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HISTORIA DATEIURA UMBERTO ECO Diegso etna fisabeta Soar! Coordenacs0 eitoral ‘anna Moria onsso Colaboraramcom 3 1edaq30 Fabio Cleto Federica Mateo Projet raico Polystudlo Diagramacdo Paola Berto Pesquisa iconogatica Siva Borahes! Produgso tecnica Sergio Daniot Ccp-trasi.Catalogagaorne forte Sncicat Naconal dos Editors de i705 Tradugdo de: Storia della ruttez3 Incluibibhografia Isat 978-85-01-07864°3 uestetica Hist 2. Grovesco-Histora 3.Arte -Flesofo Hitgnia 4 Arte flsofa~ Historia Titulo cop 1ni8s eae coumniss Copyright © 2007 RCS Libr SpA, Boman Todos os cits reservados. Proce 9 eproducao amazenamento ou tansmissde de partes deste Iurovatrovés de quaisquer meios sem prévaautoiz30 por eit Diretosexclusvos desta digo reservados pelo EDITORA RECOADLTDA ua Argentina 171 Rode Janeio, RJ ~ 20921380 ~Tel:2585-2000, Ampresso nails Primera impressa0 Outubro 2007 ‘Segunda impress Fevereito 2008 IsaN 978:85-01-07864°3 PEDIDOS PELO REEMBOLSO POSTAL Colea Postal 23052 Rode Janeio,R)- 20822970 Universidade Estadual de Maringa ‘Sistema de Biblotecas - BCE i Imagem G. Canale, Borgaro Torinese SUMARIO Introdugao. capitulo! O feio no mundo classico Capitulo A paixao,a morte, Capitulo © Apocalipse, o inferno eodiabo Capitulo lv Monstros e portentos Capitulo 0 feio, o cémico, o obsceno Capitulo Vil Odiabo no mundo moderno Gpitulo vil Bruxaria, satanismo, sadismo Capitulo x Physica curiosa Capitulo x O resgate romantico do feio Um mundo dominado pelo belo? Helenismo e horror A visao pancalista do universo A dor de Cristo Martires, eremitas, penitentes O triunfo da morte Um universo de horrores Oinferno As metamorfoses do diabo Prodigios e monstros Uma estética do desmesurado Amoralizagao dos monstros As mirabilia O destino dos monstros Priapo Satiras sobre o vilao e festas carnavalescas A liberacao renascentista Acaricatura Atradicao antifeminina Maneirismo e Barroco Do Satands rebelde ao pobre Mefistofeles A demonizacao do inimigo Abruxa Satanismo, sadismo e prazer da crueldade Partos lunares e cadaveres desventrados A fisiognomonia As filosofias do feio . Feios e danados . Feios e infelizes Infelizes e doentes 43 49 56 62 3B 82 90 107 1 13 16 125 131 135 142 152 159 169 179 185 203 216 241 257 an 282 293 302 O inquietante oxi 1. Afeiura industi Torres de ferro (0 Decadentismo ea luxiria e torres de marfim do feio fulo xt ‘Avanguarda eo triunfo do feio. 1. O feio dos outros OKitsch Camp O feio dos outros, o Kitsch eo Camp 3 O feio hoje Bibliografia essencial Referencias bibliograficas das traducées utilizadas indice dos autores e outras fontes Indice dos artistas Referéncias fotograficas 3n1 333 350 365 441 443 445 447 453 Tntrodugao Prdgesad Pierro A ead Pe or aaa Peru ero a 1s testemunhos € ead pe és dos tempos. J4 com 0 feio, foi diferent Pee ea do belo; gracas a esse: Rr Re ht Pen cde meng6es parentéticas e marginais. Po a Pe ik ee Cc se poderé deduzir o gosto de determinada Pere Mec CLC) ONT ct Cd a CII er st ia cored FORINT esl ail com a historia da beleza. Antes de mais Pe eta pe Ea dba re nee renee nent Eee uN aa Apr RIN aC Nicer ics femininos pintados por Picasso e ouvisse que os visitantes os consideram DN es Pete ner ce keg femininas cujos rostos s4o semelhantes aqueles representados pelo pintor. ere tec eek ue Re desfile de moda ou um concurso de Miss Universo, nos quais veria Peer tee Ne Cun nn Pe eed teeta desse tipo nem em relacdo ao belo, nem em relacdo ao feio, pois dispomos Pe cme et tea ices oe ae ane ec atc nunc ts TO CUR ut Rl CET uC) ere uot beleza ie a ! | fental. Para as civilizacdes arcaicas € para 0s povos dito chados arqueologicos e artisticos, mas nao de im se eles eram destinados a provocar del na civilizacao ocid primitivos, dispomos de textos tedricos que informe ‘0. ou mesmo hilariedade. estético, terror sat idental, uma mascara ritual africana poderia parecer Para um o horripilante - enquanto para o nativo poderia representar uma divindade benévola. Em compensacao, para alguém pertencente a alguma religiao poderia parecer desagradavel a imagem de um Cristo e humilhado, cuja aparente feitira corporea ndo-europé flagelado, ensanguienta mosao a um cristao, as em textos posticos e filoséficos (como, inspira simpatia e No caso de out por exemplo, a indiana, a japonesa ou a chinesa), vemios imagens e formas, mas, ao traduzir tanto as paginas de literatura quanto as filoséficas, é 5 culturas, quase sempre dificil estabelecer até que ponto determinados conceitos podem ser identificados aos nossos, embora a tradicao nos tenha induzido 2 transpo-los para termos ocidentais como “belo” ou “felo’ Porém, mesmo que essas tradugdes fossem confidveis, saber que numa determinada cultura entende-se como bela uma coisa que exibe, por exemplo, porcao e harmonia nao seria um dado suficiente, O que se entende, de fato, com estes dois termos? € curso da historia es mudaram de sentido até mesmo no ocidental. Quando comparamos afirmacées ted um quadro ou uma constru cas com 40 arquitetonica da mesma época, podemos Perceber que aquilo que é proporcional em um determinado século j8 Nao 0 € no outro: falando, por exemplo, da proporcao, um filésofo medieval pensava nas dimensoes e na forma de uma catedral gética: enquanto um tedrico renascentist fa pensava em um templo quinhenti Cujas partes eram reguladas pela seco urea ~ e para os renascentistas Pareciam barbaras e, justamente, goticas’as proporcées realizadas aquelas catedrais. Os conceitos de belo e de feio so relat de bel felo s20 relativos aos varios periodos historic citar Xendfanes de Colofao Tapecarias, , 110) 0u as varias culturas e, para Clemente de Alexar segundo Se maos tivessem o bois, os Cavalos € os ledes e pudessem, 0s i F em, como os homens, desenhar e criar obras Com estas maos, semelhantes ao caval pene ; 20 cavalo, 0s cavalos desenhariam as formas cles oF erg s Semelhantes a0 boi e hes fariam corpos tais quais Na Idade Média, Jacques de Vitry bri duo, quorum prior Orientalis, si Ocidentalis istoria), ao a0 louvar a beleza de tod. Provavelmente, os ciclopes, que tém u ‘Om aqueles que tém dois, como nés nos a OU COM as criatur Hiyerosolimat r jatanae, alte obra divina, admitia que admitia que se espantam c n olho s6, ssombramos com as de trés olhos... Consideramos Mais negro € cons ard eco em Voltaire feios os etiopes siderado mais belo’ Mais tarde 10 Dicionério filosético} ladeiro belo, oto kalén. Ele com seus dois bel Negros, mas, entre eles, Perguntem a um respondera que os olhdes redondos que se SPO 0 que é a beleza,o verd, Consiste em sua fémea, ee talarga e chata,o ventre amarelo Guiné:o belo consiste para dos, no nariz achatado. destacam na cabeca pequena, 2 gargan escuro, Interroguem um negro da nos olhos enfossa tum par de chifres, quatro patas err eo dorso ele na pele negra e ol Interroguem o diabo: dira que o belo € garras e um rabo’ Jegel, em sua Estética, anota qu eae sropria esposa, pelo menos cada namorado considera bela, alias, eee 2 propria namorada;e se 0 gosto subjetivo por tal pode-se dizer que isso é uma sorte .e‘acontece que, se nao cada marido a exclusivamente bela, Beleza nao tem nenhuma regra fixa jara ambas as partes...Quve-se dizer com frequencia que Uma Beleza fadaria a um chinés ou mesmo a um hotentote, embora o eito de Beleza inteiramente diverso daquele do rmos as obras de arte dos povos nao emplo, que brotaram de sua uropéia de: chines tenha um cont negro...£,na verdade, se considerar gens de seus deuses, por fantasia como dignas de veneracao e sublimes, poderdo nos parecer idolos dos mais monstruosos, assim como sua muisica pode soar aos NOssos vidos da forma mais det Por sua vez, aqueles povos verao as nossas esculturas, pinturas e misicas como insignificantes ou feias Muitas vezes, as atribuicdes de beleza ou de felura eram devidas nao a critérios estéticos, mas a critérios politicos e sociais. Hd uma passagem de 10s econdmico-filoséficos de 1844) que recorda como a iro pode suprir a feiura:"O dinheiro, na medida em que possui a propriedade de comprar tudo, de apropriar-se de todos os objetos, é 0 objeto em sentido eminente...Logo, minha forga sera tao din grande quanto maior for a forca do meu dinheiro...0 que sou e posso ndo portanto, efetivamente determinado pela minha individualidade. Sou ' posso comprar a mais bela entre as mulheres. Logo, nao sou feio, na medida em que o efeito da feiura, seu poder desencorajador, é anulado pelo dinheiro, Sou, como individuo, manco, mas o dinheiro me da vinte € quatro pernas: donde, nao sou manco...Meu dinheiro nao transforma todas as minhas deficiéncias em seu contrério?" Ora, basta estender essa reflexao sobre o dinheiro a0 poder em geral e poderemos compreender alguns retratos de monarcas dos séculos passados, cujas feicdes foram devotadamente eternizadas por pintores cortesdos, que com certeza nao tinham nenhuma intencdo de ressaltar os seus defeitos e que talvez até tenham dado o melhor di si para suavizar seus tragos. Mesmo assim, tals personagens nos parecem, sem sombra de duvida, bastante feios mo em seu tempo); no entanto, ram ( provavelmente o eram, mesn dotados de um tal d dos de um tal carisma e de um tal fascinio devido a sua onipoténcia, Liditos os viam com olhos de adoracao, Enfim, basta ler um dos mais bi que seus los contos de ficcao cientifica contemporanea, A sentinela, de Fr Poranea, A sentinela, de Frederic Brown, para ver como a relacao entre normal e monstruoso, aceit di ‘vel e horripilante, pode ser invertida se o NOs para o monstro es Estava ens !ava ensopado e coberto de | cede de pacial ou do monstro espacial para jama,tinha fome, frio e estava a mais ns: ' J t 4s culturas (ou at tentou, desde F 30. a um modelo esta > Niet c lo dos idolos, que dida da perfeicac ‘adora lea > n delha nas coisas, consid >ma da feiura sao definidas em referéncia a um e anoga a todos os entes, como fazia Platao na F bela uma panela construida Toma: egras artesanais, ou 9, 8), para que quino (Sum de uma correta proporcao e da luminosidade ou clareza, pe e, portanto, un exibir todas e sentido, considerava felo somente aquilo que fc proporcionado, como um ser humano com uma cabeca eno! mas eram ditos feios também os seres que Tomas ino sentido de “diminuides;ou seja = como dird is falta um Guilherme de Alvernia (Tratado do bem e do mal), 205 Ait pee M im olho (ou até trés, pois € possiv ntar membro, que tém apenas um ol im defeito de integridade também por excesso). Portanto, eram mo feios os erros da natureza, que os artista snhuma compaixao ~ , para o mundo jectos formais d pernas curtissimas, definia como “torpes impiedosamente definidos co’ tantas vezes retrataram sem nef 's hibridos, que fundem inadequadamente os asp‘ animal, o% duas espécies diversas. O fei poderia, entao, ser definido simplesmente como 0 contrario do belo, mesmo um contrario que se transforma com a mudanca da idéia de ‘07 Uma historia da feidra coloca-se come contrapanto simétricc seu opost de uma historia da beleza? ra e mais completa Estética do feio, elaborada em 1853 por Karl ima analogia entre o feio eo mal moral. Como o ma A prim Rosenkrant, raca ul € o pecado se opdem ao bem, do qual sao 0 inferno, assim 0 feio € 0 inferno do belo” Rosenkrantz retoma a idéia tradicional de que 0 feio é 0 contratio do belo, uma espécie de possivel erro que o belo contém em si de modo que toda estética, como ciéncia da beleza, é obrigada a enfrentai também o conceito de feidira, Mas é justamente quando passa das definic6es abstratas para uma fenomenologia das varias encarnacdes do feio que ele nos faz entrever uma espécie de “autonomia do feio’ que o transforma em algo bem mais rico e complexo que uma série de simples negacdes das varias formas da beleza. Ele analisa minuciosamente o feio da natureza, o feio espiritual,o feio na arte (e as diversas formas de incorrecao artistica), a auséncia de forma, a assimetria, a desarmonia, o desfiguramento e a deformacao (o mesquinho, 0 débil, o vil, o banal, o casual e 0 arbitrario, o tosco), as varias formas de repugnante (0 desajeitado, o morto e o vazio, o horrendo, o insosso, 0 nauseabundo, 0 criminoso, o espectral, o demoniaco, 0 feiticeiresco, 0 satanico),|sso tudo é demais para que se continue a dizer que 0 feio 6 0 simples oposto do belo, entendido como harmonia, propor¢ao ou integridade. Se examinarmos os sindnimos de belo e feio, veremos que, enquanto se considera belo aquilo que é bonito, gracioso, prazenteiro, atraente, ieee een en ,, , , ‘pcional, fabuloso, Saeelig fen teansae ae apreciével, espetacular, asqueroso, desagradavel, fates com hae er indecente, imundo, SUjO, oe en ie Spee ee eae ‘monstruoso, horrivel, hérrido, ee Renee or ucmenda, Retiteee ee terrivel, terrificante, nauseabunde,étido, apavorante,ignob decgre ee ee , fe, ndbil, desgracioso, desprezivel, pesado, falar das formas ignados ) magico, enquanto para todos os ciagao mpre uma no hot nos animal a determinada >mo expressivos a undo’ desejavel: bast de alegria do glutao diant 20 estético, mas an semelha aos gru > aos arrotos emitid em algumas civi para rr F aprovacao depois de uma refeicao (embora nestes casos de etiqueta).£m geral, em todo caso, parece que a ex lo provoca aquilo que Kant (Critica do juizo) definia como s desejo de possuir tudo aquilo que gradavel ou de participar de tudo aquilo que n s parece bom, © juizo de gosto diante da visa de uma flor provoca um prazer do qual se qualqu ej de posse ou de consumo. Nesse sentido, alguns filésofos erguntaram-se se é possivel pronunciar um juizo estético de feitira, v to que 0 feio provo: a reacdes passionais, ersao descrita por Darwin. Na verdade, deveriamos, no curso de nossa historia, distinguir as manifestacdes do feio em si (um excremento, uma carcaca em decomposicao, um ser coberto de chag s emanando um cheiro Nauseabundo) daquelas do feio forme ou seja, desequilibrio na relacao organica entre as partes de um todo. Imaginemos encontrar na rua alguém com a boca desdentada: 0 que nos perturba nao ¢ a forma dos labios ou dos poucos dentes restantes, mas 0 fato de os dentes nao estarem acompanhados dos outros que deveriam estar naquela boca. Nao conhecemos a pessoa, aquela feitira nao nos envolve passionalmente e, no entanto - diante da incoeré incompletude daquele conjunto -, nos sentir a ou autorizados a dizer que aquele rosto ¢ feio. Por isso, uma coisa é reagir passionalmente ao nojo provocado por um inseto pe ajoso ou uma fruta apodrecida, outra é dizer que uma pessoa é desproporcional ou um retrato ¢ feio no sentid jlo em que & malfeito (0 feio artistico ¢ um feio formal). e todas as teor' im lembrar que quase conhecido que sos dias, tém re uma representacao feio artistico,é 10s da Grécia aos no: + redimida po! ‘a, 14480) fala da possibilidade epelente e Plutarce a de feiuira pode a tria aquilo que tistica, 0 feio imitado yesenta¢so a na represe f je beleza da uma reverberagao di gis poetis) diz qu .cebe como que menos diversos:o feio em si, 0 feio formal mbos.O que devemos ter quase sempre, serd possivel int iros tipos de feitira com ente a0 folhear as paginas deste livro é qu Jo terceiro tipo muitos equivocos, Na Idade Média, ‘omna-se bela cul dois prim im determina\ as em testemunho! aio diia que a imagem do diabo t 3s seria isso mesmo que os fiéis ma sua feitira Mee nas de inauditos tormentos infernais nos ais jas? Nao reagiam, talvez, com terror e angustia ‘omo uma feiura do primeito tipo, enregelante e 19 a para nds a visio de um réptil que nos ameaca? v Joricos no consideram intimeras varidveis individuais, iiossincrasias e comportamentos desviantes. Se é verdade que a experiéncia da bele ica uma contemplacao desinteressada, um scente perturbado pode, no entanto, ter uma reacao passional diante 4a Venus de Milo. mesmo vale para o feio: uma crianga pode sonhar d ite, aterrorizada, com a bruxa que viu no livro de fabulas e que, para seus outros coetaneos, era apenas uma imagem divertida. Provavelmente vitos contemporaneos de Rembrandt, em vez de apreciar a mestria com cionado na mesa de dissecacao, \daver fosse verdadeiro ~ assim ardeio talvez nao possa olhar Guernica de sado, revivendo o terror de sua que ele representava um cadaver si podi 10 de modo esteticamente desintere Dai a prudéncia com que devemo p prudéng que devemos nos preparar para prosseguir esta nossa historia da feiura, em suas variedades, em suas multiplas declinacdes,na diversida le de reacdes que suas varias formas estimulam, s,uanees comportamentas com que se reage a elas. Considerando, a ad quando tinham razdo as bruxas que, no primeiro ato de Macbeth, gritam: "Belo é feio, feio é belo, etd Lh eel eo Cu cet Lint Ter ee eee essere iy eee peheatanoL er rT ea ae todos 0s seres que no encamavam tals proporcées fossem vistos conio Cee Ue a O ideal grego da perfeicao