Outra reação digna de nota é a afins. Ainda hoje, quando eles plantam, festival dá conta de que a arrecadação
quadro especialmente feliz no que diz do Creative Commons e do belíssimo colhem, enfim nas manifestações mais que ocorre nesse período equivale a
respeito ao trato da questão cultural - trabalho feito no Brasil pela equipe do anímicas da comunidade dos guara- dez meses de arrecadação tributária
gestão cultural como a gente a enten- Ronaldo Lemos, na FGV do Rio. minanguenses, eles representam, can- no município. Além disso, o festival
de e não “a festa do caqui no ano que tam, dançam. Enfim, tem, tinha algo abriu novas perspectivas, especial-
vem”. Talvez, também, porque a gen- Outra questão é que não adianta in- ecoando e algo latente, algo que não mente para o jovem, em termos profis-
te tenha uma discussão enorme, sem vestir em tecnologia, se as pessoas se concretizava em termos turísticos e sionais e de realização pessoal, gerou
fim, e que toma um espaço mental e não estiverem capacitadas a lidar afins. E o que aconteceu então? Ten- novo fôlego de visibilidade do Ceará e
um nível de energia, desproporcional a com essa tecnologia. Néstor García tando resolver isso, era preciso analisar daí pra frente. Acho importante frisar
meu ver, que é a das leis de incentivo à Canclini, no livro “Latinoamericanos uma equação complicada, incluindo a que 70% da programação é gratuita,
cultura. Claramente, são instrumentos à procura de um lugar neste século”, falta de conhecimento do interior do há muita programação didática e pa-
interessantes para corrigir algumas diz: “A educação formal precisa das Ceará e a ditadura do carnaval, quan- ralela ao festival, ampla visibilidade à
disfunções de mercado, mas não são telas de televisão e computador para do não havia muito espaço para ritmos produção local e à sua economia - tudo
política municipal de cultura. E a gente vincular-se à vida cotidiana dos es- fora do eixo axé-pagode-samba. Com é comprado ali, em se podendo tudo é
discute 15 vezes mais a Lei Rouanet, tudantes e habilitá-los para o futuro. isso, as pessoas eram fadadas a ouvir comprado ali, até a água. E promove-
do que discute o porquê de mais de Porém, nem o controle remoto e nem esses ritmos musicais, sem muitas al- se o encontro dos jovens talentos com
40% dos municípios não terem política o mouse organizam a diversidade cul- ternativas. Para os que gostavam, uma os talentos nacionais e internacionais
municipal de cultura. Acho que há algo tural ou desenvolvem opções de vida maravilha. Para os que não gostavam, que vão para o festival - internacionais,
errado nessa prioridade de discussões. inteligentes”. Ou seja, como a gente se um terror. inclusive, do naipe de Scott Henderson,
E a gente precisa mudar. relaciona com a tecnologia? Como eu Jean-Jacques Milteau.
consigo ter a capacitação de raciocínio O Festival de Jazz e Blues então, organi-
Algumas mudanças são visíveis, há uns que rege as novas tecnologias? É uma zado no período do carnaval em Guara- Hoje o festival recebe 15 mil pessoas
trabalhos absolutamente singulares. Eu outra lógica, de fato. miranga, acabou transformando a co- em média para o festival. Há toda uma
sou fascinada por alguns dos trabalhos munidade. Porque não foi organizado mobilização da região, inclusive com
que a gente encontra Brasil adentro. Um Dentre os exemplos mais singelos e em Guaramiranga. Ele foi organizado atividades paralelas, para que isso não
deles é o dos “índios online”. Quando, mais transformadores que eu conheço, para Guaramiranga. A comunidade se seja um problema para Guaramiranga,
na minha vida, eu imaginaria que tribos um deles é o Festival de Jazz e Blues de apoderou desse projeto, que na verda- mas que seja uma solução para a re-
indígenas utilizariam Internet para fazer Guaramiranga. Segundo o IBGE, Guara- de é um programa de transformação, gião. Há também outros festivais ao
indiosonline.org.br, cuja home page ob- miranga tem 4.307 habitantes e fica a é um processo que hoje tem 10 anos longo do ano, como o festival de teatro
viamente se chama Oca? E aí eles têm 100 km de Fortaleza. É uma cidadezi- e mantém atividades constantes ao e o do queijo e vinho.
um espaço para troca de informações, nha pequenina que tinha uma situação longo do ano, inclusive de capacitação
para discutir os seus âmbitos vários de muito singular em 2000 - e aqui já con- de novos talentos, de formação de tu- Eu queria agora fazer um contraponto
questões culturais, sociais, econômi- tando o final da história, - com uma eco- ristas para as trilhas ecológicas. Já que entre a singela Guaramiranga e Bil-
cas, etc. Então, já que a gente não tem nomia local estagnada, um enclave de é uma reserva natural, como é que a bao. A região de Bilbao, a região do
uma circulação física dos conteúdos Mata Atlântica, em região de serra. Faz gente mantém a turma suficientemen- país basco espanhol, tinha uma série
culturais, como é que a gente trabalha frio em Guaramiranga, levem casaco te ocupada durante o dia para não ser de problemas, em especial com a der-
as tecnologias para eventualmente ten- quando forem pra lá. E que tinha isso: aquele turista que vai tomar pileque, rocada da economia industrial, que
tar fazer com que haja uma mínima vál- ausência de infra-estrutura, não podia dorme a noite inteira depois do show, afetou dois pilares de sua riqueza: o
vula de escape para essa concentração ter indústrias, não podia investir nos se- acorda às 3h da tarde e cadê o próximo porto (porque serviços não precisam
tão absolutamente estarrecedora que a tores conhecidos como tradicionais na show? Como é que a gente consegue de containers) e mineração (idem).
gente tem da circulação cultural? E esta região por ser uma reserva ecológica e conciliar duas enormes diversidades Quando se falava em Bilbao, o que vi-
é uma noticia que saiu no “Estadão”, no cujo turismo não era de destaque, em que coexistem no Brasil: a diversidade nha à mente era uma região comba-
Estado de São Paulo, em março deste especial de fora do estado. Segundo cultural e a biodiversidade? lida, em parte esvaziada e violenta, o
ano: que lan house é o principal aces- os dados da Via de Comunicação, que que era agravado pela associação ao
so de Internet do país. Como é que a concebeu e realiza o festival, havia em Então eles trabalham as duas dentro ETA. Foi feito um projeto de regenera-
gente usa a lan house para isso que a 2000 apenas 308 leitos, desde o turis- dessa equação de Guaramiranga e os ção da estrutura econômica do país
gente está discutindo? Eu acho os Pon- mo solidário, até o hotelzinho; dois res- resultados falam por si mesmos, com basco, ou seja, que tinha como símbo-
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lo e chamariz internacional a constru- em um encontro em Londres do qual começa a pensar: bom, Guggenheim beça dos gestores culturais, quando a
ção do museu Guggenheim, que, por- ajudo a fazer a curadoria, o Creative dificilmente terá algo - talvez até tenha, gente entende cultura de forma mais
tanto, era apenas a bandeira de um Clusters Conference, esse programa mas dificilmente terá - essencialmente ampla e transversal. Temos 4% de parti-
programa muito maior: um programa investirá 29 bilhões de dólares. Abu da região. O museu marítimo eu acre- cipação nas Américas, que representa-
com oito eixos estratégicos enormes, Dhabi é o maior distrito dos Emirados dito que seja essencialmente da re- vam 17% do fluxo mundial de turistas,
incluindo metrô e aeroporto e outras Árabes, fortemente, maciçamente, gião. O Museu Nacional, com certeza, ou seja, 0,68%. Não chegamos a 1%.
questões de infra-estrutura. Essa es- ancorado no petróleo. Mas o que será da região; o Centro de Artes e Espetá- Com tudo o que a gente tem, não pas-
tratégia foi desenvolvida em parceria daqui a 20, 40 anos? Corre o risco de culos, um misto. Então a gente come- sa disso. E aí chegamos ao “Relatório
entre o público e o privado, muito an- enfrentar um problema duplo: o pro- ça a ver que, inclusive em termos de de Competitividade em Viagem e Turis-
corado na especificidade da situação blema do fim do petróleo e o problema apresentações e de acervos, deve ser mo”, editado anualmente pelo Fórum
econômica e da situação social de Bil- da criação de energias alternativas que algo que mistura as culturas, que é um Econômico Mundial, relevando todas as
bao, e esse é um cuidado que a gente não vão, necessariamente, fazer com dos grandes objetivos, a rigor. E o Lou- críticas que faço ao relatório, aos crité-
tem que tomar. Há alguns anos, quan- que o petróleo seja, no futuro, o que vre também ganha, não só em termos rios utilizados, mas, enfim, é um instru-
do ocorreu a discussão sobre a cons- ele é hoje. E o país se vê, primeiro, com financeiros, mas ao ganhar espaço ex- mento que circula mundialmente. Ele
trução de um Guggenheim no Rio de essa complicação econômica e seus positivo para um acervo gigantesco, aponta o Brasil em 49º lugar na com-
Janeiro, será que havia uma estraté- efeitos claramente sociais no futuro e, que fica em boa parte na reserva téc- petitividade de turismo e viagem - esse
gia por trás? Qual seria o papel desse depois, com uma outra complicação... nica; e na exposição da cultura france- dado é de 2008. Mas o que puxa essa
museu? Ser um chamariz internacio- e aí não está no projeto, mas é uma hi- sa, que inclusive terá peças de outros média para cima ou para baixo, segun-
nal para uma cidade que já chama a pótese que traço: a falta de contato en- museus da França expostos em Abu do esse relatório? De ruim há um mon-
atenção do turista de fora? Deveria ser tre as culturas oriental e ocidental e os Dhabi, sempre guardadas porque não te de coisas que a gente conhece tão
mais um museu (enquanto muitos dos preconceitos que imperam em ambas há espaço para expor. O Louvre, enfim, bem: burocracia, insegurança, baixa
atuais têm dificuldades orçamentá- as partes. É preciso começar a pensar o que está ganhando com essa histó- qualidade dos portos, das estradas, da
rias) ou efetivamente ele seria um íco- como esse diálogo vai se estabelecer e, ria? 520 milhões de dólares pelo uso infra-estrutura... E continuará havendo
ne de atração de pessoas que, depois, atraindo os ocidentais para esse país, do nome durante 30 anos; 32 milhões porque os investimentos não são feitos
vão travar contato inclusive com o que também é uma forma, primeiramente, de dólares como doação para recupe- hoje como deveriam ser feitos nessas
é a cidade, que vençam essa barreira de fazê-los ver o que é esse país e o que ração de uma ala do museu que esta- questões todas, para que o amanhã
e que gerem não só recursos econô- é sua cultura; mas, também, de fazer va com sérios problemas; 747 milhões seja diferente. O que a gente tem de po-
micos de turismo, mas, também, que com que as pessoas locais comecem a de dólares pelo empréstimo das obras sitivo dentro dessa equação? O terceiro
dêem uma nova vitalidade ao conheci- lidar com as diferenças culturais. Por- ao longo de 10 anos, além de organi- lugar em recursos naturais e o décimo
mento e a um diálogo entre a cultura que agora eu vou ver gente andando de zações de exposições por 15 anos e segundo lugar em recursos culturais.
internacional e a cultura local? short e regata na rua... O investimento consultoria de gestão por 20 anos. Por- Como é que a gente frisa o que a gente
em turismo ancorado em cultura faz que nem Abu Dhabi é ingênuo de dizer: tem de bacana, conhecendo o que te-
O relatório anual de impacto econômi- com que as pessoas travem contato “Oba! Me dá um nome e agora vou fa- mos de bom e de ruim, sob a ótica dos
co do Guggenheim de Bilbao traz vários com a cultura local, mas, muitas vezes, zer o que eu quero”, nem o Louvre dará outros, já que são esses outros que que-
números. Se alguém quiser acesso a atraídas por um modismo arquitetônico seu nome e dirá: fique à vontade. Se- remos atrair?
eles, basta escrever para o Museu. Uma dos grandes ícones e, aí, sim, padroni- gundo os cálculos do país árabe, eles
das críticas feitas ao museu é que ele zados etc. Aqui eles utilizaram um outro esperam receber um milhão e 400 mil Bom, como o André já mostrou para
não reflete a cultura espanhola, muito macete, que foi um dos grandes esto- turistas por ano, tendo uma população vocês, temos um problema que pro-
menos a basca. A meu ver essa discus- pins da polêmica: a franquia do nome de um milhão e 600 mil pessoas. Eles mete se agravar ao longo das próxi-
são é irrelevante, porque o objetivo do Louvre, o primeiro museu Louvre fora esperam um país por ano! Isso deve mas décadas, que é o do crescimento
museu não é esse, mas sim ajudar a da França. gerar, pelos cálculos deles, um impac- populacional. Eu somo a ele uma outra
reposicionar Bilbao no mundo, atrain- to econômico de 1,7 bilhão de dólares, equação, que é a da migração das pe-
do pessoas que depois vão travar con- O distrito cultural de Abu Dhabi, na ante um investimento de 1,3 bilhão quenas cidades. Entre 1950 e 2000,
tato com o que é a cultura local, por verdade, vai levar um investimento de de dólares, gerando 2.600 empregos. elas sempre representaram cerca de
meio do Casco Viejo (a parte antiga da 27 bilhões de dólares até 2012, ou Mais do que isso, chegando ao final o 90% dos municípios brasileiros, ape-
cidade), Palácio do Congresso e Músi- seja, amanhã. Porque fazer isso tudo petróleo, eles vão ter alguma outra coi- sar do desmembramento constante
ca, do Museu Marítimo de Bilbao, esse em 2012, num prazo de cinco anos, sa para fazer sobreviver a economia na de municípios no país. Já a população
espaço que traz a essência do que é é uma coisa impensável para os nos- visão deles. Isso é estratégia de longo dessas cidades, que em 1950 era de
Bilbao. Bilbao nasceu em função do sos padrões. Prevê-se a construção de prazo e contextualizada na economia, quase 63% do total nacional, em 2000
porto, então agora a gente visita o Mu- 29 hotéis, três marinas, dois campos na sociedade e na cultura. representava pouco mais de 36% - e
seu Marítimo e entende o que é Bilbao de golfe e 19 km de orla marítima, continua caindo. O que acontece quan-
e por que chegou à complicação que ou seja, a contemporanização do que do as pessoas saem das pequenas ci-
chegou, na década de 1980. ocorreu na Holanda. O distrito cultural Eu queria só apresentar para vocês al- dades e vão para as médias e grandes?
em si terá cinco equipamentos cultu- guns números com relação ao fluxo O André já bem mencionou o que ocor-
Pegamos um outro projeto polêmico: rais: centro de artes e espetáculo; mu- internacional de turistas, para termos re nas metrópoles. Com a migração, as
o do distrito cultural de Abu Dhabi, que seu marítimo; museu nacional; museu uma idéia de como também estamos pequenas cidades ficam com os ônus
para alguns será uma ilha da fantasia. de arte contemporânea, que é um ou- perdendo espaço nisso e o que a gente dos custos sociais dos idosos e crian-
Pelos números que me foram dados tro Guggenheim; e um museu de artes pode fazer a respeito, algo que, clara- ças, sem ter um nível proporcional de
por um dos coordenadores do projeto, clássicas, que é um Louvre. E a gente mente, tem que estar presente na ca- trabalhadores ativos que contribuam
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para a arrecadação. Mais do que isso, Longa” é um livro que já foi muito co- baseia-se em fluxos. Mas, sendo fluxo,
também temos um risco sob a ótica mentado e em grandes linhas defende flui, esvai-se, escapa. Então, as oportu-
da diversidade cultural. Nas grandes que, no mundo digital, as vendas de nidades devem ser aproveitadas quan-
cidades, a gente tem a efervescência vários pequenininhos são viabilizadas do surgem.
