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Niterói/ RJ
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AGRADECIMENTOS
RESUMO
ABSTRACT
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO..............................................................................................................11
1. SOBRE SEXUALIDADE..........................................................................................16
1.1 Sexualidade na Pré-História.............................................................. 17
1.2. Sexo e Moralidade............................................................................19
5. SOBRE ADOLESCÊNCIA....................................................................................... 37
6. SATANIZAÇÃO DA SEXUALIDADE: HISTÓRICO DA CULPA......................40
6.1. Amor, Erotismo e Procriação......................................................... 42
7. UM POUCO DE HISTÓRIA.................................................................................. 43
8. SEXUALIDADE E EDUCAÇÃO: UM POSSÍVEL DIÁLOGO?.............................50
8.1. A Sexualidade do Professor.............................................................. 52
8.2. Orientação Sexual: O Que Significa?............................................... 53
8.3. Inserção da Orientação Sexual no Currículo - os PCNs..................58
9. METODOLOGIA.......................................................................................................61
15 REFÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS...................................................................105
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LISTA DE TABELAS
LISTA DE GRÁFICOS
INTRODUÇÃO
Não se pode negar ou simplesmente ignorar a sexualidade. Ela existe e faz parte
do nosso dia-a-dia. Está inserida nas sociedades do mundo inteiro e apresenta-se sob as
mais diversificadas formas e para cada uma delas existe um conjunto de variáveis físicas,
mentais e psicossociais que contribuem para a formação integral das pessoas.
Para atingirmos nossos objetivos, tomamos como sujeitos desta pesquisa dois
grupos distintos: o primeiro grupo formado por adolescentes, estudantes, de ambos os
sexos, freqüentando regularmente a sétima série do ensino fundamental das escolas
selecionadas; o segundo grupo de sujeitos formado por professores também do ensino
fundamental, lecionando nestas escolas. Nossa escolha pela sétima série não foi aleatória.
Ao contrário. De acordo com o conteúdo programático da disciplina de Ciências, é
justamente na sétima série que o aluno estuda o corpo humano, todos os órgãos e sistemas
inclusive o sistema reprodutor. Em nossa pesquisa de campo, utilizamos dois tipos
diferentes de instrumento: o questionário composto por dez perguntas (anexo1), aplicado
aos estudantes de ambos os sexos que estivessem cursando a sétima série do ensino
fundamental das escolas selecionadas, e a entrevista, feita com os professores (roteiro em
anexo 2), gravada com o prévio consentimento dos entrevistados. É interessante observar
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Nossa pesquisa teve uma abordagem qualitativa, que não pretende impor um
quadro pré-determinado de raciocínio sobre a realidade existente nas escolas da rede
pública (estadual e municipal) que foram observadas. Optamos pelo relativo abandono da
explicação do fenômeno Orientação Sexual em termos de causa e efeito. Ao contrário,
procuramos compreendê-lo de forma contextualizada, dentro do enfoque social, cultural,
político e efetivo ao qual pertence.
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Aqui nos referimos ao volume 10 dos Parâmetros Curriculares Nacionais (MEC) denominado Pluralidade
Cultural e Orientação Sexual, que é específico para as séries iniciais ( 1ª à 4ª ) do ensino fundamental.
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Foucault chama de hipótese repressiva as perspectivas de análise em geral feitas ao sexo, a que ele se opõe.
Ele é contra a idéia da hipótese repressiva e afirma que a repressão ao sexo só estimulou ainda mais suas
manifestações.
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1. SOBRE SEXUALIDADE
demanda social cada vez maior de informação e formação coletiva, estudos acerca da
sexualidade já começam a ser encarados com mais naturalidade e seriedade. Almeja-se o
crescimento global do indivíduo como cidadão, em todos os planos: físicos, intelectual,
afetivo-emocional e sexual.
O mais complicado nestes casos é que a grande maioria das meninas que
engravidam na adolescência pertencem às classes menos favorecidas economicamente,
pois nas classes média e alta, um número considerável de adolescentes que engravidam não
vão fazer parte dessas estatísticas por terem acesso ao aborto. Um milhão de adolescentes
teve de se deparar com a gravidez não planejada. Por esta razão, é importante pesquisar
esta faixa etária (adolescência) e desenvolver propostas pedagógicas voltadas para uma
demanda de atendimento específico à questão da sexualidade.
O surgimento do ser humano no planeta Terra não é algo muito preciso, mas
sabemos que sua evolução, de simples primata para o ser complexo que é hoje, passou por
um longo processo de mutações e adaptações.
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Dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) – 1996.
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A vida nas florestas, dentro das árvores, chegou ao fim com a seca enfrentada
pelo planeta. Com a falta de água, a extensão das florestas ficou reduzida, obrigando os
seres vivos a abandoná-las em busca de comida. As transformações do homem
aconteceram em decorrência das interferências ecológicas (num primeiro momento),
genéticas, cerebrais, sociais e culturais. O meio natural se modificou lentamente,
provocando a mudança nos indivíduos e nos grupos sociais. O surgimento das savanas e a
saída dos indivíduos das florestas, cada vez mais escassas, foi o primeiro passo no sentido
da hominização.
Para adaptar-se ao terreno plano das savanas, o homem primitivo teve que
adquirir um andar bípede, libertando as mãos da função locomotora e passando a utilizá-
la para outros fins. A posição de pé, liberta as mãos que, se modificam (surge a oposição
do polegar em relação à palma da mão). Com as mãos livres o homem passa a
confeccionar objetos, adquire novas habilidades para caçar e modifica seu padrão
alimentar, especialmente após o domínio do fogo.
As práticas sexuais também variavam de tribo para tribo. Nas tribos menos
evoluídas, o ato sexual era feito com a fêmea de “quatro”, posição semelhante àquela usada
pelos animais. Podemos notar que tratava-se de algo puramente instintivo, voltado para a
procriação da espécie. Nas tribos mais adiantadas, a mulher passa a adotar a posição de
frente para o parceiro, buscando sensações mais prazerosas.
Podemos então concluir que a busca do sexo por puro prazer exigia uma
complexidade maior por parte dos indivíduos e até mesmo das sociedades. E como todas
as outras práticas, a sexualidade também apresentava variações individuais e culturais,
observáveis nas mais diversas esferas.
Durante muito tempo da era paleolítica, o homem percebeu como “natural” para
a fêmea humana, como para a égua selvagem ou qualquer outra fêmea, ficarem grávidas ou
amamentando durante boa parte de sua vida adulta, como era “natural” para o homem e
todos os demais animais entregarem-se ao ato sexual sem verem nisso nada mais do que a
realização física. Somente em um estágio realmente tardio da civilização é que sexo e
moralidade convergiram.
Quando Freud tentou ajudar aos vienenses adultos a vencer suas neuroses,
formulou para isso uma filosofia geral capaz de explicar como as patologias se
desenvolviam e como as crianças se desenvolviam psicossexualmente. Ele percebeu que as
crianças desde a mais tenra idade, exerciam atividades sexuais e estabeleceu cinco fases
dentro das quais aconteceria o desenvolvimento emocional e psicossexual da criança.
A segunda fase foi denominada de fase anal e nesta, a fonte de prazer está
localizada na região anal. A criança sente prazer em controlar os esfíncteres.
apenas o próprio corpo, como ocorre na fase fálica). Esta fase prenuncia o
desenvolvimento dos relacionamentos sexuais adultos.
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Texto de Sigmund Freud denominado O mal estar na civilização de 1929-1930.
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humanidade é o de saber se tal acomodação pode ser alcançada (por meio de alguma forma
específica de civilização) ou se esse conflito é irreconciliável.
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A sublimação do instinto constitui um aspecto particularmente evidente do desenvolvimento cultural; é ela
que torna possível às atividades psíquicas superiores, científicas, artísticas ou ideológicas, o desempenho de
um papel tão importante na vida moderna.
