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Conceitos Basicos de SOCIOLOGIA aulo Gai Prod Editoragio: Conexdo Editorial Produgdo Editorial: Adalmrir Caparrds Fogd 5° Edigho— Revist Tradugdo: Rubens Eduardo Ferreira Frias rard Gi laura Dados Internacionais de Catalogago na Publicagio (CIP) a Brasileira do Livro, SP, Brasil) Weber, Ma, 1864-1920 | Concsitos bisicos de socio ttadugto de Rubens Eduardo Pet « Gerard Georges Delaunay ‘io Paulo : Centauro, 2002 ISBN 978-85-88208-26-1 Cincias sociais ~ Discursos,ensais, conferéncias 2. Weber, Max, 1864-1920 I. Titulo. cpp. indices para catalogo sistematico Weber, Max : Teorias : Sociologia 301 2008 CENTAURO EDITORA Travessa Roberto Santa Rosa, 30 02804-010 So Paulo - SP el 1] ~ 3976-2399 Tel Fax 11 ~ 3975-2203 E-mail: editoracentauro@terra.com br www centauroeditora.com.br SUMARIO Prefiicio Prefiicio da Editora Sobre o Conceito de Sociolo; “Sentido da Conduta Social Formas Caracteristicas de Ago Social OConceito de Relagao Social Tipos de Acao Social: Usos, Costumes O Conceito de Autoridade Legitima Tipos de Autoridade Legitima: Convengio, Lei A Validade da Autoridade Legitima: Tradigao, Fé, Lei OConceito de Luta Comunidade ¢ Sociedade das Relagdes Sociais Relagdes Sociais Abertas e Fechadas Responsabilidade pela Conduta Social Representacao O Conceito de Associacao e Seus Tipos Tipos de Autoridade Numa Associagio A Natureza da Autoridade Administrativa e Regulamentadora nas Associagdes A Natureza da Associagio: Associagiio de Empresa, Associagtio Voluntéria e Compulséria Os Conceitos de Poder e Dominagio Tipos de Associacies Politicas e Religiosas PREFACIO. A metodologia sobre a qual se baseiam estes conceitos introdut6rios pode parecer abstrata e, portanto, algo distante da realidade. Contudo, nao se pode dispensar a esmo estas ‘considerages metodolégicas, embora nio exista nenhuma reivindicacZo quanto & sua originalidade; em vez. disso, sua meta ¢ formular uma terminologia mais utilizdvel, bem como mais correta, para conduzir claramente o verdadeiro signifi- ado de qualquer ciéncia social empitica em sua preocupa ‘eo com conceitos semelhantes. Isto sera verdadeiro mesmo ‘onde termos novos e niio-familiares forem empregados. Por esta razdo, poder’, ocasionalmente, soar como algo pedante. No en‘anto, comparado ao ensaio Logos IV (1913, pags. 253 € segs, reimpresso em Ges. Aufs. z Wissenschafislehre, 2° igs. 427 e segs.) a terminologia tem sido simplificada Guando possivel e tem sofrido, portanto, freqtientes mudan- 8, de modo a torné-la mais facilmente compreensivel. Co- Mo a exigéncia de maior simplicidade nem sempre pode Coneiliar-se com a de conceituagdo mais precisa, esta tiltima deve, ocasionalmente, se submeter & primeira. No que concerne ao conceito de “compreensiio”, com- Pare-o A Allgemeine Psychopathologie, de K. Jaspers, bem Como a algumas observagdes de H. Rickert na 2 ed. de Grenzen der Naturwissenschafilichen Begriffsbildung (1913, Pigs. 514-523) e, especialmente, aos Problemen der Geschi- ehtsphilosophie, de Simmel, Como em algumas ocasiées anteriores, encaminho, metodologicamente, ao exemplo de MAX W F, Gottl, cujo livro Die Herrschaft des Wortes é, com certeza extremamente dif en. volvido plenamente; também pertinente, em substancia, é o excelente trabalho de F. Toennies, Gemeinschafi und Gesells: chaft. Além disso, existe 0 enganoso trabalho de R. Staem: mler, Wirtschaft und Recht nach der Materialistischen Geschichtsauffassung, juntamente com minha andlise critica XXIV, 1907 (reimpresso Wissenschaftslehre, 2 ed., pa il de entender e parece nio ter sido de dele em Archiv f. Sozialwissensc em Ges. Auf Esta andlise critica j4 continha algo do que vem a se s. 192 € segs.) tir. Eu me distancio da metodologia de Simmel (em sua Soziologia e em sua Philos. d. Geldes), distinguindo quando possivel o significado essencialmente subjetivo do objetivamente vali do; estes dois termos nao foram suficientemente diferencia- dos por Simmel, mas so usados por ele de modo deliberado © com freqiiéncia como sugerindo sua permutabilidade. Max Weber PREFACIO DA EDITORA ‘Ao morrer, em julho de 1920, Max Weber deixou uma grande quantidade de estudos incompletos. O Wirtschaft und Gesellschaft (Economia e Sociedade) que Weber comecou a eserever em 1907 constitui-se na obra que mostra a amplitu- de do seu conhecimento e do seu pensamento. Para servir de introdugio aos seus trabalhos, Weber preocupou-se em ofe- Teeer uma série de definigdes baseadas nas suas pesquisas empiricas. Portanto, essas definigdes jit haviam sido testadas € podiam ser consideradas como formulagdes preliminares Para uma ciéncia geral da aciio social. A primeira versio desses conceitos foi apresentada na Fevista Logos, Vol. IV, em 1913. Mais tarde ela foi reelabo- fada por Weber pouco antes de sua morte ¢ publicada pos: {imamente como o capitulo primeiro de Wirtschaft und Gesellschaft (em Gundriss der Sozialekonomik, parte III. Tiibingem, 1925), que a Centauro Editora traduz agora para © piiblico de lingua portuguesa. f A influéncia de Weber sobre 0 desenvolvimento das H€Neias sociais ¢ evidente nos trabalhos cientificos de autores “ome Talcott Parsons, Hans Morgenthau, C. Wright Mills, R H- Tawney, Vance Packard, entre tantos outros. O trabalho de Weber permaneceri memorivel pelas suas exploracaes de Pioneiro nas éreas da Sociolo; Contribuicio geral para o alargamento dos horizontes dos Estudos modernos. Weber elevou a Ci ncia Social do mundo Seidental p; Hist6ria, Politica e pela sua ara o nivel da verdadeira pesquisa e erudigao. Ele ~~ 10 MAX WEBER, reclamava amargamente que, ao menos durante a sua vida, ‘a maior parte do que passa hoje sob 0 nome de sociologia é fraude”. Que isto nio seja mais verdade se deve principal mente a Max Weber e seus discipulos. Karl Jaspers in Max Weber, Deutches Wesen, na pagi- na 70, menciona “a depreciagdo de Weber pelo seu papel de sdbio e filésofo através da sua linguagem. No primeiro con- tato com o texto de Weber, o leitor é surpreendido com o contraste entre o seu pensamento penetrante, sua conceituali- zagio incisiva, seu raciocinio cuidadoso © sua indiferenga com 0 seu trabalho expressada através da forma, da compo: sigdo, dimensio e proporgio da sua linguagem. Weber nunca trabalhou seu estilo. Ele escreveu demonstrando intensa ati vidade cerebral ¢ poder de imaginagdo e nunca poliu esse material. Portanto, o estilo é freqtientemente incolor, mas, mesmo assim, as caracteristicas weberianas esto sempre presentes”. Eric Voegelin, cuja posigao teérica é diametral- mente oposta a de Weber (ndo se pode encontrar uma critica mais mordaz a Weber do que a que esta em The New Science of Politics, Chicago, 1952, de Voegelin), chama-o, mesm¢ assim, de “um pensador que queria clareza sobre 0 mundo do qual apaixonadamente participava; que estava novamente na estrada em diregio a esséncia”. Outro grande oponente de Weber, 0 Professor Leo Strauss, da Universidade de Chica- g0, afirmou: “Quaisquer que possam ter sido seus erros, ele & © maior cientista social do nosso século”” SOBRE O CONCEITO DE SOCIOLOGIA EO “SENTIDO DA CONDUTA SOCIAL” © termo “sociologia” esta aberto a muitas interpreta- ges diferentes. No contexto usado aqui significaré aquela Gigncia que tem como meta a compreensio interpretativa da agio social de maneira a obter uma explicago de suas cau: Sis, de seu curso e dos seus efeitos. Por “ago” se designard foda a conduta humana, cujos sujeitos vinculem a esta ago lum sentido subjetivo. Tal comportamento pode ser mental ou exterior; poderd consistir de ago ou de omissio no agir. O termo “aco social” sera reservado 3 aciio cuja intengo fo- Menlada pelos individuos envolvidos se refere & conduta de ules, orientando-se de acordo com ela. Fundamentos Metodolégicos 1. A palavra “sentido” & usada aqui em duas ocasides diferentes. Primeiro, existe a conduta r fico em uma dada situacio histérica ou a aproximacio gros- Seira baseada numa dada quantidade de casos, envolvendo Militos atores; e, em segundo lugar, hd o “tipo ideal” concei- {ual de sentido subjetivo, atribufdo a um ator hipotético num ado tipo de conduta. Em nenhum dos dois casos pode ser lusado como um sentido objetivamente “vélido”, ou um sen- lido *Verdadeiro”, estabelecido metafisicamente. Reside aqui A distinedo entre as ciéncias empiticas da ago, tais como a Sociologia e a Historia e as disciplinas ortodoxas, tais como Turisprudéncia, a Logica, a Etica ou a Estética, cujo propé de um ator especi- ~~, MAX WEBER sito € determinar o significado “verdadeiro” e “valid” dos objetos de sua anilise, 2. A fronteira entre uma ago com sentido ¢ uma agio meramente reativa (isto &, sem um sentido subjetivo elabora ificativa de toda a conduta sociologicamente relevante, principalmente a agic abaixo), flutua entre os dois Uma ago com sentido, isto é, subjetivamente compreensi- do) € extremamente ténue, Uma parte si puramente tradicional (veja vel, ndo se dé em muitos casos de processos psicofisicos, ¢ em outros, s6 € reconhecida pelo especialista; experiéncias misticas que niio podem ser comunicadas adequadamente em palavras nunca so inteiramente compreensfveis para alguém nao suscetivel a tais experiéncia Por outro lado, a capacidade de realizar uma agiio seme Thante nao é uma condigao prévia para a sua compreensio: “ésar a fim de compreender César”. Ser nilo € necessério “ser capaz de colocar-se no lugar do ator & importante para a clare- za da compreensio, mas nao é uma condigdo prévia absoluta para a interpretagdo do sentido. As partes compreensiveis & nio-compreensiveis de um proceso freqiientemente esto inextricavelmente interligadas. 3. Toda interpretagaio, como a ciéncia em geral, luta pela clareza e provas verificéveis. Uma tal prova de compre ensio serd ou de um carter racional, isto 6, 16 gico ou mate- mético, ou de um cariter emocionalmente empético. artisticamente aprecis na esfera da ago por um claro dominio intelectual de tudo 0 que esté dentro de seu pretendido contexto de sentido. A prova empatica na esfera da ago sera suprida por uma com- pleta participacao na conexdo de sentimentos nela vivida. el. Pode-se suprir uma prova racional Inteligibilidade direta © nao ambigua é compreensio racional da mais alta ordem, especialmente em proposigdes matemé ticas ou logicamente relacionadas. Entendemos claramente quando alguém usa a proposigio 2+2: ou 0 teorema pita CONCEITOS BASICOS DE SOCIOLOGIA jocinio ou argumento, ou quando uma cadeia de gorico no aciocinio 6 executada logicamente, de acordo com maneiras goeitas de pensar. [gualmente entendemos as agdes de uma pessoa que tenta alcangar determinada meta escolhendo os tmeios apropriados, se os fatos da situagdo em que se baseia para fazer sua escolhia nos sio familiares. Qualquer interpre {ago de uma aco com tal propésito racional possui — para tum entendimento dos meios empregados — o mais alto grau de prova. Nio com a mesma exatidiio, mas com exatidio Sifficiente para a maioria dos propésitos da explicagio, é possivel entender erros (incluindo problemas intrincados) 0s cuais nds prdprios somos suscetiveis ou cuja origem po- de ser detectada por auto-andlise simpitica, Por outro lado, MWitas metas ou valores iltimos para os quais a experiéncia demonstra que a agio humana pode ser orientada, freqtien femeate, nao podem ser entendidos como tais, embora seja Possivel dominé-los intelectualmente. Quanto mais radical- Mente se diferenciam de nossos préprios valores tiltimos, mais dificil se torna para nés entendé-los por participagio empatica. Dependendo das circunstincias de um caso parti: Cilla, deve ser suficiente conseguir apenas uma compreensio Plramente intelectual de tais valores, ou na auséncia disto, uma simples aceitacio deles como dados. Até onde for pos- Sivel, a conduta motivada por estes valores deve ser entendi- da ‘com base em quaisquer possibilidades de uma interpretagao simpética emocional e/ou intelectual dos dife- Fenles estdgios de seu desenvolvimento. Deste tipo sio mui- 108 alos virtuosos de religidio ou piedade que Incompreensiveis aqueles no suscetiveis a tais valores, bem £oM0 0 fanatismo racional extremo, tipico dos expoentes das teorias. dos sio totalmente “direitos humanos”, repugnantes aqueles que €nfaticamente os repudiam. fora ttt? mais cresce nossa suscetibilidade, mais fécil se Fain “*Petimentarmos paixdes to verdadeiras como medo, MA; AmbicIo, inveja, citimes, amor, entusiasmo, orgulho, _, 14 MAX WEBER ving nga, compaixio, devogiio e outros desejos de todo tipo, m. Mesmo quando 0 grau de intensidade em que estas emogdes siio encontradas ultrapassa em muito nossas prdprias poten de compreenstio experiencial, podemos ainda compreendé-las em seu sentido e calcular intelectualmente bem como © comportamento irracional que deles prov Jo € os meios da agdo. Para fins de a, serd conveniente represen- tar todas as conexdes de sentido irracionais e emocionalmen te condicionadas como desvios de um tipo de conceitualmente puro, orientado para fins. Por exemplo, uma andlise de uma crise na bolsa de valores seria tentada da forma mais conveniente, da seguinte maneira: primeiro, a determinagao de como teria sido seu curso na auséneia de seus efeitos sobre a dire uma anilise cientifica sistema agao fatores irracionais; segundo, usando 0 antecedente como premissa hipotética; os componentes so entiio isolados co- mo um “desvio” da norma, Da mesma maneira, a determina ¢o do curso racional de uma campanha politica ow militar precisa primeiro efetuar-se & luz de todas as circunst metas conhecidas dos participantes. Somente entio ser4 pos- sivel dar conta do significado causal de fatores irracionais Ancias e como desvios do tipo ideal, A construgio de uma agdo rigorosamente racional, de acordo a afins, por causa da sua clara inteligibilidade e falta de ambigtlidade racional, serve & sociologia como um “tipo ideal”. Assim somos auxiliados em nossa compreensio da maneira pela qual a ago real orientada de acordos afins é influenciada por fatores irracionais de todo tipo (tais como emogio, erros) € que podem entio ser classificados como desvios da ligao original hipotética Somente neste aspecto e por causa da eficiéncia meto- dolégica pode 0 método da sociologia ser considerado “ra: cionalista”, Naturalmente, este procedimento nao pode ser interpretado como um preconceito racionalista por parte d sociolog i0 metodoldgico. mas simplesmente como um m CONCEITOS BASICOS DE SOCIOLOGIA Is >_, INao pode também ser considerado como evidéncia do pre- dominio do racionalismo na existéncia humana. A extensio fem que a realidade do racionalismo determina de fato a con iduta nao ser considerada aqui. Nao se nega o perigo de in- ferpretagdes racionalistas nos lugares errados. Infelizmente. toda a experiéncia confirma a existéncia de um tal perig 4, Por outro lado, certos processos e fendmenos “sem Sentido” (isto ¢, desprovidos de significado subjetivo) exis fem em todas as ciéncias da ago humana. mulos, ou efeitos, e promovem ou inibem a conduta humana, Uma aco “sem sentido” nao deve ser confundida com um comportamento inanimado ou ndo-humano. Todo artefato {por exemplo, uma maquina) adquire o sentido que the foi Wado pela sua produgdo e uso, por parte da ago humana; um fal seatido poderd ser perfeitamente variado em seus propési 0s. Mas, se no se referir a um tal sentido, o objeto perma iece completamente ininteligivel. O que faz este objeto ininteligivel 6 sua rela Gio humana em seu papel de meio ou finalidade. E deste felacionamento que o individuo pode reivindicar ter consci- @neia € ao qual sua conduta tem sido orientada. Somente nos fermos de tais categorias é que surge uma compreensio de Objetos deste tipo Agem como esti Jo. com a Por outro lado, todos os processos ou condigdes per- manecem “sem sentido” se nao podem ser relacionados a um Proposito significativo; quer sejam inanimados, humanos ou Mio-humanos, Em outras palavras, sao vazios de sentido se HAO podem ser relacionados & ago em seu papel de meio ou inalidade, mas operam simplesmente como estimulos, seja Tiberaado ou inibindo tal acai E possfvel, por exemplo, considerar 0 rompimento do Rio Dollart, em 1227, como um poderoso estimulo aos mo- MmMentos migratsrios subsequientes. O processo da decompo- SISO, na verdade o ciclo orginico da vida por completo da incapacidade da crianga & do velho — obtém seu momen to sociolégico primdrio das diversas maneiras pelas quais o comportamento humano se tem condicionado a estes fatos Certos fendmenos psfquicos ou psicofisicos, tais como o cansago, a disciplina ea meméria, devem ser vistos como mais uma categoria de fatos vazios de significado, bem como estados tipicos de euforia causados por certas condigdes de autopunigio, ou variagdes tipicas nas reagdes de individuos dependendo do tempo, precistio e natureza. Em diltima andli se, o principio a ser observado € o mesmo de outros fendme- nos ininteligiveis: prové observador eo participante. E totalmente possivel que no futuro a pesquisa possa ma fonte de “dados” para ambos, descobrir uniformidades nao-inteligiveis sob aquilo que pa- recia ser, até entdo, agdo com sentido, embora isto nao tenha ocorrido até agora, Por exemplo, diferengas em caracteristi cas biolégicas h erdadas (raciais) devem ser aceitas pela so- ciologia da mesma maneira como os fatos fisiolégicos da necessidade da nutrig&o ou os efeitos da senescéncia sobre comportamento humano. Tais dados deveriam ser aceitos apenas, € claro, até 0 ponto em que provas estatisticas con clusivas pudessem ser supridas sobre a sua influéncia na ago sociologicamente relevante. O reconhecimento de tal significancia causal ndo mu- daria nem um pouco a tarefa da sociol preta mer a, que é a de inter a conduta humana inteligivel. O resultado seria mente introduzir em certos pontos das suas conexdes de motivos ininteligiveis e interpretiveis, fatos no compreen: siveis como, por exemplo, as relagdes tipicas existentes entre a freqtiéncia de certa agio orientada afins ou o grau da sua racionalidade e o indice encefalic quer outta caracteristica fisiolégica herdada. ou cor de pele, ou qual A compreensiio pode compreensio direta empirica do significado de um dado ato de dois tipos: primeirc CONCEITOS BASICOS DESOCIOLOGIA 17 {inclusive um pronunciamento verbal). E neste sentido que Seompreendemos” (isto é, diretamente) o significado da pro. posigio de que 2x2=4, quando o ouvimos ou lemos. Experi- mentamos aqui a compreensao direta, acional de uma idéia, Da mesma maneira, compreendemos um acesso de raiva o facial ou movimen- lexpressada por exclamacSes, expressi fos irracionais. Trata-se de compreensiio direta empirica de Teagdes emocionais irracionais e pertence & mesma categoria ue a observacio da agio de um cortador de madeira, ou alguém que estende a mao para uma maganeta para fechar a porta, ou que aponta uma arma a um animal. Trata-se de ob- Sservacdo empirica racional do comportamento. ‘A compreensiio pode também ser de uma segunda es- pécie, ¢ esta ¢ conhecida como compreensao explicativa. Somos capazes de entend firma que 2x2=4 (oralmente ou por escrito) precisamente Him momento particular e sob uma série determinada de Gireunstancias. Tal compreensao pode ser obtida se a pessoa Sob observacio esté empenhada em alguma tarefa de conta Bilidade ou alguma demonstracio cientifica ou algum outro Pfojeto do qual esta tarefa é uma parte essencial. Trata-se de Compreensio racionalmente baseada da motivagio, isto é, 0 tO € Visto como parte de uma situagao intel PFeensio motivacional adiciona-se 4 observacional, se sabe- MOS que o apontar de uma arma se faz por diversiio e o corte 4 madeira por motivos econémicos. Ou, no caso anterior, 0 lo pode ser realizado para liberar certas emogdes contidas, ¢ Meste caso a conduta assume um carter irracional, ou porque @ Pessoa que aponta a arma recebeu ordem pra fazé-lo como Membro de um pelotio de fuzilamento, ou por estar atirando Sobre um inimigo (em quaisquer destes casos seu comporta- Mento € novamente racional), ou ainda porque est exerci- Hindo seu desejo de vinganca (caso em que reverte ao SOmportamento irraciona Malmente um os motivos de qualquer um que ivel. A com ). Por fim, entendemos motivacio- icesso de raiva se