era representado pela kallokagathla, termo que nasce da unido de kdilos (genericamente traduzido como“belo") Ni ee au ee Lor ea ee ae ee uma série de valores positivos). Observou-se que'a virtude de ser kalos ea Se tenet eee bchterneaieneieline seats ec eT at eee ae digno, de coragem, estilo, habilidade e conclamadas virtudes esportivas, Miilheteha aC ee ei ae eee literatura sobre a relacéo entre feldia fisca e feidra moral. eta de cosas fess Pago VV 30) Parti 0 3 apts do bel, do hom dane Si spore a do TE supoes igualmente e de todos howem, independ de is € de aus qe so como 6m om ms de home de fogo ov te sMSobre esas cosas, Parménides muita veres duvidel se deveriamos Consideri-las como as precedentes OY yma forma em issn por a tens centeza 3 ree de og Pe 2 of ‘qualquer outra coisa desprovida de Cum, ante que xe ar xu das ua forma separa, qe € por ter, versa dao qv cas com 35 = Oh, no. creo que tis coisas, assim ‘como as vers, asim elas io, Acreditar ‘que existe uma forma separada de cad tia dels seri, eu temo, demasiado ose tee dC) prazer ma fea, Nio poderiamos ¢, através da experiéncia de diversas belezas, tenta alcancar a 'o.em Si, da Beleza hiperurania, da Beleza como Idéia amor pelos jovens ao qual Sécrates se dedica, o que lo Alcebiades, ja bel ta-se aqui de itrompe no banquete doria de Socrates, Ihe partilhar da sab ido o pro Enesse contexto que Alcebiad © famoso elogio da aparente feitira m0 aspecto externo de um sileno, mas que Sconde uma profunda beleza interior crates, que t sob estes nico dislogo o n-se diversas idéias de 9 esquema simplist plica. Ea civilizag 640, como se in a feitira como oposto da 20 grega sempre esteve conscienté Te do elogio, mais tardio, de um outro ser oo.mas de alma nobre e rico de sabedoria, Esopo, ee TTersites Home ‘ada, M, 1BISs mes fe Dos cert (se. Ka) peito arcade giboso, ¢ inha 0 pe sntuda cabeca umas faltipas; Sch npre a Ulisses € 0 Pelides, Monta verope Esopo, 0 feio Romance de Bsapo 1 (36. LID ‘ Paap. o grande benfetor da humanid ‘hols, foi esravo por condicio, mas na Fri Je nascimento figio de Ame C), nojente = eS ee repeleme 3 Cin a eabeva pontagn Sais alvaceo,Paixinho, com pes Shor, bragoscurtos, vesgo, beicud if ainda mais grave Ademais - deficienc 1 deformicade -,nilo possuia o dom que di palavra, alem de ser gago e totalmente Socrates como Sileno Plato (sée. VV aC) Digo, com efeito, que ele (Socrates) se muitissimo com aqueles silenos parece muitssimo x sxpostos nas oficinas dos escultores, que fgutas na mao e que, quando aber meio, evelam em seu interior efigies cle Aero oe po, Mas 0 mundo grego foi atravessado também por outras contradicOes. ago velo an Na Repablica, considerando que o feio como falta de harmonia é o 1630-168; tes contrario da bondade de espirito, Platao recomendava que se evitasse a jee representacao das coisas feias para os muito jovens, mas admitia que, no fundo,existiria um grau de beleza préprio a todas as coisas, na medida em que se adequassem a idéia que Ihes correspondia; portanto, pode-se dizer que ¢ bela uma jovem, uma jumenta, uma panela, cada uma dessas oisas sendo, no entanto, feia em relacao a precedente, Arist6teles,na Postica,ratificava um principio que seria universalmente aceito no decorrer dos séculos, ou seja, de que se podem imitar belamente a8 coisas felas - e desde as origens, admirava-se o modo como Homero havia bem representado a fealdade fisica e moral de Tersites. Enfim, vejamos como, mais tarde,em ambiente estdico, Marco Aurélio reconhece que também o feio, também as imperfeicoes, tais como as rachaduras na crosta de um po, contribuem para a atratividade do todo. Princo este que (como veremos no préximo capitulo) domina a visio Patistica e escolstica, nas quais ofeio é redimido pelo contexto € Contribui para a harmonia do universo, Imitar belamente r 2, Helenismo e horror so grego era obcecedo por muitos tipos de felira e maldade, Nao O mundo oe terse a oposicao entre apolineo e dionisiaco: embora nos ilenos ébrios e comicamente repugnantes, la proeza a resistencia de é necessario reme r cortejos de Baco aparecam s justamente no Banquete elogi Sécrates as mais generosas libagoes. Perm: de ambiguidade a respeito do papel da musica, que estimula paixoc da a estética pitagorica vé a musica como aquilo que realiza as leis fa harmonia. ja-se como uma bel janece, no maximo, uma sombra ideais, as regras matematicas da proporcao ed {as zonas subterraneas onde sao ‘omo Ulisses e Enéas) aventuram-se Na cultura grega restam, porém praticados os Mistérios e os herdis (c has névoas sinistras do Hades, do qual Hesiodo ja nos contava os horrores. ‘A mitologia cléssica é um catdlogo de inenarrdveis crueldades: Saturno ddevora os proprios filhos; Medéia os massacra para vingar-se do marido infiel;Tantalo cozinha ofilho Pélops e serve sua carne aos deuses para desafiar sua perspicdcia; Agamemnon nao hesita em sacrificar sua filha figGnia para agradar aos deuses; Atreu oferece a Tiestes a carne de seus filhos; Egisto mata Agamemnon para roubar-lhe a esposa Clitemnestra, que sera morta por seu filho Orestes; Edipo, embora nao 0 soubesse, comete tanto parricidio, quanto incesto...£ um mundo dominado pelo mal, no qual as criaturas, mesmo as belissimas, realizam ac6es ‘feiamente” atrozes. Neste universo, vagam seres assustadores, odiosos por serem hibridos que violam as leis das formas naturais: ver,em Homero, as Sereias (que nao. cauda de peixe, mas aves de rapina), Cila e Caribdis, Polifemo, a Quimera} em Virgilio, Cérbero e as Harpias, e iqualmente as Gorgones (com a cabeca erigada de serpentes e as patas de javali),a Esfinge, de rosto humano sobre poset enue es da kallokagathia, foram inspirados também por pei ifestacoes do horrendo, de Dante aos nossos dias. Tanto é stv eapeptsreia ela oer em paginas como as de Clemente Al ae sce cma lexandrino ¢ Isidoro de Sevilha, as monstruosidades descritas pelos anti a ntigos para a falsidade irae i90s para demonstrar a falsidad um corpo leonino, as Eri © Minotauro, posteros fanta I ne [As Sereias Homero (séc. aC) ‘dessa, XI, 2545 Has de as Sereias Primero deparar, cuja harmon bementa € Fascia OS ‘Quem se apropingua esto CGpost e fics nao regoziar nos doces lates (Que a vocal melodia de buman feunes, Surde avante: As orelhas dos teus com cera tapes Ensurdegam de todo. ‘Ouvias pores, Gontanto que do mastro ao longo estas de pes e mios atad te se, absorvido no prazet, fordenares que te sok, mais forga Liguemze ca (0 companhetos Dal pass 1 via note aponto Que te cumpre seguir tu mesmo a escolas, 15 dots penedos, que os Supremes chamar Errantes, onde fremem de Anfite Ondas azuis As Harpias| Visio (sé. 12.6) Breida, I, 219-222, 25-229 has do grande Jonio, em grego Stotades, Nas prs me receber nests ilhas Mora a cruel Celeno e as mais Harpias Monstro maior, em divinal Nagel, Nem peste mais vor brotou di Exige Tem laxo imundo vente Aves nojoss, ‘com divinos rcsts, Magros,palidos sempre Cila © Caribalis Homero (séc. 1K a.¢) diss. XU, 62.67 Onde a lar se aloja 0 monsero Gi, Como tenrinhos cies, Dox proprios deus pemas doze informe: Dentug ‘os colmilhos cheios De negra morte Polifemo Homero (séc. XG. Oidisseia, IS, 111-143, 218-2: 290300 Seus rebanhos ali desconversivel Gigante pustorava, em separado, do $6 consigo maldades ramina Eko, sevo ¢ em silencio, a dois agar No chio como uns clezinhos fos machuca Eo eérebto no chio corre espargido, Eos membros 135 hes devora tudo, Fibra, enfranha, oss mole ou medulosc Qual farinto leto: chorando, as palmas, Em desespero e grita, a Jove algamos. Pleno de humanas carnes © amplo vente, Leite bebe 0 Ciclope a grandes sores, Eentre as ovelhas na cavern estira-se oO E ressupino eal ¢, a cervig grossa, dobranido, a0 sono domador se rende A jimpar na embriague7, ressona € arrou, Vomita 0 vinho came humana em postas ( Cérbero Virgilio (sée. 1.6) Breida, V1, 426-433 om trifauce ltr Getbero ingente Deitado em cova oposta, Seus serpentinos colos Langathe a vate Lum Sonorento bolo De mel ¢ confecoes que, a8 tr gangantas| Eseachando glutio, raivoso engole, E,05 costados em t etorpecide Por toda a gruta 0 corpo enorme esta Gustave Moreau, Aquimera 1867, Cambridge (Mas. Fogg Are Museum pdginasseguntes John Wiliam Waterhouse, Uisses eas sereias 891, Melbourne, National Gallery 0s infernos Hesiodo (sée. VIL aC.) Teogoniia, 736-773 Trata-se ¢ 1m local tetro, esqul até mesmo os deuses odeiam, E uma chegaras a tocar seu fundo, pois ante i para cd sem te conceder respito (.) Lit esta a horrenda casa da tenebrosa Noite, coberta de lividas nuvens. Antes dlesta, bem plantado sobre as pera, filho de Japeto rege firmemente 0 amplo ‘céu com a cabega © com as mios Bem naquele ponto, Noite e Hemera cencontrando-se, trocam siudagdes na hora fem que — uma para stir € outra para das juntas contemporaneamente, mas sempre uma dekas, do lid de fora, vai percorrendo a terra, enquant dentro, fica a espera de que surf, agort para ela, o momento de sain. Uma leva aos Terestres a Juz que a tudo ilumina; a sua vez, a fosea Noite com seu outea, pe rmanto de densa caligem, cartega nos bragos Hipno, iio de Tanatos, ©.) Hélio, 0 esplendente, nunca os no céu, nem quando dele a primeiro, pkicido e grato aos homens, gira sobre a terra € sobre a vasta extensio do man, © outro, a0 contro, tem um bronze no peito: arrebata os homens para rio mais deixa-los até mesmo dos deuses imortais € inimigo, Embaixo, mais adiante, ergue-se a ribombante morada do deus subterrinec r possante Hades ¢ da assustadora Cre eee core Cea cet ney Peetu eet cre) CSC oe Bun OO Mt eee ny Dees Cea eee ed Pe tn cues ee eacie e eane CCC Rui ee CM et eeu ee ot BUS OeCac cicero Dc oe kee ce SOE A Rc ae ee SCG ee Ne com 0 mundo ciistéo: de um ponto de vista teolégico-metafisico, todo OS a ae ee uc enue COE a ae eee ake ae oe Ro TE CMe eke et atc OTe uC es Dr We te Oe cy na beleza de todo o ser. Com o Génesis, eles aprendiam que, ao final do sexto dia,"Deus viu tudo o que tinha feito, e era muito bom’ (1,31), Ce eae tr eee) DO RS ea ee acy Dee Oe ees ee eRe ee Coenen ee ee Eu re ay conceito de origem platénica e Calcidio (século IV d.C), em seu Comentario ao Timeu, falava do“espléndido mundo dos seres gerados... Cee cso influenciada por uma obra de cunho mentario aos nomes divinos, do pseudo- 10 inexausta irradiagag universo aparece com jionisio Areopagita. Aqui o univ i rd Priel na grandiosa manifestacdo da difusividade da beleza le esplendores, uma gf : ae eas ma cascata ofuscante de luzes: 0 Belo supra-substancial primeira, uma c tir dele, dissemina-se causa da Beleza que,a par eee a jedida. Ela € causa da harmonia ‘Aldade Média seré muito neoplatdnico (século V), 0 Con d undo a propria m entre todos os seres, segun fa ren e do esplendor de todas as coisas, e expande sobre cada uma, sob a forma de fulgidissima luz, as efusdes de seu raio manancial que as fazem belas, chama a si todas as coisas, e portanto é justamente denominada Beleza recolhendo em si mesma tudo em tudo” (Nomes divinos, IV, 7, 135) No rastro do Areopagita, Escoto Eriugena (séc. IX) vai elaborar uma concep¢ao do cosmo como revelacao de Deus e de sua beleza inefavel através das belezas ideais e corporais;e se difundira sobre a venustidade de toda a criacao, das coisas semelhantes e das dessemelhantes, da harmonia dos géneros e das formas, das ordens diferentes de causas substanciais e acidentais compreendidas em maravilhosa unidade (Adivisao da natureza, 3).£ nao ha autor medieval que ndo retorne a este tema da pankalia, ou beleza, de todo o universo. Para uma identificacao tradicional de Belo e Bom, dizer que todo o Universo era belo signifcava dizer que também era bom ~ e vice-versa Como concilar esta persuasio pancalista com o fato evidente de que existem no universo 0 Mal e a deformidade? A solucao foi antecipada por Santo Agostinho, que fez da justificacao do Mal em um mundo criado por Deus um de seus temas fundamentais 'No Sobre a ordem, Agostinho argumentava que haveria, é verdade, condenado ha de estar em meio ‘antos milhées de outros danado pelo fedor que exalam. (. Mais Penam (digo) pelo fedor, pelos gritos & pelo apemto, pois estario no inferno uum sobre o outro, come welhas amontoadas 2s em tempo de invemno (..) Donwle, viri depois a pena da imobilidade (..) De moxk que © dank inferno no dia fia ficar sem mudar de lugar e sem poder mover nem tum pé, nem uma flo, enquanto Deus for Deus. Seri acormentado 0 ouvido com gritos ontinuos « prantos dos pobres lama ertanga que chora? Miseros que tendo de ouvir danad continuamente para tox a redores! Seri com a fome; 0 danado Mas iio tees nunca wma migalha de pac er também wm sede tal que 10 Ihe bastara tox a gua do mar mas dele ndo teri uma gota sequer uma gota era 0 que Epubio. imp) YA pena que mais atormenta os do sentidos do condenado € 0 f inferno, que atormenta 0 tato (..) Também nesta terra a pena do fogo granule 4 diferenga entre 0 noss Fogo € aquele do infer que S Agostinho diz que 0 nosso parece pintado (.. De modo que 0 misero seri crcundado pelo f uma acha dentro da fornalha. 0 danado tera um abismo de foge ahuixo dele, um abismo acima © um abismo a0 redor. Se ele ta, ¥8, ou respira, ilo toca, nio vee nem respira outa coisa sendo fog Estar no fogo con ms RO como peixe na agua Mas este fogo nio estara somente 10 redor do danado, mas entrar também em suas visceras para de moo cerebro dent da abe, oa dentro das ossos: cada danado fornalha de fogo (..) Se o infer Se etemo, no sera infer A pena que no chia muito nao ¢ vuma grande pena, De um enferme corse um apostema, de ui out se queima uma sgangrena, a dor ¢ grande, mas como acab es pouco, mio € grande o Mas que pena sera, cou aquela operigio de ccontinuasse por uma. sen 5 fam mes intro? Quand e bastante long toma doe nds Othos, uma dor ‘edema, torna-se insuportivel, Mas por que flo dle dor? Mes Comedia, uma musica que dr demas ou seguisse 0 dia i indo se poderia suportar pelo ted E se durasse um més? Um ano? 0 que seri o infermo? E onde nio se fouve sempre a mesma comécia ow de no hi Pee T Cs Gs ou fan Oe ea sears ere Inferno moderno Jean-Paul Sar Entre quatro par * INES ~ (Othe para ele sem mi A (Pawsa) Calma! Ji entendo.. ja Luca de Lida tiptico do Juleo Fino detalhe 1527, Leiden, Musée Municipal de akenhal eentendi porque nos botarsm juntos. GARCIN ~ Cuidado com 0 que Vai INES — Voce vai ver que idiotice Idiota como uma floe! Nao tem tomura fisica, no € verdadk? E, no de ser castigado, né? Ninguém vem fim, 56 nds, juntos, nao € iss £ dl ato que esti faltando alguem aqui GARCIN = CA mela 102) E, eu se pessoal, isso. S’0 08 proprios clientes que fazem 0 servigo, com ESTEE ~ 0 querendo dizer? Mas o inferno serd uma obsessio nos séculos sucessivos e nos sermoes ‘quaresmais barrocos (ver Marchelli e Santo Alfonso Maria de’ Liguori) fie! é aterrorizado por uma descrigao dos tormentos infernais que supera a violencia dantesca, mesmo porque nao é redimida pelo sopro da arte. A idéia do inferno retorna até em uma perspectiva existencialista e atéia quando, nos dias atuais, Sartre encena um inferno contemporaneo, em sua peca Entre quatro paredes: se somos definidos pelos Outros quando estamos vivos, por seu olhar impiedoso que revela a nossa feitira ou a nossa vergonha, ainda podemos nos iludir com a possibilidade de que esses outros nao nos ‘vejam como somos. No inferno sartriano (um quarto de hotel de luz sempre acesa e porta fechada, no qual és pessoas que nunca tinham se visto antes, terdo de conviver eternamente),a0 contratio, ndo se pode escapar do olhar do Outro e vive-se apenas de seu desprezo. Um dos personagens grita: “Abram, abram, vamos! Eu aceito tudo: as botinadas, os ferros,o chumbo quente,(..) quero sofrer para valer..” Mas em vao:”..fornalhas, grelhas...Ah que piada. Nao precisa de nada disso:0 inferno sao 0s Outros” 3. As metamorfoses do diabo No centro do inferno reina Lucifer, ou Satanas, se preferirmos. Mas Sata, -avam presentes anteriormente. Existiam en diversas culturas varios tipos de deménios, como seres intermediarios que as vezes sao benévolos e as vezes malévolos (embora no Apocalipse também 0s ‘anjos” sejam coadjuvantes tanto de Deus, quanto do aspecto monstruoso: no Egito o 0 diabo, o deménio ja est deménio) e, quando malévolos, de monstro Ammut, hibrido de crocodilo, leopardo e hipopétamo, devora 0s condenados no além-tumulo; existem seres de feigOes bestiais na cultura mesopotamica; em varias formas de religiao dualista existe um Principio do Mal que se opée ao Principio do Bem. Ha o diabo como Al-Saitan na cultura islamica, descrito com atributos animalescos, assim como existem varios deménios tentadores, os gul, que assumem 0 aspecto de mulheres belissimas, Quanto & cultura hebraica, que influencia diretamente a crista, € 0 diabo, assumindo a forma de serpente, quem tenta Eva no