do encontro de pensamentos, de for- e, somadas, podem superar as ven-
mações de nacionalidades, de visões das de um grande título ou obra. Já o Para terminar, eu queria fazer uma
de mundo, que é real e legítima. Nas novo livro do Thomas Friedmam, que profética citação do saudoso Celso
pequenas cidades, somadas, está o foi lançado há algumas semanas nos Furtado, no seu livro “Cultura e De-
berço das tradições e manifestações Estados Unidos, revisita o anterior, “O senvolvimento em Época de Crise”:
folclóricas. Ora, se a pessoa sai da sua Mundo é Plano”, e surge com o título “Todos os povos lutam para ter acesso
pequena cidade e vai para uma cidade “O Mundo é Quente, Plano e Lotado”, ao patrimônio cultural comum da hu-
na qual ela não consegue praticar isso, no qual defende que, além de plano manidade, o qual se enriquece perma-
suas manifestações, suas expressões, (ou de oportunidades mais equanime- nentemente. Resta saber quais serão
o seu artesanato, por falta de escolha - mente espalhadas pelo mundo, graças os povos que continuarão a contribuir
de novo a história do desenvolvimento às novas tecnologias e à globalização), para esse enriquecimento e quais se-
de Amartya Sem – e não por escolha, o mundo está cada vez mais quente, rão aqueles que serão relegados ao
a diversidade cultural do país fica cada por conta do aquecimento global, e papel passivo de simples consumido-
vez menor. Ou seja, perdemos dos dois cada vez mais lotado. E essa combina- res de bens culturais adquiridos nos
lados, na ponta das grandes cidades e ção é problemática, porque os países mercados. Ter ou não direito à criativi-
na ponta das pequenas cidades. nos quais a população cresce a um dade, eis a questão”. Obrigada.
ritmo acelerado (como, aliás, é o caso
Como é que a gente oferece às pessoas do Brasil) são aqueles nos quais o mo-
as condições para que fiquem nas suas delo de consumo é consumista. Então
cidades, se elas assim o quiserem, e a gente tem um problema maior. Eu
sobrevivam da sua produção, inclusi- sempre acho que uma crise oferece
ve cultural? Dando-lhes as condições, uma oportunidade grande demais de
inclusive econômicas, para que essa mudar um modelo, para que nos de-
produção cultural pague suas contas, mos ao luxo de jogá-la fora. Temos que
além de lhes dar satisfação pessoal. rever alguns paradigmas. Certamente,
o modelo mental que nos trouxe à cri-
Por fim, gostaria de trazer dados do se não será o modelo mental que nos
balanço de pagamentos que levantei tirará dela. E, em meio a esses pensa-
para serviços audiovisuais, do ano de mentos, abri o jornal do dia 31/10, no
1953 ao de 2007. Teríamos duas li- qual a notícia era: “Crise vai reduzir or-
nhas (de receitas e de despesas), mas çamento da cultura em 2009”.
na verdade, só vemos uma (de despe-
sas). E o que se nota é que a linha de Ora, diante de tudo o que vimos, de
despesas explode, na última década, como cultura pode ser uma estratégia
em ritmo exponencial, terminando o promissora de desenvolvimento para o
ano com cerca de 450 milhões de dó- nosso país, de seu potencial para gerar
lares de déficit. divisas, gerar empregos e oferecer às
pessoas a possibilidade de ganhar di-
A boa notícia é que, agora, dentro des- nheiro com talentos que hoje são pou-
sa linha de convergências que o André co reconhecidos economicamente, re-
também estava pincelando e que foi duzir o orçamento da cultura soa como
colocada ontem, o setor empresarial um grande desperdício. ANA CARLA FONSECA
começa a perceber que - como diz o
Pablo Capilé, do Espaço Cubo –, hoje Então, como mensagens básicas para Sócia-Fundadora da Garimpo de Soluções – economia, cultura
em dia, até para ser egoísta a gente este seminário de gestão cultural, & desenvolvimento.
tem que pensar no outro. Algumas em- acho que a gente precisa sair do linear,
presas começam a perceber que seu onde há extremos, e pensar de modo Administradora Pública pela FGV; Economista, Mestre em Admi-
envolvimento com cultura ultrapassa circular, onde tudo é complementar. O nistração e Doutoranda em Urbanismo pela USP, consultora em
os limites do mecenato, da filantropia, público e o privado, o local e o global, a economia criativa para a ONU, curadora dos congressos “Cre-
da responsabilidade social corporativa, economia e a cultura. “Eu só ganho se
ative Clusters” (Reino Unido) e “Creative Cities Summit” (Esta-
do próprio marketing cultural e chega você ganhar” deixa de ser um discurso
dos Unidos), autora de Marketing Cultural e Financiamento da
efetivamente à estratégia do próprio utópico, sai das páginas da teoria do
negócio. Trouxe aqui alguns títulos de caos, do budismo, do Yin e do Yang, Cultura e Economia da Cultura e Desenvolvimento Sustentável
best-sellers corporativos, que dão ele- para ser um modelo prático. O mun- (Prêmio Jabuti 2007), professora de pós-graduação da FGV, da
mentos para esse debate. “A Cauda do gira e muito rápido e, como vimos, UCAM e dos cursos de gestão e economia da cultura da DUO.
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MESA: MUNDO EM PALESTRA
É um prazer muito grande estar hoje à
mesa com Isaura Botelho e com Marta
Porto, e com nosso professor modera-
dor, Alexandre Barbalho. Gostaria de
INTERNACIONAL
línguas americanas nativas na Colôm-
bia. Na Colômbia falam-se 64 línguas
americanas nativas, duas línguas afro,
a língua Creoles, de San Andrés e Provi-
dencia - das ilhas no mar do Caribe e do
Mediador: Alexandre
entorno negro de Palenque, na Cartage-
na - e fala-se uma língua Rom, sendo
que há uma população de aproximada-
Barbalho - Universidade
mente 15 mil ciganos que falam essa
língua. As línguas, por sua vez, têm sido
consideradas pela Constituição colom-
Estadual do Ceará
biana política, de 1691, como línguas
oficiais colombianas, juntamente com o
espanhol, apesar de que algumas des-
UECE (CE/Brasil)
sas línguas são faladas por poucas pes-
soas e algumas delas estão realmente
em processo de desaparecimento.
70 • Mundo em movimento:política cultural, intercâmbios e cooperação internacional 1º Seminário Internacional de Gestão Cultural • 71
ral e o que está acontecendo na cultura. memória, eu acho que nunca vi em ne- são conservacionista da memória de vi- Número cinco: nós temos o fortaleci-
Seria um pouco a idéia de Michel Fou- nhum ministério lá no meu país um de- são tradicional patrimonial e colocando mento, uma necessidade de fortalecer
cault, quando Michel Foucault fala que partamento de memórias. Mas passa a memória onde foi colocada depois de processos de conciliação para o fun-
há três epistemias: a da semelhança, realmente pelas indústrias, pelas novas séculos, que é a memória, na verdade, cionamento das políticas. Isso a gente
a do quadro e a da história. Dom Qui- tecnologias, pelo patrimônio, e isso gera uma projeção de horizontes do futuro. sabe, teoricamente, que é necessário
xote, por exemplo, quando ele fala dos uma série de problemas funcionais. Os Mas como combinar as memórias das esse consenso. Mas o que é muito di-
livros de cavalaria, que é aquele corte fantasmas são realmente levados por- áreas patrimoniais dos ministérios, da fícil é que, no plano de construção da
entre a epistemia da semelhança e a que eles geram problemas funcionais, arquitetura ministerial e cultural com política, na real política cultural, o efeito
do quadro, mas os nossos ministérios sobretudo quando os ministérios atuam as áreas dessa memória difusa de flu- seja um diálogo entre estados e movi-
de cultura e a nossa arquitetura cultu- a partir do centro com as regiões. Porque xos que passam pelas novas tecnolo- mentos sociais, empresas privadas etc.
ral estão formados ao redor do quadro, podem se reiterar funções, ficar uma gias e pelas relações simbólicas? Bom,
ou seja, de uma taxonomia em que nós como se fossem várias funções, vários as culturais, territoriais são aquelas que O número seis: eu creio que estão se
temos patrimônio, nós temos artes, nós focos no mesmo ministério, por exem- respondem a realidades, requisitos e repensando os vínculos entre políticas,
temos divulgação cultural, nós temos plo. O assunto da memória, do ponto processos de territórios específicos. planos, programação e ações. Isso é
estímulos, etc. Temos uma repartição de vista do patrimonial ou da questão Aqui, na verdade, há uma questão de o fio-terra. A terra das políticas é mui-
simbólica da cultura que eu acho que da performance artística, é diferente da regiões culturais. Não são regiões admi- to complexa, entre as políticas e esse
está realmente implodindo. A minha memória das culturas digitais e diferente nistrativas, não são regiões geográficas, fio-terra acontecem muitas coisas no
palestra é isso, implodindo fantasmas, também em certos focos mais estabele- mas regiões culturais. Mas na América nosso contexto cultural. Por exemplo,
então, por enquanto, já respondi a essa cidos do patrimonial. E, também, há o Latina tem sido quase impossível para o que acontece entre as definições de
idéia da implosão, não é? Está implo- assunto da formação ou da organização o Estado, para o establishment político uma política de estímulo e, depois, a
dindo realmente, está implodindo por- da diversidade, da criação. A criação é o pensar em territórios culturais. concessão de bolsas de estágios, de
que as próprias classificações estão grande fantasma, é o grande fantasma estímulos? Qual é a evolução que tem
sendo quebradas, ou seja, porque as realmente, porque nós temos uma cria- O que está acontecendo com as políti- esse tipo de estímulo?
compreensões da arte que deram lugar ção que passa pelo patrimonial. Há cria- cas culturais hoje? Eu gostaria de co-
às divisões de arte nos ministérios ago- ções que passam pelo digital, mas qual locar alguns elementos para o debate: Número sete: é necessária a formulação
ra não mais são os caminhos através é o dialogo estabelecido entre a criação primeiramente, a implosão do quadro e de indicadores, critérios e protocolos de
dos quais percorrem as práticas artísti- digital e a criação patrimonial? da taxonomia classificatória da cultura procedimentos para o acompanhamento
cas ou estéticas. Se eu tivesse tempo, eu explicaria como que adota a arquitetura cultural. O que das políticas culturais, um acompanha-
o meu laboratório é um laboratório mul- eu questiono é que existe uma assinto- mento participativo do que está aconte-
Agora vamos falar dos fantasmas. O timídia que tem o último em software, o nia profunda entre essas arquiteturas cendo com as políticas, do cumprimento
segundo ponto são as políticas trans- último em hardware, mas não interessa, culturais, agora não só do estado, mas das políticas, dos efeitos intencionais e
versais, são as políticas inexistentes nos não é uma sala de computador, é uma também de fundações culturais, de não-intencionais da política.
quadros ministeriais, ou seja, inexisten- idéia criativa. Lá criam-se quatro coisas empresas culturais e dos dinamismos e
tes nas arquiteturas estabelecidas da cul- fundamentalmente. Quem entrar para transformações da cultura. Número oito: eu acho que cada vez mais
tura. Esses são os fantasmas que ficam o laboratório cria quatro coisas: escrita, são necessárias instâncias de percep-
vagando pelos ministérios, que ficam aí sonoridade, visualidades e técnicas em O segundo assunto é o da articulação ção de campos e de atores emergentes.
vagando pelas práticas culturais, pela expressões. É isso o que a gente faz no entre as políticas culturais, ou seja, esse Eu acho que isso é muito fundamental.
gestão cultural, que são fundamentais, laboratório. O meu laboratório foi funda- aqui é um grande problema interno, não O assunto das taxonomias é que as ta-
mas que não têm visibilidade. Essa é do com aquela invocação de “Frankens- só a articulação das políticas culturais xonomias às vezes não permitem visua-
uma das características dos fantasmas. tein”, é claro, pois a gente tinha que in- com outras políticas, mas o diálogo das lizar esses territórios que fogem um pou-
É claro que eles só ficam visíveis em al- vocar um fantasma. “Edward Mãos de políticas culturais entre elas. O terceiro co do quadro, e esses atores que agora
guns momentos, não é? E são aquelas Tesoura”, do Tim Burton, e aquele filme ponto é a interação das políticas cultu- não compõem os registros tradicionais
grandes definições culturais para a ação “A Mosca”, de David Cronenberg, são os rais com outras políticas da gestão pú- das taxonomias tradicionais.
que percorrem todas as diferentes áreas santos padroeiros do meu laboratório blica, os diálogos com a saúde ou com o
dos ministérios, das arquiteturas institu- que fica numa universidade jesuíta. O meio ambiente ou com os planejadores Número nove: é o assunto todo da ge-
cionais da cultura e das diversas políti- primeiro grupo que eu convidei para o do desenvolvimento ou com as idéias ração e do uso dos recursos econômi-
cas setoriais que compõem os campos meu laboratório de criação multimídia de competitividade que ainda não são cos, humanos e tecnológicos, e a refor-
para os quais confluem as políticas di- era formado por três comunidades in- fortes. Começam a ser fortes agora. O mulação das relações entre Estado e
rigidas, a partir de diferentes instâncias dígenas da Serra Nevada de Santa Mar- questionamento da Ana Carla abre pers- mercado. Eu acho que boa parte das
da sociedade e dos ministérios. Na Co- ta, os Koguibas e Arhuacos. Os Kogui, pectiva para que exista essa interação, políticas, hoje, está no meio de tensões
lômbia há pelo menos sete fantasmas. por exemplo, na sua cosmologia, falam essa conversa entre a cultura e a eco- entre o assunto de mercados culturais
É um país fantasmagórico, fantasmá- uma frase que até agora não consegui nomia, por exemplo. O quarto ponto é a e de serviços públicos culturais, entre
tico até do ponto de vista psicanalítico. entender por muitos anos e que me toca superação de outras assintonias, outras mercados e Estado.
Borges falou muito lindamente sobre a muito. Eles falam: “Na origem do mun- assimetrias entre a gestão central da
Colômbia uma coisa que eu acho que do era o nada, só existia pensamento e política e a gestão regional e local da po- Número dez: tem a ver com e para onde
é a melhor definição da Colômbia. Ele memória”. Pensamento e memória, ou lítica, aquilo que Alfons Martinell falava fluem as políticas. As políticas devem
disse: “Colômbia é um ato de fé”. Então, seja, era o nada e o nada era feito de das políticas da proximidade. Existe uma fluir e fluem por muitos lugares. E um
se é um assunto de crença, para os que pensamento, mas também era feito de distância entre a política central do Esta- desses lugares são os sistemas nacionais
não acreditam não existe esse país cha- memória. Com isso os Arhuacos, esse do em termos culturais e as políticas da ou municipais de cultura, ou seja, certa
mado Colômbia. Mas esses fantasmas povo indígena, já estão na cosmologia, proximidade cultural. estrutura de participação e de gestão
são os fantasmas da memória, não há rompendo, quebrando com aquela vi- cultural, mas isso também tem que ser
72 • Mundo em movimento:política cultural, intercâmbios e cooperação internacional 1º Seminário Internacional de Gestão Cultural • 73
questionado. Nós temos estruturas muito seja, que exista certa unificação dos sem conflitos de intenções dos atores.
rígidas. O conceito de estrutura não serve, propósitos em meio ao debate sobre as Na política patrimonial, por exemplo,
na verdade, não obedece a uma forma de diferenças. E sempre existem debates são discutidos temas entre as comuni-
conhecimento que agora não procede. E e diferenças sobre o propósito das polí- dades indígenas e entre patrimonialis-
não procede para o conhecimento e não ticas culturais, mas que sempre exista tas urbanos etc., ou seja, entre muitos
procede para a cultura. Esse é um pon- o mínimo de compartilhamento social. outros atores. A ação cultural não se
to que vale a pena ser discutido. E outro Em terceiro lugar, que existam alguns vê pontualmente nas políticas bem-
detalhe é o tema da necessidade de re- procedimentos coerentes com a políti- sucedidas, mas sim como processos.
ferências críticas sobre as políticas cultu- ca que sejam reconhecidos, que sejam E as continuidades são difíceis, vocês
rais. Quais são os referentes críticos, por legitimados e que sejam universais. sabem, na gestão dos estados. É funda-
exemplo, que não estão nos ministérios, Por exemplo, nós trabalhamos em uma mental o estímulo à criação e, também,
mas estão na sociedade? De todas as política de conciliação que é a política às possibilidades criativas como ele-
formas que nós encontramos na América que administra mais dinheiro dentro do mentos fundamentais e garantias das
Latina, uma dessas formas são os conse- ministério da cultura da Colômbia e que políticas. Também são fundamentais
lhos culturais. representa a verba de recursos públicos a geração de públicos e a geração de
para instituições culturais. Mas quais processos da própria ação social da po-
Muito bem, se a mim me perguntas- são os critérios legitimados, quais são lítica. As melhores políticas são aquelas
sem, no caso da Colômbia, por que fo- os procedimentos que geram igualdade que foram apropriadas socialmente pe-
ram bem-sucedidas algumas políticas de condições para grandes instituições las pessoas.