sabemos que sua causa ime- >_>, 18 MAX WEBER diata pode ser encontrada em citimes, orgulho ferido ou vai- dade magoada, todas causadas emocionalmente e, portanto, relacionadas a motivos irracionais. Em todas as situagdes acima, a agiio em questo pode ser designada como parte de uma seqiiéncia compreensivel de emogdes. Tal compreensdo pode set aceita como uma xplicagdo verdadeira do curso real da agiio. Para uma cién- cia que trata do verdadeiro significado da agio, a explicagao requer uma apreensio da conexao de sentido dentro do qual ocorre 0 curso da agao real, Em todos estes casos, mesmo os que envolvem processos emocionais, 0 sentido subjetivo dentro do contexto relevante de seu significado ser designa do como sentido “pretendido”; assim vamos além do uso comum, que considera intencional somente 0 comportamen- to (de propésito racional) orientado a meta. 6. Compreender significa, pois, em todos estes casos, compreensio interpretativa de: a) casos concretos individu- ais, como, por exemplo, na andlise hist6rica; b) casos mi dios, isto €, estimativas aproximadas, como na anélise sociolégica de massa; c) um tipo de construco cientifica- mente formulado de ocorréncia freqtiente. Construcdes tipi- cas ideais so, por exemplo, os conceitos e axiomas da teoria econémica pura. Demonstram como um dado tipo de ago humana ocorreria numa base estritamente racional, sem ser afetada por erros ou fatores emocionais e sendo, além disso, dirigida apenas a um fim tinico. A aco real s6 raramente toma este curso (por exemplo, na bolsa de valores) e mesmo assim aproximadamente, em sua correspondéncia a um tipo ideal (Sobre o propésito de tais construgdes, ver o que formu- lo em Archiv f. Sozialwissenschaft, vol. XIX, pigs. 64 e segs.; reimpresso em Ges. Aufs. z. Wissenschafislehere, pags. 190 segs.; ver também a parte 11 que vem a seguir neste livro). Certamente, toda interpretagdo esforga-se para conse- 2uir o maximo de verificabilidade. Contudo, nem mesmo a ‘CONCEITOS BASICOS DE-SOC 19 {nterpretagao mais verificdvel pode reclamar o carditer de ser casualmente vélida, Permaneceré apenas como uma hipétese particularmente plausivel. Assim, o que parece ser motivacio eonsciente para o individuo envolvido pode to somente ser- vir para esconder os motivos © represses mais profundas gue esto realmente na raiz da sua acio, invalidando desta maneira mesmo as tentativas mais sinceras de auto-anilise Num tal caso, torna-se tarefa da sociologia investigar o sen- tido mais profundo de uma tal motivagio e interpreté-la de modo correto, mesmo se esta motivagao nao tiver feito parte da agio consciente do individuo em questo: torna-se, por- {anto, um caso limite da interpretago de sentido, De novo, formas de agao que aos olhos do observador parecem compartilhar as mesmas caracteristicas ou caracte- risticas semelhantes podem basear-se numa variedade de motivos por parte do ator individual. Situagdes deste tipo, que parecem compartilhar algumas caracteristicas superfici- ais, devem ser interpretadas de forma bem diferente, mesmo Que isto leve a uma andlise conflitante. Por fim, os indivé duos envolvidos em qualquer situagao dada freqtientemente Tespondem a impulsos opostos, os quais podem ser todos Entendidos. Sabemos por experiéncia que nfo é possivel ava- liar sempre, mesmo aproximadamente, a forga relativa dos Motivos © muito freqientemente no podemos sequer estar €ertos de nossas préprias interpretagdes. Somente o resultado final do conflito nos prové uma base sélida de julgamento. A Verificagao da interpretagdio por seus resultados, ou seja, a decisio final do curso real dos eventos é, como na verdade €m todas as hip6teses, indispensdvel. Infelizmente, tais in terpretacdes verificdveis s6 podem ser obtidas com exatidio Telativa apenas em alguns poucos casos especiais, do tipo adequado a experimentacdo psicolégica, ou tendo como meta Um grau diferente de aproximagio, através dos dados estatis: ticamente quantificaveis dos fendmenos em massa. Quanto Ao restante, permanece apenas a possibilidade de comparar 21 20 MAX WEBER ata cONCEITOS uma quantidade maxima de processos hist6ricos ou fendme- dos profetas entre os persas) nfo se submete facilmente a tal nos rotineiros da experiéncia cotidiana e de aparéncia seme- prova. A verificagao pode ser obtida somente quanto con- Ihante, mas diferindo substancialmente em relagio ao fator duta dos persas em casos de vit6ria, como por exemplo em motivacional sob investigagéo, Esta é a tarefa fundamental Jerusalém, no Egito e na Asia Menor, e mesmo esta verifica- da sociologia comparativa. Infelizmente, permanece com Jo deve necessariamente permanecer incompleta em muitos freqiiéncia apenas 0 instrumento incerto de experimentos aspectos, O que prové a esta hipétese apoio tio forte é a sua Puramente hipotéticos, que desprezam certos elementos na marcante plausibilidade racional. Porém, o que falta a muitos cadeia de motivagio ¢ levam, ao invés, & construgdo de um de tais casos de interpretagées histéricas altamente plausiveis curso de eventos meramente provavel, que poderia empres- a possibilidade de que o tipo de prova adequado a este caso tar-se a uma atribuigdo causal seja ainda possivel. Sob tais circunstancias a interpretagao Por exemplo, 0 postulado conhecido como Lei de Gre- deve permanecer puramente hipotética. sham é uma interpretagao racional da conduta humana dentro de um dado contexto ¢ com base em uma hipdtese ideal de lum curso puramente racional. Em que extensiio a ago real segue realmente a Lei de Gresham podemos certificar-nos apenas com base em informagdes estatisticas concernentes a0 desaparecimento da moeda subvalorizada e de modo geral nossa experiéncia tem demonstrado a validade desta lei. Nes- te caso os dados foram primeiramente acumulados e segui dos da formulagio de uma generalizagao adequada. Mas sem ‘uma tal interpretagiio de sucesso nao poderiamos ter obtido 0 necessfirio para a compreensio causal verdadeira. Por outro lado, a auséneia de provas de que a aco inferida deste com- portamento ocorre com alguma regularidade faria com que uma lei, ndio importa quantas provas tedricas pudessem ser obtidas, fosse completamente sem valor para fins de andlise conereta. Neste caso a interpretagio teérica da motivagao © de sua verificagZio empirica demonstram considerdvel con- formidade e ha uma quantidade suficiente de casos para que se considere a prova satisfatoriamente estabelecida, Mas para usar outra ilustracio, a engenhosa teoria de~ senvolvida por Eduard Meyers quanto & significagio causal das batalhas de Salamina e Platéia na evolugao tini tura grega e ocidental em geral (Ele se baseia em fatos si tomaticos concernentes a atitude dos oriculos helénicos 7. A palavra “motivacZo”, tal como se usa aqui, refere~ se a uma conexilo de sentido que parece ser, para 0 individuo envolvido ou para 0 observador, 0 fundamento da sua condu- ta, Dizemos que uma conduta que se desenvolve como um todo coerente € adequada de sentido, na medida em que suas partes componentes articulam-se entre si, dentro do contexto de nossos modos costumeiros de pensamento e sentimentos, a ponto de constituir uma conexiio de sentido “tipica”. Ge- ralmente, a chamamos de “correta”, ao invés de tipica. Em contraste, consideraremos uma interpretagéo de uma sequ cia de eventos como casualmente adequada se, com base na experiéncia passada, parecer provavel que tomnaré a ocorrer sempre da mesma maneira. Um exemplo de adequagio de sentido pode ser encon- trado na soluco correta de um problema aritmético, se esti- ver de acordo com as normas aceitas de célculo e raciocinio. Por outro lado, uma interpretagzio causalmente adequada do mesmo fendmeno concerniria & probabilidade estatistica de que, alinhada com generalizagdes empfricas testadas, haveria ‘uma soluedo correta ou incorreta do mesmo problema, Em- bora aceitasse padres normativos vigentes, levaria em con- ta, também, erros ou confusdes tipicas. Explicagdes causais postulam, portanto, uma probabilidade raramente quantifies IAX WEI vel, mas sempre de alguma maneira calculvel, de que qual- quer evento observavel, manifesto ou subjetivo, vem seguido ou acompanhado de outro evento. Consegue-se uma interpretagdo causal correta de uma ago concreta, quando tal agiio manifesta e seus motivos fo- ram ambos corretamente estabelecidos ¢ se, ao mesmo tem- po, © relacionamento entre eles tornou-se inteligivel, de acordo ao seu sentido, Uma interpretagiio causal correta de uma ago tipica pode ser obtida quando este processo, desig- nado como tipico, demonstra oferecer uma adequagio de sentido e também pode ser demonstrada tanto significativa como causalmente adequado. Se nenhum sentido se liga a uma tal ago tipica, entiio, independentemente do grau de uniformidade ou de precisao estatistica da probabilidade, ela ainda permanece uma probabilidade estatistica incompreen- sivel, embora lide com um proceso manifesto ou subjetivo. Por outro lado, mesmo a adequagao de sentido a mais evi dente s6 sera causalmente significativa, de um ponto de vista sociolégico, se tivermos prova de que, com toda a probabili- dade, a conduta em questo tomard, de fato, a forma que foi considerada como adequada de sentido. Para que isto ocorra deve-se determinar algum grau de freqiiéneia de aproxima- Go de um tipo médio ou ideal. No presente contexto, uniformidades estatisticas cons tituem tipos inteligiveis de acio, isto é, generalizagdes socio- I6gicas, apenas quando manifestam o sentido subjetivo compreensivel de um curso da agio social. Novamente, s6 podem ser consideradas tipos sociolégicos de um proceso empitico aquelas construgdes racionais de conduta subjeti amente inteligivel que podem ser empiricamente observa das com ao menos uma certa aproximagio. Nao se trata, quase nunca, de que a probabilidade real de ocorréncia de um dado curso de comportamento seja sempre proporcional a clareza da interpretacao subjetiva. De qualquer forma, so- mente a experiéneia poderd dizer se isto seré sempre verda- TOS BASICOS DESOCIOLOGIA 3 de. E possivel, afinal, obter informagdes estatisticas sobre processos que so vazios de sentido, bem como daqueles que © tém: a quantidade de chuva, os indices de mortalidade, os fendmenos de fadiga e a produtividade das méquinas so bons exemplos dos primeiros, enquanto indices de criminali- dade, distribuigdes ocupacionais, estatisticas de pr tatisticas de produgao agricola so exemplos dos tiltimos; e somente nestes tltimos casos mostra-se possivel falar de estatisticas sociolégicas. Esta claro que ha muitos casos, co- mo as estatfsticas agricolas, que contém ambos os tipos de significado. 8. Processos ¢ regularidades que, por causa de sua inin- teligibilidade, nao so designados aqui como fendmenos Sociolégicos ou leis sociolégicas nio so necessariamente menos importantes por causa disto. Isto € verdadeiro também Para a sociologia em nosso contexto presente, implicando numa restri¢do a fendmenos subjetivamente compreensiveis que ninguém tem a obrigagio de aceitar. Eles sio simples- mente corsiderados numa categoria diferente da do compor- tamento significativo, o que é metodologicamente inevitivel, Assim tornam-se condig6es € estimulos, inibindo ou encora- Jando o ambiente em que a ago ocorre. 9. A “ago” no sentido da orientagio subjetivamente inteligivel da conduta existe somente como a conduta ‘de uma ou mais pessoas individuais. Para outros propésitos ana- liticos podera ser itil e mesmo necessério ver o individuo como um conjunto de células, ou um conjunto de reagdes bioguimicas, ou conceber a sua psique como composta por luma quantidade de clementos definidos de forma variavel. Certamente isto forneceria um discernimento precioso dos Telacionamentos causais. No entanto, nao compreendemos ealmente de forma subjetiva o comportamento destes ele- Mentos, como se expressa nestas regularidades. Nem sequer o caso de se tratarem de elementos psiquicos: quanto mais 24 MAX WEBER, cientificamente exatas sejam suas definigSes, menos 0s com: preendemos; eles jamais nos levam a uma interpretacdo nos termos de um sentido subjetivo, Mas para ambas, a sociolo- gia e a hist6ria, o objeto real de andlise deveria ser 0 sentido mais profundo de uma certa acio, © comportamento de eer- tas entidades fisioldgicas, como, por exemplo, as eélulas, ou de quaisquer tipos de elementos psiquicos pode, ao menos, ser observado em principio de tal maneira a conduzir & eria- lo de certos postulados aplicéveis a fendmenos individuais uniformes. Contudo, a compreensio subjetiva da agio sé aceita tais fatos e regularidades tanto quanto. reconhece quaisquer outros incapazes de interpretagio subjetiva, como, por exemplo, dados fisicos, astrondmicos, geoldgicos, mete- oroldgicos, geogrificos, botinicos, zool6gicos, anatOmicos, bem como tais dados relativos a psicopatologia, que estio sem significado subjetivo ou os das condigdes cientificas que possibilitam o progresso tecnol6gico. : ‘Ainda para outros propésitos de andlise, por exemplo, finalidades legais ou priticas, pode ser conveniente ¢ mesmo inevitavel tratar grupos sociais tais como o Estado, associa~ gies corporativas, coporagdes de negécios, e fundagdes co- mo se fossem pessoas individuais com direitos ¢ deveres ¢ como os executores de uma conduta legalmente significativa. Mas para interpretagdes. sociologicamente compreensivas tais organizagées si meramente o resultado da ago distinta de pessoas individuais, j4 que somente estas podem empe- nhar-se como agentes em qualquer espécie de agiio orientada por um sentido. Mesmo assim, 0 socidlogo, para seus props- sitos, no pode desprezar tais conceitos de coletividade que derivam de diferentes pontos de vista, pois a interpretagao subjetiva da ago estd relacionada a tais conecitos ao menos de trés maneiras diferentes. a) Uma tal interpretagao freqtientemente € forgada a trabathar com conceitos semelhantes (¢ mesmo idénticos) de forma a estabelecer uma terminologia inteligivel. Ambas, 10S BASICOS DE SOCIOLOGIA tanto a terminologia legal quanto a leiga, definem o Estado como um conceito legal ¢ um fendmeno de ago social no qual as suas regras legais séo relevantes. Entretanto, para finalidades sociolégicas 0 termo “Estado” nao consiste ne- ¢essariamente ou mesmo primariamente de componentes legalmente relevantes. De qualquer modo, a sociologia nao feconhece uma personalidade coletiva em aco. Quando a sociologia usa os termos “Estado”, “nado”, “corporagio”, “familia”, “divisio do exército” ou conceitos coletivos seme- Ihantes, 0 faz apenas para por em foco um certo tipo de de- senvolvimento de modos alternatives de ago social para pessoas individuais. Assim a terminologia legal, que é em- pregada aqui por causa de sua precisdo e uso comum, recebe um significado completamente diferente. 4) A interpretagio da ag3o também precisa levar em Conta um fato vital muito importante: estes conceitos coleti vos derivados de idéias legais, do sentido comum, ou de quaisquer oulras idéias técnicas, sao significativos para os individuos ou porque existem ao menos parcialmente ou Porque representam algo como uma autoridade normativa Isto no é verdade apenas para juizes e burocratas, mas para © piblico como um todo também. Os individuos orientam sua conduta em fungao daqueles conceitos que, desta manei- Ta, exercem com freqiéncia uma influéncia causal muito Teal, dominadora, sobre a ago destes individuos. Isto é ver- dade especialmente quando estes conceitos fazem parte de um padrao reconhecido, positivo ou negativo. O Estado mo- demo representa num grau consideravel um complexo de gtio harmoniosa por parte de pessoas individuais, porque Muitas pessoas agem na crenga de que ele existe ou deveria existir precisamente desta maneira, para promover validade legal A emisséo de suas ordens. Discutiremos isto a seguir. Embora fosse possivel para a terminologia sociolégica eli- minar estes conceitos de uso comum, nio sem certo pedan- 26 MAX WEBER tismo, ¢ substitui-los por novos termos mais indusivos, isto a fora de questo, a0 menos no presente contexto. . c) HA, finalmente, 0 método da assim chamada pene orginica de sociologia, da qual o brilhante wabalho de Schitle, Baw und Leben des Socialen Koerpers, representa um exemplo clissico. Esta escola tenta explicar a interagio social usando como sua premissa 0 “todo” (por exemplo, a economia) ao qual a agio do individuo é relacionada ¢ pois intrpretada, Este proceso ¢semelhante& maneira pela qual um fisiologista analisaria o papel de um érgio do art dentro da comunidade do organism, ou seja, como este 6 go contribui para a sobrevivéncia do restante do organismo. Néste’cotitexto pode’ ser lemibrada al famosa ‘rase'de ai fis ologisa durante um eminio: “Parigrafo X", disse ele, “0 Bago”. “Senhores, nio sabemos nada sobre o bago. Aper 2 isto para o bago”. Es elaro que se “conheciam” muita e sas sobre 0 bago, tais como posigdo, tamanho, forma etc.; somente suas “fungdes” nao podiam ser asseguradas e ele caracterizou esta auséncia de conhecimento como ignor cia. A extensiio em que outras disciplinas consideram esta forma de andlise funcional das partes de um todo como defi- nitiva no precisa ser discutida aqui; mas sabemos bem que formas de anilise bioquimicas e biofisicas nio se esgotam em uma abordagem funcional Para fins de andlise sociolégica uma tal abot importancia porque serve primeiro como um ponto de part- da conveniente para propésitos de demonstragio, bem como de orientaco proviséria. Desta maneira pode ser muito titil e mesmo necessaria — mas ao mesmo tempo, se 0 seu valor empitico for superestimado ou excessivamente concetualiza- do, as vantagens de uma abordagem assim estario perdidas. Em segundo lugar, pode ser a tinica maneira, sob certas cir- Cunstincias, de determinar exatamente que processos de agio Social so necessarios para a nossa compreensao de forma a =e explicar um fendmeno particular. I neste estigio que a tarefa real da sociologia, como nés a entendemos, comeca, Especialmente no caso das coletividades sociais, esta- ‘mos numa posic¢do de criar algo que vai além da demonstra. $20 dos relacionamentos. funcionais ¢ das regularidades Beralmente encontradas em organismos fisicos ou biolégi- ©os. Ao contrério do processo nas ciéncias naturais, pedemos obter aqui uma interpretagio subjetiva da agio dos indi duos diretamente envolvidos. Isto & assim porque as ciéncias haturais estdo limitadas & formulagiio de regularidades cau. Sais em objetos ¢ eventos e a explicacio de fatos individuais Por sua aplicagio. N6s realmente ndo “compreendemos” Comportamento das células, mas simplesmente reconhece. mos 0 seu relacionamento funcional, ¢ baseados nele intro. Guzimos uma generalizagdo. Este sucesso adicional. da explicacdo pela compreensio interpretativa, ao invés da mera Observacao empirica, € naturalmente obtido por um prego, ue ¢ 0 cariter essencialmente hipotético e fragmentirio dog Fesultados obtidos desta maneira, Mesmo assim, precisamen. fe esta espécie de compreensio subjetiva prové a andlise so- Giolégica de seu cardter diferenciado, Este nao ¢ também o lugar para discutir a extensiio em Gue © comportamento dos animais torna-se subjetivamente Compreensfvel para nés, ou o nosso para eles; uma tal com. Preensio ¢ altamente incerta, ¢ sua aplicagaio muito problema. fica. Mas até onde tal compreensio existe, seria concebivel formular uma sociologia das relagdes clo homem com os animais, quer domésticos ou selvagens. £ verdade, afinal, ave muitos animais “compreendem” ordens, raiva, amor, Agressividade, € nao reagem apenas instintiva e mecani frente, mas de modo conscientemente significativo e com base em experiéncias prévias, Nossa propria capacidade de \dentificar-nos com © comportamento de povos primitivos ficilmente é melhor. Mas no temos meios confiaveis de 28. _ MAX WEBER determinar o estado mental subjetive de qualquer animal ou se temios siio, na melhor das hipéteses, insatisfat6rios, Os problemas da psicologia animal sdio_conhecidos como sendo interessantes, bem como dificeis. Também sa- bemos que existem organizagées sociais animais de muitos tipos: “familias” monégamas e polfgamas, manadas, reba- rnhos, ¢ mesmo “Estados” com uma divisio funcional de tra- balho. A. extensio