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É importante ressaltar que nem todas as civilizações vão igualmente longe disso
e a estrutura econômica da sociedade também influencia a quantidade de liberdade sexual
remanescente. Isso porque a civilização obedece às leis da necessidade econômica, visto
que uma grande quantidade de energia psíquica que ela utiliza para seus próprios fins tem
de ser retirada da sexualidade. Para que esse sistema funcione é preciso haver mecanismos
de controle da sexualidade, postos em prática na vida dos sujeitos, desde a infância. A
civilização moderna cria regras para o exercício da sexualidade: relacionamentos sexuais
na base do vínculo único e indissolúvel entre um só homem e uma só mulher. Além disso,
a finalidade da sexualidade não é o prazer por si só, mas sim a propagação da raça
humana.6 Desta forma, a vida sexual do ser humano civilizado encontra-se bastante
prejudicada. Se a civilização impõe sacrifícios tão grandes, não apenas à sexualidade do
homem, mas também à sua agressividade, podemos compreender melhor porque é tão
difícil ser feliz nessa civilização. O homem civilizado trocou uma parcela de suas
possibilidades de felicidade por uma parcela de segurança e para viver em sociedade e em
6
É importante acrescentar que na época em que Freud desenvolveu sua teoria, não havia métodos científicos
capazes de auxiliar a reprodução humana, tais como inseminação artificial. Assim sendo o único caminho
para que um casal tivesse filhos era a atividade sexual. Por essa razão, a mesma era “tolerada”.
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O século XVII vai assinalar o início de uma época de repressão própria das
sociedades chamadas burguesas e da qual talvez ainda não estejamos liberados
completamente. Dominar o sexo seria, a partir desse momento, mais difícil. É como se,
para dominá-lo no plano real, tivesse sido necessário primeiro, reduzi-lo ao nível da
linguagem.
O sexo e seus efeitos não são fáceis de decifrar, em compensação, sua repressão
pode ser facilmente analisada. E a causa do sexo, de sua liberdade, do seu conhecimento e
do direito de falar dele, encontra-se com toda legitimidade, ligada à causa política.
Na obra “História da Sexualidade I”, Foucault (1988) faz uma análise histórica
e estabelece alguns questionamentos sobre os porquês que levam uma sociedade a se
fustigar ruidosamente por sua hipocrisia, a falar prolixamente de seu próprio silêncio, a
obstinar-se em detalhar o que não diz, a denunciar os poderes que exerce e prometer
liberar-se das leis que a fazem funcionar. Ele passa em revista não somente os discursos,
mas principalmente a vontade que os conduz e a intenção estratégica que os sustenta.
A questão que Foucault (1988) coloca não é o fato de sermos reprimidos, mas
porque dizemos com tanta paixão e rancor que somos reprimidos. Não se trata de toda e
qualquer repressão, mas daquela que condena o gasto de energia inútil, a intensidade dos
prazeres e as condutas irregulares.
Tais objeções que Foucault opõe à hipótese repressiva têm por objetivo muito
menos mostrar que a hipótese repressiva é falsa do que recolocá-la numa economia geral
dos discursos sobre o sexo no seio das sociedades modernas a partir do século XVII.
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Já referida anteriormente.
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Foucault (1988) não diz que a interdição do sexo é uma ilusão, mas sim que a
ilusão está em fazer dessa interdição o elemento fundamental e constituinte a partir do qual
se poderia escrever a história do que foi dito do sexo a partir da Idade Moderna. Todos
esses elementos negativos (proibições, recusas, censuras, negações) que a hipótese
repressiva agrupa num grande mecanismo central destinado a dizer não, são peças que têm
uma função local e tática numa colocação discursiva, numa técnica de poder, numa
vontade de saber que estão longe de se reduzirem a isso.
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De acordo com a Lei de n º 9.394/96 de Diretrizes e Bases, que regulamenta todo o processo educacional
no país, e seguindo as orientações estabelecidas nos Parâmetros Curriculares Nacionais traçados pelo MEC, o
tema Orientação Sexual está inserido na escola como tema transversal. Isso significa que terá de perpassar
todas as disciplinas da grade curricular: da educação artística à matemática.
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Foi neste aspecto que nos utilizamos da idéia de habitus em Pierre Bourdieu,
para tentar compreender as razões, as dificuldades encontradas por professores e alunos
em abordar as questões relacionadas à sexualidade de forma mais aberta e transversal
dentro da escola. Para Bourdieu (1975), o habitus se define pela tendência dos sujeitos à
reprodução. O habitus seria a mediação entre o agente social e a sociedade, se exprime
desta forma, necessariamente no interior de um ciclo de reprodução.
Uma das grandes preocupações que estes autores têm tido com o sistema de
ensino está relacionada à dimensão social que este sistema fornece para a formação de um
habitus. Em suas palavras:
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Bourdieu utiliza a noção de agente ao invés de indivíduo.
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Esta citação foi retirada da obra A Reprodução na qual Bourdieu condena severamente a repetição que o
sistema escolar acaba desenvolvendo em seus alunos.
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Desta forma, o habitus adquirido pelo ator social através da sua inserção em
diferentes espaços sociais constitui uma matriz de percepção, apreciação e ação que se
realiza em determinadas condições sociais. O habitus adquirido na família está portanto, no
princípio da estruturação das experiências escolares. O habitus é transformado e
modificado ou reforçado pela escola, estando por sua vez no princípio da estruturação de
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5. SOBRE ADOLESCÊNCIA
Nas sociedades ditas civilizadas, não haviam rituais de passagem tão severos
quanto aqueles impostos aos jovens indígenas brasileiros, mas as mudanças na concepção
da adolescência também aconteceram. Nas sociedades pré-industriais até as crianças
viviam em família e participavam da vida da comunidade. Eram tratadas como adultos em
miniatura. Usavam roupas e sapatos de adulto e delas eram exigidos comportamentos
semelhantes aos adultos.
A mulher saiu para o mercado de trabalho e passou a assumir funções que até
então eram ocupadas pelos homens. As crianças ou iam para as fábricas junto com as
mães, ou ficavam entregues a própria sorte. Neste período começam a surgir instituições
que se preocupavam em tomar conta destas crianças.
imediatamente em homem jovem, sem passar pelas etapas da juventude, que talvez fossem
praticadas antes da Idade Média e que se tornaram aspectos essenciais das sociedades
evoluídas de hoje. A transmissão dos valores e dos conhecimentos, e de modo mais geral, a
socialização da criança, não eram portanto, nem asseguradas nem controladas pela família.
A criança se afastava logo de seus pais, e pode-se dizer que durante séculos a educação
dela foi garantida pela aprendizagem, graças à sua convivência com os adultos. A criança
aprendia as coisas que deveria saber, ajudando os adultos a fazê-las.
A família antiga tinha por missão, sentida por todos, a conservação dos bens, a
prática comum de um ofício, a ajuda mútua quotidiana num mundo em que um homem, e
mais ainda uma mulher isolados não podiam sobreviver, e ainda nos casos de crise, a
proteção da honra e das vidas. A família não tinha a função afetiva. Isso não quer dizer que
o amor estivesse sempre ausente: ao contrário, ele é muitas vezes reconhecível em alguns
casos desde o noivado, e geralmente depois do casamento, é criado e alimentado pela vida
em comum. Contudo o sentimento entre os cônjuges, entre pais e filhos, não era necessário
à existência nem ao equilíbrio da família, se ele existisse, tanto melhor.
Na Idade Média, por exemplo, não era possível demarcar a fase da vida de
um jovem através da sua idade cronológica (Ariès, 1981). Especialmente porque as idades
e datas de nascimento não eram claramente registradas. Não havia normalmente,
documentos de registro nos quais constassem datas e horas de nascimentos e óbitos.
Mesmo tendo havido mudanças quanto à exatidão cronológica, não se possuía idéia do que
hoje chamamos de adolescência e esta idéia demoraria a se formar. O interesse pela
juventude surgiu na Europa, mais especificamente na França, em torno dos anos 1900.
Começou-se a desejar saber seriamente o que pensava a juventude, e surgiram várias
pesquisas sobre ela.
Foi assim que, passamos de uma época sem adolescência a uma época em
que a mesma é a idade favorita. Deseja-se chegar a ela cedo e nela permanecer por muito
tempo.
Para finalizar, poderíamos dizer que a cada época corresponderia uma idade
privilegiada e uma periodização particular da vida humana: a “juventude” é a idade
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Quanto à mulher, as organizações sexuais da libido que esse novo sistema cria,
fazem dela a única responsável pelo cuidado da criança porque a reduzem ao domínio do
privado, da casa, tiram-lhe o poder público de decisão. Nessa estrutura dualista:
público/privado ocorre uma interiorização dos papéis feminino e masculino. Homens e
mulheres tratam de incorporar o mais profundamente possível, o papel que o sistema lhes
aloca, e de serem fiéis a estes lugares. Aqui, a culpa passa a ser de responsabilidade do
próprio indivíduo. E este indivíduo passa a competir com o outro, a querer matar o outro
para ter mais posses. Sua essência agora são as coisas, a propriedade e assim a partilha
havia se transformado em competição.