culturais e outras não foram bem-suce- culturais e também para pequenas ins-
didas? Por exemplo: por que a Colôm- tituições culturais? As políticas culturais têm uma ampla
bia, durante os últimos dez anos, antes tarefa como políticas organizadoras
de 2004, produzia três filmes por ano? Na Colômbia existia uma espécie de das incertezas. Eu não sei exatamente
É uma produção mínima? Mas nós es- “manda-tudo” nas culturas, de chefes se organizadoras das incertezas como
távamos quase em 5º lugar na América que estavam dentro dos museus ou termo de expressão ou como expressão
Latina. Eu fui jurado em um prêmio de dentro das organizações, ou seja, exis- das incertezas e dos conflitos simbóli-
cinema no qual nós demos prêmio para tia uma espécie de mandarinato da cos, e como mobilizadoras dos novos
o primeiro filme que tinha sido feito em cultura e esse mandarinato fazia com sentidos sociais. Em boa parte as polí-
Santo Domingo na história, e isso não que isso tivesse peso político e que as ticas gerem alguns sentidos produzidos
faz muito tempo. A Colômbia tinha uma decisões dos museus e festivais de tea- pela sociedade e as políticas culturais
média de produção de três ou quatro fil- tro fossem feitas a dedo. Isso teve que seriam uma espécie de lugar onde se
mes por ano e está fechando este ano ser rompido. Mas romper com esse sis- reformulam os vínculos entre a cultura,
com mais ou menos 20, 22 filmes, os tema geraria um grande problema polí- a sociedade e a política. Uma política
quais começam a colocar a Colômbia tico, porque na verdade existiam grupos que se chama participação dos cida-
em um lugar interessante em termos políticos que estavam protegidos nes- dãos, uma política que se chama demo-
de produção latino-americana. A Co- ses locais e os presidentes das câma- cracia participativa, uma política que se
lômbia teve uma política, por exem- ras de cultura, por exemplo, tinham que chama gestão a partir de baixo, uma
plo, de patrimônio muito interessante enfrentar esse mandarinato. Então, nós política que se chama simetria, uma
e uma concepção patrimonial sobre o tivemos que impor algumas regras do política também que se chama cone-
tema da apropriação social do patrimô- jogo que permitissem certa igualdade xão da cultura com a vida das pessoas.
nio também interessante. A Colômbia de condições com alguns critérios espe- Muito obrigado.
teve um sistema de cultura que, de al- cíficos, com alguns procedimentos pú-
guma maneira, assinala alguns modos blicos a que as pessoas pudessem ter
de participação e alguns procedimentos acesso - por exemplo, a solicitação do
da participação social da cultura muito dinheiro público para a cultura.
interessantes. GERMÁN REY
A quarta questão é o tema da infra-
E o que faz com que uma política fun- estrutura necessária, a construção de
cione e traga isso para discussão? Eu infra-estrutura cultural e de infra-estru- Filiação Institucional: Convênio Andrés Bello, Colômbia.
acredito que o que funciona é um cor- turas culturais em desenvolvimento. A
pus regulamentar claro, ou seja, algu- quinta questão seria o fortalecimento Assessor em Políticas Culturais da Ministra de Cultura da Colôm-
mas regras do jogo têm que ser muito das conexões entre políticas, planos bia. É consultor do Projeto de Cultura e Desenvolvimento do Con-
claras. Por exemplo, no caso do cinema e programação cultural. A sexta seria vênio Andrés Bello e da AECID e diretor do Laboratório MATRIX
as regras estavam concentradas na Lei essa formulação de indicadores de cri- de Criação Multimedial. Professor na Universidade Javeriana. En-
do Cinema. A Colômbia tem uma lei de térios e protocolos que já existem e as tre seus livros recentes estão: “Las tramas de la cultura” (2008),
cinema, tem uma estrutura de funciona- instâncias de percepção. “La fuga del mundo. Escritos sobre periodismo” (Random House
mento de cinema, tem o reconhecimen- Mondadori, 2007), e “Industrias culturales, creatividad y desar-
to dos atores do cinema, etc. Em segun- Sobre o envolvimento dos atores cultu-
rollo” (em edição pela AECID). Acaba de apresentar o relatório “A
do lugar, fazer funcionar uma política rais nessas políticas, não pode haver
de maneira bem feita exige que exista políticas sem atores, sem crescimento outra cara da liberdade. A responsabilidade social empresarial
uma vontade compartilhada social, ou dos atores e não pode haver políticas nos meios de comunicação da América Latina” (FNPI, AVINA, Uni-
versidade Javeriana e Fundação Carolina, 2008).
74 • Mundo em movimento:política cultural, intercâmbios e cooperação internacional 1º Seminário Internacional de Gestão Cultural • 75
PALESTRA
Bom-dia a todos. Eu queria agradecer
o convite da DUO, que é uma organiza-
ção que eu admiro muito e que conhe-
POR
ço já há bastante tempo. Gostaria de
registrar que é difícil a gente se colocar
depois dessa encantadora palestra do
Germán Rey. Mas, ao mesmo tempo,
78 • Mundo em movimento:política cultural, intercâmbios e cooperação internacional 1º Seminário Internacional de Gestão Cultural • 79
econômico, político tem complexidades tantíssimo de diálogo entre artistas e tem como objetivo promover, nas esco- 1960, há esta utopia de uma união
que não cabem no escopo desta minha de difusão de uma produção reconhe- las do ensino médio, uma consciência dos países da América Latina – na pro-
intervenção, além de me parecer serem cida mundialmente. favorável à integração regional, esti- dução, na distribuição e na exibição –,
os campos nos quais a relação entre os mular e fortalecer os vínculos entre os algo que a esquerda sempre alimen-
países tem sido mais bem-sucedida. Da mesma maneira, a assinatura da estudantes de Argentina, Brasil, Chile, tou em função do ideário político dos
Instrução Normativa RFB nº 809, de 14 Uruguai, Paraguai e Bolívia, ampliando cinemas novos e do fato de, a partir do
Os poucos programas oficiais que gera- de janeiro de 2008, que regula o Selo seus conhecimentos e o respeito à di- final dos anos 1970, o Festival de Cine-
ram circuitos regionais de intercâmbio MERCOSUL Cultural, instrumento adu- versidade cultural. ma de Cuba ter feito disto uma pauta
cultural não parecem ter sido capazes aneiro que irá facilitar a circulação de constante quando reuniu os cineastas
de estabelecer vínculos de natureza obras de arte, instrumentos musicais e No entanto, não vejo como separar e produtores em seminários paralelos
institucional que garantam a continui- espetáculos entre os países do MERCO- as iniciativas feitas no âmbito educa- à mostra de filmes. De qualquer modo,
dade necessária para que se ultrapas- SUL, concretiza um objetivo que estava cional daquelas realizadas no campo o importante é que esses temas estão
sem as gestões públicas conjunturais. nos primórdios do acordo. Com esse da cultura. Isso perpetua uma divisão na pauta das agências e no contato
Aqui também merece uma particular novo instrumento (reconhecido como meramente administrativa e extrema- com os países vizinhos, havendo plena
atenção o papel da formação de redes fundamental há muito tempo), os ser- mente prejudicial entre setores interde- ciência desse histórico de frustrações
que, apoiadas por instrumentos públi- viços e bens culturais têm trânsito livre pendentes. Parte expressiva das ações conforme podemos ver na declaração
cos de regulação e estímulo, possam nas alfândegas dos países do MERCO- de integração que deveriam compor de Manoel Rangel, presidente da Anci-
se desenvolver a partir de projetos pon- SUL. Envolvidos na regulamentação e uma política cultural para a região ne, ao falar da mudança de mentalida-
tuais, menos ambiciosos, conspirando consecução dos objetivos dessa Instru- passa pelas instituições de educação de dos produtores e de outros agentes
a favor de seu sucesso, na medida em ção Normativa estão a Receita Federal, em seus mais diversos níveis: do ensi- econômicos: “A co-produção interna-
que se apóiem em condições e possi- o Ministério da Fazenda, o Ministério da no fundamental ao universitário. Tudo cional ficou por um longo tempo em
bilidades concretas. Essa é uma forma Cultura, as Aduanas e os Parlamentos o que vem sendo mencionado até aqui segundo plano. Tanto que nós sobre-
efetiva de institucionalizar nossas rela- de todos os países do bloco. compõe um todo, cada ação reforçan- vivemos por largo tempo com acordos
ções com os demais países. do as demais. inexeqüíveis, completamente desatu-
Em minhas consultas passei também alizados das práticas internacionais.
Parece-me claro que temos uma tare- por interessantes projetos como o das No caso do audiovisual, que me parece Então, vem havendo um ciclo de atu-
fa imensa pela frente, tanto em nível “Escolas de Fronteira”, do MERCOSUL ter uma política que tenta ser conse- alizações desses acordos, exatamente
interno quanto externo, se quisermos Educacional (!), já implementado pelo qüente em nível nacional, muita coisa porque passamos a fazer uso deles.
de fato constituir este espaço cultural Brasil e pela Argentina, e que será am- acontece, embora ainda nada sistemá- Não adianta ter acordo de co-produção
comum, o espaço cultural ibero-ame- pliado, inicialmente, para o Paraguai e tico que resultasse de uma política. Há se eles não forem utilizados, se não há
ricano. Nesse sentido, a existência de o Uruguai. Atualmente, o projeto fun- casos de co-produção como o filme de produtores que necessitem deles”.
um acordo como o MERCOSUL é algo ciona em cinco escolas brasileiras e Walter Salles, “Diários de Motocicleta”,
que facilitaria a tarefa, não fora o fato em cinco argentinas, atendendo alunos mas a idéia de um mercado comum está Parece estar claro, para esses agentes
de que a cultura ainda é vista como de 1ª e 2ª séries do ensino fundamen- longe de ser uma realidade. No Brasil, do poder público (leia-se Secretaria do
algo supérfluo. Entre Estados Partes tal. Além das aulas, os estudantes são por exemplo, a chance de vermos filmes Audiovisual e Ancine), que é a consis-
(Argentina, Brasil, Paraguai, Uruguai e incentivados a conhecer a cultura do latino-americanos se reduz a alguns su- tência das políticas internas que dá
Venezuela) e Estados Associados (Bo- país vizinho por meio de livros, feiras cessos argentinos ou mexicanos, o que condição para os acordos externos: “É
lívia, Chile, Peru, Colômbia e Equador) e exposições de trabalhos, atividades não significa que o projeto de Mercado o mercado interno que nos fortalece e
temos uma população de cerca de estas que atendem também os alunos Comum de Cinema tenha saído do pa- dá condição para ocuparmos melhores
365.555.352 habitantes. Os acordos das demais séries do ensino funda- pel. Sua primeira versão está no livro de posições no mercado internacional.
econômicos são os que têm suprema- mental. Um dos aspectos mais interes- Roberto Farias, “O Mercado Comum de Quando demonstramos a vitalidade do
cia e nossa angústia continua sendo o santes do projeto é o fato de que pro- Cinema Latino-Americano”, organizado mercado interno, crescem as possibili-
fato, já mencionado, de que o viés cul- fessores argentinos atuam nas escolas e publicado quando ele era o Diretor Ge- dades de negócios para terceiros, cres-
tural do acordo é secundário. do Brasil e vice-versa. Dessa forma, ral da EMBRAFILME. Foi em 1976 ou 77. ce o interesse para que eles venham
os envolvidos vivenciam o aprendiza- Não era uma tese, era um estudo com para o nosso país”.
Para preparar minha intervenção neste do das duas línguas, interagindo com fundo pragmático, pois ele era o diretor
Simpósio, fui buscar informações mais base no reconhecimento das caracte- da empresa estatal. Quando o Secretário Dada a sua diversidade, o mundo do
atualizadas sobre nossos intercâmbios rísticas próprias e no respeito mútuo. do Audiovisual, Sílvio Da-Rin, ou o presi- audiovisual comporta muitos acordos
com os países vizinhos e saber em que Outro projeto, também do MERCOSUL dente da Ancine, Manoel Rangel, falam voltados para questões particulares e
estágio estava o MERCOSUL Cultural. Educacional e da Organização dos Esta- do mercado e também da co-produção talvez seja nestas iniciativas pontuais
Fiquei agradavelmente surpreendida dos Americanos – OEI –, é o que envol- latino-americana como prioridade, es- que estejam os avanços concretos.
por ver o quanto avançamos nos últi- ve as secretarias da Educação de todo tão retomando intenções antigas, nunca Nesse sentido, vemos uma pauta ativa
mos anos em setores antes totalmente o país em torno de um concurso histó- postas em prática. de ações compartilhadas como a reali-
a descoberto, como é o caso das artes rico-literário, Caminhos do MERCOSUL Afinal, em contraposição ao domínio do zação do II Encontro de Produtores do
visuais, por exemplo, que tem na Bie- 2008, com o tema “Lagos, Salares e mercado e da cultura cinematográfica MERCOSUL (em setembro de 2008),
nal do MERCOSUL um espaço impor- Culturas na Rota do Sol”. O concurso pelos Estados Unidos, desde os anos reunindo produtores da Argentina, Bra-
80 • Mundo em movimento:política cultural, intercâmbios e cooperação internacional 1º Seminário Internacional de Gestão Cultural • 81
sil, Chile, Paraguai, Uruguai, Venezue- concerne ao audiovisual, mas cujos de dados com critérios compartilhados
la, Bolívia, Colômbia, Equador e Peru. resultados terão, com certeza, imenso permitirão avanços nas constituições
O 13º encontro da Reunião Especiali- significado para os países envolvidos. de contas satélites de cultura nos di-
zada de Autoridades Cinematográficas Falo do sistema de estatísticas cul- versos países e análises consistentes
e Audiovisuais do MERCOSUL - RECAM, turais (demanda antiga no bloco do em economia e sociologia da cultura.
realizado no dia 29 de setembro, no Rio MERCOSUL) e a construção de contas Os estudos comparativos e os projetos
de Janeiro, logo após o II Encontro de satélites de cultura. Isso significa a mais ambiciosos que possam resultar
Produtores do MERCOSUL (a RECAM criação de um sistema de informação daí serão, para além dos governos,
foi criada em dezembro de 2003 pelo contínuo, confiável e comparável, que uma maneira de dar conseqüência a
Grupo do Mercado Comum - órgão exe- permita a análise e a avaliação eco- projetos comuns de desenvolvimento
cutivo do MERCOSUL - com o objetivo nômica das atividades e práticas cul- e intercâmbio. Muito obrigada.
de criar um instrumento institucional turais, e a tomada de decisões públi-
para avançar no processo de integra- cas e privadas. Esse é um exemplo de
ção das indústrias cinematográficas redes que vão se formando mais pelo
e audiovisuais da região. É um órgão interesse dos técnicos das instituições
consultivo, formado pelas autoridades envolvidas, do que por uma formaliza-
máximas nacionais na matéria). ção de um acordo entre países.