da diferenciagiio funcional destas sociedades animais nao é de nenhum modo paralela a dife- renciag&o orginica ou morfoldgica de membros individuais da espécie. Por exemplo, a diferenciagio funcional encontra da entre cupins, ¢, portanto, a dos elementos de sua organi- zag social, é bem mais avangada do que a encontrada entre formigas e abelhas. Pode muito bem ocorrer que o observa~ dor deva satisfazer-se em obter uma andlise puramente fun- cional. Uma tal andlise o capacitaria a estudar os meios que a espécie considera indispensdveis para sua sobrevivéncia: nutrigo, defesa, reproducdo ¢ reconstrugao, ¢ a identificar os animais encarregados da execugio destas ¢ de outras fun- ges, ou seja, reis e rainhas, operdrias, soldados, zang6es, propagadoras, rainhas substitutas etc. Qualquer coisa além disto permaneceria por muito tempo mera especulagio ou pesquisa, quanto a extensio em que a hereditariedade por um lado e 0 ambiente de outro estariam envolvidos no desenvol- vimento destas tendéncias “sociais”. Isto foi particularmente verdadeiro nas controvérsias entre Goethe e Weisman. O conceito de Weisman da onipoténcia da selegdo natural ba- seava-se em grande parte em dedugdes niio empiricas. Mes- mo assim, todas as autoridades sérias concordam que a redugio a um nivel funcional de andlise é simplesmente uma necessidade ¢ tera, segundo se espera, ui carter puramente tempordrio (Compare, por exemplo, 0 que se sabe sobre cu- pins ao estudo de Escherich, 1909). Gostarfamos de saber niio apenas a importincia das fungdes de todas estas formas dife- renciadas na sobrevivéncia, mas também como, por exemplo, CONCEITOS BASICOS DE SOCIOLOGIA 4 tworia da hereditariedade das caracteristicas adquiridas — 6u1 0 sett oposto — tem peso no problema de explicar as ori- gens destas diferenciagdes, bem como a influéncia das dif Tentes variantes sobre aquela teoria. Além disso, seria bom saber primeiro que fatores so decisivos para a diferenciagao original de tipos especificos a partir do tipo neutro nao dife- renciado; segundo, o que leva o individuo, uma vez. diferen- ciado, a agir de uma maneira calculada a permitir a sobrevivencia do grupo diferenciado. Onde houve algum Progresso na pesquisa destes problemas, isto ocorreu por demonstracdo experimental da probabilidade ou possibilida- de concemente a0 papel de estimulos quimicos ou processos fisiol6gicos tais como hibitos nutritivos, efeitos castrativos Por parasitas etc., no caso dos organismos individuals, Até ‘nde existe mesmo a sombra de uma possibilidade de mos- trar a existéncia de uma orientago “psicol6gica” (isto 6 Subjetiva) ou significativa experimentalmente possivel, nem mesmo o especialista aventurar-se-ia a supor Parece que se poderia obter uma mostra verificdvel da Psique destes animais sociais que se prestasse a uma com- Preensiio significativa apenas como meta ideal, somente den- tro de limites estreitos. De qualquer modo, no podemos esperar extrait desta fonte qualquer contribuigdo real para a Compreenszo do comportamento social humano, Ao contré- Hid — no campo da psicologia animal — a analogia com o hhumano deve sera usada com cuidado. Podemos esperar €niretanto, que algum dia tais analogias biologicas serao ti. teis para sugerir novas abordagens significativas. Por exem Plo, poderiam langar luz sobre como nos estigios primitivos da diferencio humana deveria ser cleulado o impact de atores mecinicos e instintivos, comparado aos fatores aces- siveis A interpretaco subjetiva de modo gerale, mas especi- icamente, aos que sio acessiveis 4 ago consciente € Facional. Uma sociologia compreensiva deve reconhecer qu Para o desenvolvimento humano primitive, o impacto da _ MAX WEBER primeira série de fatores tem importincia decisiva e que mesmo nos estigios posteriores deve-se reconhecer sua con- tinua interagdo com outros. A ago tradicional e especialmente a ago carismitica, freqilentemente, contém as sementes de contiigio psiquico e assim agem como correia de transmissiio para muitos estimu- los evolutivos do proceso social. Tais tipos de agao estao intimamente relacionados a fendmenos que s6 podem ser entendidos em termos biolégicos ou esto sujeitos a uma interpretagio incompleta em termos de motivos subjetivos, fundindo-se quase imperceptivelmente no biolégico. Nada disto livra a sociologia da obrigacao de cumprir, mesmo der tro de limites tio estreitos, o que apenas ela pode fazer. s varios trabalhos de Ohtmann Spann so ricos de Jdéias sugestivas nesta linha, embora com freqléncia ele também erre, pendendo a juizos de valor puro, que no fa zem parte de uma verdadeira pesquisa empirica. Mesmo as- sim, sem dtivida ele esta certo quando enfatiza sobremaneira a importaneia de um ponto de vista funcional para a investi- gacao preliminar de um problema social; isto é 0 que ele chama de “método universalista”. 5 ‘i Precisamos saber primeiramente 0 tipo de ago que é funcional em termos de sobrevivéncia e, acima de tudo, ne- cessiria & continuidade da unidade cultural e & continuidade dos tipos correspondentes de aco social, antes de podermos investigar suas origens e motivacio. Primeiro, precisamos saber 0 que fazem um rei, um oficial, um empresério, um alcoviteiro, um magico, um produtor, ou seja, que tipo de agio mostra-se tipica e suficientemente importante para justi- ficar sua classificagao em quaisquer destas categorias, sendo, Portanto, elevante para a andlise, antes de a iniciarmos (sto € 0 que H. Rickert entende como juizo de valor). Contudo, & ‘apenas uma tal andlise que consegue compreender a agio de individuos humanos (€ apenas humanos) tipicamente dife- CONCEITOS BASICOS DE SOCIOLOGIA 31 Tenciados © que deve, pois, ser considerada como a fungdo especifica da sociologia De qualquer modo, € um tremendo mal-entendido su- Por que uma metodologia individualista pressupse também tum sistema individualistico de valores. Uma opiniao tao erra. da, quanto confundir a tendéncia relativamente inevitével dos Conceitos sociais de adquirir um cardter racional, baseando-se ma crenga de que motivos racionais sempre predominam ou que 0 racionalismo pode ser positivamente avaliado, Mesmo uma economia socialista seria individualista para fins de anilise sociolégica, ou seja, deve ser entendida com base na agdo individual — por exemplo, o dos funcio- nérios que a dirigem —e isto seria igualmente verdadeiro no caso de um sistema de mercado livre analisado em termos da teoria da utilidade marginal, embora fosse possivel descobrit lum método mais adequado, mas ainda semelhante. A verda. deira pesquisa sociolgica empirica comeca apenas com a Questo de o que motivava e ainda motiva os funciondrios individuais e os membros da comunidade a conduzir-se de tal maneira a realizar a criagio desta “comunidade” e a asse- Surar sua continuidade. Qualquer andlise formal que use 0 iodo” como seu ponto de partida pode suprir apenas prepa. os preliminares para a verdadeira pesquisa; sua utilidade ¢ indispensabilidade sao, se forem apropriadamente aplicadas, ‘aturalmente incontestaveis 10. As varias generalizagdes sociolégicas costumeira- frente ilentificadas como “leis cientificas”, por exemplo, a Tei de Gresham, sio de fato probabilidades tipicas confirma. dhs pela observagdo, Supde-se que, sob certas condigdes dads, ocorrera um curso de ago projetado que sera inteligi- Nel em termos dos motivos tipicos e das intengdes subjetivas UPieas dos envolvidos numa certa acdo, Estas generalizagoes slo ambas compreensfveis e definitivas no grau mais alto ate Onde 0 curso de uma ago tipica pode ser observado em ter. MAX WEBER mos de busca puramente racional de um fim ou onde, por motivos de conveniéncia metodol6gica, um tal tipo tedrico pode ser heuristicamente empregado; em tais casos 0 rela- cionamento entre meios e fins é claramente compreendido empiricamente, especialmente onde a escolha de meios era “inevitivel”. Neste caso pode-se afirmar legitimamente que até onde a conduta era estritamente orientada a fins ndo po- deria ter tomado qualquer outra diregdo. As razdes seriam primeiramente técnicas, jd que dados os fins claramente de- finidos nenhum outro meio estava disponivel para os indivi- duos envolvides em tal agio. Um caso assim demonstra enfaticamente quao errado era considerar qualquer tipo de psicologia como o fundamento tiltimo da sociologia compre- ensiva. E certo que hoje todos parecem ter sua prépria inter- preta ‘ologia. Certos propésitos- metodol6gicos definidos justificam um tratamento de certos tipos de proces: sos que tentam seguir os procedimentos das ciéncias natu- rais, separando os fendmenos “fisicos” dos “psiquicos”, de uma maneira completamente alheia as disciplinas envolvidas na ago. Os resultados da pesquisa psicolégica que emprega os métodos das ciéncias naturais em qualquer amplitude e ma- neiras possiveis podem, naturalmente, exatamente como qualquer outra ciéncia, ter, dentro de certos limites, grande significado para problemas sociol6gicos; e, na verdade, isto tem acontecido com freqiiéncia. Entretanto, um tal uso de dados psicolégicos deve diferenciar-se de qualquer investi- gagio da ago humana em termos de seu sentido subjetivo. Conseqiientemente, a sociologia nao tem nenhum relaciona- mento I6gico mais intimo com a psicologia do que qualquer outra ciéncia, O erro confunde-se aqui com o conceito de “psfquico” que considera tudo 0 que € nio-fisico como psi- quico ipso facto; entretanto, o real significado da solugio de um problema matematico por uma pessoa nao é um processo “psiquico”: as deliberagGes racionais de um individuo, tendo CONCEITOS BASICOS DE SOCIOLOGIA 33. unio os resultados de um certo curso de conduta destaca- do, promovem certos interesses especificos, junto com as decisdes correspondentes, no se tornando nem um. pouco mais inteligiveis por basear-se em consideragdes psicolégi- cas. No entanto, precisamente sobre tais suposigdes racionais € que se funda a maioria das leis da sociologia, bem como da economia. Por outro lado, ao explicar a conduta irracional sociologicamente, a psicologia compreensiva (isto 6, a forma que utiliza a compreensio subjetiva), sem divida pode ter valor decisivo. Porém, isto néio muda a situagio metodol6gi- ca fundamental, 11. Tem-se repetido a premissa de que a ciéncia da so- ciologia tenta formular conceitos tipolégicos ¢ regras gerais dos processos empiricos. Deste modo, esté em contraste com 4a historia, que se esforca para a anilise ¢ explicagio causal da aciio culturalmente significativa de individuos, de institui Ges e de certas personalidades, Os dados que alicergam as Conceituagdes da sociologia consistem essencialmente, em- bora nio com exclusividade, dos mesmos processos relevan- tes de agio com os quais trabalham os historiadores. Seus Conceitos e generalizagdes baseiam-se na premissa de que a Sociologia reivindica dar uma contribuigdo & explicagaio cau- sal de alguns fendmenos histérica e culturalmente importan- tes. Como é verdadeiro para qualquer outra ciéncia Seneralizadora, o cardter abstrato dos conceitos sociolégicos € responsivel pela relativa auséncia de contetido concreto, quando comparado 4 verdadeira realidade histérica, Mas o Gue a sociologia oferece, ao contrério, é um aumento na pre- Cisio dos conceitos. Obtém-se tal precisio maior lutando Pelo maior grau possivel de adequacio de sentido, de acordo 4 conceituagao sociolégica antecipada acima. Repetidamen- {e, enfatizou-se que esta meta pode ser realizada num grau bastante alto no caso de conceitos ¢ generalizagbes que for- Mulam processos racionais — relacionados a fins ou valores, 34. MAX WEBER. Mas a sociologia tenta abranger também varios fendmenos irvacionais (isto € misticos, proféticos, espirituais, bem co- mo afetivos), em termos de conceitos tebricos que sio ade- quados ao nivel do seu sentido, Em todos os casos, quer racionais como itracionais, a sociologia distancia-se da reali dade, mas, no entanto, serve para entendé-la, mostrando com que grau de aproximagdo um fenémeno histérico concreto pode ser subordinado a qualquer destes conceitos. Por exemplo, 0 mesmo fendmeno hist6rico pode ter as- pectos feudais, patrimoniais, histéricos ¢ carismaticos. Para fornecer a estes termos a necesséria precisio, a sociologia deve projetar tipos “puros” (“ideais”) de formas correspon- dentes da ago humana, que em cada caso envolvem o grau mais alto possivel de interpretaglo légica por causa de sua completa adequaco de sentido. Porém, pela propria raziio de isto ser assim, ndo é quase nunca, em nenhuma oportunida- de, provavel que se possa encontrar um. fendmeno real que correspond exatamente a. um deste tipos idealmente, cons- trufdos. A situagdo assemelha-se ao céleulo de uma reagio baseado num vacuo absoluto. Somente com base em tais tipos ideais é possfvel a andlise tedrica no campo da sociolo- gia. Entende-se, esta claro, que em adigo scja conveniente 0 socidlogo empregar ocasionalmente tipos médios de caré- {er empirico-estatistico; estes conceitos niio requerem discus- sdio metodol6gica nesta altura, Contudo, quando a sociologia se refere a casos tipicos, deve-se entender sempre, a no ser que se afirme o contririo, que o termo significa termos ide- ais, sejam racionais ou irracionais (na teoria econémica sem- pre se trata do primeiro), mas que sio, em qualquer caso, sempre construdos com adequagio de sentido, Precisamos reconhecer que, na érea da sociologia, mé dias, ¢ também tipos médios, s6 podem ser construidos com maior precisiio, onde se trata de ages qualitativamente iguais, que diferem apenas em grau. Tais casos ocorrem, mas, na maioria dos casos dos tipos de agao que sao relevantes para a EITOSBASICOS DESOCIOLOGIA___35 hist6ria ou sociologia, os motivos que as influenciam sao qualitativamente heterogéneos, nenhum deles podendo ser considerado médio no sentido verdadeiro. Os tipos ideais de agiio social encontrados na teoria econdmica sio “niio- realistas” ou abstratos, na extensdo em que pesquisam ape- has © que aconteceria durante um dado curso de agiio, con- tanto que fosse puramente racional e orientada apenas 2 fins econdmicos. Uma tal abordagem, entretanto, é itil na com- preensio da agtio que nfo € determinada s6 economicamente, mas também influenciada por restrigdes tradicionais, emo- ges, eros e a intrusdo de outros fatores néio-econémicos, Isto pode acontecer de duas maneiras: primeiro, através de uma anilise do fator economicamente determinante junta- mente com outros fatores num caso tinico ou numa quanti- dade de casos médios; ou, em segundo lugar, a andlise de fatores ndo-econdmicos pode ser facilitada enfatizando-se a discrepincia entre 0 curso real dos eventos e 0 tipo ideal Assim a construcao de um tipo ideal, de uma atitude acdsmi- a para com a existéncia, engendrada por influéncias misti- cas, seria um processo semelhante a0. analisar suas Consegiléncias no relacionamento do individuo na vida co- mum (por exemplo, em politica ou economia). Quanto mais distinta ¢ precisa a construgao do tipo ideal, maior é sua na- tureza abstrata ou nao-realista, e mais capaz de desempenhar Suas fungdes metodolégicas na formulagdo da clarific: terminologia, da classificagao, e das hipéteses, Na atribuigao de explicagao causal concreta de eventos individuais, 0 método hist6rico essencialmente o mesmo Por exemplo, uma tentativa de explicar a campanha de 1866 deve necessariamente abranger uma reconstrugio de como Moltke ¢ Benedek teriam agido se tivessem possuido discer- nimento integral ndo somente da propria situagdo, como também da situagao do adversério. $6 entio seria possivel Estabelecer comparagdes com o curso real dos eventos ¢ formular uma explicagio causal dos desvios observados, que BR ocr poderiam ser atribufdos a fatores tais como desinformagao, erros estratégicos, faldcias l6gicas, exageros personalistas ou consideragdes niio-estratégicas. Assim, estd latente aqui uma construgio tipica ideal de ago racional Porém, as construgdes tipico-ideais da sociologia deri- vam seu cardter no somente do ponto de vista objetivo, mas também de sua aplicagio a processos subjetivos. Na maior parte das vezes, a ago real atua no nivel subconsciente inar- ticulado de seu sentido subjetivo. A pessoa que se comporta de uma certa maneira “sente” isto vagamente, ao invés de ser explicitamente consciente da fonte de sua ago. Quase sem- pre sua agdo € governada pelo hébito ou instinto. Apenas ocasionalmente — e no comportamento uniforme das gran- des massas, somente no caso de alguns poucos individuos — © sentido subjetivo de tal ago, seja racional ou irracional, eleva-se ao nivel da verdadeira consciéneia. Na realidade efetiva, a ago consciente ¢ claramente significativa sempre constitui um caso marginal, Toda investigagiio hist6rica sociolgica empenhada na anélise de fatos empiricos tem que tomar isto em consideragiio, Mas esta dificuldade nao precisa impedir © pesquisador de formular conceitos através da classificago de tipos possiveis de sentido subjetivo; isto 6, deve agir como se a ago realmente ocorresse na base de um sentido claramente autoconsciente. A divergéncia resul- tante dos fatos concretos deve ser mantida continuamente sob observaciio todas as vezes em que houver uma questio deste nivel de conereticidade e deve ser cuidadosamente es- tudada, tanto no que se refere a grau quanto a tipo. Metodo- logicamente, com frequéncia temos somente a alternativa de escolher entre termos que no sio claros e os que sio claro estes iiltimos podem ser tipos abstratos ideais, mas por esta mesma razio sio cientificamente preferiveis (sobre todos estes t6picos ver Archiv fuer Sozialwissenschafi, vol. XIX, op. cit. ver parte A, sec. 6). con {TOS BASICOS DESOCIOLOGIA. O Conceito de Acio Social 1. A agdo social (incluindo tanto a omissio como aqui- escéncia) pode ser orientada para as acdes passadas, presen- tes ou futuras de outros. Assim, pode ser causada por sentimentos de vinganga de males do passado, defesa contra perigos do presente ou contra ataques futuros. Os “outros” podem ser individuos conhecidos ou desconhecidos, ou po- dem constituir uma quantidade indefinida. Por exemplo, “di- nheiro” € um meio de troca que o individuo aceita em Pagamento, porque sua agio se orienta na expectativa de que humerosos, mas desconhecidos e indeterminados “outros” o aceitardio por sua vez, em algum tempo no futuro, como um meio de troca, __2. Nem toda espécie de acto, nem mesmo a agio ma- nifestadamente formal, é “social”, no sentido da presente discussao. A aco formal € nio-social se orientada exclusi Yamente ao comportamento de objetos inanimados, Atitudes subjetivas devem ser consideradas aco social apenas se ori- entadas a ago de outros. A conduta religiosa nao € social, se permanece simplesmente uma questo de contemplacio, de oracio solitéria etc. A atividade econdmica de um individuo apenas é social se ¢ até 0 ponto em que concerne também A atividade de terceiros. Falando de modo geral, em termos formais, torna-se social apenas até o ponto em que reflete a extenstio em que os outros respeitam o controle real de uma Pessoa sobre bens econdmicos. Mais concretamente, é social Se, por exemplo, em relaco ao consumo de uma pessoa, as necessidades futuras de outros so levadas em conta e deter- Minam, portanto, a “poupanca” desta pessoa. 3. Nem todo tipo de contato entre seres humanos tem lum caréter social, mas apenas quando a ago do individuo 6 Significativamente orientada para a dos outros. Assim, a coli- Sio entre dois ciclistas ¢ apenas um evento isolado, compa- rdvel a uma catéstrofe natural. Por outro lado, qualquer tenta- tiva de um deles de evitar bater no outro, com os insultos subseqtientes, uma briga, ou mesmo uma discussio pacifica, constituiria uma forma de “ago social”. 