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ANIBAL PINTO DE CASTRO OS CODIGOS POETICOS EM PORTUGAL DO RENASCIMENTO AO BARROCO. SEUS FUNDAMENTOS. SEUS CONTEODOS. SUA EVOLUCAO COIMBRA loo ee Sepeta de Rex, Us Ceimb, ol 81 184, p. £06582 OS CODIGOS POETICOS EM PORTUGAL DO RENASCIMENTO AO BARROCO. SEUS FUNDAMENTOS. SEUS CONTEUDOS. SUA EVOLUCAO() Anfnat Piro De Castro Factor de primordial importincia para a completa descodifcagio do texto poético, em qualquer periodo, 6 sem divide o c6digo que determinen o trabalho do criadosjemissor ¢ condicionou, por natural sintonia on discordincia, a atitude do receptor, perante os resultados esse trabalho. Partindo da definigto de Umberto Eco, segundo a qual um eédigo é una struttara,elaborata sotto forma di modello, che viene postalata come regoa soggiacente a una sere di messaggi conczet e individual cho vi si adeguano, e che rissltano communicativi, solo in riferimento ad essor f),torna-se evidente quanto importa o dominio daquele con- junto de sinais ¢ regras combinatérias que, sstematizades através de ‘uma elaboragio mais ou menos demorada ¢ exaustiva, por assim dizer regulamentam ¢ enriquecem a vilizagfo dos signos lingulstcos camo forma e meio de comunicagio da mensagem poética Onganizando em profunda consubstancialidade—e nfo como um simples somatério de partes—um vasto © miltiplo conjunto de ele- mentos pertencentes a outros eédiges, como ot tematios, o estéiees, 0 retdrcn-estilistcns, os simbélicos, os miticas,e até o8 ideogions ou éticos, 0 trabalho dos teorizadores'¢ dos poetas forjou, 20 longo do séealo xvi, um corpo de doutrina que, pelas caracterstcas sociocul- turais da nossa vida colectiva nessa époea, encontrou expresso mum conjunto de textos de indole normativa ou paraliterdia, difundidos pelo ensino, pelo liv ou compéndio de teoria pela propria produgio postion ©) O presente testo constitua, na sua primaire forma, a matisia de mina isso do concurso para Profesor extraordiaisio na Universidade de Colmbra, ‘Vom agore, depuis de completado e aprofundado, inteprarce nesta homenagem & memérie do Doutor Manuel Lopes de Almeida. Com perfsito cabimento © lnteira adiquagto, tio coastante e profenda fol a amizade com que o seu alt feplsito me acompanhou nes pastos que, por vis to dolorosa, tive de dar até fe momecto de prestar aquela, pars mim, importante signifetiva prova, (@), Umberto oo, La siruitwa azrone, Milano, Hompisni, 1968, p. 60. 505 6 ALP. pe Castno—Os eddigns poltcos do Renascimento ao Barroso Se, em qualquer momento, 0 e6digo poético assume primacial inte- resse para 0 estudo do fenémeno literiio, em todos os seus multimodos ‘© complexos aspectos, quando ele se vé fortaleido pelo poder vineula- tivo de um conjunto de regras acatadas e praticadas tanto pelos emis- sores como pelos receptores das mensagens contidas nos textes, @ sua definigio © 0 seu estudo constituem tarela imprestindivel e, em certa sedida, pricrtétia, para o conhecimento des condigdes da comuni- ‘agio literiria, para a adequada valoragio estétia de cada obra, pare a defniglo exacta dos génecos predominantes em cada periodo e, quando ‘ocorrem infracgies ou subversies dos cédigos vigentes, para a cor recta, delimitagio periodoldgica. da produgio literévia(). 'E evidente que o oSdigo pottico, na complexidade de aspectos que comporta e envolve, nao se encontra integralmente expresso no Conjunto (por muito vasta que este seja) dos textos teoréticos que fixam, para cada época, a teotia podtica que Ihe 6 poculiar. A essa metalite- ature, a que Michal Glowitsli chama poeta explicita, hi que juntar © contributo dos textos Iiteririos propriamente ditos, sempre parta- dores de wma police smplicte, deveras importante para a conbeci- mento de certos cddigos integrantes do eddigo poético, como, por exem- plo, os temticos (), Considerarei, no entanto, por agora, apenas os problemas espe- cificos da. teoria explicita que, aids, nfo tem merecido entre n6s pat- ticular atengio ‘Tendo em conta a progressiva difustio da cultura humanistica, rio admiza que a matriz principal do cédigo poético renascentista fosse constituide, em Portugal como no resto da Europe, pelas abras consagradas dos’ teorizadores greco-latinos, em especial as Podticas de Hordcio e de Aristételes, cuja doutzina se veria mais tarde comple- tada pela letra do alguns didlogos platénicos, ou de certas reformu- lagbes dos neoplatonistes italianes. (©) Sobre-« defnigia e importa do eédig litertro, veja-se Vitor Manel de Aguiar @ Silva, O trio litrdrio eos seus eStigos, in sColdquio(Lohas, ne 21, Set, 1974, pp. 2835, © Teoria da Literatura, 62 42, Coimbra, Livrasia Ame ina, 1984, pp. 100 e segs. (0) Vide Michal Glowifski, Theoretical Foudations of Historical Potics, in sNev Literary History. A Journal of Theery and Interprtations, wal. Vil, 2, 1976, pp, 242-248 (Ja Biaria de Lourdes Belehor sublishava om 1971 « necessidade do evar @ cabo o entedo da teoria podtica quiahentists am Portugal (f. Os Homans 08 lator, Sdouoe XV ¢ EVIT. Lisboa, Verbo, 1971, pp. 4144). Ao assanto ‘ediquel a slate disertagio de doutoramento Rtivca ¢ terisagas era a Portugal. Do Humanteno 20 Neoslassiciomo, Colmbra, Canto de Estudos Rome ‘nleos, 1978 ¢ La Ridorigue ef la Podipue dans la pagogie et dans la litirature de UHiumanteme portuges in L'Hunaniome portugat eT Europe, Actes du xt Cologne Taterntional d'Etudes Humaristes, Tours, 919 full 1978. Pacis, Fondation Calouste Gulbenkian, Centre Caltarel Portugais, 1984, pp. 609.721. 506 A.B, ne Casrno—0s céigas polticos do Renascimento ao Barroso 7 s fratos do conhecimento desses textos, ou dos comentarios que iam sustitando nos centros mais avangados do Humanismo europeu, desenvolveram-se ¢ multiplicaram-se, porém, com maior facilidade & rapidez, gragas & erescente projecy#o concedida ao ensino da Podtica no sistema pedagégico renascentista, Limitada a principio ao tratamento da técnica versificatdria ow estlistcs, a Pottica, na sequéncia da orgénica medieval, aparecia como parte integrante da’ Gramética, © exemplo, alids, chegava-nos de Espanba, onde, jd em MSI, Anténio de Nebrija incluira nas suas Iniroductiones in latinams gramma~ tizen todo um Tivro (0 quinto) que tratava de quantitate syllabarun amatris et accent () Na Nona granmaties ars de Estvio Cavaleiro, de 1516, tam- bbém o Livro wv tratava De prosodia ef de oneniuns syllabarum quantitate, ‘Antes, yorém, de, no capitulo v1, caracterizar os vavios metros, di 0 autor algumas definiges, entre as quais a de sarte potticas, que con- sidera sictae, ueraeque narrationis congruenti rythmo: uel pede com- posita metrica structura ad utilitatem uoluptatemque accommodata, onde se evidencia jé a marca inequivoca da leitura de Horécio (}, Esta ligagto da Poética A Gramétioa ira perdurar por muito tempo, Ainda em 1584 André de Resende, na sue Oratio fro roshis, comets & Gramétisa @ fangéo de habilitar quem a estudasse a bem interpretar os potas ‘At eam (Grammaticen} ita prasdicandam sumo, ut a minoribus,fini- bos quibusdam suis, cerisque Hmltibus conclusa, defatur, wt ea prolssio sine Diomede suctore in horstcen et exeticen, alte auetore Fabio fa matho- dicen et historicen, i est in recteloquendi scentiam, ot poetaram enarra- ‘onem diuldatur @) E dois anos depois Jerénimo Cardoso, também zuma oragio de sapitn- cia, itia considerar a Retsrica e a Pottica como partes constitutivas da Gramética: ‘Ex hac dlscipina Grammatices, quae Rhetorican ot Posticen com- leciturs () (9 Aaj Antony Nobis. Introductions [i lainam grammaticen | {1 logio- | ribusglssematis. Ex priilegio[ egal! naquls alls in Hispa- [nla ‘oxcudat aut vidae. | Ex impresione | e&tabsica, (0) Nowa grdmatices Marian motri | des Viginis art. cuius author est magisir Stephanus | eques lstawus (Lisboa, Valentin Ferandes, 1516). (Odette Sauvage, L'inéaive drasnsin d'dndsl de Resende (1500-1573). Paris, Rendasio Calouste Gulbenkian, 1971, p. 112 (@) Oragdo de sapitncia proferida ene lowor de tas as disiglinas. Repro= ‘dude facsimilada da ed. do 1850. Trad. de Miguel Pinto de Menosts, Into Adugdo de Dontor Justine Mendes de Almeida, Lisbos, 1965, p. 104 o 8 A. pe Castn0— 0s ciigospotcos do Rewaseioento a2 Barro Em 1504 D. Pedro de Meneses considera-a, de par com a Ret6- rica, entre as disciplinas professadas nos cursos de Artes (8). No entanto 0s estatutos dados & Universidade por D. Manuel I, em 1508, nifo lhe ‘azem qualquer referencia, talvez porque era apenas objecto de cadeira Jacultativa, ainda sem provimento regular. $6 em 1597, quando 0 