Logo após a Renascença, no período que vai do século XIV até meados do
século XVIII, aconteceu um fenômeno generalizado em toda a Europa: a repressão
sistemática do feminino – foram quatro séculos de caça as bruxas.
7. Um pouco de História
A partir do século IV, os clérigos passam a viver num celibato regido pela
virgindade e pela continência. Eles não devem derramar nem sangue nem esperma.
Opõem-se aos leigos, isto é, ao resto da sociedade, presos num casamento dedicado à
procriação.
O casamento passa a ser visto como local exclusivo para a atividade sexual,
sendo voltado unicamente para a procriação de novos adeptos para a Igreja. Ele tem por
finalidade lutar contra um desejo culpado. Na Alta Idade Média, o calendário era
ferozmente restritivo: não menos do que 273 dias nos quais os contatos sexuais são
condenados. Se admitirmos que o ano comportava, já nessa época, 365 dias, um rápido
cálculo nos informa que restavam apenas 92 dias passíveis de relações sexuais entre os
cônjuges.
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Na Idade Média, este nome designava os livros nos quais estavam registradas as expiações devidas pelos
diversos delitos, qualificados como pecado.
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Que manifesta uma inclinação desenfreada ou irresistível pela busca e prática dos prazeres sexuais.
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No Brasil colônia, das leis do Estado e da Igreja, com freqüência bastante duras,
à vigilância inquieta de pais, irmãos, tios e tutores, tudo contribuía para a concretização de
um único objetivo: abafar a sexualidade feminina que ao ficar fora de controle, ameaçava o
equilíbrio doméstico, a segurança do grupo social e a própria ordem das instituições civis e
eclesiásticas. A Igreja Católica exercia forte pressão sobre o adestramento da sexualidade.
O fundamento, escolhido para justificar a repressão da mulher era simples: o homem era
considerado superior e, portanto, cabia a ele exercer a autoridade. A mulher estava
condenada por definição, a pagar eternamente pelo “pecado” de Eva, primeira fêmea que
levou Adão ao pecado e tirou da humanidade a possibilidade de gozar da inocência
paradisíaca. Já que a mulher partilhava da essência de Eva, tinha de ser permanentemente
controlada. O poeta Gregório de Matos, que viveu em Salvador no século XVII fala de
uma mulher após o casamento, da seguinte maneira:
“Irá mui poucas vezes à janela,
mas as mais que puder irá à panela;
ponha-se na almofada até o jantar,
e tanto há de coser como há de assar”.
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Sobre esta longa perseguição, La Sorcière (1862) de Michelet constitui ainda hoje, uma obra de referência.
Michelet insiste justamente sobre a obsessão sexual dos juízes e teóricos da bruxaria.
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mulheres pelo casamento, tornando-as hábeis na arte de prender a seus maridos e filhos
como por encanto, sem que eles percebam a mão que os dirige. Em outras palavras, devia-
se aguçar seu instinto feminino na velha prática da sedução, do encanto.
Esse discurso justificava a saída dos homens das salas de aula, dava a eles a
oportunidade de se dedicarem a profissões mais rendosas e a elas, mulheres, a ampliação
14
Para discussão do tema ver Cunha,1989/1991.
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de seu universo, antes restrito à casa e à Igreja. Desta forma, as mulheres entraram
definitivamente nas escolas e a partir de então passam a ser associadas ao magistério
características tidas como tipicamente femininas: paciência, minuciosidade, afetividade,
doação. Características que, por sua vez articuladas à religiosidade, deram ao magistério a
idéia de “sacerdócio", e não profissão.
Tudo foi muito conveniente para que se construísse a imagem das professoras
como “trabalhadoras dóceis, dedicadas e pouco reivindicadoras” ( Louro, 1995), o que
serviria futuramente para lhes dificultar a discussão de questões ligadas a salário, carreira,
condições de trabalho e tantas outras coisas importantes.
Percebida como ser frágil, a mulher precisava ser protegida e controlada. Toda
e qualquer atividade fora do espaço doméstico não deveria se chocar com a feminilidade,
não poderia atrapalhar os deveres domésticos, da maternidade especialmente.
Foi neste quadro que se construiu para a mulher uma concepção do trabalho
fora do lar como ocupação transitória, a qual deveria ser abandonada sempre que houvesse
necessidade por parte da verdadeira missão feminina: de mãe e esposa. O trabalho fora
seria aceitável para as moças solteiras, até o momento do casamento, ou para as mulheres
que ficassem sós: viúvas e solteironas. Não há dúvida que esse caráter provisório ou
transitório do trabalho feminino também acabaria contribuindo para que seus salários se
mantivessem baixos. Afinal, o sustento da família cabia ao homem. Ele é quem deveria
prover a esposa e filhos de suas necessidades. Havia outras razões que atraíam as mulheres
para o magistério, uma dela, era a jornada de um só turno, que permitia que elas
atendessem suas obrigações domésticas no outro período. Tal característica justificava
ainda mais o salário reduzido, supostamente um salário complementar. Com certeza não se
considerava as situações nas quais o salário das mulheres era fonte de renda indispensável
à manutenção das despesas domésticas.
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Kupermann (1999) faz uma rápida abordagem do que seria sexualidade, usando
para isso conceitos freudianos, como pulsão, pulsão sexual, fonte e obtenção de prazer.
Dentro desta visão, a pulsão sexual é o motor da atividade humana. A partir dela é que se
constitui a pulsão de saber, responsável por todo o movimento de curiosidade “intelectual”
da criança. O autor usa o termo entre aspas porque os primeiros interesses da criança estão
intimamente vinculados ao que é de ordem sexual – fonte maior de suas satisfações e
merecedora de sua atenção – ou seja, o que a afeta. Desta forma, a curiosidade infantil está
dirigida em primeiro lugar ao enigma das origens: De onde venho? Como nasci? Por que o
menino “tem” e a menina não “tem” ?
alunas vivenciam. Talvez essa seja a parte mais rica deste processo, afinal, a sexualidade é
uma experiência inacabada que coloca-nos frente ao desconhecido por toda a vida. Desta
forma, o professor que aborda o tema sexualidade, estará sofrendo exigências psíquicas
diferentes daquelas que lhe são exigidas por outras disciplinas e precisará de uma certa
elasticidade psicológica para lidar com elas. Um trabalho planejado e articulado,
respeitando e considerando a transversalidade do tema sexualidade, poderá servir de
suporte a professores e alunos e manter acesa a chama da curiosidade dos “juquinhas” em
todos nós.
A escola possui uma condição diferente da familiar, contudo cabe a ela, escola,
discutir as questões ligadas à sexualidade, abordando diferentes pontos de vista, valores e
crenças. Podemos dizer que são diferenciados os tratamentos dados à sexualidade, no
espaço familiar e no espaço escolar.
A caminhada da Educação Sexual em nossa sociedade não foi algo muito fácil, ao
contrário teve avanços e retrocessos.
O início da Orientação Sexual se deu na década de 1920 no Brasil vinculada
à vigilância sanitária, ao controle e cura das DSTs, especialmente nas populações
consideradas de risco. Algumas doenças sexualmente transmissíveis, como a sífilis, se
espalhavam por todas as camadas sociais, daí a necessidade de combater o mal. Já naquela
época, surgiram propostas de inserção da educação sexual no âmbito escolar. Infelizmente
tais perspectivas não se concretizaram, devido às posições mais conservadoras da
sociedade, especialmente da Igreja. Poderíamos dizer que esta visão médica, relacionada ao
combate das doenças e controle das praticas sexuais, perdura até os dias atuais, gerando
entraves no desenvolvimento de projetos voltados para essa finalidade.
Na década de 1960, o Brasil e o mundo, passam por um processo de
questionamento de sues valores, socais, sexuais e morais. Nesta época surgem no mercado
os anticoncepcionais femininos, dando assim à mulher a possibilidade de Ter relações
sexuais sem engravidar. Foi a partir deste período que surgiram os primeiros registros de
uma preocupação com a educação dos jovens e adolescentes da rede pública de ensino,
especialmente nas grandes cidades, como São Paulo e Rio de Janeiro.