Génesis e na tradicao, interpretando alguns textos biblicos que parecem se referir a outra coisa, como em Isaias e Ezequiel, ele estava presente no inicio do mundo como © Anjo Rebelde que Deus precipitou ao inferno. Sempre na Biblia, encontramos meng6es a Lilith, monstro feminino de origem babilénica que, na tradicao hebraica, transforma-se em deménio feminino com rosto de mulher, jongos cabelos e asas e que era vista, na tradicao cabalistica (0 alfabeto de Ben-Sira, séc VIl1X), como a primeira mulher de Adao que depois se transformou em deménio. Mas pode-se acrescentar também o dem6nio do meio-dia do Salmo 91, que aparece inicialmente como anjo exterminador, mas na tradi¢ao monastica se transforma em tentador da carne, e as numerosas alusoes a Satanas em varias passagens, onde ele vai aparecendo como 0 Caluniador, © Opositor, como aquele que insta para que Deus ponha J6 a prova, como © Asmodeu em Tobias. a Sabedoria (2.23-24) dird:"Deus criou o homem para a incorruptibilidade e 0 fez imagem de sua propria natureza; foi por inveja do diabo que a morte entrou no mundo. Nos Evangelhos, 0 diabo nunca é descrito, salvo pelos efeitos que provoca, ‘mas, além de tentar Jesus, ele é expulso varias vezes do corpo dos endemoniados, é citado pelo proprio Cristo e & definido de forma variada como 0 Maligno,o Inimigo, Belzebu, o Mentiroso,o Principe deste mundo. acter, rex Alone, A queda dor i sais, 14:1 sencesor rolocaret me Batalh Ipocalipse Um sinal entre Miguel € 0 Dr: Parece ébvio, também por motivos tradicionais, que 0 diabo deve ser feio. Ele jé é evocado assim por S80 Pedro ("Irméos, sede sobrios & Vigilantes! Eis que 0 vosso adversario,o diabo, vos rodeia como um leao a rugir, procurando a quem devorar’) € é descrito na forma de varios ‘animais nas vidas dos eremitas. Em um crescendo de feiuira, invade pouco a pouco a literatura patristica e medieval, sobretudo aquela de cardter devocional 0 diabo aparece para Rodolfo, 0 Glabro; bandos de diabos aparecem em narrativas de viagens a paises exdticos, como em Mandeville, ¢ por varios séculos circulam lendas pias sobre o "pacto com 0 diabo": 0 diabo tenta 0 bom cristao e 0 faz firmar um pacto, que hoje diriamos faustiano, ‘mas geralmente 0 cristo consegue escapar de suas armadilhas no final A lenda medieval de Cipriano também fala de um pacto com o diabo: um jovem pagao vende a prépria alma ao deménio para possuir a jovem ‘amada, Justina, mas,finalmente, tocado pela fé da donzela, se converte € ruma junto com ela para 0 sacrificio. O tema sera retomado em seguida por Calderén de la Barca, em seu O magico prodigioso (1637). Mas uma das verses populares de maior sucesso desde os primeiros séculos cristaos foi a Lenda de Teofilo: o protagonista, diacono na Cilicia, caluniado junto 20 bispo, é privado de sua dignidade. Para recuperé-la, Teofilo encontra 0 Diabo gragas ajuda de um magico judeu; ele Ihe pede que venda sua alma e renegue Cristo e a Virgem. Firmado 0 pacto, Teéfilo recupera 0 posto, mas depois de sete anos vivides como pecador se arrepende, implora durante quarenta dias 4 Virgem, que intercede junto a seu filho e consegue reaver 0 pergaminho fatal, festituindo-o a Teofilo, que o queima e da testemunho. Ppuiblico de seu erro e do milagre. Alenda de Teofilo pode ser encontrada em Paolo Diacono, no Speculum Historiale de Vincent de Beauvais, na Lenda durea de Jacques de Voragine, em um poema de Roswita, em Rutebeuf e na literatura inglesa © espanhola ~ pata nao falar de seu retorno no Fausto goethiano. Uma das mais eficazes representagdes do milagre de Te6filo pode ser vista no timpano da igreja romanica de Souillac, com uma sequiéncia de imagens (definida como antecipadora dos quadrinhos) que acompanha o desenvolvimento da histéria: embaixo, a esquerda, © diabo estende 0 pergaminho a Teofilo, direita, o didcono assina © no alto aparece a Virgem que desce do céu para retomar o documento do diabo, Nesta escultura, 0 diabo ja aparece feio, periodo, ainda nao é representado em t mas, segundo as imagens desse toda a sua feilira,e num mosaico de S. Apollinate Nuovo, em Ravena, datado de cerca de 520, ele é fepresentado como um anjo vermetho,€ somente a partir do século XI ue ele comeca a aparecer como um monstro dotado de cauda, orelhas animalescas, barbicha caprina, artelh também asas de morcego. 105, patas e chifres, adquirindo padre Teil faz lumpactocomo diabo, sex, Timpano de Soullac Acta sanctorium Truculento ertivel de Forma, grande de cabs de prescogc macilento de squilido de bacha, peludo nas orelha ke fronte sinistro de olhos, fetido de boca, eqtino de dentes, lancando chamas da boca, turvo nas goelas, amplo de libio, espaventas de boca, saliente de peito, eseabroso de cealeanhar. Rodolfo, © Glabro € 0 diabo Rodolfo, o Glabro (sée, XXD Gronicas, V Fatos do por vontade de Deus, ustamente comigo, tempos até hem recentes. Quando residia no monasterio do, Beate Leodegitio, em Champeaux, uma noite antes da hora das matinas, apareceu-me a0 pé do leito uma figura de homtnculo de aspecto tenebroso. No que me fot passivel ddistinguir,tinha modesta estatura, pescogo. fino, rosto chupado, olhos nigerrimos, fronte encrespada de ru boca protuberante, labios inchados, queixo Jo, barba caprina, orelhas estreito € 3. AS METAMORFOSES 00 DIABO hirsuta © pontiagudas, cabelos hittos e desgrenhiados, dentadkira canina, ern alongado, peito saliente, dorso coreunda nidegas que balangavam, roupas suas; cestavi apressado e com todo © corpo em agitagio, Agarrou uma ponta do colchio de palha onde eu estava e sacuch a cama com terrivel violencia; depois falou: “Ta rio ficaris mais neste local” Ao despertar sobressaltado, como agontece 3 Yezes por ‘causa do susto, vio ser que descrevi Rilhando os dentes, repetiy varias vezes: io fiearis mais aqui.” Precipitadamente pale da cama e corn pe de, jogandorme aos pes do aar do sntisimo pai Benedito, fiquet por longo: tempo aterrorizado, Tentava trazer a meméria com a maxima atengao todos os mal los € as culpas graves que voluntariamente o por descuid, tinha comeaido desde a infincia, E como nem 1 de Deus tinhat alguma vee me induzido a penitencia ow 1 reparagao de tudo isso, jazia dolente € desvanecido ¢ nao me vinha nada de melhor a dizer que estas simples palavras: Senhor Jesus, que vieste para a sl dos pecadores, em virude da tua imens misericordia, tem piedade de min! As tentagdes de Santo Ant6nio " sat > dent nt s poderes contra rio da duracdo Cristo" assim que AniSnio 7 Fo loca enc pO por uma chicotada : O éxtase da tortura ‘ ’ a : » fac No mei do pio, em pen» : : painter con pean se © diabo em toda a sua monstruosidade nao apenas impera,aterrador ! cad chicotada tok mene em miniaturas e afrescos, mas ja tinha sido evocado vividamente nos ta bem pod ane Ssmohmino.cveis, relatos das tentagoes sofridas pelos eremitas (ver por exemple, a Vida de * o data, frente frente, 4 wa visa, Pracotee Santo Anténio de Atandsio de Alexandria). Nesses textos, ele assume mend aoe tes : ore arb também o aspecto convidativo de jovenzinhos amb/guos ou prostitutas impudentes,a tal ponto que, nos tempos modernos, entre romantismo wiravolta quase blasfematoria do tema feidra do diabo tentador ea Jora do diabo e os langores e decadentismo, tem lugar uma re\ da tentacao, destacando-se, mais do que a oe Mates forca do eremita que resiste,a imagem ten wwe do tentado (como em Flaubert, por exempl wa 6S Sar da esquerda para ‘Abracay, Blzebuth, a, Deus Haborym, de Colin de Pancy, Dictonnare infernal Paes lon 1863, principe dos demenies Silogeu fantasmagorico de todas as feidras diabdlicas, o Baldus (1517), escrito por Te6filo Folengo sob 0 pseudénimo de Merlin Cocai, é um Poema herdico-cémico grotesco, galhofeiro e goliardesco, a0 mesmo tempo parddia da Comedia dantesca e antecipacao do Gargantua ‘abelaisiano, do qual infelizmente é impossivel dar um exemplo antol6gico, pois ou é saboreado em seu latim macarrénico ou, traduzido, Perde todo o sabor. Entre as varias e picarescas aventuras do protagonista ge Seus amigos encontra-se, no livro 19, a batalha contra uma grande Hi ms SRE eens Por uma colagem de formas animalescas: Toros aan ig Us0s€ porcos com chifres, mastins de trés pernas, pied Fbbes nae cabes#8 de Gigante com focinhos de lobo, micos, sib oes, Pabuinos, grifos metade ledo e aguia, metade dragao, corujées com partes de mi ; lorcego, monstros com bicos de mocho e bracos Mas a moral dessa batalha diabo nao € derrotado, poi sobretudo na ambicao dos Dimensdes do diabo Em seus escritos, Lutero ird identificar muitas vezes 0 pontifice romano tanto com 0 diabo quanto com o Anticristo. Lutero obcecado pelo diabo e a lenda reza que, em uma de suas aparic6es, ele 0 expulsou jogando-lhe um tinteiro. Mas mesmo sem a lenda, em suas Conversas mesa aparecem invectivas deste tipo: “Muitas vezes expulso 0 diabo com um peido. Quando me tenta com pecados tolos, digo-Ihe: Diabo, ontem mesmo eu te mandei um peido: colocaste na conta?” (122). Ou entao: “Quando acordo, eis que logo chega o diabo e disputa comigo até que eu Ihe diga: ora, vem lamber meu cu... Porque ele nos atormenta antes de mais nada com a diivida. Em compensacao, temos o tesouro da Palavra. Deus seja louvado" (141). Contudo, jd em Lutero e em seguida na tradicao protestante ganha espaco uma concepcao (que nao sera partilhada pelos fandticos protestantes que, mais tarde, darao inicio a persequi¢ao de feiticeiras e feiticeiros suspeitos de terem feito pactos com 0 deménio, como veremos no cap. Vil) segundo a qual o diabo identifica-se com os vicios dos quais se torna simbolo. De fato, a maior coletanea demonoldgica publicada em ambito protestante, 0 Theatrum diabolorum (1569), um grande volume de cerca de setecentas paginas, aborda todos os aspectos da demonologia (calcula-se até mesmo que o ntimero dos diabos ¢ 2,665.866.746.664), porém nao nomeia os diabos tradicionais, mas os diabos da blasfémia, da danca, da luxtria, da caca, da bebida, da tirania, da preguica, do orgulho ou dos jogos de azar. —_ Enquanto tem inicio a reforma protestante, morre Hieronymus Bosch, cujos seres infernais sao hibridos que fazem pensar nas colagens diabdlicas do Baldus, mas estdo muito distantes da iconografia precedente. Nao nascem da mist acos de animais conhecidos, mas tem uma autonomia oriunda de pesadelos e nao se sabe se vém do abismo ou vagam, observados, em nosso mundo. As criaturas que assediam o eremita no fentacoes de Santo Anténio nao sa0 os deménios da tradicao, maus demais para serem levados a sério. Quase divertidos, como ersonagens carnavalescos, eles sao bem mais insinuantes. A respeito de Bosch, falou-se, ndo por acaso, de “demoniaco na arte’ de fermentos heréticos, de apelos ao mundo do inconsciente, alusdes alquimicas e antecipacoes do surrealismo, Antoni de se ad Artaud refere-se a ele no contexto teatro da crueldade” como um dos artistas que souberam reve ado obscuro de nossa psique. Bosch era membro de uma Confraternidad de Nossa Senhora, de espitito conservad 0 lor, mas voltada para uma reforma mes, de modo que suas representagoes fazem pensar antes em {ime série de alegorias moralizantes sobre a decadéncia daquela época licias ou em O carro de feno, nao temos apenas visoes ulftireas do além, mas também enas aparentemente delicadas, sensuais rivelmente inquietantes, do mundo dos prazeres tetrenos que ha de nos levar ao que ha de nos levar ao inferno. Bosch parece quase antecipar 0 rum diab espirito do The diabos lorum:o que oferece nao sao visoes do: existentes, mas antes imagens dos vicios da sociedade em que vivia Cy on con PP Cod © mundo cléssico era muito sensivel aos portentos ou prodigios, que CEU eae ee ee recur Cee Uta ec a nC UCR Ree ee ene RC no Livro dos prodigios de Giulio Ossequente (que, no século IV d.C,,anota Ree ee ees Seu ae ees et eo nu ee kee kau UC Pees Meet hae ur ae een aula que sobre as mesmas bases tenham sido concebidos, pelo menos em Pe une tr ace Pen card Ceo ues ec Merc RUE Cit) Re ete eee eau cute eC eS ee ae) crocodilo, mas que passou para a tradicéo como 0 Leviat. Ctésias de Cnido CO Cra CUO UC eC Murer coe Ree) Bo ee a aR a Cen ee Me he ee Rear Pree et Ske ee ee Re ned Doe OCT er eRe Oe nee ear ry COUN eae ee Cn eee mete Oe eerie ce ued cs Dt eer CME ee eed Do ance cue tt ee cue eet han UT Neen Me au MRM Cees Paes furor das tempestades. : iy 0 androgino pelo, F de cada um que fendi, mandlava Apol na peda 0s portentos a mem Giulio: Ossequente (sée. 1V) a renllda an f 2 ele i + funda sto felpas para ck , He Se artasta sob ' z mo uma cal pty a teimador d Iv, MONSTROS EPORTENTOS ‘Aeconcre eg ‘ontraes homens deletireetlavraye histoire du bono Alexandre, Royal ms, 20,8 XX 51 seenv, Londres, Brits Library As aventuras de Alexandre © romance de Alexandre, I 33 ee. XW) habitada por selvagens semelhantes a olhos de foge ee € parecem ledes. Com eles havia também outros seres que se chamam Otis: ni ti r om Ot fem um 6 pelo 1 corpo, s40 altos quatro cabitos ¢ ‘omprides como tuma langa, Assim que directo, Cobriam-se m pels defo, ern fortissimas ¢ trein: i foramen ewes paso Combate ® atingiamos, mas eles pém nos atacavam com hastoes e Soldados. No dia sey i crn is, No da segue, resol encontramos, as, feras com leds, mas que tin Partimos em seeuid echegamos mel: havia um @ de pélos om > pas rdenet au 0 ie * encarurnos com seu olhar seh ‘Ordenei entio ‘Que apresentasse dian TT lang: : aM|-Se CONF NOS OULFOS se especie, 405 milhares, © nosso exército tinha quarenta mil homens: ordenei entio {que pusessem fogo aos visto do f¢ ados ¢ eles, 3 escaparam, Capturamos que niio aceitaram comida por oito dias e Morreram. Tais seres nao falam. como os humanos, mas latem como os cies, Uma estética do desmesurado Estas e outras noticias acabaram alimentando o surgimento daquela que foi definida como estética hispérica A latinidade classica ja havia condenado o estilo dito ‘asiatico” (e depois “africano’), em oposicao ao equilibrio do estilo “atico’ Este estilo era considerado feio também pelos padres da Igreja, conforme testemunha a seguinte invectiva de Sao Jeronimo (Adversus Jovinianum |):"Existem atualmente tantos escritores barbaros e tantos discursos que os vicios de estilo tornam confusos, que nao se compreende mais nem quem fala, nem do que fala, Tudo se incha e se relaxa como uma serpente doente que vai se despedacando enquanto ensaia suas volutas (..) Mas de que servem tais bruxarias de palavras?” Entre 0s séculos Vile X assiste-se, porém, a uma reviravolta do gosto, pelo menos em uma area que vai da Espanha as ilhas Britanicas, tocando a Galia. A estética hispérica € 0 estilo de uma Europa que esta vivendo seus *séculos obscuros’ uma Europa na qual, com a decadéncia da agricultura, © abandono das cidades, o desmoronamento dos grandes aquedutos e das estradas romanas, em um clima geral de barbarizacao, em um territorio coberto de florestas, os monges, os poetas, 0s iluminadores também véem o mundo como uma selva obscura, habitada por monstros, atravessada por caminhos labirinticos A pagina hispérica nao obedece mais as leis tradicionais da proporcao: aprecia-se a nova musica dos incompreensiveis neologismos barbaricos, privilegiam-se as longas cadeias de aliterages que o mundo classico consideraria pura cacofonia, preza-se ndo a medida, mas antes 0 gigantesco e o desmesurado. Sobretudo os monges irlandeses que, naqueles séculos dificeis e desordenados, haviam conservado e reconduzido a Europa continental uma certa tradi¢ao literaria, movem-se no mundo da lingua e da imagina¢ao visual como, justamente, em uma floresta ou como 0 irlandés sao Brandao vagava pelos mares ~ ancorando-se em uma horrivel baleia confundida com uma ilha e encontrando Judas prisioneiro em um rochedo, batido e atormentado pelas ondas marinhas. Entre os séculos VII e IX, talvez em terras irlandesas (mas certamente nas ilhas Britanicas), surge o Liber monstrorum de diversis generibus, que além de descrever monstros de todo tipo, comenta sua variedade. Ele nos diz (livo Il): "S2o sem duivida infinitas as raas de feras marinhas que om corpos desmesurados como altas montanhas, sacodem com seus peits as ondas mais gigantescas e as extens6es de agua quase erradicadas das profundezas (..) Sugando com horriveis redemoinhos as Aguas ja agitadas pela grande massa de seus corpos, dirigem-se para a praia een a calor tum espetaculo aterrorizante’ Neste clima, surge na Irlanda is ornado de espléndidas letras capitulares nas quais triunfam os entrelacs, rendas labirinti inticas em que aparé jun sep ee parece, junto com figuras divinas, pennee crate: monsrusas de odo tipo Sao formas de anime estilados, Pe imiescas entre folhagens impossiveis que cobrem paginas sige crrarneesore os matvos sempre gua de um tape, embora cada nha wn de voraroes ep tesente de fat uma invengio diverse.