4. A acio social também niio é idéntica a: a) a agio uniforme de muitas pessoas; 6) a ago influenciada por ou- tras pessoas. Por exemplo, se no comego de uma chuva uma quantidade de pessoas na rua abrir seus guarda-chuyas ao mesmo tempo, tal conduta normalmente no se orienta para a dos outros, pois trata-se simplesmente de uma reagio seme: Ihante de todos de protegerem-se contra a chuva. Sabe-se também que a conduta de um individuo pode ser fortemente influenciada pelo mero fato de que ele é um membro de uma multidio contida num espago limitado. Este constitui 0 as- sunto das pesquisas sobre “psicologia de massas”, do tipo desenvolvido por Le Bon, sendo conhecido como ago “con- dicionada pelas massas”. Prosseguindo, é possfvel que um grande ntimero de pessoas que se encontram bastante disper- sas reaja simultdnea ou sucessivamente a uma fonte de influ- @ncia que atua de modo semelhante sobre todos os individuos, como faz, por exemplo, a imprensa; desta mane ra a aco do individuo é influenciada por sua associagaio a multidao e por sua propria percepgo deste aglomerado, De falo, certos tipos de reacZo so possfveis apenas pelo mero fato de que o individuo se porta como parte de uma multi- dao, embora outros tipos se tornem mais dificeis sob as mesmas condigdes. Conseqiientemente, é possivel que um evento em particular ou um modo de agdo humana dé lugar a emogoes de tipos muito diversos — humor, raiva, entusias- mo, desespero ou paixiio — numa situagao de multidao, qu ndo aconteceria de modo algum ou de modo tio facil se 0 individuo estivesse sozinho; isto no precisa constituir ne- cessariamente uma relagZo significativa entre 0 comporta- mento do individuo e o fato de que ele € um membro da multiddo, Uma tal aco, resultante apenas do resultado de reagdes do individuo na multidao, nao & conduta “social” no sentido usado aqui, especialmente quando nJo ha orientacaio desta conduta que se possa considerar adequada no nivel do significado, Tais diferengas sio, necessariamente, muito fle xiveis. Por exemplo, niio apenas 0 demagogo, mas também a massa que 0 ouve podem ser afetados em graus varidveis um pela conduta do outro; ¢ um tal relacionamento pode dar lugar a varias interpretagoes. Além disso, a mera “imitagdo” da conduta dos outros — corretamente enfatizada por G. Tarde — nao sera consi- derada especificamente “ago social” se for simplesmente reativa e nao orientada com sentido para o individuo assim imitado. Novamente a linha de demarcagao ¢ extremamente flexivel, 0 que torna sua determinag&o cada vez mais dificil Entretanto, 0 mero fato de alguém usar, de propésito, um esquema tendo em vista que outros 0 usem nao constitui, no sentido presente, agao social. Uma agao como esta nao se orienta pela aco de outras pessoas, pois o individuo, tendo aprendido através de observagao de outros a existéncia de certos fatos objetivos, orienta sua ago em funcio daqueles fatos. Assim, sua acdo € causalmente determinada pela aco de outros, mas no pelo sentido contido nesta Gitima. Por outro lado, por exemplo, se a conduta dos outros é imitada porque é “moda”, ou “tradigaio”, ou “padrao” corrente, ou concedem prestigio social, ou por motivos semelhantes, en- to temos uma relagio de sentido, quer para a aco daqueles que esto sendo imitados, quer para o de terceiros, ou ainda a0 de ambos. Entre estes tipos de imitagio, existe, esta claro, toda espécie de casos limftrofes. Ambos os fendmenos, tanto o do comportamento das multidées, bem como o da imitagdo, so conceitos fluidos no limite da agdo social; 0 mesmo € verdadeiro quanto a tipos tradicionalistas de ago social, mais bem desenvolvidos no capitulo 2. Pode-se encontrar a razao de tal flexibilidade nes- MBs 40. MAX WERER {e caso © em outros semelhantes no fato de que a orientagao pela acdo alheia e o sentido da prépria conduta do individuo nem sempre so suscetiveis de determinagiio concisa e, com freqiténcia, so, na verdade, completamente inconscientes ¢ raramente inteiramente autoconscientes, Mera “influéncia” e “orientagio com sentido” nio sio sempre, por este motivo, suscetiveis de distingiio empirica, Porém, conceitualmente, é essencial diferencid-los, ainda que a mera imitago “reativa”” tenha a mesma importincia sociol6gica que o tipo que cons- titui a agdo social no sentido estrito. Portanto, a sociologia no se ocupa com a “ago social”, mas tal agiio fornece (a0 menos para a sociologia desenvolvida aqui) sua matéria cen tral e pode ser considerada sua parte constitutiva como cién cia. Contudo, isto nao implica em qualquer juizo sobre a importdncia comparativa deste e de outros fatores. CAPITULO 2 FORMAS CARACTERISTICAS DE ACAO SOCIAL Como qualquer outra a terminada de qualquer das quatro maneiras seguintes: Pri- meira: Pode ser classificada racional em relagdo a fins. Neste caso a classificagdo se baseia na expectativa de que objetos em condigao exterior ou outros individuos humanos compor- tar-se-do de uma dada maneira e pelo uso de tais expectati- vas como “condigdes” ou “meios” para atingir com sucesso os fins racionalinente escolhiidos pelo individuo. Em tal caso, ser denominada agao em relacdo a fins. Segunda: A agio social pode ser determinada pela crenga consciente no valor absoluto da ago como tal, independente de quaisquer moti- vos posteriores ¢ medida por algum padrio tal como ética, estética ou religiao. Em tal caso de orientagao racional para um valor absoluto sera denominada acdo em relacdo a valo res, Terceira: A ago social pode ser determinada pela afeti- vidade, especialmente de modo emocional, como resultado de uma configuracdo especial de sentimentos e emogdes por parte do individuo, Quarta: A agao social pode ser determi- nada tradicionalmente, tornando-se costume devido a uma longa pratica social pode ser de- 1. A aco estritamente tradicional — exatamente como © tipo que reage por imitagao discutido antes (ver cap. 1) — fica inteiramente no limite do que se pode chamar de uma ago com sentido e As vezes até a ultrapassa. Freqiientemente 6 simplesmente uma reago amortecida — quase automética — a estimulos costumeiros que tém conduzido a agiio, repe- tidamente, ao longo de um curso rotineiro. A maior parte de todos os deveres rotineiros desempenhados habitualmente Pelas pessoas todos os dias é deste tipo; conseqiientemente, ndo pertence a esta classificagdio apenas como um caso mar- ginal, mas também (como ser demonstrado mais tarde) por- que sua ligagdo com o costume pode ser mantida com graus varidveis de autoconsciéncia e numa variedade de sentidos ste caso 0 tipo pode aproximar-se do de ntimero dois (rela- tivo a valor) 2. A acdo estritamente afetiva também fica na linha do que pode ser considerado uma ago consciente de sentido e, com freqiiéncia, ultrapassa também a linha; por exemplo, pode ser uma reaco desinibida a algum estimulo extraordiné- io. Hé um caso de sublimagio quando um comportamento afetivo condicionado toma a forma de liberago consciente de tenses emocionais. Quando isto acontece, de um modo geral, mas nem sempre, esté bem adiantado no caminho em diregio 4. agdo em relagio a valores ou fins, ou pende para ambas. A ago em relacio a valores distingue-se da ago afetiva por sua formulagio consciente dos valores dltimos que a governam e sua consistente orientagao planejada que se volta a estes valores. Ao mesmo tempo, estes dois tipos compartilham o fato de que o sentido da ago nao se resume a obtengao de algum tipo posterior, mas concentra-se no em- Penho existente no tipo de aco por si prdprio. A acao afeti- vamente determinada é a que exige a satisfagio imediata de um impulso, nao importando quo sublime ou sérdido possa ser, de modo a obter vinganga, gratificagio sensual, dedica 40 completa a uma pessoa ou ideal, contemplagio feliz, ou finalmente, para liberar tenses emocionais. Exemplos de aco pura em relagdo a valores estariam na ago de pessoas que, independentemente das conseqtién- cias, conduzem-se de tal maneira a por em priitica suas con- viegdes e o que Ihes parece ser exigido pelo dever, honra, beleza, religiosidade, piedade ou pela importincia de uma “causa”, nio importando qual o seu fim. Dentro de nossa terminologia tal agao em relagio a valores consiste sempre numa conformidade a comandos ou exigéncias cujo cum- primento a pessoa nela envolvida considera uma obrigagao, Somente até onde a ago humana se orienta exclusivamente a igéncias incondicionais — o que se mostra verdadeiro tais ex até um ponto bastante modesto — é que pode ser considera- da como “em relagio a valor”, ou seja, orientada a valores absolutos. Veremos que este tipo de agao € suficientemente importante para justificar seu isolamento como um tipo es- pecial; contudo, devemos observar que no se faz aqui ne nhuma tentativa para formular de qualquer maneira uma classificago exaustiva de certos tipos de ago. 4. A acio racional é da espécie orientada a fins quando enyolve a devida consideragio de fins, meios ¢ efeitos se- cundérios; tal ago também deve considerar atentamente as escolhas alternadas, bem como as relagdes do fim com ou- {ros usos possfveis do meio e, finalmente, a importancia rela tiva de diferentes fins possiveis. Assim, a classificagao da ago em termos afetivos ou tradicionais é incompativel com este tipo. A decisio entre fins e resultados competitivos e conflit 7, set determinada por uma con- sideragao de valores absolutos: neste caso tal conduta é ori entada a fins apenas no que diz respeito A escolha dos meios Ou a pessoa envolvida em tal conduta pode, ao invés de de cidir entre fins conflitantes ou competitivos em termos de orientago relativa a valor, apenas tomd-las como necessida- des subjetivas dadas e ordené-las numa escala de prioridades. Pode, entiio, orientar sua ago de acordo com esta escala de lal maneira que esteja conforme, até onde seja possivel, & ordem de prioridades prescrita pelo prinefpio de “utilidade ntes pode, por sua. vei 44 Esta agtio em relagdo a valores pode ser, de varias ma- neiras, relacionada & conduta orientada a fins. Do ponto de vista desta Gtima, entretanto, a orientagdo por valores adqui- re mais irracionalidade na medida em que se torna mais ab- soluta. Porque, quanto mais incondicionalmente o individuo se dedica a tal valor em si — seja por causa de sentimento, beleza, bondade absoluta ou devogio ao dever — menos pensa nas conseqtiéncias de tal dedicagao, Uma ago absolu- tamente orientada a fins, ou seja, & pura finalidade, sem qualquer referéncia a valores basicos, &, em esséncia, apenas uma excegiio que formulamos, 5, Raramente a agio, especialmente a ago social, ori- enta-se apenas de uma ou de outra destas maneiras. E nao se constitui, tampouco, uma classificagdo exaustiva dos tipos de ago ora existentes, pretendendo-se chegar somente a certas formas conceitualmente puras de tipos sociologicamente im- portantes, dos quais a agdo social se aproxima um pouco mais ©u pouco menos, ou que mais freqtientemente constituem os elementos que se combinam para formar tal ago. Apenas seu futuro sucesso pode justificar a utilidade desta classificagao ara 0s propésitos de nossa pesquisa. CAPITULO 3 O CONCEITO DE RELACAO SOCIAL O termo “relagio social” sera usado para designar a si- tuagdo em que duas ou mais pessoa estaio empenhadas numa conduta onde cada qual leva em conta 0 comportamento da outra de uma maneira significativa, estando, portanto, orien- tada nestes termos. A relacio social consiste, assim, inteira- mente na probabilidade de que os individuos comportar-se- fo de uma maneira significativamente determindvel. E con pletamente irrelevante 0 porqué de tal probabilidade, mas onde ela existe pode-se encontrar uma relagio social 1. Um critério de definigao exige, pois, ao menos um minimo de orientagdo mitua da conduta de cada um em rela- iio & de outro, Seu contetido pode variar bastante: conflito, hostilidade, atracio sexual, amizade, lealdade ow intercdmbio comercial, pode envolver “cumprimento”, “evasio” ou “tompimento” de um acordo; “competigiio” econdmica, er6- tica ou de qualquer outro tipo; participagdo em comunidades nacionais, estamentais ou de classe. Nestes tiltimos casos a mera associagao de grupo pode nao constituir ago social, como discutiremos adiante. Além disso, a definigio nao nos informa quanto ao grau de solidariedade ou oposigao predo- minante entre os que esto envolvidos nesta conduta. 2. E sempre um caso, se usado neste contexto, de senti- do imputado aos individuos envolvidos numa dada situagio concreta, seja na média ou num tipo puro construido teori- camente, mas nunca um caso de sentido normativamente ‘correto” ou metafisicamente “verdadeiro”, A relagao social MAX WERER consiste, mesmo no caso de tais “organizagdes sociais” como “Estado”, “Igreja”, “associagdio” ou “casamento”, no fato de que existiu, existe ou existiré uma conduta provavel, de al- guma maneira definida, apropriada a este sentido. Torna-se necessario enfatizar isto para evitar a aga conceitos, ou seja, sua degeneragiio em conceituagdes vazias, Desse modo, um “Estado” perde seu significado socio- logico to logo se torne provavel que cesse de manifestar qualquer espécie de ago social com sentido. Tal probabili- dade pode ser bastante alta ou pode ser insignificante. Po- n, em qualquer caso, apenas no sentido e grau em que de fato existe, ou pode ser avaliado como existindo, é que a relagdo social correspondente existe. De outra maneira ne nhum significado pode aplicar-se a frase de que um dado “Estado” existe ou deixou de existir destes 3. Todas as partes mutuamente orientadas numa dada relagdo social nao manifestam necessariamente 0 mesmo sentido subjetivo, ou seja, nao precisa haver qualquer “reci- procidade”, “amizade”, “amor”, “lealdade”, “confianga con- tratual”, “nacionalismo”, pois uma parte pode manifestar uma atitude inteiramente diferente da de outra. Para as partes envolvidas, sua conduta demonstra meramente varias formas € significados ¢ a relacio social é, para cada parte, simples- mente “assimétrica”. Mesmo assim, podem ser mutuamente orientados sempre que uma parte supde que outra manifesta- 4 uma atitude particular em relacZo a ela e orienta sua con- duta de acordo com tal expectativa. Quer esteja ou nao enganada em suias expectativas, isto pode, e geralmente re- sultard, de fato, num certo curso de conduta e teri conse- giiéncias na forma da relagio. Falando objetivamente, uma relagio “simétrica” existe apenas se em suas expectativas este relacionamento significar 0 mesmo para todas as partes envolvidas. Por exemplo, a atitude real de uma crianga para com seu pai pode ser, a0 menos aproximadamente, a que 0 ‘concer 10S BASICOS DE-SOCIOLOGIA pai, no todo, tem esperado. Uma relagio social em que as atitudes sio completa ¢ inteiramente orientadas recipro« mente 6, na verdade, um caso marginal. De acordo com nossa terminologia, a auséncia da reciprocidade excluird a existéncia de uma relagio social apenas se tal orientagio miitua estiver faltando realmente na agao das partes. Aqui, como em qualquer lugar, todas as espécies de casos interme- didrios constituem a regra ao invés da excegao. 4, Uma relago social pode ser de uma natureza transi- {ria ou de graus varidveis de permanéncia. Ou seja, pode ser de tal espécie que haja uma probabilidade de nova recorrén- cia da conduta, correspondente a seu sentido subjetivo, sen- do, portanto, esperada porque ¢ uma consequéncia de tal sentido, Contudo, para evitar que surjam impresses falsas, devemos lembrar e repetir que € apenas na presenga da pro- babilidade de que um complexo dado subjetivamente signi- ficativo resulte em um certo tipo de ago, que consiste a existéncia da relagio social. Assim, se a “amizade” ou 0 “Es- ado” existem ou tém existido, isto significa apenas que: em nosso jutzo, de observadores, hd ou tem havido a probabil dade de que, dados certos tipos de atitudes subjetivas conhe- cidas de certos individuos, resulte, na média, num certo tipo especifico de conduta, e nada mais (compare acima, a0 n? 2) H4 uma implicagio inevitavel, do ponto de vista legal: se uma regra de lei possui ou nao validade legal e uma relagio legal pode ser suposta como existente, conseqiientemente, mplesmente tal alternativa em si ndo é relevante para os problemas sociolégicos. 5. O significado subjetivo de uma relagio social pode mudar. Por exemplo, uma relagao politica baseada na solida- riedade pode mudar para outra baseada no conflito. Mas en- Wo trata-se simplesmente de uma questo de conveniéncia terminol6gica e do grau de continuidade na mudanca, po- dendo-se dizer que uma nova relago est comecando a exis- 48 MAX WEBER {ir ou que a antiga continua, mas est adquirindo novo senti- do. O significado também pode oscilar entre a constincia ea permanéncia. 6. O contetido de sentido que permanece relativamente Constante numa relagdo social pode ser expresso em axiomas que nos levam a esperar que as partes envolvidas correspon- dam ao menos aproximadamente a seus parceiros, Isto seri fanto mais provéivel quanto mais racional for a conduta em sua relacdo a valores ou fins dados. Hii muito menos possibi- lidade de formulagao racional de sentido subjetivo no caso de uma atragiio erética ou de uma relagao baseada na lealda- de pessoal ou em outro tipo emocional, do que a existente, Por exemplo, no caso de um contrato de negécios. 7. O sentido de uma relago social pode ser determina- do pelo consentimento miituo. Significa que os participantes fazem promessas concernentes a sua conduta futura — um em relago a0 outro, ou de maneira relacionada a ambos. Cada participante espera entdo que, normalmente, e até onde se comporte racionalmente, que 0 outro participante oriente a ago dele de acordo com 0 sentido que estabeleceu consigo; © primeiro participante assim entende em relagao ao segundo e vice-versa, A propria agdo de cada um é assim parcialmen- te orientada a fins ¢ ele espera corresponder com lealdade, tanto quanto possfvel; mas é também parcialmente orientada por valores, ou seja, ele tem o dever de corresponder a0 acor- do no sentido em que o entende. Sobre estas questdes antecipamos aqui tudo 0 que foi possfvel; para entendé-las melhor compare os capitulos 9 a0 13, CAPITULO 4 TIPOS DE ACAO SOCIAI USOS, COSTUMES Dentro do campo da conduta social encontramos algu- mas regularidades factuais. Isto &, hé certas ages que, com um sentido tipico ¢ idéntico, sdo repetidas pelos individuos envolvidos ou ocorrem simultaneamente entre uma quanti- dade deles. Sao tais tipos de ago que concerem a sociolo- gia, em contraste com a hist6ria, que se interessa pelas conexdes causais de eventos tinicos importantes, quer dizer, decisivos. Uma probabilidade realmente existente de regularidade ‘numa orientacao de agio social sera chamada de “uso”, até 0 Ponto em que a probabilidade de sua existéncia dentro de um grupo de pessoas nio se baseie em mais nada a nao set 0 habito real. O uso sera chamado de “costume” se 0 habito real vier de longa data, Por outro lado, onde 0 uso estiver determinado pelo fato de que toda a agdo das partes € orien- lada a fins, com expectativas idénticas, sera chamado de “uso condicionado por uma situagio de interesse préprio por parte do individuo” (interessenbedinght). 1. A “moda” também é uma parte do uso. Ela se distin- gue do uso quando a conduta em questao se motiva por sua novidade, ao invés da longa duragio, como acontece com o costume. A moda avizinha-se da “convengio", pois origina~ se, na maioria das yezes, do desejo por prestigio social. Nada mais precisamos diseutir aqui 50 MAX WEMER, 2, Em contraste com a “convengio” e a “lei”, falaremos de “costume” quando a regra niio est garantida externamen- te, mas quando 0 individuo procede de modo simples ¢ in- consciente ou por simples conveniéncia; qualquer que seja 0 motivo, ha sempre a expectativa justificada por parte dos membros dos grupos de que uma regra costumeira teré a correspondéncia dos outros, do mesmo modo e pelas mes- mas razGes. O costume, neste sentido, ni serve para reiv dicar “validade”: ninguém € obrigado a observé-lo. Obviamente, a transigdo deste caso para o de uma con- vengdo vilida ou lei é bem gradual. Por toda parte o que tem sido tradicionalmente comunicado tem-se tornado a fonte de tudo 0 que adquirit: autoridade valida. Tornou-se costumeiro que hoje tenhamos um café da manha de determinado tipo todos os dias, entretanto, ninguém é “obrigado” a fazé-lo, ‘com a possivel excego do héspede de um certo hotel, mas nem por isto tem sido sempre habitual. Por outro lado, nossa maneira de vestir nfo se baseia mais, hoje, no mero costume mas tem-se tornado uma convengio. A este respeito ainda merecem ser lidos os capftulos sobre usos € costumes do segundo volume de Zweck im Recht, escrito por Ihering. Ver também o Rechisregelung und Verkehrssitte, de P. Oertmann (1914) e Sitte, Recht und Moral, de E. Weigelin (1919), cu- Jas opinides esta de acordo com as minhas em desacordo ‘com as de Staemmler. 