Com o golpe militar de 1964 houve uma censura muito intensa aos
movimentos sociais e os comportamentos sexuais também receberam essa carga de
censura. A imprensa passa a ser vigiada, controlada intensamente pelo poder público. A
liberdade de expressão tão duramente alcançada foi castrada e mais do que nunca, os
valores morais burgueses passaram a tomar conta das pessoas. Poderíamos acrescentar que,
a sexualidade está de certa forma, vinculada ao poder e à vigilância. Isso passa, portanto
pela questão ideológica. Aqueles ou aquelas que ousassem questionar eram vistos como
subversivos e punidos severamente. Ainda hoje há quem se lembre com amargura daqueles
dias de repressão, medo e insegurança. Famílias inteiras ficavam a mercê de uma denúncia
anônima, que podia ser considerada uma confissão. De certo modo, ainda hoje, vivemos as
conseqüências daquela ditadura. Pessoas nascidas na década de 60 aprenderam que era
melhor não se envolver em confusão, em transtornos políticos. A “melhor” postura era a de
expectador. Deixar que as coisas acontecessem e se resolvessem por si só. Claro que isso
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não acontece! Se dermos a outrem o direito de agir por nós, o que o outro decidir estará
decidido, gostemos ou não do resultado.
Na década de 70, o tema Educação sexual volta ao cenário e passa a fazer
parte do currículo das escolas de 1º e 2º graus, na disciplina “Programa de Saúde”. Se isso
representou um avanço não podemos afirmar, pois enquanto disciplina, a sexualidade
passou a ter ares de coisa séria demais, para fazer prova e passar de ano. Muitas escolas
trabalharam o tema de forma anatomicista, dando ao aluno, noções geográficas da
distribuição dos órgãos de seu corpo e do corpo dos outro. A preocupação com as DSTS
era grande, pois com a pílula anticoncepcional, mais liberdade para o sexo, as DSTS se
implantaram no cenário social, atingindo pessoas de todos os níveis.
No começo da década de 80 surge o grande e pior fantasma da
humanidade(nos dias atuais ainda está assim): AIDS. SIDA em português. Naquela época
se tornou imprescindível à orientação da população quanto às formas de contágio,
prevenção e tratamento. A demanda pela Orientação Sexual nas escolas se intensifica e
mais uma vez a preocupação com a doença foi o carro chefe dos trabalhos de sexualidade
nas escolas. Além disso, o número de adolescentes que engravidavam antes do casamento
começava a crescer muito. Nos anos 90 o fenômeno “gravidez indesejada” teve seu
grande boom. Em 1996 a revista Veja, publicou como matéria de capa, a assustadora
informação: “Um milhão de adolescentes engravidam por ano no Brasil”. Se era para
assustar, assustou mesmo, pois ao final de dezembro daquele mesmo ano saía publicada a
nova LDB (Lei de Diretrizes e Bases) que prevê a inserção do tema Orientação Sexual
como tema transversal, na grade curricular das escolas. Se podemos considerar essa nova
lei um avanço, não sabemos ainda, mas pelo que temos observado em nossa prática, os
professores de modo geral e a escola como um todo, não estão mais abertos à sexualidade
dos alunos por conta desta normalização legal. Se o argumento de não ter o amparo legal,
por muito tempo serviu de escudo para que quase nada fosse feito na escola quanto à
sexualidade, atualmente nada ou quase nada ainda se faz, e não pela falta de uma lei, mas
pela falta de disponibilidade do próprio professorado.
Tal postura deve inclusive auxiliar aos alunos a discriminar o que pode e deve
ser compartilhado no grupo e o que deve ser mantido como uma vivência pessoal. Apenas
os casos individuais de alunos que demandem atenção e intervenção diferenciadas da
possibilitada pelo trabalho de Orientação Sexual devem ser tratados separadamente do
grupo pelo professor ou orientador da escola e decidido um possível encaminhamento para
atendimento específico, médico, psicológico ou ambos.
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Volume editado em 1998, pelo Ministério da Educação e do Desporto
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Uma primeira forma seria entendendo que essa relação deve ser intrínseca, ou
seja, não tem sentido existir distinções claras entre conteúdos tradicionais e transversais.
Um professor de matemática por exemplo, jamais poderia trabalhar o seu conteúdo de
matemática desvinculado da construção da democracia e da cidadania.
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Professor do Departamento de Psicologia Educacional da Faculdade de Educação da UNICAMP.
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bastante comum que o tema sexualidade surja como fonte de interesse em diferentes
momentos para cada aluno ou grupo. A cada etapa, as questões relativas a esse tema se
ampliam e se conectam com outras dúvidas e preocupações, demandando portanto sua
retomada. O professor deve também estar atento às diferentes formas de expressão dos
alunos.Muitas vezes, a repetição de brincadeiras, apelidos ou paródias alusivas à
sexualidade podem significar uma necessidade não verbalizada de discussão e de
compreensão de algum tema. Deve-se atender a este pedido.
9. METODOLOGIA
Contudo, nenhuma teoria, por mais bem elaborada que seja, dá conta de
explicar todos os fenômenos e processos. Cabe ao investigador separar e recortar
determinados aspectos significativos da realidade para sua pesquisa, buscando
interconexão sistemática entre eles. Na visão de Lüdke (1986), “para se realizar uma
pesquisa é preciso promover o confronto entre dados, as evidências as informações
coletadas sobre determinado assunto e conhecimento teórico acumulado a respeito dele”.
Tomamos como sujeito desta pesquisa, dois grupos distintos: um formado por
alunos, adolescentes, de ambos os sexos, frequentando a sétima série das escolas
selecionadas; outro grupo formado por professores de ambos os sexos, de diferentes
disciplinas que lecionem para turmas de sétima série que foram pesquisadas.
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o corpo humano nas turmas de sétima série. Alega que a chegada dos Parâmetros não
provocou nenhuma alteração em sua prática pedagógica pois já trabalhava “esses
assuntos” naturalmente. Observamos que essa naturalidade trazida em discurso por esta
professora não corresponde à sua prática pois foram detectadas algumas dificuldades para
falar abertamente de sexualidade e talvez esta mesma dificuldade esteja presente em suas
aulas. Isso nos traz à tona uma questão levantada por Foucault: o discurso. Ao mesmo
tempo que evidencia o sexo, esconde-o.
Na opinião desta professora, as maiores dificuldades no desenvolvimento do
trabalho de sexualidade são algumas religiões mais conservadoras que muito alunos têm e
as famílias dos estudantes. Contudo, quando perguntei se P1 tinha tido algum problema
com as famílias por trabalhar sexualidade, P1 afirmou que em dezoito anos de vida
docente, nunca havia tido problema algum nesse sentido. Notamos que tais argumentos
foram utilizados por P1 para, de certa forma, justificar a não realização de um trabalho de
sexualidade com seus alunos. O que corroborou esta posição foi a colocação de que seria
melhor se o tema Orientação Sexual fosse trabalhado por uma pessoa de fora da escola
pois o professor que lida com a turma todos os dias vira amigo e não é levado a sério pelos
alunos. É interessante notar que esta sugestão de ter alguém de fora da escola para fazer
este trabalho também aparece nos dados colhidos junto ao alunado.
“...há uma lição de moral nesse texto17, que diz que tudo que é gostoso de fazer, mais tarde
traz problemas e eles vêem esse lado e fazem perguntas sobre isso. Que realmente são
jovens demais para determinadas coisas e eles consentem que é uma parte deles, dessa
sexualidade...” .
17
Texto que P2 disse levar para a sala de aula para tratar de sexualidade.
{PAGE }
“ Eles consentem o erro deles, eles assumem algumas coisas, algumas falhas deles”. “...
eles acham errado esse despertar. Porque tudo que você fala, tudo que você coloca eles já
levam para o lado... “eu gosto disso” , gosto de apertar, gosto de abraçar, gosto de
beijar. Não me interessa o estudo, me interessa mais isso. E a gente mostra que o estudo
é importante...”.
“ Eu acho que esses jovens estão precisando de mais palestras, estão precisando de serem
orientados por uma pessoa mesmo experiente, uma pessoa especialista nisso. Não só os
professores ajudando nisso, mas uma orientadora sexual dentro da própria escola, cada
escola com uma, para poder orientar os jovens com mais dificuldade. Isso seria
importante e poderia até ajudar ao professor a ter uma visão mas ampla a respeito do
assunto. As vezes o professor tem uma vivência de outra geração e está vivenciando com
os alunos adolescentes uma outra geração agora, se torna mais difícil de entender como
está a cabeça dos jovens neste exato momento”. ( P2 )
“Acho que os alunos podem pensar: Ah! Aquela professora só pensa em sexo! Imagino
que esse tipo de situação não aconteceria se o trabalho de orientação sexual fosse feito
com uma pessoa especializada no assunto. De preferência algum professor de outro turno
ou outra escola.” (P2)
“...os Parâmetros Curriculares falam que o tema de Orientação Sexual seria um tema
transversal que deveria ser inserido dentro da escola por professores de várias
disciplinas,. Só que eu estou achando que isso não está ocorrendo, quer dizer, a gente na
realidade não está trabalhando esse tema transversal. Mesmo porque as pessoas têm
dificuldades em colocar esse tema dentro da sua própria disciplina, que a grade também é
muito extensa, então as pessoas acabam deixando essa disciplina auxiliar pra lá” .