Cardealnfante D, Henrique procede & reforma do Colégio de S, Paulo, de Brage, a Poétiea surge ei posi- ‘gio de completa autonomia, no quadro curricular das Humanidades (°). ‘A nova cadoira, a principio confiada a Nicolan Clenardo, seria ats ‘bulda no ano seguinte a Jodo Vaseu, passando para Marcial de Gouveia ‘quando 0 segundo acompanhar D. Henrique para Evora, em 1540. Posigo igualmente importante ocupava a Poética nos cursos ‘ministrados em Santa Cruz de Coimbra, onde Inécio de Morais a vinha ‘esinando pelo menos desde 1546 (*) Em Jivora nto deixaria Vaseu de dar continuidade a0 programa que adoptara em Braga, ¢ é de crer que outros mestres, encarregados do ensino particular, no seio das grandes familias da nobreea, segais- sem tais exemplos, do acordo com as orientagies da pedagogia zen0- vada. Por isso, quanilo, em 1547, a Postica © a Retérice obtéim um lugar de primazia 20 quadro das disciplinas estabelecido para o Colégio das Artes, 0 régio fundador limitava-se a consagrar definitivamento wma situagdo anterior, modelada & luz dos padrdes europeus. E a situaclo aio iria sofrer alteragSes de maior quando em 1585 a instituigio passa para a Companhia de Jesus (9) (i) ule (Rhetoric) faitina ucinaqe ot uee sror poet et. Hace sola tata rogia est, ta rg, sulin, cosets, astra, quae aublimes, coo Jeses, acemosfaciat (Grae profride no Esudo Gert de Lun». ‘TrsGagto fe Miguel Pato de Meneses, Introeyfo dA. Morcce de S&. Lisboa, 1906, 3 Peery CL Jesh Sebusilo daSiva Das, A palin eral de Speco de D. Joto 11. Universidade de Coit, Intato Ge Estudos Mcscn, 190, vot tp 480 {o), Dor atvaré de 90.1%-1546,datado de Santarim,nomeava D. Joo TL 1ndis de Morais para ler na Universidade dhe ead de poesia porto de ‘Aono @ comeyara‘Ao peal de ovtabron, Devise Soar bores em cada 2a, ‘a de anh eontrade tard, e dviaangir bare eo» autores Ie orem ‘rdenadce Blo conto do Teetr & otslh'™s, © ordenado ere de 60000 tals Dor ano (aio Brandte, Decunents te D. Joo 211, a. ni. Coimbra, Unie ‘erie Conmigo Stodla ac Tags, 1090, p64). Ao ordenado ta arto Re acrscontar uma gatfcapio de 200007, por outioalvars da mesma ‘ata (id, tbs. 88). Tomo poe 20°K1586 (0, Actas dor Constr de ‘niersdade 1597-1557. Coimbra, 1061. Vol 1,9. 249). Com a Sandagio do Galagio das Artes deizou Ge Icelonat (ct Inclo e Motus, Contmircar Buco tntion, Revise preidcio de Misio Drandio. Coimbra, 1988 P.- (en) Nat coniaigne claboratas entre 1988 » 1590, poo Padre Joo de olan, pera oo etois inaclanas preceteavac que or tanos ala adlantados ss A.P, DE Castno— Or cdiges polis do Reneszinonls ao Barroso 9 © ensino da Potties ligava-se enttio muito estroitamente ao da Retérics, situando-se mesmo um pouco na sua dependéncia, 0 estudo da elocugio, como parte da Retérica destinada & for- magiio do estilo literério, permitia com efeito uma inteira adaptacio dos respectivos preceitos & aprendizagem do exercicio postico, desde que completado com as regras que The eram epectficas, sobretudo as que incitiam sobre a técnica do verso. E para isso bastariam as nor- ‘mas compendiadas em obras de intuito didéctico-pedagégico como @ Collectanea Rhefories de Joo Vasen, publicada em 1538 (#) e que nfo dcixaria de ser adoptaca pelo Autor quando veio ensinar para Portugal, ‘bem como por outros mestres da matéria, pele natural facilidade de acesso a0 seu texto, ‘A. aquisigo dos conhecimentos tetricos encomtraria depois ade quado complemento no comentétio dos poetas latinos mais em voga, ‘como se depreende dos programas insertos no regulamento do Colégio de Guiana, redigido sob as indicagdes de André de Gouveia ¢ muito provaveimente adoptado no Colégio das Artes conimbricense. Com efeito, aise determinava que o ensino da Poesia ministrade na 1.8 Classe fosse vex Virgilio maxime, et Lucano, et Persio: tom ex Tuuenale, Horatio et Ouidios (9), Nemo que os textos teoréticos da Antiguidade no fossem objecto de um estudo sistemitico, prestavam por certo permanente auxilio a ‘ais comentirios, e 08 alunos, 20 abandonarem os gerais do Colégio, 12 05 nip conheciam na integra, levavam uma preparago que tomnava, {deil 0 ecess0 directo as Poéticas de Horécio e de Aristételes, ou 0 con~ facto com os comentadores modernos que as actuslizavam e divulga- ‘vam por toda a Europa, mas principalmente na Italia 0 exemplo desses comentadores iri, aliés, oferecer 0 melhor incen- tivo @ quantos portugueses véo consagrar-se & teorizaco poftica, de Aquiles Estago a Tomé Correia. Isso nfo significa todavia que a teorizagko postica tenha sido particularmente rica em Portugal. Acontece mesmo que algumas pega fundamentais da produgo portuguesa nesse campo, por vezes de ‘vel projecgdc a nivel europe (como as obras de Tomé Correia) foram. laboradas e publicadas no estrangeiro, sem terem dado entre nés todos os fiutos que delas se podiam ter colhide. sustentasim, aos domingos, conclustos publleas de Retieiea e 8¢ Poétes (cf. Mowunesta Pardagogica Socitatis Tsu, vol. 3, p. 43) (A intengEo pedegigin do livrinbe, pubicado em Salamanca, em 1538, sas jf dedicado ao Cardes/-tnfanta D. Henrigne, transparece do proprio titolo: oannis Yasaci Brv-[ gensis Golletanea | Rhetories | In graiam corom, vt granloribes occupa / € dleiplins, proixores ueterum cden / tarios exoluere Bon possent. f Axxo 26D (@) Apud Raymond Lebégu, Horace ox France pendant la Renaissance Humasiswe et Renaissance, 1%. Pats, 1986, p. 158. : 50 10 AP. we Casrno— 0 eidigeepoioe do Renascimento ao Barrovo ‘Torna-se porém evidente que os mestres ¢ os homens de melhor cultura poética as conheciam, e que as lacunas doixadas por essa escassa produsio eram facilmente preenchidss pelo que nos vinha de fora, ‘em especial de Teélia. Na verdado a Espanka no se podia gloriar de producio teorética muito mais abundante, vivendo também em fongo q Itilia. Em 1568-1567 0s italianos continuavam a predominar na lista Dibliogréfica inclufda por Lorenzo Palmireno ma sua Retérica, pois af Geparamos com 05 nomes de Mintumo, Pigna, Robortello e Scaligero, pelo menos. E em 1596, lamentando essa pobreza nas letras do pals ‘vizinho, ainda Léper Pinciano escrevia na sua Philosophia antigua pottica: ‘Sabe Dios ba muchos afcs desseo ver un libro desta materia sacado ‘aluz de mano de otro por no me paner hecho sabal y blanco de las gentes, 'y sabe quo por ver mi patra, Noreida en todas las demés disciplines, cata ‘ene parte tan falta y necestada, determing ariear por I eocormer ) A tradusto da Poética aristotélica atribuida a Péex de Castro ‘no passa de uma patranha, como jf demonstrou Menéndez Pelayo (#), € & comhecido o deliberado antagonismo de Lufs Vives no De disciplinis (1590), em zelago & poesia. As grandes posticas do pais vizinho s6 apa- recerio no titimo quartel do século: EI arte podtico on romance castellano do portugués Miguel Sanches de Lime, simples traduglo de Hordeio, é de 1880; El arte jodtico espaiiol de Dias Rengifo aparece em 1592; a Arte pata componer en metro castellano de JerSnimo de Mondragéa (perdida) tem de situar-se por 1598; a Philosophia de Pinciano 6, como vimos, de 1596 ¢ 0 Cisse de Apalo de Alonso de Carballo, de 1602. ‘A curto prazo, homens formados esteticamente no conhecimento dos textos de Horicio e de Avistételes, bem como des seus exegetas, ci ou por intorcdmbio com o estrangeiro, iam assumindo a fungao de propor e expor, de maneira mais ou menos sistematizada, as linhas ‘mestras de uma teoria que, ccmpletada com © conhecimento da nova literatura, em latim, italiano ou castelhano, havia de permitir a for- ragilo de um eédigo postico bom definido, Os casos de S4 de Miranda, , sobretude, de Antonio Ferreira, parecem deste facto provas bem concladentes. Convisé, entretanto, e antes de vermos o conteddo dessa tearia, determinar os seus fundamentos essenciais. © de mais vasta amplitude © mais longa permanéncia foi indu- bitavelmente a Epistula ad Pisonzs de Horécio, cuja presenga na cul- ‘tora portuguesa pode rastrear-se documentalmente desde os fins do séoulo xv. Sabe-se que Cataldo Siculo adoptava os Carmina como (0) Ba. de A. Carballo Picaso. Madrid, 1989, vol. 1, p. (0) Hisora de les ides eldscas on Bspaia, Made, C. 8. 