£ uma complica : mes, ignorantes de qualquer re simetiajem uma sinfona de cores dlcades de ova os arcs ae do limao a0 malva. Quadrupede impensaveis fi introduzisse lelicadas, do rosa ao amarelo-laranja, saa nadtupedes stars ibréus com bcos de cine oe 's contorcidas como um atleta de circo que "ga entre os joelhos, revirando a cabeca e inicial de uma letra, compondo a icos coloridos eA oe ras iniciais,insinuam-se linha apés linha 3. Amoralizacao dos monstros Como estes “felissimos” monstrinhos eram compreendidos pelos monges devotos? Certamente da mesma maneira como serdo apreciados outros seres disformes colocados nas margens das paginas iluminadas (os chamados marginalia) e nos capitéis das igrejas romanicas nos séculos sucessivos. Os medievais consideravam 0s monstros atraentes, assim como nos fazemos com os animais exdticos do jardim zoolégico: prova disso € a €nfase com que um rigorista como sao Bernardo (na Apologia a Guilherme) condena as esculturas dos capitéis, sob as quais é evidente que os fiéis se detinham com gosto excessivo (embora a eficacia com que as descreve leve a crer que ele também as observava mais do que o devido):"O que faz nos claustros (..) aquela ridicula monstruosidade, aquela espécie de estranha formosura disforme e deformidade formosa? O que estao a fazer ali os imundos simios? Ou os ferozes ledes? (..) Podem ser vistos muitos corpos sob uma tinica cabeca e, vice-versa, muitas cabecas sobre um unico corpo. De um lado, emerge um quadrupede com cauda de serpente, de outro, um peixe com cabeca de quadripede. La um animal tem aspecto de cavalo e arrasta posteriormente uma meia cabra, aqui um animal cornudo tem traseiro de cavalo. Em suma, mostra-se por toda parte uma tao grande e tao estranha variedade de formas heterogéneas que se tem mais gosto em ler tais marmores que os cOdices, em ocupar a inteira jornada ‘admirando tais imagens uma a uma que meditando nas leis de Deus.” SSeS Também os monstros $80 fithos de Deus Agostino (se. VV) 4 cidade de Deus, X18 Pergunts-se, além diss dos filhos de Noe ou, melhor mr exces também procedem, se hai squem esses tambem P ‘cents rics de homens intra dos eto, que alguns se € crivel que de Adio, de propa Ironsirvosos de que ahi Life, Ase im of Jos para ts, que Outros nsuem ambos 08 d Ja de mulher, © que de homer a esqverd de servindose camalmente deles im e dio 3 hz alernativamente, geram ¢ d jo tém boct Também contam que alguns ce vivem exclusivamente do af, respirado pelo nariz. Mirmam que outros tem um Civado de altura por isso 08 Breges Os ‘chamam de pigmeus € que em algumas tenides as mulheres concebem aos cinco de igual mado, exisiem homens de velocidade expantosa e que, no verio, Ueitados de costa, se defendem do sol com a sombra dos proprios pés. (.) Deus, ador de todkis as coisas, conbece onde uando € 0 que € ou foi oportuno crar € ixtemas, conhece a beleza do universo e a semelhanga ou diversidade das partes que Mas, de fato,o mundo cristo jé havia realizado uma verdadeira “redenc3o" Griador equivocido no niimero de dedos do homem. (..) Em Hipona-Diarrito ha un hhomem que tem a planta dos pes em, ras extremidades, e assim também as mos. Se houvesse alguma nagio com igual tara, acrescentar-se-ia Aquela curioss e surpreendente historia. Negaremos, por fss0, que tal homem se origina do pret ioradores poderiam, glorando-se da Fmpune vaidide tnlarse de nagbes de eee tn de pinion fou que, se homens, descendem de Ada do monstro. Como ja vimos (no capitulo 2.1) a propdsito da visdo pancalistica, Agostinho dizia que os monstros eram belos enquanto criaturas de Deus.O proprio Agostinho (na Doutrina crista) tentou regulamentar a interpretacao alegérica das Escrituras Sagradas, advertindo que é preciso descobrir um sentido espiritual, além do literal, quando 0 livro sagrado parece se perder em descricoes aparentemente supérfiuas de edras, plantas ou animais. Mas para entender qual € o sentido espiritual de uma pedra preciosa ou de um animal, era preciso ter a mao uma “enciclopédia® que dissesse qual o significado alegérico daquelas coisas. Nasceram assim os bestiérios moralizados, nos quais cada criatura mencionada (nao importa se real ou legendaria) era associada a um ensinamento moral. O primeiro texto a entrar no mundo cristéo com esse cardter foi 0 Fisiélogo, escrito em grego entre os séculos Ile Ill de nossa era e traduzido €m seguida para o latim, além de varias linquas orientais, istando cerca dé uarenta animais, pedras e arvores. Depois da descricdo de cada ser, 0 Fisiologo mostra como e por que cada um deles é 0 veiculo de um Ensinamento ético e teol6gico, 0 ledo, por exemplo, que segundo a lenda aPaga as proprias pegadas com o rabo para escapar dos cacadores, \ansforma-se em simbolo de Cristo, que apaga os pecados dos homens a Licome, tem vtes des proprétés ddesonimau, ts 3401, 1566, Pars, Bibiotneque Sainte-Genevieve Do Fisislogo Gee. 1D (© unicémio € um pequeno anima semelhante a0 cabrito, mas ferocissiny cacador nao consegue se aproximar dele por causa de sua extraordinaria forga Tem um so ch meio da eabeca Como fxzem para caciclo? Expoem uma virgem imaculada, © animal pula em seu regago € ela o amamenta € 0 condu? 20 palicio do rei, O unicOrio € uma imagem fo Salvador: de fato (.) ele fez morada no venire da verdadeira ¢ imaculada Vingem Maria clefante. Nele nao existe desejo de ceonjungio eamal: quando quer ge filhos, dirige-se para o Oriente, perto do paraiso, onde se encontra. uma arvore chamada mandrigora. A femea colhe nrimeiro o fruto da drvore, oferece a0 nae fncita, para que ele também prove. Depois de comer, 0 macho nproximacse dla femea € unese a ela (.) ‘Quando chega a hora do parto, entra em tum lago até que a agua chegue 2 alura de suas mamas e depois dé A luz 0 seu filho na Agua € este timo fica de joethos € suga seu seio (.,) A natureza de tdlefante & assim: se cai, nao € capaz de relhios. De que modo cai? Quando quer dormir, apGia-se em uma dirvore € os igadores, que conhecem a natureza do ono da clefante, serram parcialmente 0 {100% irvore. © animal chega para se encosta, ‘ai junto com a drvore € comeca a langar altos bramidos, Outro elefante 0 ouve € 2AGKO.00S MONSTROS 5, AMORALIZAGAO OC nos a bramir« ré-lo; poemse re elefantes, mas nem assim ‘onseguem erguer 0 que esti cai; eniao, pac xis rami e ches tenfim, um pequeno elefante, poe sua {romba embaixo daquele e 0 ergue ¢ O elefante ¢ sua feémea sto, portanto, imagens de Adao ¢ Eva: quando estavam nas delicias do paraiso antes da transgressio, nao conheciam a uni ‘armal ¢ 0 acasalamento. Mas quando a mulher comeu o fruto da arvore, isto € ‘da espiritual mandrigora, ¢ oferecet-o a0 hhomem também, entao Adio conheceu 1 mulher € gerou Caim sobre as aguas maléficas (..) Veio entio o grande elefante, isto & a Lei, € nao foi capa, Ue ergué-lo; depois vieram doze elefante {sto &, profetas, mas cles também nao cconseguiram reerguer 0 homem caido: depois de todos estes, veio o sunt lcfante espiritual e, enfim, reergueu 0 omem. O Fisi6logo disse da vibora que rosto de homem ¢ a femea, ‘macho ten rosto de mulher: até o umbigo tem forma jumana, enquante a cau € de crocodilc A femea nio tem vagina, mas apenas uma especie de buraco de agulha. Quando 0 ‘em sua boca e ela, depois de engolir 0 Sémen, decepa os genitais do macho, que norte instantaneamente, Quando os filhos erescem, devoram ventre da mie (..) As viboras Xio, portanto, parricidas rmatricidas. Bem comparou Joo as viboras nos fariseus: da mesma forma como a 4. As mirabilia Sequindo o modelo do Fisiélogo (devidamente ampliado e reorganizado), nasceram desde a maior parte dos bestisrios, lapidérios, herbarios e, de uma maneira geral, as varias “enciclopédias” concebidas nos moldes da Histéria natural de Plinio, da Natureza das coisas de Rabano Mauro (séc.Vil-1X), até as grandes compilagoes dos séculos Xil € Xill como, por exemplo,A imagem do mundo de Honorio de Autun, Annatureza das coisas de Alexandre Neckham, As propriedades das coisas de Bartolomeu Angélico,o Espelho natural de Vincent de Beauvais, até o Trésor € 0 Tesoretto de Brunetto Latini. Assim também os animais do fisiologo sdo procurados e as vezes descritos em relatos de viagens imaginarias como As viagens de Mandeville ou A composicdo do mundo de Ristoro d'Arezzo, A lista é incompleta, mas testemunha a atracao do mundo antigo e medieval pelas terras ainda inexploradas e a tensao atonita com que os leitores daqueles livros fantasiavam todas aquelas maravilhas. Prova disso € oimenso éxito de um embuste produzido no século XIl,a Carta do Preste Jodo, que falava de um fabuloso reino cristao na Asia, além das ‘erras dos infigis, habitado por uma gente virtuosa e rica de ouro e edras preciosas. 0 mito do Preste Joo conquistou muitos viajantes {como Marco Folo, por exemplo), que tentavam identificé-Io e, no campo a Politica, encorajou a expansao cristé para o Oriente (embora tenha se Geslocado da Asia para a Africa no comeco da Idade Moderna, quando tv feino fol identificado com a Etiépia crista). Mas um dos motivos da atracdo gerada por este reino imagindrio, quase um inventario das Monstrous aces oftthopa, ms 4611260, C1860, Nova York Prerpont Morgan Library © reino do Preste Joao Carta do Preste Jodo (se: XI Jos senhores Bu, Preste Joao, sou senhor d ¢, em cada riqueza que hi sob 0 céu, em c todos 05 reis Virude € em poxer, superc Fm nossos dominios nascem e vivem clefantes, dromedtisios, cameos, ios, metagalinaceos, hipopotamos, crocod eves brancos ¢ mvos, Ursos & brancos, eigarras muds, grifos, tigres, chtacais, hienas (..) bois selvagens nM! wheres da chiffuds, faunos, satitos eu cus, cinocétalos, cules, ‘de quarenta cubitos, mon quase que todo tip sob a absbada celeste (.) Em uma de nossas provincias corre um fio aque se chara Indo, Ete i, gue bree araiso, estencle seu curso por toda a es yntram pedras naturais, esmeraldas, if 0s, crisdlitas, Sifts, earbinculos, topazi0s, nis, t muitas outras pedras precios Nas re Ses extremas da tears, ( al Deus manda duas vezes por semana, durante > ano inteiro, copiosas chuvas de mand jue as populagdes recolhem e comem imio se alimentando sendo disso, De fato, fio lavram, nao semetam, nao colhem, nem trabalham a terra de forma alguma cextrair sett mais rico fo, C.) jens, quue comem apenas Pp Toxlos estes li > alimento celeste, viver quinhentes an trv naquuela ila (..) Entre > ninguxém mente (..) Nenhum vick eo I Malignas eram as Serpentes de crista na cabeca, caminhando sobre pernas ‘empre com a goela aberta gotejando veneno, ¢ temibilissimo 0 Draggo, tava no momento em que é derrotado por sao que a pintura represen Jorge, enquanto boa parte da literatura cavaleiresca 0 via em luta contra os ‘cavaleiros ~ que nos bosques podiam encontrar também o hirsuto Homem Silvestre, como se vé no Morgante de Pulci, Mas nao se pode diz mesmo de outras déceis criaturas, certamente extraordinarias por sua forma e costumes e decerto distantes de qualquer ideal humano de graca ou prestancia, mas inécuas, como os Acéfalos, com os olhos nas costas e i dois buracos no peito & guisa de boca e nariz; os Andréginos, os Astomoros, desprovides de boca e alimentando-se unicamente de cheiros; 0s Bicéfalos; 5 Péncios com as pernas retas sem joelhos, cascos de cavalo e 0 falo no peito; 0s Fitos, com pescocos longuissimos e bracos semelhantes a serras; 8 A 0 Pigmeus, sempre em luta com os grous; os amaveis Cidpodes (providos f ara ee ree de uma nica pera com a qual corriam e que esticavam para repousar " " " a sombra de seu enorme e Unico pé);e, por fim, 0 Unicérnio, belissimo garanhao branco com um unico chifre sobre a fronte, que sé poderia ser Sores 3 ie capturado colocando-se uma virgem ao pé de uma arvore para que o y : icatrizada animal, sensivel ao perfume da virgindade, pousasse a cabeca em seu colo, océfalos, blémios, no que ten do gra < a some . fl antas vive na Bhopia € ee s ads. E pai mo ewelhas: dizem eee wan 0 " nenhum, pera os quarenta Hi n hs a sa i Jeserto, Interrogado pe le De acikmen pondido: "Sou um, in q juc habitam as vizinhangas ¢ i tos, enganados por Alguns monstros um conv Isidoro de Sevitha (570-63 Sétiros” (. Dizem queina Ei molegias, XI 1 Gidpodes, dotadtos de ascidos da 1 am no chao de costas pia © imensa massa (.) O proprios e enormes pés. Os Antipode tal nom habitantes da Libia, ti ant dos pes h i avalo. Dizem que, na India, vive um A. mesma ind Ciclopes,assi povo chamado Makrobios, cuja estatura : ita que tem um Joze pés. Vive na India também un : sta (..) Agu rf 2 estatura € igual a um ctbit IN ONSTAOS EFORTENTOS fs Greditnesn em face de Buch derheligen Drealtighet 5. 428, 148, Vad StGallen 5. DESTINO 005 MONSTROS 5. Odestino dos monstros A convivéncia com os monstros ~ e desde os primérdios — levou o mundo cristo a usé-los também para definir a Divindade. Como explicava 0 pseudo-Dionisio Areopagita na Hierarquia celeste, visto que a natureza de Deus ¢ inefavel e nenhuma metafora, por mais fulgurantemente poética que seja, poderia descrevé-lo e qualquer discurso se mostraria impotente capaz apenas de falar de Deus por negacao, nao dizendo o que é, mas 0 que ndo é, tanto vale nomeé-lo através de imagens altamente dessemelhantes, como aquelas dos animais e dos seres monstruosos. Por outro lado, era possivel encontrar um precedente na visao de Ezequiel, nna qual criaturas celestes sao descritas sob forma animal, inspirando © apéstolo Joao em sua visdo do trono divino (e isso explica também por que, em seguida, a tradicao associaria trés dos evangelistas as figuras do boi, do leao e da aguia) Mesmo no periodo renascentista, os monstros assumem func6es amigaveis e em virtude justamente de sua impressionante feiura. Desde a Antiguidade, nas artes da meméria, por exemplo, aconselhava-se, para conseguir lembrar de palavras e conceitos, a associé-los aos diversos aposentos de um palacio ou aos diversos locais de uma cidade onde apareciam estatuas horripilantes, dificeis de esquecer. E els que na Ars ‘memorandi de Petrus von Rosenheim (1502) aparecem figuras mneménicas que certamente tém um parentesco com os monstros apocalipticos e com as criaturas dos bestiarios. Os monstros terdo, por fim, um enorme sucesso no universo heterodoxo dos alquimistas, onde simbolizarao os varios processos para se obter a Pedra Filosofal ou o Elixir de Longa Vida - é podemos supor que para os adeptos das artes ocultas eles nao pareciam assustadores, mas maravilhosamente sedutores No entanto, como veremos no capitulo IX, num dado momento 0 gosto pelo maravilhoso legendario dard lugar a curiosidade pelo interessante ientifico e outros tipos de monstros encherao as Camaras das Maravilhas e outras colegdes modernas. A partir dai, exploram-se lugares que para os medievais ainda eram um territério de lendas e tais empreitadas nao deixam mais qualquer espaco para monstros de bestiario. © monstro continuard a habitar o imaginario moderno e contemporaneo, mas sob outras formas. IN MONSTROS EPORTENTOS Petrus von Rosenheim, Ars memorand 1502 Pforzheim Pseudo-Dionisio Areopagita (séc. V) Hierarquia celeste, I, 5 Veremos que os intéxpretes da teologia misteriost adaptam tais simbolo santamente mio apenas as manifestagdes dhs dispasigbes celestes, mas tambén, por vez proprin manfesages da Fearquia. Fs vezes celebram a Divindade consideramos : ) Outras vezes, a0 coninisio, celebram 1a com os apelativos dos elemen im 10 que ilumina sem danos, ‘gua dlstnbuidora de plenitude vital e ara falar simbolicamente, com entra no ventre ¢ faz bre do gua que oar Fias que ah irefreavelmente, Por fim, chamam. na também com o nome das coisas mat batras,(..)e ate the atrbuem ums ferina adaptando-the as caracterist leao € da pantera ¢ dizendo que cas do ‘como um Jeopardo ou como um urso cenfurecido, Acrescent wei também a mais vil de todas as Comparacoes, que parece ser a mais inconveniente: de fato, todos os doutos fem coisas divinas nos transmitiram que Deus atribuiu a si mesmo a forma de um verme. Assim os tedsofos © os intéxpretes da inspiragio oculta separam de maneira nada © “Santo dos santos” das ‘coisis impetfeitas e profanas ¢ velam pelas Santas figuragdes dessemelhantes para que 88 coisas divinas no se 05 profanos e para que os que contemplam os santos simulacros nao se Prendam as figuras como se fossem reais, m negagdes verdadeiras € ‘com semelhangas dessemelhantes que rovém de coisas que tem tracos divinos €xtremamente diversos em suas Propriedades 5. OESTINO 005 MONSTAOS Caliban Monstruosas tetas William Shakespeare Jonathan Swift A rempestade, 1, 2 061) Viauens de Gulliver (1726) (O que é isso? £ homem ou peixe? Esti Nada me repugnot tanto quanto a vista vivo ou morto? E peixe! O cheiro € de Jo seu monstnioso seio, € nao sei a que Bieter eu ciatee eee compari-lo a fim de dar ao leitor uma de badejo nada novo, Que peixe esquisito! _idéit