“ Não consigo porque eu não vejo nada afim entre história e sexualidade, que eu possa
pegar e entrar naquele tema sem ser uma ruptura muito brusca. Por exemplo, hoje eu vou
parar de falar de História e falar de Orientação Sexual, entendeu? Eu acho que deveria
ser alguma coisa que me desse entrada dentro da disciplina para que eu chegasse a esse
tema e isso eu não estou conseguindo. Na minha área, eu ainda não consegui colocar
sexualidade como tema transversal”.
Esta professora imagina que na área de Ciências tal articulação ocorra de forma
mais natural pois os assuntos têm mais afinidade com a sexualidade. É bastante
interessante notar que vários professores entrevistados imaginam ser mais fácil estabelecer
a relação entre sexualidade e seu conteúdo programático, para o professor de ciências,
devido ao fato de na sétima série o enfoque ser o corpo humano. Acontece que nas
demais séries como a quinta série por exemplo, o conteúdo de ciências é Planeta Terra.
Poderíamos nos perguntar também qual a relação entre planeta Terra e sexualidade.
Alguns poderiam facilmente estabelecer esta relação e articular os conteúdos. Contudo,
muitos docentes ainda preferem assumir um distanciamento estratégico das questões
acerca da sexualidade, alegando que sua disciplina não apresenta nenhuma brecha na qual
pudesse ser inserido este tema transversal. Não percebem que trabalhar transversalmente
{PAGE }
Ao explicar o que faltava para que essa articulação fosse feita, alegou a falta de uma
Orientação Pedagógica, de pessoas que pudessem orientar este trabalho de forma mais
sistematizada. Concluiu sua fala defendendo que o tema Orientação Sexual deveria ser
uma disciplina, pois assim aconteceria mesmo na escola. Esta observação demonstra uma
desinformação com relação à tranversalidade proposta nos PCN’s.
Em entrevista com P4, da área de Ciências, foi observado que esta conhece
teoricamente o conteúdo dos Parâmetros. No entanto, apesar de ter lido vários documentos
sobre isso, inclusive os volumes que foram enviados pelo MEC, não se sente preparada
para trabalhar com estes, ou seja, a interdisciplinariedade ainda está só no discurso, não
faz parte da prática. Quanto à Orientação Sexual, sabe que deve aproveitar as
oportunidades em sala de aula e trabalhar com os alunos na medida em que vão surgindo as
questões. Faz isso tambémcom as turmas de 6ª série, nas quais trabalha o tema seres vivos.
Reconhece que isso não tem sido fácil, pois os alunos da 6ª série são ainda imaturos e
levam para o lado da brincadeira. Por essa razão, prefere responder as perguntas dos alunos
e alunas de forma individualizada, até mesmo fora das aulas, no recreio, nos intervalos ou
em outro momento, sem a presença maciça de toda a turma.
{PAGE }
“ Eles têm muitas dúvidas e perguntam várias coisas. As meninas às vezes me perguntam
até fora da matéria. Elas têm muito interesse, buscam mais informações. Querem saber
sobre período fértil, gravidez, o que acontece, usar a camisinha, se não usar, elas me
perguntam isso. Até por eu ser professora de ciências. Agora em geral trabalhar com a
turma já é mais complicado”.
“A gente pode conversar com eles mas eu acho que teria que ser alguém melhor
preparada, exatamente para dar essas noções de Orientação Sexual a eles. Alguém que
buscasse só isso e que pudesse conversar com eles e se aprofundar mais no assunto. Não
só em sala de aula porque é muito pouco. Precisaria de um tempo maior. Sair de sala de
aula, que eles tivessem palestras para orientar. Eu sou professora de Ciências, dou as
noções básicas mas tem coisas que eu acho que poderia haver alguém que poderia estar
melhor preparado do que eu. Eu acho difícil também a gente lidar com esse tema. Pra mim
é difícil porque eu não me sinto completamente preparada porque eu posso ensinar a
teoria, mas ter um contato maior com o aluno, levar um papo mais profundo, conversar
mais com eles, eu não tenho esse tempo e nem esse preparo. São muitos problemas né?
Acho que um psicólogo seria a pessoa mais indicada para conversar com os alunos.”
18
A Fundação Municipal de Educação é o órgão maior do município, e regulamenta e controla as ações
desenvolvidas nas escolas municipais de Niterói.
{PAGE }
pessoas da escola sobre alguém da UFF, que estava em busca de estágio na escola. Foi
explicado à diretora que o objetivo não era estagiar, mas sim desenvolver uma pesquisa
sobre Orientação Sexual. Todos os objetivos e procedimentos da pesquisa foram
explicados e assim, iniciamos nossos trabalhos. Ao entrar em contato com os professores
da casa e expor nossas intenções de pesquisa, dois professores se ofereceram para a
entrevista e preferiram fazê-lo em conjunto, ou seja, os dois ao mesmo tempo. Vamos
chamá-los de P5 e P6.
Um fato bastante interessante aconteceu nesta escola, durante nossa pesquisa, por
isso vamos mencioná-lo. Certo dia na escola, esta pesquisadora entrou no banheiro
feminino que é utilizado pelas alunas e viu que o mesmo não possuía portas internas,
somente a externa que ficava no corredor. Ao sair deste banheiro, esta pesquisadora se
deparou com um funcionário da escola que passava pelo corredor e com muito espanto
este a perguntou o que esta fazia naquele banheiro, ao que foi respondido que usara o
banheiro. O funcionário então disse que aquele banheiro não deveria ser utilizado pelos
professores, somente pelas alunas e imediatamente mostrou a localização do outro
banheiro. Foi então observado que o banheiro das professoras tinha um aspecto
completamente diferente do das alunas: tinha portas internas, além de espelho na parede,
sabonete nas pias e flores para enfeitar. O ambiente estava limpo e arrumado,
completamente diferente do das alunas: sujo e completamente devassado. Aqui
pontuamos a importância do ambiente escolar acolhedor para qualquer iniciativa,
especialmente para as de educação e saúde, fato que não parece preocupar a maior parte
dos gestores.
Também nas questões relacionada ao pedagógico, observamos um enorme embaraço
por parte dos entrevistados ao afirmar que desconheciam os Parâmetros Curriculares
Nacionais. Já haviam ouvido falar alguma coisa, mas sem precisar o que era exatamente.
Ambos tentaram se justificar, dizendo que aquela era uma questão que a Fundação
Municipal cuidava, mandando pessoas para fazer palestras de vez em quando e mesmo
assim não era para todas as turmas. Tiveram dúvidas em dizer quais turmas recebiam este
tipo de orientação. Achavam que era nas turmas de 7ª e 8ª série, mas reconheciam que os
alunos das turmas menos adiantadas (5ª e 6ª) também necessitavam desta orientação.
Uma professora alegou que não conhecia os Parâmetros porque nunca tinha tido
curiosidade e também tempo. Justificou a falta de tempo, alegando que dava aulas em três
{PAGE }
escolas, que o dia todo ficava envolvida em dar duas aulas e se deslocar de uma escola
para outra. Outro demonstrou conhecer um pouco melhor os Parâmetros:
“Pelo que eu entendi dos temas transversais você não separa, porque Educação Sexual
está ligada a ética, que está ligada a história, a sociologia. No parâmetro diz isso, que
você tem que trabalhar isso dentro do seu conteúdo, pegando outros conteúdos, a questão
da interdisciplinariedade, independendo do tema que você trate tem que falar de algo que
inclua sexualidade.”( P6 )
Ao serem perguntados se a chegada dos Parâmetros provocou alguma mudança na
prática docente, P5 foi categórica:
Logo depois tentou relativizar sua resposta alegando que já trabalhava de forma
integrada em sua disciplina (História) mesmo antes da chegada dos Parâmetros. Segundo
ela, não se cria a preocupação com temas humanísticos através de decreto. Afirmou ainda:
“Eu não sou contra os Parâmetros, mas acho que as propostas se perdem um pouco.”