1, C., vol 1, p26 0 segs 510 ALP. pm Casrno—Os ciges polticas do Renesinento wo Barroco UL texto de leitura dos seus discfpulos, a comegar por D. Jorge de Len- caste, o bastardo de D. Joto II (4). E abundam outros testemanhos, os quais adurirei alguns. Assim, na ja citada Oraiio ro resiris, invocava André de Resende, a propésito da necessidade de estudar 0 Grego, 0 famoso verso Vas exemploria gracea | Nocturna uersate manu, wcrsate diurna (®), Os graméticos mostram do texto do Venusino um conhecimento jualmente directo. Por exemplo: no capitulo VII de sua Gramutica (1536) acusa Ferngo de Oliveira a leftura dos vv. 823-992 da epfstola hhoraciana, que cita explicitamente para distinguir a promdncia por- tuguesa da castelhana: 1 quaco podemos dizar que 0 que dd a entender Horicio na Arte Polteas dos Gregos e Latinos temos entro és @ os Castelhanos «0 (2) Joie do Barros, no Didlogo er lowwor da nossa linguager, de 1540, ita ¢ aproveita vivios preceitos do Venusino. E assim que cita um hemistiquio do v. 78 ¢ adapta os ditames dos vy. 51-58 a0 entiqueci- ‘mento lexicolégico do portugués A custa do latim (8). E hé que nko fesquecer, por outro lado, a clara influéncia da teoria horaciana nos ppreceitos da Arle de la joesta castellana anteposta A edigéo das obras, Ge Juan del Encina, aparecida em Burgos, em 1505 (*) © muito dival- gaa entre nés. ‘86 esta presenga do texto heraciano na cultura portuguesa da primeira metade de Quinhentos explica a preferéncia que Ihe deram alguns dhs nossos humanistes, consagrandodhe comentérios que niio esmetecem no conjunto da exegese levada a cabo nos centros huma- nisticos da Flandres da Ital Assim, em 1553, Aquiles Estaro publica em Antuérpia os Fx Quint! Horatis Flacci Posticam Commenters, onde, apoiado na biblicgralia (09 Tendo certa ver de interrompar as lgbes que the dava, logo 0 mestie ‘ecomendon 20 Tet que 0 obrigaso a estudar 100 vorsos dos Carativa em cada d8 (ch Amérizo da Costa Ramalho, Estudos sobre a tpca do Rewascimente, Coimbra, entra de Betudos Clasicos Humantsticos, 1960, pp. 65 ¢ 178, nota 10). (0) Vide Odette Sauvage, op. cit, p. U6. (9) 4 Gramdtice da tinguagem portuguese. Introduglo, etara setuslzada fe notas por Maria Leonor Carvalho Bueeen, Lisboa, Impreama Nacional j Case a Moeda, 1975, p. 48. (Cs, pirgue a leenga que Horlcio em aus Arte Potties d sos latinos ‘pera comocrom vordbulos rover, eontanto que safam da fontegrega, esta pode emos tomar, so os devivarmos da Tati (Gremtice da Hngua portuguesa, Car~ Finta, Grade, Dialog om lowcor da massa inguagem e Didlogs da viciosa vegeta. ‘Roprodugio fae'similads, loiter, inrodugdo « anotagbes por Maria Leones Car: valhdo Buen, Lisboa, 1971, p 401; v. aide ib, p. 99), (9) CL Juan Carlos Temprano, «El Avie de ln fosla castelioam de Juan at Fncine. Bd. y potas, in cBoletin do la Real Academia Expafolae, 1, 1973, vp. 821-990. si 12 A, P. ni Castao— Os eidigs folios do Renascimento 20 Berroco mais recente (¢ inclufa obras de Budé, Aldo Manuzio, Bembo, Robor- tello e Robert Btienne!), procede a uma euidadosa explicitapto do texto, de caricter predominantemente filolgico, é certo, mas observando sigorosa fidelidade & teoria origina, cujos ditames pretendia aplicar & claboragdo de uma poesia épica digna de celebrar as glériss militares dos Postugueses (9). Muito curia é também a odigo levada a cabo, sempre em Antuér- pla, por Pedro Veiga, em 1578. E que, animado pelo decejo de tornar © toxto mais acessivel aos jovens estudantes, o editorcomentador m0 hesitou em substituir, por ostros de sua lavra, mumerosos passos 03 ‘expressdes do original, chegando a glosar versos inteiros (%). Mais pessoal, profundoe fundamentado, porgue reultante do conhe cimento mais préximo e intenso da exegese italiana, nfo apenas do texto horaciano, mas dos de Arstételes ede Platto, é trabalho de Tomé Correia patente nas In librum de Arte Poetica Hovatitexplanationes, publicadas fem Veneza, em 1587. A dilucidagio dos problemas relatives & eriagio podtica, dos condicionalismos que a regiam e dss fnalidades que 0 poeta Govia ter em mente, via-se af completada por preceitos muito coneretos acerca do estilo ¢ da téenica verificatéra (9. ‘Outro documento significative desse interesse, mas aquém-fron- tires, seriam 0s Conimentaria in Rhetoricam Cizeronis et Artem Pod an Horas elaboraden pelo crizio D. Fratuose de. Joto, j& nos fnais do século xvi, mas infelizmente desaparecidos (*). (03) Sobee a obra e o sou lugar na tooia itera portuguesa de Quinhentos, vejao 0 mou artigo Ayuiles Eslago, 0 prineivo comentador peninsular da adrie Poltces de Fordeio, in eArquives do Centro Cultural Portaguést, vol. x, 1976, vp. 83-102 (), HORATIVS / FLACCVS VENVSINVS / DE ARTE POETICA, | | Vera & gomina, & son supposita & adutorina, | Prout axtehas bababatuy. | JAP. Weguio Lnstano, in commanem stadiosorim adoles-/ centiom, Vadaet Sj prorsorim valliatemgue, magao cum / labore & tampons dlependio, maior sed vague ments / aniotat ftigatio neque restitata, & in erum indubl- tatu ‘que suae antiquiors editions statum reposita./ est ops emendare, magis, quam fexibere: maior, | Exoli erat wat vis & este labor /(einhta] | ANTVERPIAE, / 7 ExpensisIpelos Vegul. / Bscudebet Christians Hsuwelis, / 1578. Teabalhel tobre exeniplar da Biblitaca Piblica do Hyora. ‘Sebre 0 autor apenas dispoaho, ‘te agor, da stcinta ¢ nebulom noticia de Barbosa Machado (Biblioteca Luci. tana, vol. i, p. 628), (O) Thotiae Corracee in Libram De Avte Poaica Q. Horatj laces Rspla- sationet. Venatiis, apad. Franciseam de. Francscis Senonsom. x.p. 1208v0 Sobre o autor vejn-en, alm de Barbose Machado (Biiistece Lasitane, vol, 1, pp. 754-755), Francsco Rodrigues (Histvis da Companhia de Jesus ne Aeris. fa de Portugal, 1, vol, $98. Quanto & obra, cl. Bernard Weinberg, A Hic. tory of Literary Crtcien i the Titian Renaissance, The University of Chicago res, 11974, pp. 215-221. “eh A neticin vem na Biblioteca Lusitana de Barbosa Machado (t 1, p. 90. 512 ALP, pie Casrto— 0s eiigos polls do Rewascimento ao Banvoco 18 Arautos bem mais eficentes da teoria horaciana seriam, porém, poetas como Sa de Miranda, Diogo Bemardes e Anténio Ferreira que, ‘pela maior acessibilidade das suas composigées, pelo atractive de uma roupagem estilistica a contrastar com a erudigdo dos comentaristas & pelo seu prestigio pessoal, exerceram uma acgio muito mais profonda o eficaz De todos foi Anténio Ferreira quem mais conscientemente assumiu (© encargo de adaptar 0 cédigo horaciano ad ssw poctarum lusitano- ‘ram (), em vrias das suas epistolas, mas sobretudo nas que dirigi f Pero de Andrade Caminha (VIII do Livro I dos Poemas Lusitanas) fe @ Diogo Bemardes (XII do Livro I), aqusla anterior a 1558, visto que nela se refere a Sa de Miranda como estando vivo. Mas, a partir da décade de 50 a doutrina horaciana vé-se revi- talizada e completada pelo conhecimento mais exacto da Podtica de Aristételes. Foram, aliés, as necessidades da exegeso praticada sobre 1 Epistoia aos Pisdes que motivaram de inicio a divulgagdo do tra tado do Estagirita visto que a forma de comentirio mais utilizada partia do confronto intertextual, ¢ a matriz do Horécio era fundamen- talmente a teoria aristotdica, 'O comentirio de Estago oferece um exemplo acabado desta linha de aproximacio entre ambos os teori- zadores antigos. Passos por vezes longos da Poitica de Aristételes aparece constantemente transcritos no original, jé para explicitar ‘© sentido do texto horaciano, ji para Ihe determinar a fonte. A. Poltica do Estagirita merecerathe também particular interesse, pois a eacerrar o sou comentirio doclara 0 Hemanista ao Principe D. Jodo: ‘Reliquas erant commentationes aligo quazdam maao in Avstoteli ‘postiam, quas quemadmodem ante in obvervationam asearuin belo memini me promittrs, nune etiam simel egigisem, st doctorum honisain ills, quae optabam et sperabam, hac ipsa do re seiptn iam actus fuieem. (Queetamen, si quidem tii gratae faurae sunt, has olin etiam consequenturt A divalgagao de Avistdteles tomara-se muito fell, gragas & ver= fo latina de Alessandro de’ Pazzi, aparecida em 1536 (8), e 20s zeme- +0508 comentérios entio publicades, em especial os de Robortello (®) (©) Por isso resomendava aov poctas, na Carta VII do Livse I, a Paso de Andrace Caminha: «A ti leam, gl Paco, apie 1 andem (Poemas Lusitans om pret nota do Prot args Ba. Lis, 8 ota, 1867, 1 p.m). () Arisotelis Pontica, Per Alezondrwon Paccion, Patritun lorontinsan, fn Latinum conuarea(..) Venetis, In Aedibas Biased Aldi, e¢ Andreas Asi Ia Sooe, 38. 22050 (C1) Pronoisci Robortel Ueinensis in Librum Avieielis De Arle Poctica Esplicatiwes (10) Tlotentie. In Gtcina Laurent Torretinl Ducalis Typo raph, web. vm 513 A.D. ve Castno—Os eddigos potices do Renascinento ao Barro de Castelvetro(%), que nfo eam de modo slgum desconhecidos centre nés (3) ‘A teoria litera do fildsofo grego iia conhecer progressiva difo- slo nas excolas portuguesas com o ensino dos Jesutas, apoiado prin- ipalmente nos De Arle Riclorica libri tres &6 P.