do seu tamanho, da sua forma ¢ da Se eu estivesse na Ingliterr, agont, como sua cor. Mediria uns seis pés de altura e tive, ¢ mandasse pintar esse peixe nao menos de dezesseis «le circunferencia, Be eee caida aa eee ‘Um mamilo teria, no minimo, a metade do {que mao me desse por ele uma moeda de tamanho da minha cabega, ¢ assim como prata; hi qualquer monstro faz um homem 0 resto do seio ostentava tho grande de qualquer um. Nao dio um vintém para variedade de manchas, erupgdes € sardas, aliviar um mendigo, mas desperdicam dez que eu nao poderia imaginar nada de 0 para ver um indio momo. Tem perna feito nauseabundo (..) homer! E as nadadeiras parecem bragos! Isso me fez pensar na linda pele dle Palavra que esti quente! Agora vou rnossas danas inglesas, que’ s6 nos libertar minha opintio, que eu no seg parecem tio belis por terem as mesmas mais: isto nao € um peixe, @ um Uhéu que dimensdes que nds e porque as acaba de set atingido por um rato imperfeigoes de suas epidermes s6 podem ser vistas com lentes de aumento, que demonstrim efetivamente que a citis mais lisa e alva é, na realidade, aspera, grosseira e muito feta de cor Por influéncia das descobertas de navegadores que encontravam (mas de verdade) populacdes de costumes selvagens, Shakespeare vai nos falar do horrendo (e infeliz) Caliban e Swift das criaturas encontradas ao longo de suas viagens. Em seguida, pouco a pouco, perde-se a intimidade com 0 monstro: ele vai parecer perturbador para Poe, horripilante para Arthur Conan Doyle (que ja sabia alguma coisa sobre os animais pré-hist6ricos), enquanto Baudelaire sonhara um éxtase erdtico sobre o corpo de uma mulher gigantesca. Chegando aos nossos dias, passando através do Dracula, da criatura do dr. Frankenstein, Mr. Hyde, de King Kong e, enfim, cercados de mortos-vivos e alienigenas vindos do espaco, temos novos monstros a nosso redor, mas por eles so experimentamos medo, nado os vemos mais como mensageiros de Deus, nem pensamos em doma-los colocando uma virgem ao pé de uma drvore.E talvez o primeiro aceno ao ceticismo em relagao aos seres muitas vezes benevolentes dos bestidrios ja pudesse ser encontrado no Milhao de Marco Polo, quando ele, que vViajava de verdade e nao com a fantasia, encontra certos animais que para nds sao evidentemente rinocerontes. Tratava-se, para ele, de animais nunca dantes vistos, e como sua cultura ja Ihe oferecia a idéia do unicdrnio como quadriipede com um tinico chifre sobre o focinho, decide que esta vendo um unicérnio. Porém, como € um cronista honesto e aplicado, apressa-se a explicar que estes s0 unicérnios muito estranhos, diferentes da imagem tradicional: ndo séo brancos e esbeltos, mas tém “pélos de bufalo e patas como leonfantes";o chifre é preto e desgracioso, a lingua espinhosa, a cabeca semelhante a de um javali.£ conclui que nao somente o animal em questao “é besta muito feia de se ver mas também “nao € que, como se diz por aqui, se deixe prender por uma donzela, muito pelo contrario” ee 1. Priapo Deo Aur AOE to TOE kL ae Lo) Pe EO eee ce erty DSS Run UME cet Mele ba ord sérios e ponderados? Dizemos c SECU HUT La el ce 's6 aquilo deveria ser pronunciado a boca pequena?” De fato, o ser humano De Meee eeu ere Terre ero cae ay io tcc tn ERT tS eC ae gd Cee tea a ee ruc near eR Td Co CUCU e RCL Rn Cena hur ees expressou-se através do pudor, ou seja,o instinto ou dever de abster-se de exibir e de fazer referéncia a certas partes do corpo ea certas atividades. Da OR ete CUR CS ee ena eo Lory DU ich a coe ee oe Cl ca Rete ET) BOSSI SU CS SEE Coc le eee ule er ose ira) TE CU RUC Wee eR eur re oa) Peet ec eter a here CU ee uuu aed aE eed SO CRE Slee ood ee RT eT) Ce Ee Meee hss ae Me Elza ue Pode-se exibir comportamentos obscenos por raiva ou por provocacio, RS CEM ur ee aca need simplesmente fazem rir — basta pensar na satisfacao com que as criancas Pert eats V oFti0,0 comico, .08sceno Invocacb0 a Propo, stcldc Pompéia Casa dei Vert Desde a mais remota Antiguidade, o culto do falo uniu as caracteristicas da obscenidade, de uma certa feiura e de uma inevitavel comicidade. Tipica disso é uma divindade menor chamada Priapo (que aparece no mundo grego e latino na época helenistica), dotada de um 6rgao genital enorme, Filho de Afrodite, era protetor da fertilidade e imagens suas, geralmente em madeira de figueira, eram colocadas nos campos € nas hortas, seja para proteger as colheitas, seja como espantalho: acreditava-se também que tinha 0 poder de afastar os ladroes ameagando sodomiza-los. Era certamente obsceno, era considerado ridiculo justamente em razao daquele membro exorbitante (nao é por acaso que ainda hoje o priapismo é uma doenca) e nao era tido como belo: era, alids, definido ‘como amorphos, aischron (feio), pois desprovido da forma justa. Em um baixo-relevo de Aquiléia da época de Trajano (que Freud também conhecia, referindo-se a ele em uma carta de 1898), Priapo é representado no momento em que Afrodite, desgostosa com a aparéncia daquele filho malformado, o rejeita. Enfim, ndo era um deus feliz: era definido também como “monolitico; por ser talhado em um Unico bloco de madeira e colocado nos campos, impossibilitado de se mover e sem o poder da metamorfose proprio de muitos outros personagens mitolégicos, oprimido or sua solidao e pela incapacidade de seduzir uma ninfa, apesar de suas hipertroficas possibilidades. Basta pensar no tom de compaixao com que € descrito por Horacio nas Satiras. No entanto, era uma divindade substancialmente divertida e simpatica, amiga dos viajantes e como tal é representada por varios poetas, desde Teécrito e das Priapéias (uma coletanea andnima, provavelmente do século | d.C, de tom burlesco e impudico) até a Antologia palatina, Priapo simboliza, portanto, o estreito parentesco que sempre se estabeleceu, desde os primérdios, entre feitira, inconveniéncia e comicidade (como se pode ver nos trechos de Aristéfanes e do Romance de Esopo) Lamento de Priapo Horicio (sé. 13.€) Satis, 1, 8 teram colocados em caixas miseriveis € trazidos para ci pelos companheiros: este era 0 cemitério comum dos desvalidos (..) Ful outrora um tronco de figueta, madeira Agora no Esqu tivel sem serventia, quando um marceneiro indeciso se devia fazer dele um banco ou um Priapo decidiu-se pe ino recuperado hal: J Se pode passear pelos bastioes deus: € deus eee ore tristeza o campo desolado branquejante tho de de oss0s; € 908; € a. mim jé no causam tantc irolo—_transtomo os ladrdes ¢ os animais que Pissaros e ladeBes: 0s ladroes, com minha dirt direita © com pau vermelho Pousem nos hortos recém-p s : tantados, Outrora os cadaveres dos escravos, Fomados fora de suas celas acanhadas, ‘eralmente infestam tais lugares, mas antes as mulheres que, com filtros e agias,transtornam a mente humana bem da verdade, nao sou capaz de acabat com elas e impedir que recolham ossos (OU ervas venenosas assim que a ha, em Seu Vagar, aponta o rosto radiante PRIAPO Priapéia, 6, 10, 24 Mesmo sendo, podes ver, um lenhoso Priapo, que tem foice e até earalho de puro lenho, Vou te pegar mesmo assim e te possuir © esse trogo, quiio longo for, sem fraude vou te enfiar, mais duro que um cetro até tocar a tua sétima costela De que fis, mocinha estapida? Prasiteles nao me esculpiu, nem Scopa em me poliu a mio do grande Fidias; rude madeiro, talhou-me um campOnio ¢ exclamou: “Sim, tu seris Priapo! E entio me olhas e te poes a rit? adavel Com certeza pensas que € 4 A mim, guardiio de um hono fecundo, 6 feitor fenou que cuidasse do lugar que me foi confiado. Sejas punido, 6 ladrio, mesmo que indignado digas Devo pagar tudo isso por tdo pouca verdur” Priapeum Tebcrito (see. I-IV) Epigramas, 4 Naquela vereda dos carvalhos, 6 pastor, fazendo a curva, encontraris uma efig feita de figueira, apenas esbocada, com tres pernas, coniga, sem orelhas, mas com um membro vital capaz de cumprir as obras de Cipride, Um sac ¢-€, das rochas, um tio F enfeita-se por toda parte de louros e de esp reeinto ali se na e de perfumados ciprestes; ld se oferecendo seus cachos em espirais, uma videira, © primaveris, com elros emitem antos varialios. E rouxindis melodiosos respondem com trinados, langando dos bicos a vox de mel, Pira ali e, a0 gracioso Priapo, pede que eu perca o desejo por Datne, ¢ logo imolaret em sua honra um. belo cabrito, Se recusar, porém, para convencé-lo hei de cumprir um triplice sacrificio: darei, de fato, uma novilha, um bode peludo € um cordeito que tenho ‘guardado, Que o deus me ouga com benevolencia ont pint mosquitos preocupes: no podetias, de fato, cagar re a trseiro. (.) _julzo que nao tens do estn Contra o rise. ar a passar com forca diretamente —Regra do So Benedito ( 1 u lepois, stindo atravé fonunciar palavras vas ou ti tado, faz 0 anu AF por causa 0 riso excessiv lesmed des Eni " Sio Basilio, Pequemas regras ( defecou 1 nana (..). Contudo, como atestan alescas Falamos aqui te que exprimem a harmonia perdida (como 0 sublime e ot am ansiedade e tensao), a harmonia possuida como o belo eo induzem a serenidade) ou ainda a harmonia perdida e ea temos 0 comico como perda e rebaixamento ou ainda como mecanizacdo dos comportamentos normais. Desse modo, pode-se rir daquela pess cascade ba ’a empertigada e presuncosa que escorrega numa ana, dos movimentos rigidos de uma marionete, mas pode-se rir também com as varias formas de frustragdo das expectativas, com a animalizacao dos com muitos jogos d acos humanos, com a inabilidade de um trapalhao palavra. Estas e outras formas de comicidade jogam eformacao, mas nao necessariament coma e com a obscenidade. Comicidade e obscenidade casam-se, a0 contrario, quando nos divertimos a custa de alguém que desprezamos (basta pensar nas piadinhas licenciosas ‘ou nas pilhérias sobre os cornos) ou num ato liberador voltado contra algo ou alguém que nos oprime. Neste ultimo caso, o comico-obsceno, ao nos fazer ri do opressor, representa também uma espécie de revolta compensatéria Estas formas de revolta (mesmo que autorizadas e entendidas, portanto, como motor de escape de tenses que sem elas seriam incontrolaveis podem ser encontradas nas saturnais romanas, durante as quais era permitido aos escravos assumir 0 lugar dos patroes,e nos triunfos, onde se peimitia que os veteranos gritassem ao condo salgadissimas, com alusoes até bastante pesadas. tiero homenageado piadas Quanto ao primeiro mundo cristao, ele nao foi nada ameno em relagdo ao riso, considerado uma licen¢a quase diabdlica. Uma tradicao derivada de um evangelho apécrifo, a Epistola de Lentulo, ensinava que Cristo nunca tinha sido visto rindo e a disputa sobre o riso de Jesus acabou durando séculos, Apesar desses documentos contra 0 riso, outros pais e doutores da Igreja defenderam 0 direito a uma santa alegria e que, desde os primeiros séculos medievais, circulavam textos jocosos como a fantasmagorica que ‘ena Cypriani (uma parédia e uma trajetoria de sucesso no universo monastico, na qual personagens biblicos eram postos em cena de forma francamente ieverente) ou os Joca monachorum. Havia, além disso, momentos dedicados a licenga jocosa, como o riso pascal, que permitia gracejos durante a celebracao da Ressurreicao, na igreja e durante os sermoes arido embaragan escroto n XILXI © peido do aldeao € isse ficaria curadh A Idade Média era uma época cheia de contradicées, em que as manifestac6es publicas de piedade e rigidez se faziam acompanhar de generosas concessdes ao pecado, conforme se vé em grande parte da novelistica da época, ¢ existiam locais onde a prostituigéo era tolerada (e até aldeias-gineceus, frequentadas por feudatarios e chamadas de columbaria). Nao devemos esquecer 0 erotismo da poesia cortés ou os cantos dos goliardos, que eram clérigos também. Além disso, o senso do pudor era certamente bem diferente daquele moderno, sobretudo entre os pobres, onde as familias viviam promiscuamente, dormindo todos no mesmo aposento ou até no mesmo leito, e as necessidades corporais eram satisfeitas nos campos, sem grandes preocupac6es de privacidade. A obscenidade (e a magnificacao do disforme e do grotesco) aparece nas satiras contra 0 aldeao e nas festas carnavalescas em relacao a vida dos humildes. Trata-se de dois fendmenos bastante diversos. Existem textos, dos fabliaux franceses 8 novelistica italiana e aos Contos de Canterbury de Chaucer, nos quais 0 aldeao ¢ apresentado como um tolo, sempre pronto a ludibriar seu senhor, sujo, fedorento (em um conto, um pastor de asnos passa na frente da loja de um perfumista e fica tao tonto com aqueles aromas que desmaia e s6 volta a si quando o fazem cheirar imundicies) e, a5 vezes, como um Priapo, desfigurado por repulsivos atributos genitais, Isso nao era, contudo, um exemplo da comicidade popular; era antes a expressao do desprezo e da desconfianga do mundo feudal e do mundo eclesidstico em relacao aos camponeses. As deformidades do aldedo eram apreciadas com sadismo e ria-se deles e nao com eles. ¥.0F810.0coMIco,0o8sceN os chara 44 as plebes citadinas eram, a0 contrario, ee ee grotesca nos carnavais ¢ de outras manifestacdes de tipo a como a Festa do Asno eos charvar procissbes Por Ocasao de novas nupcias de um viivo,caracterizadas por gritos, gestos obscenios, travestimentos e uma grande barulheira com a percussao de caldeirées, panelas e outros utensli de cozinha. No carnaval prevaleciam as representacées grotescas do corpo (como as mascaras), as parddias de coisas sacras e uma licenca plena de linguagem, inclusive blasfematoria, Triunfo de tudo aquilo que era considerado feio ou proibido no resto do ano, estas festas representavam apenas um paréntese concedido ou tolerado em algumas ocasides especificas; para 0 resto do ano, havia as festas religiosas oficias, Nas festas religiosas reconfirmavam-se a ordem tradicional e o respeito pelas hierarquias;nos carnavais permitia-se que ‘a ordem social e as hierarquias fossem derrubadas (elegiam-se até os teis ou 0s bispos da festa) e que os tracos bufonescos e “vergonhosos’ da vida popular viessem a tona. A populacdo vingava-se alegremente do poder feudal e eclesidstico e tentava reagir, através de parddias dos diabos e do mundo infernal, ao medo da morte e do além-tumulo, a0 terror das pestes e das desgragas que imperavam no decorrer do ano. ‘Assim, poderiamos dizer que, paradoxalmente, seriedade e lugubridade eram apanagio de quem praticava um sacto otimismo (ha que sofrer, mas depois vird a gléria eterna), enquanto o riso era 0 remédio de quem vivia com pessimismo uma vida sofrida e dificil Entre estas manifestacdes havia também a Festa dos Loucos, e é dbvio que a figura do doido (que pode ser portador de inesperada sabedoria) fosse caracterizada por uma careta de loucura que logo se transformou em mascara burlesca, Nestas ocasides, até os excrementos assumiam funcao farsesca e eram utilizados no lugar do incenso, nas igrejas, durante as eleicoes dos falsos bispos, enquanto nos charivari eram lancados diretamente sobre a multidao. E assim, o feio era, de alguma maneira, resgatado, talvez também porque o protagonista do camaval, esfomeado e alquebrado pelas doencas, nao fosse muito mais bonito do que a mascara que rath um ato de desafio, o desgracioso era aceito e imposto como modelo. © Principe dos Tolos los determinados (.) tolas senhoras Gingore ge SVAN fon wey ES Sethorinhas; ols vetha ¢ tos os lunaticas,tolos aparvalhados, tolos joven, donzelis, todas as tolas amam © sbi lon cles ds ea, haces leone wei do alc stash, os lindas; tlay gabolas, tolas meigas, ta ca aa es amortos, eed: tols que queren ter ‘ is, ols sages; tolos Prehenda; tolas trotando nas trillas; tolas Hottos moves ¢ tolos de todas asides; coradas, mags, paltdas © gordas: na tls bir tos fortis, tls Tereacfeita Gorda, 0 Principe irk recedes iveis,tolos perversos, nos tllles ¥. OFEI0, 0. COMICO, 0. 