“Eu não conheço os Parâmetros. Pode ser até que eu esteja trabalhando e me encaixando
dentro dos parâmetros de forma intuitiva, sei lá.”
“Isso exige do professor! Isso é complicado para o professor que tem várias turmas,
várias escolas. Tem o compromisso em cumprir a grade curricular, tem o dia-a-dia, o
corre-corre, a nossa vida é muito louca. A questão do planejamento de aula, não é uma
coisa de fazer fichinhas como eu tinha que fazer na minha época. É pensar uma aula,
pensar questões, estar atento ao que está à sua volta é importantíssimo para você dar uma
boa aula. Às vezes o dia-a-dia do professor faz com que ele passe o tempo inteiro no
próprio ato de tentar sobreviver.” (P5)
“Quando você vê isso, a sua preocupação dobra. Mas também quando você está
preocupada, você não consegue fazer uma coisa direito. Você não pode transformar a
sexualidade numa proibição, num tabu. Falar de sexualidade como uma coisa excelente
na vida do ser humano, mas que precisa ter cuidado, com ele e com o outro.” (P5)
“...a minha matéria é Geografia... só que eu, paralelamente já desenvolvi um curso sobre
AIDS, e fiz isso aqui na escola. Na minha matéria, quando eu vou tratar de assuntos
relacionados com a população, índices de natalidade e mortalidade, o controle da
natalidade. E o controle da natalidade é feito como? Através da pílula ou da camisinha. E
se você não usar a camisinha, além de não controlar a natalidade você pode adquirir
várias doenças sexualmente transmissíveis. Então eu me propus a trazer aqui e todo ano
eu trago, um médico, uma pessoa da Secretaria de Saúde para desenvolver esse trabalho.
Eu cheguei até a fazer no ano passado e no ano retrasado um trabalho de um mês com
eles, toda semana passava filme, fazia oficina sobre AIDS principalmente. E eles adoram,
gostam muito desse tipo de trabalho que eu faço aqui. Esse ano eu ainda não fiz, mas até o
final do ano vou fazer”.
Esta professora sente falta da colaboração de outros professores para
desenvolver o trabalho de orientação sexual na escola, sente-se só...
“...sempre eu trabalho só. Em 98, nós fizemos o PDBG, Programa de Despoluição da Baía
de Guanabara, eu trabalhei com mais de dois professores e a gente acabou juntando,
{PAGE }
fazendo esse de meio ambiente e o da AIDS, mas depois de 98 pra cá, eu passei a fazer
sozinha.”19
Ela considera este trabalho muito importante especialmente pela quantidade alta de
alunas ainda meninas, que engravidam todos os anos na escola. E terminou sua fala
questionando se havia algum programa de Orientação Sexual que pudéssemos levar para
aquela escola.
“...Agora mesmo nós temos o caso de duas alunas grávidas e eu venho conversando com
elas há um tempão. Falei:”Vai namorar? Usa camisinha! Enrola o menino” . Elas
morrem de rir comigo. Eu falo: “Vai namorar? Acende a luz. Não fica no escurinho
porque na hora que botar é bom e você não vai querer tirar”. Eu procuro usar uma
linguagem mais brincalhona mas mesmo assim, virou, mexeu, aparece uma grávida.”
Em nossa entrevista com P8, da área de Ciências, foi observado que esta possui
pouco conhecimento acerca dos Parâmetros Curriculares Nacionais, mas entende que sua
proposta é a interdisciplinariedade.
“.. eu acho que é legal porque uma matéria não pode ficar restrita a só uma cadeira. Todo
esse intercâmbio entre as matérias, acho legal pra caramba, acho que faz falta. Ninguém
precisa ser responsável por uma única matéria. Você tem que ter um conhecimento maior,
estar preparada para uma coisa, mas não significa que você não possa levar o que você
sabe para outras disciplinas e vice-versa. Eu não sei se todo mundo vai topar fazer isso
não! Aí já é outro esquema. A idéia é legal, agora se as pessoas vão aceitar e fazer essa
ligação são outros 500.”
P8 reconhece que não leu os Parâmetros de 5ª a 8ª, mas sente que alguma coisa
precisa ser feita na escola...
“ Eu já tive até olhando mas não parei para me fixar, para saber direitinho tudo o que tem
dentro do Parâmetro. Agora que eu acho que há uma necessidade muito grande de
esclarecer, de trazer para esses adolescentes toda essa parte de Orientação Sexual. Aqui
na escola está havendo problemas de gravidez com meninas novas, com 14 ou 15 anos e
19
P7 está se referindo ao trabalho de orientação sexual que faz na escola
{PAGE }
isso gera evasão. Porque a partir do momento que elas ficam grávidas, elas ficam com
vergonha. Às vezes não está nem aparecendo ainda, a gente nem sabe, mas elas morrem
de vergonha e não vem mais. Principalmente no turno da tarde. Elas engravidam e largam
a escola.”
“...como eu sou professora de ciências da 7ª série, uma das partes da matéria é o aparelho
reprodutor masculino e feminino. Primeiro eu falei pra eles tecnicamente o que era um e
outro. Eles ficaram com vergonha de fazer perguntas, como sempre. Aí eu passei uma
sacolinha com as perguntas, sem nome de ninguém. Peguei a sacola fui lá pra frente, li e
respondi pergunta por pergunta, sem identificar ninguém. Outra coisa que eu achei válido
também : falei sobre as DSTs e AIDS. O risco que eles correm, o uso da camisinha, os
anticoncepcionais, a pílula , o DIU, diafragma. Conversamos sobre isso tudo. Não sei o
que ficou e o que não ficou. Fizemos um grande debate, enfim. Mas não sei o que ficou,
porque eles vem com tanta coisa errada, que as vezes eles não acreditam naquilo que a
gente está falando. Eles ficam com muita dúvida. A gente tenta, né? Eu estou sempre
aberta. De vez em quando um me cerca aí fora, até por causa da área.”
“ O projeto foi em cima de gravidez, adolescência e evasão. Porque temos observado que
as meninas estão engravidado cada vez mais cedo, 5ª e 6ª série são os maiores índices.
Isso atrapalha a adolescente porque ela sai da escola, fica com vergonha, atrapalha o
pai20 pela mesma razão, ele sai da escola. Ele acha que já é muito adulto e quer estudar à
noite. À noite, a gente sabe que não é igual ao ensino regular durante o dia. Ele tem que
parar pra trabalhar, tem que parar para uma série de coisas. Atrapalha a vida de duas
crianças, o que dificulta muito o futuro. Normalmente, o pai ainda retorna, às vezes, para
20
Aqui P8 está se referindo ao adolescente do sexo masculino que se depara com uma situação inesperada de
gravidez da namorada.
{PAGE }
estudar à noite, mas a menina, é muito difícil. Então ela pára de estudar na 5ª ou 6ª série e
se dá por satisfeita. Isso vai acontecer com o filho dela, quando estiver nessa idade. O que
a gente está notando, pelo menos aqui na escola, há uns dois ou três anos atrás, a
incidência de gravidez maior era na 6ª ,7ª e 8ª série. Esse ano não, a incidência maior foi
na 5ª e 6ª série, ou seja, está acontecendo mais cedo, mais na 5ª do que na 6ª série. Eu
tenho uma turma, de 6 ª série, eu até te mostro, tem umas 4 meninas grávidas, à tarde. Não
sei porque. Isso é uma observação minha. As turmas da manhã, até tem alunas grávidas.
Teve uma que engravidou da 7ª série, perdeu o neném, uma professora estava com uma
trouxa de roupinhas de neném para dar pra ela, e ela disse: Ah professora, eu perdi o
neném mas a senhora guarda porque eu já estou providenciando outro. Entendeu? Aí o
que a gente bolou: Eu e os professores daqui da escola, fizemos esse projeto e estamos
querendo começar a conversar com os alunos de 4ª série. Começar a explicar as coisas na
4ª série e continuar isso na 5ª e na 6ª série, aumentando o grau de conhecimento pra ver
se quebra um pouco isso. Porque se a gente bobear, daqui a pouco vai começar a
acontecer na 4ª série ou na 3ª série. Onde a gente vai parar com isso? A mãe dessas
crianças trabalha fora, o pai também então, quer dizer, a responsabilidade de cuidar
dessas crianças fica por conta de outra criança. Você acha que a avó do neném vai poder
parar de trabalhar? Não vai! Aí é que ela vai ter que trabalhar muito mais. Fica difícil! A
gente está com o projeto aqui, vamos apresentar para a direção, o pessoal gostou e vamos
ver se a gente bota para funcionar a partir do ano que vem. Depois eu te conto o
resultado.”