* Cipriano. Soares, publicados em 1562 ¢ objecto de numerosas edigdes posteriores () Codliicando um ideal estéico de cunho humanistico e ssbrio tear clssico, este compéndio, pelo conteibuto que trouxe & divulgagdo de “Avistteles, i abrir generosemente as vias para @ berroquizagdo do ebdigo literixio renascentista, sob 05 auspicios da Companhia de Jesus Plato também nfo esteve ausente dos fondamentos da teoris| poética quithentists. Ap contririo do que acontecera. com Horécio f Aristteles, as suas ideias nesta matéria nfo haviam sido eompen- Giadas num tatado cujo texto desse lugar @ comentirios; antes so dispersavam por vérios Dislogos, em especial a Republica, o Feivo e ‘Jon 29, Al se apresentavam simples prinepios gers acerca da poc- sia, mas nfo se procedia a um exame aprofundado das svas implicagses xo plano da expressdo, on soquer a ume sistematizagto da respectiva sky (®). Além disso a sua influgneis rovele-se em época relativamente (0), Poti d'Avitolle Vedgarizeta ot Sposta por Lodovico Castelvetro[~} ‘Stampeta in Vienna Austria, par Gaspar Stuinhofer,Vanno det Signore x. DX. ‘Acetta das numerosss eigen, comentirios © tradugses da obra, vide AritStaes, Poltce (..] ed talingae por Valentin Garcia Yebra. Madrid, Grades, 1874, pp. 426-492, (G}) Basta, para o comprovar, atentar nas repetidas citagdes que deles ‘ncontremos no'orrio de Arte Postics de D. Anténio de Atalda, contigo no fms. dG-vit-a7 da Biblioteca da Ajuda, a quo voltarei adiante, Vejam-se, para fexempl, a notas da fl. 18. {C) Sobre os contesdos da obra e = sun diva em rslagio a0 De Arts Rhatoricae eompondioea coaplations ox Aritoule, Cerone ef Quinttiano, de Bio ‘anténio de Nebsija, wide Ansbal Plato de Castro, Reivica 0 teorizaydo lierdria ‘om Porgal, pp. 38-15. © titulo completo, aiés bem signieativo, é: De Ate Rhetorica Wirt tes ex Aristotle, Cicerone + Quintlione frascipue deprompts ab eden Actora recogni, of muti in lcs Iocupllas. 8 1.80. & de Coimbra (Jofo Ge Barrera, 1962), Sobre as suse aumeross edie, vide o men trabalho clade, . 86, nots 86 “e) A propésito da responeabilldade da Companhia de Jesus na eveluio 4 teorialiteréia em Portugal na sogunda motado do século Xv, vejase, além {0 miu trababoacima citado, em espeial as pp. 48663 e ngs, P.atiguel Bator, La barroquiaactin dela eotio Shudoruna on tz mente 9 las obras de Gracidn, 5n Gracidn yf Barroen, Roms, Edison! si Storia Letéeratora, 1968, pp. 102-105, 0H) Aisin, o banimento dos poets para fora da nbc, ocorre nos Livzo I, III e X aa Repibien; o teora da imitagio foi explanada nesse mesmo Didlogo (AIT, 994 roge © X, 285 o sege); para o fev podieo intaressam partiularments (© Fedro (248 A « 285 B) e 0 fon (534) (@) CL Berard Weinberg, op. it, pp. 250 © sees st ALP. pe Casrno—0s edigospalticos do Ronasinento ao Barco 15 tardia, © quase sempre na sequéncia da leftura dos neoplatonistas ita anos, de Ficino a Castiglione Se, em termos de criagio, sobretndo através de Ficino, a teoria ppoética platénica subjaz. com clara evidéncia na poesia de Camées (), sua andiéncia nos tratadistas portugueses s6 viré a encontrar expres- slo signficativa nas obras de Tomé Correia, especialmente no De Anti- quitale Dignitateque Poesis et Poctarum differentia, inserto uo Globus Canonum et Arcanorum Linguae Sanclas ac Divinae Sovipturac, de Fr. Luls de S, Francisco, publicado em 1568 (") e, jé muito mais tarde, na Arte Poitica ¢ da Pintura, de Filipe Nunes, aparecida em 1615 (*) Chegando embora tarde, o conhecimento das teorias platénicas acerca da. eriaglo poétics, como forma de imitagio par exceléncia, ‘permitiu, como jé foi sublinhado a propésito de Fr. Agosticho da Cruz (9), a conciliagio do ideal helénico de poesia com as exigencias do pensumento catélico pésridentino, abtindo caminho & veeméncia de poesia a0 divino e facilitando a evolugio name ao Barroco. ‘Vejamos agora em que medida a teoria postica quinhentista encerra e exprime 05 cédigos posticns da época em causa, Pare os renascentistas a pocsia, como qualquer outra arte, ¢ i taglo. Eo objecto desta imitacio tanto pode situar-se na realidade externa como no mundo psfquice do individuo. Embora ndo se defina ‘em termos coincidentes em ambos os autores, este concsito mimético de poesia radicava-se, como é sabido, nas obras de Plato e Aristételes, ‘mas a sta principal matriz era entio a Arte Postica horaciana (M) E dado que todas as outras artes eram apenas formas diferentes (©) Acerca da importdncie do neoplatonismo ficinlano ma tegrie da eriaefo ‘poltca, ide Vitor Manual de Aguiar « Silva, Pare una inbrpretasto do Clae- ‘Heiomo. Coimbra, 1982, pp_ 44 aaags. Sobre o neoplatonimo camoniano vejame, ‘entre outs, Hdvardo Lourengo Faria, Cainivs «a visto moplatnice do Mundo, Jn sActas da I Reunifo Internacional de Comonistam, Lisboa, 1978, pp. 227-248 fe José V. do Pina Martins, Caner of [a ponsée platonicionne ds la Renaivancs, fn Visage: db Luis de Comius. Paris, Centeo Cultural Portaguts, 1972, pp. 85:95. (©) Cl Masiana Amaia Machado dos Santos, A toris police de Tord Comma, ix eMiaeelines de Estudos a Jooguim do Carvalhor, n° 7. Figusiva da ‘Fos, 196, pp. 754-758; e Maria de Lourdes Belchior, arte pp. I-44. ( ‘aitre / PoRtICA, | © DA PINTURA, / E SViIETRIA | COM PRINCIPIOS | ¢1 Purspectins. Em Lisboa, por Paizo Crasbueck, Anno 1615 () CL Masia do Lourdes Belcher, do. ci (CE, a este propésito, Amtéaio Garcia Berri, Formacién de la teorle maderna, La tpica hovaciana en Ewopa. Madvid, CUPSA Béitorl, 1977 3I5 18 A. P. we Castno— 0s efdigo potios do Renascimente bo Barroce de imitar a natureza, os teorizadores facilmonte relacionsram a possia, com elas, numa comparagio que vinha de Siménides, através de Pine tarco, Dionfsio de Halicarnasso, Cicero e Quintiliano, até Leonardo de Vinci ¢ Leon’ Battista Alberti, nos seus tratados de pintora (1), A aproximagéo da poesia com a pintura, apoiada numa falsa inter~ pretagio do v. 361 da Carta aos Pisdes, foi entre nés a expresso mais fecunda deste conceito de poesia, alimentando um longo e permanente dobate, Exigindo, a0 caraeterizar 0 bom julzo eritico, que ele soubesse comparar & boa pintura J 0 bom poemar, aderia Anténio Ferreira na carta a Caminha (#) & doutrina que equiparava a poesia as artes Aga rativas, mas panha a ténice do problema na valorizaglo da primeira, porque, pela indestrutibilidade das obras a que dava lugar, garantia fa imortalidade 20 agente e ao objecto da sua elaboragdo, através do ‘monumention acre perenius de que falava 0 Venusino: As Musas cantam: delat 6 sablda, [Nio de metas, do codres, de esculturas, ‘A fama nos elit felton concodids. ‘Coom ab estituas, guatam-se as pinturas; ‘Aquele brando canto ¢ sé mals forte Conix’o tempo, que ferro ou padraa duras Canta fogo, conta Agua © contra = morse ea soanda sempre. De Lisipo esclpido, © $5 pintado D’Apales tavons dua, persceram 0s paptis eromos 36, de que € cantado, [eles se vé com quanta gléia arderam De Gricia,o& iigce mros; da ata Roma Como da terra aos efus cutis sergueram. (8) Néo ignorade por Camdes (4), 0 debate volta a explicitar-se com toda a clareza no segundo dos Didlogos de Roma, de Francisco de (©). Acerca da fortuna desta aprosimagio entre posia ¢ pintora na hist Fla das elas estticas, vide em especial: K. W. Leo, oUt plata pote: he Haan ‘ust Theory of Pointing, in eArt Bulletin x1, 1940 (feimp. New Yars, Norton ‘Paperback, 1967; tad italiana. Firenas, Sanson, 1974); R. Spencer, sU¢ Rhloic Pictiyan: a Study sn Quatocento Theayy of Painting, in sJouraal of Warburg nd Courtanld Instituto, xx, 1087, pp. 28-44; D. Rosand, Ut picor potas Meoving 40 Tuian's Poses, in New Literary History: a Journal of Theory ‘and Interpretations, 1, 101-1072, pp. 827-546; ee. (8) Carta VEE do Livro T dos: Poomas Lusitans (0d. ct, vel. 1, 9.78) (©) Td, i. pp. 172 © 77-78, (8) Ch Aurelio Roncagla, 60s asladess de Canes. Ut picture peesis, fm eArgulvoe do Centro Cultural Portugués, vol. 11975, pp. 259-295; e Maria, 56 ALP, DE Castn0—0s cbdiges polis do Renascimanlo ao Barroco 17 ‘Holanda, decidindo naturalmente o autor a contenda a favor da pin ‘tora. Diz 0 Autor: ‘Onde eu com meu poueo engenho, como dessipalo ame mestra sem lingoa, tenho inda por mér a poteaei da pinture que da poosia em enasar mone efeitos, « ter muito mar forga © vehomenca, ash para commover © spito © a alma, a slogea e riso, como a tristeza © lagrimas, com mals ‘fcaselogueacin. (8) Delinido o conceito de poesia, tomava-se