3. Numerosas regularidades bastante notadas na agio social nfo se baseiam de modo algum na orientagio para alguma norma ou uso “valido”, mas antes no fato de que 0 tipo correspondente de aco, pela natureza do caso, adapta-se melhor aos interesses normais dos individuos envolvidos, do modo que eles mesmos 0 percebem. Isto é especialmente verdadeiro na conduta econémica, como por exemplo na regularidade dos pregos de um mercado “livre”. Os distribu- idores tratam assim de sua propria conduta como um meio CONCEITOS BASICOS DE SOCIOLOGIA SI para cbter a satisfagio de fins, definidos como os que perce- bem ser seus préprios interesses econdmicos tipicos e tratam de medo semelhante como condigdes as expectativas tipicas correspondentes, em relagio & agiio que esperam dos outros Desta maneira, quanto mais rigidamente orientada a fins for sua conduta, tanto mais eles tenderdo a reagir de modo seme- Ihante na mesma situagio. Surgem assim semelhangas, regu- laridades e continuidades em suas atitudes e agdes, que frequlentemente sfio bem mais estaveis do que seriam se a sua aco fosse orientada por um sistema de normas e deveres considerados obrigat6rios pelo grupo. Este fendmeno — o fato de que a orientagio em termos de interesse préprio da pessoa ¢ de outros cause resultados muito mais semelhantes aos tentados através da coergao (muitas vezes inutilmente) Por um agente da autoridade — tem especial relevancia no campo da economia, Sua observacio foi, de fato, uma das origens importantes da economia como ciéncia. Mas é igual- mente verdadeiro em todas as dreas da agio. Este tipo de fen6meno, em sua consciéncia e falta de restrigdes, 6 a antt. tese direta a toda espécie de compromisso impensado que tem normas conscientemente aceitas como valores absolutos. Um componente essencial da racionalizagao da agio 6 a substituigo do compromisso impensado com os costumes antigos pela adaptagio planejada a situagdes, em termos de interesse proprio, Esté claro que nao esgotamos assim 0 con- ceito de racionalizagio da agao. Isto € assim porque, uma tal gio pode ocorrer positivamente, em diregao a realizago consciente de valores tiltimos ou, negativamente, no apenas custa do costume, mas também de valores emocionais e, finalmente, em favor de um tipo de relacionamento livre de valores, & custa da crenga em qualquer valor absoluto. As muitas interpretagdes do conceito de racionalizacao continu- am a ser de interesse para nds (conceituagées adicionais a este contexto sero encontradas no final). 32 MAX WERE 4. A estabilidade do (mero) costume reside essencial- mente no fato de que a nao adaptagao da aco a ele esta su- jeita a grandes e pequenos inconvenientes ¢ aborrecimentos, enquanto a ag: responder a este costume ¢ a proceder de acordo a ele. De modo similar, a estabilidade de qualquer conduta, em termos de interesse préprio, reside no fato de que a pes- soa que no “leva em consideragiio” os interesses dos outros provoca a hostilidade deles, podendo terminar numa situagaio diferente daquela que pretendia e correndo, portanto, 0 risco de prejudicar os seus proprios interesses. » da maioria dos envolvidos continuar a cor- CAPITULO 5 O CONCEITO DE AUTORIDADE LEGITIMA A agi, especialmente a ago social, e mais particular- mente a relagdo social, pode ser orientada, de parte dos indi- viduos, pelo que constitui sua “representaco” da existéncia de uma autoridade legitima. A probabilidade de que uma tal orientagaio realmente ocorra ser chamada de “validagao” da autoridade em questao. 1. A “validagio” de uma autoridade deveré significar, Portanto, mais que a mera regularidade da ago social, de- terminada pelo costume ou interesse préprio. O fato de que 0s transportadores de méveis fagam propaganda de seus ser- vigos regularmente na época do fim dos aluguéis 6 causado bem claramente por seu desejo de explorar uma oportunidade em seu interesse. O fato de que um vendedor ambulante visite regularmente um certo cliente num certo dia da semana ou més € 0 resultado de um longo habito ou de interesse préprio {por exemplo, 0 pagamento naquela empresa). Quando um servidor puiblico aparece em seu escrit6rio todo dia na mesma hora, isto pode ser determinado nao apenas pelo costume ou interesse préprio, jé que pode fazer o que bem entender, mas pode ser parcialmente o resultado de sa observancia aos regulamentos do escritério, que impoem certos deveres sobre ele, os quais podem relutar em transgredir, j4 que tal conduta no seria desvantajosa apenas para ele, mas também poderia ser detestavel a seu “sentido do dever”, o qual, numa exten- so maior ou menor, representa para ele um valor absoluto, 54. MAX WEBER, = 2. O contetido de uma relagio social somente represen- tara uma “ordem” se sua conduta puder ser orientada apro- ximadamente para certos_axiomas _reconheciveis. A autoridade adquiriré “validade” apenas se a orientagdo a es- tes axiomas incluir ao menos o reconhecimento de que tudo a que obrigam 0 individuo, ou a ago correspondente, consti- tui um modelo digno de imitagaio. Verdadeiramente, a con- uta pode ser orientada a uma autoridade por varios motivos. Mas o fato de que, ao lado de outros motivos, a autoridade seja mantida também ao menos por alguns dos outros indivi- duos como sendo digna de imitagio ou obrigatéria, natural- mente aumenta num grau considerivel a probabilidade de que a ago de fato se ajuste a ela. Uma autoridade sustentada so- mente por motivos de fins geralmente é muito menos estivel que uma mantida puramente numa base de costumes. Esta Uitima atitude para com a autoridade é bem mais comum. E. ainda mais estavel € 0 tipo de conduta orientada ao costume que goza do prestfgio de ser considerada exemplar ou obriga- t6ria, ou possui o que se conhece como “legitimidade”. Est claro que a transigdo de uma conduta orientada por fins ou por tradicao a uma motivada por uma crenga em sua legitimidade 6 extremamente gradual 3. Pode haver orientagio a uma autoridade valida, mesmo onde o seu sentido (como geralmente se entende) nao € necessariamente obedecido. A probabilidade da ordem ser mantida em alguma extensio como uma norma valida pode ter também um efeito sobre a aciio, mesmo onde seu sentido € burlado ou violado deliberadamente. Isto pode ser verda- deiro, em principio, mesmo com base na pura racionalidade. Assim, a agio do ladrio exemplifica a validade da lei penal, meramente pelo fato de que ele procura esconder sua condu- ta, O proprio fato de uma autoridade ser vélida dentro de um grupo particular faz com que ele busque necessariamente ocultar-se. Este é, naturalmente, um caso marginal, mas com CONCEITOS BASICOS DE SOCIOLOGIA 55 freqiiéncia a autoridade € violada apenas parcialmente em um ou outro ponto, ou eno 0 ato de violé-la € apresentado como legitimo, com uma medida maior ou menor de boa fé. Ou podem realmente coexistir varias interpretagdes paralelas do sentido da autoridade. Neste caso 0 socidlogo as conside- rard todas como vélidas, exatamente na medida em que re- almente modelem o curso da aco. O sociélogo nao tem dificuldade para reconhecer, dentro do mesmo grupo social, a existéncia de vérios sistemas vilidos de autoridade, possi- yelmente contraditérios entre si. Na verdade é possivel, até para © mesmo individuo, orientar a sua ago por sistemas mutuamente contraditérios de ordem. Isto pode ocorrer niio apenas em sucessio répida, mas pode ser observado diaria- mente, até no caso da mesma conduta. Uma pessoa que se envolve num duelo orienta sua acto para a observancia de um e6digo de honra; mas também orienta sua conduta pela lei penal, quer mantendo 0 duelo secreto ou, ao contririo, aparecendo voluntariamente na corte de justiga. Entretanto, onde a burla ou violagdo do sentido da autoridade geralmente aceito tem-se tornado a regra, uma tal autoridade pode ser chamada de “valida” apenas num sentido limitado, ou deixou de ser vilida como um todo. Para o jurista uma autoridade é valida ou nao; para 0 socidlogo nao existe tal escolha. Antes, ha uma transicdo gradual entre os dois extremos de validade © no-validade, sendo possivel que sistemas mutuamente contraditérios de autoridades coexistam validamente. Cada um € vilido exatamente na proporgdo da probabilidade de que a agi seja realmente orientada para ele. Os que estiio familiarizados com esta literatura lembra- Fo 0 papel desempenhado pelo conceito de autoridade no trabalho de R. Staemmler, o qual, embora seja brilhante, mostra-se, no entanto, equivocado e confunde os problemas de maneira desastrosa (ver meus comentarios do preficio), Staemmler nao falha ao distinguir entre o significado normativo eo empirico da validade, mas tampouco entende que @ conduta social nao se orienta apenas por autoridade Acima de tudo, ele trata a autoridade, de modo completa- mente ilégico, como uma forma de conduta social e tenta relacioné-la ao “contetido”, de uma maneira andloga ao de forma e contetido na teoria do conhecii cionar outros etros. Na verdade a ago, que € primariamente econdmica, por exemplo, orienta-se pelo conceito da relativa escassez de certos meios disponiveis para a satisfagio de necessidades, em relagdo & conduta considerada do individuo € 2 aciio presente e provavel de outros, na medida em que estes dependem dos mesmos recursos. Est4 claro que tal conduta, além disso, é orientada em sua escotha de procedi- mentos econdmicos pelas regras convencionais € legais re- Alidas, ou cuja violagaio, como se sabe, conhecidas como v4 provocaria certas reagdes de outras pessoas. Staemmiler conseguiu confundir este assunto empirico simples, sobretudo por af mar que uma relagZo causal entre autoridade e aco social empirica € uma impossibilidade con- ceitual. E verdade, esté claro, que entre a validade normativa, dogmitico-juridica de uma autoridade e qualquer fato empfri- co nao hé realmente nenhuma relago causal a ser encontrada. Neste contexto destaca-se apenas a questiio de se a autoridade como corretamente interpretada, no sentido legal, “aplica-se”” também a este fato empirico. A questo & se deveria ser trata- do como “vélido” num sentido normativo e, se isso fosse ver- dade, qual deveria ser o contetido de suas prescrigdes normativas. Entretanto, entre a probabilidade de uma conduta social orientada para a crenga subjetiva na validade da autori- dade e a acio economicamente orientada existe, esté claro, relagiio causal. Mas para os propésitos sociolégicos € exata- mente uma tal probabilidade de orientag’o em fungio de uma crenga subjetiva na validade de uma autoridade que constitui a autoridade vilida em si CAPITULO 6 TIPOS DE AUTORIDADE LEGITIMA: CONVENCAO, LEI A legitimidade da autoridade pode ser garantida das es maneiras: I. Em uma base puramente subjetiva, ou seja, que se deve a: 1) aceitagiio meramente afetiva ou emocional; 2 provir de uma crenga racional na validade absoluta da auto- ridade como uma expresso de valores tltimos obrigatorios, sejam éticos, estéticos ou de qualquer outro tipo; 3) originar- se em atitudes religiosas, isto é, guiada pela crenga de que a salvagaio depende da obediéncia a autoridade. Il. A legitimidade da autoridade pode ser garantida também pelo interesse préprio, na expectativa de conseqiiés cias especificas de uma espécie particular Um sistema de autoridade poder parecer: a) conven- cional, quando sua validade for externamente garantida pela probabilidade de que qualquer desvio dentro de um grupo social definido sera tratado com uma desaprovacio rela mente geral e significativamente perceptivel; b) um tal sis- tema de autoridade sera considerado /ei se for externamente garantido pela probabilidade de que um comportamento no costumeiro serd tratado com sangdes fisicas ou psiquicas, com a finalidade de tornar a conformidade obrigat6ria ou de punir a desobediéncia, sendo ministradas por um grupo de homens providos de autoridade especial para este propdsito (Sobre o conceito de convengao, ver: Ihering, op. cit.; Wei gelin, op. cit. e Die Sirte, de F, Yoennies, 1909). segui 58 MAX WEBER. 1. O termo “conyengiio” sera usado para designar a par- te do costume que, dentro de um dado grupo social, é apro- vada como valida ¢ garantida contra violagdes por sangdes de desaprovagao. Difere da lei, como definida aqui, para auséncia de um grupo com a fungiio especifica de coergio. A distingao de Staemmler entre convengio e lei que depende de submissio voluntaria nao corresponde nem ao uso lingilist co comum, nem esti de acordo com sua prépria ilustragiio. A conformidade com a convengio em assuntos tais como as formas gerais de cumprimento, 0 vestir-se decentemente, Virias regras que governam o intercémbio social, tanto na forma quanto no contetido, cria a expectativa de que o indi viduo a leve a sério e a considere obrigatoria, ao contrério da escolha da maneira de cozinhar, onde pode haver liberdade de aceitar ou rejeitar o uso comum, Por exemplo uma viola- io A convengao da ética profissional freqlientemente recebe séria ¢ efetiva retribuigio na forma de ostracismo social, podendo ser ainda mais efetiva que a sangio legal, ita meramente 0 grupo cuja fungo especifica é a de man- tera lei ¢ a ordem, com integrantes tais como juizes, promo- tores, oficiais administrativos e carrascos. Entretanto, nao existe aqui nenhuma linha divisGria clara a ser encontrada, O caso marginal de uma garantia convencional de uma autori- dade no processo de transi¢ao para uma garantia legal da autoridade deve ser encontrado na aplicagao do “boicote formalmente ameagado e organizado. Mas em nossa termi- nologia isto j4 constitui um meio de coergao legal. E irrele- Vante no presente contexto que, em certas circunstincias, uma convengio possa, somando-se & mera desaprovacio, ser também protegida por outros meios, como por exemplo no caso do dono de uma residéneia que expulsa o visitante cuja conduta nao Ihe parece convencional. O que é decisivo neste ‘caso € que um tinico individuo, em virtude de uma conven- 0 desrespeitada, aplica estas sangdes — freqtientemente Muito drésticas — no como um membro de um grupo orga- T | CONCEIFOS BASICOS DE SOCIOLOGIA 59. nizado provido de uma autoridade especifica, mas meramen- fe com base em sua prépria autoridade. 2. Em nosso contexto, 0 conceito de lei seré definido em termos da existéncia de um agente especial de coercio. Em outros contextos definigdes diferentes podem muito bem ser apropriadas. O cariter desta agéncia de coergao niio pre- cisa, esta claro, ser semelhante ao que estamos familiariza- dos hoje. Em particular, no € preciso que haja qualquer 6rgio judicial. Assim, no caso de uma rixa de sangue, o cl torna-se um tal agente de coeredo, contanto que sua agzio em tas situagGes seja governada de fato por algum conjunto de regras, Porém, este é um caso extremo que apenas por pouco pode ser considerado “coergdo legal”. Sabe-se muito bem que 8 lei internacional tem sido negada sempre a qualidade de lei precisamente porque carece de um agente de coergio supranacional superior. Na verdade, nos termos de nossa definicio, isto seria certamente verdadeiro quanto a um sis- tema de autoridade cuja legitimidade se baseia inteiramente na expectativa de desaprovagio e represilia por parte daque- les que sto prejudicados por sua violagio, ou seja, quando a conduta é garantida inteiramente pela convengao ¢ conveni- éncia, ao invés de um agente especifico de imposigao. Mas para os propésitos da terminologia legal o uso oposto pode- ria muito bem ser aceitavel Em qualquer caso, 05 meios coercitivos sao eficientes, ainda quando impréprios no sentido legal. Mesmo a “persua- sio amigavel”, que pode ser encontrada em virias seitas reli- giosas como uma forma de pressiio suave sobre os pecadores, constitui coergtio. em nosso sentido, se for efetuada de acordo com as regras ¢ por um grupo especialmente designado. Isto também é verdade para o uso de censura como um meio para impor normas de conduta moral ¢ ainda mais para a coergio psiquica exercida como um meio disciplinar da Igreja. Daqui em diante, a lei pode ser garantida por uma autoridade eclesi- 60__ MAX WERER, stica, bem como politica, e pode ser garantida pelos estatutos de uma associagao ou através de autoridade do chefe da fami- lia, As regras de organizagio fraterna so leis, em nosso senti- do, tanto quanto os deveres legalmente regulamentados, mas que mio podem ser impostos, mencionados no Artigo 888, item 2 do Cédigo Civil Alemao. As leges imperfectae e a ca- tegoria das obrigagdes naturais sao formas de terminologia legal que expressam indiretamente os limites ou condigdes para 0 uso da coergao juridica, Uma norma de convivio hu- mano imposta forgosamente, mesmo assim € lei (Ver 0 § 157, 242, do Cédigo Civil Alemiio — Buergerliches Gese buch — sobre o conceito de obrigagdes na lei comum, isto ¢, obrigagdes que surgem de padrdes comunitérios de compor- tamento aceitivel, obtendo, desta maneira, sangio legal. Ver também o artigo de Max Rumelin, Schwaebische Heimats- gabe fuer Theodor Haering, 1918) 3. Nem toda autoridade valida € necessariamente de um cariter geral abstrato, A distingdio entre um preceito legal ¢ uma decisio judicial nem sempre, nem em toda parte, tem sido to clara quanto temos chegado a esperar hoje em dia. Assim, a autoridade pode surgir simplesmente tendo como base a autoridade que governa, numa tinica situago conere- ta, Os pormenores deste assunto constituem a preocupagio da sociologia do direito. Mas para os nossos propésitos a distingio moderna entre um preceito legal e uma decistio specifica sera tomada como certa, a nilo ser nos casos em que se indique 0 contritio. 4, Um sistema de autoridade que € garantido por san- ‘ges externas também pode tornar-se internalizado. O rela- cionamento entre lei, convengio e ética no apresenta quaisquer problemas para 0 socidlogo. Este considera um padrio como “tico” se pessoas the atribuem um tipo espec fico de valor que reivindicam como bom eticamente, exata- mente como qualquer conduta considerada como bela, pode __coxcermos _6L ser medida por padrées estéticos. Idéias eticamente normati- vas desta espécie podem ter uma poderosa influéncia sobre a conduta, mesmo que thes falte qualquer garantia externa. Este ¢ freqiientemente 0 caso quando a violagio de tais pa- drdes niio afeta os interesses dos outros. 5. Por outro lado, tais padrdes éticos também siio fre- gllentzmente sancionados pelas crengas religiosas. Contudo, também podem ser mantidos pelo boicote, ou por meios le- gais tais como a ago da policia ¢ as sangdes aplicadas pelo direito civil e criminal. Todo sistema ético realmente vilido sociologicamente, provavelmente fundamentar-se- vengao, ou seja, na probabilidade de desaprovagdo generali- zada que se segue a sua violagio. Entretanto, norma convencional ou legalmente sancionada reclama ser ética. Normas legais sio freqtientemente motivadas pela me- ra conveniéncia e assim podem reivindicar menos ainda um cariiter ético que as normas convencionais, Se uma autorida- de nermativa aceita socialmente pertence ou nao ao campo da ética ou é mera convengio ou lei, isto pode ser decidido ‘empiricamente em termos do que é realmente sentido como “ético” pelo grupo observado em pesquisa. Mas nao é possi- vel estabelecer qualquer generalizagao a este respeito. na con- CAPITULO 7 A VALIDADE DA AUTORIDADE LEGITIMA: TRADICAO, FE, LET Um sistema de autoridade pode legitimamente assumir validade aos olhos daqueles que Ihe esto sujeitos de uma variedade de maneiras: 4) pela tradigdo: aqui o que sempre existiu € valido; b) em virtude de ligagio emocional, legitimando a va- lidade do que foi ha pouco revelado ou que considera digno de imitagao: ¢) em virtude de uma crenga racional no seu valor ab- soluto: © que tem sido revelado como sendo absolutamente vilido é valido; 4) por ter sido instituido modo positivo, sua legalidade sendo reconhecida como estando além de questio. Tal legali- dade pode ser considerada como legitima: 1) porque tem sido aceita voluntariamente por todos 0s envolvidos; 2) porque tem sido imposta com base no que se mantém como a autoridade legitima de aigumas pessoas sobre outras e, portanto, exercita uma reivindicagao correspondente a sua obediéncia. Todos os outros pormenores, exceto por uns poucos conceitos outros que precisam de definigaio, sero discutidos a seguir, na sociologia do direito e na sociologia do poder. Por enquanto os seguintes breves coment ios serdo suficientes, 1. A legitimidade da autoridade mais antiga e mais uni- versalmente mantida baseia-se no carter sagrado da tradi- do. O temor de penalidades mégicas fortalece as inibigoes psicolégicas a respeito das mudangas nos modos costumeiros 64. MAX WERER de conduta, Ao mesmo tempo um sistema de autoridade con- tinua valido por causa dos muitos interesses empenhados que se levantam com respeito & sua perpetuacio. 