82 • Mundo em movimento:política cultural, intercâmbios e cooperação internacional 1º Seminário Internacional de Gestão Cultural • 83
PALESTRA
Eu vou começar pedindo desculpas
pela minha voz, que infelizmente logo
hoje não está boa, e vou fazer na ver-
POR
dade uma fala mais solta. A fala do
Germán e a fala da Isaura têm uma
carga conceitual importante para esta
mesa sobre a qual nós precisamos re-
86 • Mundo em movimento:política cultural, intercâmbios e cooperação internacional 1º Seminário Internacional de Gestão Cultural • 87
ências naturais de boas políticas cultu- digma aqui que não deve ser mexido. pode ser pobre, você pode ser rico, diria que a cultura só existe se a gen-
rais. No entanto, a política de cultura Esse não é o compromisso da cultura, você pode ser negro, você pode ser te consegue manter a esperança no
em si é a grande possibilidade de as do meu ponto de vista. Então acho branco, não importa. Sempre existem futuro, e esse futuro é um futuro que
pessoas sentirem que elas têm algo a que a gente tem que repensar a forma os vencedores, sempre existem aque- a gente precisa reinventar, talvez com
mais além do econômico e do social. como a gente produz os nossos proje- las pessoas que se organizam melhor, utopias novas, repensando muitas coi-
As políticas de caráter social partem tos, os conceitos que a gente manipu- que têm mais talento do que as outras, sas e acreditando especialmente que,
de um princípio, no qual a gente preci- la, a maneira como a gente se motiva e as políticas de cultura não podem por cima de tudo, existe um fator hu-
sa prestar muita atenção, que é a idéia para esse fazer junto. achar que, ao ampliar essas represen- manístico, humanitário, filosófico, que
da vulnerabilidade do sujeito diante da tações de quem tem mais talento, es- tem que resistir, e essa resistência é
sociedade em que ele vive. E aí vou resgatar do parágrafo do Eduar- tão produzindo algo novo para uma so- uma tarefa nossa. Obrigada.
do Delgado a grande possibilidade de a ciedade que continua com as mesmas
A cultura parte da potência. A coopera- cultura fazer diferença num mundo em assimetrias, que continua com o man-
ção é uma experiência de poder, é uma movimento, num mundo em conflitos: é to de pessoas invisíveis, que continua
experiência de deslocamento de pode- ser capaz de reconstruir uma utopia de de costas para os direitos humanos.
res, na qual eu parto de um processo que, apesar disso, é possível em algum Então a política de cultura bate pal-
meu no encontro com outro e alguma lugar, em vários lugares, em vários mo- mas para a visibilidade, mas se você
coisa nova se produz. Talvez a gente mentos a gente estar junto. É a gente tem um menino que é de um grupo de
precise repensar a partir de uma am- encontrar uma maneira de estabelecer Hip Hop e que em casa ele promove
bição de construir um ethos comum. conexões, proximidades, não só a partir qualquer nível de violência doméstica,
A idéia de cooperação é uma dimen- da nossa diversidade e não só a partir alguma coisa está errada, não é? Se
são meio genérico-universal da cultu- das nossas diferenças, mas aquilo que você tem grupos que têm mais oportu-
ra, é uma crença que as pessoas têm nos liga como uma geração que, num nidades de gerar emprego no mercado
de que é possível construir um ethos determinado momento histórico, numa cultural, nas indústrias culturais, que
comum, um ethos que evidentemente determinada geração, faz parte desse produzem cinema, que produzem tea-
engloba diferenças e diversidades e movimento e consegue encontrar ma- tro, que aparecem na Rede Globo e em
outras tantas coisas. Porém, o fundo neiras e formas de se conectar. Numa outras tantas televisões, maravilha.
disso é uma crença de que é possível sociedade em formação a idéia da co- Mas quem são essas pessoas? Será
fazer as coisas juntos, que é possível nexão é fundamental, mas se conectar que a gente conseguiu produzir uma
estar junto e é essa grandeza que eu sem uma ética que coloque o desafio experiência capaz de fazer com que
acho que não é possível perder. humanitário à frente das diferenças cul- elas se revelem pessoas melhores, re-
turais é fazer pouca coisa. Eu trouxe um velem que elas têm mais condições de
Para imaginar como podemos coope- texto no qual eu detalho isso de uma se encontrar com o diferente?
rar, é preciso que a sociedade brasilei- forma mais clara, mas eu queria hoje
ra repense as maneiras pelas quais ela realmente fazer uma chamada em tor- Em muitos e muitos grupos que eu
está formulando, produzindo, investin- no desses conceitos. acompanho no Rio de Janeiro eu vejo
do nesse conjunto de propósitos que é um enorme preconceito. Quantos garo-
a política de cultura. Eu acho que a pri- Eu tenho falado no Rio de Janeiro para tos que fazem parte de igrejas evangé-
meira questão é conceitual, acho que a grupos e a pergunta que muitas vezes licas, quantos garotos que fazem parte
gente devia dizer não para o viés social me fazem e me fizeram na semana das igrejas católicas, quantos meninos
sempre. Eu tenho algumas dezenas de passada, quando reuni grupos de Hip que não estão naquilo que a gente
artigos, ensaios, nos quais eu trabalho Hop no Rio com grupos de São Paulo, considera o bacana, o cult, o legal? Eu
isso de uma forma mais teórica, mas é a seguinte: a gente tem gerado opor- acho que a responsabilidade da cultu-
aqui eu acho que a gente teve uma tunidades culturais para vários grupos ra é com o todo, é com esse conjunto
boa carga de teorias e eu queria dizer novos, porém, muitas vezes, o que se de pessoas que em algum momento
isso pra vocês: o social está matando percebe é que as pessoas não mudam da vida delas têm que se encontrar
a cultura, o social é o lado obscuro da na sua essência, e se percebe também com a experiência cultural.
cultura. Com a cultura caminhando que, ao ascender, ao tornar a sua expe-
sem pensar em ajuste social, a cultura riência mais visível, não há nenhuma Então, eu queria fechar a minha fala - MARTA PORTO
que olha a sociedade e se permite di- mudança, nenhum eixo de mudança realmente a minha voz não está agüen- XBrasil – Rio de Janeiro (RJ)
zer que a sociedade não está boa, essa nessa possibilidade de encontrar de tando mais - pensando nisso, talvez a
sociedade não está andando bem, uma forma mais franca e aberta com gente tenha que fazer nesse momen- Jornalista, ensaísta e editora. É diretora de Conteúdo e Es-
essa sociedade precisa ser repensada, o outro. Pelo contrário, não é? Quer to com que nosso pêndulo comece a tratégia da XBrasil e consultora internacional em políticas
não é a sociedade da inclusão social. A dizer, você vai formando uma políti- pensar o conjunto de pessoas que não culturais. Foi Diretora de Planejamento e Coordenação Cul-
sociedade da inclusão social é a socie- ca de reafirmação de novos talentos estão encontrando, nesse momento tural da SMC/BH na gestão de Patrus Ananias (1993-1996)
dade que diz ok, está tudo ótimo, mas numa sociedade que já tem o que eu histórico que a gente está vivendo, ne- e Coordenadora Regional da UNESCO no Estado do Rio de
eu vou incluir mais alguns nesse para- chamo de lógica dos vencedores. Você nhuma possibilidade de vida digna. Eu Janeiro (1999-2002).
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MESA: MERCADO DE PALESTRA
Bom-dia a todos vocês. Em primeiro
lugar, eu gostaria de agradecer aos or-
ganizadores, à DUO e também à equi-
TRABALHO EM POR
pe da DUO, à Maria Helena, por esse
convite que muito me honra. É um
privilégio poder estar em um país tão
interessante para os mexicanos como
FORMAÇÃO MAC
tão, o Brasil é um país muito interes-
sante e muito agradável e é um privi-
légio, para mim, poder estar aqui com
vocês participando deste evento que
92 • Mercado de trabalho em mutação: gestão cultural e formação profissional 1º Seminário Internacional de Gestão Cultural • 93
tos de qualidade, projetos de impacto. o promotor sempre tem que trabalhar zar, ou seja, não somente nós nos limi- tes, eficientes e participativos. Quanto
E, nesse sentido, eu acho que um dos com uma comunidade e não para a távamos a profissionalizar os gestores, às estratégias de operação, foi muito
grandes desafios da gestão cultural é comunidade. E nessa relação promo- mas também existiam promotores que interessante. Nós éramos governo fe-
a geração de processos interculturais. tor/comunidade o projeto cumpre um queriam só algum tipo de atualização deral no México e o que nós fizemos
A interculturalidade vem sendo, me papel fundamental. Um gestor que não ou um curso mais curto, mais especí- foi mais do que criar um programa e
parece, um dos grandes desafios para tem projeto me parece que estará tra- fico, e também tinham essa oportuni- mandar esse programa para o interior
construir e gerar desenvolvimento a balhando, como se fazia anteriormen- dade. A reflexão crítica e o intercâmbio do país, nós convocamos os responsá-
partir da cultura. te, com atividades sustentadas mais de experiências de gestão foram for- veis de cultura dos estados do interior
na intuição, atividades dispersas, não mando uma rede e vocês vão ver mais do país e, juntos, nós construímos as
Como nós entendemos a intercultura- conexas. E, finalmente, me parece que adiante os dados. bases fundamentais do sistema de tal
lidade? Nós entendemos como esse o projeto é uma síntese, uma síntese modo que isso não pareceu simples-
processo - e vocês se lembrarão da na qual se encontram ou se objetivam Ao largo de sete anos nós formamos mente uma transferência do centro
matéria de lógica, a teoria dos conjun- as propostas do que se vai fazer e para quase 21.000 promotores culturais para fora, mas sim uma construção
tos, de como conjunto A e o conjunto B que se vai fazer. Então, é um acordo em todo o país e se fez uma rede de que partiu também do interior com a
se juntam, e, nessa área que compar- que gestor, promotor e comunidade promotores muito importante de modo federação. Isso permitiu um alto grau
tilham, que se chama área de interse- fazem e esse acordo fica sintetizado que tivessem acesso a opções infor- de apropriação pelos estados desse
ção, nós temos elementos comuns de e fica reunido em um processo para o mativas, pertinentes, atualizadas e de sistema. E isso foi uma coisa muito
A e elementos comuns de B. O que não desenvolvimento cultural. qualidade para repensar, consolidar e importante que nós chamamos de ins-
pode conseguir a teoria do conjunto e sustentar a sua prática profissional em tância organizadora, ou seja, nós nos
que a cultura, sim, pode conseguir é E agora, sim, rapidamente, eu vou uma práxis mais eficiente, comprome- referimos com essa expressão à orga-
que de um processo dialógico entre A compartilhar com vocês essa experiên- tida com o desenvolvimento cultural. nização desse diploma ou seminário
e B se gere C, ou seja, a cultura como cia que teve lugar entre 2001 e 2007. Nesse sentido também nós víamos ou mestrado. Poderia ser o governo
possibilidade de criação e de invenção Em dezembro de 2007, eu deixei a di- como o promotor cultural se sentia local, poderia ser a universidade, uma
de novos processos e expressões. A in- reção desse sistema que apresentarei muito isolado na sua comunidade, era ONG, etc.
terculturalidade pressupõe processos para vocês, então, eu falarei sobre es- sozinho, lutava sozinho sempre em
de diálogo em condições excelentes ses quase oito anos do meu trabalho. condições bastante precárias, sempre Então, se consideraram ações siste-
porque, se A subordina a B, nós não A missão que eu tinha com o sistema lutando contra a maré. E, de repente, a máticas para avaliar os projetos cultu-
estamos falando de interculturalidade. nacional de capacitação era capacitar, possibilidade de encontrar-se com ou- rais, ou seja, todos os promotores que
E profissionalizar para construir novas atualizar e contribuir na profissionaliza- tras pessoas mais e com outros muito queriam certificar os seus diplomados
utopias, para retirar essa idéia que te- ção de promotores e gestores culturais mais como ele em um encontro nacio- tinham que elaborar um projeto, e es-
mos de que aqui existe só um discurso, das instituições públicas e privadas, nal no qual chegavam 700 promotores ses projetos foram avaliados e foram
o discurso do individualismo, do consu- educativas e culturais de organizações culturais, ou seja, isso gerava uma sen- apresentados e colocados em um ban-
mismo e o culto ao corpo como única não governamentais, comunitárias e sação de pertencimento a uma comu- co de projetos da internet para que
forma de existência, e entender, como grupos independentes, com o fim de nidade de promotores que gerou pro- toda a rede de promotores soubesse
diria Ceratti, que a vida sem utopia elevar o nível e a qualidade dos proje- cessos muito interessantes. que tipos de projetos estavam sendo
não é mais do que o ensaio da morte. tos e serviços culturais que oferecem considerados naquele momento. Nós
Se nós deixamos de acreditar, se dei- à população. Então, nesse sentido, O objetivo era desenvolver processos conseguimos com a secretaria da edu-
xamos de pensar que através daquilo a proposta era bastante ampla e nós sistemáticos de capacitação e forma- cação que se certificassem todos os
que fazemos e daquilo que somos nós entendíamos, por um lado, que as ins- ção integral de nível nacional através estudos que nós gerávamos ali. Isso foi
podemos ser melhores como pessoas, tituições públicas, privadas e as ONGs de diplomados seminários, estudos muito importante porque muitos pro-
como coletividade, eu acredito, então, cada vez tinham maior interesse em profissionais, publicações e encontros motores culturais já levavam cinco, 10,
que a gestão cultural poderia ficar re- formar promotores culturais, inclusive com o propósito de proporcionar aos 20 anos trabalhando e nunca tinham
duzida a atividades de índole adminis- algumas que nem sequer tinham pro- promotores e gestores culturais ele- tido um papel que os reconhecesse ou
trativa para gerir recursos e apoiar pro- motores culturais começaram a enten- mentos significativos para a adminis- que reconhecesse a sua capacidade
jetos que não teriam impacto. der a importância desse tipo de projeto tração - e aqui se trata de toda a nossa profissional, a sua competência para
para suas diferentes instâncias. formação acadêmica que incluía uma trabalhar na área. Então isso significou
Então eu acho que, em grande medida, parte do currículo que eram marcos muito para que os promotores dignifi-
a possibilidade de construir a utopia conceituais; a outra, modelos metodo- cassem e revalorizassem a sua própria
que é gerada pela cultura é realmen- A visão - ou seja, até onde nós quería- lógicos. Aos marcos conceituais nor- condição profissional.
te um potencial de trabalho extraor- mos chegar como sistema, como nós malmente nós dedicávamos 30% do Nós tínhamos três subsistemas funda-
dinário e, finalmente, para concluir nos imaginávamos - era de que os pro- conteúdo; aos marcos metodológicos, mentais. O primeiro - o de capacitação
esta primeira parte - a segunda parte motores e gestores culturais do México 50% do conteúdo; e às ferramentas modular - era um subsistema no qual
eu farei de modo mais objetivo -, eu encontrassem no sistema nacional de técnicas e práticas de campo, 20% os diplomados eram armados por mó-
questiono uma tríade. Eu reflito sobre capacitação um espaço de oportunida- mais ou menos, com uma diversidade dulos de tal modo que o promotor pode-
uma tríade indivisível: o promotor sem de para sua profissionalização. Para de enfoques que favorecesse a reali- ria escolher o módulo de um diploma,
a comunidade não faz sentido algum, aqueles que quiseram se profissionali- zação de projetos culturais pertinen- outro módulo de outro diploma, etc. e
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ele armava o seu processo curricular capacitação. Em muitas universidades qualificamos, a média de avaliação comunidade e disse: olha, vocês po-
de acordo com seus interesses sempre 500 horas é um mestrado. Por exem- dos professores foi de 9.3, ou seja, um dem me falar da história da sua comu-
quando nessa armação houvesse um plo, em uma das licenciaturas nós con- alto nível de excelência acadêmica. Es- nidade? Responderam: Bom, sim, eu
equilíbrio entre 30% de matérias con- seguimos fazer com que a licenciatura ses quatro círculos integravam a rede falo com você, mas quem sabe tudo
ceituais, 50% metodológicas e 20% não fosse realizada em quatro anos, nacional de promotores culturais, e, isso é Don Juan. Eu fui até outra comu-
de técnicas ou práticas de campo, ou mas em dois anos. O requisito era que no último trecho, foi feita uma avalia- nidade e perguntei: Ah, você pode me
seja, no modular existia muita flexibi- tivessem dez anos de prática profis- ção de uma amostra representativa de falar sobre o aspecto da terra? A res-
lidade. Inclusive promotores viajavam sional, de experiência profissional, e projetos e nós tivemos esse resultado: posta: Ah, sim, claro, mas quem sabe
para outros lugares do país para ter au- que fossem egressos do nível dois, ou 48% eram projetos excelentes, 16% realmente sobre isso é Don Juan. E nas
las no módulo particularmente interes- seja, 10 anos de prática e 500 horas eram projetos muito bons, 12% bons festas todo mundo comentava de Don
sante para eles. O subsistema de for- de formação, de educação não formal. apenas e 24% deficientes. Juan, falava de Don Juan. Eu imagina-
mação contínua é mais tradicional: um Por que isso de educação não formal? va o Don Juan como um homem de
diplomado que começa tal dia termina A universidade reconhecia isso como A UNESCO esteve interessada, a partir idade avançada, cabelo branco, barba
tal dia num curso com sessões quinze- dois anos, ou seja, a metade do curso de um encontro em 2005, no qual o Al- comprida, um homem cheio de paz e
nais. O subsistema de capacitação a universitário. Eram três licenciaturas e bino esteve presente, em Guadalajara, tranqüilidade.
distância é um subsistema que poderia três mestrados, um total de 651 even- um encontro internacional de promo-
ser modular ou poderia ser contínuo e tos de capacitação. tores culturais no qual estiveram mais Então fui procurá-lo e, depois de muitos
todo o resultado foi muito importante de mil promotores. A UNESCO colocou dias eu o vi, eu me encontrei com ele.