necessirio estabelecer fs fundamentos do trabalho de etiagio, assunto que dé Iugar a novo fe nko menos duradoiro debate, entre a primazie do engenho, que consi- derava » poeta possesso do furor anim, e a supremacia da arte, ou sea, de uma técnica adquirida em fongio de uma caltura literéria codimen- ‘ada e organizada, Hosicio pusera claramente a questio (#) ¢, na sua peugada, a teo- ria de meados de Quishentos caprichou em valovizar a arte, embora sen negar a importincia da inspirag A posigio de Antonio Ferreira & paradigmética, quando escreve f@ Dioge Bernards: Questia fol $6 do maltas aisputada ‘Sobra em vereo arto anal, a0 a natures Va sem outra vale poueo ou nada ‘Mas en tomarin antes a dureza Daquele que o tabalho © atte abrandos, ‘Que destoutro a corrente 0 vi prestara» (9) © engenho era fero, indémito, quase violento, mas & arte cabia amansédo e reduziclo as proporgées exigidas pelo equilforio. J& Camées, adaptando a teoria platénica as exigtncias da Fé, cembora acentue na proposigso d'Os Lusfadas, a necessidade simultanea de engenho e arte (:Cantando espalharei por toda a parte, | se a tanto ‘me ajudar © engenho e arte) (®) e confesse, quase no final do Poem, ‘possuir ambos os requisites (@Nem me falta na vida honesto estudo, | }(..] Nem engenho ...»(#)), sobrevaloriza claramente o furor quando, za invotagdo, pede as Tégides ela firia grande © sonorasa» (). ‘Vitalina Leal de Matos, 0 canto na poesia épica de Came, Estudo da iotopie ‘ensnciatoa Pars, Contzo Caltsral Portagués, 1981, pp. 167-191. (9) De pinture antige (..) Porto, Renascenga Portuguesa, 1918, pp. 216 fe ange, Sobre este ponto voja'se Mariana Amélia Machado dos Santon, etl fea de Francisco de Holenda, Coimbra, 1940, p. 95. (8) Arte Podlica, we. 295-306, (©) Caria XU do Livro T das Poemas Lasitanae (8. et, vol. 1, p. 108). one () = 15e 58, Ore 18 ALP. DE Casrno Or eiigos poticos do Renascimento ao Barrco Os meios de aquisigio da arte cram o estudo e a douttina, isto 6 © saber teérica que, mediante um trabalho aturado, © posta devia cconstruir ao longo de uma porfiads aprendizagem: ‘tuto, 6 poeta, o engenho pode dar-to, ‘Mas muito mais que o engenho, o tempo 6 estado; No queras do U logo contentarte 4 nocessieio ser wm tempo muda! (svi e ler somente 0 () Horécio dissera que sSeribendi recte sapere est ot principium et fons» (v. 309), Ferreira diri: «Do tom escrever saber primeico & fontes #). O preceito mantiaha, pois, todo o vigor antigo! © tempo assume deste modo uma importancia capital, j4 para a aquisiggo da doutrina o, por conseguints, da arte, jd para a busea tenaz da perfeigdo. Diz Ferreira a Ceminha: Dostrina, arte, trabalho, tempo ¢ lima ‘Fizeram aquelas aomes tao famor, ‘Por quem a Antguidade so honra e estima. (9) No menos importante para a formagio do bor poeta era a imi tagio dos modelos, Como Horicio recomendara aos Pisses leitura iurma e noctuma dos autores gregos (vv. 268-268), os quinhentistas insistem na nevessidade de imitar, para cada género, 03 paradigmas mais perfeitos. Recomendava, pois, Ferreira: Na boa imitagso @ aso, que o fero ‘Eagenho abranda, 20 inculeo 44 arte, Lal esperoo @4) © processo mio andava isento de perigos e de crfticas. Se levado As ultimas consequéncias, podia arrastar o posta & tradugio, ou redu- ir as suas composigses a meros centdes de tépicos e estilemas jé gastos. Em qualquer caso, a sua observincia implicava um porigo constante para o principio da originalidade, que nfo era menos importante € recomendado, ‘Sem atingir uma acuidade compardvel & que alcangara em Itilia, no principio do séeulo, opondo Bembo a Pico della Mirandola (#), questo nio passow despercebida aos nossos teorizadores. (0) Ferreira, na Carta XIt do Livro I, @ Dogo Bernard (eet p 105) f) 1, pie (©) Caite VIE do Liveo 1 (ed ee, vol ap. 76) (Te p, 0s, {) Ct! G, Santangsa, Le epete we imitations a G. Peo delta Miran 4a 648 Phere Bonde. PUenze, 1954 si8 i A.B, pp Casto — Os ebdigs podcos do Renascimento ao Barrocs 18 A imitagio servil era radicalmente repudiada pelos seus préprios Aofenseres. Basta citar a opinio de Tomé Correia que, no De Epi- ‘grammete, dedicado a D. Scbastiio, em 1569, escrevia: ‘Est imitatio stadlam quoddam comparandi similitudinem excellen- ‘un seriptorum: sed hane nolo seraltute ee, nihil ut passs de uo addere ‘quimiam hac zatione aihil admisatione dignam unquam effcies. Volo in ‘Stolio cum ueteribus eurras, sed nolo ut pedom ponas in coram westigi ‘qua nec praeeuntes consequeris, noc palmas reportabis unquam, et de ‘qu hule serait! adie est acciplenda dt Herat. soatenta: 0 initaors serum acu Quod ction signifiat i rie Nec devilee dtatr fact ‘Sed ex alia parte non ita tamen naturae ot facultaten euagarl sins utomnia de two param, ant nil imitando alloscomponas. ‘Sed serve hans Tegan: si tactauecs ab alia poets lam explicatam, dabis diigenter operam, ‘vt non summum ex flgore, se ex foro darem lucem engites;elabora omni nimi contentione, ut iis splendorem adluagas, tonebras non offendas: Addo vennstatom, elogantiam, numero, elioqui non aggrediars sed nouam raterans assume (*) ‘A imitagio nio podia, pois, ser um decalque; antes pressupunha uma seperagio do modelo, tanto na invensfo, camo na disposicao ¢ na elocugio podtica, obtida através de uma verdadeira © completa assimilago de alquvs dos elementos eonstitutivos do discurso ‘Alim disso a escotha dos modelos, sempre feita em fungio da sua qualidede, devie assentar mum profundo conhecimento dos respectivas textos, fossem eles antigos ou modemes—¢Enriguece a meméria de doniria, | Do que um cante, outro ensine, outro te canter — reco rmendava Ferreira a Diogo Bemardes(%). Sé deste modo padia apli- care com vantagem 0 proceso da. coniaminajdo, yue consstie em aprovetar elementos conteudisticas ¢ formais ealhidos em vérios mode- Jos, para a criagdo de obras tho novas © pefeitas quanto possvel E que cate ideal de pecteigio, insistentemente proslamado como 6 sinico caminho suseeptivel de elevar as Letras modemas a0 fulgor as astigas, determinou uma permanente insatislagso estética, Por isso, em poesia. nfo havia meio term: oa era bos ou era iremediavel- sente mé; dizia Ferreira ‘to sofrm as altas Musas megimente Serem tratadas; tanto que do extreme “Um pouco depo, alo baixamentes () (6) De tat eo pocmatis gnere, quod spigramma dicta of de is, quae a ital ‘pertinent bas, “Vesetis, Bx Ol8cina Francis Zee, 1569, pp. 9-12. (@] Carte XIE do Livro I (oe. cit, p. 10). (6) Carta VIN, do Livro I, a Diogo Bernardes (@, p. 74). 31 20 A. P. ne Castuo—or estigos polo do Renscimenta ao Barco Horfcio dissera na Arte Poética |v. 878): Si paulum a summo evescit, uergit ad imoms, ‘Dai a importincia atribuida ao. limae labor et mora, preconizado por Hordcio (4. Pottica, v. 291). Ferreira nflo se cansa de reiterar 0 ppreceito, recomendando a constante revisio dos textos, na busca da melhor expressio, A Bemardes lembra: sDoutsing, ate, trabalho, tempo e lia Breram aqueles noms to famowos, Por quem a Antiguidade so honra ¢ estima. (4) E a Caminha fala no stompo e lima de inveja forte muroe ), Nem ‘por iss0, todavia, deixa de prevenir o seu destinatério contra o perigo dos excessos: ‘ates aligente ssi a ime retorme ‘Fev verso, que nio entre pela so, ‘Tomandoo, em vez de orntlo, entto distormes (8) Ainda aqui o tempo era factor fundamental, pois s6 ele permitia, fo apenas esse trabalho, mas a perspectiva crition necessirla para colher dele todos os resultados. Por isso, © mesmo Ferreira escrevia a Bernandes: ‘Brsina maito ¢ muda um ano ¢ am dia, (Como em pintora of ert vai siostando, Depois o tempo, que o oho antes nto vias (@) que, uma ver publicada, era difel retomar a obra, para the elimi rar ou cerrigir 0s aleijoes: A palavea que sal Ga ves fora, Dial ce sabe tomar: 6 mala seguro ‘fo tila, que eseusar @ culpa agora. (9) Ao dizer tais palavras, evocava Ferreira os vv. 986-390 da Avte Poética de Horicio: ‘Siguld tamen olin Seripsris, in Naoci desendit iudiels ans ‘Et patrie & nostra, nonumque prematur in annum ‘Membranis intus posts; delere dioebit (Quost nom edideris; nescit wae alaen reverts ©) Los. i, p76, (@) Te, p. ior | | | ALP. Du CAstRo—Os eigos polticas do Renesciments ao Baraco 21 Dai também a fungio primacial da critica, Nao devia 0 poeta confiar apenas no seu julzo, porque vulnerivel, parcial e naturalmente condicionado pelo amor préprio. Havia, pois, que submeter as suas produgées, ainda depois de corrigidas, 8 opinido de um amigo conhecedor dos assantosliteriros, nfo invejoso nem Hsonjeiro, como aconselhava sempre 0 mesmo Ferreira a Diogo Bernardes. 