2. Criagdes conscientes de autoridades novas formam, originalmente, quase inteiramente, 0 resultado de orfculos proféticos ou, ao menos, de revelagdes que gozam da auréola da profecia, como é verdade até para os estatutos dos Aisim- netes Helénicos. A aquiescéncia dependia entio da fé na legitimidade do profeta. Em perfodos de rigoroso tradiciona- lismo nenhum sistema novo de autoridade podia surgir as- sim, sem que se proclamassem revelagdes novas, a no ser que o sistema novo de autoridade nao fosse considerado re- almente novo mas fosse considerado, ao invés, como uma verdade que jé houvesse sido vilida mas que fora temporari amente obscurecida © que estivesse sendo agora restaurada em seu lugar de direito. 3. O arquétipo da legitimidade absolutamente referente a valores € encontrado na idéia do “direito natural”. A influ- éncia de seus preceitos logicamente desenvolvidos sobre a conduta real pode nem sempre estar de acordo com as suas pretensdes ideais, mas ela inegavel. Estes preceitos devem, Portanto, ser claramente distinguidos dos da lei revelada decretada, ou tradicional. 4. Hoje, a forma mais comum de legitimidade é a cren- a na legalidade, ou seja, a aquiescéncia aos decretos que so formalmente corretos e que tém sido impostos por um procedimento costumeiro. O contraste entre regras voluntar amente aceitas e aquelas que tém sido impostas de fora é rigorosamente relativo. No passado, para uma autoridade ser tratada como legitima era freqtlentemente necessério que fosse aceita unanimemente, Hoje, entretanto, acontece fre- giientemente que uma autoridade seja aceita por uma maioria dos membros de um grupo enquanto a minoria, que sustenta GIA 65 [0S BASICOS DE SOCIO! coc opinides diferentes, apenas se submete. Em tais casos a auto- ridade € realmente imposta pela maioria sobre a minoria Muito freqiiente é também 0 caso de uma minoria violenta, brutal ou simplesmente enérgica que imponha uma autorida- de que eventualmente venha a ser considerada como legitima por aqueles que originariamente a ela se opuseram. Onde o voto é 0 método legal de criar ou de mudar um sistema de autoridade, acontece freqilentemente que vontades minorité- rias obtenham uma maioria formal & qual a maioria real se submete: neste caso, 0 “governo da maioria” é apenas apa- réncia. A crenga num sistema contratual de autoridade pode ser tragada até tempos bem antigos e pode também ser en- contrada entre os assim chamados povos primitivos, mas em tais casos quase sempre est suplementada pela autoridade de oréculos. 5. A aceitagilo de uma autoridade imposta por um ho- mem qualquer ou por virios, até onde niio dependa de mero medo ou derive de motivos de conveniéncia, sempre pressu- poe uma crenca na autoridade legitima da fonte que a impoe. 6. Como regra, a aceitacio de uma autoridade é quase invariavelmente determinada por uma combinacdo de moti vos, tais como 0 interesse prOprio, ou uma mistura composta de aderéncia & tradigao e uma crenga na legalidade, a niio ser em um caso de principios inteiramente novos. Muito fre- giientemente aqueles que concordam assim com a autoridade niio esto sequer conscientes de se o fazem por costume, convencio ou lei. Torna-se, entio, tarefa do socidlogo anali- sar aquela base de validade que seja mais tfpica. CAPITULO 8 O CONCEITO DE LUTA ima relagio social seré chamada de luta, na medida em que a ago de um partido for orientada propositadamente a fim de satisfazer a vontade prépria, prevalecendo contra a resistncia de outros partidos ou de um outro partido. Se os meios de uma tal luta ndo consistem na violéncia fisica real, entao 0 processo é de luta “pacifica”. Esta luta “pacifica” serd chamada de “competicao” se for uma tentativa formal- mente pacifica de obter o controle de oportunidades e vanta- gens também cobigadas por outros. Uma competigiio sera conhecida como “competigao controlada” se seus meios e fins estiverem sujeitos & mesma autoridade, Esta luta social ou individual, freqiientemente latente, por vantagens ¢ pela sobrevivéncia, sem basear-se necessariamente em um confli- to de interesses, sera chamada de “selecdo”. Na medida em que € uma questio das oportunidades relativas de individuos durante seu proprio perfodo de vida, é uma forma de “sele- ‘so social”; na medida em que concerne a probabilidade va- ridvel da sobrevivéncia de caracterfsticas herdadas, é uma forma de “selecao biolégica’ 1. Existe uma grande variedade de estdgios intermedia- trios, indo do combate sangrento nao reprimido por quaisquer regras e tendo como meta a completa aniquilagzio do inimi- g0, até os torneios convencionalmente regulamentados na Idade Média (ver 0 chamado cléssico do arauto antes da bata- tha de Fontenay: “Messieurs les Anglais, tirez les premiers!”), bem como as regras do jogo que governam rigorosamente 68 MAX WE tum esporte. Outros exemplos de tais transigGes so a compe- tigdo erética irrestrita dos pretendentes aos favores de uma io econdmica regida pelas leis do mercado, ou as competigdes rigorosamente regulamentadas pelos pré mios artisticos, ¢ finalmente a vit6ria ganha duramente na campanha eleitoral. A diferenciagao conceitual de luta vio- lenta, fisica, é justificada pela singularidade dos meios nor Eee ois cortespondentes peculiaridades das conseqiiéncias sociolégicas de seu uso. dama, a competiga 2. Todas as formas de luta ¢ todas as maneiras de com- peticdo que ocorrem tipicamente em grande escala levari independentemente da intervengao possivel do acaso, a uma selegio de todos aqueles que possuem num grau mais alto as qualidades pessoais importantes para 0 sucesso. A naturez: destas qualidades é determinada pelas condigdes de luta ou competigao que incluem, além de qualquer e toda qualidade individual ou das massas imaginaveis, também as dos siste- mas de autoridade de acordo aos quais o comportamento dos individuos se orienta, em virtude da tradigo, f€ ou conveni- éncia. Assim, qualidades necessirias podem ser a forca fisi- ca, a falta de esertipulos, 0 nivel de habilidade mental, a Poténcia dos pulm@es ou técnica demagdgica, maior lealdade 408 superiores ou técnica demagégica, maior originalidade criativa ao invés de adaptabilidade social; em suma, aquelas qualidades que sejam necessérias, quer extraordindrias, quer medfocres. Qualquer tipo de autoridade influencia de modo diverso as oportunidades para a selegao social Nem todo processo de seleco social é uma “Iuta” no sentido aqui admitido. De imediato, a “selegao social” signi fica apenas: que certos tipos de conduta e, eventualmente, de qualidades pessoais, tm mais probabilidade de entrar em uma determinada relacZo social; por exemplo, na relagio de amante, marido, deputado, servidor piblico, diretor geral, homem de negécios de sucesso etc. Se esta vantagem social CONCEITOS BASICOS DE SOCIOLOGIA 69 foi ou nfo conseguida através de “luta” nio se pode discer- nir. No processo de selego social, nem é possivel determi nar se afeta as oportunidades biol6gicas de sobrevivencia de uma maneira ou de outra. Apenas onde existe uma competigio verdadeira é que 0 termo “luta” se aplica, A experiéneia mostra que apenas a luta € inevitével no sentido de selecdo e somente no sentido de selegio biolégica ela é inevitavel, em princfpio. A selecao 6 eterna precisamente porque parece nio existir qualquer meio que possa remové-la completamente. Mesmo para um sistema de autoridade rigorosamente pac nas regulamentar os meios, diregdes e objetivos de I dando apenas com cada tipo separadamente. Isto significa que hé outras maneiras de lutar em direcdo a vit6ria, desde que 0 processo de competigio permanega aberto. Mas mesmo se supuséssemos, utopicamente, que a competigzo pudesse ser completamente eliminada, tais condigdes, enquanto prevale- cessem, levariam ainda a um processo latente de seleciio, seja biolégico ou social, e que favoreceria os tipos melhor adapta- dos a estas condigdes, indiferentemente as qualidades ambi- entais ou hereditérias. A selego social, empiricamente, e a selegdo biolégica, em prinefpio, agem como obstéculos a completa eliminagio da luta. 3. A luta e 0 processo de seleciio que ocorrem nas rela~ «des sociais devem ser distinguidos, naturalmente, da luta do individuo pela sobrevivéncia e sucesso. Apenas num sentido metafrico podem estes conceitos ser aplicados a relagdes sociais, pois as relagdes existem apenas como agdes huma- nas com sentidos subjetivos particulares. Portanto, um pro- cesso de selecio ou luta entre elas significa que um tipo especifico de ago esti sendo deslocada por outra, seja aco da mesma pessoa ou de outras pessoas. Isto pode ocorrer de varias maneiras. A ago humana pode ter como fim, primei- ro, a altera¢do consciente de certas relagdes sociais ou a pre~ 0____ maxwerer, vengao do seu aparecimento ou perpetuagao; por exemplo, um “Estado” pode ser destrufdo por guerra ou revolucdo, por uma conspiragio, por uma repressdo sangrenta; 0 concubina- to por uma medida policial; a pritica de usura nos negécios através da falta de protegio legal e através da imposigdo de penalidades. Ainda, as relagdes sociais podem ser influenci- adas pelo tratamento deliberadamente favorecido de um gru- Po social sobre outro. Tais fins podem ser perseguidos por individuos ou por grupos organizados. Secundariamente, também pode ocorrer que curso da ago social, como pro- duto colateral, niio intencional, leve a que certas relagdes sociais concretas diminuam progressivamente suas probabi- lidades de continuar ou de serem criadas novamente. Todas as mudangas de condigdes naturais e sociais t@m alguma es- pécie de efeito sobre as probabilidades de sobrevivencia das relagdes sociais. Qualquer um é livre para considerar tais casos como um processo de “selecdo”. Um exemplo seria dizer que entre varios Estados 0 “mais forte”, no sentido de ser 0 mais “adaptavel”, emergira vitorioso. Mas deverfamos lembrar que, esta selegio assim chamada nao tem nada a ver com a selecio de tipos humanos no sentido social ou biolé- gico; em cada caso serd necessério inquirir as causas que tém Jevado a uma mudanca nas probabilidades de sobrevivéncia ou destruigdo de uma outra forma de ago ou de relago so- cial. A explicagao de tais processos causais envolve tantas facetas que pareceria sabedoria nao abranger a todos com um termo tinico; de outra maneira corremos o perigo de introdu- 2ir juizos de valor nio-criticos nas investigages empiricas € corremos 0 risco de generalizar um caso particular que se baseia meramente em circunstancias “acidentais". Este tipo de argumento (em, infelizmente, se tornado cada vez mais freqiiente nos anos recentes. O fato de que uma dada relacao social tenha sido eliminada por razes caracterfsticas apenas de uma situacao particular, nfo nos diz. nada, afinal, sobre 0 valor de “sobrevivéncia” de uma tal relagio, CAPITULO 9 COMUNIDADE E SOCIEDADE DAS RELACOES SOCIAIS Chamamos de comunidade a uma relagio social na medida em que a orientagio da ago social — seja no caso individual, na média ou no tipo ideal — baseia-se em um sentido de solidariedade: 0 resultado de ligagdes emocionais ou tradicionais dos participantes. A relagio social de socie- dade, por outro lado, é 0 resultado de uma reconciliagao ¢ de um equilibrio de interesses motivados por juizos racionais, quer de valores, quer de fins. Tipicamente, a sociedade pode, mas nao precisa, fundamentar-se em um acordo racional a que se chegou por consentimento miituo. Neste caso a agio racional seré orientada por valores, ou seja, baseada na f€ da validade compuls6ria da obrigagao de aderir a ela, ou sera orientada por fins, na expectativa da lealdade da outra parte, 1, Esta terminologia lembra a diferenga feita por F. To- ennies em sua obra pioneira Gemeinschaft und Gesellschaje. Entretanto, para os propésitos de sua investigagao, ele deu a esta distingiio um significado mais especifico do que seria conveniente para os propésitos da presente discussao. Os tipos mais puros de sociedade podem ser encontrados: a) na natureza rigorosamente conveniente do intercdmbio do mer- cado livre: geralmente um comprometimento de interesses opostos, mas complementar; b) na unio puramente voluntiia baseada no interesse préprio, cuja meta é a promogio dos inte- resses_materiais especificos (por exemplo, econémicos) de seus membros: ¢ c) na unio voluntéria baseada em valores 2 MAX WEBER ideol6gicos absolutos — por exemplo, uma seita racionalmen- te orientada que despreza interesses emocionais ou afetivos, mas se devota apenas a uma “causa” (0 que certamente, em seu tipo puro, ocorre somente em casos excepcionais). 2. A comunidade pode basear-se em qualquer espécie de ligag3o emocional, afetiva ou tradicional: por exemplo uma irmandade espiritual, um relacionamento erético, uma relagio de lealdade pessoal, uma heranga nacional, ou 0 companheirismo de uma unidade militar. Este tipo € encon- trado mais convenientemente na relaco familiar. E claro que a grande maioria dos relacionamentos sociais compartilham tanto da comunidade, quanto da sociedade. Nao importa qudo convenientes e sObrias possam ser as consideracGes predominantes em uma relagio — por exemplo, a do fregués com o balconista — ela estar aberta & introducdo de valores emocionais que se estendem além da mera utilidade arbitré- ria. Toda relagdo social que vai além da busca de fins co- muns imediatamente atingfveis envolve um grau relativo de permanéncia entre as mesmas pessoas ¢ tais relagdes nfo podem ser limitadas a atividades de uma natureza puramente técnica, Uma tal tendéncia pode ser observada no caso de uma sociedade dentro da mesma unidade militar ou na mes- ma classe na escola, ou no mesmo escritério ou loja, embora a intensidade das afeigdes desenvolvidas varie considera- velmente. De modo inverso, € possfvel que uma relagiio so- cial de cardter primariamente comunal manifeste um tipo de comportamento por parte dos seus membros que seja, intei- ramente ou em parte, motivado por fins racionalmente deli- mitados. Por exemplo, grandes diferengas podem ser encontradas na extensio em que os membros de um grupo familiar sentem uma comunhio genuina de interesses ou, a0 invés, exploram o seu status como “unidade social” para fins puramente pessoais. O conceito de comunidade 6 mantido CONCEITOS BASICOS DE SOCIOLOGIA 2B aqui deliberadamente vago © conseqtlentemente inclui um grupo muito heterogéreo de fendmenos. 3. A comunidade €, no sentido usado aqui, normalmen- te 0 oposto direto de “luta”. Nao devemos permitir, entretan- to, que isto nos engane a ponto de pensarmos que a coercdo real njio possa ser encontrada normalmente mesmo nas rela- oes comunais mais fntimas, submetendo-se uns a outros; € também que o processo de selegaio de tipos, levando a dife- rengas de oportunidades e sobrevivéncia, no continue den- tro destas relagdes, como 0 faz. por toda parte. A sociedade, por outro lado, representa meramente a reconciliagiio de inte- esses competitivos, em cujo caso somente uma parte do objetivo ou dos meios de luta sio eliminados (ou a0 menos se faz a tentativa de uma tal eliminagdo), mas o conflito real de interesses com a correspondente competigao por oportu- nidades no se altera. Luta e comunidade sio conceitos rela- tivos; uma luta pode tomar vérias formas, dependendo dos meios usados, pacffices ou violentos, e o grau de brutalidade com que sao empregados. Como afirmamos antes, qualquer tipo de autoridade governando a ago social deixa espaco para 0 processo ideal de selecaio na competigao entre varios tipos humanos rivais. 4. Nao 6 de nenhum modo verdadeiro que a participa- 10 em qualidades comuns, numa situagio comum ou de modos comuns de comportamento implicam na existéncia de uma comunidade. Por exemplo, a posse de caracteristicas bioldgicas comuns herdadas e adequadas ao estabelecimento de distingdes raciais para certas pessoas nio implica de qual- quer maneira em uma comunidade entre elas. Por restrigGes sobre seu direito ao comércio ou casamento tais pessoas po- dem encontrar-se na mesma situagao, ou seja, isoladas do seu. ambiente costumeiro que impde tais restrigdes. Porém. mesmo se todos reagirem a esta situagao da mesma maneira, isto no constitui uma comunidade criada por um “sentimen- 74. _____ Max wenee to” meramente comum a respeito da situagao e de suas con- seqiiéncias. £ apenas quando este sentimento leva 2 orienta- 0 miitua de sua agio reciprocamente referida, que a comunidade surge entre eles. Isto € especialmente verdadeiro para os judeus que, com excectio de alguns sionistas e das atividades de algumas organizagGes de juros especificamente judaicas, experimentam apenas um sentimento relativamente pequeno de comunidade; de fato, os judeus frequientemente repudiam a existéncia de uma comunidade judaica. ‘Uma comunidade de linguagem como um resultado de uma semethanga de tradigao através da familia © ambiente social envolvente facilita 0 entendimento mtituo e promove, portanto, no grau mais alto, toda espécie de relagiio social Por si a linguagem nao é suficiente para constituir uma co munidade, mas meramente facilita a comunicagio entre os grupos envolvidos e, portanto, possibilita relagdes de socie- dade. Ela faz isto através do contato entre individuos, nao porque falem a mesma lingua, mas porque compartilham outros tipos de interesses. Uma orientago para as regras de uma lingua comum é primariamente itil como meio de co- municago, mas nio suficiente para prover a substancia da relagio social. E apenas com o surgimento de diferencas conscientes, em relagiio a terceiros, que o fato de dois indivi- duos falarem a mesma lingua e compartilharem de uma situ- aciio comum pode levé-los a experimentar um sentimento de comunidade e a criar modos de organizagio social conscien- temente baseados na participago de uma lingua comum. A participagdo num mercado é ainda de um tipo dife- rente, Ela encoraja sociedades entre individuos diferentes a0 engajarem-se em atos especificos de intercambio ¢ numa relagio social, especialmente a de competicao, entre os pro- vaveis compradores, cujo comportamento deve ser mutua- mente orientado. Além disto, podemos falar de sociedade apenas na medida em que alguns participantes individuais entram em acordos de maneira a perseguir suas vantagens CONCEITOS BASICOS DE SOCK 15 uma guerra de precos, ou a assegurar e regulamentar todas as transagdes sob condigdes favordveis a eles apenas. De fato, o mercado livre e a economia competitiva, nela base: da, formam o tipo mais importante da influéncia reciproca de ago em termos do puro interesse préprio, nao tipico das economias modernas CAPITULO 10 RELACOES SOCIAIS ABERTAS E FECHADAS Uma relacdo social, independente de ser uma comuni- dade ou sociedade, seré chamada de “aberta” ao exterior, sempre que a participacio na aco social mutuamente orien- tada, relevante em seu sentido subjetivo, nao for negada pe- Jas regulamentagdes que regem esta relagio a qualquer um que esteja inclinado e esteja de fato em condicio de nela partic:par. A relagao sera chamada de “fechada” ao exterior, por outro lado, sempre e quando devido ao sentido da as regulamentagdes que a regem, a participagio de certas pessoas for excluda, limitada, ou sujeita a condigoes. O rater cberto ou fechado de uma relagao social pode depender da tradigo ou de atitudes afetivas, ou condicionado racional- mente por valores ou fins. E mais provavel que seja fechado por razOes racionais nas seguintes situagOes: uma rek social pode prover aos participantes a oportunidade de satis- fazer muitos interesses diversos, sejam satisfagdes espirituais ou materiais, seja participando pelo fim ou pelos seus resul- tados, através da cooperagio ou da conciliagao de interesses. Se os participantes, através da admissao de estranhos, espe- ram chegar a uma melhora de sua situagaio no grau, na espé cie, na seguranga ou no valor da satisfaco, terao interesse em manter a rela m inte ressados em melhorar sua posigdo através de préticas mono- polistas tender a favorecer uma relagdo fechada io aberta. Se, inversamente, estiver 78 MAX WEBER. Uma relagao social fechada é capaz de garantir proba- bilidades monopolizadas a seus membros através de: a) etigdio livremente desenvolvida dentro do grupo; b) regulamentagdo ou racionamento de tais probabilidades; c) sua apropriagao por individuos ou pequenos grupos numa base permanente, em cujo caso se torna mais ou menos inali- endveis. Este tiltimo caso € um fechamento por dentro, bem como um fechamento contra estranhos. Tais probabilidades apropriadas serio chamadas de “direitos”, Em harmonia com © sistema predominante de autoridade, a apropriagio destes direitos pode ser estendida para o beneficio de todos os membros de comunidades ou sociedades (por exemplo, uma comunidade doméstica) ou para o beneficio de individuos Neste tiltimo caso, tais direitos sto desfrutados pelo indivi- duo numa base puramente pessoal, ou de tal maneira que no caso de sua morte uma ou mais pessoas relacionadas com o mantenedor do direito por nascimento (parentesco), ou por alguma outra relagio social, pode herdar os direitos em ques- to. Estes direitos podem passar ainda a um ou mais indivi- duos especificamente designados pelo mantenedor original Finalmente, pode ser que 0 mantenedor original esteja mais ‘ou menos capacitado a alienar os seus direitos voluntaria- mente a outros individuos ou a qualquer um que escolher. Isto se conhece como apropriagio aliendvel O participante ativo de uma relagio social fechada sera chamado de um membro; mas se a participacio for regula- mentada de tal maneira a garantir-Ihe vantagens apropriadas, ele seri chamado de membro legal com direitos e privilégios. Vantagens apropriadas, que sio desfrutadas pelos individuos através da hereditariedade ou por grupos hereditirios, serio chamadas de “propriedades” do individuo ou do grupo em questiio; até onde siio “aliendveis”, so propriedades “livres” A definigio aparentemente “laboriosa” destes conceitos constitui um exemplo de que o fato “evidente por si” raramen- te € pensado com clareza, pela propria razo de parecer bvio. ros ns! 79 con ‘08 DE SOC 1. a) Comunidades fechadas em virtude da tradigio sto, por exemplo, aquelas em que a participagiio se funda em lagos de famili b) Relagdes pessoais de uma natureza emocional, por exemplo, aquelas baseadas no amor ou na lealdade, sio geralmente fechadas de modo efetivo; ¢) O fechamento relacionado ao valor é geralmente caracterfstico de um grupo que compartilha um sistema de crengas religiosas comuns; d) O fechamento orientado a fins € tipico de associa. Ges econdmicas de um carter monopolista ou plutocratico. Aqui esto alguns poucos exemplos escolhidos ao aca- so. O caréter aberto ou fechado das comunicagdes verbais, depende de seu contetido; assim, a conversagio geral tende a ser aberta, enquanto um col6quio fntimo ou uma conversa de negécios tendem a ser fechados. Relagées de mercado sio geralmente, a0 menos no comego, de uma natureza aberta. Em numerosos casos de comunidade e sociedade podemos observar uma oscilagio entre as caracterfsticas de fechamen- toe abertura; por exemplo, no caso das guildas ¢ das cida- des-Estados democriticas da Antigitidade e da Idade Médi havia uma tendéncia, as vezes, de aumentar seus membros no interesse de melhorar a seguranga de sua posicao de po- der, enquanto em outras €pocas, se restringiam os membros para proteger o valor de sua posigao monopolista. O mesmo fenémeno nao € incomum nas ordens mondsticas ¢ seitas religiosas que tém mudado de um estégio de proselitismo religioso para um de hermetismo, seja no interesse de manter um padrio ético alto ou para a protegao dos beneficios mate- riais. A expansio das relagdes de mercado, tendo como fim uma maior movimentagdo de dinheiro ou sua contratagaio para praticas monopolistas, € um caso semelhante. A promo- co da uniformidade lingifstica € hoje um resultado natural dos interesses de publicagdes ¢ de escritos € pode contrastar OT : 80. MAX WEBER, com a tendéncia mais primitiva, nao incomum, de certas classes manterem peculiaridades lingifsticas ou recorrerem ‘mesmo a linguagens secretas, 2. Tanto a extensio quanto o método da regulamenta- gio € a exclusiio de estranhos podem variar enormemente, de modo que a transigiio de uma condicZo aberta para uma regu- lamentada ou fechada € gradual. Varios requisitos para ad- missdo podem ser propostos: provas de admissao e periodos de iniciagdo, a aquisigao de um titulo sujeito a certas condi- $0es, a elei¢io de novos membros por voto, a elegibilidade baseada na ancestralidade ou em virtude do desempenho, no caso de restrigiio dirigida internamente sobre a apropria- io de direitos dentro do grupo, 0 status pode depender da fio de um tal direito apropriado. Qualquer quantidade de variedades de fechamento ou de condigdes para admisstio Pode ser encontrada. Assim, a regulamentagao ¢ 0 hermetis- mo so conceitos relativos. Ha toda espécie de estiigios in- termediarios, indo do clube exclusivo & audiéncia do teatro, cujos membros t&m bilhetes comprados, ao comicio de um partido em campanha, que est abeto ao maior nimero pos- sivel de pessoas; semelhantemente, de um culto de igreja aberto ao piblico através dos rituais, a uma seita limitada e 405 mistérios de um culto secrete. 3. Restrigdes dentro do grupo — como entre membros € em suas relagées reefprocas — podem assumir também as formas mais diversas. Por exemplo, uma casta, guilda, ou uma associagao de corretores de bolsa fechada a estranhos, pode permitir a seus membros a livre competicdo por todas as vantagens que o grupo como um todo monopoliza para si; ou pode restringir em relagio a membro, durante o prazo da ‘sua vida ou numa base hereditéria, 0 gozo de certas vantagens, tais como acesso a fregueses ou a oportunidades de negécios especificos. Isto é especialmente caracteristico da india. Se- melhantemente, um grupo fechado de colonos pode permitir a CONCEITOS BASICOS DI \CIOLOGIA 8. seus membros 0 uso livre do solo, ou pode restringi-lo rigida- mente a uma partitha especifica de terra por familia. Aqui, novamente, todas as formas concebfveis transicionais e in- termediarias podem ser encontradas. Historicamente, por exemplo, a restrigio dentro do grupo de eventuais reivindi- cadores de um feudo, de beneficio eclesifstico © cargos, e a apropriago por parte daqueles que os desfrutam tém ocorri- do das mais variadas maneiras. Do mesmo modo, o estabele- cimento de direitos e a posse de determinados empregos por parte do trabalhador seguem todo um caminho, desde 0 im- pedimento pelo sindicato até o direito a um determinado em- prego. O surgimento dos conselhos do trabalho pode ser, embora nao precise, um primeiro passo nesta diregzio. Um estdgio preparativo seria a proibigao de despedir-se um ope- rario sem o consentimento dos representantes dos operirios. Estes pormenores pertencem & andlise objetiva dos ca- sos individuais. A forma mais extrema de apropriagiio per- manente existe onde direitos particulares so garantidos ao individuo ou a certos grupos, tais como o lar, 0 cla, ou famf- lia, de tal maneira que por lei, no caso de morte, os direitos passam a herdeiros espectficos e 0 possuidor é livre para transferi-los a qualquer pessoa a vontade; este tiltimo torna-se assim parte da relago social, de modo que quando a apropria- gio aleanga o extremo dentro do grupo, ele se torna um gru- po relativamente aberto em relagio aos estranhos. Isto é verdadeiro quando a aquisigao do direito de ser membro niio est ligada ao consentimento dos outros membros. 4. As principais motivagdes para uma relago social fe- chada sdo: a) a manutengio da qualidade e eventualmente do prestigio e oportunidade que dele derivam, para gozar de honra e possivelmente mesmo de lucro. Exemplos deste tipo: comunidades de ascetas, ordens mondsticas, especialmente as ordens mendicantes indianas, seitas religiosas como a dos puritanos, grupos organizados de veteranos, de ministros e 82_ MAX WEBER de outros burocratas, grupos organizados de cidadaos como has cidades-Estados gregas, e guildas de artestios; b) a falta de oportunidades em relagiio as necessidades de consumo. Exemplos: os monopélios de consumo, cujo arquétipo esta na comunidade auto-suficiente de vilarejo; ¢ c) a falta de oportunidades de sustentar a vida pelo trabalho, cujos exem- plos classicos sio a monopolizagao do comércio pelas guil- das, © outros tais como a pritica antiga de monopolizar 0 direito & pesca etc. Geralmente 0 motivo “a” é encontrado em conjunto com “b” ou “c”. CAPITULO 11 RESPONSABILIDADE PELA __ CONDUTA SOCIAL: REPRESENTACAO Uma relagio social, dependendo de se é governada por uma autoridade tradicional ou legal, pode resultar em certos, tipos de ago por alguns daqueles envolvidos na relagao, ten- do, por sua vez, conseqiiéncias que afetario a conduta de ou- tros. Pode ser que todos sejam tidos como responsdveis pela conduta de qualquer deles, neste caso a condigo seré conhe- cida como “solidariedade coletiva”; ou, a conduta de certos membros individuais, os “representantes”, podem trazer obri- gagdes sobre outros, ou seja, aqueles que esto sendo “repre- sentados”. Num tal caso, os representantes seraio tidos como responsaveis tanto pelo sucesso como pelo fracasso de sua conduta, O poder pleno pode ser conferido de acordo com a autoridade predominante de tal maneira que a) ele é apropria- do em todas as suas formas — isto é verdadeiro para a autoridade auténoma; b) pode ser conferido de acordo com padrdes especfficos, permanentemente ou por um prazo limitado — este & 0 caso da “autoridade delegada”; ¢) pode ser outorgado por atos especificos dos membros ou de outras pessoas, novamente de modo permanente ou por um prazo limitado, como no caso de uma nomeagao. Sobre a condigao sob a qual as relagdes sociais — quer de comunidade, quer de sociedade — desenvolvem lagos de solidariedade ou representagio, pode afirmar-se o seguinte com algum grau de certeza: uma das condigdes mais decisi- a extenso em que a ago do grupo tenha 84 MAX WEBER como fim 0 conflito violento ou a troca pacifica. Adicional- mente, hd muitas circunstncias especiais que podem ser de importincia crucial mas que deverdo ser discutidas apenas com maiores pormenores. Naturalmente, um tal desenvolv mento menos conspicuo em grupos que perseguem seus ins por meios puramente pacificos. O fenémeno da solidari- edade e da representacdo freqiientemente corresponde ao de fechamento aos estranhos; mas este ndo 6, de modo algum, sempre 0 caso. 1. A “atribuigio” da responsabilidade pode, na pratica, envolver tanto a solidariedade ativa quanto a passiva: todos 0s participantes podem ser tidos como responsiiveis pela conduta de qualquer deles, exatamente como ele proprio é, € semelhantemente, eles podem ter o direito de gozar de quaisquer beneficios resultantes da sua conduta, Tal respon- sabilidade pode ser atribuida a espiritos ou deuses, sendo no caso de orientagdo religiosa. Também pode ser uma respon- sabilidade atribuida a seres humanos, baseada na convencéio, como ¢ verdadeiro, por exemplo, para uma “vendetta” levada contra ou com a ajuda de membros do grupo de parentesco, ou de represilias contra os habitantes de uma cidade ou de um pats invasor; pode ser ainda uma responsabilidade atribu- fda a seres humanos baseada na lei; como ilustra a punigao formal de parentes, familiares ou membros do mesmo grupo comunal, ao invés de ou em adigio a do ofensor real e quan- do hd responsabilidade pessoal dos membros de um lar ou de uma parceria de negécios pelas dividas de cada um. A soli dariedade para com os deuses tem tido também resultados hist6ricos muito significativos. Assim, por exemplo, a alian- ¢a de Israel com Jahvé, no cristianismo primitivo e na comu- nidade puritana primitiva Por outro lado, a atribuigio da solidariedade pode sig- nificar, no minimo, que os participantes de uma rel soci- al fechada, seja por causa da autoridade tradicional ou legal. ‘ONCEITOS 8 85 sio tidos como tendo direito legal de gozar de algum tipo de acesso a vantagens e beneficios, especialmente econdmicos, que um representante procurou; exemplos so a validade do poder exercido pela mesa de diretores de uma corporagao, ou pelo agente responsivel de uma associagao politica ou eco- nomica sobre recursos que, por autorizagao, devem intencio- nalmente servir ao propésito corporativo do grupo. 2. A situagio de solidariedade se encontra tipicamente em: a) grupos tradicionais, comunais, baseados na heredita: riedade ou em compartilhar uma vida comum: por exemplo, © lar ou 0 cla; b) relagdes fechadas que monopolizam opor tunidades e beneficios conseqiientes de seu préprio poder — tipicos de grupos politicos corporativos, especialmente no passado, embora hoje existam mais marcantemente durante periodos de guerra; c) em associagdes lucrativas produtoras cujos membros ainda dirigem pessoalmente 0 negécio, ou seja, uma sociedade mercantil; e d) sob certas circunstancias, em organizagées de trabalho, como por exemplo, um artel! A situagio da representagio existe mais tipicamente em as- sociagdes devotadas a propésitos especificos e em grupos legalmente organizados, especialmente quando fundos para um propésito foram sido coletados e devem ser administra- dos segundo interesses do grupo. H4 mais explicagdes a res- peito na sociologia do direito, 3. O poder pleno é delegado de acordo com padrdes especiais quando atribufdo por idade ou algum outro critério semelhante 4. Os pormenores deste assunto nio devem ser tratados de modo geral, mas devem ser analisados individualmente pelo socidlogo. O fendmeno mais antigo e mais universal nes- te campo € 0 de represélia, quer na forma de vinganga, quer como meio de obter reféns para evitar danos posteriores. CCooperativa econdmica opera, especialmente na Unio Soviica (N. dT) CAPITULO 12 O CONCEITO DE ASSOCIACAO E SEUS TIPOS 0 termo “associagio” est reservado a uma relacio so- cial que € fechada para estranhos ou restringe sua admissio por regulamentos, e cuja autoridade ¢ imposta pelas agdes de individuos especificamente encarregados desta funcao, como por exemplo, um dirigente ou chefe, geralmente incluindo um quadro administrativo. Estes funcionérios normalmente também exercerdo poderes plenos. A incumbéncia de uma posicao executiva ou a participagzio nas fungdes do quadro administrativo constituiraio a “autoridade governante” € po- dero ser apropriados ou delegados de acordo com as regras obrigatérias da associacdo, estabelecidas em critérios ou pro: cedimentos especificos; tal delegacHo pode ser permanente, ou valida por uns tempos, ou para lidar com uma situagao de emergéncia. A agio da associagao consiste na conduta do quadro administrativo, que em virtude da sua autoridade go- vernante ou posse de poderes plenos orienta-se para a execu- cdo dos termos de sua autoridade, e na agio dos membros da associagio, dirigida pelo quadro administrativo. 1, Nao faz nenhuma diferenga, para propésitos de con- ceituagao se a relagao tem o carter de comunidade comunal ou sociedade. A presenga de uma pessoa ou de pessoas em posigdes de autoridade reconhecida sera suficiente, tal como © chefe de familia, 0 conselho de diretores, 0 executivo, 0 principe, o presidente, ou chefe de uma igreja, cuja conduta concerne a execugao de leis e regulamentos que governam a 88. MAX WEBER _ associagiio. Este critério é decisivo porque nao € meramente uma questo de conduta que se orienta para uma autoridade, mas que se encarrega especificamente de sua imposicdo. O acréscimo deste elemento aumenta 0 conceito de uma rel gio social fechada sociologicamente e é da maior importan cia na pritica. Pois cada comunidade ou sociedade nao é de nenhum modo uma associagio, como nao é por exemplo uma relagio erdtica ou um grupo de parentesco, onde nao exista um sistema formalizado de autoridade. 2. Se uma associagiio “existe” ou no, depende inteira- mente da presenga de uma pessoa com autoridade, reunido, possivelmente, um quadro administrativo. Mais precisamen- te, ela existe até onde hé uma probabilidade de que certas pessoas designadas agirio de tal maneira a expressar o ver- dadeiro significado das leis que governam o grupo; em ou tras palavras, hé pessoas que esto determinadas a agir naquele sentido e em qualquer outro, quando a ocasitio 0 exigir. O que causa tal orientagao, seja no caso de dedicagio emocional, tradicional ou racional orientada a valores, qual- quer das quais pode estar envolvida na lealdade feudal, a um cargo ou a um servigo, ou que seja devida a interesses racio- nalmente considerados como, por exemplo, um interesse pecunidrio no respectivo salério conceitualmente nao teve nenhuma conseqiiéncia. Falando terminologicamente, e den- tro do quadro da sociologia, a associagio nao “existe” fora da probabilidade de que um curso de aco orientado desta maneira tenha lugar. Se nao hé probabilidade deste tipo de ago por parte de um grupo particular de pessoas ou de um dado individuo, hi, terminologicamente, apenas uma relagio social, mas nenhuma associagio. Mas enquanto ha a probabi lidade de uma tal agio, a associagio, como um fendmeno sociolégico, continua a existir, mesmo que possa ocorrer uma completa mudanga nos individuos especificos cuja agio se orienta para as leis e regulamentos em questo (a maneira CONCEITOS BASICOS DE SOCIOLOGIA 89. pela qual tentamos estabelecer esta definigaio tem precisa- mente 0 propésito de incluir este mesmo fenémeno). 