085CENO 3. Aliberacao renascentista Todos estes fendmenos sofrem uma espécie de reviravolta no ambiente renascentista.A virada mais evidente acontece com Gargantua e Pantagruel de Rabelais, que comeca a ser publicado em 1532. Aqui a culture popular, em suas formas mais rudes, nao é somente revisitada e saqueada com extraordinaria originalidade, mas o obsceno rabelaisiano jé nao aparece (ou nao apenas) como caracteristica plebéia, transformando-se antes em linguagem e comportamento de uma corte emenen real, E nao para por ai. A ostentagao da impudéncia (com resultados see ccémicos insuperados) nao ¢ mais praticada no gueto da festa carnavalesca apenas tolerada: transfere-se para literatura culta, exibe-se oficialmente, transforma-se em satira do mundo dos doutos e dos costumes eclesidsticos, assume funcao filoséfica. Deixa de dizer respeito apenas a uma parentética revolta anarquica popular, para tornar-se uma verdadeira revolucao cultural Em uma sociedade que vai sustentar doravante a prevaléncia do humano e do terrestre sobre o divino, o obsceno transforma-se em orgulhosa afirma¢ao dos direitos do Corpo - e como tal, Rabelais foi esplendidamente analisado por Bakhtin. Os gigantes Gargantua e seu filho Pantagruel io, segundo 0 critérios classics medievais, disformes, porque desproporcionais, mas sua deformidade torna-se gloriosa. peginassequintes Como Paniirgio se € Alguns bons habitos de Ps Frangois Rabelais Gustave Dore Francois Rabelais Eles nao sao mais 0s apavorantes gigantes que se rebelam contra Jupiter, Pere Gargantua e Pantagruel, W, 67 (1532) Gargantua ¢ Pantagruel, Mt, 16 0532) rangois Rabelais, os pobres mestres-cle-ceriménia Frei Jean, ao aproximar-se, sentiv na 1os pobres mestres-de-ce Inexoravelmente condenados pela mitologia classica, nem os monstruosos habitantes da India das lendas medievais: em sua incontinente e ‘enorme’ Les Songes drolatiques de Pantagrue Pans Richard Breton, ual odor diferente da polvora i qual odor dife P grandeza,transformam-se em herbis dos novos tempos, ie ren cau von Mteemanene aati eee Dee ate beavis ihes pregaralguma pega, atirando uma oa tuulherezinhias agachadas, como se vée tiseulb ehanado esfincer ( Sree ee eee ett Gargdntua ¢ Pantagruel, NM, 27 5% em varios lugares, que ndo erescem send0 Jo cu) se dissolve ela veeméncia uma oretha de lebre, ou alguma coisa Mas com c Sade Como 0 abo das vacas, para baixo, ou medo que ele tivera em suas semelhante, Certo dia, quando todos os disformes; ¢ de uma ventosic _ Deus, eis uma bela penea de homens € sintomas ¢ acidentes do medo € galbano, assa-fétida, eas 0, bem Sorbonne, de modo que nem o dial guientaria fear ak No inicio do século XV toldo de Giulio Cesare Croce (16 eiissimo € rude, o aldeao, que era parv ersonagem, ainda lenda de Esopo, que num corpo desgracioso n essatio esperar pelo Be de ‘ampé nula, engana alguns estuipidos mercadores mostrando que o anim defecar dinheiro e consegue vende um alto preco.Também 0 louco, de seem imbolo filosofico: Flogio que Ihe faz Erasmo de Rotterdam (1509) EE rvém para fustigar os costumes A boca eo Bertoldo Conte poraneo de Rabelais era Pieter mundo dos campone: entra na grande Bruegel repre Bruegel, o Velho, gracas ao qual 0 Ses, com suas festas, sua rudeza e suas deformidades Pintura. Como nas satiras dos aldedes, a pintura de Ma 0 Povo, mas nao € destinada ao povo. Como bem observou Amold Hause em sua Histéria social da arte, quem quer retratar@ Propria vida sao os grupos soci aTUpos ainda opinions sea Satisfeitos com sua situagao e nao os Bruegel era destinada a pe " Sejariam uma vida diversa. A arte de deve se ners Beans cate © 840.20 campo. Nem por isso, porém 2 Bruegel uma atencao fiel aos costumes camponeses e Sua Fepresentacao do aldes #0 do aldedo nao é, certamente, feroz e escarnecedora como acontecia nas satiras medievais com pi a ios F Hone animalium, cle essai h , afirma também que nada & mais feio « i le fe a geragio dos animais e kh nic : 10? E yem. Quem pudesse te correto € li 1 Jet aquelas infectas misturas de sangues vilania n todas a ” auseadh nior p Nessa altura, a atencao ao feio esta para assumir contoros realistas, como acontecerd na pintura do século XVIl:é de 1635 0 tratado Sobre a feitira, de Antonio Rocco, que afirma polemicamente que vai falar de coisas feias, ja que as coisas suaves e graciosas acabam por provocar nauseas. Logo de inicio, Rocco diverte-se enunciando paradoxos moralistas e antifeministas, demonstrando que nas mulheres a feidra é "garantia de honestidade, remédio de luxiiria, ocasiao de equidade e de justica” e que, portanto, somente as mulheres feias nao provocam desejo e anguistias nos amantes € nao sao lascivas, como as belas. Rocco faz também o elogio dos desastres naturais, ocasido de nova geracao, e define como principio de todo bem as coisas repulsivas, como os partos, as menstruagoes, o esperma, as purgas Isso acontece porque, com o Renascimento, o obsceno entrou em uma nova fase. Os atributos sexuais na representagao de corpos humanos deixam nao somente de ser vistos como motivo de escandalo, transformando-se em elemento de sua beleza, mas com autores como Aretino a exaltacao de atos antes inominaveis (cuja insercao em uma antologia a decéncia veta até hoje) penetra nas cortes, inclusive a Pontificia, e nao se expde mais sob o signo do repulsivo, mas de um altivo e despudorado convite ao gozo. A arte das classes cultas arroga-se publicamente o mesmo direito que antes era concedido quase de ma vontade a canalha plebéia ~ salvo que ela o exerce com graca e nao com violéncia ~ e faz desaparecer a diferenca entre dizivel e indizivel. Pretendendo representar ’belamente’ nao somente 0 feio inocente, mas também aquele que era considerado tabu, ela separa o obsceno do feio. a a \.0F10,0.comico.0 08sceNo Pornocratas 1878 (0 Presidente de Curva Marques de Sade . (Os 120 das de Soxloma (ntsochu 4735) singularmente ‘Com quase sessenta anos € ‘mais parecia um devas gasto pela devassi = fesqueleto. Era alto, see bilos fundos e bagos, uma boca livia © weixo elevado, 0 maniz ‘Coben de pelos como tum sit ‘suas costas mais lembravar r antas chicotadas podia ple murs P eens com on dedos sem suc ce No meio dessas, sem que fosse presi ‘enorme, cheiro € cor fgualment > Presidente, que sso aecrescin gos.0s cos quanto ela, ) Poucos homens for: ies e devassos quanto o Presidente; no entant, psolutamente avaclhe apenas a & horas de ‘completamente apitic tembrutecido, re ea eripul texcesso, e dos mais infames, para lograr Curval estava tao profundamente mergullado no lamacal do vicio © da ihertinagem que The era praticamente impossivel falar em outa coisa, © sas expressoes mais Sujas estavam sempre fem sua bora e em seu coriclo, Entremeava-as com as mais vigorosas blasfémias © imprecacdes, insufladas pelo verdadeiro horror que sentia, assim como seus compadtes, por tudo que lembrasse a religito, Exacerbada pela embriaguez ‘quixe continua em que se compra, essa desordem de espirito conferia-Ihe havia alguns anos, uma aparéncia de imbeciidade e de embrutecimento, font, segundo dizia, de suas mais caras oenava-se um personagem cuja PreSenc io fedonenta podia 0 agradar a todos delicias ‘A obscenidade torna-se oportunidade de elegante entretenimento na literatura licenciosa seiscentista e setecentista, embora em um autor “maldito” como Sade ela retome todas as suas caracteristicas mais asquerosas, Mais uma vez, a decéncia impede que se coloque em uma antologia toda a descricéo do Presidente de Curval que aparece em. 120 dias de Sodoma, Curval ¢ um depravado que atos de repugnante libidinagem, descritos sem poupar nada ao leitor, tornam horrendo, fétido e repulsivo. Sade, ao superar o limite entre dizivel e indizivel, vai além do exercicio normal das fungdes corporais: querendo ser liberador, ‘© obsceno supera a medida, mira a enormidade, a insustentabilidade ‘Como tal, vai adquiri,enfim, um papel dominante em boa parte da literatura do final do século XIX e nas vanguardas do século XX. justamente para destruir os tabus bem-pensantes e, a0 mesmo tempo, aceitar todos os aspectos da corporalidade Mas, no século XIX, aquilo que antes era considerado obscenamente feio fo tratado sem hesitagdes pela arte e pela literatura realista, interessada em mostrar a vida cotidiana em todos os seus aspectos. Em todo caso, como prova da relatividade do conceito de pudor, muitas obras que hoje sao lidas até nas escolas, como Madame Bovary, de Flaubert, € Ulisses, de Joyce, ou 0s romances de Lawrence ou de Miller, causaram escandalo quando foram publicadas e tiveram, muitas vezes, a sua live Circulagao proibida, 4, Acaricatura Uma das formas do comico é com certeza a caricatura.A idéia de caricaturaré,afinal, moderna, embora alguns assinalem seu inicio em certos retratos grotescos de Leonardo. Porém, mais do que escolher alvos reconheciveis, Leonardo “inventava’ tipos, assim como eram representados, no passado, os seres jé disformes por definic3o, como silenos, diabos ou aldedes. A caricatura moderna, ao contrério, nasce como instrumento polémico voltado contra uma pessoa real ou, no maximo, contra uma categoria social reconhecivel,e consiste em exagerar um aspecto do corpo (em geral, o rosto) para zombar ou denunciar, através de um defeito fisico, um defeito moral. Neste sentido, a caricatura nunca tenta enfeitar 0 proprio objeto, mas sim enfeé-lo, enfatizando certos tracos até a deformidade. {Assim, moralistas como Hans SedImayr (em A perda do centro) falavam de uma forma de amesquinhamento que tira do homem 0 seu equilibrio ea sua dignidade. Existem certamente caricaturas voltadas para humilhar e tornar odioso o proprio alvo (ver, no capitulo 7, as varias técnicas de demonizacao do Inimigo politico, religioso ou racial). Contudo, no mais das vezes a caricatura pretende também, ao enfatizar algumas caracteristicas do sujeito, alcancar um conhecimento mais profundo de seu carater. E também nao pretende sempre denunciar uma feitira “interior podendo trazer a luz caracteristicas fisicas e intelectuais ou comportamentos que tornam o caricaturado amével e simpatico. Assim, enquanto as caricaturas ferozes de Daumier ou de Grosz denunciam a baixeza moral de certos personagens ¢ tipos de seu tempo, as caricaturas de pensadores ¢ artistas realizadas por Tullio Pericoli sio verdadeiros retratos de grande penetracae psicol6gica que muitas vezes atingem a celebracao. Por isso, Rosenkranz considerava a caricatura uma espécie de redencao estética do feio,na medida em que nao se limita a evidenciar uma desproporcao, nem enfatiza todos os elementos andmalos presentes (cas0 em que nao teriamos uma c ae teriamos uma caricatura, mas, como nos gigantes e pigmeus de Swift, a descricao de uma forma diversa):a boa caricatura insere 0 = Se10™omo um fatordinamico que envolve a sua totalidade”efaz.com que o elem nto de desorganizacao formal torne-se “organico’ Em outros a "bela" representacao que faz um uso harménico da deformacao. “ee Oceontate de venda, VL Berlin, Tullio Perio, Albert Ester George Grosz 1921 Belin Staath Contra a caricatura Hans Sedimayr eda do Cont Caricaturas sempre existizim, mesmo em, vais) Epocas mais antigas. S40 conhecidlas desde > imo periodo da civ slexandrina Nelas acentua-se 0 que € fisicamente fei No periodo barroco, existiam casicaturas pessoais e caricaturas privadas como, por exemplo, nos Carraci, em Mitelli e Ghezay mesmo em Bernini, Como observer amente Baudelaire, as chamadas caricaturas de Leonardo da Vinci nio sio asicaturas propriamente ditas, Na Idade Média, existia © quadto politico infamante que ena a execugio de uma pena capital in effigie E somente do Final do séeulo XVI que aparece — antes de qualquer outro, lugar, na Inglaterra ~ a caricatura ec 5 alo XIN, com Daumier, ela se transforma em campo Nao &, ponanto, o simples nascimento e em clevada e significativa ica, De 1830 em di revista La caricature, com pre transfor ikicas; “Uma noite de Valbu nécia a horripilante uubmundos clos quais humans) no elemento humano, A desfiguraglo pode seguir varias direcbes m € desfiguradlo, por exemplo, em (Em mento inconseiente da desfigurago prove chamados de posiivo © negativo, Fst Ultimo tira do homem o seu equitibric sua forma © a sua dignidade: ele ¢ Apresentado feio, disforme, mesquinho & ‘idiculo, O homem, coroamento da eriaclo, €wvltado e rebaixado, mas conserva seu carter h No inicio do século XX (..) a imagem d homem dest I igurado que subjuga 0 artista de man Anetra irresisivel vai se exibir sem Tha, naquelas imagens que, para ingémuos, parecem caricaturas ap qUC, realmente, slo geradas nas escuras fundidadkes > abisino, 4. ACARICATURA Pane oe coy Museu Pichkin Reece eed Entre a Idade Média e 0 periodo barroco, o tema da DT Tet) & mulher feia, cuja feidra manifestaria sua malicia interior CST ico) pie Oi ee Ley cet tener bee eT ame Oc eet cuit ete CEC Suncor CON LR ese eg ara 0 rosto feminino, mesmo dedicando-se & cosmética, advertia Tr BMC d ar Tok eran ee es ey Cy virtude.O problema da cosmética ¢ retomado no mundo cristo por Tertuliano, com impiedoso rigor, recordando que “segundo as Escrituras, ‘0s adornos para a beleza sempre formam um todo com Beat Eyl A oo eae eae et ae et ail alicenciosidade do mundo pagao), fica evidente a SUE Tete Ke tr) LU Perec teen art PMc ard OCMC T ee earns PERL eel lo CC Tc ICEL a ae Cen EET) co ue et cetit Pee Cee do tema da CUE COR CONC Met eed Le ahs Nile od da decadéncia fisica e moral, em es Eel ke Uo) PT re eis eed SU CuL alae airy SUL Cena ct oar burlesco, com 0 elogio irénico de modelos que se afastam dos c&nones Cry ee Se een ee eee ae imperfeices femininas como elementos de cite te AntiBeatriz i Velha danin Na Idade Média, para Dante (Purgatorio, XIX, 7-9),a sereia é na verdade uma mulher horrivel e balbuciante e 0 tema da “vituperacao da velha aparece em muitos textos como A arte versificatoria de Mat thieu de 1a Beroe (de cabeca calva, rosto rugoso, olhos remelentos, nariz escorrendo e halito Vendome, que traca um repulsivo retrato da velha e deprava repelente), ou como Os segredos das mulheres do pseudo-Alberto, que aceita um dito corrente segundo o q mortifero em virtude da retencao do al o olhar de uma velha (que se torna ie menstr al) envenena os bebés no berco. Algumas vezes topos da invectiva antifeminina aparece como reacao ao logio stilnovista da mulher angelizada e, assim, a mulher feia descrita por Rustico di Filippo ou por Cecco Angiolieri aparece como uma anti-Beatriz. 0 pice da misoginia é alcancado, no alvorecer do Humanismo, pelo rbaccio de Boccaccio. 0 narrador ama uma bela vidva sem ser correspondido e seu evidente ressentimento é expresso pela alma do marido, que surge do Purgatério para descrever a luxtiria e a perfidia da mulher, revelando ao pretendente, ja velho (quarenta e dois anos!), que ela esconde os seus cinquenta anos com cremes e outros preparados repugnantes, estendendo-se em detalhes repulsivos de sua feitira fisica, ‘VLA FOORA DA MULHERENTRE A ANTIGUIDADE E0 BARROCO Belos cabelos de prata Joaquim du Bellay (sée. XVD. es regrets , bela argéntea crina com graca torcid, 6 fionte serena e crespa, 6 face dourada! © belos olhios de cristal, boca adorada que dus longas pregas mostram descaida! Dentes de Ghana, 6 tesouro precioso, ‘que num s6 fiso faz a alma en: © belos seios, dignos de forma entalhada, © colo plissado de damasco suntuaso! © maozinhas gordas de unhas amarelas! coxa fina e magna e alentadas canelas, E tudo que, por pudor, nao posso elencar Belo corpo inefivel de membros gelados prodligios divinos, perdoem-me os pecados ols, por ser mortal, nlio vos ousarei amar. Cabeleira de prata Prancesco Berni (sée. XVI) Soneto a sua amada Coma de prata hirta pousada a sorte Sem arte um rosto auribelo eercando; fronte erespa que empalideco olhando, conde apontam setas de Amor e Mort: colhos de de tudo que nao thes patega igual s pérolas distantes, clos de neve onde ee en poral Iibion de let, na boes eles de Ano, as does, de modo incontete sto de mina Benvamada 2 bet ‘No tempo em que fui bela Pieme de Ronsard (sée. XV) Sonetos a Helena Quando fores bem velha, a noite, AIuz da vel Junto ao fogo do lar, dobando 0 fio € fiando, Diris a0 recitar meus versos e past ando: Ronsard me celebrou no tempo em q fui bela, Been aquela Que, ja sob 0 labor do dis dormitando, Seo meu nome eseutar ndo va logo scordando, E abengoando o esplendor que o teu ome revela Sob a terra eu irc, famtasma silencioso, Entre as sombras Sem fim procurande repouso, F em tua casa irs, velhinha combalida, Chorando 0 meu 4 F&O teu cruel desclém, Vive sem esperar pelo dia que vem; Goihe logo, desde ji, colhe as vida, osas dla ‘Teta horrorosa Clement Marot brasdo da feta teta (1535) Teta sem nach mais que murcha pele seea bandeira que flutua mole grande tetucha, longs teticha, feta bolacha, feta salsicha, teta tetucha do bico pontudo, igual a0 pontal do funil agudo, bamboleando a cada mencio © sem precisto de nenhum permeio, Bem se pode gabar quem te amass de ter metido a vera a mio na massa teta torrada, teta que pende teta pelanca, teta que rende Jama peguenta, mas nao leite quente Belzebu vai te botar na Para Ii no inferno aleitar-the a filha Tetinha que no pescoco se enrola anilia (.) unos ombros tal como antiga estola muitos de nds a0 te ver despontar sentem ganas de aus tabefes pegar nao a ti, tetinha, mas a sibila que te esconde amassada sob a axila Senhora Aldonza Diego Hurtado de Mendoza (sée. XVD 4 uma velba que se quer formosa Tu tens, senhora Aldonza, trés trinta anos, és cabelas, nao mais, € Um s6 dente, nos peitos de cigarra, propriamente ‘moram teias de aranha, sem enganos, Em tas sais, foucas e outros panos ‘io hi tanta rug como em tua fronte 1 boca € rasgada como uma ponte e excede a largura de dois palmos. Teu cantar & de mosquito ou ri 1 perna ¢ de formiga Tu fedes como um pe com teu lombo toto de cabra © com a pele de um frango depenado, As va feidra feminina Onensio Lande Que seja melhor se jue belo’ Paradoxos, 1. 