como vocês verão depois nos núme- Os promotores capacitados por ano, os olhos sobre nosso sistema e se viu a Pois me disseram que em tal comuni-
ros. Uma área de crédito e certificação como vocês podem ver, foram sendo possibilidade de que a UNESCO fizesse dade, em tal dia, vão reunir o conselho
nos permitiu certificar os participantes em números ascendentes ano após a sua avaliação. A conclusão do seu re- de anciãos e Don Juan será o presiden-
com documentos de validade oficial. ano e nós alcançamos a capacitação latório é de que o sistema nacional de te do conselho. Então eu fui me encon-
Nós tínhamos um programa estraté- de 21.789 promotores culturais. Des- capacitação no México constituía uma trar com Don Juan e eu cheguei justa-
gico de formação profissional, ou seja, ses promotores, 41.4% se encontram boa prática. O texto da avaliação diz o mente antes de terminar a reunião de
junto com as universidades públicas e na faixa etária entre 26 e 45 anos seguinte: para as agências das Nações anciãos. Quando eles saíram, eu pen-
privadas nós criamos três licenciaturas - isso é muito interessante -; 83,2% Unidas, em geral, e para a UNESCO, sei: bom, com certeza vou conseguir
e três mestrados. Atualmente eles con- têm menos de dez anos de trabalho em particular, uma boa prática é en- identificar o Don Juan assim que eu o
tinuam em funcionamento. A idéia era no setor cultural, ou seja, são pessoas tendida como uma experiência de pla- enxergar. Era realmente uma obses-
ou a reflexão foi: nós não vamos con- jovens que começam a se interessar nejamento, execução, implementação são eu encontrar o Don Juan, porque
seguir processos de profissionalização pelo campo da gestão cultural; 53,5% e avaliação de uma política pública ele ia me falar de toda a história da re-
até as suas últimas conseqüências se têm nível de estudos de licenciatura no dirigida à melhoria das condições de ligião, da história da cultura da região.
nós não conseguirmos que as univer- setor formal; e 53,9% são mulheres. vida de ambos os setores populacio- E, quando o auditório ficou esvaziado,
sidades assumam a responsabilidade Desses 21.789 promotores, 13.176 nais de um país e cujo desenvolvimen- só havia um jovem de uns vinte anos
de criar esse novo campo profissional. concluíram seu plano de formação e, to se caracterize pelo caráter inovador varrendo o chão. E eu falei: onde está
E, nesse sentido, ou seja, dessas três destes, 9.683 receberam o certificado no país e na região, e por evidentes Don Juan? Ele respondeu: Quem você
licenciaturas e desses três mestrados, oficial. Na estratégia da coordenação conquistas tanto em termos de pro- está procurando? Don Juan, eu disse.
apenas uma licenciatura não obteve no centro em que nós trabalhávamos cesso como também de resultados e Ele perguntou: Qual Don Juan? Minha
o resultado que nós esperávamos. As no governo federal, o segundo círculo impactos. Sem dúvida, tal como se evi- resposta: Aquele que é o presidente
outras cinco experiências foram muito concêntrico eram os coordenadores dencia ao longo desse relatório, o de- do conselho de idosos. Ele falou: sou
bem-sucedidas. de instâncias organizadoras, ou seja, senvolvimento do sistema nacional de eu (vinte e um anos de idade). Eu fa-
cada estado, em cada universidade ou capacitação se inscreve dentro das ex- lei: desculpe, mas eu estou procurando
Rapidamente vou apresentar para você ONG, nomeava um coordenador que é periências que podem ser qualificadas pelo Don Juan, o presidente do conse-
os resultados. Bem, nós tivemos 99 te- aquele que convocava os promotores como boas práticas da gestão pública lho de idosos. Sou eu - ele disse. Eu fa-
lecursos que eram teleconferências, da sua região ou do seu estado com no México. E, para fechar o meu dis- lei: Juan - não falava Don Juan pra ele
123 cursos, 148 módulos, ou seja, o qual nós fazíamos o desenho curri- curso, quando eles me perguntaram: -, será que você pode me falar sobre a
esses módulos, além dos módulos de cular. Porque a grade curricular era somente dos setores culturais são os história e a religião? E aí ele começou
um curso de diplomado. Nós tínhamos feita de acordo com os interesses de profissionais que têm a licenciatura, o a falar e, dez minutos depois, eu disse:
gente que falava: Ah! Eu não quero ter cada região ou de cada setor com os mestrado? Eu disse a eles que o prin- - Olha, Don Juan, você poderia me falar
todo o diplomado, ou seja, eu quero só quais trabalhávamos. Então, o seguin- cipal professor que eu tinha tido e que da cultura? Aí voltei a usar o Don com
um módulo desse diplomado. Então te círculo são os instrutores, ou seja, me modificou a vida quando eu era ele. É realmente impressionante o que
havia essa possibilidade, e também os professores. Nós chegamos a tra- muito jovem foi um indígena que vivia esse garoto sabia. Eu falei tchau para
125 seminários; diplomados de nível balhar com quase 300 instrutores que na região de Guerreiro, a zona sul, na ele e fiquei muito emocionado.
1, que eram cursos de 200 horas; di- foram avaliados curso por curso e foi região sul do México.
plomados de nível 2, que eram cursos muito interessante porque a média Posteriormente, falando com uma pes-
de 300 horas. Ou seja, o egresso do de qualificação que eles obtiveram de Quando eu fiz um trabalho de campo soa de uma comunidade, eu perguntei
diplomado nível 2 tinha 500 horas de zero a dez, que é como normalmente como antropólogo, eu cheguei a uma para eles como esse Don Juan, sendo
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PALESTRA
tão novo, como ele consegue estar no Bom-dia a todos e a todas. Eu que-
conselho, presidindo o conselho de ria primeiro agradecer à organização
idosos? Para você, o que é um idoso? do encontro e, em especial, a Lena
POR
Pra mim é uma pessoa de idade. Não, Cunha, pelo convite para compartilhar
são os velhos, isso é velho. Agora, os esta mesa com os amigos Mac Gregor,
idosos são os que sabem mais, são os José Márcio e Lia Calabre. É sempre
mais sábios. Aí a pergunta que eu fiz bom estar em uma mesa com amigos.
foi: e como vocês sabem quais são os
mais sábios? E a resposta realmente
me marcou para sempre. Ele disse:
ANTÔNIO Estamos tratando aqui de um tema
fundamental: a relação entre cultu-
ra e educação. Precisamos trabalhar
é muito fácil, os homens mais sábios
são os que mais servem ao seu povo.
E tomara que o espírito de Don Juan
ALBINO melhor essa relação, porque no Brasil
e em outros países ela foi muito dila-
cerada. Parece que educação não tem
CANELAS
acompanhe vocês na sua gestão cul- nada a ver com a cultura. Parece que
tural. Muito obrigado. as escolas e a educação formal estão
totalmente alheias à cultura. Enquan-
to essa relação não for recomposta
98 • Mercado de trabalho em mutação: gestão cultural e formação profissional 1º Seminário Internacional de Gestão Cultural • 99
samos apenas no momento da cria- Temos um outro momento: a conser- várias pessoas da mesa. A Lia Calabre é a mesma coisa formar um gestor ou
ção, por mais importante que ele seja. vação e preservação. Toda cultura ne- tocou nesse assunto logo no início, com um produtor cultural. É claro que a for-
Para que exista cultura é preciso todo cessita de um conjunto de instituições, múltiplas nomeações de diferentes pa- mação deles tem afinidades, mas exis-
um sistema cultural, com patamares que a humanidade inventou exatamen- íses e com muitas singularidades. Se tem peculiaridades, que não podem ser
diferenciados e flexíveis. Ele deve com- te para preservar e restaurar a cultura. formos analisar como é que o campo desconsideradas. Para entender isso
portar um conjunto de momentos. Vou Não existe vida cultural sem que todos cultural se organiza em cada país, va- será necessário pensar na singularida-
enumerar alguns desses momentos. esses passos estejam contemplados. mos ver que existem muitas diferenças de da organização da cultura no Brasil.
Isso dá uma complexidade ao sistema na sua conformação. Mas a atividade As análises comparativas são signifi-
Quem são as pessoas que socialmen- cultural. Mas falta ainda algo, que é exa- de organização da cultura está voltada, cativas para a elucidação das singu-
te são reconhecidas como pertinentes tamente o que chamo de organização independente do nome que ela tenha laridades, mas não dá para comparar
a cada um dos diversos momentos do da cultura. O que esse campo envolve? em cada país, para assegurar condições com países muito desiguais, a França
sistema cultural? Começo pela criação. Administração, gestão, financiamento, e recursos institucionais, materiais, hu- e os Estados Unidos, por exemplo. Pre-
Nesse caso são os intelectuais, os artis- legislação: um leque de atividades sem manos, legais e financeiros para que a cisamos comparar com países mais
tas e os cientistas, são os criadores das as quais a cultura não existe, porque a cultura possa se desenvolver. A organi- assemelhados, por exemplo, o México,
culturas populares, das culturas tradicio- cultura não é apenas algo espontâneo. zação da cultura pode se dar em um pla- que é um país que tem uma tradição
nais, quer dizer, um conjunto de pessoas Ela não brota, sem mais. Ela depende no macro-social ou micro-social. Quero centralizadora, apesar das experiências
que se dedicam a criar, inventar e inovar. de um conjunto de condições e circuns- propor que nós pensemos em três tipos relatadas por Mac Gregor com experi-
Uma segunda etapa, muito importante, tâncias. Isso é que permite que a cul- de profissionais, independente de sua mentos descentralizadores.
é o momento da divulgação, da difusão tura realmente possa se desenvolver nomeação específica.
e da transmissão da cultura. Esse mo- e se consolidar na sociedade. É sobre O México historicamente tem uma tra-
mento em boa medida é realizado pelos esse momento organizacional que va- Inicialmente, temos um profissional dição muito presente de políticas cul-
professores. Desde o professor primário mos conversar aqui. Mas não podia que dá conta de um plano macro-social: turais. O estado nacional tem um peso
até o universitário. Além deles, no mun- falar dessa atividade organizativa sem a formulação de políticas. Políticas cul- muito forte nisso. Como se comporta o
do contemporâneo, também os profis- delinear uma visão geral, sem afirmar turais, na verdade, são modos sociais caso brasileiro em relação ao México?
sionais da comunicação participam da que a cultura precisa sempre de todos de estruturação do campo cultural. Em relação às políticas culturais eu te-
transmissão da cultura. Um terceiro pa- esses movimentos. Nós vamos discutir, Em um primeiro nível da organização nho dito que nós temos três tradições
tamar diz respeito a circulação, coopera- portanto, um patamar específico que da cultura temos esse pessoal ligado muito tristes: primeiro, a ausência de
ção, intercâmbio e troca. A circulação é não está isolado dos outros. Mas vou exatamente às políticas culturais. Um políticas culturais. Nós só vamos ter
fundamental para que a cultura exista. destacá-lo para efeito de análise. segundo patamar é o da gestão cultu- políticas culturais de forma mais subs-
Nós temos também pessoas que lidam, ral. Estamos pensando na administra- tantiva a partir dos anos 1930, com a
por exemplo, com a mediação cultural, Que profissionais ou que pessoas estão ção de instituições, sejam públicas ou experiência de Mário de Andrade, em
diplomatas ligados à área cultural, etc. envolvidas na organização da cultura? privadas, e também na gestão de pro- São Paulo, e a do Gustavo Capanema,
Um quarto instante é o relativo à análise, Administradores, gestores, pessoas jetos de maior durabilidade, de médio no plano federal. Temos uma tradição
crítica, ao estudo, à investigação, à pes- que lidam com financiamento, com le- e longo prazo. No terceiro patamar, forte no campo do autoritarismo. Bas-
quisa e à reflexão sobre a cultura. Conve- gislação, produção cultural, isto é: for- situam-se os organizadores da cultura ta lembrar que o período no qual nós
nhamos que, para que se pense em uma muladores, promotores, animadores, que trabalham com atividades even- tivemos políticas culturais mais pre-
cultura rica e viva, essa etapa é essen- produtores, gestores, programadores tuais, a organização deste seminário, sentes foi exatamente no governo de
cial. Quer dizer, não basta que existam etc. As denominações variam de país por exemplo. Ele envolveu pessoas na Vargas, que aconteceu em boa medi-
bens culturais, é preciso que eles sejam para país, pois, como uma área não sua construção. O seminário não caiu da durante a ditadura do Estado Novo.
criticados, discutidos, debatidos. Esse é consolidada, ela não tem nomeações do céu, ele teve uma organização com Depois temos a ditadura cívico-militar
outro instante significativo da vida cultu- consolidadas. O Mac Gregor disse que pessoas dedicadas a isso. Organizaram de 1964, que tomou muitas iniciativas
ral. Estão associados a ele: pesquisado- no México são gestores e promotores. de tal maneira que podemos estar con- no campo cultural. Além da censura,
res, críticos e estudiosos da cultura. Um No Brasil nós não poderemos esquecer fortavelmente discutindo sem nos pre- da repressão, dos assassinatos, houve
outro patamar é a fruição e o consumo. os chamados produtores culturais. Em ocupar com todas as questões infra-es- uma série de intervenções no campo
Ele é um dado muito singular, pois não outros países aparecem animadores truturais que são necessárias para um das políticas culturais. Mas não foram
exige nenhum tipo de profissional. Muito culturais. Não há uma nomenclatura seminário acontecer. apenas as ditaduras que consolidaram
pelo contrário, ele, por excelência, deve internacional que dê conta desse mo- a tradição de autoritarismo. Muitas
tentar ser universal. Quanto mais pesso- mento da organização da cultura. Qual Temos determinado tipo de organizador das nossas políticas culturais, mesmo
as forem capazes de fruir a cultura, mais é a razão dessa indefinição internacio- que está ligado a coisas mais eventuais realizadas em momentos democráti-
vigorosa ela será. Enquanto nos outros nal? O campo é novo. e que no Brasil nós chamamos de pro- cos, foram autoritárias. O IPHAN, por
casos o vigor da cultura depende da exis- dutores culturais. É claro que cada um exemplo, criado em 1937, até os anos
tência de profissionais, nesse caso acon- Em todas as esferas recentes apare- desses patamares vai ter exigências de 1970 primou por tombar somente mo-
tece exatamente o contrário. Quanto cem as singularidades de cada país. formações distintas. Não é a mesma numentos da classe dominante, da cul-
mais universal for o consumo da cultura, Portanto, esse é um campo social, coisa formar o produtor cultural ou for- tura branca ocidental, em geral, igre-
mais ela tende a ser vigorosa. institucional e academicamente não mar uma pessoa qualificada para pen- jas católicas de estilo barroco. Vocês
organizado, como já foi observado por sar e formular políticas culturais. Nem hão de convir que uma instituição que
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faz isso tem uma concepção de cultura Então, o estado nacional teve um peso de incentivo tomaram o lugar do finan- ciamento e, no interior das políticas
elitista e autoritária que despreza todo grande na organização da cultura. No ciamento. Em determinado momento de financiamento, estejam submeti-
o conjunto de outras formas culturais entanto, ele não apresentava nenhu- não havia praticamente outra forma das leis de incentivo, nessa ordem. É
que existem na sociedade brasileira. ma preocupação com formação de no país de financiamento a não ser preciso refazer tudo isso.