0 juizo de um eritico ‘inico era, porém, falivel, por favoritieme ou impreparagto, pelo que © mais pridente setia ouvit 0 veredicta de um pequeno grupo de pessoas competentes e isentas: ‘80 mude ou tre, ou ponbe, sam primairo Vir eos ouvidos do prudente experto Amigo, no invejoso on lsonjeir, Engana-te 0 amor prdpsio falso e incerto, ‘Também s'engenao-medo de aprasorse Em ambos erro hi guase igual ¢ certo Por lato 6 bom semédio as vers Ior-ce ‘A. dous on tits amigos; o bom Pejo Honesto ajuda entio melhor a verse 2 8) Una teoria poética assim concebida tinhe de apresentar um cari ‘ter fortemente normativo, expresso num conjunto de regras que, embora no sistematizadas num corpus tnico, se revestiam de vigoroso poder vinculativo. ‘A primeira de todas era 0 decoro, pelo qual o poeta se obrigava 2 uma es:olha criteriosa dos temas e géneros, no apenas de acordo com fas suas caracteristicas ¢ qualidades préprias, mas tendo em vista a sensibilidade, 0 gosto ¢ a formayio do leitor|destinatéri, Havia, além disso, que dosear, para cada tema, a importincia e atengiic concedidas a cada um dos aspectos e partes que comportava, omitindo uns, e dando maior ou menor extensio a outros; vejam-se, a este propésite, estas consideragdes de Ferreira a Caminha: 10 decoro que quer que ta cousa digas, ‘Outra cales, emt outes vs detendo © Teitor, isto fujes, isto sigas A observincia do decoro exigia, pois, ao pocta uma esclarecida capacidade clectiva ¢ selectiva, pautada sempre pela sobriedade, que Ferreira recomendava 2 Bemardes, ao dizerthe: elnventa ¢ escolhe 8) 1, p. 10. (8) By 3.78. 22 A. Pe Casrno— 0s cldiges palion do Renassimono ao Barroco entiio o melhor do muitos (%); © que Tomé Corzeia muito havia de valo- rizar também nas suas Explanationes (). O respeito pelo decoro exercia deste modo uma decisiva influéncia nna constituigio do cédigo temético, como parte integrante do poético. Os grandes géncros (0 épico, o dramatico e o lirica) via assim a maté- ria que thes era prépria condicionada pela teoria explicita, mesmo ‘quando tinham a impé-la ou a enobrecé-la— como no caso da poesia lirica —cortentes tematicas e retérico-estilisticas to ricas ¢ fecun- antes como o petrarquismo, 0 neoplatonismo ou mesmo a mitologia steco-latina, Era ainda 0 decoro que obrigava o posta a observar a verosimai- Thanga —particularmente relevante no drama e na epopeia—, que Hordcio recomendara com tio signifcativa insisténcia no inicio da sua Arle, e a dar & organizagto da matéria poética uma estrutura coerente f harménica, que no apresentasse +a histéria on mal tocada ox mal seguidan (*), isto &, que preservasse sempre a unidade intrinseca da obra, © decoro prescrevia igualmente a intima adequagio da elocusao ‘a materia, do estilo a0 contetido, do signiicante ao significado poéticos, servindo a0 poeta para stemperar o ornamentos sHo escuro dé lus ¢ 80 que pudera Fazer divide aclara; do omamento (Ou tira, ox pie: com 0 decero 6 tompera.s () Deste modo se fixevam também, mesmo quando se nilo descia a regras de pormencr, os prineipios basicos para a utilizagio do eédigo retérico-estilistico, Os cédigos temitico e estilistico, assim definidos em fungto do devoro, caracterizatos pela legante contencio da matéria poética e pela clara sobriedade do ornato, dio lugar a uma poesia que é—ou, ppelo menos, pretende.ser!—uma simbiose perfeita, em que todos os elementos intrinsecos ¢ formais se organizam ¢ harmonizam num con- junto de equilibrada beleza (%), assim definida por Anténio Ferreira Para Andrade Caminhs, quando apela para um jufzo Que saiba comparar & boa pinta 6 bom poema em tade vivo e esperto, A sa alegoris, a mé figura, (2) Carta XI do Livro 1 (i, p. 110), (2) Ba. cit, pp. 98 ¢ 1418. (8) Carta Xt do Livro 1 (i, p. 110), ©) 1, p. 107 (0) Sobre este conceto de decorum, de marca profundamente horacians, de tho larga impoctincia na estética Mterrla do Renascimento, vejate C. O. Brink, Horace on Poetry. Cambcidge, at th University Press, 1968, pp. 229-290 52 ALP, pe Gastro — Os efiges police do Renastiments ao Barroso 23 |A Bistéria ou mal toceda ou mal seguida, ‘A fein feltagio, sentenga dara, ‘Sentenge bos, porem mal easiéa, Palawras muito novas, muito antigas, ‘Arte ou demasiads ot eaqueciday;(%) ‘on quando eserovia a Diogo Bernardes: Dana 20 estilo As vests a contenga ‘Tao igual vonka tudo, ¢ tio conforme ‘Que em divide eet ver qual deles venga. (%) Coniena por isso a feia afeitardo ¢ reitera. com significativa insis- ‘téncia as recomendagées quanto ao uso moderado do ornato estilistico. © attificio estilistico era imprescindivel, mas sob condigio de nunca por em risco a sobriedade © a correcsio: ‘Nozssisio é, confess, 0 artitco: ‘Nilo afetado; empoce & tera planta (© mito mimo, 0 multo benelieios (2) A consecnsdo da beleza cstilistica dependia em primeiro lugar do profando conhecimento do eddigo lingulstico ¢ da sua utilizagao adequads ¢ prépria. O o6digo postico beneficiava, neste ponto, ¢ de maneita muito dirocta, do movimento quinhentista da defesa ¢ ilus- tragdo da Ingua (%). So bem conhesidas as posigdes de Anténio Fer zeira quanto & exaltaglo do verndculo portugats (%); e no sto menos insistentes, se bem que de indole mais pedagégice, as recomendagies que, alguns anos mais tarde, Tomé Correia faré a este respeito no De Bega (9. S6 através do porfeito dominio do sistema lingulstico, o posta ppodia encontrar os registos de linguagem mais adequados ao ser dis- ‘curso e conseguia estabelecer as gradagbes virias que separavam 9 estilo coloquial do literdrio, segundo o esquema tripartido do sublime, médio e humilde, normalmente fundamentadona Rhlorica ad Herennims utilizando-as de acordo com o género cultivade Ateneo especial merecia, naturalmente, 0 problema da vers ©) Poemas Lastanos, ed, @ oc. it, p. 75. (2) 2, p. 108. (2) Carta de Fereima a Diogo Berardes (0... 108) (0) Sobeo este movimento em Portage 0 seu enquadramento earopes, vejase Maria Tost de Moura Santos, Not salve omeavimento uikensta de edfesas itstasdon ts Unguas vulgers, in «Biblow, vol 1, 1975, pp. 517-528 (C7) ‘Sio muito expresivos desta posigio os verso da Carta IT do Liveo 1, também ¢ Pero do Anirade Caminha (loc cit, pp. 43-4 (3) Tiomae Coneee De Elepia, Ad Ampitssimumm Cardinalam Scipionem Gonzagan Lstetus. Bononiae, aped Alexendrum Benatium [..] AD. cf. 1X, pp. 9 0 gs 3 24 ALP, De CAstRo—Os edigos potions do Renascimente ao Barroco cago, que, como vimos, ocupava nas graméticas um Inger caja impor- tancia o tempo no diminuiu, pois se mantém ainda nos De éns- fituions Grammatica libri ies do Padre Manuel Alvares, publicados em 1572 ‘As regras métricas assomem, no entanto, tal selevincia que dio lugar a obras espectficas, como a Epomtetria de Aires Barbosa (7) © 0 De componendis versibus (*), dostinados a Sxar o divulger as mais essencais Ensinava-se—claro esti—a miétrica latina, baseade, como & sabido, na combinagio de sflabas breves ¢ longas, mas 0 seu contr- bbato pare 0 sentide do ritmo (ou mimero) do verso em vulgar era decisive. (© conhecimento dos metros italianos (%), divulgedes entre nés a partir de S4 de Miranda, supria, por outro lado, a falta de ragras espe- clficas para o mimero poético do verso em vulgar, que 28 aparecerto em 1615, com a Arte Podtica ¢ da Pintura de Filipe Nunes (#). Aspecto muito importante da versificaro em vernéevlo era a zima. ‘Reconhecendo embora a sua necesidade, nfo deixavam contudo alguns de consideréla um espartilho a liberdade da constragto podticn, pot constituir um falacioso engano do julzo e um embalader Iudibrio do oavido. Eo caso de Anténio Ferreira, que dela preseindiré na Casivo, Mas havia que admitila, quanto ndo se descobria maneira. de res. ‘taurar a boa sola da muse antiga O exemplo dos italianos era entre- tanto suficiente para aplacar os escripulos dos mais renitentes parti- irios da aplicasao da métrica latina ao verso em vulgar, como acen- ‘tua o mesmo Ferreira, a D, Simfo da Silveira: 6 doce rime! mas inda ata ¢ dans, nda do verso a liberdade estrita, Enquanto com tom leve 0 jvien engans, Nie fol a conorincla sempre accit, ‘To ropotida,assi come 2 dogara Continua © epstite cheo enjeta Mas soframo-a, enquanto figura io vemos, que male viva repronte ‘Daquela musi antiga a bos soltura sta deu glésia & italiana gente. [esta prime ardeu ef o bom Manda. (®) ©) Bpometria, sou de metiondi cormina rations. Salmanticas, 1518. (05) De componondée seeds Costmrine, Aped Toannem Barzeruss & Toanns Aluarum Typographos Regis. 