Em entrevista com P9, da área de Ciências, ficou constatado que ela compreende a
proposta dos Parâmetros e mostrando-se disposta a trabalhar de forma integrada com as
demais disciplinas e quanto à Orientação Sexual, tem uma maneira própria para
desenvolver este tema:
“Eu acho que os professores fazem, mas não de uma forma programada. Isso acontece de
uma forma mais solta. Tem o conteúdo que cada um tem que dar: 5ª série é solo, 6ª série é
seres vivos e na 7ª tem mais essa parte, porque trabalha o corpo humano. Mas mesmo na
6ª eu procuro trabalhar esse lado de acordo com a realidade deles. São alunos com faixa
etária variada, entre 12 e 14 anos, então a gente está sempre trazendo a AIDS, a gravidez
{PAGE }
precoce. Sempre trazemos isso para dentro de sala, procurando orientar um pouco os
alunos em relação a isso”.
“ Eu enfoco essa questão da Orientação Sexual, mas de uma forma sem programação.
Aproveito as dúvidas que surgem dos alunos, perguntas, questionamentos, a existência de
alunas grávidas dentro da própria escola. Ou na parte de prevenção, mas quando você
sente uma abertura da aluna pra isso. Mas uma coisa programada, específica pra isso
não! Na escola até tem palestras, às vezes, trazem profissionais da área da saúde, mas a
minha prática mesmo, não. Até por falta de tempo. Ou eu sou enrolada mesmo! Mas é
muita matéria a dar. O conteúdo é muito extenso. Na 5ª série eu até consegui resultados
melhores porque o conteúdo é mais enxuto mas na 6ª é quase impossível. Na 7ª, mais
quando eu começo a falar no aparelho reprodutor.”
“ Eu acho que os próprios alunos sentem muita necessidade disso, de uma orientação
nesse sentido. Mas ainda, por incrível que pareça, existe um tabu deles. Até que com os
professores que têm mais contato, proporcionam uma abertura maior, eles se chegam
mais. Então você consegue fazer um trabalho melhor. Mas eu acho que esse trabalho que
você está fazendo é fundamental na maioria das escolas. Você vê só, logo que você surgiu
em sala eles já foram perguntar se você fazia palestras. Estão naquela sede mesmo, então,
eu acho que eles têm pouco conhecimento, acho que a gravidez e as doenças sexualmente
transmissíveis acabam acontecendo mesmo por falta de informação. A maioria dos pais
não têm nem conhecimento e às vezes não têm acesso a isso. Então fica tudo muito em
cima da escola. A escola está suprindo o papel da família. Então eu acho que esse
trabalho, eu não sei se vai haver sempre ou se vai ser uma coisa mais esporádica, é
{PAGE }
sensacional. Fazer um acompanhamento com eles, com palestras, vídeos. Já até teve aqui
na escola! Eu acho que veio bem a calhar porque está precisando muito.”
Interessante notar que a professora estava imaginando que esta pesquisadora iria
desenvolver na escola um trabalho mais sistematizado enfocando a sexualidade. Ao final
da entrevista foi explicado o objetivo desta pesquisa. Foi possível observar um certo ar de
decepção na professora ao perceber que alguém de fora da escola não iria desenvolver tal
trabalho.
“...os Parâmetros Curriculares nós temos trabalhado em cima deles, mas não há como
colocá-los em prática. Principalmente em determinadas escolas, com a nossa realidade
carência de professor, carência de material e a coisa é muito bonita no papel mas na
prática fica difícil, pelo menos até o momento, de ser implantada, na maioria das
escolas.”
“... os tabus são muito grandes e existem hábitos de prevenção e higiene muito diferentes
do que já é usado. Camisinha, muitos ainda têm preconceito de usar. Usam ainda tampão
com vinagre como contraceptivo, coisa de séculos atrás. Eles têm informações ainda muito
arcaicas. É uma clientela diferente. Os pais (dos alunos), a maioria trabalha como
caseiro, são pessoas que vieram de fora, normalmente do norte do país, são pessoas de
origem bem humilde e que não têm conhecimentos nem para elas mesmas e nem para
passar pros filhos. Isso dificulta muito! Então há necessidade de haver uma Orientação
Sexual, o movimentar disso dentro da realidade deles, para que eles possam se colocar e
serem trabalhadas essas dificuldades e até mudanças de hábitos de higiene” ( P10)
“... Você não fica só na sua disciplina você pode adequar à realidade do aluno, outros
conteúdos que tenham a ver com a realidade de cada um. Então isso melhorou bastante.
Utilizar até outros colegas e fazermos um plano para que cada um possa fazer abordagens
sobre determinado texto e cada um utilizar dentro da sua disciplina. Isso ajudou bastante.
Podemos trabalhar com arte, com ciências, história, geografia, enfim. Acho que ajuda
bastante”.
“Utilizamos vídeos, conversamos com eles. Nos vídeos saem as perguntas que você nunca
imaginaria que eles tivessem dúvidas tipo: “Fazer sexo com cachorro, o que vai nascer?
Metade gente, metade cachorro?” As coisas mais absurdas! Eu trago vídeos de casa, a
escola também tem alguns vídeos e nós conseguimos pincelar essa parte do início da vida
sexual, a formação tanto dos órgãos sexuais masculinos e femininos, das doenças
sexualmente transmitidas, trabalhamos em relação à AIDS, entendeu, essas coisas deu pra
{PAGE }
ser feita. Esse ano foi feito isso, a maioria conseguiu entender e houve até mudanças de
comportamento. Porque a mídia faz com que, nessa fase, eles busquem revistas pornôs,
filmes pornôs, e isso estava atrapalhando muito até o rendimento na escola. Eles estavam
chegando cochilando dormindo. Aí eu comecei a fazer uma sondagem com eles e vi que
era em função desses filmes passados à noite, que eles ficavam assistindo. Isso aguçava
muito mais o sexo”.
Perguntamos a ela se esse trabalho era uma iniciativa da escola ou dela própria enquanto
professora, ao que respondeu:
“ Foi uma iniciativa minha, por eu sentir a necessidade com as minhas turmas, por conta
até do rendimento. Porque estava atrapalhando em tudo eles ficavam aguçadíssimos.
Estava atrapalhando em todas as disciplinas e o rendimento melhorou a partir dessas
informações porque aí tira aquela ansiedade e eles tem que saber que é normal essa
mudança toda, mas também não é trabalhar só em cima disso. Afinal não se vive só pra
isso né?”
“ A dificuldade é que cada um tem que se virar, preparar material. O governo não manda
livros em quantidade suficiente que abordem esse tema. Então você tem que preparar. Tem
um livro de 7ª série que tem alguma coisa sobre isso, mas aí você tem que xerocar, eles
não têm dinheiro e você tem que dar um jeito, entendeu? Então existe uma dificuldade. O
vídeo seria muito mais prático e eficaz. Não ia onerar o aluno e nem o professor. O
professor não tem grana pra isso. Ficar preparando material, xerocando e dando pra todo
mundo. E também tem o seguinte, há famílias que a criança não pode chegar com aquele
material em casa.”
21
P 10 alegou que a Secretaria de Educação não manda nenhum material para esta escola e os professores
tem que se virar com o que tem.
{PAGE }
“Então eles não têm noção de que numa brincadeira, se a menina estiver no período fértil,
pode acontecer de engravidar. Eles não têm noção do uso de pílulas, como usar.
Imaginam que se vão transar agora ou à noite, vão ali e tomam uma pílula. Eles não tem
muita noção disso. Não vão ao posto de saúde, não se tratam. Mas isso não acontece só
com os alunos. Com os adultos acontece coisa semelhante. Você vê dos homens de 40
anos, quem é que vai fazer o exame da próstata? Eles simplesmente não vão! É o
preconceito mesmo! As mulheres vão mais mas mesmo assim tem muitas que não vão. Vão
quando vão ter filho e depois não voltam mais, nem pra fazer a revisão pós parto, porque
tem vergonha. E quando vão só querem ir à médica mulher e não médico homem. Como
no posto muitas vezes não dá pra fazer essa escolha, elas acabam não indo. Fica difícil!”