Espero que o governo Lula dê uma gui- pessoas nessa área. O estado criava as leis de incentivo. Ou seja, o estado
nada em relação a essa tradição. instituições no campo da cultura e, praticamente se omite. Só para vocês No caso específico da organização da
no entanto, não tinha nenhum cuida- terem uma idéia, acho que em 1998, cultura é necessário recriar sua com-
Por fim, cabe lembrar que temos ainda do com quem eram os gestores das enquanto as leis de incentivo mexiam plexidade. Devem ser formadas pes-
uma tradição de grande instabilidade instituições; se eles tinham formação com algo em torno de 300 e tantos soas para as políticas culturais, para a
nas políticas culturais. Um exemplo ou não. Muitas vezes, por sorte, tive- milhões de reais, o Fundo Nacional de gestão e para a produção culturais. Te-
sintomático: entre a inauguração do Mi- mos excelentes gestores, mas isso Cultura manejava com algo em torno mos que buscar e garantir que a forma-
nistério da Cultura no Brasil em 1985 era totalmente aleatório, dependia de de 12 milhões de reais. Então acabou ção seja diversa. Não podemos conti-
e o final do governo Itamar Franco, em circunstâncias históricas e de casuali- o financiamento público direto para a nuar só formando produtores. Eles são
1994, nós tivemos em nove anos dez dades. Não tivemos uma tradição de cultura e ficou só a lei de incentivo. importantes para o sistema funcionar,
responsáveis pela cultura no Brasil. Eu formar pessoas que formulassem po- mas nós temos que ter gestores, nós
não digo dez Ministros da Cultura por- líticas culturais ou que fossem gesto- Mas as leis de incentivo não ocupa- temos que ter pessoas que tenham
que no governo Collor o Ministério foi res culturais. A situação muda a partir ram só o lugar das políticas de finan- a capacidade de formular bem políti-
fechado. O governo Collor durou dois da criação das leis de incentivo. O que ciamento, o que é já uma distorção cas culturais. Nós temos que redefinir
anos e teve dois Secretários de Cultura, acontece é muito pouco discutido: nós imensa. Há um problema ainda maior. o campo da organização da cultura e
o Ipojuca Pontes e depois Sérgio Paulo passamos desse estado central que Elas tomaram o lugar das políticas da formação da cultura, o que não é
Rouanet. No total, em nove anos nós ti- tinha iniciativas culturais, que financia- culturais. Lembrem-se de que no go- coisa pequena. Acho muito bom ter
vemos dez responsáveis pela cultura no va cultura, para um outro estado que verno FHC/Francisco Wefort tivemos nesta mesa a presença do Mac Gregor,
plano nacional implantando um minis- cada vez foi delegando suas interven- uma cartilha chamada: “Cultura, um que fala da experiência mexicana de
tério novo. É brincadeira? Instabilidade ções, inclusive o financiamento para o bom negócio”. Pensem na distorção formação em gestão cultural. Eu tive
maior do que essa não pode existir. mercado, ainda que, por absurdo, este que aconteceu no Brasil. Estou mui- uma conversa, um tempo atrás, com
financiamento seja feito com dinheiro to à vontade, pois não sou, em prin- o Juca Ferreira, quando ele ainda não
Indo adiante: as políticas culturais no público. Esse conjunto de leis de incen- cípio, contra leis de incentivo. Eu sou era ministro, quando ele era secretário
Brasil nunca focaram com atenção o tivo teve um impacto sobre a organiza- contra que a lei de incentivo se torne executivo. Eu disse exatamente a ele
tema da formação no campo cultural. ção da cultura no Brasil que ainda não a política de financiamento e que se que era preciso que fosse criado um
Se vocês observarem nas políticas cul- foi estudado devidamente. torne a política cultural. Temos aí um sistema nacional de formação e quali-
turais que foram desenvolvidas da dé- abuso total e nós não podemos con- ficação em cultura. Isso é fundamental
cada de 1930 até bem recentemente, A partir dessa revirada começa a pre- viver com isso. Se a revisão das leis para o Brasil. Esse governo podia nos
os programas que apontam para a for- dominar no Brasil aquilo que vamos de incentivo não for feita no Brasil, dar, além do que já nos deu no cam-
mação, qualificação e capacitação de chamar de produtores culturais. As pri- nós estamos muito mal. Porque essa po da cultura, essa política. Penso que
pessoas são secundários, quando não meiras leis de incentivo não previam distorção mudou muito toda a confi- devemos pressionar o governo nesse
simplesmente ausentes. Isso nunca foi isso, mas a reforma da Lei Rouanet guração da relação entre estado e sentindo. Nós podemos e devemos.
colocado como prioridade. Nós tive- passa a prever os intermediários cultu- cultura no Brasil. A partir dessas mu- Se esse governo aprovar um sistema
mos no Brasil um Estado que centra- rais que, na verdade, é um outro nome danças foi consolidada no plano da nacional de formação e qualificação
lizava as políticas culturais e o finan- para falar de produtores culturais. Co- organização da cultura uma visão na em cultura, nós vamos dar um pas-
ciamento da cultura. Pelo menos até meçamos a ter, a partir de então, uma qual não se investia na formação de so gigantesco no Brasil. Esse sistema
o início da Lei Sarney quem financiava dominância no campo da organização pessoas ligadas às políticas culturais, nacional pode ter como fonte de ins-
a cultura no país em termos nacionais da cultura dos produtores culturais. não se investia na formação de ges- piração a proposta do México. Quan-
era o Estado brasileiro. As políticas Isto é uma singularidade brasileira. Se tores culturais. Em lugar disso, cada do conversei com o Juca, disse: nós
culturais eram desenvolvidas, quase a gente for conversar com os nossos vez mais se investiu na formação de podemos criar um sistema, com base
exclusivamente, pelo estado nacio- colegas argentinos, mexicanos, colom- produtores. Em 1996, a UFBA e a UFF em um mapeamento no Brasil de to-
nal, porque os estados regionais e os bianos, ninguém vai entender porque criaram os dois primeiros cursos de das essas instituições que trabalham
municípios só se tornaram atores im- essa presença forte dos produtores graduação em Produção Cultural no formando pessoas no campo da cultu-
portantes das políticas culturais mais culturais. Ela é uma peculiaridade na- Brasil. Na época ninguém falava em ra. Feito esse mapeamento, de forma
recentemente. No caso dos estados cional que tem a ver com o peso que formação de gestores. Falava-se na sistemática, com uma pesquisa bem
regionais, isso aconteceu mais ou me- as leis de incentivo adquiriram e que formação de produtores, que era uma qualificada, depois caberia definir os
nos com a redemocratização no país. têm no país. O que é uma lei de incen- nova profissão que estava emergindo. potenciais parceiros. Anotadas quais
Os municípios só tiveram papel mais tivo? É uma lei criada para incentivar A questão que coloco para vocês é a são as instituições que fazem cursos
relevante em termos de políticas cul- a iniciativa privada a investir na cul- seguinte: é preciso que a gente rede- sérios, elas deveriam ser convidadas
turais ainda mais recentemente com a tura. Uma lei de incentivo deveria ser fina as políticas culturais no Brasil, para discutir a constituição do sistema
Constituição de 1988. uma parte de uma política maior de inclusive criando políticas públicas de nacional de formação e qualificação
financiamento da cultura. Mas as leis cultura que incluam políticas de finan- em cultura. É fundamental chamar e
102 • Mercado de trabalho em mutação: gestão cultural e formação profissional 1º Seminário Internacional de Gestão Cultural • 103
discutir com todas as instituições qua-
lificadas. Primeiro, para não reproduzir
algo imposto pelo governo nacional.
Não há nenhuma lógica em que o mi-
nistério imponha um sistema de cima
para baixo. Há muita gente fazendo
isso. Os Pontos de Cultura são um dos
melhores programas do ministério. O
que é genial nos Pontos de Cultura?
Ele não inventa. Você detecta quem faz
cultura e apóia.
104 • Mercado de trabalho em mutação: gestão cultural e formação profissional 1º Seminário Internacional de Gestão Cultural • 105
PALESTRA
Bom-dia a todos. Gostaria de come-
çar agradecendo e cumprimentando
a Marcela, a Lena e toda a equipe da
POR
DUO pela iniciativa deste Seminário
que acho sempre muito importante e
necessário. Queria também agrade-
cer pelo convite de estar aqui e dizer
BARROS
muito e estimo pelo compromisso e
pela contribuição que sempre trazem
para a questão da cultura aqui no
Brasil. Queria também cumprimentar
todos vocês: alunos, ex-alunos, compa-
nheiros de trabalho, pessoas daqui de
Belo Horizonte e de outras cidades.
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me refiro a “antigas e novas” porque do, muito menos com qualquer proces- versais dizem respeito, então, ao trân- Transversalidade, na área da gestão
é preciso também reconhecer que no so de transmissão de informação, mas sito entre saberes, aos cortes que nós cultural, no meu entendimento, refere-
campo da cultura tudo é muito novo, sim de processos, inclusive de educa- estabelecemos e às articulações de se a uma ruptura epistemológica com
mas tudo tem a mesma anterioridade ção, e que tudo isso nos leve ao exercí- áreas e campos de conhecimento que a perspectiva disciplinar que trata a
e permanência. cio efetivo da pluralidade no interior e restavam separados e incomunicáveis realidade através de um conjunto de
entre as diversas sociedades. e resultam de novas atitudes tanto na dados estáveis. É mais que uma ten-
Eu antecipo que, na minha perspecti- dimensão da produção cultural quanto tativa, através de mútua cooperação,
va, e nesses cursos e trabalhos com os É com essa pretensão, que alguns po- da comunicação e do aprendizado que boa vontade e simpatias, de construir
quais eu me relaciono e me envolvo, dem achar delirante, que eu acordo to- a experiência cultural nos oportuniza e referenciais conceituais e metodológi-
eu não concordo em assumir uma po- dos os dias e vou trabalhar e dar aula. nos demanda. A transversalidade não cos que vão além do consenso. Traba-
sição relativista e, às vezes, mineira, Então podemos com essas perspecti- se localiza num outro pólo, ela atraves- lhar com a perspectiva da transversa-
de responder: temos que nos preparar vas substituir o risco da rubrica jurídica sa todas essas dimensões. Por isso fa- lidade é não cairmos nesse canto da
para isso, mas também para aquilo. do termo competência, porque aí com- lar de competências transversais para sereia do consenso. Transversalidade,
Assim fica tudo muito fácil e prefiro petência se transforma em atribuição a gestão cultural significa enfrentar a portanto, é uma opção política tanto
pensar que está na hora de fazer esco- e poder. Ser competente é ter poder e questão de que a transversalidade nos quanto epistemológica, e, portanto, é
lhas. Ou então já temos a crise de não reconhecimento para fazer as coisas demanda uma capacidade de transi- uma experiência cultural de um regi-
saber mais o que é a esquerda, temos e podemos aprender metaforicamen- tar entre diferentes campos de saber me de conhecimento e ação marcado
a crise de achar que não temos mais te com a rubrica da hidrografia sobre e sem nenhum vestígio de hierarquia. simultaneamente pela abertura, pela
fronteiras. Se tivermos também agora a competência. Por incrível que pare- Portanto, transversalidade nos convida horizontalidade, pela dinamicidade.
a crise de não fazermos escolhas, en- ça, no campo da hidrografia, o termo a uma experiência de horizontalidade, Isso implica o quê? Implica o reco-
tão fica difícil. Eu quero fazer escolha e competência dos rios não é a sua velo- o que é, antropologicamente falando, nhecimento de que transversalidade
tenho feito escolhas dos projetos com cidade e nem a força das suas águas. o que a cultura deve nos fazer e que, às não é uma técnica de entrelaçamento
os quais eu tenho me envolvido. Eu A competência de um rio é sua capa- vezes, a dimensão política da cultura de conteúdos, que ações transversais
acredito que é muito diferente formar cidade de fluidez e deslocamento. Um nos impede de viver. não são uma técnica de tecelagem
gestores culturais para tratar a cultura rio é tão mais competente para quem de idéias nem muito menos uma téc-
como negócio e formar gestores cultu- dele vive quanto mais ele conduz na Articular competências com transver- nica de culinária e de boas intenções.
rais para entender e agir sobre e atra- fluidez dos seus movimentos e não na salidades significa, penso eu, construir Transversalidade é o resultado de uma
vés do negócio da cultura. Eu acho que velocidade e na força das suas águas. um novo modelo cultural de conheci- máxima aproximação entre modelos
faz muita diferença. Na primeira pers- Então, metaforicamente, eu estou que- mento e ação que opera simultanea- de representação e ação do e sobre o
pectiva, corremos o risco de reduzir a rendo dizer que a competência que eu mente duas rupturas. Com o regime mundo que se contaminam produzin-
formação para o mercado da cultura; acredito ser necessária é nessa linha. de uma subjetividade disciplinada e do configurações de conhecimentos e
na segunda, abrimos a possibilidade da razão que a modernidade empre- práticas híbridas, mas também cola-
de prepará-los para o trabalho com a Em segundo lugar, eu trabalhei com endeu e que Foucault denominou na borativas, renováveis e sustentáveis.
cultura que conforma uma socioeco- o termo da transversalidade e me in- sociedade disciplinar, e, por mais que
nomia da cultura. É para esse segundo teressa muito que a gente problema- nós olhemos para isso com um certo A terceira e última questão: se essas
ponto que eu acredito que o nosso in- tize se hoje falar de transversalidade romantismo histórico, é assim que duas idéias de competência e trans-
vestimento deve se dirigir. Eu não es- é uma retórica contemporânea ou, de nós nos dividimos dentro da universi- versalidade fazem sentido, então eu
tou aqui brincando com palavras nem fato, falar de transversalidade é falar dade, fora da universidade: criticamos me arrisco a terminar colocando algu-
propondo fáceis oposições, eu estou de um outro paradigma que nos ajuda o modelo que a modernidade nos co- mas proposições para a nossa reflexão
aqui propondo que façamos escolhas. a resolver e enfrentar essas questões locou. Festejamos Foucault, mas con- na formação dos gestores culturais. A
que o Mac Gregor e o Albino já nos tinuamos sendo uma sociedade disci- primeira delas: o gestor cultural não é
A minha eu já antecipo: penso a forma- anteciparam de forma tão brilhante plinar, mas também com a ruptura e um operador de lógicas lineares e aris-
ção de gestores culturais na dimensão aqui. O prefixo “trans” quer dizer supe- a superação dos limites a que a idéia totélicas voltadas ao disciplinamento
das competências para a consolidação ração, isso já nos ajuda, já nos convida da interdisciplinaridade nos convida. da selvageria e da barbárie da cultura
da cultura como um ponto central de a uma complexidade de reflexão sobre Interdisciplinaridade é um meio passo e dos seus sujeitos. Não é, não é isso.
projetos de desenvolvimento humano a questão da transversalidade na for- ainda porque ela é uma tentativa de Não pode ser isso, não podemos reco-
ancorados em processos de economia mação das competências do gestor estabelecer comunicabilidade e reco- lonizar em nome da gestão cultural,
solidária, de educação inclusiva e de cultural. Transversalidade, portanto, nexão entre ligações que foram des- sair em ações de recolonização dos
modelos de sociedades plurais. É com é a possibilidade de uma simetria, de feitas ou perdidas com o movimento rincões do país substituindo os sabe-
essa pretensão que eu penso a impor- um equilíbrio, mas de uma natureza da especialização. Mas é ainda algo res nativos e as lógicas próprias por
tância da formação de competências muito nova e peculiar porque são uma frágil no meu entendimento, é só meio essa missão civilizatória em nome da
para os gestores culturais, nesse foco simetria e um equilíbrio construídos caminho, é apenas um primeiro passo linearidade e da ciência aristotélica,
da questão da cultura como epicentro pelo cruzamento e pelo atravessamen- de ruptura com o regime disciplinar da não é? No meu entendimento, gestor
de um modelo de desenvolvimento hu- to das coisas. E aí que mora o novo modernidade. cultural é um mediador entre a dimen-
mano que trabalha não com qualquer e o difícil desafiador dessa idéia da são subjetiva e sensível da cultura e
economia e nem com qualquer merca- transversalidade. Competências trans- os seus desdobramentos e interfaces
110 • Mercado de trabalho em mutação: gestão cultural e formação profissional 1º Seminário Internacional de Gestão Cultural • 111
com os outros campos da experiência grandes habilidades do ponto de vista
humana. Em segundo lugar: o gestor de análise conceitual, metodológica e
cultural da e na atualidade, antes de também tática.
ser um especialista em conhecimen-
tos e práticas exclusivas e excludentes, Eu vou só citar porque quando eu co-
é uma espécie de roteador de infor- meço a falar sobre Edgar Morin, Ma-
mações alternativas e possibilidades turama, eu levo dois dias. A circulari-
dinâmicas de construção de cenários dade, que não é um princípio baseado
prováveis, mas também de cenários em modismos, é uma forma de olhar
utópicos. Acho que um dos papéis do e pensar o mundo e a gestão da cul-
gestor cultural hoje é isso que o apare- tura. A idéia da interconectividade nos
lhinho roteador faz: distribuir. Por quê? ajuda a decidir onde temos que inves-
Porque tem gente que ainda acha que tir, atuar, fazer nossas escolhas, quer
o gestor cultural é um especialista, é o dizer, os pontos máximos de conexão
portador de uma excepcionalidade. Eu que podem realizar transformações
estou aqui propondo que a gente pense mais definitivas, a idéia da autopro-
o gestor como o roteador, alguém que dução, a idéia de que nós e os nossos
distribui, capaz de provocar e realizar o objetos da cultura nos misturamos e
processo de distribuição. Terceiro: uma nos constituímos. Portanto, é impossí-
gestão cultural atenta e coerente com vel ser gestor da cultura quem faz da
a questão da diversidade cultural deve sua visão da cultura só a sua própria
reconhecer, para além da presença cultura, não é? A idéia da dialética...
de diferentes padrões e configurações O mundo comunista entrou em crise,
dos campos culturais, o desafio de mas nós jogamos fora os fundamentos
articular lógicas em modelos de insti- que deram vida a uma experiência his-
tucionalização e legitimação que são tórica que acabou, mas o materialismo
singulares. da dialética continua sendo muito inte-
ressante: a dialética, a visão holística,
Isso me parece muito importante por- a perspectiva dinâmica e a perspectiva
que como é que nós vamos superar o da intersubjetividade. Somos gestores
demagógico reconhecimento das dife- de cultura e não gestores de qualquer
renças como curiosidades excêntricas? negócio. Então é isso, desculpem o ex-
Como é que nós vamos afastar o risco cesso. Obrigado.
de empreender missões civilizatórias
de imposição de lógicas gerenciais
travestidas de editais inclusivos para
os nativos? Quando é que efetivamen-
te faremos esse passo, além de ficar
só explicando aos nativos da cultura
como é que eles devem preencher os
nossos formulários? E quando é que
nós vamos efetivamente reconhecer
que a maneira como organizamos os
nossos processos de informação e de-
cisão e financiamento da cultura com-
portam lógicas, perspectivas de poder,
perspectivas conceituais sobre a cultu-
ra?