3. a) Além da aco do quadro administrativo, ¢ do que aconteze sob a sua diregao, € possivel encontrar também ‘outros casos onde a conduta dos membros tem como prop6- sito garantir a observancia da autoridade. Por exemplo: con- tribuigdes ou liturgias, ou seja, servigos pessoais de toda espécie, tais como um corpo de jurados ou 0 servigo militar. b) O sistema valido predominante de autoridade pode também incluir normas levando a esperar que a conduta dos membros da associagdo seja orientada de outras maneiras além Caquelas pertinentes aos assuntos do grupo como uma unidade. Por exemplo: 0 Estado — em si uma associagio — inclui regulamentos que governam os empreendimentos pri- vados que nfo concernem 3 imposigao da autoridade legal do Estado como tal, mas & conduta que serve aos interesses pri vados; isto é verdadero para a maior parte das leis “civis”. No primeiro caso a) € possivel falar de aco orientada para a associagio; no segundo 5) de ago regulada pela asso- ciagdo. Apenas a conduta do quadro administrativo em si, bem como aquela deliberadamente dirigida por ele, pode ser chamada de “agio da associagao”. Exemplos de tal ago da associagio seriam a participagio, com qualquer capacidade numa guerra mantida pelo Estado, uma petigio pelo comité executivo de uma associagao; ou um contrato feito por uma pessoa de autoridade, cuja validade fosse considerada obri- gat6ria pelos membros € por cujas conseqiiéncias eles fos- sem tidos como responsdveis (ver capitulo 11); além disso, toda a atitude judicial, bem como administrativa, pertence a esta categoria (ver também capitulo 14, a seguir), Uma associagio pode ser auténoma ou heterogénea, & autocéfala ou heterocéfala. A autonomia significa que a auto- ridade governante do grupo foi estabelecida pelos seus pré- prios membros, através de seus préprios esforcos, opondo-se ee 90 MAX WEHER, & heteronomia, ou A imposigdio de um agente extern. A au- tocefalia significa que o dirigente e seu quadro administrati- vo agem pela autoridade de uma ordem auténoma da associagdo € no como na heterocefalia, onde estariam sujei- tos a fontes de autoridade externas. Isto é verdadeiro inde- pendentemente de quaisquer outros aspectos da relagio. Pode-se ver um exemplo de heterocefalia na nomeagio dos governadores das provincias canadenses pelo governo cen- tral do Canadé. E possivel que um grupo heterocéfalo seja auténomo e um grupo autocéfalo seja heterdnomo, Uma as- sociagdo também pode, em ambos os aspectos, ser em parte uma coisa, em parte outra. Os Estados-membros do Império Aleméo eram, apesar da sua autocefalia, heterénomos dentro da esfera nacional de autoridade, mas auténomos dentro de sua prépria esfera em assuntos tais como religidio e educacio. A Alsicia-Lorena enquanto estava sob jurisdigio alemi — anterior a 1918 — cra auténoma num grau limitado, mas também heterocéfala num grau limitado, pois 0 governador era nomeado pelo imperador. Todos estes elementos podem estar presentes apenas parcialmente na mesma situagio, Uma associagiio, manifestando ao mesmo tempo caracteristicas heterdnomas bem como heterocéfalas, como por exemplo, um. regimento que faz parte de um exército, é tratada melhor co- mo parte de uma associagio mais ampla, Se este é realmente ‘ou ndlo o caso, depende da extensao real da independéncia na orientagao da ago num caso particular e é, terminologicamen- te, puramente uma questo de conveniéncia CAPITULO 13 TIPOS DE AUTORIDADE NUMA ASSOCIACAO As regras dos estatutos de uma sociedade podem origi- nar-se por: @) acordo voluntério; b) por imposigao de fora acordo subseqilente. A autoridade que governa uma associ ‘Zo pode reivindicar poder legitimo para a imposigZo de novas regras. A assim chamada “constituigdo” de uma associago significa a existéncia da probabilidade pratica de que tais regras impostas pela autoridade governante serio obedeci- das; 0 grau, tipo e condigdes que do lugar a tal probabilida- de variam com as circunstancias. Dependendo do sistema predominante de autoridade tais condigdes podem espe car que certos grupos ou secgdes de seus membros devem fazer-se ouvir ou expressar seu consentimento de alguma maneira; adicionalmente, pode haver qualquer quantidade de outras condigdes. Os estatutos de uma associagao podem ser impostos no apenas sobre os seus membros mas também sobre niio-membros, contanto que satisfacam certos critérios. Tais critérios sao mais provavelmente relacionados a territé- rio e referir-se-fo a residéncia, nascimento, ou a desempenho de certos atos dentro daquela érea; neste caso, 0 sistema de autoridade ser conhecido como tendo “validade territorial”. Uma associagdo cujos estatutos ganham validade com base no prinefpio territorial sera chamada de “associagao territori- al”, Este termo ser usado independentemente de até onde sua reivindicagdo & autoridade se estenda sobre seus préprios membros em questdes pertinentes aquela drea. MAX WEBER De qualquer forma, isto é possfvel e certamente ocorre em alguma extensio. 1, Dentro do contexto desta terminologia, qualquer auto- ridade € sempre “imposta” na extensto em que nao se origine de um acordo pessoal voluntério entre todos os individuos envolvidos. Isto é verdade também para a decisiio majoritéria 8 qual a minoria se submete. Conseqtientemente, tem havido longos periodos em que a legitimidade do governo da maio- ria nao tem sido reconhecida de modo algum ou tem sido considerada duvidosa, como por exemplo, nos Estados da Idade Média e, até pouco tempo, na Obschtschina russa. 2. Porém, mesmo acordos formalmente “livres” sio freqiientemente © resultado da imposi¢ao, um fato muito bem reconhecido, como no caso da Obschischina. Sob tais circunstincias 0 sociélogo se preocupa apenas com o estado real das coisas. 3. 0 conceito de constituiglo usado aqui é 0 mesmo. empregado por Lassale. Nao deve ser confundido com a constituigio “escrita” ou, na verdade, com a constituigio em qualquer sentido legal. Para o socidlogo apenas tem impor- Lancia quando e por que propésitos, dentro de que limites, ou possivelmente, sob que condigdes especiais (por exemplo, a aprovacdo dos deuses, dos sacerdotes ou o consentimento do eleitorado), os membros da associago se submetem a auto- lade do governante. Além disso, em que circunstancias 0 governante tem a seu dispor 0 quadro administrativo, bem como a ago da associagio, quando emite ordens ou, mais especificamente, impde novas regras. 4. Os principais exemplos da imposigio de uma autori- dade com validade puramente territorial so os preceitos da lei penal © varias outras prescrigdes legais que requerem como eritério de a pratique a agiio dentro da abilidade que a pessoa seja residente, nascida e rea controlada pela associ CAPITULO 14 A NATUREZA DA AUTORIDADE ADMINISTRATIVA E REGULAMENTADORA NAS. ASSOCIACOES Um sistema de autoridade que regulamenta a agao da associagiio ser chamado de “autoridade administrativa”. Um sistema de autoridade que governa outras agdes sociais, assim protege pessoas que tém uma participagao no sistema, sera chamado de “autoridade regulamentadora”. Na medida em que uma associagio somente oriente-se pelo primeiro, sera chamada de “associagao de cardter administrativo”; na medida em que se orientar pelo iiltimo, de “sociedade de cardter regulamentador”. 1. E evidente por si que a maioria das associages reai manifestam ambas as caracterfsticas. Somente o Estado ideal governado pela lei (Rechtsstaat), como concebido pelos te6- ricos do laissez-faire, seria exemplo de uma associagao pu- ramente regulamentadora. Nela, é claro, 0 controle do sistema monetirio seria deixado inteiramente para empre- endimento privado. 2. Sobre 0 conceito de ago de associagao ver anterior- mente o capitulo 12, n° 3. O conceito de autoridade adminis- trativa incluiria todas as regras que governam a ago do grupo administrativo, bem como a dos membros da associagio. Esta espécie de relagio grupo-membro envolve a conduta que ser ve aos fins cujo alcance se torna obrigatério pelo sistema de acs MAX WERER autoridade que governa o grupo, o qual planeja um curso posi- tivo de ago antecipadamente, com diretivas para sua execu- Go pelo grupo administrativo e pelos seus membros. Num sistema econ6mico completamente comunista isto abrangeria todas as formas de conduta social. Por outro lado, um Estado do laissez-faire incluiria apenas as fungdes de juizes, policiais, jurados, soldados, legisladores ¢ do piblico com capacidade de legislar e votar. Geralmente, a autoridade administrativa ¢ regulamentadora coincide com a distingio feita na associagao politica entre direito puiblico e privado, CAPITULO A NATUREZA DA ASSOCIACAO: ASSOCIACAO DE EMPRESA, ASSOCIACAO VOLUNTARIA E COMPULSORIA Uma “empresa” & um sistema de atividade continua perseguindo um fim de uma espécie definida. Uma “associ ‘cdo empresarial” é uma sociedade caracterizada por um qua dro administrativo, cuja atividade se orienta exclusivamente e continuamente a alcangar os fins da organizagao. Uma associagio voluntéria (unio) € uma associagao baseada em acordo voluntério, cujos estatutos stio vélidos apenas para membros que se associaram por livre decistio pessoal. Uma associagio compulséria (instituigdo) € uma associagdo cujos estatutos podem ser impostos com sucesso, dentro de uma dada jurisdicZo espectfica sobre toda a ago individual que se conforma a certos critérios distintos. 1. Na medida em que 0 critério da continuidade deva ser aplicado, a administraczo dos assuntos politicos e eclesi- Asticos, bem como dos negécios das unides, se inclui sob o conceito de empresa 2. As associagSes voluntérias ¢ compulsérias bas associagdes cuja conduta se baseia num sistema racional de autoridade. Ou, mais ex um sistema racionalmente estabelecido de autoridade, sera conhecida como uma associagao ou voluntéria ou compulsé- ria. O Estado é um exemplo primario de associagio compul 0 am- amente, se uma associagao tiver are 96 MAX WEBER, S6ria (instituigao) juntamente com todos os seus grupos su- bordinados heterocéfalos; isto é igualmente verdadeiro para a Igreja, contanto que o seu sistema de autoridade tenha sido racionalmente estabelecido. A autoridade que governa uma associagaio compulséria reivindica ser vélida para qualquer um que satisfaga certos critérios distintos, tais como nasci- mento, residéncia ou 0 uso de certas facilidades. E irrelevan- te se o individuo que participa assumiu pessoalmente a obrigacdio — como no caso de uma associagio voluntiria — nem tampouco tem importincia se ele esteve presente na da autoridade, Tais autoridades so, portanto, consi- deradas outorgadas, no melhor significado da palavra. De modo especffico, uma associagdo compuls6ria pode ser uma associagio cujos limites so definidos territorialmente. 3. O contraste entre associagdes compulsérias e volun- tarias € puramente relativo. As regras de uma associagio voluntéria podem afetar os interesses de niio-membros ¢ eles podem, na verdade, ser forgados a reconhecer a validade destas regras, seja por usurpacao, seja através do exercicio da forga bruta, ou através de um processo de promulgacao legal (por exemplo, 0 direito das sociedades anénimas). 4, Nao precisamos enfatizar que os termos associagio voluntéria © compuls6ria nao cobrem conceitualmente todo tipo concebivel de associagdo. Nem tém esta pretensio. Constituem, de fato, apenas polarizagdes; assim, na esfera religiosa, os tipos correspondentes so “seita” ¢ “Lgreja” CAPITULO 16 OS CONCEITOS DE PODER E DOMINACAO, Entende-se por poder a oportunidade existente dentro de uma relagao social que permite a alguém impor a sua pré- pria vontade mesmo contra a resisténcia e independentemen- te da base na qual esta oportunidade se fundamenta, Por dominagio entende-se a oportunidade de ter um comand de um dado contetido especifico, obedecido por um dado grupo de pessoas. Por “disciplina” entender-se-4 a opor- tunidade de obter-se obediéncia imediata e automitica de uma forma previsfvel de um dado grupo de pessoas, por cau- sa de sua orientagao pratica ao comando. 1. O conceito de poder € sociologicamente amorfo. To- das as qualidades concebfveis de uma pessoa e toda comb nagao concebivel de circunstincias podem por alguém numa situagio na qual possa exigit obediéncia & sua vontade, O conceito sociolégico de dominagio conseqiientemente deve ser mais preciso © pode significar apenas a probabilidade de que 0 comando seri obedecido. 2. O conceito de “disciplina” inclui a “natureza pritica” da obediéncia em massa, sem critica e sem resistencia, fato é que a dominacdo depende apenas da presenga real de uma pessoa emitindo com sucesso comandos a outra; nao implica necessariamente quer a existéncia de um quadro administrativo, quer a existéncia de uma associagio. Geral- mente, entretanto, um ou outro caso esto presentes. Na me- dida em que membros de uma associagiio esto sujeitos a0 8 MAX WEBER, exercicio legitimo de uma tal dominagao, denominar-se- “associay Zo de dominagao” 3. O patriarca domina sem um quadro administrativo. Um chefe beduino, que recebe tributo das caravanas, pessoas € transporte de bens que passam através de suas montanhas, domina todos aqueles individuos mutaveis e indiferentes, aos, quais, sem estarem associados entre si, ocorreu encontrare se casualmente nesta situagio particular. Ele pode em virtude de que seus servidores reais agem, quando a oca sido exige, como seu quadro administrativo, impondo sua vontade. Teoricamente, tal dominacao seria concebivel tam- bém por uma pessoa sozinha, sem a ajuda de qualquer qua- dro administrativo. fazer isto 4, Se uma associagio possui um quadro administrativo, ela sera sempre, numa certa medida, empenhada numa asso- ciagdo de dominagio, Mas este conceito é relativo. Normal mente a associagiio de dominagio € a0 mesmo tempo também uma associagio administrativa. A natureza de uma associagio € determinada por uma variedade de fatores: a maneira pela qual a administragdo se efetua, 0 caréter do pessoal, os objetos sobre os quais exerce controle ¢ a exten- stio da jurisdigiio efetiva de sua dominagao. Os primeiros dois fatores em particular dependem, no mais alto grau, da maneira pela qual a autoridade é legitimada. CAPITULO 17 TIPOS DE ASSOCIACOES POLITICAS E RELIGIOSA’ io de dominagao serd chamada de “poli- Uma assoc tica” se, e na medida em que, sta exist suas leis dentro de uma rea territorial definida forem garan das por um quadro administrativo através da continua aplica- clo e ameaga de forga. Uma associacio politica compulséria com ums organizagio continua ser4 chamada de “Estado” se, e na medida em que, seu quadro administrativo reivindicar com sucesso a monopolizago do uso legitimo da forga fisica na imposigZo de sua autoridade. A ago social, especialmen- te de uma associagio, serd politicamente orientada se, e na medida em que, seu propdsito for o de influenciar a lideranga de uma associagio politica, seja para a apropriagdo, expro- priagdo, atribuicao ou reatribuigao dos poderes governantes ‘A zssociaciio de dominagao sera chamada de “hierocré- tica” se, e na medida em que, empregar, para manter sua autoridade, a “coergao psiquica” por meio da concessio ou no de beneficios religiosos (coergio hierocratica). Uma associagio hierocrdtica compulsoria com uma organizagao continua seré conhecida como uma “Igreja” se, € na medida em que, seu quadro administrativo reivindicar um monopélio do uso legitimo da coereao hierocritica ncia e a validade de 1, Entende-se que o uso da forga fisica no € nem o Sinico nem o método normal de administragdo de associagdes politicas, Significa, antes, que seus lideres usam todos os meios concebiveis para alcangar as suas metas. Mas a amea- 100 Max wen a de forga, e, se preciso for, 0 seu uso real, é 0 método que distingue as associagdes politicas, sendo sempre o dltimo recurso quando outros métodos falham. Mas nao apenas as- sociagdes politicas tém aplicado e estiio aplicando a forga fisica como um meio legitimo de imposigio: ela tem sido uusada da mesma maneira por grupos de parentescos, pela familia, guildas na Idade Média e, em certas circunstancias, por todos aqueles que podem portar armas. A associagio politica se distingue, portanto, em seu uso da forca fisica entre outros meios para impor seu sistema de autoridade, pelo fato que a autoridade de seu quadro administrative é reivindicada como obrigatéria dentro de uma area territorial € que esta reivindicagao € mantida pela forga. Toda vez em que associagdes que fazem uso da forga sdo caracterizadas também por uma reivindicagio de jurisdigdo territorial — sejam comunidades aldeds ou mesmo apenas comunidades domésticas, associagdes de guilda ou associagdes de operi- rios (soviets, conselhos) — devem ser consideradas por defi- nigio, nesta medida, como associagdes politic: 2. Niio € possivel definir uma associagzio politica — nem mesmo o Estado — em termos dos fins aos quais sua “ago de associagaio” se dedica. Da preocupacao pelo bem- estar corporal até 0 patrocinio da arte, no ha meta concebi- vel que alguma associagio politica nalo tenha alguma vez perseguido, nem hi um fim, da protecio da seguranca pes- soal até a administragao da justiga, que todas tenham reco- nhecido. Conseqtientemente, 0 cardter politico de uma associagdo pode ser definido apenas em termos dos meios, nif necessariamente tipicos dela, que ocasionalmente se tor- nam até um fim em si, mas que, no sentido especifico acima definido, sio indispensdveis para seu caréter, e estes meios significam 0 uso da forga, Este uso no é exatamente con- forme a fala cotidiana. Mas este tltimo, a no ser que seja precisamente definido, é completamente inétil, em qualquer caso. Assim, falamos da politica de cimbio estrangeiro do Reichsbank, da politica financeira dos diretores de uma asso- Jo, das politicas educativas da comunidade, ¢ entende- mos por elas a conducHo e © controle sisteméticos de um problema particular. Somos capazes de distinguir com muito (0 os aspectos politicos da questiio. Assim, hé 0 funciondrio “politico”, 0 jornal “politico”, o partido “politi- co”, 0 clube “politico”, a revolugio “politica”, ¢ as conse- qiiéncias “politicas” da aga, como distintos de outros, tai como aspectos econdmicos, culturais ou religiosos das pes- soas, negécios ou processos em questiio. Usado neste contex- to, “politico” significa tudo que tem a haver com relagées de autoridade dentro do que é — de acordo com 0 uso corrente — uma associagio politica, o Estado. Refere-se a coisas que so proviveis de manter, mudar ou derrubar, promover ou inibir os interesses do Estado como distintos de pessoas, coi- sas e eventos que nao tém nada a haver com ele. Este uso, portanto, busca tirar as caracteristicas comuns dos varios meios de exercer dominagao costumeiramente usados dentro do Estado na imposigao de suas ordens, exclusivos das metas aque servem, Portanto, é legitimo reclamar que a definigao usada aqui é apenas uma formulagio mais precisa do uso corrente, em que se da énfase a0 que ha de mais caracteristico nestes, meios, 0 uso da forca, seja efetivo ou para intimidar. Natu- ralmente, 0 uso corrente considera como “politico” nao ape: nas as associagdes, que so os agentes diretos do uso legitimo da forga em si, mas também outros — por exemplo, associagdes inteiramente pacificas, tais como partidos ou unides que tentam influenciar na agao politica da associagao. Para os nossos propésitos parece aconselhavel distinguir este tipo de ago social “politicamente orientada”, da aco pura- mente “politica”, isto é, da agdo realmente politica da associ- agiio (como se definiu no capitulo 12, n° 3) SOCIOLOGIA 101 10: Max Wane: 3. E apropriado definir 0 conceito de Estado em termos que correspondam ao seu status moderno, pois apenas em termos recentes 0 Estado tem conseguido plena maturidade. Ao mesmo tempo, devemos defini-lo considerando os valo- res do tempo presente, especialmente sujeitos a mudanca. O Estado moderno possui as seguintes caracteristicas, primei- ramente formais: uma autoridade administrativa e judicial sujeita a mudanga de estatutos, e & qual a atividade do qua- dro administrativo, também sujeito 4 mudanga de estatutos, se orienta, Este sistema de autoridade reivindica validade nao apenas para membros da associagdio, a maioria dos quais a ela pertencem por nascimento, mas também, numa grande extensio, para toda conduta que ocorre dentro da érea de sua jurisdicdo; 6, portanto, uma associago compulséria com uma base territorial. Além disso, considera-se 0 uso da forga hoje como legitimo, apenas na medida em que é permitido pelo Estado ou prescrito por ele. Assim, resta a0 pai o direito de punir seus filhos, algo que subsiste de uma autoridade em certa época prépria de cabeca do lar, que dispunha da vida de filhos e escravos. Esta reivindicagaio do Estado moderno de monopolizar 0 uso da forga é uma marca distintiva tio es- sencial a ele como 0 seu aspecto de jurisdigaio compulséria e de organizagao continua 4. A maneira pela qual a salvagao pode ser conseguida — seja neste mundo ou no préximo, materialmente ou espiri- twalmente — nao é um critério decisivo para a formulagao do conceito de uma associagao hierocrtica; antes, é importante exercer controle sobre 0 modo de obté-la, para formar a base da dominacdo espiritual dos seres humanos. Por outro lado, 0 conceito de “Igreja” caracteriza-se, mesmo no uso comum, pelos atributos de associacio racional compulséria, com organizacio continua, e por sua reivindicagao de ser uma autoridade monopolizadora. A organizagao hierocritica territorial predominante e a organizagio ecles CONCETTOS BASICOS DE SOCIOLOGIA 103 acordo quanto ao empenho normal de uma Igreja pela domi- nagéo completa; os meios pelos quais tais reivindicagdes & monopolizacao se mantém variam de caso para caso. Porém, a0 contririo da associagio politica, historicamente a Igreja no tem sentido tanto a necessidade de uma dominagao terri- torial exclusiva, ¢ isto & especialmente verdadeiro hoje em dia, O cardter “associative compulsério” da Igreja, princi- palmente pelo fato de alguém ter “nascido” nela, & responsé- vel por sua estrita diferenciagio de uma mera “seita”, cuja principal marca distintiva reside, na verdade, em seu carter ssociativo voluntirio”, pois admite em suas fileiras somen- te aqueles que tém as qualidades religiosas requeridas. Con- {e t6pico pertencem a tudo, 0s pormenores relativos a sociologia da religiao.

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