1544) Alguns duvidam que seja melhor ser feio que belo ©.) Centissima coisa me parece que se Helena, a grega, e Paris, o pastor troiano, fossem to feios quanto foram belos, nem os gregos teriam tide tanto trabalho, nem Troia sustentaria 0 que fot seu exterminio final (.,) Vejamos agora que sio muitas vezes mais sibios os feios Co. Bsopo de Frigia, fabulador que os belos. E por Séc excelentissimo, tinha feigdes quaise nodo que qualquer um dos Baroni, comparad com ele, pareceria ‘um Narciso ou mesmo um Ganimedes; nem por isso deixou de exceder em todas e qualquer grande as virtudes ou de t ‘outro, um intelecto agudlissimo feiura foi Zenon, o fildsofo, ¢ feio ena Aristoteles, feio era Empédocles, feiissimo cera Galba, mas em engenho e elogiieneia, de todos sempre se mostrou lustrissimo (..) E quantas das belas mulheres que vém hoje em dia para a ‘gualmente pudicas? (..) Assim sendo, 6 feidra santa, amiga de castidade, Iealia sa que afasta escindalos, que abriga dos perigos, com ceneza conheces as eonversacdes mais Ficeis, delas retiras toda amargura, esmagas cada funesta suspeita tu, apenas tu, és finalmente o remédio Pant o citime maivoso, Gostaria de poder encontrar as palavras justas para louvar-te como 05 teus meéritos exigirian faria logo € de muito bom grado, pois de ti derivam infinitos bens e bem grande € 0 erro dos ignorantes que te deploram. 1. ATRADIGAO ANTIFEMININA A feitira dos homens Lucrezia Marinelli A nobreza e a exceléncia das mulheres 591) Se as mulheres si0, portanto, mais belas que os homens, que na maioria se mostram nudes © mal compostos, quem negara jamais que elas sio mais singulares que os homens? Ninguém, a meu ver. Donde pode-se dizer que a beleza na mulher € um maravilhoso espeticulo e um re admirivel, que nunca foi xddo © reverenciado pelos adiante € que mostremos que os homens sio homens. May quero que passemos ‘obrigados e forcados a amar as mulheres & que as mulheres no So obrigadas a ami- los de volta, sendo por simples cortesia (..) © homem tem necessidade de amar as coisas belas: mas que coisa mais bela que as mulheres enfeita o mundo? Nenhuma nna verdade, nenhuma, como bem dizem todos esses nossos contririos, que afirm: lampejar em seus formosos rostos a graca 0 explendor do Paraiso e por essa beleza sto forcados a ami-las: jé elas nao sio obrigadas a amar os homens, pois o menos belo, ou mais feio, ni € por sua natureza digno de ser amado, Pois texlos homens sio feios, quero dizer, em compuragio com as mulheres, nao sio les, portanto, dignos de serem cortespondidles por elas, senao gragas & sua natureza cortés ¢ benigna (..) Cessem (010s lamentos, os suspitos e as ‘exclamagoes «los homens que querem ser, a despeito do mundo, amados pelas mulheres, chamando-as crugis, ingratas € impias: coisa de provocar riso, mas das quais esto cheios todos os livros Poéticos, No Renascimento, a mulher feia aparece antes como uma anti-Laura: em divertimentos como os de Berni, de Doni ou de Aretino - e também em textos andlogos franceses (Ronsard, du Bellay ou Marot) ~ manifesta-se, de fato, um claro antipetrarquismo. Nessas poesias ndo ha mais aversao: a visdo da deformidade ora é jocosamente irénica, ora é afetuosa. O proprio deperecimento da mulher que envelhece se transforma em melancélica reflexdo sobre a beleza em declinio, E é justamente no periodo renascentista que surgem algumas reflexes que questionam a condenagao do feio, Se Ortensio Lando, antes mesmo do elogio da feidra de Rocco (citado no capitulo anterior), js refletia satiricamente sobre as vantagens da feiira feminina, Lucrezia Marinel em um espirito que poderiamos considerar pré-feminista, vira a tradicao de cabeca para baixo e exalta a beleza das mulheres em oposicao 4 feitira dos homens, oncepcao classica da arte, fundada acao di ias da natureza, com o Maneirismo ha uma reviravolta. A tendéncia hoje ¢ marcar 0 inicio do Maneirismo com uma data certame ional, 1 Ja morte de Rafael. Se antes se falava de lo de um determinado autor « ira para indicar oe: seguida, um modo repetitivo de remeter-se aos grandes modelos Precedentes, agora se define o Maneirismo como a época em que o artista dominado pela inquietacao e pela “melancolia’ nao se volta mais para o belo como imitagao, mas para 0 expressivo. Os tedricos do Maneirismo enunciam a teoria do engenho, sendo a /déia, desenho interior concebido pela mente do artista, uma manifestacdo, dotada de forca demiuirgica, do divino que o habita. A deformacao é, portanto, justificada como recuse simples imitagao e das regras, que nao determinam o génio, mas dele nascem. O maneirista tende a subjetivacao da visdo: enquanto a Perspectiva monocular dos renascentistas visava a reconstrucao de uma cena como se fo: € vista por um olho matematicamente objetivo, o artista maneiris lissolve a estrutura do espaco classico nas vi Des saturadas e desprovidas de um centro privilegiado de Bruegel, nas figuras distorcidas e“astigmaticas” ¢ le El Greco, nas fisionomias inquietas e irrealisticamente estilizadas do Parmigiano. Temos ent 0 uma escolha do expressive contra 0 belo, uma tendéncia ao bizarro, ao extravagante e ao disforme, como nas figuras de fantasia de Arcimboldo. Com maior propriedade, o gosto pelo extraordinario, pelo que pode despertar assombro e maravil ambiente cultural a aprofunda-se no Barroco e neste 10 explorados os mundos da violéncia, da morte ou do horror, como acontece na obra de Shakespeare e dos elisabetanos em Yeral, ou nos Sonhos de Quevedo, chegando mesmo a reflexdo mérbida Sobre o cadaver da amada, como acontece em Gryphius. Dessa maneira, M rismo e Barroco nao temem recorrer aquilo que, Para a estética classica, era considerado irregular. Assim, o tema da mulher 2 também muda de perspectiva: as imperfeicdes da mulher sao d scritas ora como elementos de interesse, ora co no estimulos voluptuosos veremos mais tarde como tal comportamento é retomado tanto pelo Romantismo qua (0 pelo Decadentismo, por autores como Baudelaire, Para citar apenas um nome Gioxsion Ja a cavaleiro dos séculos XVI e XVII, encontramos dois textos significativos: Montaigne elabora um afetuoso elogio das mulheres mancas e Shakespeare, embora pareca depreciar a sua Dark Lady através de uma série de negacdes das caracteristicas tradicionais da beleza, conclui com um “porém”: apesar dos pesares, ele ama a sua musa. A poesia barroca vai além disso: surge o elogio da ana, da gaga, da corcunda, da vesga, da bexiguenta e, contra a tradicao medieval das faces vermelhas ou rosadas, Marino exaita a palidez de sua amada. Se a primeira beleza feminina exigia cabelos louros, agora se faz 0 elogio dos cabelos Negros. Tasso, em suas Rimas, jd escrevia:“Morena és, mas bela - qual a roma donzela’ e Marino elogia a beleza de uma escrava negra. Tocante é 0 elogio da bela velha em Salomoni e, se o texto de Quevedo ainda parece tradicionalmente adverso, ndo é o que acontece com o de Burton, onde a transbordante descricdo de uma mulher horrenda reafirma que 0 amor pode ir além da oposicao entre feio e belo, William Shak: A tempestade, 1, 2 (1623 Prospero ~ Bscravo vil, que 0 diabo ical cals Seer fn Trou Je conv harco com per Cm sudeste — 8 cubea inteiros de bolhas. Prospero = S6 por falar assim ta va Does ay de perder 0 fo Pior que a outra Caliban = Bu quero 0 meu jantar A ilha € minha, da mae Sycorax Que vocé me tito. Logo « Q BO que ve afagava, mimaya, inda me Maldito sca Tots os encanios Scag bareuns meios Je expressos. Mas Nestas pedras, guardando para Imas boa: , aia to N Prosper avo mentiroso is ie : A bonta de minha fia Spode p paginas precedentes {eas Cranach, Aonte da juventude, 1586, 8erlim Gemaldegalerie Georges dela Tocador de tara, 1628-1630, Nantes, Musée des Beau Arts Bartolomeo Passerott Comedar debra, s,s XV Mila, ‘colegio particular Michelangelo vetho Meu corpo nada mais é wins, e pele £0 cal Até as aneas pre Je muletas 1 Fe : duando esta hora ¢ z radas, 5 E uma opressio que vem deliberada A noite, na outra precise Ricardo I tur mn arroso alent William Shakespeare ) Ricardo Mtl, 1, 1 (1597) Que adiantou fa s criar Mas eu, qu af tejar um ¢ Aa tanto val nidemente sou © marcado, © que nai jutrora, aqui az tho. a majestade do amor para pobre, velho ¢ it alheio pavonear-me diante de uma n a ue, se nao morro 1e desfaze eu, que privado s harmoniosa propor ro de formacac Asi mesmo bra da natureza enganadora, disforme Andreas Gryphius (sé acabado, langado antes do tempo para Noite, lumeinosa noite, 1, 48 este mundo que respira, quando muit Tenho horror de mim mesmo. meus feito, e de tal modo imperfeito © t nembros trem fora de estagio que os cies ladram Quando 0s labios, 0 nariz, o olhar quando passo, coxeando, perto deles, encovad Pois ¢ fe mole e ocioso tempo de Cego pela vigilia, € 0 alento pesad paz, nao tenho para passar o tempo outrc Contemp -us cilios mortos ji nen Jeite sendo contemplar minha sombra Com as palavras cai a lingua, negra d Je. E assim, ja que nao posso secura set amante © gorar estes dias de priticas Balbuci ue; a alma ex Wes, estou decidido a ser um vil chama feroz ¢ odiar os prazeres destes dias (O grande consolador, a carne cheira ser As d Mas desde os primérdios do periodo maneirista ganha espaco também. uma reflex melancdlica sobre a velhice masculina e uma dolente piedade vibra nos versos em que Michelangelo ou Gryphius pintam a sua prépria feidira senil. Tem inicio também uma reflexao piedosa sobre uma feitira que produz dor e ao mesmo tempo maldade — outro tema que sera retomado pelo Romantismo. Basta observar 0 modo amargamente piedoso com que Shakespeare coloca em cena 0 sofrimento de Caliban ou de Ricardo Ill, sugerindo que teria sido o olhar hostil com que 0s outros consideravam a sua feiura que os tornou maus. ‘A mesma compreensao pelos defeitos humanos aparece igualmente em varios pintores, cujos retratos de rostos desgraciosos nao pretendem. zombar dos desventurados nem representar o mal, mas mostrar a doenca 0u 0 inelutavel labor do tempo. Heinvch Foss, oe Cena Panett eas Ct 1. Do Satands rebelde ao pobre Mefistéfeles eR Er eee RT CLOUT EE nT eye TS elle heal w oT eC Rem RC uS Cuneo ei CTA eee Ke Rules ee eae ery Cech eu Re UT RUE eu c) See eee eres eee ee RU RUS ee Re eso P ee aCe ke once) TS SACS DU eure Ren ee a ty Cee ue eau URES kee Sr hg ST Bu Ru co DR STEEL CeCe CU cele Ce cel 1 aE COO eet ea eect) Ee eet ues hate tire ent LT eee CIN ar ker ied feel Lk ae eee Nee AEE RU ue Mount ur ec) Se OR CUC Mu Ue ic eects Murda a} CEO SIU Ciera ie Rear ay Dee CRORE une ue Recent: eee en Ci uncon eee od acu Ma ae cara kta Do UE ee Rue Mu ee eet) CSO Ce Ure Ter cr ented Se UR ei yr ee Rete ey € recusa-se a pedir graca:“Melhor reinar no Inferno que servir nos céus! Vl. 0 BIABO NO MUNDO MODERNO Wiliam Bake, Satandsataca 16 «com as chagas, llustragao do Lire de J6,RA 2001 68, 1826, Nova Yor, The Perpoint Morgan brary emface Joseph Anton Koch Ointerno, 1825-1829, Roma, Casino Massimo, fe Dante ifer Dante Alighieri (1265-1321) Inferno, XXXIV. (0 imperador do re linha, do gelo, sobrealgado o peito austicante mais posso comparar-me colum gigante do que um gigante eom seu braco, a jeto ‘Com que inaudito espanto, de repente dliviset-the a cabega desdobrada twés faces: uma rubra, mais a frente eas outras duas, cada uma plantada ronco, ¢ juntas aflorando 10 dpice da inte alcandorada A da direita era oere, ao branco orgando, 2 cor possuia que no alto Nilo 0s rostos vio mostrando. De cada qual abaixo asas havia, de modulo e tan no mar vela maior inho apropriados ados, ndo tinham pélos; Dite as agitavs, E tais as dos vampiros en produzindo tré ventos variados. Dali todo 0 Cocito enregelava dos seis olhos um pranto permanente Em cada bd tres queixos Ihe tombaya, ca triturava a dente ‘com a espadela a0 linho, um condenado; Plutio Torquato Tasso Jerusalém libertada, WY, § 4-8 (1581) Horrida majestade 0 aspecto feio Lhe torna mais medonho e soberboso; olhar sanguineo, de veneno cheio, Cometa infausto, esplende pavoroso; Acoberta-the 0 queixo « hirsuto seio Longa barba, pélo dspero © asqueroso, F, a semethanga de voragem funda, Abre a boca de negro s: Sataniss Giovan Battista Marino A matanga dlos inocentes (1632) Nos olhos, onde migoa alberga e morte fulgura uma luz turba e vermelha © olhar obliquo de funesia sorte neta que maldade espelha Das ventas € da boca qual um corte fedor e eva vomita em parelha Iracundos, soberbos, consumidos, rovOes seus Sopros, raios os gemidos © fascinio do rebelde John Milton Paraiso perelido, 1, 62-155 (1674) Nove vezes o dia e nove Ele com sua multidao horren| A cair estiveram derrotados Apesar de imomtais, e confundidos Rolaram nos eachoes de um mar de fogo. Sua condenagiio, porém, 0 Para mais fero horror: e ver eda Jo agora Perdia a gloria, perenal a pena, este duplo prospeeto na alma 0 punge Langa em roda ele entito os tristes olhos Qu mensa dor & Sobetba empedernida, édio constante Fis quando de improviso ve contempla, Tao longe como os anjos ver costumam, Mterrivel mansio, tor s va espantosa, Prisio de horror que imensa se aredonda, Ardendo como amplissima fornalha. Mas luz: nenhuma dessas flamas se Vertem somente escuridio visivel Que baste a por patente © horrido, quadro Destas regiées de dor, medonhas trevas Onde 0 repouso e a paz morar nao podem ‘Onde a esperanga, que preside a rude, Nem sequer se lobriga: 08 lesgracados smindvel afliglo lacera fogo um dildvio alimentado De enxofre abrasidor, inconsumptivel A justica eternal tinha disposto Para aqueles rebeldes este sitio (.) Ele impeliu-me a combater 0 Eterno, E trouxe Inimera aluviao de armados Genios yo as férvidas batalhas Que dele o império aborrecer E, a mim me preferindo, opor quiseram, Nas planicies do Céu, em prélio dubio, As forgas proprias as opostas foreas Fave Que tem perder-se da batalha Jo-lhe tremer o empireo s6lio. campo? Tudo nao se perdeu; muito inda Indémita vontade, ddio constante De atris vinganeas decidido estudo, Valor que nunea se submete ou se rende (Nobre incentivo para obter vitoria), Honras silo que ha de extorquir-me Do Eterno a ingente forga e inteira Perdao de joethos suplica humilde, the Acatar-Ihe © poder, eujo alto império No ambito inteiro vacilou ha pouco pelo impulso e terror de minhas Fora abjeta baixeza, infmia fora Muito piores que este infando esirago! WAS REBELDE AO POBRE MEFSTOFELES ee SI Pia) 2 (2 inumerivels mf Lens Morison Um pobre diabo Penetra ni : Faust, Johann Wolfgang von Goethe sio eles) S i «arta tear Fausto ( mais pe comer a em Gd Mefistfeles ~ Quem sou eu? Parte da ( Fausto ~ i sei o que és, € Gerad Philipp, fora ee oe ‘ema Beaute du diab, que, empenhada no mal, o bem X ae, al dieqBo de René Chi ©) exnper 950 Sou o espirito que estorva sempre, €com —_tode razao, pois tudo quanto nasceu merec poeste a tomar de sm ninhati ser Mefistifeles ~ Con: 00, ¢ fi © oposto ao Nada, © Que Quer Que aniquilado, portanto era melhor nilo te post f E que existe, o mundo bronco, p asc que mi vulne vel Meu elemento 0 que chamai mais que em our fica-me sempre ile h Destruigo, Pecado, 0 Mal, em su aerojo onddas, procelas, alo verdade cha. Retro baz mar ficam serenos. Cada homem (microcosmos de loucuras) ois a ralé nojosa, a corja humana, imagina-se um todo, ¢ conte niio hi de meterthe dente! Ando, ha ine da parte que era a que tempos, a matar entre eles, sem parte da treva, mie da luz, sim, dess parar na faina, ¢ a espécie a medrar nidosa luz, que a sua mie sempre em sangue 5 io Giente €4 ft, do Oma e & Thos hi de usuppar, quem the de ean mee Se mo pile of Se no Dr. Fausto de Marlowe (1604), Mefistafeles ainda era feio e se, ainda O diabo de Cazote a um spaniel de pelo stoxo raz dos abel.) Vestose no século XVIll, no Diabo enamorado de Cazotte, aparece sob a forma de debe onaade (172) asa Ghai sascariee um camelo, no Fausto de Goethe ele se mostra como um cavalheiro Pronuncio a evocaglo em voz clara © diabo de Dostoievski adequadamente vestido.