JOSÉ MÁRCIO BARROS
Do gestor cultural hoje se espera mais
do que a capacidade de transformar Pontifícia Universidade Católica - PUC Minas
fraquezas em fortalezas, ameaças em
oportunidades, o inesperado em pre- Mestre em Antropologia pela UNICAMP, Doutor em Comunica-
visível. O gestor cultural de hoje é um ção e Cultura pela UFRJ. Professor do Programa de Pós-Gradu-
profissional da complexidade da cul- ação em Comunicação da PUC Minas e Coordenador do Obser-
tura, né? E isso significa habilidades, vatório da Diversidade Cultural.
112 • Mercado de trabalho em mutação: gestão cultural e formação profissional 1º Seminário Internacional de Gestão Cultural • 113
Você já viu essa pessoa?
Quer dizer que já houve um encontro.
Então, vamos aproveitar e formar
uma rede!
Vitor Ortiz
PRINCÍPIO DE
RECONHECIMENTO
E DE PROTEÇÃO
DOS DIREITOS CULTURAIS
Os direitos culturais devem ser entendidos como direi-
tos de caráter fundamental, segundo os princípios de
universalidade, indivisibilidade e interdependência. Seu
exercício desenvolve-se no âmbito do caráter integral
dos direitos humanos, de forma tal que esse mesmo
exercício permite e facilita, a todos os indivíduos e gru-
pos, a realização de suas capacidades criativas, assim
como o acesso, a participação e a fruição da cultura.
Esses direitos são a base da plena cidadania e tornam
os indivíduos, no conjunto social, os protagonistas dos
afazeres no campo da cultura.
metodológica
gração e Cooperação Internacional. Em seguida, esses temas foram desdobrados
em nove subtemas discutidos nos grupos temáticos, coordenados por especialis-
tas e abertos a um grupo mais restrito de 30 pessoas em cada sala.
A finalidade de tal dinâmica era aprofundar o debate em torno dos temas coloca-
dos como norteadores para a discussão, criando, ao mesmo tempo, um ambiente
formativo e de trabalho colaborativo que pudesse suscitar reflexões, manter o
debate aberto e, ao final, produzir este material de referência para o setor cultural
e áreas transversais.
O início dos debates seguia com a apresentação do tema por parte dos coordena-
dores que abriam para o diálogo com todos os participantes, colocando questões
e provocando manifestações e contribuições para o grupo. A idéia foi estabelecer
uma conversa livre para construir, em conjunto, um conteúdo que apresentasse as
principais conclusões sobre o tema específico de cada encontro. Para tanto, toda
a discussão foi registrada por um relator e, também, gravada para não correr o
risco de perdermos importantes abordagens e pontos suscitados.
Ao realizar encontros como este 1º Seminário, a DUO tem por objetivo colocar em
pauta a discussão não apenas de temas teóricos - que devem ser aprofundados
– sobre a diversidade do campo da gestão cultural, mas, também, propor formas
e princípios metodológicos diferenciados como parte do processo formativo. Abre-
se, assim, mais um espaço para incentivar a troca de experiências e o exercício co-
laborativo de aprendizagem a partir de diálogos abertos e construtivos. Queremos
deixar claro que os coordenadores dos Grupos Temáticos tiveram a liberdade de
adaptar a metodologia proposta inicialmente, o que justifica o resultado diferen-
ciado nas conclusões dos trabalhos aqui publicados.
BRASILEIRO:
de Leon Antunes(MG), Davi Costa
Queiroga Barros(MG), Diná Marques
Pereira Araújo(MG), Elder Miranda de
Castro(MG), Gabriela Araujo Batista
Síntese
Cristina Lins apresentou dados de al-
128 • Encontros temáticos: uma proposta metodológica 1º Seminário Internacional de Gestão Cultural • 129
Palavras-síntese
Desenvolvimento local, tecnologia,
para resolver os problemas urbanos. É
um componente fundamental para o
GESTÃO NA Coordenadores
José Márcio Barros – Pontifícia Uni-
empreendedorismo, cultura, identida- processo de formação da cidade; DIVERSIDADE versidade Católica – PUC Minas (MG).
de, futuro. - É preciso construir um futuro desejável, Marcelo Santos – Gerência de Arte
planejar com muita antecedência: trinta e Cultura da Fundação AcelorMittal
Conclusões anos para frente, construir novas gover- Brasil (MG).
- O desenvolvimento de cidades é pau- nanças e buscar um futuro desejável.
tado pelo planejamento urbano. Há Relatora
sempre uma vocação latente. É neces- Célia Corso - Venezuela
sário planejamento;
- São muitas identidades convivendo. É Participantes
preciso ter a vocação ancorada na sua Ana Luiza Capel Moreno(MG),
identidade; Andersen Viana(MG), Andreia Costa
(MG), Cássia Saldanha Gomes(MG),
- Existe uma dificuldade em valorizar o
Eloá Ribeiro de Oliveira(RJ), Elzelina
que temos de bom, a nossa identidade;
Doris dos Santos(MG), Eugenio Pas-
- É preciso pensar o desenvolvimento cele Lacerda(SC), Henilton Parente
das cidades como um todo. Não inte- de Menezes(CE), Ivone da Silva Ra-
ressa a área. O desafio é pensar a ci- mos Maya(RJ), Kátia Maria Malloy
dade como um caleidoscópio; Mota(MG), Kelly Alcilene Cardozo
(MG), Lais Terçariol Vitral(MG), Lucie-
- A importância das universidades para ne da Silva Nogueira(MG), Maria de
as redes e para os diagnósticos: plane- Betânia Teixeira Campos(MG), Maria
jamento urbano; Zienhe Caramêz de Castro(PA), Marli
- O diagnóstico deve ser acompanhado Elias Veisac(MG), Nísio Antonio Teixei-
de ações compartilhadas; ra Ferreira(MG), Patrícia Lamego de
Carvalho(MG), Patricia Lamounier(MG),
- Sustentabilidade econômica, capital so- Rafael Matrone Munduruca(MG), Ro-
cial e políticas são meios, são caminhos; bson Ricardo Machado(MG), Romê-
nio Cesar Leite Coelho(MG), Rosa H.
- O desenvolvimento é fim e meta nor- Rasuck(ES), Sabrina Campos Costa
teadora, que motiva e direciona; (PA), Soraya Santoro Queiroz(MG),
- Os principais problemas apontados re- Stanley Levi Nazareno Fernandes(MG),
lacionam-se à descontinuidade das polí- Welington Luiz de Carvalho.
ticas públicas no Brasil, à falta de diálo-
go entre as esferas e entre as pastas;
Síntese
- Diversão não é só entretenimento, é Não se pode reduzir a gestão à gerên-
também prazer, é sentir-se bem em al- cia de cultura. A atual conjuntura de
gum lugar; crise econômica mundial representa
um ponto de partida para repensar os
- A parceria público/privada tem que modelos de gestão existentes. É um
ser construída. É preciso criar uma li- erro pensar que a diversidade cultural
nha de geração de negócios, indepen- se esgota nela própria, pois erra uma
dente de lei de incentivo. A cultura sociedade que transforma a diversida-
deve ser vista como investimento e de cultural num elogio às diferenças.
não como despesa; Dentro da proposta de um possível mo-
- É importante ter vontade política, delo gerencial universal para a área,
mas o apoio da iniciativa privada é fun- deve-se considerar o gerenciamento de
damental; grupos que não atendem ao consumo
de massas, grupos culturais que não
- Pode ser que a vocação da cidade não “dão lucros”. Existem, no Brasil, outros
seja necessariamente cultural, mas é processos de produção, processos co-
difícil sobreviver se não tiver a questão laborativos nos quais é praticamente
cultural;
- A pauta da cultura não é superfície impossível diferenciar o início e o fim
130 • Encontros temáticos: uma proposta metodológica 1º Seminário Internacional de Gestão Cultural • 131
da cadeia produtiva e isso faz com que normatização e exigências específicas;
seja difícil pensar em um modelo úni-
co ou universal. - Criar modelos abertos de Gestão
Cultural que propiciem a interlocução
No Brasil há políticas de editais e gran- entre os setores (primeiro, segundo e
des empresas usam o patrocínio in- terceiro), para que sejam respeitadas
centivado. Deve-se aprender a avaliar as suas particularidades;
essas experiências ao mesmo tempo - Realizar encontros que promovam a
em que é preciso recolher e avaliar as discussão entre os diversos gestores e
práticas de investimento cultural dire- as entidades governamentais;
to já existentes em alguns estados.
- Reafirmar a necessidade de contínuo
A questão da sustentabilidade da cul- investimento na formação de gestores
tura é uma questão de tempo. É como culturais;
a questão ambiental: preservar para
- Promover a diversificação das fontes
garantir o lucro do futuro. Por isso, de-
de financiamento;
vemos pensar em múltiplos modelos
baseados em parâmetros comuns. É - Lançar mão dos indicadores culturais
preciso desconstruir para construir e já existentes para sermos capazes de
começar a pensar numa economia traduzir informação em ações;
solidária como eixo transversal, que
perpasse todos os setores, pois a ca- - Desenvolver programas de educação
deia econômica da cultura é comple- patrimonial que contribuam para a
xa: agrega fruição estética, mas exige ampliação de uma nova visão do pa-
planejamento e pesquisa. trimônio cultural brasileiro em sua di-
versidade de manifestações, tangíveis
e intangíveis, materiais e imateriais,
Palavras-síntese como fonte primária de conhecimento
Crise mundial, processos colaborati- e aprendizado;
vos, investimento cultural, consumo,
pesquisa, gestão cultural. - Manter a atenção na militância cultu-
ral. Integrar os militantes em rede. In-
formar, divulgar e orientar militantes,
Conclusões artistas e o público em geral sobre as-
- Promover o Georreferenciamento
suntos relacionados à cultura.
para criar e/ou financiar grupos de
pesquisa em ferramentas culturais;
MOVIMENTO:
e Planejamento – CEBRAP (SP)
COMPARADA Alexandre Barbalho – Universidade
Estadual do Ceará – UECE (CE)
INTERCÂMBIOS E Participantes
André Luis da Fonseca(SP), Cesaria
INTERNACIONAL
nando Paixão Duarte(MG), Francisco
José Gómez Duran(DF), Gisele Men-
donça do Nascimento, Gisele Sousa
Castro Magalhães(MG), Jaime Luiz
Rodrigues Júnior(MG), Jakeline Lins
G. de Albuquerque(MG), João Roberto
S. Silva(MG), Maria Carolina Campos
Oliveira(MG), Maria Elizabeth de Aze-
vedo Meyer Camargo(MG), Maria Fla-
via Gadoni Costa(DF), Marize Figueira
de Souza(RJ), Marli Elias Veisac(MG),
Nísio Teixeira(MG), Paula Ziviani(MG),
Rachel Cesarino Moraes Navarro(SP),
Dia 6 de novembro Raquel Costa Chaves(MG), Renata
de Oliveira Ramos(MG), Romulo José
Avelar Fonseca(MG), Tatyana Laryssa
Rubim Silva(MG), Vanilza Jacundino
Rodrigues(MG).
Síntese
O debate foi realizado em torno de três
grandes modelos de política cultural:
o modelo I ou ‘modelo francês’, que
se caracteriza por sua natureza cen-
tralizadora; o modelo II ou modelo
‘descentralizado’, comum nos países
anglo-saxões como Inglaterra e USA,
cuja legislação de incentivo e de bene-
ficio fiscal não é específica e a maior
fonte de financiamento é indireta; e o
modelo III, ou modelo de descentrali-
zação administrativa, que se vê repre-
sentado em países como Alemanha e
Itália: cujo poder decisório pertence às
regiões. Existe, em geral, uma política
externa, legislação específica e enor-
me participação do mecenato privado
em torno do patrimônio.
Palavras-síntese Participantes
Política cultural, processo histórico, co- Adalberto Andrade Mateus(MG),
municação, novos modelos para proje- Alberto Luiz Hermanny Filho(MG), Ali-
tos culturais. ne Tatagiba Bessa Gonçalves, Aman-
da Aparecida Silva(MG), Ana Luiza de
Melo Albuquerque, Bárbara Guima-
Conclusões rães Aranyi(MG), Berenice de Albu-
- Produzir trabalhos de legislação com-
querque Tavares(ES), Bianca Torres
parada;
dos Santos(MG), Cecilia Bhering Maga-
- Criar cursos e concursos para gesto- lhães Pinto(MG), Cristina Ribeiro(MG),
res culturais; Dalmo de Oliveira Souza e Silva(SP),
Eleonora Joris(RS), Eloá Ribeiro de
- Propor e incentivar fóruns de comuni- Oliveira(RJ), Elzelina Dóris dos Santos
cação entre os diversos gestores e ins- (MG), Fernanda Toffoli Versolato(SP),
tituições; e fóruns entre as secretarias Isabela Haueisen Pechir(MG), Jacya-
estaduais e municipais; ra Edwiges Rosa de Araújo(MG), Jane
- Modificar as formas de avaliação dos pro- Maria de Medeiros(MG), Jeferson Fer-
jetos culturais (avaliar pela qualidade); reira de Jesus(MG), Josenira Monte-
teiro de Souza(MG), Julia Duarte de
- Promover a diversificação nas formas Souza(ES), Letícia Duarte(MG), Lucie-
de captação de recursos; ne da Silva Nogueira(MG), Magna Va-
ladares de Sales Gonçalves, Nelson
- Estimular a renúncia fiscal de pes-
Rodrigues Pombo Junior(MG), Pedro
soa física;
Alves Madeira Filho(MG), Regina Vieira
- Propor e/ou criar novos modelos de de Faria Ferreira(MG), Robson Ricardo
prestação de contas; Machado(MG), Rogério Luiz Vanucci
de Moraes(MG), Rosa H. Rasuck(ES),
- Promover e/ou retomar o conceito de Silvia Rejane Lopes Silva(MG), Soraya
incubadoras culturais no Brasil. Santoro Queiroz(MG), Wallace Puosso
de Castro(SP), Wanderley Soares da
Cruz(MG).
Síntese
Utilizando como referência o texto “A
conveniência da Cultura”, de George
Yúdice, Daniela Matos abriu a reunião
com uma exposição na qual abordou
o tema em debate a partir de três ver-
tentes: desenvolvimento cultural, eco-
nomia cultural e cidadania cultural.
Discutiu-se a idéia da cultura como
recurso de desenvolvimento econômi-
co e sociopolítico, analisando em que
medida o investimento em cultura es-
timula padrões de desenvolvimento,
136 • Encontros temáticos: uma proposta metodológica 1º Seminário Internacional de Gestão Cultural • 137
considerando que ela está na interse-
ção das agendas econômica e social.