3p. 3. (0) Vejam-se as consideragdes de Anténio Ferreira, na Carta X do Livro It doe Foenas Lusitanes, 2 D. Simao da Silvera (oe. et. p. 177), (0) Arte Poatica, «da Pinta, « Spimctia, com Principe da Perspetoa [J Bm Lishoa, yor Pedro Crasbeeck: Anno 1615. () Carta %, do Livro TT (lo. eit, pp. 185-186). su | | i |A shmetria perfeita estabelecida pelo decoro entre 0 ctiador, 0 ‘objecto da criagio, a obra ¢ 0 seu receptor, dando ao texte literdrio, ‘um sentido pleno e modemo, conferia & poesia uma dimensio social do mais prefundo aleance, Com efeito, a eriagio postica nfo era considerada uma actividade estética, meramente Nidiea ou evasiva, antes visava uma explicita fungiio sicial, de intengio formativa no plano ético, tanto ou mais importarte que a sua finalidade estética Dissera Horécio: ‘Aut prodesce aut delectare poetue ‘ant simul ot fnounda ot donen dicere ltass E os nossos quinhentistas assimilaram integralmente este preceito. ‘Ao mesmo tempo que procuravam produzir obras susceptiveis de des- pertar nos leitores uma consciente emogio estética, no esqueciam ‘a formagto moral ¢ elvica dos seus concidadsos, inculcando-thes uma ‘mensagen pautada pela escala de valores do Cxistianismo, premiando virtudes ou vituperando vieios, como recomenda Tomé Correia no jé citado optisculo consagrado ao epigrama (*) ets fungo docente cometida & poesia oferecia até um dos argu- ‘mentos de maior peso para a defesa das Letras contra os seus dettac- tores, ou perante os grandes do mundo propensos ao mecenatismo, como quando Ferreira escreve ao Cardeal-Infante D. Henrique: {Stas nem por isso logo 0 povo chame ‘Vas outta letras, @ 0 honesto exerciio ‘Das brandas Musas tfo mal jolgee e infame 55m nenhum estude bam pode haver vicio. ‘As artes entre si 6 se comunicam, Cada hia ajuda a ontra em sen off. Do arcia © eal o podse eo que edifcam (Baixas mas necossdrias miudezas) As tones erguem, que to slfas fam, ‘Tem também seus prncipios as granderss, 1 ts coisas grandes pequenas ajsdam. Boas leas, Sonhor, nfo sto babvenas, Para o pablico bem também estadam E cantamn os boss postas; deleltando Ensinam, eos maus efates em bons mudam. E is veuts ace Rois vio declarendo MGT sogredas, que entio 28 véem ¢ saber DE rostor falas, aguas mds mostrando. (4) (2) Arie Podtcs, we. 880-884 (©) Vojese a aniliae de B. Weinberg, op. cit, pp. 185-86. (9) Carta XIE do Livro TE (ed. if, pr 198). 925 25 AP. Be Casrmo—0s esdigos podtins do Ronascimento a9 Barroco Dos prémios prometides, « elevagao a esfera da imortalidade era por certo 0 mais apetecido por todos. Esta aspiragio, tio caraceristica do espirto renascentista esti de tal modo presente na poesia da época, do Sd de Miranda a Camées, que se torna supésfio insist nela, Adu zine apenas, como simples exemplo,o fal da carta de Ferrera 2 Diogo Bernardes: {Bo ojo cada dia acesentarso Em ti fogo mals lay, «o engoo ton Geta dia'mais vivo leven Entio dards com glia tun o se Gi" prémio de tes, que fo fal clam, Vda a fee nome, qual a fama don ‘Avmulton que da morte tenfram Nao admira assim que, até pela preparagio cultural que exigia, tanto do emissor como do receptor, este poesia se enquadrasse nama coneepeo vineadamente atistocrdtica da arte Ant6nio Ferreira, a0 tazer na Carta a D. Simo da Silveira a sua profisso de f€ no eclaro fume de Toscanas, deixando ao pave as antigas trovas de Espanha, estabelecia uma consciente separaggo entre as elites literdtias conquistadas pela nova poesia A maneira italiana e 0 ‘vulgo profanc, ainda agarrado a “barbaric” da estética peninsular (*. Esta deliberada sujeigdo da heranga medieval no foi, contudo, uunfinime, como sabe qualquer Ieitor de S4 de Miranda, Bernardes ot Camées. Os eédigos quinhentistas puderam assim acolher e transmitir sumerosos © valiosos legados temiticos e formais dos cédigos que os ‘haviam precedido aqueles que se Ihes seguiram, E que 0s cédigos estéticos, como quaisquer outros da mesma natu- tera, no constituem sistemas rigidos, cojas regras caduquem por ecreto, ou cujas infracg6es se reprimam por sangSes, Bem pelo con tritio— sto entidades dintmicas, sujeitas a uma evolugio que per- manentemente as transforma, muitas vezes até antes de se verem fixadas nos textos teoréticos que constituem como que uma sgramética da literatures, ‘Assim acontecen na época que estamos a analisar. Sobretudo a partir da década de 60, a teotia que procurei definir, quase sempre com base nos mesos textos © apoiada nos mesmos fundamentos, sofre visiveis transformapées, permitindo por conseguinte dlimitar um novo periodo literdri. E certo que a teoria horaciane perdura como suporte fundamental de todo o sistema. E sintomitico que, em 1592, tenha aparecido em Lisboa uma versio da Arte Podtica do Vennsino, feita por D. Lufs 0m, p10 (09) Leet, p. 172 ALP, ps Casrno— 0s cédigos pottins do Renascimento ae Barreca 27 Gapata M7). Mas essa taoria surge agora enriquecida o reinterpretada fem fungio do conhecimento mais profundo e alargedo da doutrina estética de Aristételes e de Platzo, A penetragio especulativa dos mistérios da criagfo pottica fazse agora en claro detsimento da atencio antes concedida 4 técnica da ‘expresséo ou iis regras que @ condicionavem, que perdem cada vex mais ‘0 seu vigor antigo. Para Tomé Correia, por exemplo, o poeta nfo j& 9 artifes, que poe & prova o dominio de uma arte aprendida, mas um ‘inietro e intéxprete do proprio Deus, e as suas obras verdadeitos ori cculos dos ditames divinos: sDininus Plato poctes uocst dag et imypineg. hoc est, Deorum minstros et interpretes, quod ila mysteria, & arcana portarum involucrs imueut per pootas homimum gener judicata, non nisl quaedam salutaia forse sine fnicandan Pattindo dos trés graus da vida humana estabelocidos por Pla- tio ¢ Proc, dstingue Carreiatrés greus de poesia, o primeiro dos quais caractesiza por uma misteriose comunicagao do furor como um dom, zo jA das Musas do paganismo, mas do Espirito Divino, dos erstios. © pocta participa, assim, com Deus na criaglo da beleza ¢ na revelagto das verdades etermas, transformando-se num elo damitrgico entre 0 Homem ¢ a Divindede, gragas ao arrebatamento que Ihe € insuflado, ‘quando possuido daquele faror: Hace pracstans, divinague poctica Deo zeram svctore complet ant ‘num, et mirabili quadam conlunctione et abdita, copalat quod completar ‘cum ¢o, quod complet atque animam quidem sine ula materia, et sae tacts sub Dei subdit poustatom, ut ilustotur. Deum autem inaliat, & allt, nt cam animo se pracbeate commanicet Incem suam confuentibusqne Sistals gaia pereanis opera, ex oreslo componit. Haee communi quo. ‘dam uincule Bectit quod pastlaipat, cum eo unde partiipat, et quasdam knw ex utroque faciento mistura, quod deterius es, in id, quod est potius ‘tansfondit, effcleque wt fd solum, quod est divinas munere fengatar suo, Infewiore paste cudente, ot in ea, qute potior ext occutante wm seam, it ahd fore jem ia animo cernatis, nisl caceste, atgue disinum (_-) Nam Devs, ut rebus cacters age paroctstribuit concentum quendam, ct mame- rose dimensions, ic etiam sm anime a so ooeupats gigi llam poeta inam, in qua elucet uestiginm queddam, non obscuram illus consensio- nis, ct conuenientaa dluinae. Deinde mentis occupationem et farerem oeat (J) E D. Anténio de Ataide, primeiro Conde de Castro Daire, no seu orrdo de carte poéticas conservado no ms. 46-VIII-37 da Biblioteca (©) Bl ate postice de Horatio, taducida de Latin on Espaol for Don Last ‘Gapata{...] (Bm Lisbos, em casa de Alsxandre de Sygueira. Anno do 1592), () De anuiuatata dignitateque Poese ot Postarum diferent, 8, cit, p. 675. (0), pp. 677-878 ea 28 AP. pp Casmo—0s egos polio do Renscimeno a0 Bavroco a Ajuda, © que pode datarse dos fins do séeulo xvi, dizia, para definir 0 posta: ‘para @ poeta ser digno do seu nome dde ter tal entendimento que, Aeisando por baxo toda humanidede empronds of altesimas © se pote ‘quasi hf meo entre Deos © 0 homé, porque 0 home tado o que faz he de mato= tia, Deus cra de nada, mas 0 pool, ainda que aio ee prepriamente alga couse de nada, tadaviacheo do divino furor, de tal modo age elegantements fem seus verses que quasi parsce que produs de nada of suas fcpoese (i) A segunda espécie de poesia visava a interpretasio das aparén- cias, mediante o conhecimento da natureza das coisas, de modo @ con- ‘ribuir com obras esteticamente perfeitas para a edificagdo moral do homem, através do deleite: ‘Altera poctica spoces, mols partibus inferior, habet statum suum finitum intelligendihabite: cognossit naturam rerum, et honeste facts, of dicts delotatur, ot ees in numeram fcludit () A terceira, inferior ¢ mais obscura, consistia apenas na simples imitagio da realidade verdadeira ou de fantasias imaginadas, por fin- sgimento ou por semelhanca, para exclusive prazer do esplrito: ‘Testa demum, et extrema forma pootiae Longe superiribus iaferoe, bscutior, ot igoobilir, oplaiontons, et visionibas conluncta ext. ace {mitatione perctor; nequa eo, aut dlitr ese aud, quam quaedam cone citatio (..