€ verdade que se aproxima de Fausto nas vestes ested. depos aumento Roi Deis diab de Mann de um cao negro que inicia, em sequida, uma inquietante transformacao, Sleeps racks Emumscnhor ow melhor oma, ovo Fausto 3947) assumindo a forma de um hipopétame com olhos em brasa e garras Um eilafnio me percorre as veias e especie de gentirhomem muss £ um homem de corpo um pouco horrendas, mas por fim se manifesta em vestes de clérigo errante, de um escaos seme eg na abe, “gu rat a cinguartain, como. mace namerte me Fae eara oloune area ia ROR \ancwcuom hee Mea | E diabolico apenas na medida em que ¢ dialeticamente insinuante e Pe beet stoners eratatwterudsgn | feyenypunily ees asta | convincente e faz com Fausto “como o gato faz com 0 rato’ Por outro lado, fomente de vz mats ofuscante que ponta lado aparecia a ele nao precisa de muito para seduzir Fausto, pronto para estabelecer ey altho us isccap aimee ia comércio com 08 espiritos, quase como se fosse um desejo seu ir a0 tas dimensdes quay na forms, Glowanel Papen 2 cic o& clos. veawielienies encontro do diabo e nao o contrario, parece as orelhas, © deménto me disse ssto, com a ponta do nariz Mefistofeles prenuncia, portanto, uma terceira metamorfose do diabo. No Gi es Die ac cache Sllds abviay Steno cule ena ees século XX, ele se tornara absolutamente “laico” (ver Dostoievski, Papini e Bapea avin samesiiia i, evasion tos auc ue ee pate eaten Gea Mann): nem aterrorizante nem fascinante, infernal em sua mediocridade Purigo, respond. “Che twot jrentode que vireddermise que! Hodes eats Geraimeo cian da © em sua aparente mesquinhez pequeno-burguesa, ele agora é mais Ce fetetbemeuwlice se |” eames aa ie Perigoso e preocupante, pois jd nao inocentemente feio como se fem, disse eu, sob a fogna de Sete de partoular a Bos out bemoan nice susie costumava pinta-lo FROMM Gio. chats EL pacidy einmaigas De auoe ue minke eine oeen . Gabel ao centro dasa e ' Sofwancenas ese pene quse na mange os ma eae LL LCCC nnn nnn ee wO << « do Anticristo Jos primeiro: Montier-en-Der pestiferos, Hi m de ca bai tados pela . yar c © 0 rosto 4s como Daniel r Adso de Hildegarda de Bingen, insist feitra 4 F aica Miguel Psellos nfinitament Liutprando de Cremona oe i 30 horrorizada dos habite c \e tui, para muito: empre foram também amente, 05 inimigo: ate 0 horror em relagao aos leprosc Vl. 0.D1A80 No MUNDO MODE pastor da rela luterana (no centro) selaum pacto com um menestelouum louco ecomo dabe, de Thomas Mumer, Von der Grossen Lutherschen Marten, 1522 No mundo moderno, que sempre representou o inimigo religioso ou Nacional com feicdes grotescas ou malignas, nasce a caricatura politica Foram ferozes, na época da Reforma, as caricaturas com as quais Protestantes e catdlicos representavam o papa e Lutero, Durante a Revolucao Francesa circularam caricaturas legitimistas que Tepresentavam os sans-culottes como canibais sedentos de sangue. Entre os séculos XIX e XX temos a caricatura anticlerical, Os patriotas italianos oitocentistas caricaturavam ferozmente o opressor austriaco (embora um texto delicioso como o de Giusti, apesar de descrever inicialmente a feitira dos ocupantes, depois se enternece com aqueles Soldados distantes de casa, devotados a rezar para um Deus comum). Mas em toda guerra o adversério é representado como monstruoso. Um certo Berillon escreveu, durante a Primeira Guerra Mundial, La Polychésie de la race allemande, onde demonstrava que o alemao medio produz uma quantidade maior de matéria fecal que um francés, € de cheiro mais desagradavel, Erica a seara de caricaturas antinazistas e antifascistas, mas 6 igualmente feroz, sobretudo durante a Guerra Fria, a caricatura anticomunista Ce Os exercitosaliados contra o Kaiser, emLe petit) 23 de setembro de 1914 James Gila, Uma familia de sans-culottes recupera-se depois da fabura dajomade, . publicado por Hannah Humphrey em 1792 eae TaD Bt Lat. —f 193 ie ae OPES la Farictane ag A Famaly of Sans (idole refesSing efor Uefigues of the day A excravaa de Fu Manchu (1933) ma grande pedr coral. Estava ali me das amplas mangas da doutor Fu Manc Encyclopaedia Britannica Vrias feigbes de seus zigomas altos, fi ada, natiz cut, la Anatomia da raga Cesare Lombroso Sobre a ongem ea variedade das tans, LI S71) estupenda harmonia das formas: n: longo demais, nem redondo demais, nem Jemasiado pontudo ou piramidal. Em sua fonte, plana, vasta, ereta sobre o rasto, ou magas do rosto, nao sto distantes demais e 0 maxilar nao se mostra muito Alex Raymond, roeminente; por isso é denominado, Mina régnato. O crinio do mongc fem Fash Gordon contririo, é redondo ou piramidal, com es Syndicat, In as magis do fosto muito distantes entre s sendo chamado eurignato, a esses ‘eabelos, a obliqiidade d livacea. (...) Mas o hotentote Tran retine as formas mais disparatadas das totalmente proprias, as quais companitha pmo dele. Ao focinho saliente di mistura 0 focinho alargado d 1 forja na. O cabito, que & um oss ets de uma escovinha de roupa, de Como sustentaculo para a missdo civilizadora do homem branco, a representacao do africano sempre foi impiedosa, nao somente na narrativa e na pintura, mas também em textos de carster cientifico como aqueles de Lombroso. Mas a ideologia do “fardo do homem branco’ levou muitas narrativas a criar caracteres repulsivos referentes a qualquer etnia nao-européia, do érabe desleal aos thugs indianos estranguladores, para nao falar dos incontaveis chineses de rosto sinistro, mestres de todo tipo de crueldade. E isso aconteceu também nos quadrinhos: basta lembrar de Ming, de Alex Raymond, na saga Flash Gordon, cuja perfidia se mostra evidente em seus trasos asiaticos, ou nos inimigos de James Bond, nos romances de lan Fleming, que, muito mais do que nos filmes, 40 quase sempre mesticos ou agentes comunistas, e sao verdadeiros monstros que parecem construidos no laboratério de algum mad scientist. lan Flemin; 007, Missa A primeira jonou Bond foi a falta de proporcio de a figura. Era baixo, talvez um nsco e peside impressao de ter sido construido ‘com pedagos tirados de outras pessoas, Lésbica ¢ sov Jan Fleming 007, Du Rissa com amor (195; Tatiana abriu a porta e, enquanto permanecia de pé sustentando ‘ olhar da mulher sentada atras de de repente de onde conhec quele cheiro. Era o cheito metr6 de Moscow numa noite quente, um perfume barato lissimulava eflavios anim Na Rassia, as p literalmente de per importa se tenbam. io © tinham feito (..) A porta do quarto de dormir se abtiu e "Klebb” apareceu lum sutia formado por duas ross le seda anificial e calgoes 4 moda elistieos acima dos joel De uma abertura da ca destacava-se um joelhe Parecido com um coco bem ido para a frente na Pose classica de manequim. (..) Rosa Klebb tinha tirado os éculos € coberto 0 rosto com uma pesada camada de base, po-de-arroz ¢ mais feia e velha is do mundo. Levantou um braco e acendew uma Himpada vermelha sustentada por ma estatueta de vidro representando uma mulher nua. Em seguida, batew levemente no. sofi, a seu lado. “Apague a luz central, minha querida, O interruptor fica bem ai, perto da porta. E venha ci, sente-se aqui 1. meu lado, Precisamos nos conhecer melhor Dr. No fan Fleming 007, Licenca para matar (1958) Era pelo menos quinze centimetros. mais alto que Bond, mas seu porte 1 parecer ainda mpletamente calve até 0 queixo Sutil, dando assim de chuva de cabega para baixo, ou melhor, pois a pele tinha um vel dizer a idade de ‘do tinha profundamente cavadas sob 0 zigomas altos e pronunciados, ram lisas como marfim, As sobrancelhas, que recordavam pequena complet expresso sobre uma: sutil e que Permanente, denotava apenas crueldade © autoritarisme, © queixo, fugidio, como Bond ligeiramente deslocado de lado, que dava a impressio de que as vértebras do. pescoc rigidas Aquela estranha figura gigantesc parecia uma ¢ surpreso se se soltar para desliza © doutor N metros deles ¢ m-me py mio aper disse com voz inexpre ue nao posso", Ergueu lentamente as mangas. *Nio tenho mios. Mr. Big fan Fleming 007, Viva e detxe morrer (19 bola de futebol, tinha duas ‘© timanho normal ¢ era quase absolutamente esférica Ac Ja pele ostentava um negro a era inchada ¢ ado uma semana dentro de um rio. Nao tinha cabelos, a excegio de um tufo Também era desprovido de cilios ¢ sobrancelhas ¢ os olhos eram re alguma coisa, parecia que devoravam 0 objeto de sua ateneao, Eram levemente saltados ilatadas, Eram 0s olhos dk © agora os tinha ilargado completamente pondo A mostra os dentes e as gengivas MRS. PRUNEFACE 2. ADEMONIZACAO DO INMIGO SHAKEY THE BROW Nossa viagem pela feitira do inimigo nao pode se concluir senao com a primeira aparicdo daquele que serd o Inimigo Galéctico, The Thing, a Coisa, : . " 0 Inconcebivel. Em Lovecraft, este ser amorfo ou pegajosamente ‘ polimorfo é ainda deste mundo e representa nossos terrores inconscientes, mas na ficcdo cientifica (romances e filmes) ele sera apresentado como o invasor “alienigena’ o Bug-eyed-monster,o monstro de olhos de inseto que vem do espaco, barbaro no sentido mais ancestral ‘ A do termo, ameacador e inassimilavel, pois totalmente desumano. Ele é a personificagao de cada inimigo e vem confirmar a ten ncia dos seres humanos a representar aquele a quem se deve odiar como desprovido de qualquer forma, fazendo dele, sempre, a Ultima encarnacao do Diabo. ai o satanismo, Sa smo Pe cc Seres diabélicos capazes de feiticarias, filtros magicos e outros eT eae Le La ee et et ee ato) Cree toe eet ee ee Le ated EER CCR trek uaa’ Sr ree Ket Mu ene ecm tay Ce ae uci ary Cee Me et tet el cere eine De te eee er rt) Fee Ue Cen cre heath ttre (as feiticeiras), gracas a uma espécie de radicada misoginia o ser maligno Ce eS mun eee eee Dr et ee ue brs Rom ict Rone tol Por uma mulher. De fato, na Idade Média ja se falava do sabé como uma NE ou Wu Our eee mas também a verdadeiras orgias, mantendo relacées sexuais com 0 Du ei Reet ere a Te ur ee ee aiken ai ied RO oe ee eae et ine ROOM eter tei BOE UC Ura Oe runes ieee eat ete CT eau eer ee ee et eee eu io Rk kerlee ta eae eet ete Eee ret eet aed UC an Cuan eri ad eet at Transformado em asno Existem, na Idade Média, documentos de condenacao das bruxas, como uma bula de Alexandre IV, de 1258; também os tedlogos falavam de feiticeiros e necromantes, como é 0 caso, por exemplo, de Sao Boaventura que adverte:"Em razao de sua sutileza ou espiritualidade, os deménios. em virtude de sua sutilidade e de sua poténcia, podem se introduzir no i Corpo do homem e atormenta-lo, a menos que sejam impedidos por um ae Poder superior” (Comentario as sentencas, Il, 8). As bruxas, contudo, ndo Constituiam uma obsessao para o mundo eclesidstico rf Contrariamente a opiniao corrente, a idade Média nao foi a época em que ‘ ae 98 processos contra as bruxas se difundiram. Foi antes a Idade Moderna, As parcas como prova o fato de que a mais rica iconografia sobre as bruxas comeca ; No século XV. A Inquisicao nasceu no século XIll, mas se ocupava eet Principalmente dos hereges. No entanto, em 1484 aparece uma bula de Inocéncio Vill contra a feiticaria, Summis desiderantes affectibus, e 0 papa s encarrega dois inquisidores, Heinrich Kramer c Jakob Sprenger, de atuar Feiticeiras de Horacio 4 le com severidade contra as feiticeiras. 7 Foram eles que, alguns anos depois, publicaram 0 Malleus Maleficarum (Omartelo das feiticeiras) tratado maximo contra a feitigaria, no qual se i ensinava como reconhecer tais infelizes, como interrogé-las, como submeté-las a tortura para fazé-las confessar seu pacto com o deménio. ll ee trade Meri 2 € realmente bru Hist de Meri Assim, 0s processos e a condenacao das bruxas & fogueira ou ao ooseeny Es Se ear: Nae ere Beet ese enforcamento explodem entre 05 séculos XVI e XVill,ndo somente no mundo wocafam Satands e foram desviadas por Ch Pence oe can ‘atdlico, mas também e sobretudo no mundo protestante (visto que Lutero ogre shi ma bara Ho ~ que en as definia como “prostitutas do diabo acusando-as de roubar leite, suscitar ene tempestades, cavalgar bodes e atormentar criancas no berco) endo apenas na alvacio e desparrando-se catélic na Europa, mas também e com particular viruléncia na Nova Inglaterra, onde Os sacerd n exomtar io ficaram tristemente célebres os processos de Salém, em 1692, que mandaram Ee ae Para a forca dezenove mulheres. As feiticeiras apareceram muito na literatura Pell ura es esta (2 ath basta pensar nas bruxas de Shakespeare e naquelas da Noite de Valpurga, mtos, male 3, €8¢ no Fausto de Goethe. Mas a literatura mais rica nesse aspecto refere-se a Ee Ee GEE ae polémica sobre a feiticaria. Enquanto Cardano sustentava que as bruxas nao tines (.) que o flagelo ek: Passavam de mulherezinhas supersticiosas (antecipando a interpretacao Psiquiatrica moderna), acreditam na bruxaria autores como lan Wier lecretan ue lode (De praestigiis daemonum, 1564), Jean Bodin (La Démonomanie des sorciers nencionados inquisidores Spre 1580), Martinho del Rio (Disquisitionum magicarum libri sex, 1599), Francesco * i Maria Guazzo (Compendium maleficarum, 1608), Joseph Glanvil (Saducismus ; triumphatus, 1681) e Cotton Mather, que teve um papel (embora controverso) i sciulis (pessoas Nos processos de Salém, Tentativas de desmitificagao tiveram lugar apenas no s. século XVIII, com autores como Tartarotti (Del congresso notturno delle lamie) Mas mesmo com o fim das perseguicdes, a imagem da bruxa nao desapareceu, Ela sobrevive na literatura fabulistica e retorna também na literatura de terror, com escritores como Lovecraft. Porém, 0 que interessa a nossa histéria € que na maior parte dos casos as vitimas de tantas foguelras foram acusadas de feiticaria porque eram feias Ea respeito de sua feitra, inventou-se que nos sabas infernais elas poderiam se transformar em criaturas de formas atraentes, mas sempre marcadas por tracos ambiguos que revelariam sua feiura interior. Sahator Rox, A Noite de Valpura fen Aone Wolfgang Goethe Gra ai vem jt decerto chegando 0 160-1649, Faust rebuligo Te eter Noite de Santa Valpurga (887) que vem povoar este montés deserto, steey Ui Fogo-fatuo, Fausto Mepis mas horas do feiigo {Ui que algaravia! Bufidos € pios De Brocken ao rochedo corre, comer am levantados gaios, papa verde (.) serio salamandras? E aquelas , unido bando seja. Posto de alto AIMEE sl bragos, qual polo tao! Por cna da flha, mais do pedrewulho, Mera alzadas, toca emproadas feaanga ragada com todo 0 banlho Pgindo scrpenes rio se apanh ralé variegada, mntanhva. : azoinado redemoinho. ( Fica melhor a n6s outros esta andadura Je ver tudo a rodopiar Se tudo vai ao pago do Grio-Perro, n° de ver tanto, horrendo esgar oa uns penedos desalmadk leve Meftetes 1 dante, arvoredo? h P As corujas pelo at esvoagam de med ( ’ © Sei bemdotada tudo em medonho caos n precipita, rodilha a trovejando silvando até o fundo abi mo faz uma vela com que a amantilha. ( das v LV, BRUXARA, SATANISO, A aldeia das bruxas Howard Phillips Lovecta das bruxas, dos adoradores de fe das estranhas presengas na floresta, er mpreensivel que se evitasse aquele habitantes da localidade:atingiram repelentes (..) Forinam atualmente quase repe ne, com estigmas bem uma raga a parte, com esti definidos de regressao fisica e mental Ame dol \ém, nem mesmo quem tem ‘conhecimento dos horrores. mais recentes, sabe em que pé as coisas estio em Dunwich, n da sombra das grandes colinas circulares foram invocadas, ¢ elevaram-se selvaigens pre rgidsticas, respondidas por strondos dos subterrined Fm 1747, o reverendo Abiiah Hoadley smasiado universal para serem negados, ¢ que as Vozes malditas de Auizel e Buzrael, de Belzebu € de Belial vindas do Subsolo foram. ouvida por indimeras Testemunhas dignas de F ainda vivas. Eu mesmo, nio mais de quinze dias atris, eaptei um Discurso de Forgas Malignas na Colina atris da minha asa, durante ¢ jocalhar € Ribs um tal de © Assoviar que Coisa alguma nesta ‘Terra Wem daquelas Cavernas que 5 Magia negra pode revelar © s6 0 Diabe pole abr Sonhar as bruxas Patrick McGrath Kitchener Street, que fica lado do canal, mais leste (..) No alto da pona de trada havia ma Iuneta suja em forma bem um deposit fe sol poente, havia ta de carvio acessivel através de uma porta nue se abria para o corredor de baixo e diva para um lance ingreme de escads Todas as pegas da casa eram pequenas, desordenadas e com pé-direito bap warede's dos quartos tinham sido forradas nuitos anos antes © o papel, stava descolando ¢ desbotava em pontos; as grandes manchas que s ilastravam com seu cheiro de argamassa formavam estranhas figuras sobre Mais tarde, subia para o meu quartc Ficava na parte de tris da casa, soby cescaclas, e da janela se via 0 patio e, mais : ° ido da casa provavelmente o mais tin havia uma grande mancha na parede em ente A minha cama, onde © papel tinha ransformayam-se em P te ua jazia acordado €, 2 Wwa no quanto, observava aqueles inirava no quanto, obse 1 A ele, um espirito danado por cus pecados conira os homens, que maligna de uma velha parede de periferia As vezes, a bruxa deixava a parede ¢ eu eta cheio de pesidelos) ¢ ent quando despenava atertorizado, poi fea guinchar malévola no canto di quarto, com a cabeca envolta as € os olhos cintilantes no m a horrivel pele pustulenta, enquanto o Fedo Je seu hilito empestava o ar; entio, pulava sentado na cama, gritando, € sO quando minha mae vinha e acendia a inha que deixar 0 abajur aceso 0 rest Francesco Sahat Astrs parcas 1550 Florenca Galleria Palatina Wat Disney, Branca de Neve dinegso de David Hand, 1937 6 Disney

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