- Considerar a escola com espaço híbri-
do (educação e cultura) com o objetivo
COOPERAÇÃO Coordenadores
Daniel González – Culturacomunica-
No debate que se seguiu, as principais
de potencializar esses espaços; CULTURAL ción - Argentina
Vitor Ortiz – Instituto Hominus de De-
questões colocadas pelas coordena- - Questionar a força e o poder da gran-
de mídia; ENTRE OS PAÍSES senvolvimento Sociocultural (RS)
doras e analisadas por todo o grupo
foram: a formação de público a partir - Re-inventar utopias que nos aproxi- ÍBERO-AMERICANOS
das mídias disponíveis e em que medi- Relatora
da a mídia deveria ser explorada para
mem do outro, do compartilhamento;
E A DISCUSSÃO Patrícia Faria (MG)
a divulgação de conteúdos educativos - Promover o intercâmbio de políticas
e culturais, considerando que hoje culturais, educacionais e de turismo; DA AGENDA 21 Participantes
os meios de comunicação formais (a Andersen Viana(MG), Cristiane Martins
- Criar estratégia de contra-agenda-
grande mídia) não contribuem para a Teixeira(MG), Deusa Assis (MG), Édison
mento da mídia, a partir dos movimen-
reflexão sobre a produção cultural; a Vilela de Freitas(MG), Giovane Pereira
tos sociais e culturais;
necessidade de um projeto político- Sampaio(MA), Janaína Magalhães(RS),
pedagógico para embasar políticas de - Trabalhar a Comunicação como es- Juno Alexandre Vieira Carneiro(MG),
cultura, considerando o tripé ‘educa- tratégia de intervenção e não apenas Leida Cantanhêde(RS), Maria Hele-
ção/comunicação/cultura’; a neces- como instrumento de divulgação; na de Alencar Pires, Marina de Sousa
sidade de parcerias público-privadas Bandeira(MG), Martha Sandra Dias
para resolver o acesso universal; a - Usar a Comunicação como meio para
aproximar as pessoas. Toffolo(MG), Paz Pérez Catalã(DF), Ra-
importância de formar novas redes fael Matrone Munduruca(MG), Rapha-
sociais, educativas e de cooperação; o ela Simões Pedroso(MG), Regina Mag-
direito de escolha. da Rodrigues de Melo(MG), Rita de
Cassia Brito Cupertino(MG), Roberto
Entre as contribuições de suas interven- Carlos Teixeira(MG), Sabrina Campos
ções ao debate, Marta Porto abordou: Costa (PA), Simone Zárate(SP), Stanley
a questão da injustiça nos processos Levi Nazareno Fernandes(MG), Suzana
de escolha; os repertórios que impli- Markus(MG), Tatiana Vieira Assump-
cam novas exclusões; a importância ção Richard(RJ), Vera Lúcia Claudino
da formação de novas redes sociais; a Ramos Flores(MG), Washington Benig-
formação de público na escola e as di- no de Freitas(SP), Welington Luiz de
mensões da produção simbólica. Carvalho.
Palavras-síntese Síntese
Indicadores culturais, cadeia produti- Considerando que a Ibero-América
va, comunicação, mídia, transforma- não é somente um conjunto de países,
ções subjetivas, escolhas justas, diá- mas um conjunto que possui um subs-
logo, redes, educação, comunicação e trato cultural comum, com identidades
cultura. culturais compartilhadas, o diálogo ini-
cial - realizado entre os coordenadores
Conclusões - tratou principalmente de como se
- Ter como preocupação permanente: estabelece, hoje, a cooperação cultu-
criar meios alternativos de divulgação ral no espaço ibero-americano e quais
de conteúdos culturais; são e como atuam os organismos mul-
tilaterais que trabalham a cooperação
- Considerar a necessidade de ampliar cultural na articulação de interesses
repertórios, especialmente os experi- entre os países.
mentais;
- Reconhecer a importância da expe- A Ibero-América tem um imenso ca-
riência coletiva (catarse), a partir da pital cultural. Possui um ativo cultural
arte, para despertar/estimular os indi- importante, tem tradição de diálogo e
víduos; de confrontação. Porém, não tem ain-
da o costume e a tradição de trocas
- Formar hábitos culturais;
horizontais.
138 • Encontros temáticos: uma proposta metodológica 1º Seminário Internacional de Gestão Cultural • 139
A cultura é parte indissociável do de- zio prático. O que fazer? Como atuar?
senvolvimento. Mas é preciso uma de- Onde está o caminho? Quais são as
finição sobre o modelo de sociedade regras? Cadê o fazer? De onde come-
de desenvolvimento que todos quere- çar? A Bienal do Mercosul já é uma
mos e qual o papel da cooperação cul- prática. Como ela aconteceu? Como
tural e do desenvolvimento local nesse fazer um evento deste porte. Como foi
processo. esse redemoinho de ações para que
isso se concretizasse?
Por ter sido constituída como um com-
promisso, resultante de uma articula- - Na teoria o conceito de cooperação
ção representativa mundial e assinada está bem aceito, mas na prática é dife-
por 350 cidades no Fórum Universal rente. Ainda é muito pouca a oferta de
das Culturas, em Barcelona, a Agenda formação em gestão cultural. Isso difi-
21 da Cultura foi um tema importante culta colocar a Agenda 21 em prática.
no debate realizado por este Grupo. - É preciso ampliar o leque de oportu-
nidades de formação senão “é querer
Palavras-síntese fazer mais com pessoas que não estão
Cooperação cultural, desenvolvimento preparadas para fazer mais”.
local, identidade cultural, democracia,
- A Cooperação Cultural é um campo
Agenda 21 da Cultura.
de trabalho muito amplo e pouco co-
nhecido. Os organismos, institutos etc.
Conclusões precisam prestar atenção na coopera-
ção para construir propostas que a for-
Sobre a Agenda 21 da Cultura: taleçam. Existe um déficit nesse sen-
tido. A questão é mergulhar no tema
- A Agenda é uma plataforma de refe- para compreender melhor o processo.
rência das cidades para trabalhar mais
efetivamente o desenvolvimento cultu-
ral local;
- Existe um consenso de que os gover-
nos precisam ter uma atuação mais
forte nesta área e que a formação de
políticas públicas para a cultura preci-
sa de participação local;
Conclusões gerais
TRABALHO EM
México - México
PERFIL, Maria Helena Cunha – DUO informa-
ção e Cultura | DUO Editorial (MG)
HABILIDADES E
MUTAÇÃO: GESTÃO SABERES Relatora
Célia Corso - Venezuela
CULTURAL E Participantes
Ana Luisa Santos(MG), Bárbara Guima-
PROFISSIONAL
(MG), Domingos Máximo Pereira(MG),
Edilson Rodrigues de Araújo(MG), Fer-
nanda de Melo Carvalho(MG), Fernan-
da Toffoli Versolato(SP), Gisele Sousa
Castro Magalhães(MG), Heitor Borges
Lins(SC), Ilca Suzana Lopes Vilela(PE),
Jacyara Edwiges Rosa de Araújo(MG),
Kátia de Marco, Letícia Acácio Rodri-
gues e Silva(MG), Luiza Firmato, Ma-
ria Aparecida de Andrade Resende
(MG), Maria Flávia Gadoni Costa(DF),
Maria Lúcia Cunha de Carvalho, Maria
Dia 7 de novembro Zienhe Caramêz de Castro(PA), Marli
Elias Veisac(MG), Mirian Dolores Bal-
do Dazzi(RS), Paloma Elaine Santos
Goulart(MG), Paula Borges Lins(SC),
Rosana Magalhães(MG), Sérgio Henri-
que Carvalho Vilaça(SP), Silvia Rejane
Lopes Silva(MG), Wanderley Soares da
Cruz(MG).
Síntese
Segundo o mapa conceitual apresen-
tado, o Gestor Cultural, dentro de uma
dimensão sociopolítica, é um interpre-
tador de realidades complexas (impe-
lido a contextualizar) que desenha e
administra diplomacias transversais
e transnacionais; identifica bases pa-
trimoniais internacionais (pesquisa
e avalia); promove uma ação cultural
em cooperação (manejo de grupos) e
trabalha em rede para comunicar-se e
fazer gestão da informação.
144 • Encontros temáticos: uma proposta metodológica 1º Seminário Internacional de Gestão Cultural • 145
CULTURA DA Coordenadores Síntese
Marcela Bertelli deu início aos traba-
Palavras-síntese
Diagnóstico, planejamento estratégi-
Lia Calabre - Fundação Casa de Rui
GESTÃO: Barbosa (RJ) lhos com a apresentação das coorde- co, gestão participativa, novos mode-
Marcela de Queiroz Bertelli - Duo nadoras e destacando a pertinência los, ferramentas de avaliação, infor-
PLANEJAMENTO E e Informação e Cultura | Duo Editorial de estarem ali, na coordenação, duas mação.
gestoras públicas e uma gestora atu-
FERRAMENTAS (MG)
Mônica Starling - Fundação João ante na iniciativa privada para tratar Conclusões
DE TRABALHO Pinheiro (MG) do tema e de suas particularidades re-
lativas aos setores público e privado.
- Trabalhar o Planejamento como pro-
cesso formativo, coletivo, participativo;
Relatora Ao iniciar sua fala, Lia Calabre apre- - Formar profissionais aptos a lidar
Ana Flávia Macedo (MG) sentou as seguintes questões para re- com metodologias/técnicas/dinâmi-
flexão e debate: cas de planejamento estratégico para
Participantes - Que modelos de gestão desejamos?
a cultura;
Ana Luísa Bosco Freire(MG), André
- Organizar informações relevantes à
Luis da Fonseca(SP), Berenice de Al- - Quais as funções reais do planeja- formulação de indicadores consideran-
buquerque Tavares(ES), Cássia Salda- mento? do, especialmente, aqueles de avalia-
nha Gomes(MG), Danielle Ponce de
- O que são ferramentas de gestão? ção qualitativa;
Leon Antunes(MG), Eleonora Joris(RS),
Eloá Ribeiro de Oliveira(RJ), Fernanda - Realizar o mapeamento de profissio-
Teixeira Gomes(MG), Francisco José Focou suas considerações no setor nais que lidam com ferramentas de
Gómez Duran(DF), Ivan dos Santos público, ressaltando o planejamento gestão, com a constituição de grupos
Cândido, João Paulo Couto Santos neste setor como uma imposição ins- de estudo, que possam criar e replicar
(BA), João Roberto S. Silva(MG), José titucional, na maioria das vezes sem metodologias;
Márcio Barros(MG), Leonardo Valle e qualquer diálogo com a ação, com a
Costa Beltrão(MG), Marina Abelha de atividade fim. Ressaltou que diagnós- - Sistematizar processos e experiên-
Fuccio Barbosa(MG), Mônica Tavares ticos e pesquisas são ainda muito pou- cias (memórias);
Pereira Lima(MG), Paula Ziviani(MG), co utilizados como ferramentas fun-
- Estabelecer parcerias com universida-
Paz Pérez Catalã(DF), Romulo Avelar damentais de planejamento. Segundo
des para elaboração de metodologias
Fonseca(MG), Rosa Rasuck(ES), So- ela, é necessário construir modelos
de pesquisas aplicadas à cultura que
raya Santoro Queiroz(MG), Tatyana participativos de planejamento e ges-
possam ser replicadas;
Laryssa Rubim Silva(MG), Vera Lucia tão e trabalhar na constituição de ins-
C. Ramos Flores(MG), Viviany Barreto tâncias de participação como fóruns e - Incrementar disciplinas transversais à
Nogueira(RJ). conselhos. cultura em cursos das diversas áreas;
146 • Encontros temáticos: uma proposta metodológica 1º Seminário Internacional de Gestão Cultural • 147
EDUCAÇÃO, Coordenadores Síntese
Os principais temas trabalhados pelo
levar em conta essas diferenças. Como
disse Alfons Martinell, é preciso forta-
Ángel Eduardo Moreno Marin – Con-
CULTURA E vênio Andrés Bello - Colômbia grupo, com a intervenção precisa dos lecer, no âmbito da educação, a cultura
política que aproxima esses temas”.
Antônio Albino Canelas Rubim – coordenadores, foram: a relação entre
NOVAS MÍDIAS Universidade Federal da Bahia –UFBA a educação e a cultura (a cisão entre
(BA) razão e sensibilidade); o poder da co- Palavras-síntese
municação e a relação do gestor cul- Educação e cultura, comunicação, no-
tural com as novas mídias; a neces- vas mídias, política cultural, formação,
Relatora sidade de organizar o campo cultural trabalho em rede, culturas regionais,
Patrícia Faria (MG) para entender, aprender e trabalhar tecnologia, razão e sensibilidade.
por uma nova e estreita relação entre
Participantes educação e cultura.
Conclusões
Ana Elisa Ribeiro(MG), Ana Maria
- Promover uma mobilização nacional
Nogueira Rezende(MG), Andersen Nas palavras dos coordenadores: para regulamentar uma lei que já foi
Viana(MG), Artur Henrique de Leos
aprovada e que tem sido deixada para
e Silva, Cesaria Alice Macedo(MG), Albino Rubim: trás: a Lei da Regionalização da Pro-
Clarissa Melo Araújo, Claudio Soares “Como superar esse descolamento en- gramação (30% de programação re-
Leão(MG), Eva Bañuelos Trigo, Gabrie- tre educação e cultura? É preciso en- gional na emissoras de TV);
la Araújo Batista(MG), Jane Maria de tender que existe um conjunto diverso
Medeiros(MG), Jeferson Ferreira de de conhecimento. Não vamos cobrar - Promover a comunicação popular
Jesus(MG), Karla Bilharinho Guerra da ciência o que é da arte, do conhe- uma vez que os governos só fazem ma-
(MG), Letícia Duarte(MG), Luciene da cimento comum. As novas mídias não rketing das suas políticas públicas;
Silva Nogueira(MG), Marcelo Henri- podem ser tomadas apenas na sua
que Costa(MG), Maria Aleluia de Alen- dimensão instrumental. Elas são mui- - Considerar a recomendação de que
car Pires, Maria Elizabeth de Azevedo to mais do que isso. Estão associadas vídeos de educação, programas de in-
Meyer Camargo(MG), Maria Luiza Dias ao momento novo em que vivemos, formação educativos, sejam passados
Viana(MG), Nelson Rodrigues Pombo ao período contemporâneo. Uma das nos equipamentos públicos de acesso
Junior(MG), Regina Magda Rodrigues características deste período é a socia- da população, por exemplo, salas de
de Melo(MG), Rosália Estelita Diogo bilidade que conecta o local com o glo- espera de hospitais, salas da Receita
(MG), Rosalves dos Santos Sudário, bal, espaços geográficos com espaços Federal, equipamentos de atendimen-
Sibelle Cornélio Diniz(MG), Violeta Vaz virtuais, convivência com vivências à to público das prefeituras etc;
Penna(MG). distância. Mídias não são meros instru-
- Criar uma rede de organizadores cul-
mentos. Elas modificam nossa forma
turais para troca de conhecimentos,
de estar no mundo e geram novas for-
experiências e informação, já que a
mas culturais. São formas de compor-
divulgação das atividades culturais é
tamento e, portanto, de cultura”.
cada vez mais feita pela internet;
Ángel Marin: - Criar processos formativos para traba-
“Esses três temas: educação, cultura e lhar em conjunto. Um game como pla-
novas mídias são muito complexos e, taforma de colaboração, por exemplo;
tanto no Brasil como na Colômbia, há
um divórcio entre educação e cultura, - Criar o ‘horário cultural gratuito’ – TV,
principalmente no âmbito público. É rádio, celular, internet – um espaço re-
preciso atentar para os princípios da servado para a cultura. Nos moldes do
democracia, da participação cidadã e Redcult – inserções de 5 min;
fortalecer os direitos culturais. Não há
o exercício consciente dos direitos cul- - Pensar em estratégias para que a infor-
turais.Existem algumas experiências mação chegue aos agentes culturais;
que tratam de juntar esses três temas:
- A banda larga deve ser uma “obses-
educação, cultura e novas mídias.
são” para os gestores culturais;
Porém, não são os gestores culturais
- Criar nas escolas espaços de convivên-
que estão fazendo esse processo. Os
cia para a prática da arte;
gestores culturais não são uma massa
homegênea. São distintos os conheci- - Trabalhar para que os Estados criem e
mentos e o espaço da educação deve ampliem seus Fundos de Cultura;
148 • Encontros temáticos: uma proposta metodológica 1º Seminário Internacional de Gestão Cultural • 149
- Criar um Sistema Nacional de Forma-
ção de Gestores Culturais para estrei-
tar a relação entre Educação e Cultura.
ANAIS DO
As políticas sociais não dão conta dis-
so, nem as leis de incentivo. Tem que 1º SEMINÁRIO
ser através de uma política cultural;
- A formação não vem sem a informa-
ção. Um dos itens no Plano Nacional de
Cultura é: “Comunicação é Cultura”. Os
Estados devem discutir, acompanhar e
incluir o que está sendo discutido em
nível nacional. Devemos nos juntar a
uma roda que já está rodando. A partir
da discussão da TV digital, por exem-
plo. A cultura deve ser geradora de
conteúdo, que precisa ser produzido. É
preciso reivindicar esse lugar.
Edição
DUO Editorial
Coordenação Editorial
Élida Murta
Marcela de Queiroz Bertelli
Maria Helena Cunha
Transcrição
Cássia Torres
Revisão
Élida Murta
Rachel Murta
Produção Editorial
Ariel Lucas Silva
Fotografia
Tiago Lima
Design Gráfico
Daniel Patrick
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Essa publicação foi composta na fonte Franklin Gothic e suas
variações. A impressão foi executada pela Rede Editora Gráfica,
em Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil, com tiragem de 1000
exemplares, impressos em papel Polen Soft 80g,
capa em Supremo 300g, para DUO Informação e Cultura, em
novembro de 2009.
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Apoio Cultural