Uma análise geral foi feita a partir dos temas propostos no roteiro, a saber:
conhecimento sobre PCN's , entendimento sobre Orientação Sexual na escola, mudanças
provocadas em sua prática pedagógica, aplicabilidade em sua disciplina em teoria e em
prática, e contribuições dadas pelos entrevistados.
Quanto a conhecimento sobre PCN's , a maior parte dos professores entrevistados
demonstra ter pouco conhecimento sobre as diretrizes propostas nos Parâmetros
Curriculares Nacionais. E mesmo aqueles ligados à área de Ciências acreditam estar
trabalhando Orientação Sexual por darem na sétima série aulas sobre sistemas do corpo
humano ( sistema reprodutor masculino e feminino). Estes professores acabam repetindo
aquilo que era desenvolvido na década de 70, quando se trabalhava temas relacionados à
sexualidade em Programas de Saúde. Notemos aqui a nítida dificuldade destes
22
Apesar de alegar que nunca teve problema algum com as famílias dos estudantes ao trabalhar assuntos
relacionados à sexualidade.
{PAGE }
{ EMBED MSGraph.Chart.8 \s }
Dos 200 alunos que responderam ao questionário, observamos que a faixa
etária predominante concentra-se em torno de 14 - 15 anos, o que pode ser visto como uma
pequena defasagem série-idade. Por outro lado, para fins desta pesquisa, uma idade mais
adiantada traria uma maturidade física também correspondente, o que poderia ser causador
de maiores probabilidades de atividade sexual por parte destes jovens.
Aproximadamente 72,5 % dos adolescentes pesquisados consideram-se
bem informados acerca da sexualidade, embora não conversem, na mesma proporção, com
seus professores, sobre sexo. Apenas 26,5% dos entrevistados admitem não serem bem
informados(as) sobre sexualidade. Cabe aqui levantarmos o seguinte questionamento: De
onde vêm estas informações recebidas por estes alunos adolescentes?
NÃO 53
BRANCO 02
{ EMBED MSGraph.Chart.8 \s }
Verificou-se que 87% não conversam sobre sexo com seus professores,
enquanto que apenas 37,5 % o faz; apesar de ambos os grupos acharem importante
conversar sobre o tema “sexualidade” na escola.
{ EMBED MSGraph.Chart.8 \s }
SIM 34
NÃO 166
TOTAL 200
{ EMBED MSGraph.Chart.8 \s }
BRANCO 40
ATRAVÉS DE PROFESSORES OU ORIENTADORES 17
AFIRMARAM QUE NÃO HÁ 07
HOUVE UMA ÚNICA PALESTRA COM UMA SEXÓLOGA 02
ATRAVÉS DE VÍDEOS 05
NAS AULAS DE CIÊNCIAS 10
ATRAVÉS DO GRÊMIO DA ESCOLA 01
ATRAVÉS DO GAE (GRUPO DE APOIO AO ESTUDANTE) 03
ATRAVÉS DE UM TEATRO SOBRE SEXUALIDADE 01
O TRABALHO SÓ ACONTECE QUANDO OS ALUNOS SOLICITAM 01
{ EMBED MSGraph.Chart.8 \s }
Contrariamente às questões anteriores, conforme mostra a tabela 6, muitos
entrevistados não responderam à pergunta do questionário, talvez por não haver mesmo
nenhum trabalho de sexualidade ou por não saber como gostariam que o mesmo fosse
feito, caso houvesse.
{PAGE }
80
60
40
20
0
SUGESTÕES QUANTO À ESTE
TRABALHO
CONSIDERAM O TRABALHO DE SEXUALIDADE IMPORTANTE E SOLICITAM QUE O MESMO SEJA
FEITO NAS ESCOLAS
FALAR SOBRE PREVENÇÃO E DST
CAMISINHA
GRAVIDEZ
{ EMBED MSGraph.Chart.8 \s }
{ EMBED MSGraph.Chart.8 \s }
conversar sobre sexualidade com os professores, a grande maioria não o faz ainda. A
grande maioria dos jovens tira suas dúvidas entre si, e o nível de informação e orientação
sobre o assunto é considerado baixo mediante a importância do tema. Por isso, reforçamos
nossa preocupação quanto à necessidade de atender esse jovem que está nas escolas,
muitas vezes sem respostas para as questões que realmente o preocupam.
Nosso objetivo ao desenvolver esta pesquisa não foi e não será o de trazer
respostas definitivas às questões levantadas, mas sim traçar uma reflexão sobre estas. A
vida não é uma equação e por isso não pode ter um solução única. Nosso esforço em trazer
algumas questões formuladas por nossa sociedade contemporânea e nosso interesse em
compreender como a escola tem se encarregado de administrar a sexualidade de seus
alunos, deve-se ao fato de que estas percepções têm norteado as práticas relacionadas à
sexualidade seja no âmbito escolar ou fora dele.
Mas como pensar a transformação numa estrutura como a escola? Por que
parece ser tão difícil fazer a inserção da Orientação Sexual na escola, mesmo depois de
{PAGE }
todo o amparo legal para que isso aconteça?23 O que continua dificultando ou mesmo
impedindo que isso aconteça?
Buscamos com este trabalho dar algumas idéias que possam subsidiar ações
efetivas de políticas públicas no campo da Educação Sexual a partir da inserção da
Orientação Sexual na Escola enquanto tema transversal, de acordo com os Parâmetros
Curriculares Nacionais, no sentido de possibilitar a real inserção da sexualidade como
tema transversal.
23
Conforme já visto anteriormente, de acordo com a Lei de n º 9.394/96 de Diretrizes e Bases, que
regulamenta todo o processo educacional no país, e seguindo as orientações estabelecidas nos Parâmetros
Curriculares Nacionais traçados pelo MEC, o tema Orientação Sexual está inserido na escola como tema
transversal. Isso significa que terá de perpassar todas as disciplinas da grade curricular: da educação artística
à matemática.
24
Dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
{PAGE }
integrador e globalizador é urgente. Para que isso aconteça é preciso mudar o habitus
estabelecido e cristalizado tão severamente no campo25 escolar.
ANEXOS
25
Utilizamos aqui o conceito de Boudieu, reconhecendo a escola como campo.
{PAGE }
ANEXO I
3) Na sua opinião, a chegada destes Parâmetros provocou alguma mudança em sua prática
pedagógica?
4) Na disciplina que você leciona, você aplica em sala de aula, as diretrizes propostas
pelo Parâmetros Curriculares Nacionais, quanto à Orientação Sexual ?
6) Deseja acrescentar alguma informação que considere importante para este trabalho?
ANEXO II
Caro(a) estudante:
Você está fazendo parte de uma pesquisa sobre Orientação Sexual na Escola. Não é
preciso se identificar, colocando seu nome.
Escreva o nome da sua escola:________________________________________________.
QUESTIONÁRIO
_________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________
8) Você já teve vontade de conversar sobre sexo com seus professores e não o fez?
( ) Sim ( ) Não
9) Por quê?________________________________________________________________
_________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________
10) Na sua opinião, quais os temas mais importantes no trabalho de Orientação Sexual na
Escola?
_________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________
ANEXO III
CONSENTIMENTO LIVRE E INFORMADO
________________________
Katia Krepsky Valladares
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15.REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ARAÚJO, U. F. – Temas transversais em educação- bases para uma formação integral. São
Paulo: Ática,1999.
ARIÈS, Philippe. História Social da Criança e da Família. 2ª edição, Rio de Janeiro: LTC
Editora, 1981.
CATONNÉ, Jean-Philippe. Sexualidade, ontem e hoje. 2ª edição. São Paulo: Cortez, 2001.
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CUNHA, Luiz A.. Educação Estado e Democracia no Brasil. São Paulo: Editora Cortez,
1991.
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Pensadores) 1978.
1988.
FREIRE, Paulo. Educação como prática da Liberdade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1989.
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1999.
complementaridade? Caderno Saúde Pública, Rio de Janeiro, 913 (239-262), jul/set, 1993.
ORTIZ, Renato. Pierre Bourdieu – Sociologia. 2ª edição. São Paulo: Ática, 1980.
PRIORE, Mary Del.(org.). História das mulheres no Brasil . 2ª edição. São Paulo:
Contexto, 1997.
RAMINELLI, Ronald. Eva Tupinambá. In: PRIORI, Mary Del. (org.) História das
ARAÚJO, Emanuel. In: PRIORI, Mary Del. (org.) História das mulheres no Brasil .São
TANNAHIL, Reay - O Sexo na história- Rio de Janeiro. Francisco Alves Editora, 1983.