} Imitatio quaedar vara of recta quae tslom tina quamque Tem tingle, qualls ipsa ot; altera simolata ot fieta unamquamgue rom expel ‘it, non qualis [psa est, sed qualiswidetor, aut mulltudint wider potest. Hino existit una forma poetic quae veris de rebus opinionlbus niva est, ct germanam illum, et exprosam sizilltudinem proponans tata ad Sie ‘ationem ueitatis accommodatur. Altore, quae sequens 43 tantum quod nidetur, et apparet, non similitudinem uoram, sod quamdam simolatam speciem similttadnis ante oculos ponit, ae tota ad woluptaten compa raturs (3) ‘Nao deixa Correia, por certo, de mencionar a necessidade da eul- ‘ura (citando inclusivamente o verso de Horécio Scribendi rede, sapere (0%) Biblioteca da Ajude, cfd. 46-vax-87, Me, 18, Os apontamentos reunidos estos dever data dos ittmosancsdosée,xovtouprsultosdosegutnte visto que, ‘afl. 48, ht uma nota da mao de qualquer oficial de cas do ater, em que declara ‘tr feito cectas entrogas do diahero em 28-X-1601, D, Antinio de Atside fol 9 IL Conde de Cattro Daire ¢ 8° Conda de Castinbcia, Nasceu em 1564 ¢ fle. cou a 14 XIFIGH7 (cl B. Machado, Diblitca Lucitane, tt, pp. 21L218 6 ‘A. Braamcamp reir, Byasdes da Sala de Sintra, 9. ed, Lisboa, mprensa Nacie nil—Casa da Moeds, 1974, val. x, pp. 103-105) (8) Op. at, p. 682 ©) Tb, p88 _ j | | ‘AP. oe Casino —Os eigoepoltcss do Renasimento ao Barroso 29 est et principiumn et fons) (), mas o dominio da técnice aparece, na sua teoria, em posigdo ja claramente secundéria. A poesia é ainda imitagto, mas o objecio dessa imitagio alarga-se ‘progressivamente da realidade verdadeira aos resultados de uma ima- ginagdo exercida em fungdo da fantasia ou da Optica através da qual © poeta observa essa realidade, que podo cada vez mais livremente ‘ransformar ou distorcer, com 0 fim vinico de proporcionar um prazer ‘estético, liberto de qualquer outro intuito que nfo seja agradar ivertir Em consequéncia desta amplitude concedida A imaginagfo e & fantasia, o c6digo temitico altera-se substancial e profondamente, ‘Para essa alteragio contribui com igual peso a. crescente importincia atsibuids aos afeios. Para ser perfeito, nfo importava jé tanto a0 poeta camprir as regras, mas, & semelhanga dos oradores, cumpria~ the mover os afectos © deleitar, comovendo, pelo patético. Escrevia por isso D. Anténio de Atalde’ ‘Sto basta que o posta cipra od as obrigagoés da ate, so a obra nto for batistce, qe he 0 mesmo que dizer comovedara, do modo que de mover ‘aE afecto, om a testers, ot aleria ou a semethantes (¥) © Aarmonioso equilibrio que 0 decoro assegurava ¢ impunha a0 ebdigo temitico renascentista vé-se deste modo seriamente compro- metido, ndo Ihe valendo sequer a defesa da verosimilhanga, sempre fundada em Aristétees ‘Assim se compreende a erescente importtncia que a poesia ele- siaca aiguire no lirismo do final de Quinhentos, Tanta, que Tomé Correia julga oportuno consagrar-the uma teoria espectica, no De elegia, texto que jf por virias vezes aproveitei ao longo destas gina. ‘Assim, se compreende também a cada vez maior projeesio da poesia ao divino, com preferéncia manifesta pelos temas relacionados com a Paixéo de Cristo ou com a angtstia do pecador arrependido, sjudada, aids, pela nova espritualidade nascida do Concllio do Trento ‘ou pelo espitito de crise colectiva subsequente a derrota de Alcécer- Quibic (9. ‘Ao mesmo tempo, a organizagio do discurso pottico exigida por ‘este alergamento temético consequente do recurso a fantasia da vvalorizagio de contetidos emocionais, acolhe com avidex 0 recurso 8 argicia,& subtileza ao enigma, como outros tantos meios de melhor (2) 2, p. 682 Op. ae, soy. () Cf. Afatia de Lourdes Belchio, art cit.» Vitor M. de Aguiar © Siva, Manwiviono ¢ Barroco na poesia Hirica portuguesa.” Coimbra, Centro de Pstudos Rominicos, 971, pp. 205-925 50 90 AP. ne Castmo—0s eéigospolica do Renascinento ao Baroco captar o destinatério. Atonte-se, a comprové-to, neste passo de Tomé Correi ‘Forma epgrammatis quasi anima et spstes ort anputla; sine gua Jace, ot lnguet quae sl subnets si aligua requires, pobutar tamen, ct oblectat animi senses. Si uso epigramma argitin cert, epigramma ‘hm est; ut fs alae qua suam formamn per quam sunt, aon habent Nem eri, ancoos of goat oagus opigramaads sles args, et acumen eto 09) A necessidade de adequar o estilo 2 matésia tinha por forga de conduzir a uma sobzevalorizagio do ornato estilistico. As figuras ¢ 0s ‘tropos aprendidos nas aulas e nos compéndios, on consagrados ecmo esteredtipos formais pelo oédigo anterior, tinham agora justificada ‘uma utilizaso mais livre e abundante, & medida que o valor e a forga do decoro vinham enfraquecendo. Entre todos & a metéfora que, naturalmente, zaaior beilho © mais peregrino uso obtém, como aquele que mais podia contribuir para o enriquecimento do poema. Para D, Anténio de Atalde, sendo uma icenga coneesida mais facilmente aos poetas, encontrava a sua expres- ssio mais requintada no enigma, pois epara eseurecer se podle usar de ‘metéforas com licengas muito largase (”). ‘Ja se fazia a apotogia da obscuridade! Mas 0 oximoro, a antitese ¢ a hipérbole no contribuirio menos para esse entiquecimento do cédigo estlistica, A prépria classifcarto da poesia em trés graus, defendide por ‘Tomé Correia, faciitava, com toda a evidéncia, esta valorizagio do omato. Se o primeiro daqueles graus, reservado a poucos iluminados, © 0 segundo, pela sua harmonia e sentido moral, visavam a elevago spiritual do homem, o terceiro pretendia apenas o seu deleite estético. E como este grat, pela sua maior e mais fécil acessibilidade, era o que atingia mais vastas camadas de piblico, o prazer estética era, para ‘2 major parte dos eriadores de poesia © para os respectivos destina- ‘érios, 0 fim tinico a alcangar. Ora privilegiando assim a fungio lidica, tomava-se necessétia, facil © atraente, a consequente exuberincia formal. Por outro lado, 0 poder vinculative atribuido as xegras do cédigo fenfraquecia cada ver. mais, tanto nos aspectos que acabamos de exa- iar como, sobretudo, na degenerescéncia da disciplina dos géneros. Formado esteticamente segundo os cdnones do equilfbrio renas- centista, vai D. Anténio de Ataide anotando no sex borrio, com dente intengo condenatéria, as infraogdes que por toda a parte via (9) De toto co poematis gonee quod epigramina wily dictur, >. $8. (0) Op. eit, . 34, 0 cea ss Peron sii ALP. pe Casrno— Os eSigos polio do Rewascinent so Barroco 3 ssurgir em relagto a eles, sobretudo no que tocava ao género dramético, E fora precisamente 0 desejo de obstar & decadéncia que verifcava, ‘em poesia uma das causas principais que 0 haviam levado a reunir as rnotas para a sua ineonclusa «Arte Poéticas: ‘A terceira causa que tive para publics esta Arte Postica he ver como se vei estragando a poesia ea pouca noticia que della ha, digo, das suas lis fe otrigagbes © cédigo estéticoditericio estava, pois, no seu tempo, jé profun- damente alterado (* Nao levou D. Anténio a bom termo 0 sen projecto, mas, ainda que tal -ivesse acontecido, nto lograria naturalmente travar um pro- cesso evalutivo que ele proprio, apesar de o condenar, verificava ¢ reflectia Ao longo da sogunda metade de Quinhentos o cédigo renascentista tinha-se alterado e transformado, timidamente a principio, com maior fe mais ripida ousadia, depois, permitindo ¢ reflectindo o forescimento de uma 2oesia diferente, a que se tem chamado maneirista. © chdigo maneizista no encontroa—é certo—entre nés uma expresedo clara completa, em termos de teoria explicita. Para o defi- nit hé que aproveitar os clementos cantidos nos textos podticos dessa ‘mesma época. No entanto, as transformagées verifiadas no eédigo renascen‘ista criaram as condigdes pars que 0 florescimento poético do perfodo seguinte pudesse fundamentar-se, ja de maneira mais segura, ‘numa teoria estruturada e sistematizada, que ir permitir uma tei ‘mosa consistincia e uma prolongeds duragao & poesia barroca em Portugal, (18, 0.8. ©) Cow, ds av, 7, 16 © passin, 33

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